GAZETA DIARIO 941
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
Foz do Iguaçu, quinta-feira, 8 de agosto de 2019<br />
Cidade<br />
07<br />
OPERAÇÃO NIPOTI<br />
Melquizedeque guardava<br />
dinheiro de propina em<br />
banheiro da prefeitura<br />
Depoimento do ex-secretário de Reni durou dois dias e confirmou o esquema de corrupção<br />
Adelino de Souza<br />
Freelancer<br />
O banheiro do gabinete do<br />
ex-secretário da Tecnologia da<br />
Informação Melquizedeque<br />
Correa de Souza não servia apenas<br />
para suas necessidades fisiológicas.<br />
Nele era armazenada<br />
temporariamente a propina<br />
recebida de empreiteiros durante<br />
o governo de Reni Pereira.<br />
Neste mês, a Justiça Federal<br />
começou a ouvir os 98 réus<br />
da Operação Nipoti, um desdobramento<br />
da Pecúlio, deflagrada<br />
pela Polícia Federal, que descobriu<br />
um grande esquema de<br />
corrupção na gestão passada.<br />
O ex-secretário da Tecnologia<br />
da Informação Melquizedeque,<br />
conhecido como Melque,<br />
foi o primeiro a ser ouvido nesta<br />
fase. Seu depoimento durou<br />
mais de 15 horas, em dois dias.<br />
Ele confirmou o que já dissera<br />
na delação premiada.<br />
Durante muito tempo, Melque<br />
foi operador do caixa 2 do<br />
governo Reni Pereira. Ele era<br />
o encarregado de receber propina<br />
de empreiteiros e prestadores<br />
de serviço ao município,<br />
repassar ao prefeito e pagar alguns<br />
vereadores que faziam o<br />
que Reni mandava.<br />
O começo de<br />
tudo<br />
Melquizedeque<br />
participou da<br />
campanha que<br />
levou Reni à prefeitura.<br />
Antes,<br />
ele trabalhava<br />
com informática<br />
no Paraguai e<br />
conseguiu dinheiro<br />
para a<br />
campanha com<br />
algumas empresas<br />
de Ciudad del<br />
Este. Como presente,<br />
ganhou o<br />
cargo de secretário<br />
da Tecnologia da Informação.<br />
No início ele era um secretário<br />
como qualquer outro,<br />
mas a partir do segundo semestre<br />
de 2014 foi ganhando<br />
a confiança do prefeito. Em<br />
agosto daquele ano, emprestou<br />
R$ 60 mil para o prefeito<br />
pagar o "mensalinho" aos vereadores.<br />
Logo em seguida<br />
passou a ser o "operador" do<br />
sistema criminoso.<br />
Dinheiro no banheiro<br />
A função de Melque não<br />
era apenas a de conseguir dinheiro<br />
para o "mensalinho",<br />
Melquizedeque reafirmou o que já havia dito<br />
no acordo de delação premiada<br />
mas também de arrecadar a propina<br />
de grandes, pequenas e<br />
médias empresas, que realizavam<br />
obras superfaturadas para<br />
engordar os bolsos do chefe da<br />
organização criminosa. Melquizedeque<br />
e outros operadores<br />
do sistema ficavam apenas com<br />
as migalhas, embora corressem<br />
todos os riscos. Melque e Budel,<br />
por exemplo, "pegaram<br />
cana pesada", enquanto Reni<br />
pegou apenas alguns dias de<br />
prisão domiciliar.<br />
No depoimento dessa fase,<br />
o ex-secretário esclareceu que<br />
os R$ 100 mil de propina que<br />
ele armazenou no banheiro vi-<br />
eram de uma empreiteira<br />
que iria construir a estrada<br />
do Alto da Boa Vista.<br />
Depois do expediente, a<br />
parte do leão teria sido repassada<br />
ao chefe.<br />
Melque ratificou também<br />
o recebimento de propina<br />
de outras empreiteiras,<br />
como o caso da Avenida<br />
Felipe Wandscheer,<br />
executada pela Construtora<br />
SR, cujos donos fizeram<br />
acordo de delação premiada,<br />
ressarciram o dinheiro<br />
desviado, pagaram<br />
multas e evitaram a prisão.<br />
E assim era com empreiteiros,<br />
prestadores de serviços e<br />
consultores. Pagamentos eram<br />
atrasados propositadamente<br />
para arrecadar ainda mais com<br />
a liberação. Nada escapava do<br />
rastel do ex-prefeito, apelidado<br />
de gafanhoto, porque devorava<br />
tudo o que via pela frente.<br />
Até mesmo os prestadores<br />
de serviços de saúde eram obrigados<br />
a "encostar umbigo no<br />
balcão" dos desalmados, enquanto<br />
o povo morria aguardando<br />
atendimento nas unidades<br />
de saúde.<br />
Os depoimentos prosseguirão<br />
até o final do mês.<br />
Vereador<br />
marcado com<br />
"XX" recebia R$<br />
10 mil por mês<br />
O ex-secretário Melquizedeque<br />
confirmou ainda o pagamento<br />
de "mensalinho" a vereadores<br />
que votavam para aprovar os<br />
interesses da organização<br />
criminosa. Sobre esse episódio,<br />
ele ratificou praticamente tudo<br />
o que disse em sua delação<br />
premiada.<br />
Além disso, apresentou<br />
documentos e áudios que<br />
comprometem alguns<br />
vereadores no esquema. Uma<br />
das provas é uma lista<br />
encontrada em seu celular, na<br />
qual os vereadores marcados<br />
com "XX" deveriam receber R$<br />
10 mil por mês; e aqueles com<br />
"X", R$ 5 mil e mais um cargo<br />
em comissão na prefeitura.<br />
Segundo a delação, em<br />
novembro de 2014 Melque foi<br />
buscar Reni nas proximidades do<br />
Fórum de Justiça, quando<br />
recebeu a ordem de repassar o<br />
dinheiro a sete vereadores.<br />
"Como eu não tinha papel para<br />
anotar, gravei os nomes em meu<br />
celular." Nessa oportunidade,<br />
Reni orientou sobre a estratégia<br />
do "X" ou "XX".<br />
Melquizedeque cita o<br />
recebimento de propina de<br />
várias empresas para azeitar<br />
essa máquina nefasta. O<br />
recebimento era feito em<br />
hotéis e residências de<br />
secretários, durante jantares.<br />
"Os vereadores denunciados<br />
integravam a aludida<br />
organização criminosa,<br />
mediante a não instalação ou<br />
arquivamento de CPI,<br />
aprovação ou rejeição de<br />
projetos, conforme o interesse<br />
da ORCRIM", escreveu o<br />
procurador de justiça na época<br />
da denúncia.