19.06.2013 Views

Falsificação de medicamentos. Uma realidade à qual é preciso dar ...

Falsificação de medicamentos. Uma realidade à qual é preciso dar ...

Falsificação de medicamentos. Uma realidade à qual é preciso dar ...

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Acta Pediatr Port 2008:39(1):46-50 Virella D – <strong>Falsificação</strong> <strong>de</strong> <strong>medicamentos</strong><br />

Enquanto no Terceiro Mundo são os <strong>medicamentos</strong> necessários<br />

para a sobrevivência que dominam o mercado da contrafacção,<br />

sejam <strong>medicamentos</strong> caros, como citostáticos, antirretrovirais<br />

ou para baixar a tensão arterial ou o colesterol, ou<br />

baratos, como antibióticos, tuberculostáticos, antimaláricos,<br />

analg<strong>é</strong>sicos e antistamínicos, nos países <strong>de</strong>senvolvidos predominam<br />

<strong>medicamentos</strong> relacionados com “estilos <strong>de</strong> vida”<br />

(esterói<strong>de</strong>s anabolizantes, sil<strong>de</strong>nafil, etc.). Sejam quais forem<br />

os <strong>medicamentos</strong> contrafeitos adquiridos, existe sempre o<br />

risco <strong>de</strong> não terem o efeito terapêutico <strong>de</strong>sejado ou <strong>de</strong> provocarem<br />

efeitos adversos.<br />

Contrafacção <strong>de</strong> <strong>medicamentos</strong>: o problema conceptual<br />

A <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> contrafacção <strong>de</strong> <strong>medicamentos</strong> varia entre países,<br />

reflectindo os diferentes aspectos que o fenómeno tem em<br />

diversos locais do Mundo5 . Este facto dificulta uma abordagem<br />

global do problema.<br />

Na sua visão mais restrita, o conceito <strong>de</strong> contrafacção refe -<br />

re-se apenas ao fabrico <strong>de</strong> um produto farmacêutico por<br />

algu<strong>é</strong>m não autorizado a fazê-lo, copiando ou imitando o original<br />

sem a autorização <strong>de</strong>vida e com o propósito <strong>de</strong> engano<br />

ou frau<strong>de</strong> atrav<strong>é</strong>s da venda do produto como se do original se<br />

tratasse. Este conceito, com uma visão puramente comercial,<br />

<strong>é</strong> uma transposição do que ocorre com a contrafacção <strong>de</strong> bens<br />

<strong>de</strong> consumo, como produtos <strong>de</strong> moda ou <strong>de</strong> tecnologia.<br />

No entanto, como vimos, o problema da contrafacção <strong>de</strong><br />

medi camentos ultrapassa nas suas consequências a produção<br />

e a venda <strong>de</strong> roupas ou <strong>de</strong> malas <strong>de</strong> marcas <strong>de</strong> prestígio. Os<br />

<strong>medicamentos</strong> contrafeitos são uma parte específica do fenómeno<br />

mais vasto da produção farmacêutica que não atinge os<br />

padrões <strong>de</strong> <strong>qual</strong>ida<strong>de</strong> a<strong>de</strong>quados. A diferença fundamental <strong>é</strong><br />

que <strong>é</strong> feita com o propósito fraudulento e <strong>de</strong>liberado <strong>de</strong> falsear<br />

a sua origem e essência, ocultando o facto <strong>de</strong> não terem<br />

o benefício terapêutico <strong>de</strong>sejado, po<strong>de</strong>ndo ser causa <strong>de</strong> resistência<br />

aos fármacos ou mesmo <strong>de</strong> morte4,6 .<br />

Para tentar resolver este impasse, a OMS <strong>de</strong>senvolveu uma<br />

<strong>de</strong>finição própria, mais abrangente: “O medicamento contrafeito<br />

<strong>é</strong> aquele que foi <strong>de</strong>liberada e fraudulentamente sujeito a<br />

uma alteração da sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e/ou origem. A contrafacção<br />

po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> marca ou <strong>de</strong> gen<strong>é</strong>ricos e po<strong>de</strong> incluir<br />

produtos com a composição correcta ou errada, sem componentes<br />

activos, com componentes activos insuficientes ou<br />

com uma embalagem falsa” 5 .<br />

Condições que favorecem o fenómeno<br />

da contrafacção <strong>de</strong> <strong>medicamentos</strong><br />

Sem dúvida, a procura <strong>de</strong> <strong>medicamentos</strong> baratos por parte <strong>de</strong><br />

quem <strong>de</strong>les necessita gera a oportunida<strong>de</strong> para a contrafacção<br />

ou falsificação <strong>de</strong> <strong>medicamentos</strong>, mas o principal factor que a<br />

favorece <strong>é</strong> o lucro fácil.<br />

Há um mercado inesgotável <strong>de</strong> milhões <strong>de</strong> pessoas com baixas<br />

condições económicas e saú<strong>de</strong> instável (ou falta <strong>de</strong>la), que<br />

gera uma procura superior <strong>à</strong> oferta legal <strong>de</strong> muitos <strong>medicamentos</strong>.<br />

O facto da compra <strong>de</strong> um medicamento não ser habi-<br />

tualmente uma escolha pessoal, mas sim uma indicação m<strong>é</strong>dica<br />

ou <strong>de</strong> outro profissional <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, supostamente legitima o<br />

produto. À imensa maioria dos utentes faltam os conhecimentos<br />

necessários para reconhecer a <strong>qual</strong>ida<strong>de</strong> do produto farmacêutico<br />

que adquirem 5 . A estas populações necessitadas juntam-se<br />

muitos milhares dispostos a conseguir <strong>medicamentos</strong><br />

para usos mais ou menos ilícitos, que não os po<strong>de</strong>riam obter<br />

pelas vias legais ou habituais (cremes com corticoesterói<strong>de</strong>s<br />

para clarear a pele, esterói<strong>de</strong>s anabolizantes, psicofármacos e<br />

outros estimulantes) 5 .<br />

Produzir ilegalmente <strong>medicamentos</strong> copiando os seus produtos<br />

activos ou simplesmente omitindo-os não requer instalações<br />

nem meios onerosos. Na realida<strong>de</strong>, quanto mais discretas<br />

as instalações, maior a probabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sucesso. Os lucros<br />

são gran<strong>de</strong>s, mesmo que os produtos sejam vendidos a preços<br />

bem mais baixos do que os dos originais. Existe uma estimativa<br />

<strong>de</strong> que, em 2010, o produto da venda <strong>de</strong> <strong>medicamentos</strong><br />

contrafeitos possa atingir 75 milhões <strong>de</strong> dólares (50,6 milhões<br />

<strong>de</strong> euros), o que significa um aumento <strong>de</strong> 95% sobre as estimativas<br />

para 2005) 5 .<br />

A falta <strong>de</strong> legislação específica nalguns países (ou a falta <strong>de</strong><br />

meios ou vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> implementá-la) e a livre circulação <strong>de</strong><br />

bens <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s espaços económicos facilitam a ex -<br />

pan são <strong>de</strong>ste negócio 4,5,7 .<br />

Se não existir legislação que regule a implementação <strong>de</strong> pa -<br />

drões <strong>de</strong> boas práticas industriais para a fabricação <strong>de</strong> medi ca -<br />

mentos, elas não serão implementadas. Dos 191 países que pertencem<br />

actualmente <strong>à</strong> OMS, cerca <strong>de</strong> 20% possuem legisla ção<br />

regulamentadora da produção reconhecidamente bem concebida;<br />

cerca <strong>de</strong> 50% dos países têm legislação parcial ou capacida<strong>de</strong><br />

insuficiente <strong>de</strong> implementá-la; os restantes 30% ou não possuem<br />

<strong>qual</strong>quer legislação ou capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> implementá-la 5 . A<br />

prevalência <strong>de</strong> <strong>medicamentos</strong> falsos <strong>é</strong> maior em países on<strong>de</strong> a<br />

legislação reguladora e a sua implementação são mais fracos 4 .<br />

Por outro lado, na sua maioria, as sanções previstas para a<br />

contrafacção <strong>de</strong> <strong>medicamentos</strong> não têm <strong>qual</strong>quer efeito dissuasor<br />

5 . Em muitos países, a pena por falsificar o logótipo <strong>de</strong><br />

uma camisola <strong>é</strong> muito maior do que a prevista para a contrafacção,<br />

por exemplo, <strong>de</strong> um citostático 3 .<br />

O com<strong>é</strong>rcio internacional <strong>de</strong> princípios activos <strong>é</strong> tamb<strong>é</strong>m uma<br />

potencial janela <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong> para a disseminação <strong>de</strong> me -<br />

di camentos falsificados ou contrafeitos. Parece estar comprovado<br />

que algumas das novas potências do com<strong>é</strong>rcio mundial<br />

não têm as mesmas exigências <strong>de</strong> padrões <strong>de</strong> boas práticas<br />

industriais para a fabricação <strong>de</strong> <strong>medicamentos</strong> para as empresas<br />

exportadoras, do que para as que produzem para o seu<br />

mercado interno 5 . Quando estes produtos entram em zonas <strong>de</strong><br />

com<strong>é</strong>rcio livre, atrav<strong>é</strong>s dos seus países membros mais permeáveis,<br />

<strong>é</strong> fácil que ocorra a utilização <strong>de</strong> princípios activos<br />

ina<strong>de</strong>quados pelas indústrias farmacêuticas locais ou que se<br />

proceda simplesmente <strong>à</strong> reembalagem e reetiquetagem dos<br />

<strong>medicamentos</strong> importados, entrando assim na ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> distribuição,<br />

mesmo nos países on<strong>de</strong> o sistema <strong>de</strong> vigilância está<br />

muito regulamentado 5 .<br />

No caso da UE, os produtos farmacêuticos figuram entre<br />

aqueles que po<strong>de</strong>m circular livremente entre os 27 países<br />

47

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!