Descarregar PDF - Região de Cister
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10 oPINIÃo<br />
oPiNião oPiNião<br />
O praticante e o convertido A “i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>” unisexual<br />
Prosa Perfeita - Publicações, lda.<br />
administração e Gestão<br />
Pedro Calado e Alexandra Sousa<br />
direção editorial<br />
Alexandra Sousa, Pedro Calado,<br />
Hermínio Fortes, Filipe Ribeiro<br />
e Hél<strong>de</strong>r da Fonte<br />
coor<strong>de</strong>nação executiva<br />
Pedro Calado e Alexandra Sousa<br />
diretor interino<br />
Pedro Calado<br />
geral@regiao<strong>de</strong>cister.pt<br />
António Ventura<br />
professor<br />
A gran<strong>de</strong><br />
coragem que<br />
hoje é pedida<br />
ao catolicismo<br />
é aceitar<br />
jovialmente ser<br />
minoritário.<br />
Antes isso,<br />
do que ser<br />
praticante<br />
sem alegria,<br />
um cumpridor<br />
profissional <strong>de</strong><br />
missas, ou crente<br />
sem irradiação<br />
ou testemunho<br />
É um facto, e cada vez mais evi<strong>de</strong>nte, nestes tempos que vivemos,<br />
que existem crentes não praticantes; e o facto <strong>de</strong> serem não<br />
praticantes já não serve para medir a intensida<strong>de</strong> duma crença.<br />
Com efeito a figura do praticante correspon<strong>de</strong> a um período típico<br />
do catolicismo, marcado pela extrema centralida<strong>de</strong> do po<strong>de</strong>r<br />
clerical, sob o báculo da Igreja. Foi o mo<strong>de</strong>lo que se impôs na<br />
Igreja <strong>de</strong> Roma, a partir do concílio <strong>de</strong> Trento. Mas a influência do<br />
catolicismo enfraqueceu, e assim se esgotou a figura do praticante<br />
regular. As estatísticas estão aí e não mentem: os praticantes estão<br />
em queda acentuada por toda a parte. A noção <strong>de</strong> obrigação foi<br />
sendo substituída por uma escolha pessoal, sobretudo entre os<br />
jovens católicos. “Bem, eu sou católico, mas não vou à igreja;<br />
ou melhor: eu vou, mas é só às vezes; aquilo já não me diz nada.”<br />
Procurando um novo conceito para o não praticante eu escolhi: o<br />
Peregrino, pois me parece ser a figura que expressa melhor esta<br />
mobilida<strong>de</strong> religiosa dos nossos dias.<br />
o pregrino apareceu, na história das religiões, antes do praticante<br />
regular. Ele atravessa a história <strong>de</strong> todas as religiões. Mas<br />
este peregrino não é como os <strong>de</strong> antigamente que iam visitar as<br />
relíquias dos santos e obter o perdão dos pecados. o peregrino<br />
<strong>de</strong> que eu falo é aquele que faz o seu próprio caminho e não vai<br />
por on<strong>de</strong> todos vão. Este peregrino é aquele que o nosso poeta<br />
josé Régio tão bem retrata no seu “Cântico Negro”:<br />
“Vem por aqui! Dizem-me alguns com olhos doces, estendome<br />
os braços e seguros <strong>de</strong> que seria bom que eu os ouvisse,<br />
quando me dizem: Vem por aqui! Mas eu olho e nunca vou por<br />
ali. A minha glória é esta: não acompanho ninguém. Não! Não!<br />
Não vou por aí. Só vou por on<strong>de</strong> me levam os meus próprios<br />
passos. Prefiro escorregar nos becos lamacentos, re<strong>de</strong>moinhar<br />
aos ventos como farrapos. Arrastar os pés sangrentos, do que ir<br />
por aí. Corre nas vossas veias o sangue velho dos avós. Vós amais<br />
o que é fácil. Eu amo o Longe, a Miragem. Amo os abismos, as<br />
torrentes, os <strong>de</strong>sertos. I<strong>de</strong> vós. Ten<strong>de</strong>s estradas, ten<strong>de</strong>s jardins,<br />
ten<strong>de</strong>s canteiros, ten<strong>de</strong>s pátria, regras e tratados, filósofos e<br />
sábios. Eu tenho a minha loucura. Ninguém me diga: Vem por<br />
aqui! Não sei por on<strong>de</strong> vou, não sei para on<strong>de</strong> vou. Sei que não<br />
vou por aí”. Na figura do peregrino e na do praticante temos as<br />
duas maneiras <strong>de</strong> ser cristão hoje. Enquanto o peregrino segue<br />
uma prática voluntária, o praticante consi<strong>de</strong>ra-a obrigatória.<br />
Enquanto o peregrino tem uma prática autónoma, o praticante<br />
segue aquela que é normalizada pela Igreja. Enquanto o peregrino<br />
tem uma prática caraterizada pela flexibilida<strong>de</strong>, para o<br />
praticante essa prática é fixa. Enquanto o peregrino tem uma<br />
prática individual, para o praticante ela é comunitária. Isto mostra<br />
que a religião está viva, ainda que <strong>de</strong>senquadrada e por vezes<br />
bravia, e não ten<strong>de</strong> a <strong>de</strong>saparecer, como alguns vaticinaram. o<br />
cristianismo está em <strong>de</strong>senvolvimento mas talvez à beira <strong>de</strong><br />
um novo começo. Hoje pergunta-se: porquê a Igreja? Não po<strong>de</strong><br />
haver cristianismo sem Igrejas cristãs? Há indícios <strong>de</strong> um advento<br />
<strong>de</strong> um cristianismo menos ritualista, menos praticamente, mais<br />
liberto das tradicionais práticas religiosas, e mais preocupado<br />
com a fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> evangélica. Cada vez mais cristãos se querem<br />
libertar das suas faixas dogmáticas e pietistas, mas sem sofrerem<br />
qualquer forma <strong>de</strong> excomunhão. A gran<strong>de</strong> coragem que hoje é<br />
pedida ao catolicismo é aceitar jovialmente ser minoritário. Antes<br />
isso, do que ser praticante sem alegria, um cumpridor profissional<br />
<strong>de</strong> missas, ou crente sem irradiação ou testemunho.<br />
A juventu<strong>de</strong> prefere, e com que entusiasmo, peregrinar, tal<br />
como participar nas jornadas Mundiais da juventu<strong>de</strong>, e em eventos<br />
afins, do que ir à Igreja e ser assim um praticante. É que a prática<br />
tornou-se “uma seca”. Entre serem peregrinos ou praticantes,<br />
os jovens preferem o Peregrino.<br />
redacção<br />
joaquim Paulo (editor) (CP 4229)<br />
joaquim.paulo@regiao<strong>de</strong>cister.pt<br />
Luci Pais (CP 6545)<br />
luci.pais@regiao<strong>de</strong>cister.pt<br />
colaboradores permanentes<br />
Damião Leonel, Daniela Franco Sousa, Elisabete<br />
Cruz, Fernando josé, Graça Menitra, jacinto Silva<br />
Duro, joana Fialho, Luciano Larrossa, Maria<br />
Anabela Silva, Miguel Sampaio, Pedro Mateus<br />
Guerra, Raquel Sousa Silva e Ricardo Graça<br />
colaboradores <strong>de</strong> opinião<br />
A<strong>de</strong>lino Granja, António Ventura, Carlos Bonifá-<br />
cio, César Santos, Gaspar Vaz, Hélio Pires, Isabel<br />
Rufino, joão Paulo Raimundo, Manuel António<br />
Sequeira, Pimenta Antunes e Rui Rasquilho<br />
composição e paginação<br />
Prosa Perfeita, Lda<br />
serviços comerciais<br />
Cidália Norberto<br />
publicida<strong>de</strong>@regiao<strong>de</strong>cister.pt<br />
serviços administrativos,<br />
comerciais e assinaturas<br />
Marlene Carreira<br />
marlene.carreira@regiao<strong>de</strong>cister.pt<br />
assinaturas@regiao<strong>de</strong>cister.pt<br />
Fleming <strong>de</strong> Oliveira<br />
advogado<br />
Gostaria <strong>de</strong><br />
saber se os<br />
meus leitores<br />
alcobacenses<br />
enten<strong>de</strong>m que<br />
nas últimas<br />
décadas, não<br />
<strong>de</strong>sapareceram<br />
ou, pelo<br />
menos, se<br />
transformaram<br />
valores como a<br />
amiza<strong>de</strong>?<br />
Proprieda<strong>de</strong>/editor<br />
Prosa Perfeita - Publicações, Lda.<br />
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QUINTA-FEIRA 24 jANEIRo 2013<br />
Penso que uma das gran<strong>de</strong>s características dos dias que correm, que<br />
aliás não é nova, mas se vem sucessivamente acentuando, resi<strong>de</strong> na<br />
“afirmação” <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> unissexo.<br />
os papéis são intermutáveis, tanto os do pai como os da mãe, bem<br />
ainda o dos parceiros sexuais. Todavia, o mo<strong>de</strong>lo que na Família reputamos<br />
preferido continua a ser o “viril”. A silhueta da mulher, especialmente<br />
a jovem, tem-se aproximado da dos rapazes, per<strong>de</strong>ndo algumas<br />
daquelas formas que os artistas europeus apreciavam e valorizavam<br />
tanto, aliás como eu mesmo.<br />
Será mesmo assim ou uma interpretação distorcida? Num tempo antigo<br />
que ainda foi meu, havia espaços absolutamente “unissexuais” vedados<br />
às senhoras (por exemplo a taverna ou o clube), on<strong>de</strong> os homens se<br />
reuniam e as mulheres presentes eram as <strong>de</strong> “má vida”. Recordamo-nos,<br />
por outro lado, dos salões <strong>de</strong> cabeleireiro e os lavadouros das al<strong>de</strong>ias,<br />
vedados aos homens, pois ali muitas confidências femininas se podiam<br />
trocar. Esta segregação encontra-se praticamente superada, e profissões<br />
consi<strong>de</strong>radas essencialmente masculinas, bem como as gran<strong>de</strong>s Escolas,<br />
escancararam-se <strong>de</strong>finitivamente às mulheres. Por seu lado, o homem<br />
introduziu-se no universo tradicionalmente reservado ao feminino, o<br />
ginecologista substitui a parteira, o marido muda as fraldas ao bebé,<br />
cozinha e lava a louça. o vestuário frequentemente semelhante (jeans),<br />
exprime o ajustamento da forma feminina à masculina. A sexualida<strong>de</strong><br />
precoce ten<strong>de</strong> a esbater fronteiras. ouvi recentemente “ainda” <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r<br />
a tese, contra corrente, que o futuro da humanida<strong>de</strong> resi<strong>de</strong> na<br />
separação entre sexos, que os homens e as mulheres têm <strong>de</strong> seguir vias<br />
distintas para se reencontrar o “equilíbrio” necessário. os tempos têm<br />
<strong>de</strong>monstrado o contrário mas, se reparamos bem, tarefas masculinas e<br />
femininas continuam a repartir-se segundo normas tradicionais.<br />
Gostaria <strong>de</strong> saber se os meus leitores alcobacenses enten<strong>de</strong>m que<br />
nas últimas décadas, não <strong>de</strong>sapareceram ou, pelo menos, se transformaram<br />
valores como a amiza<strong>de</strong>, sentimento mal conhecido, difícil <strong>de</strong><br />
viver e manter, morto talvez no limite, pelo culto do casal que a ten<strong>de</strong><br />
a excluir por inúmeras razões, a menor das quais não será a <strong>de</strong> ela ter<br />
sido testemunha do passado. Hoje, parece-me que este sentimento é<br />
absorvido pela família. outrora, esta não tinha esse monopólio, pelo que<br />
a amiza<strong>de</strong> <strong>de</strong>sempenhava papel relevante. Esse sentimento ligava os<br />
homens, alimentava numerosas relações <strong>de</strong> serviço, hoje substituídas<br />
pelo contrato. A vida social era organizada a partir <strong>de</strong> laços pessoais, <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>pendência e <strong>de</strong> entreajuda. As relações <strong>de</strong> serviço e as <strong>de</strong> trabalho<br />
eram relações <strong>de</strong> homem para homem, evoluindo da amiza<strong>de</strong> ou<br />
confiança, até à exploração ou mesmo ao ódio.<br />
o amor, tornou-se a condição <strong>de</strong> sucesso do casamento. os cônjuges<br />
<strong>de</strong>vem comunicar entre si? Apaziguadas as refregas do <strong>de</strong>sejo,<br />
estabelece-se uma “espécie” <strong>de</strong> amiza<strong>de</strong>. É o casamento a duas<br />
velocida<strong>de</strong>s ou o divórcio. As relações familiares são cada vez mais<br />
íntimas, mesmo entre gerações. Estudo/inquéritos <strong>de</strong>monstram que<br />
pais e filhos nunca estiveram tão “próximos”, embora a mãe seja<br />
normalmente a confi<strong>de</strong>nte preferida. Na socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> ontem, a diferenciação<br />
dos estatutos das funções e papéis era muito nítida, não<br />
só entre sexos, mas entre pais e filhos. A relativa homogeneização<br />
que se vive atualmente, torna as fronteiras mais permeáveis, e os<br />
“quarentões” são intimados a permanecer jovens, isto é, a ser capazes<br />
<strong>de</strong> praticar os mesmos <strong>de</strong>sportos que os filhos, a ser os seus melhores<br />
companheiros. Aliás, “companheiro” etimologicamente é aquele com<br />
quem se partilha o pão e assim, o passou a enten<strong>de</strong>r a geração saída<br />
nos anos sessenta ou setenta, como a dos meus filhos.<br />
Entre as mulheres, às rivalida<strong>de</strong>s que proce<strong>de</strong>m nas estratégias <strong>de</strong><br />
sedução, juntam-se as rivalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> carreira? os homens afirmam-no<br />
para se “tranquilizarem” e tirarem proveito das discórdias, embora não<br />
seja ”<strong>de</strong>mocrático” excluir que entre as mulheres não se estabeleça<br />
o pacto <strong>de</strong>cisivo que superando as ninharias em que as armadilhas<br />
grosseiras do macho as confinam, lhes permitira no futuro <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong><br />
ser <strong>de</strong>finitivamente o repouso do guerreiro.<br />
impressão<br />
GRAFEDISPoRT<br />
Impressão e Artes Gráficas, S.A.<br />
distribuição Prosa Perfeita - Publicações,<br />
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dia <strong>de</strong> publicação Quinta-feira<br />
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países do Mundo)<br />
15€ (on line)<br />
tiragem Média 2.500 exemplares<br />
N.º <strong>de</strong> registo 116 942<br />
<strong>de</strong>pósito legal 65280/93