20.04.2013 Views

Tempo Perdido – Livro de Joaquim (PDF – 140kb) - Laura Malin

Tempo Perdido – Livro de Joaquim (PDF – 140kb) - Laura Malin

Tempo Perdido – Livro de Joaquim (PDF – 140kb) - Laura Malin

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

fosse Leah, jamais diria aquilo, a não ser que fosse hipócrita:<br />

Leah, se estivesse viva, seria imortal e não precisaria ter sua<br />

vida salva. A não ser que...<br />

— Você não <strong>de</strong>via mergulhar sozinha — resmunguei, afastando<br />

a mão.<br />

— Nem você. — Sylvia levantou-se, esqueceu-se do pé machucado<br />

e, quando o plantou no chão, sentiu uma fisgada <strong>de</strong> dor<br />

que percorreu seu corpo até franzir a testa. Sentou novamente.<br />

— Fique aí, vou te trazer um café e <strong>de</strong>pois te levo ao posto<br />

<strong>de</strong> saú<strong>de</strong>.<br />

— Não precisa — se limitou a dizer, enquanto <strong>de</strong>scobria a vista<br />

que se alargava na janela do meu quarto, revelando a Enseada<br />

da Caieira. Havia algo <strong>de</strong> estranho e duro em suas palavras.<br />

Fui até a cozinha e trouxe, numa ban<strong>de</strong>ja, um café da manhã<br />

que tinha preparado. Pousei a ban<strong>de</strong>ja em seu colo e cheguei<br />

perto o bastante <strong>de</strong> sua boca para querer beijá-la. Minha frustração<br />

foi se dissipando, como areia em vendaval, à medida que<br />

ela e eu trocávamos olhares silenciosos. Ousei colocar o guardanapo<br />

em cima da sua blusa.<br />

— Acha que sou uma criança? Uma menina mimada? — ralhou,<br />

puxando o guardanapo para si.<br />

— Uma eterna adolescente? — E vi quando ela arregalou<br />

os olhos, vi o susto, quase que ouvi seu sangue pulsando nos<br />

pequenos e <strong>de</strong>licados vasos capilares.<br />

Sylvia apenas me encarou, calada, enquanto <strong>de</strong>vorava seu<br />

café da manhã. Eu fui até a janela, disfarçando. Lancei, a braçadas,<br />

o maior olhar que pu<strong>de</strong> na enseada. Me veio a imagem <strong>de</strong><br />

Leah, e um sentimento: a minha Leah era mais doce do que Sylvia.<br />

Meiga, <strong>de</strong>zessete anos congelados num sorriso <strong>de</strong> menina.<br />

Leah não tinha a aspereza <strong>de</strong> um teju, era doce como um pôr do<br />

sol. Macia, intensa, viva, pronta a <strong>de</strong>scobrir, sem <strong>de</strong>fesas, uma<br />

primavera. Minha flor.<br />

O tempo, provavelmente, a teria mudado, endurecido e criado<br />

aquela casca que revestia Sylvia. Eu também tinha minhas<br />

cascas, afinal. Se houvesse, lá embaixo, a essência <strong>de</strong> Leah, eu<br />

<strong>Tempo</strong> perdido: livro <strong>de</strong> <strong>Joaquim</strong> 25

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!