A Historia do Brasil em 50 Fras - Jaime Klintowitz
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organizadas pelas autoridades. Eram comuns matanças patrocinadas por<br />
fazendeiros e seringueiros. O próprio Ron<strong>do</strong>n precisou de sangue frio para<br />
não se deixar arrastar pelos costumes <strong>do</strong> faroeste caboclo. Em seu diário, ele<br />
narrou a luta íntima, travada entre o desejo de vingança e a ponderação<br />
humanitária, que se seguiu a um ataque nhambiquara ao seu acampamento<br />
no norte <strong>do</strong> Mato Grosso, <strong>em</strong> 21 de outubro de 1907.<br />
Uma flecha atingiu a ban<strong>do</strong>leira de couro de sua espingarda R<strong>em</strong>ington<br />
e outra feriu com gravidade Rio Preto, seu cão da caça. O futuro marechal<br />
espantou os atacantes a tiros, mas disparou para o alto. Ao registrar o<br />
episódio, ele não disfarçou a irritação: “Esses nhambiquaras 16 não sab<strong>em</strong><br />
que vi<strong>em</strong>os <strong>em</strong> paz? Longe estávamos de esperar essa traição”. Na<br />
conclusão, o sentimento de alívio: “Que felicidade! Escapei de morrer<br />
inglória e traiçoeiramente”. No dia seguinte, mais calmo, mostra-se<br />
compreensivo com os índios. Mas foi preciso convencer seus comanda<strong>do</strong>s a<br />
não a<strong>do</strong>tar represálias:<br />
(...) a vergonha que parecia to<strong>do</strong>s sofríamos se não<br />
d<strong>em</strong>onstráss<strong>em</strong>os aos inimigos nossa superioridade. Ao princípio ia<br />
participan<strong>do</strong> deste ponto de vista militar, sen<strong>do</strong> felizmente<br />
reconduzi<strong>do</strong> ao ponto de vista humano e fraternal – insisti pela<br />
retirada, porque nossa missão é de to<strong>do</strong> fraternal, não de<br />
guerra. 17<br />
Cândi<strong>do</strong> Mariano da Silva nasceu no Mato Grosso <strong>em</strong> 1865. Aos cinco<br />
meses perdeu o pai e, aos <strong>do</strong>is anos, a mãe. Foi morar com um tio <strong>em</strong><br />
Cuiabá, de qu<strong>em</strong> a<strong>do</strong>tou o sobrenome Ron<strong>do</strong>n. Em dez<strong>em</strong>bro de 1889, um<br />
mês depois da proclamação da República, recebeu o título de engenheiro<br />
militar e de bacharel <strong>em</strong> mat<strong>em</strong>ática e ciências físicas pela Escola Militar <strong>do</strong><br />
Rio de Janeiro.<br />
Sua mãe descendia de índios bororos e terenas – mas não foi a<br />
genealogia que o motivou a defender os indígenas. Ron<strong>do</strong>n pertenceu a uma<br />
geração de brasileiros que lutou por reformas modernizantes e para dar<br />
identidade à nação. No final <strong>do</strong> século XIX, a presença <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> brasileiro<br />
não se estendia longe <strong>do</strong> litoral. D<strong>em</strong>orava um mês para ir <strong>do</strong> Rio ao Mato<br />
Grosso numa viag<strong>em</strong> de navio que descia o litoral, entrava no rio da Prata e<br />
subia pelos rios Paraná e Paraguai.<br />
Levava-se quase o mesmo t<strong>em</strong>po para ir ao Japão, <strong>do</strong> outro la<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />
planeta. Em 1908, o navio Kasato Maru com a primeira leva de imigrantes<br />
japoneses, só precisou de quarenta dias para chegar ao <strong>Brasil</strong>. 18 A notícia da<br />
proclamação da República <strong>em</strong> 15 de nov<strong>em</strong>bro de 1889 só chegou aos