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01 - Princesa das Cinzas - LAURA SEBASTIAN

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para a cama, afugentar os pensamentos sobre Blaise, Ampelio e minha mãe para o fundo

da mente de uma vez por todas. Eu poderia enterrar tudo lá no fundo. Poderia evitar

enraivecer o kaiser e ele continuaria a me manter viva.

Mas penso no sangue que manchou meu vestido e minhas mãos. De Ampelio.

Respiro fundo e me obrigo a girar a maçaneta e empurrar a porta, abrindo-a apenas

o suficiente para me esgueirar por ela e sair no corredor. As portas dos quartos das

Sombras estão todas fechadas, mas há taças de vinho deixadas no chão diante delas.

Alguma boa alma deve ter lhes trazido bebida do banquete. Ou talvez não tão boa,

dependendo do que mais havia no vinho.

Muito inteligente, Blaise. Reprimo um sorriso antes de me dar conta de que, pela

primeira vez em séculos, ninguém está me vigiando. Permito-me sorrir de verdade. Por

um momento, penso em minhas Sombras adormecidas em seus quartos minúsculos e

sinto-me tentada a espioná-los ao menos uma vez, mas não posso correr o risco de

acordá-los.

O sorriso permanece fixo em meu rosto enquanto prossigo pelo corredor. Como a

adega fica na ala oeste do palácio, embaixo das cozinhas principais, preciso virar à

esquerda. Ou será à direita? Sob a luz fraca das tochas presas nas paredes, não tenho

certeza de nada. Basta uma única mudança de direção errada, uma única passagem

errada, uma única pessoa no lugar onde não deveria estar. A ideia quase me faz correr

de volta para a cama, mas sei que é apenas uma morte mais lenta que me aguarda lá.

Tenho de fazer uma escolha. Tenho de confiar em mim mesma. Vou para a esquerda.

Os sons dos farristas da madrugada sobem pela grande escadaria e percorrem os

corredores, chegando até mim – música e risos alcoolizados, gritos de alegria à custa

de Astrea. Um brinde é erguido à Princesa das Cinzas e eles contam as piadas

indecentes que ouvi tantas vezes que já não me afetam. O caminho mais fácil até as

cozinhas passa direto por eles, desce as escadas e dobra uma esquina – uma

perspectiva assustadora, considerando o estado deles –, mas existe um motivo para

Blaise ter designado a adega da cozinha, e não é só porque ela fica escura e deserta a

esta hora da noite. É por causa dos túneis.

Quando éramos crianças, antes do cerco, Blaise estava determinado a explorar

todas as passagens ocultas no castelo, desenhando dúzias de mapas rabiscados que

somente ele conseguia entender. E, como a mãe dele e a minha eram amigas íntimas e

estavam sempre juntas, muitas vezes ele era obrigado a me levar junto. Eu explorei as

passagens também. Não chegamos perto de encontrar todas, mas, durante o período de

cerca de um ano que passamos a procurá-las, encontramos dúzias delas. Incluindo uma

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