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E m m a S c o t t
F u l l T i l t # 1
E m m a S c o t t
Disponibilização: Eva
Tradução: Equipe Sweet
Revisão Inicial: Renata V.
Revisão Final: Keira
Leitura Final: Miss Marple
Formatação: Eva
Fevereiro/2020
F u l l T i l t # 1
E m m a S c o t t
Full Tilt Duet
F u l l T i l t # 1
E m m a S c o t t
Eu te amaria para sempre, se tivesse essa chance...
Kacey Dawson sempre viveu a vida no limite — impulsivamente, às vezes
perigosamente. E agora, como guitarrista principal de uma boa banda em
ascensão, ela está pronta para a fama e fortuna. Mas está dividida entre
querer ser uma musicista séria e a brilhante sedução dos seus demônios
regados a muito álcool ao se tornar uma celebridade do rock. Um show
arruinado em Las Vegas ameaça destruir inteiramente sua carreira. Ela
acorda com uma ressaca do inferno, sem memória da noite anterior e de
como acabou no sofá do motorista de sua limusine...
Jonah Fletcher está ficando sem tempo. Ele sabe que sua situação é
desesperadora, e prometeu aproveitar ao máximo os poucos meses que lhe
restam. Seus planos incluem ver a exposição de sua obra de vidro em uma
prestigiada galeria de arte... nesses planos não estava incluído se apaixonar
por uma celebridade do selvagem rock, tempestuosa e que desmaiou em
seu sofá.
Jonah vê que Kacey está no caminho da autodestruição. Ele a deixa dormir
com ele por alguns dias para pensar e pôr a cabeça no lugar. Mas nenhum
deles esperava a conexão profunda que estão sentindo, ou que essa
conexão cresceria tão rápido da amizade para algo mais. Algo profundo,
puro e transformador... algo tão frágil como o vidro, que ambos sabem que
será quebrado no final, não importa o quanto tentem evitar.
Full Tilt é uma história sobre o significado de se amar com todo o seu coração, sacrificar,
experimentar o sofrimento terrível e a felicidade. Viver a vida com toda a sua beleza, toda
a sua dor e no final ser capaz de sorrir entre as lágrimas, sabendo que você não teria feito
nada diferente.
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Playlist
Lightning Crashes - Live
Hurricane - Halsey
Chandelier - Sia
Yellow - Coldplay
My Heart Will Go On - Celine Dion
Like a River - Bishop
Free Fallin - Tom Petty
Chasing Cars - Snow Patrol
Spirits - the Strumbellas
Hallelujah - Rufus Wainwright, lyrics de Leonard Cohen
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E m m a S c o t t
PARTE I
Full Tilt (Pôquer): Jogar com emoção e não com a razão; tomar
decisões precipitadas em vez das lógicas.
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E m m a S c o t t
PRÓLOGO
jonah
Quinze meses atrás...
A luz branca perfura meus olhos. Eu luto para mantê-los
abertos, em seguida, cedo e deixo fecharem novamente. Ouço as
máquinas em vez disso, deixo seu som me tirar da inconsciência.
O pulso apitando é o meu coração. Meu novo coração,
bombeando lentamente dentro do meu peito. Ontem, ele
pertencia a um jovem de vinte e três anos de idade, jogador de
basquete que acabou em um acidente de carro nos arredores de
Henderson. Agora é meu. Tristeza e gratidão permeiam as bordas
da minha consciência.
Obrigado. Sinto muito, e obrigado...
Deus, meu peito. É como se uma bigorna tivesse me
esmagado, quebrado minhas costelas. Em algum lugar no meio
da dor profunda e pesada está meu coração. Uma grande agonia
nasce debaixo do meu esterno que foi aberto como um armário,
então grampeado e fechado novamente.
dor.
Eu gemo e o som sai de mim, formando uma corrente de
“Ele está acordando. Você acordou, querido?”
Forço meus olhos a se abrirem e a luz branca é ofuscante.
Talvez eu esteja morto.
O branco dos lençóis hospitalares e lâmpadas fluorescentes
gritantes queimam meus olhos, então tudo entra em foco. As
Sombras escuras tomam forma. Meus pais pairam sobre mim do
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meu lado direito. Os olhos da minha mãe estão molhados e sua
mão afasta uma mecha de cabelo da minha testa. Ela ajusta a
cânula nasal que está presa ao meu nariz embora provavelmente
não precisasse de ajuste.
“Você está lindo, querido”, ela me diz com uma voz trêmula.
Eu sinto como se tivesse sido atropelado por um trem de
carga, e antes disso estivesse estado mortalmente doente por
semanas. Mas ela não quis dizer que eu pareço bonito. Ela quis
dizer que pareço vivo.
Por ela, eu forço um sorriso.
“Você se saiu bem, filho”, meu pai diz. “Dr. Morrison disse
que tudo parece muito bom.” Ele me dá um sorriso tenso, então
desvia o olhar, tossindo em seu punho para esconder a emoção.
“Theo?” Eu resmungo e estremeço com a profunda ferida da
dor em meu peito. Respiro superficialmente e olho para ele do
meu lado esquerdo.
Ele está ali, agachado em uma cadeira, seus antebraços
apoiados nos joelhos. Forte. Sério.
“Ei, bro”, ele diz e ouço a leveza forçada em sua voz
profunda. “A mãe está mentindo. Você parece uma merda.”
“Theodore”, ela diz. “Ele não parece assim. Ele está lindo.”
Eu não tenho energia para dar a meu irmão uma piada.
Tudo o que consigo é um sorriso. Ele sorri de volta, mas está
tenso e sério. Conheço meu irmão melhor do que ninguém. Sei
que tem algo que o está comendo por dentro. A ira está
borbulhando como uma luz pulsante e agora está o queimando.
Por quê…?
Lanço meu olhar ao redor da sala e então sei. “Audrey?”
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O ar fica pesado e minha mãe salta como se alguém a
tivesse cutucado com uma agulha. Olhares são trocados a minha
volta, como pássaros se lançando sobre minha cama.
“É tarde”, meu pai diz. “Ela foi para casa.” Ele é um
vereador da cidade, e ligou a voz do seu eu político, a que usa
quando ele precisa dizer uma verdade desagradável de uma forma
agradável.
Minha mãe, uma professora de jardim de infância e adepta
do conforto, diz. “Mas você deve descansar agora, querido.
Dormir. Você vai se sentir mais forte depois que tiver mais horas
de sono.” Ela me dá um beijo na testa. “Eu amo você, Jonah.
Você vai ficar bem.”
Meu pai pega minha mãe pelos ombros. “Vamos deixá-lo
descansar, Beverly.”
Eu descanso. Entro e saio de um sono irregular,
encharcado de dor, até que uma enfermeira injeta algo via
intravenosa no meu braço e então eu durmo profundamente.
Quando acordo, Theo está lá. Audrey não. Meu novo
coração começa a bater em um maçante ritmo pesado. Todos os
circuitos de adrenalina foram reconectados, ou qualquer
hormônio que aparece quando algo que você achava que poderia
durar para sempre acaba.
“Onde ela está?” Pergunto. “Diga-me a verdade.”
Theo sabe de quem estou falando. “Ela partiu para Paris na
manhã de ontem.”
“Você falou com ela? O que ela disse?”
Ele puxa a cadeira para mais perto. “Alguma história triste
do caralho. Que ela tinha um plano para sua vida e isso...” Seu
olhar varre o quarto.
“Isso não é o que ela queria”, digo.
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“Ela não podia aguentar...” Ele passa a mão pelo cabelo.
“Foda-se, não deveria ter dito nada.”
“Não”, digo, balançando a cabeça um pouco. “Estou feliz
que você me disse. Eu precisava ouvir isso.”
“Sinto muito, bro. Três anos. Três anos você deu a ela, e ela
apenas...”
“Tudo bem. É melhor.”
“Melhor? Como diabos é melhor?”
Agora, meus olhos estão pesados e querem fechar, deixar
cair a cortina e afundar no esquecimento por pouco tempo. Eu
não tenho a força para lhe dizer que não odeio Audrey por me
deixar. Eu já esperava por isso. Mesmo doente com um coração
rapidamente falhando, podia ver quando ela se contorcia e
saltava, olhos correndo para a porta, traçando uma rota de fuga
da minha doença e da vida que ela não queria ter.
Dói — como se cada um desses três anos em que estivemos
juntos foi uma faca empurrada em meu novo coração. Mas não a
odeio. Eu não a odeio porque não a amo. Não da maneira que eu
queria amar uma mulher — com todas as minhas forças.
Audrey foi embora. Theo poderia odiá-la por mim. Meus
pais podem se maravilhar com sua crueldade em meu nome. Mas
eu a deixo ir, porque naquele momento, não sei que ela seria a
última...
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CAPÍTULO 1
kacey
Julho, uma noite de sábado
Estou bêbada.
Por que mais eu estaria com meu celular na minha mão,
meu polegar pairando sobre o número da casa dos meus pais em
San Diego?
Ligação de bêbada, pensei. Não são apenas para exnamorados.
Solto uma risada. Sai mais como um soluço e ecoo pela
escada. Sento no espaço escuro, estreito, com os joelhos puxados
para cima, tentando fazer-me pequena. Invisível. Do outro lado do
muro de cimento onde posso ouvir os gritos abafados e assobios
de três mil pessoas à espera da Rapid Confession subir ao palco.
Nosso empresário, Jimmy Ray, tinha nos dado o sinal para entrar
em dez minutos ou uns bons vinte minutos atrás e meus
companheiros de banda provavelmente estão, procurando por
mim.
Tomo um gole da minha garrafa de água Evian, misturada
com três quartos de vodca — porque eu sou inteligente — e
contemplo o meu telefone. Eu me atrevo a ligar. Seria melhor não,
basta colocá-lo de lado e me juntar à banda no salão verde.
Temos que entrar no palco, tocar para mais um show lotado. Eu
ficaria muito famosa, faria algum dinheiro de verdade e
continuaria a transar com um cara diferente a cada noite.
Porque isso é rock and roll.
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Que piada. Eu não combino com rock and roll. Olho para
mim, especialmente esta noite vestida de minissaia, botas até o
alto das coxas e top. Meus cabelos — descoloridos ou quase
brancos — enrolados em volta dos meus ombros em perfeição
como uma modelo. Meus lábios pintados de vermelho e meus
olhos envoltos em preto. Tatuagens decoram minha pele, dando a
impressão de uma garota roqueira, mas eles não são uma
fantasia. São meus.
Olho para mim, mas me sinto como um pedaço de vidro,
quebrado e espalhado por toda parte. Eu não sei mais quem ou o
que eu sou, mas sempre fico lindamente no centro das atenções.
Tomo outro gole de vodca e quase deixo o meu telefone cair.
Eu me atrapalho para pegá-lo e quando levanto, vejo que cliquei
no grande botão verde de chamada.
“Merda...”
Lentamente, coloco o telefone na minha orelha. Minha mãe
atende no terceiro toque.
“Residência dos Dawson, alô.”
Meu coração cai para meu estômago. Meu queixo se aperta,
mas eu não consigo fazer qualquer som sair.
“Alô?”
“Eu…”
“Olá, posso ajudar você?”
Ela vai desligar!
“Ei mãe. Sou eu. Kacey. “
“Cassandra.”
Odeio esse nome e não o tenho usado durante anos, mas
envolto em torno dessas três sílabas, ouço o alívio na voz de
minha mãe. Posso reconhecer.
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“Sim, oi!” Eu digo incrivelmente, muito alto. “Como uh...
Como estão vocês?”
“Estamos bem”, ela diz. Sua voz fica abafada agora, como
se ela não quer ser ouvida. “De onde você está ligando?”
“Las Vegas” digo. “Porque estamos em turnê. Eu e minha
banda? Viagem rápida? É um show lotado hoje à noite, a segunda
noite seguida. Na verdade, a maioria dos shows da nossa turnê já
estão esgotados. É demais. Estamos em um grande momento.”
“Estou muito feliz por você, Cassandra.”
Ouço a voz do meu pai por trás das palavras de minha
mãe, transformando-a em um robô de merda, jorrando falas que
ela tinha sido forçada a memorizar.
“E o nosso mais recente lançamento? ‘Talk me down’?
Bem...” Mordo o lábio. “É o número seis na Billboard Hot 100. E
eu... bem, eu componho, mãe. Quero dizer, é minha música e eu
a escrevi, mas as palavras... são principalmente minhas. E a
música ‘Wanderlust’? Eu escrevi também. É número doze nas
paradas.”
Nada.
Engulo em seco. “Como está o pai?”
“Ele está bem” responde minha mãe, com a voz quase como
um sussurro agora.
“É... ele está aí?”
Minha mãe suspira, uma pequena exalação. “Cassie... Você
está se cuidando? Você está tomando cuidado?”
“Estou cuidando de mim, mãe” digo. “E eu sou um sucesso.
Esta banda... somos um sucesso.”
Deus, odeio isso. O tom patético da minha voz, a se gabar
das realizações da banda, implorando que minha mãe se sinta
feliz pelo nosso sucesso quando eu quase não sinto qualquer
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coisa eu mesma, exceto a necessidade de ser amada. É como uma
fome que nunca é saciada. A fome desesperada torcida e retorcida
em minhas entranhas, emaranhada em nós vorazes que eu não
posso desfazer.
Eu nunca consigo acabar com esse apetite terrível. Só se
me afogar em álcool por um tempo e tentar vomitar no dia
seguinte.
“Mamãe? Por favor, diga para o Pai...”
“Cassie, eu tenho que ir.”
“Espere, você pode colocá-lo na linha? Ou apenas... pode
dizer a ele que você está no telefone comigo agora? Basta fazer
isso, mãe. Veja o que ele diz.”
Silêncio. “Eu não acho que é uma boa ideia”, ela diz
finalmente. “Ele tem estado... alegre recentemente. Não há
surpresas. Eu não quero perturbá-lo.”
“Ele ainda está com raiva de mim?” Pergunto, com minha
voz vacilante. “Foi há quatro anos, mãe. Eu nem estou mais com
Chett.”
Chett me abandonou em Las Vegas há quatro anos,
deixando-me de coração partido, desolada e cambaleando. Uma
temporada country, um contrato de gravação, inúmeros
encontros de uma noite e duas novas tatuagens depois e lá estou
eu, uma garota rebelde novamente, implorando perdão a seus
pais.
Luto contra as lágrimas. “Eu te contei, mãe. Mas você disse
a ele? Alguma vez você disse ao Pai que eu estava sem casa e
dormindo na rua quando ele me expulsou? Sem teto, mãe. Eu
tinha dezessete anos de idade.”
Ouvi-a engolir em seco. Forçando para baixo as lágrimas e
as emoções e tudo o que ela queria dizer, mas nunca faria. Ela
não tinha dito nada sobre mim a meu pai além de que eu ainda
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estava viva, que ela tinha ouvido falar de mim e eu estava indo
bem. Ela manteve-se no script, não importa quantas vezes
implorei a ela para experimentar algo diferente.
“Você deveria ter pensado melhor antes de trazer aquele
menino para casa”, minha mãe diz, reunindo um pouco de
firmeza. “Você sabia que iria perturbar o seu pai.”
“Tudo o que eu fazia o perturbava”, grito, minha voz
aumentando o volume. “Nada é bom o suficiente. Sim, eu sabia
que levar Chett para casa era uma má ideia, porra, mas eu queria
ser pega. Sabe por que, mãe? Para forçar papai a falar comigo. E
como isso é triste? Sua própria filha. Sua própria filha.”
“Cassandra, eu tenho que ir agora. Vou dizer ao seu pai
que tive notícias suas, e...”
“Que eu estou bem?” Eu termino. “Mais do que bem, mãe”,
eu rebato, e limpo o nariz na parte de trás da minha mão. “Nós
somos uma sensação, porra. Estamos prestes a ter os sucessos...”
“Você sabe que eu não ligo para toda essa linguagem chula,
Cassandra”, ela diz. Agora sua voz está se transformando em
pedra, isolando-me. Mas não posso parar.
“Você diz ao pai ok? Diga-lhe que eu fiz isso, e que eu fiz
isso sem a sua porra de ajuda ou aprovação ou... ou o seu
maldito teto sobre minha cabeça.”
“Eu vou desligar agora, Cassandra.”
Respiro fundo, instantaneamente lamentando cada palavra.
Eu precisava ouvir mais de sua voz. “Mãe, espera. Eu sinto
muito. Eu sinto muito…”
A linha fica muda e penso que ela desligou até que a ouço
respirar instavelmente.
Eu facilito a minha própria respiração e fecho os olhos. “Eu
sinto muito. Diga ao papai...” Eu engulo as lágrimas. “Diga a ele
que o amo. Ok? Por favor?”
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“Eu direi”, ela responde, embora eu não acredite nisso.
Nem por um segundo.
“Obrigada, mãe. E eu te amo também. Como está...?”
“Eu tenho que sair agora. Cuide-se.”
A linha enfim fica definitivamente muda.
Olho para o meu telefone alguns momentos mais. Uma
lágrima derrama em meu rosto e a limpo com o polegar. Eu penso
sobre pressionar o botão de ligar novamente. Eu poderia ligar
para ela novamente e dizer que sinto muito pelos palavrões. Ou
eu posso ligar de volta e dizer que não estou nem ligando para
eles afinal. Eu nunca irei ligar novamente. Estou tão de saco
cheio deles tanto quanto eles estão de saco cheio de mim.
Eles estão de saco cheio de mim?
O pensamento faz meu coração doer. Não, ainda não.
Minha mãe, não. Ela precisa de meus telefonemas. Eu sei. Mas se
nunca ligasse, ela não iria me ligar. Eu também sei disso. Ela
ainda é uma espectadora na vida da sua própria filha.
Caio contra a parede de concreto. Eu posso ouvir a
multidão do outro lado gritando inquieta. Soa como uma
tempestade se aproximando. Se não subir ao palco em breve...
Eu preciso de um cigarro.
Puxo um maço amassado de cigarros da parte superior da
bota de cano longo, e acendo com uma caixa de fósforos dobrado
no celofane.
Eu trago fundo, solto e caio mais baixo contra a parede,
sob o peso de todas as lágrimas que não chorei ao longo dos
últimos quatro anos. Elas ameaçam explodir agora na minha
própria tempestade. Luto para colocar tudo de volta, inalando, me
envolvendo no cigarro e pressiono meu abdômen, onde pareço ter
um peso de chumbo.
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Meu pai não vai falar comigo mesmo.
Exalo o pensamento e recuo. E daí? Quem se importa com o
que ele pensa? Ele nunca deu a mínima em vinte e dois anos, por
que começaria agora? Foda-se ele.
Um discurso cheio de atitude, só que eu teria dado
qualquer coisa para ouvir a voz do meu pai, e não ter que sentir
sua decepção ou raiva. Para ouvi-lo dizer que sente minha falta
ou que me ama. Dizer que eu poderia voltar para casa qualquer
momento que quisesse e a porta estaria aberta...
Mas ele fechou e trancou a porta, talvez para sempre, e a
base sobre a qual construí minha confiança está desmoronando
ao pó.
A multidão grita do outro lado do muro. Eles estão pedindo
por nós. Por mim. Eles me amam.
E, como Roxie Hart diria, eu os amo por me amar.
Tomo outro gole da minha vodca e me levanto, assim que
Jimmy Ray sai por uma porta no patamar acima do meu, olhando
freneticamente e procurando.
Nosso empresário tem quarenta e poucos anos e sofre com
queda de cabelo. Seu terno — sempre Armani, uma vez que uma
gravado de médio porte assinou conosco três meses atrás — está
pendurado um pouco solto sobre seu corpo magro. Seus olhos
selvagens pousam em mim e ele desmorona contra a parede em
alívio exagerado, com a mão sobre o coração.
“Jesus, gatinha, porque não me dar um infarto? O show
deveria ter começado meia hora atrás.”
Jogo fora o cigarro e amasso sob a sola da bota e coloco um
sorriso no meu rosto. “Desculpe, Jimmy. Eu tive um telefonema
importante. Mas estou pronta agora. Pronta para detonar.”
“Bom ouvir isso. Esta multidão vai nos comer vivos se não
chegarmos lá, logo.”
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Passo por ele, mas ele me para, com a mão no queixo,
estudando meu rosto.
“Você estava chorando?”
Eu respiro fundo. Jimmy Ray não é a figura paterna de
ninguém, mas ele tem sido bom para nós. Bom para mim. Sinto
que começo a murchar sob a sua bondade, querendo dizer a ele...
“É que a sua maquiagem está borrada”, ele diz. “Certifiquese
de ajeitar isso antes de ir, sim?”
Eu balanço a cabeça em silêncio.
“Boa menina.”
Ele bate na minha bunda levemente, para me fazer andar e
me segue para fora da escada, de volta para o salão verde, onde o
resto da banda está à espera.
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CAPÍTULO 2
kacey
Eles estão todos vestidos para um show completo: couro,
vinil e um monte de bijuterias grosseiras. Violet, nossa baixista,
usa seu cabelo castanho puxado apertado para um lado,
revelando a pequena tatuagem de corvo negro na pele à mostra de
seu couro cabeludo acima da orelha. Ela me dá um aceno de
cabeça e pisca para mim com o sinal de paz.
Lola, minha melhor amiga, está sentada numa cadeira,
girando suas baquetas habilmente em torno dos dedos. Ela se
levanta e caminha na minha direção, olha para o meu rosto
através do cabelo preto e azul elétrico. Seus olhos escuros são
afiados, atentos e cheios de preocupação.
“Você está bem? Onde você estava?”
Sou poupada da resposta por Jeannie, a nossa vocalista.
Ela estava fazendo seus aquecimentos vocais, mas para no meio
de uma escala.
“Que porra, Kacey?” Seus olhos, delineados com rímel Kohl
tão preto como as calças de couro apertadas, me encaram. Ela é
uma garota bonita, nossa líder destemida, ou seria se não fosse o
olhar perpétuo em seu rosto.
Eu sinto o peso da sala em mim, pesado e acusatório.
Cruzo os braços sobre o peito, e digo com a voz afetada que
lembra uma senhora mais velha do centro oeste. “Olá, Jeannie,
quem está incomodando você agora?”
Lola ri, e Violet abafa uma risada atrás de sua mão.
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“Quem está me incomodando? Você...” a confusão de
Jeannie suprime a irritação. “Espere, você está citando algum
filme estúpido para mim de novo?”
“Estúpido?” Fico boquiaberta dramaticamente. “Curtindo a
Vida Adoidado é nada menos que um clássico. Um tesouro
nacional...”
Jeannie bate uma mão, suas pulseiras tilintam. “Tanto faz.
Se você dedicasse tanto tempo à banda como você faz para festas
e assiste filmes antigos...”
“Vamos, Jeannie”, diz Violet, com um suspiro. “Não vamos
começar qualquer merda antes do show. Ela está aqui. Estamos
moderadamente atrasadas. E daí?”
Lola concorda. “Apenas calouros iniciam uma apresentação
no horário. Ela está pronta para detonar, certo Kace?”
“Oh, parem de mimá-la, pelo amor de Deus”, Jeannie virase
para Lola, e em seguida Jimmy mergulha e a puxa de lado,
falando suavemente com ela em voz baixa.
Respiro e digo, “Mmm-mmm-mmm, mas que pequena idiota.”
Violet começa a rir, mas os olhos de Lola se voltam para
minha garrafa de Evian. Ela é um bafômetro humano, essa
garota. Rapidamente, jogo a garrafa no lixo antes que fique
sabendo do seu conteúdo e resolva dar mais um de seus sermões
em mim. A vodca já começou a fazer efeito de qualquer maneira,
me colocando um passo gigante para trás da realidade, como se
eu estivesse atrás de um painel de vidro.
“Não vamos brigar, senhoras”, Jimmy repreende, trazendo
Jeannie de volta para o centro da sala verde. “Três mil ingressos
pagos estão esperando.”
“Ele está certo”, disse Jeannie, e faz o que chamamos de
sua expressão de Líder: rígida e séria quando nos olha em volta.
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“Precisamos manter o foco e dar a eles o desempenho de nossas
vidas. Vamos formar o círculo.”
Formamos um círculo no centro da sala verde, de mãos
dadas, enquanto Jeannie murmura uma espécie de vaga
invocação. Violet é uma budista, Lola ateia, de modo que o grupo
de oração é mais sobre canalizar as nossas energias, ser gratas
por nossas oportunidades, e ter nós quatro em sintonia umas
com as outras para que possamos atuar com uma unidade e em
sintonia.
É isso que quero? Eu medito enquanto Jeannie faz umas
afirmações positivas. Suspeito que a resposta é não, mas cheguei
muito longe agora. Lola está contando comigo. Se não fosse por
ela, eu ainda estaria nas ruas. Ela me salvou, depois que Chett
me abandonou, e nós chegamos a este show juntas. Ela precisa
que eu não ferre com isso, e eu preciso não ser uma babaca.
“Esqueça qualquer outro show”, Jeannie está dizendo, suas
declarações finais típicas. “Esqueça que estivemos na estrada por
meses. Estes fãs merecem o nosso melhor, então até lá e tocar
como se fosse o nosso melhor show. Sangue, suor e lágrimas,
senhoras.”
Fazemos barulhos de acordo para ficar empolgadas, em
seguida, ficamos atentas.
Lola me puxa de lado. “Você está bem? Sério?”
“Claro, estou bem. Totalmente.”
“Onde você estava?”
“Oh, eu... liguei para meus pais.”
Os ombros de Lola caem e ela cobre os olhos com uma
mão. “Oh merda, não. Não, não, não. Eu continuo te dizendo para
desistir. Eles sempre te chateiam, Kace. Toda vez. Você fica toda
chateada, então fica ainda mais destruída do que o habitual.”
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“Não, não, foi ótimo!” Digo. “Eu só falei com minha mãe,
mas... Bem, meu pai disse oi. Ouvi no fundo. É um começo,
certo?”
É assim que você faz? Mentir para sua melhor amiga depois
de tudo que ela fez por você?
Lola parece chocada. “Sério? Ele falou com você?”
“Ele disse oi, Lola. Ele realmente disse.”
Lola me estuda com os olhos estreitos e, finalmente cede.
“Isso é ótimo, Kace”, diz ela, abraçando-me. “Estou
realmente feliz por você. Para ser honesta, eu estive preocupada
ultimamente. Você faz festa todos os dias da semana e tem um
cara diferente em sua cama todas as noites.”
“Nem toda noite”, digo. “Eu tenho meus períodos de seca.
Como nas terças-feiras.”
Lola bufa.
“Vamos, meninas”, Jimmy reaparece na porta. “Eles estão
esperando.”
Dou um sorriso tranquilizador a Lola. “Nós vamos detonar
neste show hoje à noite. Eu prometo.”
“Eu gostaria que você prometesse que não vai comemorar
muito depois. Talvez você seria capaz de se lembrar de como o
show foi maravilhoso.”
Finjo ficar afrontada. “Essa é a coisa menos rock and roll
que já ouvi na minha vida. Keith Richards rolaria no túmulo se
soubesse que você fala assim.”
Um sorriso se contrai nos lábios de Lola. “Keith Richards
não está morto.”
“Viu? Nada para se preocupar.”
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Ela revira os olhos e ri, jogando o braço em volta de mim.
Protetora, como sempre.
Hugo Williams, chefe de segurança do Pony Club, aparece
na porta da sala verde para nos levar para o palco. Seus olhos
escuros são quentes e gentis quando ele sorri para mim, os
dentes brancos e brilhantes contra a escuridão de sua pele.
“Oi, Hugo”, digo, ocasionalmente.
“Ei, doce”, ele diz em sua profunda voz de barítono.
Esta é apenas a nossa segunda noite no Pony Club, mas
Hugo parece ter consideração extra de mim, sai do seu caminho
para se certificar que estou segura.
Jimmy passa um braço sobre meus ombros nus. “Soa como
uma multidão agitada, esta noite, Hugo.”
Eu sorrio para o guarda-costas. “Hugo cuida de mim. Ele é
meu herói.”
O grande segurança balança a cabeça, como um soldado
recebendo uma ordem, e nos leva para o palco. Passamos pelos
corredores com tubulações que correm ao longo do teto. Nossos
passos ressoam e ecoam no cimento.
Jimmy vira-se para mim. “Você está pronta?”
“Nasci pronta, Jimmy.”
“Essa é minha garota.”
Me junto a minhas companheiras de banda em um
pequeno lance de escadas que leva para o palco. Um rugido vem
da multidão respondendo ao MC falando no microfone.
“Las Vegas! Vocês estão prontos para Rapid Confession?”
Outra onda de som, como uma avalanche rasgando as
paredes do local.
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A porta se abre, um retângulo escuro brilhando com as
luzes do palco. Nós subimos o pequeno lance de escadas, indo
para o palco. Minha guitarra Fender vermelha está esperando por
mim em um carrinho. Coloco as alças por cima do ombro e vejo
Jeannie fazer um aceno e um sorriso para mim, um acordo de
paz. Concordo e sorrio de volta, aceitando.
Lola bate suas baquetas sobre a cabeça em uma contagem
para iniciar “Talk Me Down”.
Toco com todo meu maldito coração. Escrevi ‘Talk Me
Down’ para mim. É um hino de tudo o que me assusta sobre
onde eu estava indo e que eu estava fazendo comigo. Ninguém
sabe que é minha. Eu canto no backvocal para dar melodia a
Jeannie. Mas quando eu toco, meu coração salta. A música abre
meu peito, esfola minhas costelas e mostra ao mundo tudo que
está lá dentro.
Eu arraso nos meus solos. Toda a vodca que bebi com o
estômago vazio está transformando as luzes do palco em
manchas borradas de branco. Os rostos na multidão fundidos em
conjunto, tornando-se um rugido, agitando, a massa elétrica. Eu
me alimento da energia, sugando sua aprovação gritando e
cuspindo-o de volta com cada acorde e progressão até que meus
dedos sangram e no final do show, quase quebro minha guitarra
no palco.
Quando as últimas notas da última canção vibram no ar e,
em seguida, desaparecem, a multidão perde a lucidez. Estou
iluminada como o Quatro de Julho, correndo ao longo da borda
do palco, batendo nas mãos do público na primeira fileira. Eles
agarram e alguém me puxa sobre a borda. Eu rio e rio, surfando
em uma onda de mãos me adorando, bêbada como o inferno e
carente de ser amada.
O time de Hugo e sua equipe rola no meio da multidão, me
arrastando para baixo, e me tiram de lá. Mas não quero que isso
acabe. Olho para a multidão em volta de mim.
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E m m a S c o t t
“Eu amo muito todos vocês! Voltem comigo...” Eu aponto
para estranhos aleatórios. “Venha comigo! Vamos continuar a
festa...”
Hugo me arrasta para a sala verde, onde a banda está
comemorando. Champanhe jogado pelo ar em manchas amarelas
e espumosas. Pego uma garrafa da mão de alguém e bebo metade
dela em um minuto. Eu grito para a segurança deixar entrar a
pequena multidão que convidei.
“Eles estão comigo!” Eu digo.
Cerca de duas dezenas entram. Minhas companheiras de
banda estão todas muito embriagadas com o sucesso inebriante
do show para notar. Jimmy parece que vai sair voando em linha
reta fora da terra.
Jogando o champanhe de lado, pego uma garrafa de forma
aleatória na longa mesa de bebida e comida pós-show. Garrafa de
bebida alemã Jagermeister.
Escolha ousada, penso com uma risada, e solto um grito
estridente, depois o licor queima seu caminho na minha
garganta. A sala, repleta de meus novos amigos, aplaude de volta.
Rostos estranhos que não reconheço, de quem nunca terei que
me lembrar de manhã. As pessoas estão aqui pela música, bebida
de graça e entretenimento e eu, sou sua patrocinadora de
diversão. Subo em uma mesa, e eles aplaudem e levantam as
garrafas para mim.
Eles me amam.
A sala começa a girar como se eu estivesse em um
carrossel. Está muito lotado aqui. Sem ar. O segurança está
tentando se espremer através da parede de corpos. Vidro
quebrado. Alguns na multidão aplaude, enquanto outros
amaldiçoam.
Lola grita para eu descer antes que machuque minha
bunda, depois a perco na multidão. A figura enorme, desmedida
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de Hugo partindo o mar como Moisés. Tento levantar a garrafa
verde esmeralda para os meus lábios para um gole final, mas não
consigo. Imagino-a se partindo, explodindo e a vejo se quebrando
em milhões de pedaços.
Palavras do meu pai, há quatro anos, ressoam na minha
cabeça com tanta clareza como se fosse ontem. Saia! Saia da
minha casa!
“Não”, digo, depois mais alto, com os olhos turvos, minha
boca grossa e desajeitada em torno das palavras. “Você sai. Esta é
a minha casa. Minha casa.”
Levanto a garrafa no ar. “Esta é minha casa!” Grito e uma
centena de milhões de vozes levantam suas próprias garrafas e
me aplaudem até que o som rasga dentro de mim como o vento
através de papel de seda.
Eu rio ou talvez grito, em seguida, cambaleio para o lado. A
garrafa de bebida escorrega dos meus dedos assim como eu
escorrego da mesa, direto para os braços de Hugo. Eu vejo a
escuridão de sua camisa, em seguida, a escuridão atrás dos meus
olhos me engole inteira.
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CAPÍTULO 3
jonah
O letreiro acima de mim pisca e pisca. Vermelho e branco.
Pony Club. As bordas de metal estão enferrujadas e três das
lâmpadas que alinham a borda estão queimadas. Parece barato.
Gosto muito de Vegas. Mas quando reflito...
As luzes piscam e posso imaginar os pisca-pisca de vidro
branco e vermelho. Miçangas de vidro, talvez. Um monte delas
presas com um fio para fazer um buquê. Minha mente imagina as
miçangas vermelhas alongadas, formando pétalas achatadas. Um
copo-de-leite com folhas secas brancas. Uma árvore de Natal de
vidro que nunca precisa se regar. Minha mãe gostaria disso. Ou
talvez Dena. Começo a puxar o pequeno bloco de notas amassado
que coloquei no bolso da frente da minha camisa para anotar a
ideia surgindo, depois paro.
Natal foi há seis meses atrás.
Uma dor suave tenta criar raízes, e a esmago com facilidade
praticada, como um pedaço de chiclete grudado debaixo de uma
mesa.
Mantenha a rotina.
Dobro minha mão e coloco o bloco de notas onde estava.
Está ficando cheio no Pony Club. O show supostamente
terminou uma hora atrás, mas os gritos de uma festa agitada
soam alto e claro — e abafado — pelo cimento da parede na parte
de trás do local.
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E m m a S c o t t
Puxo o celular do bolso da frente das minhas calças para
verificar a hora. É quase uma da manhã. A limusine foi
contratada só para as duas, mas já posso dizer que essa será
uma noite de horas extras adicionadas.
Mas o que me importa se o trabalho vai até tarde? Eu não
durmo muito estes dias e posso aproveitar o dinheiro. Ficarei até
que a banda e seu empresário cheguem, bêbados e fedidos, e vou
leva-los de volta para a mega mansão em Summerlin onde eu os
busquei às cinco naquela tarde.
A vantagem de dirigir à noite é que me deixa com tempo
para trabalhar durante o dia. A desvantagem é o tempo de
inatividade. Tantas horas vazias gastas esperando ser pago após
um jantar ou um show, ou para, finalmente, sair do cassino,
fedendo a bebida e fumo e — na maior parte das vezes — ouvindo
lamentações de perdas nas mesas de Black Jack ou pôquer.
Motoristas de limusines tendem a se unir em eventos,
alinhados fora do local em um comboio de veículos elegantes
pretos ou brancos. Vejo as mesmas caras em diferentes postos de
trabalho, e alguns são meus colegas na A-1 Limusine. Mas tenho
que evitar o fumo, e não estou interessado em fazer novos
amigos. Eu prefiro ficar sozinho, na minha rotina.
Debruçado contra a limusine, olho para cima. Nenhuma
estrela é capaz de superar as luzes de Las Vegas. Eu teria que
esperar até a viagem do meu melhor amigo, ao acampamento
Great Basin, em algumas semanas para ver estrelas reais. Mas a
avenida principal é o seu próprio tipo de constelação. Uma
profusão de cores neon fluorescente e luzes brilhantes. É bonito à
sua própria maneira, contanto que você não olhe para baixo.
Aos meus pés, bitucas de cigarro estão passando pela
sarjeta entre a rua e a calçada, também há um copo de
refrigerante Dairy Queen destruído e um panfleto de uma
apresentação de Strip. Cacos de vidro verde brilham embaixo de
um poste.
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E m m a S c o t t
Um dos motoristas de limusine se aproxima de mim. “Tem
um cigarro?”
Esse cara é jovem. Mais jovem do que os meus vinte e seis
anos, de qualquer maneira. O suor escorre na testa quando ele
olha para mim esperançosamente. Mesmo nesse calor de verão,
ele ainda usa o uniforme, um paletó marrom de poliéster com
botões dourado. Novato. Meu paletó preto está no banco da frente
e está lá desde que a banda e o empresário saíram da minha
limusine há quase oito horas atrás.
“Eu não fumo, cara”, digo a ele. “Desculpa.”
A desculpa é um código para finalizar uma conversa, mas
esse cara não percebeu.
“Merda, eu fiquei sem nenhum uma hora atrás”, ele
murmura. Seu crachá está escrito Trevor. “Ei, é motorista de
quem? Eu tenho um bando de doce riquinhas de dezesseis anos
assistindo ao show da Rapid Confession.” Ele dá uma gargalhada.
“Meninas ricas e mimadas. Quer dizer, o que é pior do que isso?”
“Eu nem posso imaginar”, eu murmuro.
Meu telefone vibra com uma mensagem de texto.
Provavelmente meu irmão Theo, com a checagem de cada hora.
Puxo o telefone do bolso da calça. Sim.
E aí? Tudo bem?
Revirando os olhos, tiro um print da tela mostrando a
checagem da meia-noite: exatamente a mesma mensagem da
minha resposta dizendo que eu estava bem. Pressiono ‘enviar’.
Ele manda uma mensagem de volta. Idiota.
Sorrio, digitando. Você faz parecer tão fácil. Vá dormir,
Teddy. Ligarei de manhã.
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“Eu gostaria de saber quem vai levar a banda”, Trevor diz,
olhando para as limusines. “Se eu levasse essas cadelas, seria
épico. Noite feita.”
Outra mensagem com foto chega, uma com o dedo do meio
de Theo. Ele odeia quando o chamo de Teddy. Quase tanto
quanto eu odeio quando caras chamam as mulheres de cadelas.
Eu me viro para dizer a Trevor para dar o fora quando a
porta traseira do Pony Club se abre e ouço som de gargalhadas,
gritos e vidro se quebrando na rua. Um enorme guarda-costas
corre carregando o corpo inerte de uma mulher, sua saia de
couro subiu até as coxas e sua cabeça está de lado conforme seu
cabelo loiro cai sobre o braço do guarda-costas.
Dou a Trevor um pequeno empurrão para fora do caminho
e abro a porta do passageiro da limusine. O guarda-costas não
para, mas se inclina muito para colocar a menina lá dentro, no
assento de couro perto da porta.
Trevor suspira. “É ela! A loira... A guitarrista do RC.” Ele
olha para mim como se eu fosse seu herói. “Você que vai leválas?”
O guarda-costas ressurge da limusine e se eleva sobre
Trevor, cerrando os punhos. “É da sua conta?”
Trevor se encolhe e recua. “N-não, senhor.”
“Você vai dizer a alguém o que viu aqui?”
“Não. Com certeza, não.”
“Boa resposta.” Ele se vira para mim. “Leve a garota para
casa. Rápido. Antes que os paparazzi apareçam. Está um tumulto
da porra lá dentro.” Ele vira sua cabeça em direção ao local onde
os gritos estão mais altos, com muitos palavrões gritados e vidro
se quebrando. “Eu tenho que voltar.” Ele aponta um dedo no meu
peito. “Tenha certeza que ela chegue em casa com segurança.”
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Vejo a preocupação nos olhos escuros do cara que estão me
encarando, depois ele está correndo de volta para o local. Sirenes
soam a distância, e aproximando.
Com o enorme guarda-costas longe, Trevor se aproxima,
olhando para dentro da limusine. “Cara. Mano, ela é fodidamente
sexy.”
Tenho que concordar com a avaliação de Trevor, mas ela
também está desmaiada de bêbada. Mulheres precisam estar
coerentes e conscientes para que eu possa me divertir mesmo
com rápidos pensamentos sexuais. A língua de Trevor fica
pendurada para fora da boca, e bato a porta, enojado, tirando sua
visão dela.
“O que você vai fazer com ela?” Trevor pergunta.
Paro na porta do lado do motorista para olhá-lo. “Vou levála
para casa, imbecil.”
Trevor levanta as mãos. “Caramba, calma. Eu não quis
dizer...”
Não ouço o resto, pois já entro no carro e fecho a porta.
Trevor não irá manter a promessa que fez para o guardacostas
sobre a garota no banco de trás. Sem chance. E as notícias
de tudo o que aconteceu no Pony Club vão se espalhar nas ruas
de qualquer maneira.
Basta levá-la para casa, terminar o trabalho, manter a sua
rotina.
Levo a limusine para longe do meio-fio. Fico preso no
trânsito na avenida principal e baixo a divisória para verificar a
menina. Sua saia ainda está puxada para cima, mostrando uma
meia calça arrastão e parte de uma tatuagem. Mais tatuagens se
espalham pela pele pálida de seus antebraços, e uma maior cobre
o ombro direito. Os topos arredondados de seus seios estão meio
pressionados para fora do corpete — ou coisa que ela está
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usando. Mas estou procurando se o peito está se movendo, para
verificar se ela está respirando.
Eu me pergunto se deveria virar à direita em direção ao
Hospital Sunrise quando a menina dá um gemido e rola para o
lado. Vejo as ruas a minha frente enquanto ouço um barulho que
soa como o um barril de bebida sendo despejado no chão da
limusine. O cheiro de álcool regurgitado preenche o espaço
confinado.
“Maravilha”, murmuro. “É por isso que me pagam um bom
dinheiro.”
Quando ela acaba de vomitar, a menina — a guitarrista, de
acordo com Trevor — cai de volta no assento, gemendo baixinho,
com os olhos ainda fechados, seu cabelo loiro claro grudado à
bochecha.
Viro para fora da avenida principal, encontrando uma rua
escura e vazia, e estaciono. Subo na parte de trás onde minha
passageira está esparramada no assento, piso em torno da
bagunça no chão para sentar-me perto de sua cabeça para tirar o
cabelo do seu rosto.
Odeio concordar com Trevor sobre qualquer coisa, mas
essa mulher é linda. Mesmo desmaiada, bêbada e cheirando a
álcool, vômito, e fumaça de cigarro, ela é impressionante. Olhos
grandes, com longos cílios escuros, ampla boca com lábios
carnudos pintados de um vermelho profundo, e escuras
sobrancelhas, que contrastam com seu cabelo loiro claro.
Lembro que estou aqui para me certificar de que ela não vai
morrer, não para perder tempo admirando-a. Eu tive um monte
de mulheres bonitas em minha limusine ao longo dos últimos
meses. Várias meninas bonitas e bêbadas. Esta não é diferente.
Esta garota — eu gostaria de ter perguntado seu nome para
o guarda costas — está respirando melhor e um pouco de cor está
retornando ao seu rosto. Vomitar uma garrafa de bebida alcoólica
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provavelmente ajudou. Ciente de que ela não precisa de um
hospital, embora não inveje a ressaca épica que terá ao acordar,
me concentro em chegar à sua casa para que eu possa encerrar a
noite.
Dirijo para noroeste, para o bairro de Summerlin. A
mansão é de uma cor pêssego claro com colunas brancas e passo
pela rotatória, está totalmente escuro.
“Merda.”
Saio da limusine e toco a campainha da frente, esperando
que o assistente pessoal de alguém ou talvez outro segurança
esteja por perto. Nada. Tento a porta da frente na sorte, vai que
tenha sido deixada destrancada. Não está.
Volto para a limusine e tiro meu celular do bolso, e ligo
para a central da A-1. Tony Politino está trabalhando nas linhas.
“Tony? É Jonah. Preciso do número de contato para o
trabalho da Rapid Confession.”
“Você ficou com esse trabalho?” Tony solta um assovio.
“Sortudo.”
“Não tanta sorte como a equipe de limpeza”, murmuro.
“Você tem o número ou não?”
“Espere aí…”
Esfrego os olhos e espero até que Tony volte.
“Jimmy Ray. Ele é o empresário”, ele diz. Ele fala um
número de telefone. “E ei, tente conseguir algumas fotos para
mim, certo? A loira? Ela é muito gostosa.”
Olho para a menina caída no banco de trás. Um
pensamento traiçoeiro penetra. Eu poderia tirar algumas fotos
dela, vendê-las a uma revista de fofocas e fazer uma fortuna. Eu
perderia meu emprego, é claro, mas com o dinheiro das fotos, não
precisaria mais dele. Eu poderia passar o dia todo, todos os dias
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no Hot shop 1 e nunca precisaria me preocupar se a minha obra
estaria terminada a tempo para a exposição da galeria em
outubro.
É uma bela fantasia, exceto pelo pequeno fato de que eu
nunca me perdoaria por ser um canalha, tão baixo. Só de saber
que eu tive a ideia já é repulsivo. Eu vou jogar a culpa dessa ideia
boba no cansaço, juntamente com a pesada pontada de medo que
se esconde por trás de cada pensamento desperto, pronta para
escapar se eu vacilar. O medo que me diz que estou correndo
contra o tempo e a obra será deixada para sempre inacabada.
“Mantenha-se à rotina”, eu murmuro.
“O que é isso, mano?” Tony pergunta.
“Nada, obrigado pelo número.”
Desligo com Tony e ligo para o Jimmy Ray, o empresário da
banda. Lembro-me dele, ele foi preso como um vendedor de
carros usados chamativo na minha memória. Um cara magro, de
meia-idade que se veste e age como se fosse uma década mais
jovem, tentando ser esperto. Ele fala com as mulheres na banda
como se fossem o seu ticket refeição, em vez de seres humanos.
Jimmy Ray atende o telefone na quinta chamada, mas falar
está impossível. A música alta explode atrás dele, e os sons
caóticos de uma centena de vozes gritando e gritando quase o
abafa.
“Alô, o quê? O quê?”
“Sr. Ray”, tenho de gritar. “Eu sou o seu motorista.”
“O quê? Eu não posso ouvir uma coisa do caralho.”
“Eu sou de A-1 Limusine...”
“Que diabos é isso?”
1 Fabrica de vidro, que faz esculturas e outros objetos decorativos com vidro colorido.
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Esfrego meus olhos. “Elvis. Elvis Presley. Os rumores sobre
minha morte foram muito exagerados...”
“Olha, seja quem for, tenho uma catástrofe de merda em
minhas mãos. Ligue-me de volta.”
Mais gritos e, em seguida, tudo volta a ficar abafado. O
cara provavelmente colocou o telefone no bolso sem desligar.
Termino a chamada e verifico que horas são. Pouco mais de
duas horas. Na rua escura, sem luzes na minha frente, ninguém
chega em casa. Olho para dentro, para a menina sem nome.
“O que farei com você?”
O desejo de levá-la de volta para o Pony Club e entregá-la
de volta para o guarda-costas é forte, mas o pobre coitado
provavelmente está muito ocupado.
Fecho a porta do passageiro da limusine e volto ao volante.
Esta cena inteira parece decadente e errada. Eu queria levá-la a
algum lugar seguro e ao mesmo tempo leva-la para o meu
apartamento não é exatamente o ideal, mas é melhor do que vê-la
espalhada e bêbada na parte de trás de uma limusine salpicada
de vômito.
“Eu espero que você perceba que isso é altamente
irregular”, eu digo a ela quando dirijo para fora das propriedades
Summerlin. “Não está nem perto do manual do funcionário. Na
verdade, eu me lembro de assistir a um vídeo educativo sobre
esse tipo de coisa, como não ser processado até a extinção. O
primeiro passo: não leve seus passageiros para casa com você,
especialmente se estão bêbados e são mulheres.”
Às duas da manhã, Vegas mostra o seu lado sombrio. As
ruas estão cheias com os mais desesperados: jogadores na
esperança de recuperar algumas das suas perdas, bêbados sem
esperança, traficantes de drogas e prostitutas. Esta é a Vegas que
odeio, mas enquanto atravesso a Strip, indo para o leste, passo
pelo Bellagio. Meu sorriso volta. Há verdadeira beleza em Las
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Vegas. Você só tem que saber para onde olhar. O teto do átrio do
Bellagio é um lugar. Meu retrovisor é outro.
A menina desmaiada no assento longo joga um braço
tatuado sobre os olhos e solta um pequeno gemido. “Estamos
quase lá”, digo a ela suavemente. “Você vai ficar bem.”
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CAPÍTULO 4
jonah
Dirijo a limusine para o meu apartamento. Moro em um
prédio caixa de cimento, com reboco cinza claro e grades tortas
com tinta verde limão descascada.
“Eu sei que não é a mansão de luxo que você está
acostumada”, digo a ela, “mas mendigos não podem escolher,
estou certo?”
A garota, ainda no fundo de seu sono regado a álcool, não
está em condição de escolher qualquer coisa.
Estaciono a limusine no lado do prédio, perto do meu
apartamento no primeiro andar, que eu posso pagar. Estacionado
ilegalmente, mas escondido da rua.
Corro até a minha porta da frente, destranco, abro e
acendo a luz perto da porta. De volta à limusine, entro e sento ao
lado da garota.
“Ei”, digo, cutucando seu braço gentilmente. “Ei. você pode
acordar para mim?”
Ela não se mexe.
“Merda.” Solto um suspiro. “Tudo bem, aqui vamos nós.”
Ela é uma coisa pequena, talvez um metro e cinquenta e
cinco e não parece pesar mais que uma nota de dez dólares, mas
o álcool a transformou em peso morto. Seus membros estão
moles e sua cabeça está pendurada. Eu me esforço para tirá-la da
limusine maldita, sem bater sua cabeça na porta. Esperava que
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eu pudesse meio que carregar, meio que guia-la para dentro, mas
ela é como geleia, escorregando para fora dos meus braços.
Respiro fundo e a levanto pelos seus joelhos e costas,
embalando-a, de modo que sua cabeça descansa contra o meu
peito.
Dr. Morrison teria um acesso de raiva se me visse levantar
um ser humano inteiro. Theo perderia a merda do controle. Mas
nenhum deles está aqui agora. Outra vantagem sobre o turno da
noite: além de uma ou dez mensagens do Theo, estou livre do
escrutínio que só me faz lembrar da minha situação quando tudo
o que quero é coloca-la de lado e manter meu cronograma.
Carrego a menina pela porta aberta do meu apartamento, e
chuto a porta atrás de mim com o calcanhar. Coloco-a no sofá e
sento ao lado dela para recuperar o fôlego. Estou sem fôlego, mas
não é ruim. Algumas respirações profundas e estou de volta à
ativa.
“Isso não foi tão difícil, agora, foi?”
Os lábios da moça se separam e ela está respirando
facilmente, um brilho fino de suor cobre sua testa e o peito. Eu
não consigo imaginar que ela esteja muito confortável nessas
botas e corpete. Não que eu vá fazer algo sobre isso. Já é ruim o
suficiente que a tenha em meu apartamento. Só remover suas
botas já pode adicionar combustível para qualquer pesadelo de
relações públicas que estará me esperando amanhã. Eu me
pergunto se posso perder meu emprego por isso. Por ela.
Agora que está segura, poupo um pensamento para a
minha situação. Preciso do meu trabalho. Tenho uma rotina
perfeita funcionando e não posso deixar uma maldita coisa
estragar. Era para eu voltar para o Pony Club e pegar a banda
como fui contratado para fazer, mas e depois? Trazê-los todos de
volta aqui para recolher sua guitarrista? Em primeiro lugar, é
uma boa ideia deixá-la sozinha?
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Olho para a garota. A mulher é nova. Imagino que talvez
vinte e dois. Ela está fria, mas seu belo rosto está em paz, as
sobrancelhas relaxadas pela primeira vez durante toda a noite.
Suspiro. Está tarde. Deixe-a dormir.
Ligo para A-1 novamente e digo ao Tony que fiz o trecho e
retornarei para a garagem às sete horas, Tony me avisa que o
nosso patrão, Harry, perderá a cabeça ao saber que um de seus
carros não está na garagem. Sem contar que deixei a banda
esperando no Pony Club.
“Por outro lado, Harry te ama”, Tony diz. “Você é o
motorista favorito dele.”
Isso é verdade, pois foi por isso que me foi confiada a tarefa
de levar e buscar a Rapid Confession, em primeiro lugar. Mesmo
assim, estou tomando um risco enorme fodendo com meu
trabalho e é um trabalho que preciso desesperadamente.
Com um gemido frustrado, jogo o telefone no mesmo velho
lugar em uma mesa de café em frente ao sofá. Ele bate contra ela
soltando um de três pedaços de vidro arranhando a superfície da
mesa, de madeira.
No armário do corredor pego uma almofada e coloco para a
minha hóspede, em seguida, coloco um copo de água e duas
aspirinas da minha mini farmácia pessoal na mesa ao lado dela.
Uma oferta de paz para a garota quando acordar e se perguntar
se foi sequestrada por um motorista maluco e psicopata.
A garota. Se eu a chamar assim mais uma vez, mesmo em
minha própria mente, vou enlouquecer.
Meu laptop está no balcão da cozinha que dá para a sala de
estar. Abro e digito Rapid Confession na barra de pesquisa do
Google. Um monte de fotos e artigos aparece, muitos são tão
recentes quanto ontem. A banda está prestes a ‘explodir no
cenário musical como um coquetel Molotov’ (de acordo com a
revista Spin) e ‘foi a melhor coisa que aconteceu para o rock and
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roll desde os Foo Fighters’ (segundo a revista Rolling Stone).
Pesquiso mais, até que encontro fotos promocionais atrevidas,
com os nomes de cada membro da banda.
“Kacey Dawson”, murmuro. “Aleluia.”
Olho para a foto promocional. Mesmo lançando um olhar
de ‘eu não dou a mínima’ na expressão de seu rosto, Kacey
Dawson é de tirar o fôlego.
“Se controla, Fletcher.”
Fecho o laptop e vou para o quarto. Na parede da cozinha,
o identificador de chamadas do telefone está piscando
insistentemente. Aperto no botão de reprodução.
“Você tem três novas mensagens.”
Eu deveria ter apenas ido direto para a cama.
“Ei, Jonah, sou eu, Mike Spence. Do Carnegie? Olha... eu sei
que você está passando por alguma merda grande agora, mas...
vamos sair, cara. Vamos tomar uma cerveja para relembrar os
velhos tempos. Ou, pelo menos, me ligue de volta e...”
Aperto ‘delete’ e pulo para a próxima mensagem.
“Olá, querido, é a mamãe. Apenas ligando para ver como
você está. Eu realmente odeio suas horas extras. Sei que pareço
como um disco quebrado, mas... bem, me ligue de manhã. E vamos
vê-lo no jantar de domingo, como de costume? Seu pai quer
churrasco. Me ligue, querido. Eu te amo. OK. Amo você. Tchau.”
Apago essa também, desejando que poder esquecer o tom
hesitante na voz de minha mãe. Parece que ela sempre está
esperando por más notícias.
A mensagem final é reproduzida, tendo chegado em apenas
alguns minutos atrás, talvez enquanto eu estava descarregando a
minha carga inconsciente da limusine. Eu sei que é de Theo antes
mesmo de ouvir sua voz.
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“Ei bro, apenas checando. Me ligue de volta. Até mais.”
Theo soou casual, mas a hora de sua chamada e as
mensagens anteriores o denunciaram. Irritado, ligo de volta.
Talvez Theo esteja trabalhando até tarde no Vegas Ink. Às vezes
ele tem clientes chegando a toda hora. Ou talvez ele tenha saído
na noite em um encontro — ele não mantém o controle com as
mulheres, elas vêm e vão em sua vida muito rapidamente.
Apago a mensagem, procuro meu celular para responder
apenas com uma mensagem. Pego na mesa de café, enquanto
Kacey Dawson dorme, alheia.
Theo: Ainda no trabalho?
Agora reviro os olhos, com muita irritação. Digito uma
mensagem de texto. Não, estou na rua, fumando um Marlboro
Reds como uma chaminé e comendo um bife cru.
Muito engraçado. Em casa???
Suspiro e contemplo o espaço em branco, meu polegar
coçando para digitar uma mensagem o mandando cair fora, sair
de cima de mim e me deixar em paz. Digito algumas palavras
nesse sentido, então apago, me afastando com um suspiro. Não
estou tão chateado assim. Não por fora, de qualquer maneira.
Não com ele ou meus pais. Toda a minha situação já é uma
merda o suficiente, sem precisar fazê-los se sentirem pior.
Sim, estou em casa agora, digito. Boa noite, Theo.
Vejo você na loja Domingo.
“Tenho certeza que sim”, murmuro.
Coloco o telefone no silencioso e deixo no balcão da cozinha
no caminho para o quarto. Lá, tiro meu uniforme de motorista de
limusine e coloco na cama, que está arrumada e, provavelmente,
um pouco empoeirada. Coloco um pijama branco confortável que
está na cômoda de madeira lisa, em seguida, vou ao banheiro do
corredor para urinar e escovar os dentes.
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Enquanto escovo, faço planos.
Levar Kacey de volta para a mansão Summerlin será a
primeira coisa que farei na parte da manhã.
Devolver a limusine para A-1 e buscar o meu carro.
Voltar para minha rotina.
Sem problemas. Um pequeno contratempo, é o que resume
essa noite.
Na sala de estar, Kacey Dawson parece estar dormindo
confortavelmente — ou tão confortável como se poderia estar em
um sofá de couro e vinil. Lembro-me de meus próprios dias de
faculdade, com ressaca e cheirando bebida da noite passada era
uma péssima combinação. Desligo o ar condicionado, e me
acomodo na poltrona reclinável em frente ao sofá.
Tenho que rir com a cena que a minha convidada vai ter ao
acordar no meio da noite: um pequeno apartamento em vez da
sua mega mansão, e um cara estranho dormindo em uma cadeira
a menos de cinco passos de distância, em vez de em uma cama
como uma pessoa normal.
“Stephen King deve tomar notas”, murmuro, ficando no
meio da poltrona deitado do jeito que meu médico recomendou.
“Isso fará você aprender a beber direito, Kacey Dawson”,
murmuro enquanto meus olhos se fecham. “Tudo com
moderação.”
Tal como o meu sono.
Acordo às seis, minha bunda dormente de tanto ficar na
mesma posição durante toda a noite. Não sou capaz de mudar de
posição sentado, mas nunca dormi muito de qualquer maneira, e
eu sempre acordo disposto e alerta. É como se meu corpo
soubesse que tempo já não é um luxo que eu posso desperdiçar.
Guio meus pensamentos em direção a algo positivo. Luz do
sol amarelo e brilhante — aparecendo pela janela da frente. As
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garrafas de vidro e pesos de papel refletem essa luz, e
pulverizando a mesa de centro em tons de vermelho manchado,
azuis e roxos.
“Lindo”, murmuro. E eu tenho o sábado inteiro à minha
frente na Hot Shop para poder criar mais.
A figura no sofá geme e suspira em seu sono, lembrandome
com uma pequena sacudida que tenho alguns negócios
inacabados para cuidar primeiro. Jogo o cobertor de lado e vou
para o sofá. Agachado ao lado da Kacey Dawson, a estudo
dormindo, aproveitando o momento.
“Ei.”
Ela não se mexe. Sua boca está levemente aberta. Morta
para o mundo.
“Estou indo tomar um banho”, digo a ela. “Não roube
nada.”
Penso em escrever um bilhete para dizer que ela não foi
sequestrada, mas, em seguida, imagino que provavelmente não é
a primeira vez que Kacey Dawson acorda sem saber onde está
depois de uma pesada noite de festas. Deixo como está e vou ao
chuveiro.
Ela ainda está desmaiada quando volto, vestido de jeans e
uma camisa lisa. Meu uniforme da Hot Shop. Precisamente às
sete da manhã tomo meus remédios, engulo um comprimido após
o outro. Quinze ao todo. Meu estômago se queixa imediatamente,
e começo preparar o shake de proteína igualmente ruim que bebo
todas as manhãs.
“Desculpe, Kacey, isso vai doer”, murmuro e aperto o botão
no meu liquidificador, enchendo meu pequeno apartamento com
um zumbido horrível.
A Kacey Dawson de ressaca massiva se agita, geme, e,
finalmente, senta, empurrando seu cabelo bagunçado fora dos
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olhos. Ela olha ao redor com os olhos turvos, não me vendo na
cozinha atrás dela, olhando para ela.
Eu não sei — eu não poderia saber — mas, nesse
momento, o resto da minha vida, ou o que resta dela, começou.
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CAPÍTULO 5
kacey
Alguém está cortando uma árvore. Foda-se, toda uma
floresta.
Que tipo de bastardo doente...?
Ergo a cabeça, piscando com força. O zumbido para e meu
olhar nebuloso é atraído para a mesa de centro e sua variedade
de pesos de papel de vidro coloridos. Eles são muito bons —
bonitos mesmo — mas o meu apreço se perde quando eles
refletem a luz do sol direto nos meus olhos.
Olhando em outra direção, vejo um copo cheio de água,
duas aspirinas ao lado dele. Sento, sempre muito devagar, e um
cobertor laranja e verde horroroso de malha cai dos meus
ombros. Olho para mim mesma. Ainda 100% vestida. Até mesmo
com minhas botas.
Dignidade intacta. Um ponto para mim.
Mas o pensamento não me traz qualquer conforto. Aqui
estou eu de novo, acordando em um ambiente estranho depois de
uma noite de bebedeira que não lembro. Em um sofá neste
momento, mas poderia ter sido um beco coberto de lixo. A
sabedoria materna diz para me cuidar sempre que for beber para
não acabar em um lugar qualquer. Eu não sou cuidadosa. Eu
nunca tive esse cuidado.
Dói demais me mexer ou olhar ao redor. Dói até piscar.
Concentro minha atenção ao engolir a aspirina, ajudando com a
água. Minha boca está tão seca e arenosa como o deserto de
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Nevada. Eu teria mastigado vidro se achasse que meu estômago
poderia lidar com isso, mas tenho minhas dúvidas. Tomo
algumas respirações profundas e espero até que a sensação de
agitação no meu íntimo diminui, em seguida, olho em volta do
lugar.
Um pequeno apartamento, parcamente decorado, com
mobiliário simples, que não combina entre si. Do outro lado da
mesa de centro e suas bugigangas de vidro está uma velha
poltrona confortável em frente a uma TV de tela plana. As paredes
estão nuas, a não ser por duas molduras de universidades que eu
não consigo ler do sofá e uma meia dúzia de fotos. As janelas da
frente mostram uma vista de uma rua movimentada de Las
Vegas. Nada sobre o lugar causa qualquer tipo de impressão em
mim. Nem é familiar.
“Bem, não estou acorrentada e a porta é fica a poucos
passos de distância”, eu murmuro para mim mesma, e levanto o
copo de água para outro gole.
“É verdade, em ambos os casos.”
Eu tusso a água por todo o meu peito, e olho em volta.
“Que inferno…?”
Um cara está na pequena cozinha atrás de mim. Seu cabelo
escuro está molhado, fresco de uma chuveirada e seus olhos
castanhos afiados me olham confusos. Ele é alto, super bonito e
totalmente não é meu tipo. Eu gosto das grossas ondas, soltas de
seu cabelo, mas ele é muito certinho para mim. Os meus homens
são tatuados e cheios de piercings e vêm com uma estratégia de
saída logo depois que eu dormisse com eles. O cara na cozinha
parece ser o tipo que faz café da manhã para qualquer mulher
que passe a noite, ou mais, e em vez de expulsá-las, diz para ‘se
sentirem em casa’.
Bom garoto, do tipo bem bonzinho.
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Mas Deus, ele tem um rosto doce. Um rosto que posso
jurar que já vi antes. Procuro nas profundezas da minha
memória... quando e onde...
“Eu sou o motorista da limusine”, ele diz. “Eu levei você e
sua banda ao Pony Club na noite passada?”
“Ah, certo”, digo. “É isso aí.”
O cara vem até a frente do balcão da cozinha, de frente
para a sala de estar, e inclina-se contra ele, com os braços
cruzados. “Jonah Fletcher.”
“O quê?” Minha cabeça lateja atrás de meus olhos de
tempos em tempos.
“Meu nome”, diz ele lentamente, “é Jonah Fletcher. Caso
você se pergunte sobre o dono do sofá que está sentada.”
“Oh, desculpe”, eu respondo, minhas bochechas
queimando. “Eu estava apenas... ouvindo a minha dor de cabeça.
Sou Kacey Dawson. Embora você provavelmente já saiba disso.”
Os olhos de Jonah arregalam ligeiramente, e eu balanço a
cabeça — um movimento do qual me arrependo imediatamente.
“Eu não quis dizer que sou famosa ou qualquer coisa, quero dizer
por causa do seu trabalho. Meu nome está provavelmente em
algum documento... Eh, esqueça isso.”
Seguro a cabeça dolorida em minhas mãos e tento lembrar
algo da noite passada. Uma vaga sensação que algo não muito
bom aconteceu adicionado à miséria da minha ressaca.
Olho para cima para Jonah Fletcher. “Então, uh... na noite
passada. Será que nós...?”
Ele arqueia uma sobrancelha para mim, perfeitamente. A
outra nem sequer se move. “Será que nós... o quê?”
Eu bufo. “Tenho que soletrar?”
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A, expressão afiada dura em seu rosto suaviza ligeiramente.
“Nós não fizemos nada. Você estava desmaiada.” Ele inclina a
cabeça. “Você não lembra de nada?”
“Não muito.”
“Isso acontece muito?”
Bufo. “Eu posso ver que não é da sua conta.”
“E, no entanto, ontem à noite, tornou-se da minha conta.”
Ele dá de ombros. “Parece ser um hábito perigoso, é tudo. Nem
todos os caras são tão legais como eu.”
“Isso ainda está em aberto”, eu murmuro e olho ao redor.
“Este é o seu apartamento? Por que não me levou de volta para a
mansão em Summerlin?”
“Oh, acredite em mim, eu tentei. Trazê-la aqui não é
exatamente protocolo do trabalho. Eu posso perder meu
emprego.”
“O que aconteceu?” Pergunto, principalmente porque devo,
não porque quero saber.
Esse cara, Jonah, coça o queixo pensativo e senta-se em
frente a mim em uma cadeira reclinável. O estofado da cadeira
pode ter sido de couro marrom, mas acho que o mais provável é
que seja de vinil — rachado em alguns lugares e gasto pelo uso.
Jonah se senta nela e apoia os braços em seus joelhos que estão
vestidos de jeans. Uma pulseira pesada de prata está em seu
pulso direito. Sua camisa apertada ao redor de seus ombros e
bíceps. Músculos bacanas. Magro, mas definido.
Meus olhos se desviam para a gola de sua camisa, para
visualizar um pouco do seu peito. Meio centímetro de uma linha
vermelha em sua pele aparece por cima da gola. Algum tipo de
cicatriz grande.
Eu rapidamente desvio os olhos.
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“Eu tentei levá-la de volta para casa”, Jonah diz. “Tentei
entrar em contato com o seu empresário, também. Não tive sorte.
Era trazê-la aqui ou voltar para o Pony Club, mas o seu guardacostas
parecia bastante insistente que eu te afastasse da cena de
lá.”
Um caroço de medo se forma, agitando minhas entranhas.
“Que cena, exatamente?”
“Não tenho certeza. Parece que havia uma espécie de motim
acontecendo.”
“Um motim.”
Seja o que for o sangue foge do meu rosto, drenando para
longe. Uma vaga memória, borrada e mergulhada em álcool
aparece. Eu, pedindo para um monte de fãs virem à sala verde.
Eu não consigo lembrar o momento real, mas o som de tantas
vozes, troveja na minha cabeça e faz doer mais.
“Será que um... Será que Hugo — o guarda-costas. Ele
disse o que aconteceu? Como começou?”
Jonah balança a cabeça. “Você não lembra de nada?”
“Tenho quase certeza que não quero”, digo, minha voz
quase em um sussurro.
Reviro em torno da parte de cima das minhas botas,
buscando meu maço de cigarros. Eu balanço um cigarro que está
junto com a pequena caixa de fósforos quando Jonah limpa a
garganta.
“Esta é uma zona de proibido fumar, se você não se
importa.”
“Tenha misericórdia”, digo com um sorriso pálido. “Além
disso, todos fumam em Las Vegas.”
“Eu não.” O tom duro na voz de Jonah congela minha mão.
Ele oferece um pequeno sorriso. “Desculpa. Regras da casa.”
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Coloco o meu pacote para baixo cuidadosamente sobre a
mesa. “Você escolheu uma cidade difícil para viver se você não faz
como todos e não curte a fumaça do cigarro.”
“E ainda, de alguma maneira, eu consigo.” Ele esfrega a
mão sobre as coxas, impaciente. “Você não precisa ligar para sua
equipe? Elas podem querer saber que você está bem. Na verdade,
eu preferiria que soubessem que você está bem. Estou esperando
uma espécie de equipe da SWAT para arrebentar minha porta a
qualquer minuto pelo seu sequestro.”
“Eu acho que...” A última coisa que eu queria fazer é ligar
‘minha equipe’, mas Jonah está me observando.
Basta acabar com isso.
“Posso usar seu telefone?”
Jonah entrega seu celular e começo a digitar o número de
Jimmy. Tenho quase 99% de certeza que qualquer catástrofe que
tenha acontecido no Pony Club foi culpa minha, e 100% de
certeza que não quero saber o quão ruim a cena realmente foi.
Acovardo-me e ligo para Lola em vez disso.
Ela responde no terceiro toque. “Sim?” Ela diz, sua voz
cheia de sono.
“Lola? Sou eu.”
“Kacey?” Ela boceja. “Onde está você? Você está ligando de
casa?”
“Hum, não”, digo. “Eu não estou lá.”
“Bem isso ajuda”, Lola diz, suspirando. “Jesus, Kace.
Preciso enviar uma equipe de busca? Pensando bem, é melhor
você ficar escondida, onde Jimmy não pode encontrá-la. Ele está
irritado por causa de ontem à noite. Jeannie também. Então,
novamente, ela está sempre irritada.”
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Fecho os olhos com a acusação e me preparo. “Por que ele
está chateado?”
“Você não se lembra, não é? Porra! Você bebeu até o coma
logo após convidar metade do público para a sala verde. Mas, em
vez de se ater ao redor para lidar com a sua confusão, Hugo te
salvou. Ele a colocou na limusine, certo? Sim, tivemos de ir para
casa de táxi. Jimmy não está feliz com isso.”
Giro uma mecha de cabelo em volta do meu dedo. “É por
isso que ele está chateado? Porque ele teve que pegar um táxi?”
“Kace, você acha que ele está preocupado com você?
Querida, ele percebeu que você estava transando com o
motorista.” Uma pausa. Eu posso ouvir as palavras não ditas.
Todos nós podemos.
Meu rosto fica vermelho até o pescoço. Me recuso a olhar
para Jonah.
“Bem, eu não transei. Eu estava em coma alcoólico,
lembra? Você pode dizer isso a ele.”
“Tanto faz. Isso importa? Jimmy liga para a empresa e dá
uma bronca por não nos pegar. Aquele motorista da limusine vai
ter seu rabo arrancado com água quente. Hugo também.”
“Não, não, ele não fez nada de errado.” Eu me remexo no
sofá, para longe de Jonah e baixo a voz. Minha dor de cabeça
aumenta mil vezes. “Nenhum deles fez nada. Diga a Jimmy que
não foi culpa de Hugo. Estou bem.”
Ouço Lola acender um cigarro. Encontro meus dedos
avançando em direção ao meu próprio maço e tenho de cruzar as
mãos.
“Você percebe que destruiu o lugar totalmente, certo?” Lola
pergunta em uma exalação de fumaça. “De acordo com Jimmy, o
Pony Club está falando em uma potencial ação judicial para
pagar os danos.”
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Quase deixo cair o telefone de Jonah. “Será que alguém se
machucou?” Pergunto em voz baixa.
“Não”, ela diz, a raiva esvaziando de sua voz. “Mas o salão
verde está um lixo. Além de lixo. Parecia uma zona de guerra,
quando saímos.”
“Então... o que está acontecendo agora? O show de hoje
está cancelado?”
Lola bufa. “De jeito nenhum. Não com sessenta por cento
dos ingressos vendidos.”
“Oh.”
“Eu vou dizer a Jimmy que você está bem, mas talvez... não
sei, Kace. Você pode querer demorar algumas horas. Pelo menos
até que Jimmy cure a sua própria ressaca. Quer dizer, para ser
justa, todo mundo estava muito bêbado a noite passada.” Agora
posso ouvir um pequeno sorriso nos lábios da minha amiga. “Foi
um show épico. Épico.”
“Foi?”
“Oh garota, você não sabe mesmo. Estamos à beira do
mega estrelato e você está perdendo. Não, você está quase se
destruindo.”
“Mas eu não me destruí, certo?”
“Não. O show tem que continuar.” Lola suspira novamente.
“Descanse um pouco. Esteja sóbria para o show de hoje à noite.
Você ainda está bem para ir, né?” Ela pergunta, e posso ouvir o
tom de aviso em sua voz. Esta não é apenas a minha grande
chance, mas a dela também.
“Claro”, digo fracamente. “Obrigada, Lola. E diga a
Jimmy...”
“Que você está arrependida? Sim, sim. Hora de mudar o
repertório, Kace. Falo com você mais tarde.”
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Entrego o telefone de volta para Jonah. “Obrigada.”
“Os policiais arrebentarão a porta a qualquer minuto?” Ele
pergunta sombriamente. “Ou eu vou perder meu emprego? Ou
ambos?”
“Não. Bem... talvez.”
Os olhos de Jonah se arregalam. “Talvez o quê?”
Vergonha e humilhação colorem minha pele de vermelho.
“O segundo. Ouça, eu vou falar com o seu chefe sobre a
limusine...” Começo a falar quando Jonah sai de sua cadeira com
uma maldição.
Ele me ignora e começa a ligar do seu telefone.
“Harry? Sou eu, Jonah. Eu...” Ele me lança um olhar ao
ouvir o que está sendo dito na outra extremidade.
Eu seguro minha cabeça dolorida em minhas mãos quando
Jonah tenta explicar a situação. Finalmente, um telefone celular
aparece na minha linha de visão.
“Você se importaria de dizer ao meu patrão por que eu não
pude concluir o trabalho na noite passada?” Jonah pergunta com
força.
“Sim, claro.” Pego o telefone. “Um oi. Harry, não é? Sou
Kacey. Da Rapid Confession. Eu tive... uma noite ruim e Jonah
foi bom o suficiente para me deixar dormir em seu sofá. Nada
aconteceu”, acrescento, recebendo um olhar estranho de Jonah.
“Ele queria voltar para pegar o resto da minha banda, mas eu não
estava fazendo muito para contribuir então ele cuidou de mim.
Ok?”
Harry promete não despedir Jonah e ladra que quer a
limusine de volta, o mais rápido possível. Em seguida, ele desliga.
Jonah olha para mim. “Bem?”
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“Você não está demitido. Mas Harry quer a limusine de
volta. Tipo, agora mesmo.”
Ele assente. “Certo, tudo bem. Vamos. Vou deixá-la de volta
para a mansão no caminho.”
“Hum...” Eu arranco um fio enrolado no cobertor.
“O quê?” Jonah diz. “Você ouviu o meu chefe. Eu tenho que
devolver o maldito carro.” Ele inclina a cabeça para mim. “Você
não precisa voltar?”
Não, penso. Eu realmente não sei. Eu só não estou
preparada para enfrentar todo mundo. Nada disso. Ainda não.
Ofereço a Jonah um sorriso fraco. “A aspirina não fez efeito
nessa dor de cabeça. Estaria tudo bem para você, se eu tirasse
uma soneca enquanto você leva a limusine de volta? Vou chamar
um táxi depois e darei o fora de sua casa, eu prometo.”
Os olhos escuros de Jonah se arregalam. “Você quer que eu
a deixe sozinha em minha casa enquanto devolvo a limusine em
que você vomitou, de modo que você fique para tirar uma
soneca?”
“Eu prometo que vou tirar uma soneca e depois ir embora”,
eu digo, em seguida, sinto meu estômago ficar gelado. “Espere.
Eu vomitei em sua limusine?”
Parece que Jonah vai retrucar com uma piada, mas ele
deve sentir pena de mim porque diz em um tom mais suave “Você
não tem um show hoje à noite?”
“Eu tenho um tempo antes de voltar.”
Jonah esfrega o queixo, com o olhar confuso. “Depois que
eu entregar a limusine, estava pensando em ir para o trabalho.
Meu outro trabalho”, acrescenta. “Eu tenho uma agenda
apertada, um cronograma muito apertado e preciso me manter
nele.”
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“Eu sinto muito. Não quero interferir.” Eu olho para ele e
ofereço um sorriso. “O que você faz no seu outro trabalho?”
Jonah acena com a mão para o copo na mesa de café.
“Você é um colecionador?”
“Não, eu crio as peças.”
Meus olhos se arregalam enquanto olho para a arte de
vidro com novos olhos. Há dois pesos de papel em forma de
esfera, um que parece que está cheio de vida do mar a partir de
um recife de coral, e a outra segurando um redemoinho
incrivelmente intricado e colorido. Ao lado dos pesos de papel tem
um frasco listrado com pó de ouro com fitas de vermelho.
Pego o peso de papel com a vida marinha nele: anêmonas
com tentáculos brancos e amarelos, fitas de babados coloridas e
—alguma forma — as colorações salpicadas de peixes tropicais.
“Um pedaço do oceano na minha mão”, murmuro. Olho
para ele. “Você fez isso?”
“Sim. É o que eu faço. Não sou um motorista de limusine.
Esse é o meu trabalho noturno. De dia sou um artista industrial.
Iluminação, metal, vidro. Principalmente de vidro.”
“Você é realmente bom”, digo. “Mais do que bom. Isso é
surpreendente.”
“Sim, obrigado.” Ele esfrega a parte de trás de seu pescoço,
me observando segurar a peça.
Ele provavelmente pensa que vou quebrá-lo. Coloco o peso
de papel com cuidado de volta para baixo.
“Então, tenho que ir para a Hot Shop”, Jonah diz. “É onde
eu os faço, o vidro. Eu ficarei lá até por volta das duas da tarde.”
Ele aperta os lábios, pensando. Finalmente, diz, “eu acho... Bem,
acho que você é bem-vinda para ficar aqui até então.”
“Sério? Você não se importa?”
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“Eu não sei se iria tão longe”, Jonah diz com um sorriso
seco. “Há um pouco de comida aqui na geladeira, para quando
você quiser comer. Sirva-se da água engarrafada, também. Se
você realmente precisar fumar, há um pequeno pátio no meio do
complexo. Você vai ver a calçada apenas para a direita quando
sair. Tem bancos e um cinzeiro.”
“Ok, claro. Entendo”, digo, alívio me inundando já que eu
tenho algumas horas antes de ter que enfrentar as
consequências. Por assim dizer.
No balcão da cozinha, Jonah rabisca algo em um pedaço de
papel e traz para mim. “Este é o meu celular. Se você precisar de
alguma coisa, é só chamar. Telefone está na cozinha.”
Pego o papel e encontro seu olhar. De perto, seus olhos
estão mais quentes. Um profundo, marrom rico.
“Agradeço muito por me deixar ficar”, digo. “Eu realmente
aprecio seu gesto. Muitas pessoas não deixariam um completo
estranho ficar em sua casa sem supervisão.”
Jonah dá um sorriso tenso. “Nem me fale.”
Ele pega suas chaves e sai, fechando a porta atrás de si.
Ele me deixa sozinha em sua casa. Eu. A garota que destruiu o
Pony Club poucas horas antes, vomitei em seu carro, invadi o seu
espaço e quase o fiz perder o emprego. Ele está sendo tão legal
sobre tudo. Mais do que legal.
Ele confia em mim. Algo assim.
Não que eu mereça confiança. Estremeço com o
pensamento de que terei que enfrentar o salão verde esta noite.
Ter que ir e fazer outro show me enche de um estranho tipo de
medo.
O que há de errado comigo?
Acho que poderia entrar em menos problemas se eu
dormisse, e não estava mentindo para Jonah sobre a necessidade
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de uma soneca de qualquer maneira. Minha dor de cabeça troveja
e quero dormir por um milhão de anos. Deito contra a almofada
do sofá e puxo o velho cobertor sobre meus ombros. Não é tão feio
como eu pensava no início. Seu peso é reconfortante. Como um
bom abraço.
Meu olhar pesado cai sobre o belo arranjo de vidro na mesa
de café. Redemoinhos lindos de cor e design, presos e flutuando
no centro dos pesos de papel, enrolado com fitas ao longo do
corpo da garrafa.
“Lindo”, murmuro. Meus pensamentos imaginam que seria
pacífico e tranquilo dentro de um desses pesos de papel. Eu
poderia flutuar sem peso em um oceano de vidro, suspenso em
beleza, rodeada por cor e quietude. Nenhum ruído. Sem tambores
ou fãs gritando. Apenas... silêncio.
E segurança.
Eu adormeço momentos depois.
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CAPÍTULO 6
kacey
Acordo incapaz de lembrar onde estou até que meu olhar
encontra os pesos de papel de vidro. Apartamento do motorista de
limusine. Jonah Fletcher. Fletch 2 , como no filme de Chevy Chase.
Sorrio para mim mesma e me espreguiço.
A luz que entra pela janela é cortante e branca, do tipo que
chega com meio-dia. O relógio do DVD diz que são treze horas.
Dormi por seis horas seguidas. Meu estômago não está mais
enjoado, mas pede por alimentos.
Eu quero um cigarro. Pego meu maço e vou para fora, em
direção ao pátio que Jonah me falou.
O calor me dá um tapa na cabeça e minha dor de cabeça
ameaça voltar. Eu não sei como alguém pode se acostumar com o
calor do deserto. Nascida e criada em San Diego, onde era quase
sempre 28 graus e ventando, eu não consigo tolerar este tipo de
calor duro, seco por mais de um dia ou dois. É como viver em um
forno. Embora eu meio que deteste a ideia de me reunir com a
banda, estou feliz que estamos deixando Nevada na terça-feira.
Sento em um dos bancos de ferro forjado no pátio
medíocre, à sombra de uma metade do complexo de
apartamentos em forma de L. O pátio é de terra e pedra calcária
esmagada, repleto de cactos e alguma outra planta de deserto que
não reconheço. Nada aqui é verde mesmo, somente verde pálido,
como se fosse revestido de areia do deserto.
2 Fletch é o nome original do filme Assassinato por Encomenda protagonizado por Chevy Chase.
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Acendo meu cigarro e mentalmente examino meu
pensamento sobre me reunir a minha banda. Será que eu
realmente detesto a ideia? Estamos à beira do estrelato. Baldes de
dinheiro e muita fama está por vir.
Então, por que me sinto como se eu quisesse ir embora?
útil.
Porque você não quer acabar morta, vem em pensamento
Eu tremo, apesar do calor insano, e dou uma longa tragada
em meu cigarro. Uma porta do apartamento de frente para o pátio
abre e uma senhora em um vestido caseiro cor de pêssego,
chinelos e bobes no cabelo curto sai de lá. Ela para quando me
vê.
Aceno. “Quente o suficiente para você?”
A mulher bufa e bate as duas mãos para mim, em seguida,
se retira e fecha sua porta com um estrondo.
Olho para meus peitos que estão saltando para fora do
corpete e tenho que rir. Eu ainda estou vestida em látex e vinil do
meu show e suando como uma cadela. A velha senhora
provavelmente pensou que eu era uma prostituta. O suor escorre
pelas minhas costas e posso sentir ao longo de meus lados onde a
parte superior do espartilho me aperta. Ir para fora no calor foi
uma má ideia.
Apago o cigarro sob minha bota e volto para o apartamento
de Jonah, orando para que não tenha me trancado para fora.
Não, eu não me tranquei para fora, tinha deixado a porta
entreaberta.
Bom, penso. Ele permite que você fique e você deixa a porta
aberta.
O complexo de apartamentos não grita riqueza exatamente,
mas Jonah tem seus belos vidros soprados. Eles parecem valiosos
para mim.
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De volta para dentro do ar condicionado misericordioso,
sento no sofá e tiro minhas botas. Minhas meias arrastão foram
rasgadas em uma dúzia de lugares. Tiro-as também, fecho os
olhos e estico as pernas. O cigarro não fez nada para a minha
ressaca. Minha língua parece grande demais e os meus dentes
parecem que não foram escovados em uma semana. Talvez Jonah
tenha algum antisséptico bucal. Ou eu poderia escovar os dentes
com a pasta de dentes no meu dedo.
Depois de fazer um curto xixi no banheiro, lavo as mãos na
pia. Eu esperava encontrar todos os tipos de merda de um cara
que mora sozinho, tais como espuma de barbear, ou catarro
assustadores. Durante o curto período de tempo que eu vivi com
Chett, ele estava sempre deixando bagunça repugnantes na pia
ou vaso sanitário.
Jonah não é Chett.
Como o resto da sua casa, a pia é limpa e organizada.
Começo a lavar as mãos, mas o reflexo no espelho me para.
O que resta da minha maquiagem dos olhos está manchada
pelo meu rosto, como se tivesse chorado. Meu batom deixou uma
mancha vermelha pálida sob o meu lábio inferior, como algum
tipo de erupção cutânea. Meu cabelo é um emaranhado e minha
pele branca parece pálida sob as luzes fluorescentes. Mortificação
me invade ao pensar que fiquei em torno de Jonah, falando com
ele desse jeito durante toda a manhã, e isso me acerta como um
soco no estômago.
“Deus, Kacey...”
Limpo o delineador e o batom manchado com papel
higiênico, em seguida, abro o armário em busca de creme dental.
Eu gelo com o que vejo.
Pasta de dente e Listerine estão lá, mas eles estão na frente
de um conjunto de medicações. Frascos de comprimidos
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alaranjados com tampas brancas, tantos quantos os olhos podem
ver.
“Que farmácia é essa, Batman.”
Viro alguns frascos para ler os nomes. Nenhum me parece
remotamente familiar.
Prednisona. Rapamune. Gengraf. Ciclosporina. Norvasc.
“Que porra é essa?” Eu viro mais rótulos. Alguns tem
nomes que imagino reconhecer pelos anúncios de TV:
analgésicos, alguns para pressão arterial elevada, dois para
baixar o colesterol, e um frasco de antibióticos.
Por que um jovem precisa de remédios para colesterol e
pressão arterial?
A costura rosa da cicatriz no peito de Jonah aparece na
minha memória. Algum tipo de problema cardíaco? Isso explicaria
o antitabagismo e a pequena farmácia que tem aqui neste
armário de remédios.
Fecho a porta do armário rapidamente, pasta de dentes
esquecido, sentindo-me como se eu tivesse acabado de entrar e
encontrar alguém nu ou como se tivesse lido um diário altamente
privado. Saio do banheiro e vou para a cozinha em busca de mais
água. Eu preciso dela para lavar o gosto ruim na minha boca de
ter bisbilhotado a vida de Jonah.
Na geladeira, acho a água engarrafada que Jonah tinha
mencionado e não há muito mais. Alguns vegetais murchos,
saladas embaladas, e pelo menos três bandejas de várias
caçarolas cobertas de papel de alumínio. Eu dou uma espiada no
congelador, tomando um momento para apreciar o ar frio, e vejo
mais alimentos embalados: Lean Cuisine e marcas de ‘coração
saudável’ como se Jonah estivesse em uma dieta.
Esta não é a geladeira de um típico solteiro de Las Vegas.
E o armário de remédios é?
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Meu estômago revira com nervosismo em vez de fome. Eu
nunca fui uma boa pessoa ao redor de doentes. Eu nunca soube
qual a coisa certa a dizer, nunca fui capaz de encontrar o
equilíbrio certo entre simpatia e compaixão. Eu sempre me calo
durante qualquer tipo de discussão sobre saúde e hospitais me
dão calafrios.
Você está sendo estúpida. Você precisa comer. Não comeu
desde...
Não consigo me lembrar da última vez que comi.
Aparentemente, estou em uma dieta também. Uma dieta líquida.
Uma tigela de cereal pode ser seguro. Abro alguns
armários, procurando uma caixa de Cheerios. Em vez disso,
encontro uma merda... toneladas de vitaminas, suplementos e
proteína em pó.
Fecho esse armário com pressa.
“Droga.”
Jonah disse que eu poderia me virar, mas agora o meu
apetite desapareceu completamente. Ele não é apenas um
estranho total; ele é um completo estranho, que tem uma
condição médica séria. Me sinto muito intrusa ao saber de tudo
isso tão cedo. Estou recebendo um curso intensivo sobre sua
merda extremamente pessoal, e ele sabe quase nada sobre mim.
Eu gostaria de ter sido corajosa o suficiente para deixá-lo me
levar de volta para a mansão em Summerlin.
Ando de volta para a sala de estar, não inteiramente certa
sobre o que fazer. A TV pode ter uma reportagem sobre o que
aconteceu no Pony Club na noite passada, então eu a deixo
desligada, e tento deixar o silêncio da casa de Jonah me
contentar.
Não posso ficar parada. Quando criança, minha mãe foi
rápida para me diagnosticar como TDAH — transtorno de déficit
de atenção — utilizando-o como desculpa ao meu pai para o meu
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comportamento exuberante, que ficava irritado com o menor
ruído ou sinal de peraltice. Estou sempre inquieta em minha
própria pele. Quando fiquei mais velha, eu me sentia como duas
pessoas presas no mesmo corpo, uma introvertida que se
esquivava das broncas com raiva de seu pai, e uma pessoa
extrovertida que praticava em sua guitarra elétrica na garagem, o
mais alto possível para irritá-lo. Uma guerra constante comigo
mesma.
Neste momento, a introvertida em mim sussurra para
desfrutar da calma.
A extrovertida quer uma bebida.
Estantes alinhadas em uma parede na sala de estar de
Jonah: artes industriais, história da arte, biografias de artistas —
alguns que já ouvi falar, outros nem conheço. Eu gosto de
romances, horror, e um mistério divertido. Jonah é todo não
ficção. Chato.
Continuo andando.
Na parede oposta, tem pendurado um monte de fotos
emolduradas. A maioria mostra Jonah, sorrindo com o que
parece ser sua mãe e seu pai, e, um cara de boa aparência. Um
irmão, talvez? O cara tem a mesma estrutura facial básica, como
Jonah, o mesmo cabelo escuro, mas é mais curto e mais
volumoso. Suas feições são mais delineadas. Seus olhos são um
tom marrom e mais escuro. Tatuagens escuras serpenteiam em
torno de seus braços musculosos.
Ele parece exatamente o tipo de cara que eu amaria levar
para casa à noite, perder-me em tudo o que é masculino, forte e
poderoso sobre ele. Um cara que correria com os primeiros raios
de sol da manhã seguinte, sem amarras, apenas como eu gosto.
Jonah parece o tipo de cara que você quer encontrar no
lado da estrada à noite, se seu carro der defeito.
Ou se você desmaia de bêbada e destrói um clube em Vegas.
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“Isso também”, murmuro distraidamente, e continuo
olhando.
O mesmo irmão quente e outros dois amigos — um cara
Afro-Americano e uma menina bonita com cabelo longo —
aparecem em um monte de fotos: em um clube, em uma festa,
cercado por árvores verdes altas em um acampamento, ou em
planícies desérticas, com o sol nascente ou poente por trás deles.
Em quase todas as imagens, Jonah está com um sorriso
brilhante, aberto, que faz toda a sua face se iluminar. Tal
contraste com a expressão rígida, séria que ele usava em torno de
mim. Eu não posso deixar de sorrir de volta para ele.
Noto que uma garota — a linda morena com delicadas
características — está ao lado de Jonah em um monte de fotos.
Jonah normalmente está com o braço pendurado ao seu redor, o
mesmo sorriso feliz no rosto, enquanto a mulher que parece
modelo e posa, como se tivesse virado seu ‘melhor lado’ para a
câmera.
Acima das fotos estão os dois diplomas emoldurados que
eu observei esta manhã. Um deles é um diploma da Universidade
de Nevada, Las Vegas, e o outro de Carnegie Mellon.
Carnegie Mellon... É uma universidade grande. Talvez até
Ivy League. Jonah é talentoso e inteligente. Ele parece jovem,
apenas alguns anos mais velho que eu. Ele não deveria ainda
estar na Carnegie Mellon? Ou será que qualquer condição médica
que tem o forçou a sair?
Toco uma foto de um Jonah rindo, sorrindo. “O que
aconteceu com você?”
Ele está bem. Ele está fazendo coisas de vidro em uma loja
apropriada, seja o que for. Você, por outro lado, iniciou um tumulto
e depois desmaiou. A melhor pergunta é, o que aconteceu com
você?
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“Eu estou bem”, digo a ninguém, mesmo que esteja
disposta a dar qualquer coisa por um Bloody Mary nesse
momento.
De repente, esse corpete maldito parece como se é dez
tamanhos menor, em vez de apenas dois. Eu não consigo respirar
e começo a suar mais uma vez. O ar condicionado se mexe
silenciosamente na janela com vista para a rua movimentada. Ao
invés de dar os vizinhos uma emoção, volto para a cozinha,
puxando os cordões que prendem o corpete juntos nas laterais.
Eu o tiro e o deixo cair no chão, ficando apenas com o sutiã sem
alças preto enquanto abro o congelador.
Sou muito baixa. O ar gelado bate no meu rosto, mas não
onde preciso. Avisto um banquinho perto dos armários, arrasto
para a frente do freezer e subo. Levanto o cabelo do meu pescoço
e seguro tudo junto no alto da cabeça, deixando o ar me bater por
baixo dos braços e peito, refrescando minha pele que queima e
amortecendo o meu desejo por uma bebida forte.
“Humm... Olá?”
Jonah. Eu não ouvi nada por causa de todo o zumbido do
congelador. Eu quase caio do banquinho.
“Oh meu Deus, é sério?” Pego meu corpete do chão e
seguro por cima do peito como um escudo. “Assuste uma garota
até a morte, por que não?”
Parece que ele está escondendo um sorriso. “Desculpa. Eu
só estou tentando descobrir o que você está fazendo.”
“Pescando um de seus congelados para fora com meus
seios”, retruco. “O que você acha que estou fazendo? Estou me
refrescando.”
“Tenho certeza que é para isso que serve o ar
condicionado”, ele diz, apontando o polegar atrás de si.
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“Sim, mas é perto da janela, cara inteligente. Eu não queria
ficar assim perto da janela.”
Jonah levanta as mãos. “Tudo bem.”
Um breve silêncio se instala, onde é óbvio que nenhum de
nós sabe o que fazer ou dizer em seguida.
Bufo um suspiro. “Olha, você vai ficar aí olhando para mim
durante todo o dia ou talvez queira me ajudar? Sua vizinha já
pensa que eu sou uma garota de programa. Esta é uma roupa de
show, palco, não de lazer.”
Agora é totalmente óbvio que ele está tentando não sorrir.
“Espere um segundo.” Ele vai para o quarto e volta com uma
camiseta preta lisa. “Esta serve?”
Viro as costas para ele, e puxo a peça sobre minha cabeça.
É muito grande e tem um decote em V, que totalmente não é o
meu estilo, e cheira como ele.
Mais uma vez, a sensação de estar precocemente muito
íntima com esse cara vem sobre mim. Agora estou de pé descalça
em sua cozinha, vestindo sua camisa.
“Obrigada”, digo, virando para encará-lo. Outro curto
silêncio, durante o qual Jonah olha para mim. Não de uma forma
assustadora, mais como se ele estivesse tentando descobrir o que
fazer comigo.
Eu percebo muito isso.
Mudo de pé para pé. “Como é o processo de fazer vidro?”
“Sopro.”
“Perdão?”
“É vidro soprado”, Jonah diz. “Eu não faço o vidro, eu faço
coisas a partir do vidro superaquecido por sopro de ar através de
um tubo...” Ele acena com a mão. “Deixa para lá. É um processo
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longo. Eu não quero aborrecê-la com os detalhes, é melhor
começar a levar você embora.”
“Não parece chato”, digo rapidamente. “Eu não posso nem
imaginar como você faz essas coisas. Tão complicado. O peso de
papel com as criaturas do mar? Quero dizer... como você fez
isso?”
Deus, estou balbuciando como uma idiota, tentando
despistar, porque o pensamento de voltar para Summerlin é como
um peso de chumbo, me arrastando para baixo. Jonah franze a
testa, claramente tentando decidir se eu realmente me importo ou
se estou apenas enrolando.
Ambos.
“Eu poderia explicar”, ele diz, “mas isso levaria o dia todo, e
tenho uma agenda apertada para cumprir, e...”
“Eu estar aqui é uma enorme encheção de saco”, eu
termino, tentando não ceder. “Entendi. Está tranquilo.”
“Você não é uma encheção de saco”, Jonah diz.
Eu levanto a cabeça para ele.
“Ok, talvez um pouco”, ele diz com um pequeno sorriso.
Encaro isso como um bom sinal. “Ei, você sabe o quê? Eu
estou morta de fome. Que tal comer alguma coisa em algum
lugar? Eu ainda tenho cerca de uma hora antes de precisar voltar
e me preparar para o show. O que me diz? Comer alguma coisa?
Por minha conta.”
O rosto de Jonah endurece e os músculos em seus ombros
ficam tensos. “Eu tenho que dirigir esta noite, às seis, e estou em
um cronograma muito apertado...”
“Você continua dizendo isso.” Eu o toco no ombro, como se
fôssemos velhos amigos. “Você nunca quebra sua rotina?”
“Não. Eu não.”
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“Oh.” Mordo o lábio. Estou muito persistente. “Um almoço
gorduroso, pós-ressaca não vai demorar muito tempo, não é?
Meia hora, quarenta e cinco minutos, no máximo.”
Olhos escuros e astutos de Jonah encontram os meus, e
posso sentir que ele está me estudando. Ele é observador, esse
cara, e sinto que minhas inseguranças estão escritas em cima de
mim.
Ou talvez seja porque você parece uma garota propaganda
da caminhada da vergonha.
“Eu disse que você podia comer qualquer coisa aqui”,
Jonah diz finalmente.
“E é educação sua oferecer, mas você não tem muito na
forma de... comida real.”
“Eu tenho muitas restrições alimentares”, ele diz.
“Claro.” Eu tusso. “Mas por que, exatamente?”
Jonah parece estar travando uma luta interna, em dúvida
sobre contar ou não para mim o que eu já suspeito.
“Eu tenho uma doença cardíaca”, ele diz lentamente.
“Oh?” Não é como se eu já não tivesse bisbilhotado o seu
armário de remédios. Meus olhos ardem por olhar para a cicatriz
que começa na sua garganta. Mantenho o meu olhar grudado em
seu rosto. Eu devo parecer como uma pessoa louca, olhando tão
intensamente porque Jonah dá um passo para trás.
“De qualquer maneira. Isso é outra longa história e... sim,
eu acho que nós podemos comer alguma coisa se você estiver
realmente com fome.”
“Faminta!” Coloco minhas botas que vão até a coxa, e fica
estranho com a minha saia de couro e camiseta masculina, mas
pude tirar o corpete, graças a Deus.
“Estou pronta.”
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“Ok”, Jonah diz, hesitante. “Um almoço rápido e então a
levarei de volta para Summerlin.”
“Parece bom.”
Ele provavelmente só concorda em me alimentar para
mudar de assunto, mas não importa o motivo, estou feliz em fazer
uma refeição com ele. Não é muito, mas aceito.
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CAPÍTULO 7
jonah
Levo Kacey para fora através do estacionamento para
minha caminhonete: um pequeno pick-up azul, a sua carroceria
cheia de caixas de papelão. Seguro a porta do passageiro aberta
para ela, o que parece surpreendê-la. Este almoço inteiro me
surpreendeu: não está na rotina de qualquer maneira. Mas,
obviamente, Kacey não tem pressa para se juntar a sua banda.
Depois de toda a catástrofe que causou no Pony Club, ficar
comigo é um ato de autopreservação.
Subo ao volante e os olhos se desviam novamente para as
coxas de Kacey, a pele lisa entre suas botas e a minissaia quase
inexistente. Parte de uma tatuagem colorida é parcialmente
visível em sua coxa e o desejo de ver o resto é ridiculamente forte.
Kacey é um colírio para os olhos. Na verdade, ela é mais do que
isso. É bonita. Mas e daí? Ela é mais do tipo de Theo com o
cabelo muito claro, couro e tatuagens.
Meus olhos se desviam para suas coxas novamente.
Quanto tempo se passou desde que toquei em uma mulher?
Um ano, quatro meses, treze dias, e dezoito horas.
Eu zombo meu lado matemático, embora o número
provavelmente não esteja muito errado. Eu não fiquei com uma
mulher desde a minha ex-namorada, Audrey. Antes de ficar
doente.
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“O que são aquelas caixas na parte de trás?” Kacey
pergunta, tirando-me dos meus pensamentos. “Você está se
mudando?”
“Não, elas estão cheias de vidro”, digo, grato pela distração.
“Frascos velhos e garrafas que derreto para fazer minhas peças.
Vou levá-las até a Hot Shop amanhã.”
“Assim, a Hot Shop é onde você sopra o vidro?” Kacey ri.
Arqueio uma sobrancelha para ela.
“Eu sei, eu sei. Tenho vinte e dois, mas tenho o senso de
humor de um menino de quatorze anos de idade.” Ela se vira em
seu assento para mim. “E como você faz isso?”
“Fazer o quê?”
“Levantar apenas uma sobrancelha. Eu sempre quis.”
Dou de ombros. “Eu não sei. Eu só faço.”
“Faz novamente.”
“Por quê?”
“Porque é legal.”
Arqueio minha sobrancelha para ela. “É isso?”
Ela ri e se recosta em seu assento, satisfeita. O largo
sorriso permanece em seus lábios enquanto observa Las Vegas
passando pela sua janela. Mesmo apenas um pouco virada para
mim, ela tem um sorriso deslumbrante.
“Então no que você está trabalhando?” Ela pergunta depois
de um momento. “Na Hot Shop.”
“Bem... estou trabalhando em uma exposição em uma
galeria local. Ela abrirá em outubro. A exposição, não a galeria.”
Calma, Fletcher. Mas faz meses desde que falei com um
estranho sobre a exposição. Eu tenho diminuído meu círculo
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social para exatamente três amigos, minha família, e o curador da
galeria. Até Kacey, eu não tinha entendido completamente o quão
pequeno esse círculo era.
“Você vai vender o copo nesta exposição?” Kacey pergunta.
“E aqueles belos pesos de papel?”
“Sim, eu vou colocar pequenas peças como aquelas para
venda, mas o foco principal será uma instalação de grande
escala.”
Ela começa a fazer outra pergunta quando entro com a
caminhonete no estacionamento do Mulligan, um restaurante
caseiro. São quase três da tarde, o movimento para o almoço já
acabou, o estacionamento está livre. Paro numa vaga perto da
porta.
“Aqui é bem perto da sua rua”, ela diz. “Nós poderíamos ter
andado.”
“Com este calor?” Eu digo, e desligo o motor.
“Bom ponto. O calor é insuportável. Eu não sei como vocês,
moradores do deserto, lidam com ele.”
Eu seguro a porta do restaurante aberta para ela,
surpreendendo-a novamente. Ela sorri para mim e quase perco
minha linha de pensamento.
“Eu nasci e fui criado no deserto”, digo. “Estou acostumado
a isso, mas algumas pessoas não conseguem suportar. Os
covardes e as maricas, qualquer um.”
Kacey bufa e me dá uma cotovelada leve na lateral
enquanto passa por mim e entra no restaurante. Ela suspira de
alívio quando entramos no ar-condicionado, em seguida, me pego
lhe dando um olhar compreensivo.
“Oh, tudo bem. Eu sou uma covarde”, ela ri. “Consiga uma
mesa, espertinho, enquanto uso o banheiro.”
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Rio no meu caminho para a garçonete. É fácil estar perto
desta garota. E parece que ela acha o mesmo de mim, como se
nos conhecêssemos há anos em vez de horas.
Uma garçonete me cumprimenta. “Quantas pessoas,
querido?”
“Duas”, digo e sinto uma pontada imediata no meu peito.
Ouvi dizer que você pode perder um braço, mas ainda
sentir dor nele. Eu não perdi Audrey, minha última namorada.
Ela me deixou, logo após a minha cirurgia de transplante. Nós
tínhamos planejado uma certa vida juntos, mas quando o vírus
destruiu meu coração e quase me matou, destruiu os nossos
planos e matou o nosso relacionamento.
Audrey não conseguiu lidar com a doença, os hospitais, o
espectro da morte pairando sobre mim até que me ligaram,
avisando que o doador estava disponível. Ela foi embora antes de
eu sequer voltar da anestesia.
Theo nunca vai perdoá-la por ter me deixado, mas eu a
superei rapidamente — mesmo depois de ficarmos juntos por três
anos. Doeu ela ter terminado, e a escolha do momento certo
poderia ter sido melhor, mas eu a perdoo por me deixar para
encontrar outra pessoa, alguém saudável com quem poderia estar
loucamente apaixonada e construir uma vida real.
Eu não sinto falta dela. No entanto, em resposta a uma
pergunta inofensiva da garçonete, percebo que perdi o ‘nós dois’.
Ser parte de um casal, segurar uma porta para alguém, pedir
uma mesa para dois, brincar, provocar, ser engraçadinho com
alguém... O meu pequeno círculo social não inclui uma namorada
e não incluirá nunca mais. Eu pensei que tinha me conformado,
mas uma parte de mim, enterrada lá no fundo, diz o contrário.
Afundo na cabine e pego um menu para me distrair dos
pensamentos que não quero ter. Mulligan tem a típica comida
caseira — que sua mãe faria todos os dias, e uma variedade de
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hambúrgueres e sanduíches para o almoço. Infelizmente, mais da
metade dos itens são estritamente proibidos para mim.
Kacey ocupa o assento na minha frente, com o rosto lavado
e brilhante. Tento não pensar no fato de que ela está usando a
minha camiseta, como as namoradas às vezes fazem com a roupa
do seu namorado.
A garçonete traz duas águas para a mesa. “Café?”
“Sim, por favor”, Kacey diz. “Desesperadamente.”
“Descafeinado para mim”, digo.
A garçonete se vira e Kacey me lança um olhar engraçado.
“Eu não posso ter cafeína.”
“Que tragédia.” Ela se inclina sobre a mesa. “Você sabe o
que dizem sobre o descafeinado. Há um momento e um lugar:
Nunca e no lixo.”
Eu rio com ela. “Vou ter que me lembrar disso.”
Kacey estuda o menu. “Estou com tanta fome, poderia
comer um pouco de tudo. E você? O que você vai pedir? Espera...”
Ela deixa o cardápio na mesa. “O que você pode comer?”
“Não tenho certeza ainda. Minhas opções são limitadas.”
“Por causa de suas restrições alimentares.”
“Sim.”
“Bem, merda, Jonah, por que você me trouxe aqui?” Ela
bate a mão no menu. “Tudo aqui é massa e gordura.”
Eu rio e levanto minhas mãos em sua súbita explosão. “Ei,
aqui é legal. Vou encontrar alguma coisa.”
Ela morde o lábio. “Sim, mas...”
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“Eu vim aqui por você. Este é o alimento perfeito para a
ressaca”, digo. “Eu costumava vir aqui com amigos quando estava
na UNLV — Universidade de Nevada.” Toco no canto do menu.
“Peça o que quiser. Está tudo bem, eu juro.”
Ela ainda parece em dúvida quando a garçonete volta com
os nossos cafés, colocando uma toalhinha de papel laranja,
escrito descafeinado, debaixo da minha caneca.
“Está pronta para pedir, querida?”
Kacey morde o lábio.
“Peça”, eu digo a ela. “A menos que prefira voltar para a
minha casa e comer alguns congelados?”
“Quando você coloca dessa forma...” Kacey se vira para a
garçonete e diz com uma voz profunda, “Sim, muito bem, eu quero
um Bloody Mary, e um sanduíche de bife e um sanduíche de bife.”
A garçonete lhe dá um olhar estranho e faço uma careta
para o Bloody Mary.
Kacey pisca os olhos, olhando entre nós. “É Fletch? Do
filme?” Ela aponta um dedo na mesa. “Você, Jonah Fletcher, não
pode me dizer que você não viu o melhor filme do Chevy Chase de
todos os tempos?”
“Desculpe, eu perdi”, digo.
“É um clássico”, Kacey diz. “Eu tenho uma coisa por filmes
dos anos oitenta.”
A garçonete pigarreia. “Eu também, querida, mas não
tenho sanduíches de bife ou Bloody Mary.”
Kacey pede um X-burguer e batatas fritas, e eu peço uma
salada Cobb, sem o bacon e uma fatia de pão de trigo, sem
manteiga.
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Quando a garçonete se vira, Kacey sacode a cabeça. “Sem
bacon? A única coisa boa em uma salada Cobb é que você
começa colocando o bacon nela.”
Dou de ombros. “Não está na lista.”
“Isso é péssimo. O que mais você não pode comer?”
“Nenhuma carne vermelha, nenhum chocolate, nenhum sal
em qualquer coisa...”
Kacey quase engasga com seu café. “Ei, ei, ei. Sem
chocolate?”
“Eu sinto mais falta do sal”, eu digo. “E manteiga. E coisas
gordurosas” eu rio secamente. “Em suma, eu não estou
autorizado a comer qualquer coisa deliciosa.”
Kacey sacode a cabeça. “Não sei como consegue.”
“Não é como se eu tivesse escolha. E há coisas piores.”
“Estou tentando imaginar algo pior do que não ser capaz de
comer chocolate.” Ela congela, em seguida, coloca sua caneca de
café para baixo, seu sorriso desaparecendo. “Oh meu Deus, isso é
uma coisa terrível de se dizer a alguém com uma doença
cardíaca. Eu sinto muito. Faço muito isso — deixar escapar o que
aparece na minha cabeça.”
“Ei, isso é legal. Também não posso usar cocaína, mas que
acabou por ser uma bênção disfarçada com todo o dinheiro que
estou economizando.”
Seu embaraço some, afastando-se com um sorriso. “Sim,
você parece um usuário de cocaína para mim.”
“Drogado total. Reformado.”
Kacey relaxa e se recosta em seu assento. “Então, você foi
para a UNLV? Foi lá que você estudou artes industriais?”
“Sim, meu irmão e eu estudamos arte lá.”
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“E Carnegie Mellon?”
Tomo um gole de café. “Com certeza você faz um monte de
perguntas.”
“Você tem um monte de fotos e diplomas em sua parede.
Antes de eu decidir refrescar meus seios em seu freezer, tive
algum tempo para matar.”
Coloco a caneca para baixo antes de derramar. “Isso não é
algo que você ouve todos os dias.”
“É no meu mundo”, Kacey diz com um sorriso triste, como
se fosse uma velha piada que ela estivesse cansada de ouvir. Mas
ela acena.
“Carnegie Mellon é... onde?” Ela pergunta.
“Pensilvânia. Sem falar no choque climático. O primeiro
inverno que tive lá eu quis hibernar.”
“Humm”, ela diz sobre a borda de seu café. “Mas de um
covarde para outro, costa leste tem um clima estranho também.
Eu nasci e cresci em San Diego, onde se chover, as pessoas
perdem a cabeça.”
A garçonete chega com a nossa comida. Eu nunca deixei
qualquer um alterar sua dieta a minha volta, mas o cheiro
flutuando do prato de Kacey se enrola no meu nariz, saboroso, de
carne e grelhados. Olho para a minha salada que cheira a nada e
dou uma bocada, principalmente por causa de Kacey.
“Então você tem uma galeria para expor em outubro?”
Kacey, pergunta, enxugando a boca com um guardanapo. “É
muito ruim eu não estar por perto para vê-lo. Estarei em turnê
pelo próximo ano.”
“Um ano... isso é uma longa turnê. Eu espero que você
goste de viajar.”
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Ela encolhe os ombros. “Eh. Não é tudo tão bom como
parece.”
“Não?”
“Parece ingrato. A maioria dos músicos daria seu rim
direito para ser contratado por uma gravadora e turistar por
várias cidades, certo?”
“Como eu não tenho rim para dar, direito ou esquerdo, não
poderia dizer com certeza”, digo com um sorriso. “Mas do meu
ponto de vista profissional — como seu motorista — não parece
que você está tendo o melhor momento de sua vida.”
Os olhos dela vão até o teto. “O que me dedurou? O local do
show ser ruim ou desmaiar e vomitar em sua limusine?”
“Empate.”
Ela sorri. “Sinto falta da música honesta, sem todos os
shows, sabe? Eu costumava amar ficar apenas sentada com a
minha guitarra e escolher uma canção. Encontrar um ritmo ou
uma melodia, entrar no clima de escrever as letras.”
“Você foi para a escola de música em San Diego?”
“Não, eu não fiz faculdade”, ela diz. “Mas... eu tenho tocado
desde que era criança. Minha avó me deu uma guitarra quando
eu tinha dez anos. Eu gostava de jogar, mas na maior parte eu
gostava de escrever músicas. A guitarra foi uma maneira de
colocar a melodia por trás de minhas palavras. Poderia ter sido
qualquer coisa — um piano, bateria... eu só queria escrever e
cantar.”
“Você canta também?”
“Só backvocal atualmente”, ela diz, não encontrando meus
olhos. “E eu não escrevo minhas próprias coisas mais. Apenas o
material para a banda.”
“Por quê?”
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Ela traça a linha da uma sobrancelha escura, distraída
com o dedo. Seu cabelo é loiro, mas as sobrancelhas são mais
escuras. E perfeitas.
“Somos uma equipe agora. Eu escrevo para nós”, Kacey
está dizendo. “Mas de uma maneira que é melhor para mim. Eu
preciso da banda.” Ela olha para mim através dos cílios
abaixados. “Eu não me dou tão bem sozinha.”
Balanço a cabeça, lutando por algo construtivo a dizer.
Para manter o foco em suas palavras e não nos pequenos
detalhes de seu rosto.
“Eu sinto que tudo está se movendo tão rápido”, Kacey
continua, “e não tenho tempo para sentar e resolver as coisas.
Como o que quero fazer? É isso que eu quero fazer? Ser uma
estrela do rock? Metade de mim diz ‘Claro que sim!’ A outra
metade de mim está com medo.”
“Medo de quê?”
“O estilo de vida. As festas. Eu sinto como se estivesse
fazendo isso para não ter que tomar quaisquer decisões reais.
Basta seguir a banda, tocar música bem alto, e beber muito,
porque...”
“Por que...?” Pergunto delicadamente
Ela dá de ombros casualmente, mesmo que suas palavras
não sejam assim. “Porque eu não tenho outro lugar para ir.”
Uma imagem do guarda-costas levando-a para fora do
clube na noite passada passa pela minha mente, assim como a
foto promocional dela, mostrando o dedo médio ao mundo.
Vulnerável e difícil ao mesmo tempo.
Ela parece perdida...
Kacey senta ereta e acena com a mão, como se suas
palavras fossem fumaça do cigarro para dissipar. “De qualquer
forma, essa é a minha história angustiada de ressaca.”
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Eu sei que não é tudo. Tenho a impressão de que ela tem
uma tonelada mais de histórias e uma tonelada mais de músicas
nela.
O silêncio cai entre nós enquanto bebo o meu café
descafeinado que está esfriando. Meia dúzia de vezes que comecei
uma frase, querendo compartilhar algo com ela. Algo
profundamente pessoal, como se houvesse algum placar cósmico
que precisasse ser igualado.
Mas a minha coisa mais pessoal é demais. Muito sombria.
Kacey Dawson é luminosa e não posso suportar a ideia de ver a
minha verdade mais profunda envolve-la como um manto,
escurecendo sua luz com o seu terrível caráter definitivo.
Eu brinco com o meu bracelete de alerta médico debaixo da
mesa. Poderia, pelo menos, dizer que é por isso que tenho que
comer a porra de uma salada em vez de um hambúrguer.
Começo, em seguida, a garçonete aparece com sua garrafa de
café. Ela reabastece a caneca de Kacey, em seguida, começa a
encher a minha.
A mão de Kacey dispara e cobre minha caneca. “Espere! É
do mesmo? Ele só pode ter descafeinado!”
A garçonete puxa a garrafa de volta com um pequeno grito.
“Droga, querida, eu quase queimei você.”
“Sinto muito”, Kacey diz. “Eu só... é importante.” Ela olha
para mim.
“Não vale a pena você se queimar”, digo. Mas o gesto me
tocou.
“Eu vou pegar a outra garrafa”, a garçonete diz, e retira-se
num acesso de raiva.
A mão de Kacey está de volta no colo e suas bochechas
estão rosadas. “Desculpa. Fiquei um pouco animada.”
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“Você alcança até o onze”, digo, relembrando uma das
citações do filme dos anos oitenta para acalmar as coisas.
Sua cabeça sobe, colocando um sorriso como a aurora em
seu rosto. “Isso é Spinal Tap”, ela diz. “Um clássico.”
Eu me fixo em seus olhos, sinto o momento entre nós,
quente e denso. “Obrigado por salvar o meu café”, digo. “É
importante.”
Seus olhos se suavizam. “Você vai me dizer o porquê?”
“Eu uh... fiz um transplante de coração”, digo.
“Oh”, ela diz, sentando-se ereta em seu assento. Seus olhos
olham para longe por um momento, então ela dá uma sacudida
brusca em sua cabeça. “Um transplante de coração. Mas... você é
tão jovem. Vinte e cinco?”
“Vinte e seis. O vírus que destruiu o meu coração não deu a
mínima para quantos anos eu tinha.” Eu sorrio com tristeza. “Os
vírus são idiotas.”
Kacey não sorri. Ela aponta para meu pulso e o bracelete
de alerta médico. “Posso ver?”
Deslizo meu braço em direção a ela sobre a mesa. Ela gira o
bracelete, da cruz em vermelho para as palavras inscritas no
outro lado.
“Paciente transplante cardíaco. Veja o cartão na carteira.”
Kacey olha para mim. “O que tem no cartão da carteira?”
“Minha informação de contato de emergência, o meu tipo de
sangue, blá, blá.”
Seu olhar me pressiona. “‘Blá, blá?’”
“O que fazer no caso de eu ficar em apuros.”
Ela assente com a cabeça. Em seguida, acho que ela vai
perguntar que tipo de problema que eu poderia ter, e eu ia falar,
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algo sobre medicação e efeitos colaterais, que é um inferno de
muito mais fácil de ouvir do que ter a insuficiência cardíaca total.
Em vez disso, ela pergunta “Foi recente?”
“Quase um ano e meio atrás.”
Seus olhos se arregalam. “Isso é muito recente.” Ela solta o
bracelete e sua mão esbarra na minha. O momento congela, em
seguida, sua mão escorrega para trás, palma com palma. Seus
dedos se curvam ao redor da minha mão e seguram firme. Eu
encaro quando meu polegar desce em cima de seus dedos e se
move lentamente para frente e para trás.
A garçonete volta com o café descafeinado. O olhar em seu
rosto é azedo, até que vê nossas mãos. Ela sorri completando
minha caneca.
“Eu sinto muito em ouvir tudo isso”, Kacey diz, quando a
garçonete segue em frente. Ela dá um aperto final nos dedos e
solta.
Eu coloco minha mão vazia, confusa, no meu colo. “Eu
também sinto.”
Kacey brinca com a colher. “É difícil falar?”
“Sim”, admito. “Somente as pessoas mais próximas sabem.”
“E eu sou a recém-chegada invadindo em seu espaço
pessoal e fazendo a todos os tipos de perguntas.”
“Sim”, digo, “você é uma maldita intrometida.”
Ela grita e joga uma batata frita em mim. Rio e a tiro do
meu colo.
“Espere, merda! Você não pode comer isso!” Kacey se
inclina sobre a mesa para pegá-la de volta. “Eu não acabei de
quase me queimar com o seu maldito café, para você comer uma
batata frita em vez disso.”
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“Seu sacrifício foi devidamente anotado.” Eu ponho a coisa
toda na minha boca, e quase gemo em êxtase. Tinha esquecido
quão bom pode ser uma batata frita. Salgada, gordurosa,
perfeição. “Santo Deus, que gosto bom.”
Kacey move seu prato fora do meu alcance. “Isso é tudo que
terá, amigo. Eu não vou ser responsável por quebrar sua dieta. Já
quebrei sua rotina, que você vive mencionando, certo? Eu sou
uma má influência para você...”
Minha risada morre e meu sorriso congela. Ela está certa.
No espaço de um almoço, Kacey não só quebrou minha dieta,
mas ela estragou minha rotina que é cuidadosamente trabalhada.
Não apenas ocupando o meu tempo que poderia ter sido gasto na
Hot Shop. É isso. Almoço. Riso fácil e dividir informações. Confiar
no outro com segredos. Dedos curvados suavemente juntos...
Isso é um item proibido no menu.
Isso é ruim para o meu coração.
Limpo a boca com um guardanapo e o coloco sobre a mesa.
“Sim, falando da minha rotina”, digo. “Eu só tenho algumas
horas antes de começar o meu turno na A-1 e você tem um show
hoje à noite. Temos que te levar de volta para Summerlin.”
O sorriso de Kacey desaparece e seu queixo se inclina para
minha mudança óbvia de comportamento. “Oh. Claro.” Sua luz
luminosa esmaece. “Pronta, quando você quiser.”
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CAPÍTULO 8
jonah
Eu nos levo de volta ao meu apartamento para Kacey poder
recuperar seu corpete e os restos de suas meias arrastão. Mas
quando paro dentro do estacionamento, ela não sai da
caminhonete, fica sentada ali, imóvel.
“Jogue fora o corpete estúpido”, ela diz finalmente.
“Tem certeza?”
“Vamos continuar”, ela diz, mas soou mais como, vamos
acabar logo com isso.
Levo Kacey de volta para a mansão em Summerlin em
silêncio. Paro a caminhonete na grande entrada circular. Kacey
sai da caminhonete e fica de frente para a casa.
“Eu odeio Las Vegas”, murmura tão baixo que quase não
ouço. Ela se vira para mim, inclina-se para a janela do
passageiro. “Obrigada por cuidar de mim na noite passada.”
“Sem problema”, digo. Diz mais alguma coisa. Diga algo
melhor. Mas as palavras estão presas na minha garganta.
“E obrigada por pagar o almoço. Deveria ser por minha
conta, mas eu não tinha dinheiro comigo. Naturalmente.” Ela
balança a cabeça. “Se você esperar um segundo, posso correr lá
em cima e conseguir algum dinheiro.”
“Esqueça”, digo. “Eu comi uma batata frita, pela primeira
vez em um ano. Valeu a pena os vinte dólares.”
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Ela levanta os olhos para os meus. “Obrigada por isso,
também.”
“O quê? Comer uma batata frita?”
“Por me alegrar. Toda vez que me sinto um pouco para
baixo, você faz uma piada para levantar meu astral.”
Eu balanço a cabeça como um idiota mudo, não sei o que
sairia da minha boca, uma piada ou a verdade: fazê-la rir é como
ganhar na loteria.
Ela arrasta os pés. “Ok, bem. Eu tenho que voltar.”
“Quebre uma perna esta noite”, eu finalmente consigo
proferir.
“Vou ter sorte se isso for tudo que eu quebrar”, ela diz, com
uma risada fraca. Ela começa a fechar a porta e depois para.
“Obrigada por ser um bom rapaz, Jonah. Está em falta no
mundo.”
Ela fecha a porta e se afasta, brilhando com o seu cabelo
claro como vidro fiado no sol. Observo sua caminhada até a
entrada — para certificar-me de que ela entrou — nos limites
escuros da casa. As sombras a engolem e a porta se fecha atrás
dela.
Sem Kacey, meu apartamento parece sem ar e selado. E
em silêncio. Se for sempre assim tranquilo? Eu vou para o sofá
para dobrar o cobertor. Restos de perfume de Kacey emanam e eu
quase coloco a maldita coisa em meu nariz para inspirar.
Você não tem tempo para isso.
Tenho que reconstruir minhas fortificações, reforjar a
armadura que preciso para chegar até outubro. Tenho que apagar
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a noite passada e esta tarde, enterrar junto com a memória dos
olhos de Kacey quando sorrir, ou como sua coxa nua em sua saia
curta tentou acordar o desejo físico que eu neguei que ainda
existia...
Com um pedido de desculpas silencioso para a minha avó
já falecida, dobro o cobertor e o jogo no armário. Para o meu
desejo, eu tomo uma ducha muito fria.
Depois, estou na minha cozinha em silêncio, bebendo a
droga de um shake de proteína repugnante que não é páreo para
a batata frita que Kacey jogou em mim...
Pelo amor de Deus, esqueça.
Morar com esta mulher, ou qualquer mulher é uma perda
de tempo. Eu não sou do tipo de cara de uma noite só. Nunca
fiquei ligado dessa maneira, e começar um relacionamento agora
está fora de questão. Nem com Kacey Dawson, nem com
ninguém.
Não estarei mais tendo belas mulheres em casa, ou mesmo
para o almoço. Não mais.
Eu verifico meu telefone: são cinco horas na noite de
sábado e estou vestido para o trabalho. Tenho duas mensagens
de texto de Theo e uma mensagem de voz do meu pai, como de
costume. Amanhã passarei o dia todo na Hot Shop, em seguida,
jantar com a minha família. Tudo como deve ser. Minha rotina foi
abalada um pouco, mas permanece intacta.
No meu caminho para fora da porta, pego o corpete de
Kacey e a meia arrastão rasgada, em seguida, jogo no lixo do
estacionamento.
“Nós agora retornamos a nossa rotina regular.”
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Meu chefe, Harry Kelton, tinha saído quando devolvi o
carro, mas ele está aqui nesta noite. Eu suspeito que ele vá
reiterar pessoalmente que levar meninas bêbadas para casa não
está no meu contrato.
“Fletcher”, ele diz por meio de saudação, e puxa minha
papelada para a noite da bagunça de sua mesa. Ele me joga um
conjunto de chaves de carro. Pego com uma mão enquanto
estudo a atribuição da noite sob as lâmpadas fluorescentes
piscando, e fico boquiaberto com o que eu leio.
“Rapid Confession? Mais uma vez?”
Kacey...
Harry entrelaça as mãos atrás da cabeça, círculos redondos
de suor escurecendo o ponto debaixo dos braços. “O empresário
pediu especificamente por você.”
“Depois da noite passada?”
“Eu acho que ele nos perdoou”, Harry diz. “Sorte também.
É um bom frete.”
Balanço a cabeça em frustração. “Não é sorte se ele está
chateado e tentando me ferrar com outra gorjeta.”
“Você os abandonou ontem à noite”, Harry diz, inclinandose
para a frente e apontando o dedo gordo para a bagunça em
sua mesa. “Tenho sorte que ele contratou — e pagou — outro
frete. Ele poderia ter cancelado o pagamento, estaria dentro dos
seus direitos, não importa sua gorjeta.” Ele se inclina para trás
em sua cadeira, a fazendo ranger. “Lucro para nós dois, Fletcher.
Mantenha o seu negócio e você tem uma segunda chance.”
“Chefe…”
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Harry se vira espetando o dedo na minha direção. “Você é
meu melhor motorista, Jonah, mas não estou muito feliz sobre a
noite passada. Termine o trabalho, se você quiser manter o seu.”
Saio do escritório de Harry em um deslumbramento, suas
palavras ecoando na minha cabeça.
Uma segunda chance...
“Maldição”, eu murmuro. Eu quase viro para enfrentar
novamente o escritório e dizer para Harry esquecer isso, alguém
poderia ficar com a gorjeta. Exceto que Harry está prestes a me
despedir, e não posso dar ao luxo de perder meu emprego.
Caminho através da garagem, passando por fileiras de
limusines pretas e brancas, carros de cidade e sedans, reforçando
a mim mesmo.
Eu posso ser profissional. Vou fazer o meu trabalho, e
passar por esta noite.
“Ei, Fletcher...”
Viro-me para ver Kyle Porter, um outro motorista, que foi
para seu carro.
“Eu ouvi que você tem o show Rapid Confession. Por duas
vezes, seu bastardo de sorte. A guitarrista é gostosa.”
Subo ao volante da minha limusine preta e bato a porta.
“Nem me fale.”
Depois de seis horas, estou de volta na mansão em
Summerlin, estacionado na rotatória, esperando a banda sair. O
sol apenas começou a se pôr, riscando o céu alaranjado e roxo no
horizonte. Normalmente, estudo o jogo de luz, pensando em como
poderia recuperar essas cores em redemoinhos no vidro derretido.
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Mas estou muito distraído. O que direi a ela? Fazer uma piada?
Dar um sorriso e pronto? Ou apenas ficar calmo. Manter a
rotina...
“É você!”
Saio dos meus pensamentos para ver a banda e o
empresário, com malas na mão, quase no carro. E Kacey...
Ela aparece com leggings, botas até o tornozelo, e uma
camiseta preta, enorme, escrita Ziggy Stardust na frente. Ela
arrumou o cabelo no topo de sua cabeça em um nó confuso e seu
rosto está limpo, livre de maquiagem, e se ilumina com uma
combinação de alegria e alívio que envia ao meu coração
emprestado, um ataque de batidas rápidas.
Ela coloca as mãos nos quadris, dando-me um olhar
brincalhão. “Você está me perseguindo?”
Antes que eu pudesse responder, Jimmy Ray se aproxima
de Kacey e coloca o braço em volta dela. “Portanto, este é o
motorista heroico que tomou conta da minha garota na noite
passada. Contratei ele de novo, gatinha, como um agradecimento
pessoal.” Ele pisca para mim. “Ela é um pouco falante, não é?”
Eu tinha visto caras como esse um milhão de vezes,
durante meus seis meses como motorista de limusine em Las
Vegas. Eu sempre os tratei com cortesia. Mas a mão de Jimmy
paira sobre o seio direito de Kacey e uma vontade de socar seu
rosto presunçoso toma conta de mim como uma onda.
“Vá em frente, entre”, Jimmy diz para Kacey. Ele retira o
braço e bate de leve na bunda dela a apressando para entrar na
limusine.
Um sorriso envergonhado cintila sobre os lábios de Kacey, e
ela não olha para mim quando entra.
Jimmy Ray estende a mão para mim, e eu aceito como um
hábito profissional.
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“Tudo está perdoado, amigo.” Ele me puxa para perto. “Eu
espero que você tenha se divertido com minha garota na noite
passada, mas não vamos fazer um hábito disso, sim? Não vamos
gastar todas as cartas.”
Sua mão escorre para fora da minha, deixando uma nota
de cem dólares na minha mão.
Amasso o dinheiro em meu punho enquanto ele sobe na
parte de trás. Apenas a ameaça de perder o meu trabalho me
impede de jogá-lo no chão. Fecho a porta da limusine com força
— colocando o cabelo para trás — e acondiciono as malas da
banda no porta-malas.
Uma vez atrás do volante, meus olhos ardem para
encontrar Kacey no espelho retrovisor, mas a partição sobe,
abafando os sons de conversas e risos. Saio de Summerlin e os
levo para a Strip, já brilhando no crepúsculo que cai.
A leste do Flamingo, perto do centro de convenções, que dá
para a avenida e manobro para o estacionamento traseiro do
Pony Club, assim como fiz na noite anterior. Abro as portas e
descarrego as malas, uma por uma, assim como na noite
anterior. Mas agora estou plenamente consciente de Kacey atrás
de mim, esperando sua vez. Ela vem por último, e viro para
entregar sua bolsa. Seus olhos são azuis-celestes e iluminados
pela luz âmbar sombria do poste que se acende acima de nós.
“Então, Jimmy pediu por você pessoalmente”, ela diz em
voz baixa, enquanto os outros esperavam na porta.
“Ele pediu.”
“Espero que ele não tenha sido um saco para você. Ele pode
ser…”
“Imbecil?”
“Sim. Mas ele é um bom empresário.”
Eu fecho o porta-malas. “Isso é tudo que importa.”
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Uma dos membros da banda, uma menina com o cabelo
azul e preto, enfia a cabeça para fora da porta. “Kace?”
“Já vou.” Kacey diz por cima do ombro. “Essa é Lola, minha
melhor amiga. Ela me meteu nessa banda. Se não fosse por ela,
eu provavelmente estaria nas ruas. Não posso decepcioná-la, você
entende?”
Ela parece que estava tentando se virar sozinha até fazer
algo assustador. Meu instinto é de consolá-la ou protegê-la, mas
de quê? Como?
“Posso ajudar?” Eu digo.
“Você vai estar aqui depois do show?” Ela pergunta, com o
rosto aberto e esperançoso, um sorriso triste.
“Sim, Kacey. Estarei aqui”, digo suavemente. “Eu vou te
levar para casa.”
“Estou tão feliz”, ela diz. Ela arrasta os pés, não muito ao
encontrar meus olhos. “Estão falando de uma festa depois, em
Summerlin. Uma tonelada de pessoas está vindo... os caras do
show de abertura. Você deveria vir. Quer dizer, se você quiser. Se
você puder.”
Eu não poderia. Nós não somos autorizados a
confraternizar com nossas cargas, mas o desejo de protegê-la é
feroz e nem a política da empresa, nem as minhas regras estritas
sobre rotina poderiam mudar isso.
Sua amiga, Lola, surge na porta novamente. “Kacey. Você
não pode nos atrasar de novo, querida. Estou falando sério.”
“Eu tenho que ir.” Kacey estende a mão e aperta a minha
mão. “Vejo você depois?”
Ela corre para se juntar a sua banda, e tento imaginar esta
menina tocando sua guitarra elétrica no palco, na frente de uma
plateia gritando. Ela parece pronta para rachar em pedacinhos, e
além de sua amiga com o cabelo em dois tons, parece que ela não
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tem a porra de uma pessoa no mundo para ajudar a resolver
tudo.
Limpo a mão no bolso da calça do uniforme como se eu
pudesse limpar o seu toque e os sentimentos que vieram com ele,
mas ainda posso sentir sua pele macia contra a minha.
Deslizo atrás do volante para esperar o show. A fila de
limusines atrás da minha cresceu, e aposto que Trevor está entre
eles, ainda não aprendeu a tirar o paletó maldito enquanto espera
no calor.
Ao contrário da monotonia da noite passada, eu passo esta
noite com os meus nervos a flor da pela, esperando para ver se
Kacey está bem, e chateado comigo mesmo por estar preocupado.
Cada ondulação abafada da multidão me fez estremecer e eu meio
que espero Hugo correr para fora da porta de trás com ela em
seus braços novamente.
Depois de duas horas, o meu nervosismo se resume em
uma pontada surda na boca do estômago. Um homem sem-teto
vem até mim, pedindo uns trocados. Entrego a ele a cédula
amassada de cem dólares que Jimmy Ray tinha me dado. Os
olhos do homem sem-teto estão cansados e aprofundados no osso
fundo. Ele arregala os olhos quando me oferece um sorriso
banguelo de profundo alívio antes de esgueirar de volta para a
noite.
São os cem dólares mais bem gastos.
É perto de vinte e três horas quando o show termina.
Através do beco que dá para a rua, vejo uma corrente de
frequentadores do bar indo embora. Eu coloco meu paletó de
volta e espero na porta da limusine pela banda.
Uma hora depois, eu ainda estou esperando, suando como
o Trevor.
Finalmente a porta se abre, a Rapid Confession sai e os
caras da banda que fez o show de abertura. Todos eles bêbados,
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chapados e rindo com um pós-show elevado. Eu procuro por
Kacey. Ela está em sua roupa de show agora: calças de couro
pretas apertadas, e um top preto frente única decotado que revela
um vale de pele lisa entre a curva suave de seus seios. Tatuagens
em seus braços contrastam contra sua pele pálida, o cabelo ainda
está amarrado bagunçadamente na cabeça, mechas caindo soltas
para enquadrar o rosto.
Kacey parece desgastada do show — suada, desgrenhada e
bêbada. O baterista tem um braço pendurado em seu pescoço.
Ambos cambaleiam. Como Kacey subiu não muito graciosamente
para a limusine, seus olhos encontram os meus, vidros com licor.
Ela me dá um sorriso amuado antes de desaparecer lá dentro.
Jimmy e empresário da outra banda entram por último,
sem olhar na minha direção. Eu fecho a porta atrás deles, blindo
a cacofonia de risos e conversas altas.
No trajeto para Summerlin, meus olhos continuam se
desviando para o espelho retrovisor e duas vezes eu mal consigo
evitar bater na traseira do carro na minha frente. Mas, enquanto
a divisória está baixada, fico tentando pegar um vislumbre de
Kacey, para me certificar de que ela está bem.
Por que você se importa? Ela é uma estrela do rock. Isso é o
que eles fazem.
Mas eu me importo. Ela bebeu até o esquecimento na noite
passada e ficou tão perdida novamente esta noite. Ela me disse
no almoço hoje que estava com medo, mas de quê? Do que
aconteceu na festa? Ou algo mais? E por que, no espaço de vinte
e quatro horas, seus medos tornaram-se tão importantes para
mim?
Paro na rotatória da entrada da mansão cor de rosa em
Summerlin. Desta vez, as luzes estão acesas em cada janela.
Quando abro a porta da limusine, um grande emaranhado de
corpos cambaleantes e risos derramados saem. Arrisco um
palpite que o minibar foi invadido até os cubos de gelo.
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O baterista da banda de abertura está em cima de Kacey, e
quando o grupo vai para a casa, eu a vejo tentando empurrá-lo.
“Saia”, ela diz, e cambaleia para trás. O cara ri e diz algo
que eu não posso ouvir. Ele vai para cima dela novamente, um
braço serpenteando ao redor da cintura para prendê-la a ele.
“Não”, ela diz, com a voz abafada contra o peito do rapaz
quando ele a prende perto. A cabeça inclinada, a boca em seu
pescoço e sua outra mão desliza para baixo contra o peito.
“Ryan... pare...”
“Ei!” A amiga de Kacey, Lola tenta afastar ela do cara e
começa a cambalear em direção a Kacey para ajudar.
Eu sou mais rápido.
Pego o baterista pelo ombro e empurro para longe de Kacey
tão forte que ele tropeça em seus calcanhares e cai de bunda no
chão.
“Ela disse para parar, imbecil”, digo. O baterista fica de pé,
sua expressão transformando de confusão para a raiva. Olho para
baixo, e quando Kacey cai em mim, com o rosto enterrado contra
minha jaqueta, meu braço vai ao redor dela.
“Quem diabos é você?” Os lábios do baterista se curvam em
um sorriso de escárnio. “O motorista…”
“Ok, ok”, Jimmy Ray diz, movendo-se entre nós. “Vamos
todos nos acalmar. Somos todos amigos aqui...”
“O inferno que somos”, digo, não tirando os olhos de Ryan.
Um braço mantém Kacey apertada, o outro está com a mão em
um punho ao meu lado. A adrenalina corre em minhas veias e me
sinto bem pra caralho, e imprudente. Eu não sou cara violento,
mas se esse bastardo quer uma luta, darei a ele.
Os membros da banda, com alguma insistência de Jimmy,
vão para a casa. Ryan está bêbado demais para brigar e acho que
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ele sabe disso. Ele me mostra o dedo e se deixa ser puxado por
seus companheiros. Lola fica para trás.
“Estamos todos bem?” Jimmy pergunta. “Você está bem,
gatinha?”
Kacey afasta-se do meu braço, mas fica perto, segurando a
manga do meu casaco. Ela dá um sorriso duro. “Claro, Jimmy.
Estou bem.”
“Que se foda isso”, Lola diz, olhando para seu empresário.
“Se Ryan tocá-la mais uma vez eu vou cortar o pinto dele fora.
Livre-se deles, Jimmy. Encontre outra banda para a abertura.”
Eu gosto dessa Lola.
Kacey acena com a mão. “Não, não, não é um grande
negócio. Está bem…”
“Não, não está tudo bem”, eu digo.
Jimmy coça o queixo. “Isso tem que ser uma grande coisa?
Agora mesmo? Eu tenho uma centena de pessoas vindo a esta
festa...”
Enquanto fala, os outros carros chegam, táxis e limusines
— um fluxo constante de pessoas. Se eu não mover logo a
limusine, vou acabar ficando travado.
Olho para Kacey. Ela está bêbada, e se eu deixá-la ir para
dentro daquela casa, ela só irá ficar mais bêbada. Ou desmaiar.
Ryan pode decidir pegar o que ele quer de qualquer maneira, e
em uma casa desse tamanho, com uma festa em fúria, quem
saberia?
Mantenha a rotina, eu penso, mesmo quando minhas mãos
se movem por conta própria. Tomo o rosto de Kacey e inclino
suavemente, fazendo-a olhar para mim. Sua ampla boca treme
sob batom vermelho. Maquiagem escura puxa seus olhos em
safiras azuis, azul pálido com um anel mais escuro ao redor da
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íris. Eu não notei isso antes. Bonita. Ela não pertence a esse
lugar.
“Você quer ir embora?” Pergunto.
Seus olhos seguram meu olhar, o álcool escureceu o brilho
que eu tinha visto neles durante o nosso almoço. Mas sua voz é
firme quando responde “Sim, eu quero.”
Eu sorrio para ela, estranhamente orgulhoso. “Feito.”
Seus olhos vidrados se arregalam de surpresa, em seguida,
com uma rajada de ar encharcada de uísque, ela murcha contra
mim. “Está tudo bem, Jimmy”, ela murmura. “Jonah... Ele é
muito bom para mim.”
Eu a levo para o banco da frente da limusine e a ajudo. Sua
cabeça pende contra o encosto de cabeça, os olhos fechados, e eu
afivelo o cinto de segurança nela para mantê-la segura.
“Faça uma mochila por favor?” Digo a Lola, fechando a
porta.
Ela estreita os olhos para mim, me avaliando, em seguida,
balança a cabeça e entra na casa.
Jimmy olha atrás dela, em seguida, vira-se de volta para
mim. “Fazer uma mochila?”
“Ela vai ficar comigo alguns dias”, digo.
Ele solta o ar as bochechas. “Nós estamos indo embora
daqui na terça-feira.” Ele está bêbado como o inferno também,
mas tentando manter alguma autoridade. “Eu tenho vinte e cinco
cidades mais agendadas e ela está sob contrato. Só para você
saber.”
“Eu sei”, digo, minha voz dura. Elevo sobre ele todo o meu
um metro e oitenta. “Ela está fazendo uma pausa desse
escândalo.”
E depois? A voz da razão me pergunta. Eu ignoro.
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“Uma pausa. Sim, está bem.” Jimmy acende um cigarro e
aponta os dois dedos para mim. “Eu sei onde você trabalha. Se
você deseja manter o seu emprego, você cuida dela.”
“Melhor do que você tem cuidado”, eu digo.
“Você acha que é especial para ela? Seu herói?” Ele bufa
uma risada. “Entre na fila, amigo.”
Ele se retira para a casa que está enchendo rapidamente.
Lola volta com uma mochila e uma pequena bolsa de couro. Pego
e vou até o porta-malas.
“Qual é o problema aqui?” Lola pergunta. “Vocês dois
estão...?”
“Não.” Jogo as bolsas no porta-malas. “Ela precisa de
algum tempo longe. Obviamente.”
“Então, ela fica alguns dias em seu sofá, e depois nos
reencontra antes de deixarmos Vegas?”
“Esse é o plano.” Eu bato a porta do porta-malas. “Se você
está preocupada ou não se ela estará segura comigo, ela está. Eu
juro pela minha vida que nunca iria machucá-la, ok?”
Lola balança a cabeça lentamente. “Certo, tudo bem. Isso
pode ser bom. Não mataria Kacey permanecer sóbria durante
quarenta e oito horas consecutivas. Eu a amo muito, mas ela é
uma porra louca. Esta é a nossa grande chance. É a minha
grande chance, e se ela mantiver seu juízo tempo suficiente, verá
que é sua grande chance também.”
Eu duvido. Vou para o lado do motorista.
“Eu vou ligar para ela”, Lola me diz, seguindo. “Para ter
certeza de que ela está bem.”
“Espero que sim”, eu respondo, e bato a porta.
Você não pode cantar pneu com uma limusine, mas chego
perto, e a mansão rosa desbotada fica fora do meu retrovisor.
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Eu dirijo de volta para A-1 para entregar a limusine,
apressando Kacey através da garagem para minha caminhonete.
Por algum milagre ninguém nos vê. De volta ao meu apartamento,
assim como ontem à noite tudo de novo, exceto que Kacey não
cheira a vômito e fumaça. O aroma de seu perfume, seu suor e
um tom de uísque impregna o ar enquanto eu a ajudo a sair da
caminhonete.
Desta vez, ela não está fria, mas está nadando em
embriaguez, às vezes profundamente e dificilmente capaz de
manter seus pés, às vezes chegando a caminhar comigo. Duas
vezes ela joga os braços em volta do meu pescoço e murmura em
meu ouvido como ela está grata por tê-la salvado. Minha pele
eclode em arrepios e minha virilha aperta quando a deito na
minha cama.
“Jonah”, ela suspira, ainda agarrada a mim, tentando me
puxar para baixo na cama com ela. “Você é tão bom para mim. O
último bom homem na terra.”
“Kacey, calma...”
Tento erguer suavemente os braços do meu pescoço, mas
ela é tenaz. Seus lábios roçam minha pele acima do meu
colarinho do uniforme. Beijos quente e molhados ela deposita sob
meu ouvido, trabalhando até os dentes roçar minha orelha, e
tenho que cerrar os dentes. Ela lambe e brinca, sua boca uma
força gravitacional e estou sendo sugado para dentro, pronto para
entrar em colapso sobre ela, dentro dela. Minhas mãos querem a
suavidade de sua pele e cabelo, a curva completa de seus seios
sob a palma da mão...
“Kacey”, eu digo. “Nós não podemos ...”
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“Nós podemos”, ela sussurra contra minha bochecha. Sua
boca se move ao longo da minha mandíbula, lábios abrindo
caminho através da pele que não tinha sentido o toque de uma
mulher em mais de um ano. Suas mãos emaranhadas no meu
cabelo, pequenos barulhos ofegantes saem de sua garganta. Sua
boca já está quase na minha, quando uma rajada forte de uísque
enche meu nariz, trazendo-me a lucidez como um tapa.
Que diabos está fazendo?
Eu me afasto antes que seus lábios encontrem os meus e
eu saio de seu abraço.
“Você não é divertido”, ela murmura, e depois estende os
braços sobre a cabeça, os dedos abertos na cabeceira de madeira.
Seus seios empurrando contra o frágil tecido reluzente de seu top
preto de frente única. “Não seja assim. Vamos para a cama,
baby.”
Realidade cai sobre mim como um balde de água gelada.
Eu poderia ser qualquer um no momento.
“Você precisa dormir”, digo. Abro o zíper da mochila que
Lola embalou para ela, e procuro lá dentro até que encontro uma
camiseta e um short leve. Eu os coloco na cama e vou para a
porta.
Assim que desligo a luz, em seguida, sua voz ressoa,
pequena e frágil no escuro.
“Espere. Jonah...? “
Paro, mas não me viro, meus ombros curvados. “Sim?”
“Fique. O teto... ele está girando...”
Não faça isso.
Eu faço. Que droga.
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E m m a S c o t t
Viro e me movo lentamente de volta para a cama. A única
luz vem da rua, uma luz branca lançando um brilho prateado
sobre a cama e através de seu cabelo que escapou do nó. Ela
estende sua mão. Pego, e me sento ao lado dela.
Kacey esgueira-se perto de mim, aperta sua bochecha
contra a minha coxa e coloca o braço em volta dos meus joelhos.
“Onde estou?” A voz dela está enrolada um pouco, fraca como o
sono. “Onde estou, Jonah?”
“Você está segura, Kacey”, murmuro. Seguro-a por um
tempo, então a ajudo a vestir suas roupas confortáveis com o
cuidado de manter meus olhos desviados, tanto quanto possível
de seu corpo, pálido e suave e estendido diante de mim.
Puxo as cobertas. E porque eu penso que ela não irá se
lembrar disso de manhã, eu acaricio seus cabelos até que ela
adormece. Então eu saio, fechando a porta suavemente atrás de
mim.
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E m m a S c o t t
CAPÍTULO 9
kacey
Alguém está usando aquela maldita motosserra novamente.
Eu me levanto, acordada, piscando na luz do amanhecer
que surge a partir de uma pequena janela. Ele ilumina um
quarto: cama, armário, mesa de cabeceira, toda planície em uma
espécie de facho de luz. No chão ao lado da cama estão a minha
mochila e a pequena mochila de couro que serve como minha
bolsa. Fora da porta, o zumbido continua.
Jonah e seu liquidificador barulhento.
Levo um minuto para montar as peças do quebra-cabeça
da noite passada. Memórias vêm a mim como fotografias
espalhadas: o baterista da banda Until Tomorrow, o nosso show
de abertura, me acariciando antes que Jonah batesse em sua
bunda.
“Você quer sair daqui?”
E eu me senti tão segura...
Sento lentamente e empurro para trás as cobertas para
encontrar uma camisa e short. Uma vaga lembrança vem até
mim: Jonah me ajudando a tirar meu jeans de couro, ajudandome
a trocar de roupa...
Eu o beijei. Apenas seu pescoço e orelha... Mas ele cheirava
tão bem. Tentei puxá-lo para a cama e...
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E m m a S c o t t
“Oh meu Deus.” Vergonha corre escarlate sobre a minha
pele e eu seguro minha cabeça doendo em minhas mãos. “Não,
não, não... Não Jonah. Ele não.”
Não era o álcool. Não inteiramente. Foi a maldita insaciável
necessidade de conexão, tentando encontrar conforto em
qualquer lugar e de qualquer maneira que posso. Jonah tomou
conta de mim, me protegeu, e eu o reduzi ao mesmo nível que os
caras sem nome que jogo na minha cama.
Eu olho para a mesa de cabeceira. Um copo de água, duas
aspirinas.
As lágrimas saltam dos meus olhos.
O rádio relógio marca 07:04. Jonah irá partir para a Hot
shop a qualquer minuto. Levanto, abro a porta do quarto e
caminho para o corredor estreito. O liquidificador fica em silêncio
e ouço vozes masculinas conversando. Outra pessoa está aqui.
Eu me mexo na ponta dos meus pés, congelados. Parte de mim
pede para escorregar de volta para o quarto e me esconder, fingir
que nada disso aconteceu. A outra metade, doente de se esconder
atrás de vodca e uísque, empurra-me para a cozinha.
Jonah parece completamente bonito em jeans e uma
camisa azul claro. Ele toma uma pílula do compartimento de
domingo em um desses recipientes de medicação de dia-dasemana.
O resto dos compartimentos foram abastecidos, suas
tampas em cúpulas. Ele toma a pílula com o que parece ser um
copo de lama e terra. A careta que torce seus lábios me diz que a
bebida não tem um gosto melhor do que sua aparência.
Uma tosse rouca me sacode dos meus pensamentos. O cara
quente das fotos na parede da sala de estar se apoia no balcão,
vestido com uma camiseta preta e jeans. Seus braços
musculosos, coberto com tatuagens tribais, cruzados contra um
peito largo. Seu cabelo escuro está cortado curto e uma barba
fina cresce ao longo de sua mandíbula. Ele é uma versão mais
volumosa, mais robusta de Jonah. Tem que ser seu irmão. Mas
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onde o rosto de Jonah é bonito em seu aberto comportamento,
amigável, seu irmão é fechado, tenso e sombrio. Seu olhar
irritado dispara entre mim e os medicamentos de Jonah, como se
ele não pudesse acreditar que as duas coisas possam coexistir no
mesmo espaço.
O sentimento de ser uma intrusa novamente torce meu
estômago já instável, em seguida, Jonah vira-se para mim. O
sorriso que abre em seu rosto quando me vê me aquece como um
sol de verão.
“Hum, oi”, eu digo. “Bom Dia.”
“Ei.” Jonah avista a expressão espantada de seu irmão, e
muda sua própria expressão rapidamente de volta para a posição
neutra. “Kacey, este é meu irmão, Theo. Theo, esta é Kacey
Dawson. Ela vai ficar aqui por alguns dias.”
“Prazer em conhecê-lo, Theo.”
Apesar de seu olhar mortal do inferno, meu instinto é de
abraçar Theo; eu sou de fortes abraços. E porque ele é irmão de
Jonah eu imediatamente sinto uma sensação de afinidade por ele.
Mas seu olhar frio me prende no meu lugar.
Os olhos de Theo me analisam de cima a baixo, fixando-se
em meu cabelo bagunçado, minha camiseta longa que cobre meu
short e faz parecer que não estou usando nada por baixo. É
bastante óbvio que Theo assumiu que está acontecendo algo
entre seu irmão e eu, e ele não gostou.
“Quando isso aconteceu?” Ele exige de Jonah, nem sequer
se preocupar em esconder o tom de acusação em sua voz.
Isso? Eu sou um isso? Eu acho que não, amigo.
Antes que Jonah possa responder, eu digo, “Isso aconteceu
na noite passada. Nós nos casamos em uma dessas capelas vinte
e quatro horas, não foi... Johnny? Jordan?” Eu bato meus dedos,
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meu rosto franzido em confusão. “Espere, não me diga... é
definitivamente um nome com J.”
Jonah sufoca uma risada.
Theo olha com raiva, mas me ignora. “Ela vai ficar aqui?
Por quanto tempo? Quando você ia me contar?”
“Sim, até terça-feira, e eu ia agora mesmo, mas Kacey
chegou antes de mim”, Jonah diz. “E Jesus, você está sendo rude
pra caramba. Até mesmo para você.”
A mãe de todos os silêncios constrangedores desce sobre
mim, quando os irmãos se encaram e trocam uma conversa
privada; Eu praticamente posso ouvir os pensamentos passando
entre eles como palavras.
Finalmente, limpo minha garganta e aponto para um saco
de mantimento no balcão, cercado por cremes e açúcares. “O que
é tudo isso?”
Os olhos de Jonah lentamente deixam Theo. “Eu saí e
comprei algumas coisas.”
“É gentil de sua parte, assim tão cedo.” Eu cheiro o ar.
“Descafeinado não cheira tão bem...”
“Isso é porque é o normal.” Jonah puxa uma caneca UNLV
de um armário, enche e me entrega.
“Obrigada.” Eu ando cuidadosamente passando por Theo.
Sua antipatia por mim ainda emanando dele como o calor de uma
fornalha. Sento em um banco do outro lado do balcão, colocando
a minha camisa um pouco para cima para provar que estou
vestindo shorts.
Vejo o olhar de Theo pousando na caveira tatuada na
minha coxa esquerda. Por um breve momento, sua expressão se
solta, aguça a sua curiosidade. Tento iniciar uma conversa sobre
suas tatuagens, quando o seu olhar de morte volta, como uma
porta batendo na minha cara.
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Ele sai do seu assento do balcão. “Você está pronto,
mano?” Ele diz. “Vamos acertar isso.”
Jonah termina seu shake de proteína e joga o copo na pia.
“Eu estarei de volta em poucas horas”, ele diz para mim. “Então
você não ficará abandonada para o almoço.”
Os olhos de Theo se arregalam. “Você não está indo para o
trabalho durante o almoço?”
“Primeira vez para tudo”, Jonah responde.
“Não, eu não quero estragar sua agenda”, eu digo. “Você
tem um monte de trabalho a fazer. Eu vou ficar bem aqui,
realmente.” Eu olho para o Theo. “Sério.”
“Sério”, Theo diz, inexpressivo.
“Sério, estarei de volta para o almoço”, Jonah diz. “Se você
precisar de mais alguma coisa, há uma loja de conveniência aqui
na rua, a cerca de dez minutos a pé. Dê-me seu número de
celular, e vou ligar se acabar me atrasando.”
Theo observa atentamente como Jonah e eu trocamos
números de celulares. “Você ainda está vindo para jantar hoje à
noite, certo?” Ele diz. Ele olha para mim, com fogo em olhos
castanhos duro e difícil. “Fazemos isso todos os domingos.
Somente família.”
Jonah esfrega as mãos sobre o rosto. “Jesus Cristo, Theo.”
Por meio segundo, Theo parece arrependido, então se
transforma em pedra novamente. “Estarei esperando na
caminhonete.” Ele caminha até a saída do apartamento e fecha
com força a porta atrás dele.
“Prazer conhecê-lo”, digo para minha xícara de café.
“Eu sinto muito. Ele realmente se tornou uma dor na
bunda desde...” Jonah ri. “Desde o nascimento, na verdade.”
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“Ele trabalha com vidro também? É por isso que ele está
indo para a loja?”
“Não, ele é um artista de tatuagem.”
“Sério? Eu estava pensando em fazer outra tatuagem. Pena
que ele me odeia.”
“Ele não te odeia. Ele é apenas... protetor. Ele me ajuda na
loja às vezes. Eu tenho uma assistente também. Tânia. Mas ela
está de folga aos domingos.”
“Então, ele dirigiu aqui para buscá-lo?”
Jonah passa a mão pelo cabelo. “Sim, estamos... Somos
próximos. E ele gosta de passar tempo comigo.”
“Assim, apesar de latir e rosnar, ele é um molenga.”
Lá fora, um carro buzina, alto e em bom som.
Começo a rir.
Jonah ri também e depois um breve silêncio cai. Acho que é
agora ou nunca, se vou pedir desculpas pela noite passada.
“Isso foi bom, você me deixar dormir na sua cama na noite
passada. Eu estava... muito bêbada. Não queria despejá-lo. Ou...”
“Você não me despejou”, Jonah diz. “Eu não durmo na
cama. Eu não tenho dormido lá cerca de quatro meses.”
Pisco. “Hum, bem, eu vou perguntar. Onde você dorme?”
Ele acena com a cabeça em direção a sala de estar atrás de
mim. “Na cadeira. Meu médico quer que eu durma semiinclinado.
Para respirar melhor. Não é um grande negócio”,
acrescenta rapidamente.
Eu faço uma careta. Soa como um grande negócio. O que
aconteceria se ele dormisse deitado? Ele pararia de respirar? Eu
não posso perguntar, então ao invés disso eu digo “É...
confortável?”
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“É apenas mais um ajuste.”
“Por que você não compra uma dessas camas chiques,
reclináveis? Que você pode elevar a cabeça?”
“Não cabe no orçamento”, Jonah diz e um olhar azedo
contorce seu rosto. Ele se inclina para a frente, as mãos no
balcão, com a cabeça pendurada entre seus braços.
Meu coração pula uma batida. “Jonah?” Cada músculo do
meu corpo fica tenso. “Você está bem?”
“Tudo bem”, ele diz para o chão, inspirando grandes
lufadas de ar. “Só náuseas.”
“Você quer um pouco de água?” Eu já estou fora do banco e
vasculhando seu gabinete atrás de um copo. Encho até a metade
da torneira e pressiono em sua mão.
Ele aceita e bebe um pouco. “Obrigado”, ele diz. “Está
passando.”
Eu sinto o cheiro da sua loção pós-barba — limpo e
masculino. A memória de sua pele sob a minha boca faz meus
joelhos tremerem. Eu sento de volta no meu banco, com as
bochechas queimando.
Jonah dá um último suspiro, profundo e põe a água de
lado. “Obrigado novamente.”
“Isso acontece muito?” Pergunto. “Quando você toma essas
pílulas?”
Ele assente. “Elas são imunossupressoras. Elas evitam que
o meu organismo rejeite o coração, mas seus efeitos colaterais
não são divertidos.”
Tento pensar em algo melhor para dizer, algo reconfortante,
ou algo engraçado para fazê-lo rir, mas tudo que consigo pensar é
que sinto muito que ele tenha que sofrer tudo isso.
Do lado de fora, o carro buzina novamente.
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“Meu irmão, a epítome da paciência”, Jonah diz. “Vejo você
depois.”
Ele está na porta, girando a chave. Em poucos segundos,
irá embora e eu ainda tenho negócios inacabados. Reúno a minha
coragem. “Jonah?”
Ele para, se vira. “Sim?”
“... sinto muito sobre a noite passada.”
Ele endurece. “Está bem. Nada demais.”
Molho meus lábios que estão secos, e deslizo para fora do
banco, movendo-me para ficar atrás do sofá, uma barricada.
“Não, isso é um grande negócio. Para mim. Eu realmente
sinto muito que tentei... não é uma coisa sexual.” Eu arranco um
pedaço de tecido inexistente no estofamento. “Ok, é um pouco de
uma coisa sexual. Quem não gosta de sexo, certo?” Eu rio
fracamente, então tusso. “Mas, principalmente, é apenas pelo
conforto. O depois. Ser abraçada por um homem enquanto
durmo. Tenho certeza que soa patético, mas é o que eu gosto, e
sinto muito que tentei fazer isso com você. Você é mais do que
isso.”
Jonah balança a cabeça, com uma expressão de dor. “Eu
não posso ser mais do que isso, Kacey.”
“Não, eu quis dizer, você é um amigo. Ou talvez possamos
ser amigos. Se você quiser. E isso é tudo que eu quero.
Honestamente, não posso estar com alguém agora, mesmo se eu
quisesse. Caso você não tenha notado, eu sou uma bagunça.”
“Você é uma bagunça como qualquer outra pessoa”, ele diz
em voz baixa.
Meu peito se aperta, empurrando lágrimas aos meus olhos.
“Obrigada por dizer isso, embora não seja verdade.”
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Ele sorri, e mesmo que não seja o sorriso megawatt que
ilumina todo o seu rosto e me emociona, é amável e gentil. E
reconfortante.
“Eu realmente tenho que ir”, ele diz. “Estou atrasado.”
“Obrigada”, digo enquanto abro a porta da frente. “Pelo café
e por me deixar ficar aqui. Obrigada por tudo. De verdade.”
“Você é bem-vinda”, ele diz. “De verdade também.”
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CAPÍTULO 10
jonah
O carro Chevy Silverado preto de Theo já está ligado
encostado no meio-fio. “Mais do que na hora”, meu irmão diz,
carrancudo quando entro. “Essa garota já está te trazendo
problemas.”
“Não foi ela”, digo. “Foi a maldita Gengraf.”
“Náusea?” Theo diz, seu tom instantaneamente mudando
da raiva para a preocupação. “Você está bem?”
Eu lanço um olhar a ele. “Essa garota pegou um pouco de
água para mim e eu me senti melhor.”
Theo bufa. Seus olhos me inspecionam, uma vez mais, em
seguida, ele manobra a caminhonete através do semáforo na
manhã de domingo para o estúdio de vidro. Eu assisto o norte de
Las Vegas passando pela janela — centros comerciais e postos de
gasolina, conjuntos de apartamentos mais pequenos e mais
velhos do que o meu — mas meus pensamentos estão no pedido
de desculpas de Kacey.
Eu não posso estar com ninguém agora ...
Perfeito. Nem eu posso.
Então, por que meu peito dói como um velho hematoma?
“Você pensa sobre ela?” Theo diz.
“Kacey?”
“Não, Madre Teresa. Sim, Kacey. Quem diabos é ela?”
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“Por que está tão hostil? Ela é apenas uma menina que está
no meu sofá.”
Theo observa a estrada, os ombros sacudindo-se em um
encolher de ombros. “Eu não quero ver outra situação fodida
como você teve com Audrey.”
“Eu estava com Audrey por três anos. Conheço Kacey por
vinte e quatro horas. Você pode relaxar.”
“Quanto você contou a ela sobre a sua situação?”
Mais do que eu deveria. Eu me mexo no meu lugar. “Ela
sabe que eu passei pela operação.”
Theo se enfurece comigo tanto tempo que penso que ele irá
bater sua caminhonete. Ele volta os olhos para a estrada, sua
expressão sombria. “Ok, fala. Qual é o problema com ela?” Ele
diz. “Sério.”
Eu descanso meu cotovelo na porta, esfregando o queixo.
“A questão é que ela tem alguns dias de folga até sua banda sair
da cidade em turnê. Ela está dando um tempo. É isso aí. Sério.”
“Por que ela não fica apenas em um hotel? E desde quando
você conta a estranhos sobre a operação?”
“Ela não fica muito bem por conta própria.” Eu olho para
ele. “Não é grande coisa. Estou dando-lhe uma pausa e ela é boa
como companhia. Ela tem um bom senso de humor. Nós nos
damos bem.”
Nós apenas... nos conectamos.
“Você a conheceu ontem.” A voz de Theo é baixa, mas posso
ouvir o temperamento estrondoso dentro dele, como uma
tempestade distante. Ele mantém seu olhar firme na estrada.
“Você está transando com ela?”
“Jesus, Theo.” No entanto, a imagem de Kacey espalhada
nua na minha cama tenta me alcançar. Eu queria ficar com ela
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na noite passada, queria ter braços e pernas de uma mulher em
volta de mim mais uma vez. Eu queria sentir o corpo macio de
uma mulher sob o meu, estar no topo dela e dentro dela e...
“Cara. Você está transando com ela?”
Esqueci que Theo pode ler meu rosto como a primeira
página de um jornal. “Não”, digo. “Não que seja da sua conta. Ela
está deixando de trabalhar até terça-feira, em seguida, vai voltar
para a turnê com sua banda. Ela estará viajando por todo o país
por meses.”
“E você está bem com isso?”
“Claro que estou bem com isso. O que poderia acontecer
entre nós? Ou entre mim e qualquer uma, já que estamos nesse
assunto?”
A mandíbula de Theo se aperta. “Não comece com essa
merda do fim do mundo. Você não sabe ao certo se...” Ele balança
a cabeça, sem vontade de expressar a possibilidade. “Os remédios
podem estar fazendo efeito. Eles provavelmente estão
funcionando.”
“Então por que você estava sendo um idiota com Kacey?”
Ele sacode os ombros num encolher de ombros. “Eu não
dou a mínima. O médico disse que você tinha que ter cuidado.”
“Ele disse que eu não poderia me cansar. Ele não disse que
eu deveria virar um monge. E sinto falta de estar com uma
mulher. Ser íntimo.”
“Você é que não faz sexo de uma noite só...” Theo diz. “Algo
que eu nunca vou conseguir.” Ele passa a mão pelo cabelo. “Olha,
se você quiser transar, transe. Eu só não quero outra situação
Audrey. Eu não quero que uma garota te traia quando você
precisar dela por perto, merda.”
“Nem eu”, digo. “O que Audrey fez... doeu, mas eu não
estava apaixonado por ela.”
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Paramos no semáforo vermelho. Theo se vira em seu
assento. “O quê?”
“Eu amei Audrey, mas não estava apaixonado por ela.” Eu
escuto minhas próprias palavras, à espera de um pouco de dor.
Mas a única dor não é pelo o que tive com Audrey, mas por algo
que eu nunca tive. “Eu nunca me apaixonei.”
Os olhos de Theo se arregalam. “Você não estava
apaixonado por Audrey? Realmente? Porque com certeza você
passou uma porrada de tempo com ela.”
“Eu a amava, mas ela não... me consumia. Eu não perdia
meu raciocínio quando ela entrava em uma sala, ou sentia aquela
sensação que começa...” Eu balanço a cabeça, procurando as
palavras. “Formamos uma boa dupla.” Como um par de sapatos,
penso. “Mas não tenho esse sentimento.”
“Esse sentimento?” Theo pergunta em dúvida.
“Esse sentimento que deveria ter quando se está com a
mulher que você está apaixonado. Eu não posso descrever esse
sentimento, porque nunca senti. E você?”
Theo me dá um olhar. “Estou me guardando para o
casamento.”
Eu solto uma risada. “Eu acho que você entendeu tudo ao
contrário.”
Os olhos de Theo endurecem novamente. “Então você não
estava apaixonado por Audrey. E você está tendo esta revelação
agora? Devido a Kacey?”
Viro meus olhos para minha janela. “Acabei de conhecer
essa garota pelo amor de Deus. Não, eu só queria dizer... já que
estamos no assunto. É algo que eu perdi. Estar apaixonado.”
“Você não perdeu”, Theo diz. “Você pode não ter perdido
nada. Se você quiser voltar para Morrison e fazer outra biópsia...”
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Eu suspiro, exausto de ter essa mesma conversa pela
milionésima vez.
“O que aconteceria se eu fizesse? Eu acharia um milagre
esperando por mim? A aterosclerose não vai se inverter.”
“Não, mas poderia ter abrandado a porra, ou parado
completamente. Talvez tenha mais tempo do que você pensa.
Muito mais tempo. Se não fosse assim tão pessimista...”
Ele mantém a esperança de que não está lá, mas sei a
verdade. Eu sinto na medula dos meus ossos, em cada pulso
enfraquecido do meu coração, suas paredes e passagens se
endurecem lentamente como o vidro esfriando.
“Para fazer outra biópsia”, digo, “eu perderia pelo menos
um dia inteiro na loja.”
Theo não diz nada e raiva fervente inflama em mim.
“Eu vou voltar depois da exposição da galeria, ok? Droga,
Theo, só estou tentando falar sobre algo real para fazer uma coisa
diferente, maldição. Eu sinto falta de ter alguém na minha vida.
Eu não sou egoísta; sei que é tarde demais. Mas eu perdi e é um
saco, ok?”
“Sim, cara”, Theo diz, mudando para um tom mais calmo.
“Isso é legal. Nós nunca conversamos sobre isso antes. Sobre o
que você quer.”
“Você quer dizer o que eu quero antes de morrer? Você
pode dizer, Theo. Gostaria que você falasse.”
“Para quê?” Retruca. “Que bem que isso faz a alguém?”
“Eu. A mim faz bem. Então, não me sinto como...”
“O quê?”
Assim tão sozinho.
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E m m a S c o t t
Nós paramos dentro do estacionamento da Hot Shop e Theo
desliga o motor. Ele senta em ereto, olhos para a frente enquanto
fala.
“Olha, se você quiser ou precisar de alguma coisa... digame,
está bem? Você está sempre falando sem lista de desejos.
Mas se há algo que você queira e que eu posso dar a você, digame,
está bem? Qualquer coisa mesmo.”
Morrer, aprendi que não é um esporte de equipe. É um
esforço solitário. Todo mundo que amo está de pé em terra firme,
enquanto eu estou sozinho em um barco, que lentamente se
afasta da costa, e não há nada que alguém possa fazer sobre isso,
somente observar acontecer.
Imediatamente me sinto péssimo por jogar a minha raiva
em Theo, ou dizer a ele o que perdi ou quero ou nunca poderia
ter. O que eles estão tendo, mas isso é somente apenas mais um
fardo para ele carregar? Só mais uma coisa que ele não pode
evitar. A dor que está em cada linha de seu rosto.
“Ok, obrigado, Theo. Fico grato por cuidar de mim.” Dou
um sorriso, e bato em seu ombro. “Vamos. Vamos ao trabalho.”
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CAPÍTULO 11
jonah
Theo poderia ser um artista de vidro se quisesse. Ele é
talentoso, e totalmente destemido. Ama o fogo, mas odeia a
fragilidade do vidro depois. Theo gosta de permanência. Ele
trabalha com tinta preta espessa que perfura sua pele, faz
sangrar, então permanece embutida para sempre. Nosso pai acha
que ele está perdendo sua incrível capacidade de desenhar e
esboçar trabalhando com tatuagens, mas é apenas o certo para o
meu irmão.
Nós trabalhamos em silêncio; mas mesmo com o rugidochiado
do forno, a Hot Shop é tranquila e os meus pensamentos
voltam à nossa conversa, para Theo, que tem estado comigo
através dessa doença, através da traição de Audrey. Ela não
terminou comigo, ela disse ao Theo, e em seguida saiu da cidade,
deixando a ele a incumbência de me dar a notícia.
Eu rolo o tubo na mão, observo enquanto as chamas o envolvem,
fazendo brilhar quente e branco...
Sentei em uma cadeira no escritório do Dr. Morrison. Não é a
sala branca de exame de onde ele normalmente me recebe, com
sua longa mesa, forrada de branco e a pequena bandeja de
instrumentos, luvas de látex, e seringas individualmente
embrulhadas. Aquele quarto é para os pacientes que estão
recebendo tratamento. Os pacientes que ainda estão na luta.
F u l l T i l t # 1
E m m a S c o t t
Hoje, eu estava no escritório do cirurgião Dr. Conrad
Morrison — cardiovascular e especialista em transplante cardíaco.
Em vez de um campo de batalha, foi onde o champanhe da vitória
estalou... ou onde as bandeiras brancas da rendição foram
jogadas.
Theo sentou ao meu lado, largado para baixo, roendo a unha
do polegar, sua perna sacudindo. Eu podia sentir a energia que
irradia do meu irmão mais novo. Ele pegou o brilho amarelo de seu
medo e queimou-o até que ficou vermelho quente e pronto para
entrar em combustão.
Eu esperava ser sacudido com medo. Não senti nada. Sem
medo. Nem mesmo o medo. Eu estava sob o medo. Entorpecido.
Esperamos por cinco minutos no consultório — vi o círculo do
relógio fazer cada volta. Cinco minutos que pareceram anos e
também nenhum segundo. A porta abriu e Dr. Morrison entrou,
uma pasta de arquivo debaixo do braço e um olhar sombrio no
rosto. Meu coração emprestado bateu contra minhas costelas,
quebrando a dormência. Imediatamente queria voltar. Sentir nada
era melhor do que este terror até os ossos.
Dr. Morrison tinha a aparência de um professor em seus
cinquenta anos, calvície, alto e um tanto desengonçado. Seus olhos
eram estreitos. Olhos de cirurgião, com uma vasta riqueza de
conhecimento e perícia médica por trás deles.
Ele me deu um sorriso fino e estendeu a mão trêmula.
“Jonah. Bom te ver. Desculpe tê-lo feito esperar.”
Eu meio que me levantei com as pernas instáveis e apertei
sua mão. “Sem problemas”, disse, olhando para a pasta de arquivo
debaixo do braço.
Esse arquivo que conta uma história absurda de um homem
— um jovem perfeitamente saudável, que nunca ficou doente em
sua vida, mas teve um ataque de amigdalite na quinta série —
atingido por um vírus que destruiu seu coração. Era grosso agora,
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cheio de análises de tipos de tecido, diagnósticos, exames de
sangue, exames laboratoriais, uma cirurgia de urgência, uma lista
muito longa de medicamentos imunossupressores, e, finalmente, os
resultados da biópsia. Dezessete deles. A de número dezoito foi
feita no dia anterior. Seus resultados ficam no topo.
“Theo”, o Dr. Morrison disse com um aceno de cabeça. Ele
não ofereceu a mão e Theo não se levantou de seu assento, apenas
acenou com a cabeça em retorno. Sua perna balançou mais rápido.
Dr. Morrison se voltou para trás da grande mesa de mogno
para sentar-se na cadeira de couro. Ele colocou a pasta sobre a
mesa, mas não abriu. Cruzou os longos dedos. Aquelas mãos que
tinham removido o coração doente do meu corpo há quinze meses,
e depois colocado um novo. Ele gentilmente baixou o órgão para o
espaço vazio, recolocando tudo o que foi necessário recolocar,
colocando a minha caixa torácica de volta em seu lugar e me
costurou.
Em vez de receber com alegria o novo coração, e apesar dos
vários coquetéis de drogas imunossupressoras que eu estava
tomando religiosamente nos últimos treze meses, meu corpo
atacou. Um ataque lento, mas implacável, mexendo com aquele
pedaço de intrusão estrangeira, deixando para trás feridas que se
tornaram cicatrizes. Em última análise, eram as cicatrizes que
estavam matando o novo coração. E me matando.
Dr. Morrison inspira. “Os resultados da sua mais recente
biópsia não são o que estávamos esperando, é...”
Ele fala e ouço as palavras, uma série de jargões médicos
que já eram para mim infinitamente familiares ao longo do último
ano, de modo que não pedi a tradução para um leigo. Palavras
como aterosclerose, estenose, doença vascular e isquemia
miocárdica. Um grupo de palavras em latim e emendadas com o
Inglês, costuradas com a ciência e autoridade, e acabando com a
última tentativa e chegando ao fim da linha.
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“Sinto muito, Jonah”, Dr. Morrison diz, com sua voz pesada e
baixa. “Eu gostaria de ter notícias melhores.”
mãe.
Balanço a cabeça em silêncio. Eu vou ter que contar à minha
O pensamento se enterra profundamente em minhas
entranhas como um veneno fervendo, queimando a última
dormência. Eu quase vomitei no meu colo. De alguma forma, falei
em vez disso.
“Quanto tempo?”
Dr. Morrison juntou os dedos sobre a mesa. “Dada a rápida
progressão do CAV, seis meses seria uma estimativa generosa.”
Eu balancei a cabeça, mentalmente fazendo a matemática.
Seis meses.
Minha obra de arte estava prevista para estar concluída
para a galeria nas exposições em outubro, cinco meses a partir de
agora.
Isso é muito, muito perto...
Theo levantou da sua cadeira, trazendo-me de volta ao
presente. Ele andava atrás de mim como uma pantera, seus olhos
escuros fixos no Dr. Morrison. A angústia em sua voz me atingiu
com cada sílaba.
“Seis meses? O que acontece em seis meses? Nada. Foda-se
seus seis meses. Ele volta para a lista, certo? A lista de doadores?
Se este coração está falhando, então você dá outro a ele.”
Dr. Morrison franziu os lábios. “Há algumas implicações
éticas...”
“Foda-se as implicações”, Theo diz. “Se ele estiver na lista,
ele está na lista. Um coração novo surge, e ele recebe. Certo?” Ele
vira para mim com os olhos ardentes. “Certo?”
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E m m a S c o t t
Eu não poderia ficar com outro coração de outra pessoa na
lista que poderia viver uma vida longa e feliz com ele. Eu tinha um
tipo de tecido raro. O mais raro. Encontrar um doador com
compatibilidade era quase impossível. Treze meses, em uma
corrida para salvar a minha vida, que me deu o melhor coração que
podiam, a compatibilidade mais próxima, e meu sistema
imunológico estava destruindo o órgão. Ele só faria o mesmo com
outro.
Eu não era assassino de nenhuma espécie, e não tinha
necessidade de ser. Ética e procedimentos médicos levariam a
decisão para longe das minhas mãos. As próximas palavras de Dr.
Morrison confirmaram.
“Sim, Jonah está de volta à lista de doadores.” Ele se vira
para mim. “Mas o seu tipo de tecido raro voltará a ser um fator, e a
rejeição crônica manifestada aqui, bem como a forma como os seus
rins estão lidando com os medicamentos imunossupressores. Eu
não posso dizer que estou otimista de que o Conselho vá aprovar
um reimplante...”
Eu podia sentir a raiva de Theo como um vento quente em
minhas costas. “O que quer dizer que não vai aprová-lo? Eles...
eles vão apenas deixá-lo...”
Ele estava no limite, eu podia ouvir isso e não aguentava
mais. Eu tinha que proteger o meu irmão mais novo, assim como
sempre protegi. Mantê-lo seguro.
Levantei, com minhas pernas fortes agora. “Obrigado, Dr.
M.” Eu ofereci minha mão. “Manteremos o contato.”
Dr. Morrison levantou, mas não apertou a minha mão. Em
vez disso, bateu no meu rosto igual um avô. “Você estará em
minhas orações, Jonah. Hoje à noite e todas as outras.”
“Orações.” Theo cospe a palavra no estacionamento. “Que
porcaria as orações irão fazer? Ele é um cientista. Ele precisa
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colocar sua bunda no laboratório ou algo assim e descobrir como
parar essa maldita rejeição.”
Então percebi. Tudo isso. Como um raio atingindo o topo da
minha cabeça e rasgando para baixo, quase me rasgando em dois.
Segurei o braço de Theo e ele parou com um solavanco.
“O que é isso? Jonah? Fale comigo…”
Puxo Theo para perto, o sangue inundando meu cérebro e
minhas palavras saindo em baforadas de ar rasas. Minha cabeça
inchada. Eu podia sentir o tempo correndo por mim, segundo a
segundo, e não poderia morrer ainda. Eu ainda não tinha acabado.
“Ajude-me, Theo.”
“O quê?”
“Você tem que me ajudar.”
“Você... Você precisa de um médico...?” Sua cabeça virou
para as fileiras de carros estacionados, pronto para pedir ajuda.
“Não há médicos. Não mais. Theo, me escute. Preciso da sua
ajuda.”
“Diga”, ele disse. “O que você precisa? Qualquer coisa,
Jonah. Qualquer coisa.”
“Ajude-me a terminar”, eu disse, meus olhos perfurando os
seus. “Eu tenho que terminar, Theo. A exposição. Não importa o
que. Eu tenho que deixar algo para trás.”
“Não fale assim”, ele disse. “Você não vai a lugar nenhum...”
Eu tinha que fazê-lo enxergar. Abracei meu irmão, agarrei-o
com força. Ele era sólido e real, enquanto eu já estava me
dissipando no ar, partícula por partícula. “Não me deixe
desaparecer, Theo. Por favor. Ajude-me…”
Os olhos de Theo queimavam com as minhas palavras, e seu
aperto em meus braços se tornou doloroso. “Eu vou ajudá-lo” ele
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disse com os dentes cerrados. “Vou te ajudar. Qualquer coisa que
você quiser ou precisar... Eu estou aqui. E você também. Você não
vai desaparecer, Jonah. Maldição, você não vai.”
Balancei a cabeça e inspirei por várias correntes de ar.
“OK. Ok, obrigado. Sinto muito, entrei em pânico, mas estou
bem agora. Desculpa. Vamos. Podemos ir agora.”
Comecei a andar e Theo não teve escolha a não ser seguir.
Eu podia sentir que estava me observando como um falcão. A
solidez dele me acalmou mais. Não sua raiva, que era um escudo
entre ele e o mundo, mas o que estava por baixo. Sua devoção
aqueles que amava. Inabalável e indestrutível. Permanente.
O sangue drenado da minha cabeça e meu coração
emprestado se estabeleceu. Ainda assim, o tique-taque suga meu
tempo a cada batida. Eu tinha um número finito de pulsos que
poderiam ser contados e medidos.
Seis meses.
Eu posso fazer isso, pensei quando subimos na pick-up de
Theo. Se eu fizesse uma rotina e me mantivesse nela. Se eu
trabalhasse tanto quanto eu podia, sem escalas, tinha que fazer
isso. Eu deixaria algo para trás. Não iria desaparecer no ar. Eu
usaria meu ar para infundir e moldar o vidro fundido, colocar
minha respiração dentro dele, e quando endurecido, uma parte de
mim permaneceria presa lá dentro para sempre.
Para sempre, pensei, sentindo um peso forte, uma
diminuição da sombra escura me arrastando, mesmo na luz do sol
brilhante do deserto. Um pouco de esperança para me levar. Uma
proposta.
Era hora de começar a trabalhar.
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A coleta de vidro no meu cano escorre de volta para a
fornalha, me tirando dos pensamentos. Como o vidro, minha vida
tinha sido derretida, maleável e cheia de potencial. Agora que está
solidificada; é resistente e endurecido. Nada de remoldar. Sem
começar de novo com alguém novo, porque não haveria tempo
para alguém novo se tornar alguém significativo. Eu tenho a
minha obra. Algo que vai perdurar, que não irá murchar e
morrer. Algo que vai ficar para sempre. A memória tem mais de
um ano, mas nada havia mudado. Era hora de começar a
trabalhar.
“Vamos almoçar e continuar” Eu digo ao Theo.
Ele levanta as sobrancelhas. “Sim? Eu pensei que você
iria...”
“Eu vou mandar uma mensagem a Kacey dizendo que
tenho que trabalhar. Ela pode pedir uma pizza ou algo assim”, eu
digo, ignorando o sentimento feio no meu íntimo, a culpa que
paira pesadamente no meu coração com a imagem dela.
Theo esfrega o queixo, parecendo alguém que lutou para
obter sua razão e agora se sente mal. “Se você tem certeza...”
“Eu tenho certeza”, digo, pegando meu telefone. “Eu tenho
que manter a agenda.”
E essa é a verdade.
Fim da história.
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CAPÍTULO 12
kacey
Tomo um banho para lavar a noite passada de mim. Tudo:
o show, a bebida, e como me joguei em cima de Jonah. Depois,
me enrolo em uma toalha, faço um turbante sobre o meu cabelo
com a outra e saio do vapor. Limpo o espelho do nevoeiro que
está sobre a pia para ver meu reflexo. Minha mão permanece no
vidro quente. Dentro estão os medicamentos de Jonah.
Ele confia em mim com eles, e isso me faz sentir bem
comigo mesma de uma maneira que não sentia há muito tempo.
Mas pensar sobre transplante de coração de Jonah faz a minha
coragem diminuir, como se eu tivesse engolido algo superforte
com o estômago vazio. Catástrofes médicas terríveis atingem
jovens inocentes todos os dias, mas isso parece como uma
bagunça cósmica. Um erro terrível. Eu não podia nem entender
porque a situação parecia tão errada.
Trago minha mão para a pele nua em acima da minha
toalha. Tento imaginar como seria ter um coração de alguém
batendo no meu peito. Ele sente como se fosse seu próprio? Ele
pode sentir que não é? Uma vez, quando era criança, eu
acidentalmente engoli um cubo de gelo. Senti a pedra dura e fria
no meu peito enquanto descia. Gostaria de saber se Jonah se
sente assim — não o frio, mas a presença de algo duro, pesado e
estranho em seu peito.
Você está sendo estúpida, digo a mim mesma. Tenho certeza
de que ele não sente nada diferente. Ou que se sente melhor. Seu
velho coração estava doente. O novo lhe deu vida.
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O pensamento me acalma um pouco, embora a suspeita de
que algo não está muito bem não me deixa.
Coloco um short e um top, e saio do banheiro. Mas o ar
condicionado se agita na janela e o apartamento fica em silêncio.
Pacífico. Sento no sofá para admirar o vidro bonito de Jonah na
mesa de centro. Pego o peso de papel com motivos marinhos, a
vida no mar sempre suspensa em um oceano calmo.
Mundos distantes.
Vinte e quatro horas atrás, minha residência era um dos
cinco quartos na mansão em Summerlin, os salões ecoando com
dezenas de vozes, música alta e risadas de bêbados em todas as
horas. Eu não sou a única festeira no nosso grupo — apenas a
mais dedicada. Meu quarto naquela casa está destruído: roupas
espalhadas por toda parte, maquiagem remexida no banheiro. O
único vidro ao redor não é uma arte delicada, mas cinzeiros sujos
ou garrafas vazias espalhadas pelo chão.
A paz do apartamento de Jonah se infiltra em mim. Eu
absorvo tudo isso, tento guardar em mim, para mais tarde,
quando tiver que pegar a estrada novamente.
Meu peito fica apertado com o pensamento de dizer adeus a
Jonah. Eu só o conheço há um punhado de horas, mas parece
ser mais tempo. Em torno dele, sou diferente do que sou com
outros homens. Em vez de me envolver em um desastre,
agarrando um corpo nu em uma névoa bêbada, nós conversamos.
Parece que estabelecemos uma base para algo mais duradouro.
Jonah tem alguma mágica em si, que me faz sentir como eu
mesma. Gosto de ficar perto dele e acho que ele gosta de passar
tempo comigo. Dado o tempo, quem sabe o que poderia
acontecer?
Só que não tem tempo. Qualquer coisa que começar apenas
vai acabar quando eu partir na terça-feira.
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“Nós podemos ficar em contato”, murmuro para mim
mesma. A louca, incansável agenda de turnê aparece na minha
frente como uma estrada sem fim, mas uma mensagem de texto
ou telefonema de Jonah poderia torná-la mais suportável. Só de
pensar nisso faz com que sair pareça um pouco menos
assustadora.
O toque do meu celular quebra o silêncio. Corro para o
quarto e tiro o telefone da minha bolsa para ver o número de
Lola.
“Oi.”
“Ei, garota”, ela diz, parecendo cansada na outra
extremidade. “Você ainda está viva?”
“Sim, mas você parece mal”, digo. “Como foi a festa?”
“Oh Deus, não consigo nem...”
Ouço o clique de um isqueiro, e me ocorre que eu não
fumei desde o show da noite passada. E nem senti vontade.
“Foi épico”, ela diz, exalando. “Bebida foi consumida. A
polícia foi chamada. Sexo foi praticado por muitos, incluindo esta
que vos fala.”
“Ah, é?” Estou sentada na beira da cama de Jonah.
“Quem?”
“Jason Hughes. O baixista da nossa breve-ex-banda de
abertura. É muito ruim, realmente. Ele é gostoso. Você deve
apreciar os sacrifícios que fazemos por você.”
“Por mim?” Então me lembro de Ryan Perry, o baterista,
ficando cheio de mãos comigo ontem à noite. Jonah entrou em
cena e Lola exigiu que Jimmy os mandasse embora até amanhã.
“Sim, por você”, Lola diz.
“Talvez nós possamos...”
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“Nós temos vinte e cinco cidades mais e cerca de seis meses
de turnê com esses caras. Você quer arriscar a sua sorte?”
Olho para as mãos no meu colo. “Tenho certeza de que
Ryan estava bêbado e sendo estúpido.”
“Sim, para ambos. Isso não é desculpa.” Lola exala, sua voz
acelera no modo sermão. “Você fica bêbada e estúpida também,
Kace, e seria apenas uma questão de tempo antes que ele se
aproveitasse da situação. Inferno, estou surpresa que ainda não
tenha acontecido.”
“Puxa, obrigada”, digo, minhas bochechas queimando. Eu
quase digo a ela que eu sei cuidar de mim, mas tenho zero
evidência para apoiar isso. Lola presta atenção em mim desde que
eu tinha dezessete anos de idade, quando o sucesso da banda se
transformou em um turbilhão de gravações e sem parar a turnê.
Eu nunca estive em meus próprios pés e nunca fiquei sóbria o
suficiente para tentar.
Mas eu poderia tentar. Se tivesse coragem...
“Desculpe eu estou aborrecida, querida”, Lola diz. “Eu não
quero que nada aconteça com você. Não quero que nada destrua
isso, Kace.”
“Eu sei”, digo. “Mas começar um novo ato de abertura é um
aborrecimento.”
Poderia ser mais fácil para a Rapid Confession arranjar uma
nova guitarrista.
As palavras se formam de repente na minha língua, me
chocando. Mas não posso fala-las.
“Eu não vejo uma alternativa”, Lola brinca, “a menos que
nós tenhamos Hugo com você o tempo todo.”
Para ser minha babá.
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De repente eu não quero mais falar com Lola. Eu tenho
esta noite e amanhã inteira antes de ter voltar e não quero perder
um segundo.
“Eu tenho que correr”, digo para minha melhor amiga.
“Falamos mais tarde?”
“Claro, eu vou te mandar uma mensagem de texto. Oh ei,
como está indo com o motorista? Ele é adorável. E gostoso. Não
são muitos caras que têm essa combinação. Vocês dois estão se
dando bem?”
Eu praticamente posso vê-la sorrindo e minha irritação
queima. Ela não entenderia se dissesse a ela que estamos
construindo uma potencial amizade e ela definitivamente não
acreditaria que não dormi com ele. Inferno, se Jonah não fosse o
cavalheiro que foi na noite passada, eu teria dormido com ele.
Um súbito arrepio agradável corre pela minha espinha ao
pensar nisso e cruzo as pernas.
Não. Isso é diferente. Jonah é diferente. Ele não é um cara
que eu com quem eu transaria aleatoriamente. Ele é...
“Ele é maravilhoso”, digo. “Adeus, Lola.”
Eu desligo e enfio o telefone na minha bolsa, até o fundo.
Nem mesmo um instante depois, ouço uma mensagem de
texto entrando. Reviro no fundo e meu coração dá um pulo
quando vejo o número de Jonah. E mais um salto quando leio as
palavras:
Vou ter que deixar você hoje. Muito trabalho, em
seguida, jantar em família. Talvez você possa pedir pizza?
Desculpa.
“Merda”, digo. Minha mão deixa o telefone cair de volta na
bolsa. A decepção aprofunda, não apenas por ele estar
cancelando, mas o próprio texto.
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Eu digito Sem problemas. Vejo você mais tarde e
examino a mensagem satisfeita por soar negligente e casual.
Como deve ser, eu me lembro. Ele tem um cronograma a cumprir
e ele está se mantendo a sua agenda.
Clico em enviar.
As horas passam lentamente. Eu não sei como posso sentir
saudades de alguém que só conheci há um dia e meio.
Ao meio-dia, faço o que Jonah sugeriu e peço uma pizza
vegetariana, no caso dele querer um pouco mais tarde e um
pacote com seis cocas diet de um local que faz entregas. Passo
pelos canais enquanto fico enrolada no sofá de Jonah. Quando
fico com frio, saio à procura do cobertor verde e laranja,
finalmente encontrando-o dentro do armário do corredor.
Tenho uma segunda rodada de pizza para o jantar, e
encontro Harry e Sally, Feitos Um para o Outro em um canal a
cabo. Um dos meus filmes favoritos de todos os tempos, mas fico
à deriva, meio adormecida por volta das nove horas. Meus
próprios padrões de sono são um mistério, já que, normalmente,
fico até qualquer festa acabar, e depois vou embora. Mas nove
parece cedo como o inferno. Imagino que eu tenha um monte de
sono para recuperar.
Balanço a cabeça despertando do cochilo e acordo no final
do filme, quando Sally e Harry estão na festa da véspera de Ano
Novo. Sally está a ponto de declarar como odeia Harry, com o eco
da palavra ‘amor’ retumbando por trás de cada ‘ódio’. Começo a
chorar, como sempre faço. Demorou muito tempo para aqueles
dois encontrarem o caminho para o outro, mesmo estando ali o
tempo todo.
Minha fantasia é o oposto. Eu sempre sonhei que meu
amor verdadeiro entraria de repente em minha vida, varrendo-me
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fora de meus pés em um gesto heroico. Eu o reconheceria de uma
vez só — a chama queimaria entre nós imediatamente. Não
haveria dúvidas ou jogos. Amor — e luxúria — à primeira vista.
Ele me livraria de toda a dor e solidão e eu nunca duvidaria que
era amada.
Pensei que Chett fosse esse cara. Eu fui a borboleta de sua
chama, atraída pela sua luz, apenas para ser queimada quando
se provou que tudo era a porra de uma mentira. E então eu não
tinha nada. Nenhum trabalho. Sem dinheiro. Nem mesmo um
diploma do ensino médio. Deus sabe o que teria acontecido
comigo se não tivesse conhecido Lola.
Eu deixei de me pendurar na aba de Chett e me pendurei
na dela, e agora estou abrigada sob o teto de Jonah. Isso nunca
tinha me incomodado antes, mas incomoda agora.
Isso me incomoda muito.
Desligo a TV. Agora, a única luz vem de uma pequena
lâmpada. Penso em ir para a cama, mas meus olhos ficam
pesados e estou muito cansada para...
“Kacey?”
Uma mão suave no meu ombro.
“Hmm?” Eu pisco e acordo. Jonah está sobre mim e então
se agacha ao lado do sofá. “Você está de volta”, digo.
“Estou de volta.” Sua expressão é de dor, seus olhos
castanhos ricos escuros. “Me desculpe, eu te deixei sozinha o dia
todo. Tinha uma coisa de merda para fazer.”
“Não...” Sento, mais acordada agora. “Você tem seu
trabalho e sua família.”
“Foi uma merda. Você só está aqui por pouco termo e eu
deveria ter voltado para o almoço.”
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Um calor se espalha no meu peito e fico tão ciente de que
apenas cerca de trinta centímetros nos separam. “Eu sobrevivi.
Eu comi pizza. Um monte de pizza.”
Ele sorri um pouco. “Estava pensando que talvez você
gostasse de ir buscar a sobremesa. Sorvete ou algo assim. Eu sei
que é tarde...”
“Eu adoraria”, digo e esse calor se aprofunda a um rubor
que colore minhas bochechas. “Você pode comer sobremesa?”
O sorriso brilhante de Jonah volta, uma inclinação lenta de
seus lábios para um sorriso satisfeito que faz seus olhos se
iluminarem. “Eu vou pensar em alguma coisa.”
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CAPÍTULO 13
jonah
Dirijo para Springles Cupcakes e estaciono na rua de trás.
Harrah’s Cassino está à nossa direita e a Strip está há uma
caminhada em linha reta a oeste da pequena loja de cupcake.
Está fechado há esta hora, e o rosto de Kacey fica triste até que
eu lhe mostro o drive thru de cupcakes
“Tem um drive thru de cupcakes?” Ela diz, olhando para a
imagem rosa brilhante embutida na parede da loja fechada. “Oh
meu Deus, é a melhor coisa do mundo.”
“Achei que você ia gostar.” Enfio meu cartão do banco na
máquina de pagamento e a tela de menu se ilumina. “Continue.”
Ela digita seu pedido na tela. Uma máquina no interior da
loja cantarola e uma pequena porta desliza para cima para
revelar seu cupcake: red velvet, bem vermelho, com cream cheese
de cobertura.
“Isso é tão legal.”
Eu peço um Cupcake simples de baunilha. Eu me viro da
máquina, fazendo malabarismos com minha carteira e
sobremesa, então Kacey parte um pedaço do seu cupcake e
oferece para mim.
“Quer experimentar?”
“Espere...” Tento enfiar minha carteira no bolso de trás da
calça jeans, mas a maldita coisa não vai. Kacey fica na ponta dos
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pés e segura o pequeno pedaço de bolo perto da minha boca. Eu
não tenho escolha, além de comê-lo de seus dedos.
A cabeça inclina, os olhos brilhantes e elétricos sob os
postes de luz âmbar. “Boa escolha?”
Eu concordo, embora não tenha provado nenhum bolo há
muito tempo.
“Você tem um pouco de cobertura...” Ela chega perto de
novo, e as pontas dos dedos roçam o canto da minha boca. Um
toque singelo que estala como uma pequena corrente elétrica, em
linha reta até a minha virilha, onde está tudo duro e quente.
Ofereço o meu. “Quer?”
Isso é tudo o que consigo. Quer. Eu zombo internamente.
Eu Tarzan, você Jane.
Kacey dá uma pequena mordida no meu cupcake, e vejo
como ela lambe os lábios, olhando para sua boca.
“Como está?” Eu digo, e paro de olhar uma fração de
segundo antes de meu olhar fosse necessária uma explicação.
“Muito bom.” Kacey recua e me dá um sorriso. “Você tem
bom gosto, Fletcher.”
Nós vamos para o oeste, na direção da Strip, passando ao
longo de uma passagem entre lojas e restaurantes, alinhada com
vasos de plantas e árvores. São mais de vinte e três horas em um
domingo, mas Vegas está bem acordada. Casais, grupos de
amigos rindo e turistas que falam outras línguas passa por nós
ou andam em torno de nós. Nós passeamos e comemos as nossas
sobremesas, atravessando a avenida em direção ao Caesar’s
Palace. Então andamos para o sul.
Quero mostrar a ela o Bellagio Hotel.
“Vamos parar por aqui”, sugiro. Nós inclinamos nossos
braços no muro de cimento branco que cerca a lagoa em frente ao
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Bellagio. Além da água, o hotel é iluminado em ouro e rosa,
curvando-se em direção às estruturas menores do cassino abaixo
dele como um livro aberto.
“É lindo”, Kacey diz. Ela se vira para olhar a Strip. A
pequena vista da Torre Eiffel brilha na frente do Paris Hotel e
Cassino do outro lado da rua. “A Itália, de um lado, a França, do
outro”, ela diz.
“Você realmente nunca entrou em um cassino?”
Ela balança a cabeça. “Nossa programação da banda é tão
louca, não tivemos qualquer tempo livre até o fim do show na
noite passada. É por isso que vamos ficar aqui até terça-feira,
assim Jimmy pode ir aos clubes de strip e fazer algumas apostas.
A última vez que estive aqui, era muito jovem para poder entrar
em qualquer lugar divertido.”
“Você veio aqui com seus pais?”
“Não”, Kacey diz, seu olhar ficando imóvel na água escura
na frente de nós. “Eu não os vejo muito agora.”
“Muito ocupada com a banda? Será que a sua turnê vai
passar por San Diego?”
Eu dou uma mordida do bolo, e quando olho para cima,
todo comportamento de Kacey mudou. Ela se abraça mesmo com
a noite quente, com uma brisa suave, e a luz em seus olhos tinha
diminuído quando ela lança seu olhar sobre a água escura.
“Não, isso não está na minha agenda”, ela diz. “Eu não vejo
os meus pais há quatro anos. Meu pai me expulsou de casa
quando eu tinha dezessete anos.”
Quase deixo cair a minha sobremesa e a mordida na minha
boca parece uma pedra irregular. Eu engulo com dificuldade. “Ele
a expulsou de casa? Aos dezessete anos?”
Meu tom é demasiado alto e duro. Estou exigindo uma
resposta de seu bastardo pai, não dela. Mas Kacey não vacila ou
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recua. Eu acho que ela entende a minha indignação, talvez até se
sinta um pouco impulsionada por ele.
“Eu coloquei meu namorado de vinte e dois anos de idade
para dentro de casa através da janela do meu quarto uma noite.
Meus pais nos pegaram... em uma posição comprometedora, e foi
isso. Meu pai nunca aprovou qualquer coisa que eu fazia; ele
odiava a minha guitarra, mas isso foi a última gota. Ele me
deixou fazer a mala e fechou a porta atrás de mim. Eu ainda não
tinha concluído o ensino médio.”
Lanço o que resta do meu cupcake em uma lata de lixo nas
proximidades, perdendo o apetite. “Que tipo de idiota joga sua
filha na rua? E a sua mãe? Ela não ajudou?”
Os ombros de Kacey erguem em um encolher de ombros
enquanto pega em seu bolo. “Ela não disse uma palavra. Ela
nunca fez nada. Ela é tranquila e mansa. Meu pai não é abusivo
com ela, não fisicamente. Mas ele pode se desligar completamente
de alguém, permanece em um silêncio profundo e frio por vários
dias se está realmente chateado e minha mãe não sabe lidar com
isso.”
“Então, ela deixou você ir?”
Talvez eu não devesse ter perguntado, mas não consegui
evitar. Eu não entendo como as pessoas podem abandonar os
seus próprios filhos. Esse tipo de falha dos pais — não, violação
— é completamente estranho para mim. Minha infância foi
ridiculamente livre de problemas. Claro, papai era duro com Theo
e minha mãe era uma pessoa compulsivamente preocupada, mas
essa é a extensão das minhas queixas. Meus pais eram pessoas
boas.
Eles deveriam ter sido a sua família, penso, olhando para
Kacey. Em uma torção estranha do destino, cada um de nós
acabou com pais errados. Os meus teriam amado e adorado ela.
Eles teriam nutrido sua música e ficado orgulhoso de suas
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realizações. Eles lhe dariam uma apropriada e firme reprimenda,
em vez de jogá-la para fora da casa.
Uma criança doente terminal é algo que os pais dela
mereciam. Minha situação, dado que o pai é cruel e a mãe é
covarde, faria mais sentido. Se Kacey e eu trocássemos de
famílias, eu não teria medo da carga emocional que estou
deixando para trás e ela seria sempre valorizada.
“Minha mãe não lutou por mim”, Kacey diz. Ela joga seu
cupcake longe também. “Ela perdeu a voz quando se casou com o
meu pai. Eu não sei se já posso perdoá-la por isso. Mas, mesmo
assim, ainda ligo para ela algumas vezes. Ela não diz muito, mas
acho que gosta quando ligo. De saber que eu ainda estou viva,
pelo menos.”
“Como você sobreviveu nas ruas?”
“Eu não fiquei nas ruas. Segui Chett, o namorado com
quem meus pais me pegaram. Ele disse que queria casar comigo,
então eu fiquei com ele enquanto ele tentava um esquema de ficar
rico rapidamente após o outro. Segui-o aqui. Ele estava ficando
sem dinheiro, então teve a grande ideia que eu poderia ser uma
modelo.” Ela fez aspas no ar em torno da palavra. “Mas cortei
essa merda imediatamente.”
“Bom.” Minhas mãos se fecham em punhos e eu as coloco
em meus bolsos.
“Mas, uma vez que eu disse a Chett que eu não iria
cooperar, foi tudo ladeira abaixo. Eu era menor de idade. Não
podia beber, jogar, ou mesmo entrar em um clube. Ele se cansou
de mim bem rápido. Dei por mim quando ele conheceu outra
pessoa. Alguma showgirl.”
“O que você fez?”
“Eu voltei para a Califórnia, pensando que teria outra
chance com meus pais. Voltaria para a escola. Eu sempre fui boa
na escola, na verdade.”
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“Eu acredito nisso”, digo.
Kacey sorri agradecida. “Eu fui até Los Angeles. Fiquei
hospedada na YMCA — associação cristã — e conheci Lola. Ela
tinha dezenove anos, e estava no mesmo barco afundando como
eu. Tinha acabado de juntar um dinheiro servindo mesas,
esperando conseguir um apartamento barato e me deixou ficar
com ela. Quando fiz dezoito anos, consegui um emprego no
mesmo restaurante, e passamos os dias de folga tocando em
parques. Eu cantava e tocava meu violão enquanto Lola tocava
bateria. Alguns meses mais tarde, encontramos um anúncio à
procura de uma garota que quisesse formar uma banda, e o resto
é história.” Ela levanta as mãos. “E é por isso que, até hoje, que
nunca pisei em um cassino.”
Eu balanço a cabeça, distraído, minhas emoções se agitam
em uma raiva espumosa para os homens na vida de Kacey que
tinham falhado com ela pra caralho. “O que aconteceu com
Chett?”
“Não sei. Não me importo.” Ela diz isso com calma o
suficiente, mas já aprendi que tudo que Kacey sente é revelados
em seus grandes olhos luminosos. Ela se preocupa com tudo,
apaixonadamente.
Ela sempre vai até o fundo.
Esse pensamento ajuda a conter a raiva que está pairando
em meu íntimo.
“Sente isso?” Kacey pergunta. “Essa é a noite morrendo
uma morte lenta e dolorosa graças à minha história triste.”
“Me desculpe por me intrometer.”
Ela acena com meu pedido de desculpas. “Eu não me
importo. Gosto de conversar com você. Eu normalmente não falo
sobre a minha vida. Nunca. Depois, isso fica reprimido e eu faço
algo estúpido como ligar para os meus pais. E me sinto rejeitada,
rejeição me faz beber até chegar em um estado de estupor, eu
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começo um motim em um salão verde e a próxima coisa que sei, é
que estou acordando no sofá do meu motorista de limusine.”
“Um ciclo vicioso.”
“Oh, não sei”, Kacey diz. “A parte do sofá não foi tão ruim.”
Um breve silêncio paira. Apesar de todos os argumentos
para manter a minha rotina e não chegar perto de uma garota
que está partindo em dois dias, sinto-me ceder, querendo segurar
a dor que ela me confiou. Querendo dar-lhe algo em troca.
“Você quer vir para o estúdio de vidro amanhã?” Pergunto.
“Você pode ver como tudo funciona, ou talvez me ver fazer alguma
coisa...”
Sinto a minha nuca avermelhar. Eu pareço completamente
arrogante e totalmente chato, ao mesmo tempo. Como se tivesse
pedido a ela para me assistir polir a minha coleção de moedas.
Mas, em seguida, Kacey bate palmas. “Você está de
brincadeira? Eu adoraria.”
“Sério?”
Ela usa seu dedo indicador para levantar uma de suas
sobrancelhas escuras em um arco. “Sério.”
Eu me inclino para trás, rindo muito mais do que ri em
meses. As engrenagens oxidadas dentro de mim rangem por falta
de uso, e meu constrangimento desaparece.
“Eu estava morrendo de curiosidade para ver como você faz
aqueles belos vidros”, Kacey diz. “Eu estava começando a pensar
que era apenas uma exibição, Fletcher. Que você encomenda as
peças e passa como sendo suas, apenas para impressionar as
garotas.”
“Eu sou legitimo, eu juro.”
Sua risada ecoa em todo o oceano e dentro dela, ouço
traços de uma bela voz para cantar. Ela começa a dizer outra
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coisa quando a música enche a praça em frente ao Bellagio: a
introdução em flauta da música ‘My Heart Will Go On’.
Kacey agarra meu braço. “É a música do Titanic? Oh meu
Deus, é. Por que eles estão...?” As palavras dela somem enquanto
a voz de Celine Dion se levanta e as fontes do Bellagio começam,
dando seu show.
Jatos de água formam um arco acima da lagoa, balançando
no tempo. Eles se movem delicadamente no início, quase
timidamente, como casais em um primeiro momento, tocam e
depois desmoronam sobre a extensão de água. Luz azul os
iluminando de baixo. Como a canção ganha força, mais jatos
sobem mais alto e caem rapidamente, criando nuvens de névoa.
As cores mudam para vermelho, roxo claro, e branco, em seguida,
prateado. A canção atinge o seu auge e o aperto de Kacey no meu
braço fica mais firme. Seus olhos se suavizam e ela assiste a
dança da água, mas não posso olhar nada, só para ela. O show
está ocorrendo na minha zona periférica, mas é só um pano de
fundo para ela.
A canção percorre suas notas finais, e os jatos de grande
altura de água formam arcos graciosos novamente, cruzando-se
em pares, como dançarinos ou amantes, em seguida, deslizando
sob a superfície quando a música termina.
Kacey funga e enxuga os olhos. “Eu não estava esperando
por isso.” Ela olha para mim. “Foi lindo.”
“Sim” digo suavemente. “Linda.”
No meu apartamento, abro a porta e a seguro aberta para
Kacey. Ela sorri quase timidamente para mim quando entra.
Puta merda, isso é um encontro, eu pensei, travando. Eu
levei Kacey em um encontro e agora... é o fim do encontro.
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“Obrigado pelo cupcake”, ela diz da sala de estar. “E o show
de água. Você planejou isso?”
“Eu conheço esta cidade. Além do meu tempo na escola, eu
vivi aqui toda a minha vida. E é parte do meu trabalho saber
onde estão os melhores shows.”
“Você é bom em seu trabalho”, Kacey diz. “Você está acima
e além, na verdade.” Ela se aproxima de mim, apoia as mãos em
meus braços e se estica para beijar minha bochecha. “Boa noite.”
Eu espero até que ela ande de volta para falar, não
confiando em mim para abrir a boca, enquanto a dela está tão
perto da minha.
“Boa noite”, respondo. Fico olhando enquanto ela vai para o
meu quarto. Em poucos minutos, ela estará na minha cama, os
cabelos espalhados em meu travesseiro...
Isto é ruim. Muito, muito ruim.
Troco para as calças de pijama e camiseta que guardei no
armário do corredor, e me recosto na cadeira. Coloco a mão sobre
o meu coração doente que sofre por razões que nada têm a ver
com a minha condição médica ou diagnóstico, ou qualquer
biópsia terrível. Dói porque eu ainda posso sentir os lábios
macios de Kacey na minha bochecha, e sinto falta dela.
Ela está a quatro metros de distância, e ainda não deixou
Vegas com sua banda, mas já sinto falta dela mesmo assim.
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CAPÍTULO 14
kacey
Jonah trabalhou toda a manhã seguinte, na Hot shop. Ele
voltou ao meio-dia e nós almoçamos em um lugar chinês,
conversando e rindo sobre tudo e nada. Depois de dois almoços e
um Cupcake, eu me sinto um pouco como se fizesse parte da
rotina de Jonah. Não é verdade, mas fico feliz em pensar assim.
Ele nos leva para uma parte industrial da cidade, nos
arredores de Las Vegas. O cenário da minha janela é preenchido
com mais deserto do que civilização. Vários armazéns e edifícios
em ruínas, com revestimento de alumínio. Ele estaciona a
caminhonete na frente do que parece ser um pequeno hangar de
companhia aérea com três chaminés. A pesada porta de metal
range quando a desliza para abrir para o lado, e ele me conduz
para dentro do espaço.
Jonah ri ao ver a minha expressão. “Eu sei que não tem
muito para se ver.”
Eu não posso discutir com ele. O Hot shop é cerca de
trezentos metros quadrados de cimento e aço, mais quente que o
calor de Nevada e com cheiro de madeira queimada. Um aparelho
de ar condicionado está travando uma batalha perdida contra
dois fornos — um grande e um pequeno — alinhados em uma
única parede. Na frente de um forno furioso fica um banco que
tem trilhos em ambos os lados, como altos braços feitos de aço
inoxidável. Ao lado do banco está uma mesa sobre a qual há um
espesso dicionário carbonizado, e ferramentas de imersão em um
balde de água: pinças, copos e panelas de aparência estranha.
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“Você deixa o forno aceso?” Pergunto, abanando-me
quando o calor em volta de mim aumenta.
“Eu diminuo a noite”, Jonah diz, e aumento de volta
durante o dia. Leva muito tempo para que fiquem suficientemente
quente. “O sistema de alarme fica lá...”, ele acena com a cabeça
para uma unidade na parede com luzes piscando, “...alerta o meu
telefone, se houver algum problema.”
Vagueio passando por uma prateleira de tubos de aço
inoxidável na parede, cerca de noventa centímetros de
comprimento. Além de que é uma mesa de metal pequena com
nada sobre ela.
“Portanto, aqui é onde a mágica acontece”, digo.
“Em um bom dia.”
“O que faz em um dia ruim? Você quebra alguma coisa?”
Meus pés rangem sobre cacos de vidro no chão de cimento
enquanto ando entre os fornos e a mesa de metal.
“Quebrar uma peça acabada com certeza poderia ser
caracterizado dessa forma.” Jonah bate os dedos sobre a mesa de
madeira com as ferramentas de aparência estranha.
“Principalmente um dia ruim é aquele em que eu não consigo
fazer o suficiente.”
“A galeria deu a você um prazo muito apertado?”
Jonah tem uma expressão estranha em seu rosto, um
sorriso suave, que não chega aos seus olhos castanhos quentes.
“Você poderia dizer isso.” Ele olha para o relógio. “Tania está em
sua pausa para o almoço. Ela vai estar de volta em breve e você
pode conhecê-la.”
“Sempre precisa de duas pessoas para fazer uma peça?”
“Nem sempre”, Jonah diz. “Eu faço a maioria das peças
individuais sozinho, aquelas que estarão à venda na galeria. Mas
para as seções maiores da exposição, eu preciso de ajuda.”
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Olho em volta. “Onde está a sua obra?”
“Depois dessa porta.” Jonah indica uma porta na parede
distante. “Ali é onde guardo todas as peças acabadas.”
“Então...” Eu balanço para trás em meus calcanhares.
“Posso dar uma espiadinha? Como eu não estarei aqui em
outubro para a exposição da galeria, acho justo.”
“Eu vou te mostrar, mas não será muito impressionante.”
Ele me leva para a sala dos fundos. Pouca luz entra pelas
janelas, iluminando dezenas e dezenas de caixas de papelão,
algumas abertas e cheias de bolhas de embalagem ou de
pequenos cachos de isopor. Outras caixas estão seladas e
empilhadas, não mais do que noventa e um centímetros de
altura, com FRÁGIL carimbado por todas elas. Outras caixas de
papelão achatadas estão empilhadas em pilhas ou inclinadas
contra as paredes de cimento, esperando para serem
preenchidas. Uma longa mesa de trabalho — facilmente com seis
metros de comprimento — exibe as peças da obra de Jonah.
Eu me movo lentamente em direção à mesa, paranoica por
quebrar alguma coisa, mesmo sem tocá-las.
Longas ondas de vidro amarelo e laranja estão dispostas ao
lado com fitas de azul e verde, infundido com manchas de ouro e
redemoinhos de roxo escuro. Branco, vidro cremoso ocupa outra
seção na mesa, perolado com incandescência. A última seção é de
esculturas de vidro que me tira o fôlego: delicados cavalos do mar
e dragões do mar, medusa branco brilhante suspensa em esferas
pretas, e até mesmo um polvo, seus tentáculos ondulando com
uns quarenta e cinco centímetros de comprimento e sua pele
ondulando com fitas coloridas.
Cuidadosamente, deixo meus dedos traçarem a ponta
chanfrada de um pedaço de vidro que parece ser um grande cubo
de gelo com folhas de coral. Dentro nada uma tartaruga —
perfeitamente esculpida.
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Olho para Jonah, tantas perguntas tentando escapar da
minha boca aberta que não faço nenhuma.
Ele enfia as mãos nos bolsos da frente da calça jeans. “Não
há muito para olhar agora. A maior parte já está embalado e
empilhado.”
Eu balanço minha cabeça. “Estes são surpreendentes. Eu
nunca vi nada assim na minha vida.”
“Obrigado.”
“O resto está nas caixas? Para enviar à galeria?”
Ele assente. “Eu não vou ser capaz de conectar todas as
peças juntas até que esteja no próprio espaço da galeria.”
“Mas como você sabe o que trabalhar, se você não pode ver
a coisa toda? Isso é como... escrever uma canção, mas nunca
tocá-la inteiramente até a hora do show.”
Jonah dá de ombros e bate na têmpora. “Eu tenho tudo
aqui guardado.”
Eu acho que ele confunde a minha expressão chocada
porque acena com a mão como se estivesse se livrando de um
mau cheiro. “Deus, isso soa pretensioso como o inferno.”
“Não, eu acho que entendo.” Faço um gesto para a mesa.
“Esta parece ser uma escavação arqueológica da Atlântida. Como
se você estivesse encontrando as peças todas, uma de cada vez, e
não fosse capaz de colocá-las todas juntas ainda.”
“Sim, eu gosto de pensar assim.” Seus olhos percorrem
sobre os pedaços de sua arte. “Eu acho que parte de trabalhar
com vidro é que você não sabe exatamente como será. A forma e o
fluxo dele... O fogo dita muito do que o vidro faz, como ele muda a
cor e a forma. Com algumas peças, como a vida marinha, eu os
projetos de cima para baixo, obviamente. Mas para a obra como
um todo, tento segui-lo, em vez de forçá-lo a ser o que não quer
ser.”
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Um breve silêncio recai. Ele olha para mim e sua
sobrancelha sobe. Riso explode de mim e dou uma cotovelada na
sua cintura. Eu adoro ouvir Jonah falar sobre sua arte. Arte. Eu
não sei nada sobre o assunto, mas é tão incrivelmente bela,
mesmo todas espalhadas sobre uma mesa em pedaços.
“Ok, me mostre”, digo. “Estou morrendo de curiosidade
para ver como você faz isso. Você pode trabalhar e divertir-me ao
mesmo tempo.”
Ele fica pensativo por um minuto, em seguida, balança a
cabeça, como se respondendo a um pensamento particular.
Voltamos para o piso principal da Hot Shop. Jonah pega
um dos tubos de aço inoxidável de uma prateleira na parede e eu
tomo um assento no banco com os dois trilhos.
“Eu vou precisar disso”, ele me diz. Ele puxa uma cadeira
da parede oposta e ajeita para mim perto do banco.
“Você vai fazer alguma coisa para a exposição?”
“Não”, ele diz. “Uma peça pequena. Para vender na galeria.
Eu acho que um frasco de perfume.”
“Eu amo garrafas bonitas de perfume.”
“E você?” Ele pergunta, seu rosto se vira, quando coloca
uma extremidade do tubo no maior dos dois fornos, girando-o em
suas mãos e para trás, o tempo todo. Quando ele puxa o tubo do
forno, uma pequena esfera fundida se agarra a ponta, do
tamanho de uma bola de tênis. Ele vai até a mesa de aço
inoxidável e rola o copo sobre ele, e para trás até que se
assemelha a uma ponta de seta grossa, em seguida, coloca na
fornalha menor, como se estivesse assando um marshmallow
sobre uma fogueira. O fogo dentro desta fornalha menor brilha
dez vezes mais de tão quente com o maior, que faz todo o vidro
ser derretido.
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Jonah rola o tubo em suas palmas mais e mais. O suor
aparece ao longo de seu pescoço e bíceps e observo os músculos
se movendo enquanto ele trabalha.
“Kacey?”
Eu tiro meus olhos de seus braços. “Desculpa, o quê?”
“Cor?” Ele leva o tubo com a sua seta brilhante de vidro
para uma prateleira cheia de bandejas. Eu mantenho uma
distância segura da tocha em suas mãos e vejo que cada bandeja
está cheia de pedaços de esmagados vidro em várias cores.
“Vá em frente”, ele diz.
“Violeta”, digo solenemente. “Como o Prince 3 .”
“Boa escolha.”
Jonah pressiona um lado estreito da forma de seta
brilhante na bandeja do vidro esmagado cor de violeta.
Habilmente, ele vira o tubo, e pressiona o vidro aquecido para
baixo do outro lado. Parece esponjosa quando ele pega os pedaços
de vidro. Com duas faixas de roxo diferentes agora presas ao
vidro derretido, Jonah leva o tubo para o pequeno forno, sempre
rolando em suas mãos. Quando o puxa de volta para fora, o vidro
esmagado está derretido.
“Por que você rola o tubo para frente e para trás?”
Pergunto.
“Se eu não o mantiver sempre em movimento, o vidro vai
explodir em uma confusão quente lancinante de dor líquida que
queima tudo o que toca dentro de um raio de seis metros.”
Cruzo os braços e lhe dou um olhar bravo.
“É pra manter o centro no lugar certo.”
“Alguém já te disse que você é um espertinho?”
3 Referência à música Purple Rain do Prince.
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Ele sorri. “Algumas pessoas. Uma ou duas vezes.”
Eu tinha que concordar com Lola — ele é muito adorável.
Tomo meu assento na cadeira e Jonah coloca a
extremidade do tubo na boca e sopra uma respiração curta.
“O vidro é feito com a boca”, digo, rindo.
“Se você acha que é engraçado, o pequeno forno é chamado
de buraco da glória.”
“Sério?”
“Sério.” Ele se senta no banco com os trilhos de metal. “Tire
sua mente da sujeira, Dawson.”
“Não é possível. Ela gosta de lá.”
Jonah sorri para mim, os olhos quentes. Ele senta virado
para a frente no banco, como se estivesse sentado em um cavalo,
e define o maçarico ao longo dos trilhos para que a bola brilhante
de vidro fique na frente dele. Ele usa o trilho para rolar o tubo
com uma mão e pega uma concha de madeira no balde de água.
O vidro afunda e envia vapor quando é embalado na concha de
madeira, rolando em conjunto para que a forma de seta se torna
uma pequena esfera.
“Quando você soube que era isso que você queria fazer?”
Pego um par de pinças que parecem feitas de duas lâminas de
faca. “Como é que alguém se apaixona pelo vidro soprado?”
“Ao beber o meu peso em cerveja e doses de uísque e quase
ser preso por embriaguez e desordem”, ele diz. “E isso, em Las
Vegas, não é pouca coisa eu poderia acrescentar.”
“Ok, essa eu tenho que ouvir.”
“No meu vigésimo primeiro aniversário, um grupo de
amigos e eu ficamos bêbados e fomos a caça de um cassino. Nós
jogamos e bebemos e depois bebemos um pouco mais, até que eu
fiquei muito bêbado.”
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“Eu estou tentando imaginá-lo bêbado e não consigo”, digo.
“O que realmente não é justo, considerando todas as coisas.”
“Você é uma bêbada muito mais bonita”, ele responde,
nossos olhos conectando. “Considerando todas as coisas.”
Sinto o rubor subir em minhas bochechas, e Jonah limpa a
garganta. “De qualquer forma”, disse ele. “Meu melhor amigo,
Oscar, era o líder de toda a expedição. Ele tinha cinco cassinos no
itinerário, seguido de um clube de strip.”
“Um clube de strip? Que vergonha.”
“Não é a minha coisa, para ser honesto”, Jonah diz. “Mas
eu nunca cheguei lá de qualquer maneira. Nós fomos ao Bellagio
e deitei no chão, no meio do lobby e me recusei a levantar.”
“No chão?” Bato palmas. “Isso me faz sentir muito melhor
sobre vomitar em sua limusine. Por favor, continue.”
Ele ri. “Eu não me lembro muito, exceto que o teto estava
girando. Mas puta merda, o que é aquele teto. Vinte e um metros
de arte em vidro soprado. Uma profusão de cores que foi de
alguma forma harmonizada. Caos planejado, se isso faz sentido.”
Eu descanso o queixo na minha mão. “Faz sentido.”
“Sinceramente, pensei que estava tendo alucinações”, ele
diz. “Eu aprendi nas minhas aulas na UNLV sobre Dale Chihuly,
um mestre soprador de vidro, e que seu trabalho estava aqui em
Las Vegas. Mas eu nunca tinha estado sob ele. Ou até mesmo no
Bellagio. Mas naquela noite, mesmo bêbado, a exposição mexeu
comigo. Eu queria saber como era possível fazer vidro assim.
Fazer com que pareça um jardim de flores entrando em erupção
lá no alto, no teto.”
“Eu voltei para o Bellagio no dia seguinte. Com uma
ressaca do inferno, para ver se era impressionante como eu me
lembrava, ou se fui um idiota bêbado, hipnotizado por cores
bonitas.”
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“Você não foi um idiota bêbado.”
“O Júri ainda não decidiu sobre isso”, Jonah diz com um
sorriso, ficando de pé para reaquecer a peça. “Mas eu não estava
hipnotizado, fiquei obcecado. Eu li tudo o que pude sobre Dale
Chihuly. Ele se tornou meu ídolo, e ainda é. Eu mudei meu foco
para vidro naquela semana e a primeira vez que pus as mãos em
um maçarico e vi um pedaço vir à vida, eu soube que era o que eu
faria para o resto...” Ele tosse e limpa o queixo suado em seu
ombro. “Pelo resto de meus estudos.”
“Eu adoro ouvir como alguém descobre sua paixão”, digo.
“Ou como a paixão o encontra.” Eu olho ao redor do espaço. “Mas
isso não é como a pintura onde você pode simplesmente pegar
pincel e uma lona. Posso ser intrometida?”
“Você quer saber como mantenho este espaço, as
ferramentas, um assistente, e todos os vidros que um cara pode
ter com um salário de motorista de limusine?”
“Algo assim.”
“Eu não pago por nada disso. Ganhei uma bolsa da
Carnegie Mellon.” Ele volta ao banco e desliza o vidro pelo
dicionário úmido, queimado e rolando o vidro, como se estivesse
polindo. O cheiro de papel queimado enche o espaço, e mesmo
que o vidro quente derretido esteja a meras polegadas da sua mão
nua, isso não parece incomodá-lo nenhum pouco. Ele rola e
molda com a facilidade praticada de alguém que já fez isso
milhares de vezes.
Ele é um profissional, penso. Um mestre. Eu me sinto
estranhamente orgulhosa de vê-lo. “Não me surpreende que você
ganhou uma bolsa.”
“Era uma espécie de prêmio de consolação, na verdade”,
Jonah diz. “Eu fiquei doente no meu terceiro ano no Carnegie e
não pude me formar. Eu estava no hospital cerca de cinco meses,
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e quando saí... não voltei. Meus pais queriam que eu ficasse aqui.
Minha mãe especialmente.”
“Eu posso imaginar”, digo em voz baixa, pouco acima do
constante silvo-rugido do fogo.
“Mas eu tinha uma bolsa de estudos integral na CM e
quando lhes disse que não poderia ficar para ganhar meu
diploma, eles me deram uma bolsa para fazer esta exposição.
Como uma espécie de projeto de tese.”
“Você deve ser muito bom, Fletcher, para jogarem tanto
dinheiro em você.” Enfio uma mecha de cabelo atrás da minha
orelha. “Mas é uma pena que você tenha tido que deixar
Carnegie. Posso perguntar…?”
“Como fiquei doente?” Ele vai para o forno para outra
rodada.
Eu balanço a cabeça. “Eu não entendo como um cara de
vinte e cinco anos de idade, acaba precisando de um transplante
de coração.”
Jonah balança a cabeça, e quando fala sua voz é
monótona. “Um bando de nós fez uma viagem à América do Sul
no verão passado. Peru, Colômbia, Venezuela. Eu peguei um
vírus ao acampar em Caracas. Eles acham que foi de nadar em
um rio, embora meus amigos e namorada na época tenham
nadado lá também. Mais tarde eu soube que tinha uma
predisposição genética que me fez suscetível ao vírus.”
Ele volta ao banco, rolando e polindo.
“Eu também aprendi que tenho um tipo de tecido raro, o
que faz encontrar um doador de coração um pouco complicado.
Eu estava muito mal quando recebemos a ligação que um doador
havia sido encontrado, o mais próximo de compatível que eles
poderiam obter. Eu tinha o transplante, e... tudo está bem
quando acaba bem, certo?”
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“Estou feliz que terminou bem”, digo suavemente.
Ele não diz nada, mas desliga o maçarico de cabeça para
baixo de um gancho no teto acima dele. Parece que tem uma
lâmpada de incandescência no final. Ele leva um segundo tubo
para o grande forno que segura o copo e volta com uma pequena
colher.
“O que isso vai ser?” Pergunto, feliz por ser capaz de fazer
uma inofensiva mudança de assunto.
“O gargalo da garrafa.” Ele senta no banco, rolando o tubo,
e pega um par de pinças que parecem ser de grandes dimensões.
Ele pressiona um alicate no vidro, um pedaço pequeno,
esvaziando-o para fora, e então começa a puxar o vidro, formando
um lábio.
“Parece um caramelo”, eu digo.
“Bastante.”
Ele trabalha um pouco, esticando o pescoço para fora, em
seguida, cortando a fim de fazer uma abertura perfeitamente
redonda.
“Muito silêncio aqui”, Jonah diz, e seu sorriso é quente
novamente. “Estou sentado com uma famosa guitarrista prestes a
ser mais famosa na minha frente, mas não ouço música. Não faz
sentido.”
Giro minhas pernas na frente de mim para examinar as
botas. “Meu violão está em uma caminhonete com o resto do
equipamento da banda. Eu acho.”
“Se eu ligar o rádio, vou ouvir uma de suas músicas?”
“Provavelmente”, digo. “‘Talk Me Down é uma espécie de hit
agora.”
“Já ouvi. Eu não sou um fã da música, para ser honesto,
mas as letras são muito boas.”
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“Eu escrevi.”
Jonah para e me olha bruscamente. “Você escreveu essa
música?”
“Surpreso?”
Ele pensa por um segundo. “Não.”
Minhas bochechas aquecem e tenho que desviar o olhar.
“Uau.”
Jonah dá o primeiro golpe com o maçarico que estava
pendurado no teto, em seguida, se senta no banco. “Posso te fazer
uma pergunta?”
Eu sorrio. “Não.”
Ele olha para mim, depois volta para o seu trabalho. “Você
não parece muito interessada em ser uma estrela do rock, então
por que não faz sua própria coisa? Escrever o que você quer e
cantar você mesma?”
“Eu canto um pouco. Como Back vocal. Rapid Confession
já tem uma vocalista e Jeannie nunca vai deixar você esquecer
disso.” Eu sorrio com tristeza. “Ela não se importa se escrevo
canções de sucesso, desde que ela seja a única a cantar. É sua
banda. E eu estive em sua banda praticamente desde que meu
pai me expulsou. É tudo que sei fazer.”
Jonah casa o gargalo com a bola rodada de vidro, em
seguida, interrompe a peça inteira a partir do primeiro maçarico.
Ele leva para a grande fornalha, explicando que está adicionando
outra camada de vidro transparente sobre ele. Então volta ao
banco para mais polimento e rolamento.
“Estou começando a ver uma pequena garrafa”, digo. “Já
está bonito. Você é tão talentoso.”
“Assim como você”, ele diz, sem olhar para cima de seu
trabalho. “Mas todas as peças do seu talento — cartar, guitarra,
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composição... Estão espalhadas, como a minha peça. Ou uma
constelação. Colocar tudo junto...” Agora ele olha para cima, com
seu sorriso gentil. “O todo pode ser muito espetacular.”
Uma centena de emoções diferentes ferve em mim. As
palavras de Jonah são fragmentos de meus próprios
pensamentos. Ideias que eu nunca tive a coragem de encarar e
dizer. Eu quase falo com ele para se preocupar com sua própria
vida, e na próxima pulsação quero jogar meus braços em volta do
pescoço dele e agradecer...
Pelo quê?
Eu não faço ideia.
E quero desesperadamente uma bebida.
“Está feito”, Jonah diz, levantando-se. Ele soltou toda a
peça do maçarico, embalando-a em uma luva de tamanho grande,
como uma luva de apanhador, e a leva para um terceiro forno.
“Este é o forno. Tem que arrefecer lentamente. Vai estar pronta
amanhã.”
Ele fecha a porta e se vira para me encarar onde estou
sentada, não tendo se mudado da minha cadeira.
“Desculpe-me se fiquei muito pessoal.” Ele esfrega a mão
sobre a parte de trás do seu pescoço, suor molhando sua testa.
“É muito fácil esquecer, que só a conheci ontem.”
“Eu sei o que você quer dizer”, digo. Meus pensamentos
turbulentos resolvidos, juntamente com a sede de uma dose de
algo forte. Levanto para ficar ao lado dele no forno. “Com você é
fácil de conversar, Fletcher.” Eu lanço um olhar para ele. “Talvez
um pouco fácil demais.”
“Também me sinto assim com você, Dawson.”
Olho pela janela blindada. “Eu não posso mais ver a peça.”
Viro, fico cara a cara com ele, apenas trinta centímetros de
espaço entre nós. “Eu quero vê-la antes de partir de Vegas.”
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“Eu vou ter certeza disso”, ele diz calmamente.
Nossos olhos se encontram, como se nossos olhares fossem
aproximando um do outro. Eu não posso me mover. Eu não
quero. Quero ficar no seu espaço, sentindo o olhar suave em
mim, respirando o cheiro de sua pele e roupas. Sua presença
desliza tudo para cima e para baixo do meu corpo. Os segundos
passam e parecem se expandir e cristalizar. Se eu me mexesse,
quebraria o encanto.
Eu não quero ir.
Eu quase digo ele. As palavras estão na minha boca.
Então não vá, ele responde em minha mente e sinto um
alívio tangível como se tivesse falado em voz alta. Como se eu
tivesse uma vida diferente esperando por mim em dois dias.
“Devemos voltar”, ele diz, com sua voz pesada e, para os
meus ouvidos, misturado com pesar.
Eu balanço a cabeça. “Ok…”
A porta da frente se abre, e uma voz de mulher ecoa. “Olá?
Desculpe estou atrasada. Você não vai acreditar... oh. Oi.”
Uma jovem mulher com pele caramelo e olhos escuros se
aproxima de nós. Ela usa jeans e regata de ginástica. Seu cabelo
é uma explosão de cachos escuros, presos por uma faixa colorida.
Ela é linda.
“Tania King”, Jonah diz, “esta é Kacey Dawson. Ela é
uma... amiga.”
“Então prazer em conhecê-la, Kacey”, Tania diz, oferecendo
sua mão e um fácil, sorriso amigável. “E onde vocês se
conheceram?” Ela pergunta, suas sobrancelhas arqueadas quase
até a cabeça com curiosidade.
“Kacey está na cidade por alguns dias com sua banda”,
Jonah diz. “Ela vai ficar comigo até terça-feira.”
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Agora os olhos de Tania parecem que estão prestes a
explodir de seu crânio. “Sério? Isso é maravilhoso. E
inesperado...”
“Eu estava apenas dando Kacey uma excursão da Hot
Shop”, Jonah fala.
Balanço a cabeça. “É incrível. Jonah fez uma peça para a
exposição da galeria para me mostrar como se faz. Ele é
incrivelmente talentoso.”
“Eu concordo”, Tania diz. “E amo dizer a ele o quão
talentoso é, porque ele não aceita. Olhe só para ele.”
Jonah revira os olhos e balança a cabeça quando o rubor
se arrasta até seu pescoço. Sua modéstia é genuína e, portanto,
sexy como o inferno.
Merda, agora estou corando...
“Então, qual peça você fez?” Tania pergunta ele. “Eu vou
riscá-la da lista.”
Jonah esfrega a mão pelo cabelo. “Hum, é...”
“Um frasco de perfume”, digo. “É lindo.”
Tania franze a testa. “Um frasco de perfume. Não me
lembro de...”
“Eu tenho que levar Kacey de volta para a minha casa”,
Jonah diz rapidamente. “Vou voltar para terminar o dia.”
“Claro, claro”, Tania diz. Ela fixa seus olhos em Jonah um
momento, depois se vira para mim. “Será que vou vê-la
novamente antes de ir?”
“Não”, digo. “Nós viajaremos amanhã.”
Mais uma vez, os olhos de Tania se voltam para Jonah. A
conversa silenciosa parece passar entre eles, lembrando-me da
conversa entre Jonah e Theo na cozinha ontem.
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“Bem, isso é ruim”, ela finalmente diz.
“Tania não se expressa muito bem”, Jonah diz secamente.
“E você não tem sorte?” Ela diz. “Foi um prazer conhecê-la,
Kacey.”
Ela oferece a mão novamente, mas eu a abraço dessa vez.
“Você também, Tania. Talvez eu venha visitar em breve.”
“Sim” ela diz. “Eu acho que seria muito, muito boa ideia.”
“Tania é incrível” digo enquanto dirigimos de volta para
casa. “Ela é sua assistente há muito tempo?”
“Desde que comecei a exposição”, Jonah diz. “Cerca de dois
meses atrás. Ela é uma sénior na UNLV. Especialistas em artes
industriais e todos os tipos de talento. Eu tenho sorte de tê-la.”
“Ela parecia feliz em me ver. Isso foi bom.”
Jonah se mexe no assento. “Ela é assim. Amigável.” Ele
olha para mim, em seguida, volta para a estrada. “A verdade é
que... Eu meio que me fechei para um grande número de pessoas
desde que comecei minha obra.” Ele fala lentamente, como se
tivesse inspecionando cada palavra antes de deixá-lo fora. “Eu
tenho Tania, Theo, meus pais e meus melhores amigos, Oscar e
Dena. Eles são tudo que cabe no meu tempo. Eu acho que Tania
está feliz que trouxe alguém novo para a Hot Shop.”
“Oscar e Dena são os amigos que eu vi em suas fotos? O
cara Afro-americano com um belo sorriso? E Dena é a garota
bonita que parece do Oriente Médio?”
“Isso, são eles. Os pais de Dena são do Iraque. Ela e Oscar
estão juntos há muito tempo. Eu realmente deveria sair com eles
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esta noite. Nós nos reunimos a cada semana. É parte da minha
rotina, como o jantar com meus pais.”
“Oh.” Eu torço minhas mãos no colo. “Isso é legal. Eu acho
que vou...”
“Mas estava pensando que, uma vez que é a sua última
noite aqui, talvez eu cancele.”
“Não, não”, digo, mesmo que a felicidade floresça em meu
peito. “Eu não quero interferir...”
“Eu gostaria sair para vermos um filme.” Chegamos em um
semáforo vermelho e Jonah se vira para mim, com um sorriso
repuxando seus lábios. “Tem algum clássico dos anos oitenta em
cartaz?”
“Pode ter.”
O sinal fica verde, e ele vira os olhos de volta para a
estrada. “Parece bom.”
“Sim” digo, descansando meu queixo na minha mão para
esconder o sorriso idiota na cara. “Soa perfeito.”
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CAPÍTULO 15
jonah
Quando meu celular toca por volta das oito horas, já sei
que é o Theo. Eu já tinha dado uma bronca em Tania quando eu
voltei para a Hot shop naquela tarde: Pergunta após pergunta
sobre Kacey. Eu contei a história resumida, ela está indo embora
no dia seguinte.
“E o frasco de perfume?” Tania perguntou, seus lábios se
curvaram em um sorriso cúmplice. “Eu não me lembro disso
estar listado nas obras da galeria.”
“Eu adicionei.”
“Você que manda, chefe”, ela diz, e deixa o assunto morrer.
Theo por outro lado...
“Oscar me mandou uma mensagem”, ele diz agora. “Você
está cancelando esta noite?”
“É a última noite de Kacey...”
“Então, é por causa da garota.”
“Kacey. Sim. Eu...”
“Você vai dormir com ela?”
“Jesus, Theo.”
“Você vai?”
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Sento em uma das duas cadeiras na cozinha, que serve
como minha mesa de jantar, afastando-me do corredor e do
banheiro onde Kacey está lavando seu rosto.
“Eu estou sendo educado com minha hóspede. Não quero
convidá-la para sair, ela está tentando não beber, e não quero
deixá-la sozinha e entediada durante toda a noite. E, a
propósito...” Baixo a voz e ouço que a água ainda corre na pia...
“Não é da sua conta com quem eu durmo ou não.”
“Você sabe o que o Dr. Morrison diz”, Theo diz. “Você tem
que ter cuidado. Não exagere.”
“Theo…”
“E você tem que usar preservativo, sem exceções.”
“Eu vou desligar agora.”
Mas, claro, eu não desligo. Porque ele é meu irmão e
debaixo de sua conversa dura, ele está com medo enorme por
mim. “Eu disse a Oscar e Dena que nós vamos sair na quartafeira
para compensar. Você está livre?”
“Estou na loja quarta-feira”, Theo diz. “Ela está indo
embora amanhã?”
“Amanhã.”
Há um silêncio na outra extremidade.
“Olá?” Eu digo. “Quer que eu diga a ela que você disse
adeus? Boa viagem? Que tal um autógrafo?”
“Eu vou falar com você mais tarde”, Theo diz, sua voz de
repente dura. O telefone fica silencioso.
Kacey sai do banheiro, vestindo uma camiseta que vai até o
meio da coxa e nada mais. Olho para suas longas pernas nuas e
a borda inferior de uma tatuagem que espreita para fora debaixo
da bainha.
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“Não fique tão escandalizado, Fletcher”, Kacey diz,
levantando sua camisa. “Eu estou vestindo shorts.”
Pisco. Sim, na verdade, ela está vestindo shorts. Short
curto.
“Sua tatuagem”, digo. “O que é? Uma caveira mexicana?”
“Uma caveira mexicana vodu. Vê a cartola? Eu amo a
mitologia vodu e magia. Marie Laveau. Vevé.” Ela levanta a perna
para inspeção e finjo estudar o crânio que foi feito em cores
vibrantes e duas grandes flores azuis nas órbitas oculares.
“É bom.” Eu tusso. “Então... filme?”
Kacey bate palmas. “O original A Hora do Pesadelo. 1984.
Eu vi duas vezes. Johnny Depp é um bebê neste clássico.”
Eu a vejo caminhar para a minha cozinha e começar a se
movimentar ao redor das panelas, abrindo armários, e ligando
um queimador no fogão, como se tivesse feito isso uma centena
de vezes.
“Você está cozinhando também?”
Ela inclina um saco de grãos de pipoca. “Caseira. Sem
gorduras ou conservantes ou...”
“Sabor?” Eu termino e depois rio de sua expressão
ofendida. “Eu tinha pipoca escondida em algum lugar?”
“Não, comprei hoje”, Kacey diz. “Não é possível assistir a
um filme de terror sem pipoca. Mas estou usando óleo de coco.
Baixo colesterol, coração saudável. E tenho isso...”
Ela me entrega uma caixinha do balcão. No rótulo está
escrito substituto de sal Milton.
“Livre de sódio”, Kacey diz, sacudindo a panela tampada em
solidariedade. Oh, e bebidas.”
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Kacey remexe na geladeira, e isso proporciona uma visão
generosa da pele lisa, sem falhas das costas e suas pernas antes
de ela se virar e me entregar uma garrafa de chá verde com limão
e mel.
“O chá verde é a coisa mais saudável que existe,
aparentemente. Pessoalmente, nunca bebi chá gelado a menos
que fosse da variedade Long Island, mas pensei que seria bom
dar uma chance.”
Eu coloco a minha garrafa no balcão e observo ela agitar a
panela que está agora repleta de pipoca. “Quando você fez
compras?”
“Enquanto você estava na Hot shop esta tarde. Eu amei a
Tania, por falar nisso. Ela é um ser humano de qualidade.”
“Sim, ela é”, digo.
“Pipoca está pronta”, Kacey diz. Ela joga tudo em uma
tigela grande, olhando-me de cima a baixo. “O que há com você
esta noite, afinal?”
“O que você quer dizer?”
“Você está meio disperso. Algo em sua mente?”
“Estou chocado que você fez tudo isso.”
“Que eu fui ao supermercado? Ou que enfrentei o calor? Eu
acho que você tem um monte de trabalho a fazer que eu ter a
responsabilidade de comprar pipoca e bebidas vem como um
choque.”
“Choque é a escolha errada de palavra. Eu quis dizer, que
estou tocado que você fez tudo isso. Para mim.”
“É o mínimo que eu poderia fazer desde que você me deixou
ficar aqui.”
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Ela sorri para mim e sorrio de volta, até o momento passar
do limite de tempo para dois amigos estarem sorrindo um para o
outro. Eu tento comer algumas das pipocas.
“Como está o sal falso?” Ela pergunta.
“Não é ruim.”
Nós colocamos nossa comida e bebida no sofá. Penso em
sentar em uma extremidade e Kacey sentar na outra. Em vez
disso, ela coloca a tigela de pipoca no colo e se enrola ao meu
lado, dobrando as pernas sob o corpo. Ela está encostada contra
mim, ombro a ombro, o peito esquerdo suave contra o meu braço.
“Está tudo bem?” Ela pergunta, pegando o controle remoto
da TV. “É um filme de terror, afinal. E eu sou medrosa.”
“Eu percebi.” Posso sentir cada lugar em que ela está
tocando. “Por quê?”
“Pronto para uma conversa psicológica? Meu pai é um
grande crente em não conceder contato físico. Ele quase nunca
me tocava ou me abraçava. E ele estava sempre insistindo com a
minha mãe em não me mimar. Que só me faria fraca e molenga.”
“Você está falando sério?” Minha imaginação conjura uma
menina doce, correndo para seu pai com um joelho arranhado ou
com um A em um teste de ortografia e sendo friamente rejeitada.
“Seu pai nunca te abraçou?”
Ela balança a cabeça. “Mas seu plano saiu pela culatra. Em
vez de me fazer fria, eu fui para o outro lado. Quero tocar todos.
Fazer contato, sabe?”
“É por isso que abraça as pessoas quando você as
encontra? Como a Tania, hoje?”
“Eu não abraço todos. Só as pessoas boas. Tenho um sexto
sentido sobre isso.”
“Você não abraçou Theo ontem”, digo. “Ele é um cara bom.”
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“Você pode me culpar? Parecia que ele queria arrancar
minha cabeça.” O brilho da TV torna os olhos de Kacey azul
elétrico. “Mas ele é um cara bom. Quis abraçá-lo, mas não acho
que ele teria gostado disso. Acho que ele não gosta de mim.”
“Ele não confia facilmente”, digo. “Tenho certeza que ele
gosta de você.”
Kacey se vira para olhar para mim, e porque ela está
praticamente sentada em meu colo, seu rosto fica a centímetros
do meu. O rosto dela está limpo, ela parece ainda mais
impressionante de perto, sem a maquiagem elaborada que
normalmente usa.
“Por que ele precisa confiar em mim?” Ela pergunta.
Merda. Boa pergunta. “Ele não confia em ninguém novo em
torno de mim”, digo, infundindo minhas palavras com tanta
indiferença quanto possível. “Desde a minha cirurgia, ele se
tornou ridiculamente superprotetor.”
“Por quê? Quero dizer, além das razões óbvias.”
“Minha rotina é muito séria e ele se preocupa que vou ficar
distraído.”
“Ele está preocupado que vou te corromper? Levá-lo para
carnes e bebidas?”
Olho para esta menina que não está acostumada a ser
confiável e me ouço dizer “Ele não confia em mulheres em torno
de mim. Por causa da Audrey. Minha última namorada.”
Agora Kacey senta ereta e vira sua atenção para mim.
“Audrey. Ela é a garota...?” Ela aponta para uma foto emoldurada
de Audrey e eu no Carnegie que está pendurada na parede ao
lado do ar condicionado.
“É ela”, digo. “Nós ficamos juntos por três anos. Nós
viajamos muito e planejamos viajar depois da formatura. Para ver
as grandes cidades do mundo e ser inspirados por sua arte.”
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“Ela trabalha com vidro também?”
“Não, com pintura. Tínhamos uma vida planejada, e então
ela se desfez, não sabia como lidar com o caos. Ela estava comigo
na América do Sul, quando fiquei doente, e voou para casa
comigo enquanto eu esperava um coração do doador. Mas ficar
em torno da doença ou em torno de hospitais não era a sua
coisa.”
Kacey se recosta, uma sombra cruzando seu rosto. “O que
aconteceu?”
“Ela foi embora logo que recebi o telefonema de que um
coração tinha chegado e estava disponível.”
Os olhos de Kacey se arregalam, “Ela foi embora? Quando
você estava prestes a ter um transplante de coração?”
“Mais ou menos”, digo. “Mas o resultado é, ela disse ao
Theo que estava partindo e isso o transformou em um cão de
guarda paranoico...”
“E você?” Kacey corta.
Eu fico tenso. “Eu?”
“Ela foi embora É por isso que você se atém de forma
religiosa a sua rotina? Para se proteger?”
Palavras ficam presas na minha garganta e posso apenas
acenar.
“Sinto muito se isso é pessoal”, ela diz. “Eu estava
pensando sobre como nós dois fomos feridos por pessoas que
deveriam nos amar. Eu me protegi também. Ao beber, festas,
fazendo música alta.” Ela se vira para enfrentar a televisão. “Eu
odeio as pessoas que vão embora quando é deveriam ficar.”
Eu balanço a cabeça, sem palavras. Nós assistimos ao filme
e comemos a nossa pipoca, enquanto os minutos passam mais
perto de amanhã.
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Na tela, uma jovem mulher é espancada em sua cama. O
namorado dela grita quando a menina tem uma morte sangrenta,
seu corpo arrastado até a parede e cortado em tiras por mãos
invisíveis.
Kacey enterra o rosto no meu ombro. “Diga quando
acabar”, ela diz, com a voz abafada.
“O que, esta cena?”
Ela assente com a cabeça contra mim, segurando meu
braço. Seu cabelo é suave contra minha bochecha.
Na TV, os gritos do namorado cessam. “Ok, ele é um caso
perdido”, digo.
Kacey vira a cabeça para espiar a tela com um olho, depois
ambos. “Desculpa. Eu sou uma covarde completa com filmes de
terror.”
“Foi ideia sua.”
“É um grande filme.”
“Mas você está assustada até mesmo de ver.”
“Então?” Seus olhos desafiantes são brilhantes e vibrantes,
como se fossem iluminados com uma luz azul celeste. “Onde você
quer chegar?”
“Não, nada”, eu rio, balançando a cabeça. “Faz total
sentido.”
Kacey dá uma cotovelada no meu lado, depois se enrola em
mim novamente.
Ela está tão suave e quente contra mim, enquanto eu estou
uma parede de tijolos com as mãos enfiadas debaixo dos meus
braços cruzados para não tocá-la. Eu queria encher minhas mãos
de Kacey; segurar a mão dela, ou colocar a palma da mão sobre a
pele nua da coxa que está pressionado contra a minha. Ou
colocar meu braço em torno dela porque — Meu Deus — essa não
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é a última vez que sento em um sofá com uma menina e assisto a
um filme novo? Ela esconde a cabeça no meu ombro durante as
partes assustadoras, ou compartilha uma tigela de pipoca? Esta é
a minha vida, o que resta dela, e estou perdendo.
Eu tento me perder no filme. Minutos passam. Na tela, um
jovem, de cabelo emplumado como Johnny Depp não consegue
ficar acordado, apesar de uma morte certa. “Você tinha um
trabalho, Johnny”, eu falo.
Kacey enterra o rosto no meu ombro, seus dedos apertam
meu braço, quando Johnny é sugado para dentro de sua cama e
uma fonte de sangue irrompe para pulverizar o quarto.
“Diga-me quando acabar.”
isso.”
“Como posso saber se acabou?” Eu digo, rindo. “Você já viu
“Duas vezes.”
“Tudo bem, os gritos pararam, você pode espiar.”
Kacey levanta a cabeça e Jesus, ela está tão bonita. Seus
olhos risonhos, como se tivesse acabado de descer uma
montanha-russa.
Sua beleza suga meu fôlego. Se eu continuasse aqui
sentado com ela, ia fazer algo estúpido. Algo injusto para nós
dois.
Levanto, resmungando sobre a necessidade de ir ao
banheiro. Todo o tempo, sinto no lado direito do meu corpo uma
frieza desagradável onde ela estava me tocando e agora não está.
No banheiro, olho para o meu reflexo no espelho.
“Mantenha a rotina, Fletcher. A porra de rotina.”
Esse mantra é uma ponte frágil, frágil entre o que quero e o
que eu nunca terei. Seria cair aos pedaços em um vento forte,
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mas é a única ponte que tenho. Sem ela, iria em queda livre para
coisa nenhuma.
“Volte. Para. A. Rotina.”
Quando volto para a sala de estar, Kacey está sentada,
bocejando e se espreguiçando. Ela sorri quando me vê. Um
sorriso surpreso. Como se já não tivesse passado toda a noite
juntos. Como se eu tivesse saído há anos para a África e não dois
minutos no banheiro.
Mas sinto isso também. Sinto a falta dela. Toda vez que
fecho os olhos porra, eu sinto a falta dela.
Estou longe dela, olhando, enquanto em minha mente eu
fecho a distância entre nós, a deito sobre as almofadas do sofá
novamente, mas desta vez, estou sobre ela. Beijando sua boca
deliciosa, provando sua língua quando ela desliza sobre a minha.
Suas coxas se separam para mim, revelando a calcinha que está
úmida quando toco nela...
Jesus Cristo…
Me abrigo atrás do balcão da cozinha para que Kacey não
veja a fúria de tesão proeminente na frente das minhas calças de
flanela.
“Estou ficando com sede, quer mais um pouco de gelo para
o meu chá”, eu murmuro. “Precisa também?”
“Certo.”
Abro o freezer e fico lá, inalando o ar frio até meu sangue
ter esfriado e ser seguro me virar.
Ou talvez eu pudesse bater meu pau na porta...
“Como é que a bebida está?” Pergunto, encolhendo quando
as palavras saem da minha boca. Claramente, o sangue ainda
precisa voltar para o meu cérebro. “Quero dizer, como é que é
beber algo sem álcool como chá gelado?”
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“Não é ruim”, ela diz. “Na verdade, tem sido muito fácil de
ficar sem as bebidas nos últimos dias. Eu pensei que seria ruim,
mas aqui, sinto que posso relaxar. Eu não preciso do barato.”
“Barato?”
“Barato da bebida. Aquele que sobe entre você e a vida real
quando está bêbado. Tudo é muito mais fácil de aceitar. Mais fácil
de não dar a mínima. Você pode ficar a uma distância segura.”
“Distância segura de quê?”
Ela encolhe os ombros e olha para as almofadas do sofá
debaixo dela. “Vida. A vida que encontrei-me vivendo. Uma vida
que me aconteceu, em vez de uma que escolhi.” Ela pega uma
mecha de cabelo e fica enrolando no dedo. “Vegas é diferente do
que eu pensava que seria. Depois de toda essa merda que
aconteceu com Chett, eu pensei que seria assombrada. Mas não é
tão ruim. Melhor do que estar na estrada com a banda. Eu posso
ver isso agora. Então, pensei que poderia...” O fio no dedo dela
está girando e girando. “Ficar.”
O sangue é drenado do meu rosto tão rápido que tenho que
segurar o balcão.
Fique.
A palavra paira no ar. A bolha de cristal perfeita.
Ela vai ficar. Poderei vê-la todos os dias, posso falar com ela,
eu posso tocá-la...
Meus pensamentos correm desenfreados, na rápida maré
de meu pulso que está zumbido nos ouvidos. É tão alto, que eu
mal posso ouvir as palavras seguintes de Kacey. Mas eu os sinto.
Sinto cada palavra; pequenas frases que me surpreendem, cada
uma com uma nova emoção: medo, alegria, culpa e algo
extremamente próximo à felicidade.
“Eu acho que quero sair da banda”, ela diz, ainda
concentrada no seu fio solto. “Estou sob contrato e não tenho
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ideia se é mesmo possível sair dela sem ser processada. Mas acho
que poderia tentar. Acho que eu poderia fazer o que você disse.
Tentar colocar todas as peças juntas. Escrever minhas próprias
canções e cantá-las eu mesma. Claro, teria que conseguir um
emprego regular de meio período, mas isso será bom para mim
também.”
O rosto dela... está com um olhar de convicção que eu
nunca tinha visto antes, sua voz é clara e forte, como se
construísse uma vida para si mesma aqui.
Uma vida comigo?
“Eu arranjaria meu próprio apartamento e cuidaria de mim
mesma”, ela está dizendo. “Em vez de deixar Lola lidar com toda a
responsabilidade. Pagar minhas próprias contas, voltar para o
supletivo. Ficar sobre meus próprios pés pelo menos uma vez...”
As palavras dela somem e ela olha para mim. E vê minha
expressão aflita e toda a sua esperança desaparece. Ela escorrega
de sua convicção como uma máscara e a luz de esperança em
seus olhos esmaece.
“De qualquer forma”, ela diz, e limpa a garganta. “Como eu
disse, não sei se é possível. Provavelmente estou amarrada ao
meu contrato.”
Ainda assim, eu não digo nada, mil pensamentos em
guerra, mil palavras bloqueadas na minha boca.
Kacey engole em seco, e ergue o queixo contra o meu
silêncio. “Não importa, é uma ideia estúpida.” Ela joga o
travesseiro de lado e voa para fora do sofá, em direção ao quarto.
“E não estou me sentindo bem. Estou indo dormir cedo. Boa
noite.”
O fechar da porta batendo religa meu raciocínio. “Kace,
espere.”
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No meu quarto, ela tem sua mochila sobre a cama e está
arrancando roupas das gavetas.
“Espere”, digo. “Pare. Eu sinto muito. Precisamos conversar
sobre isso.”
“Você não precisa dizer nada”, ela diz. “Eu entendi, porra.
Eu li no seu rosto. Só que você está errado. Completamente
errado.”
“Errado?”
“Você tem esse olhar assustado que os caras exibem
quando a menina começa a falar de casamento e bebês no
primeiro encontro.” Ela joga suas roupas na mochila, peça por
peça. “Mas deixe-me dizer uma coisa: eu querer mudar para cá
não é uma proposta de casamento. Eu não quero seus bebês. Nós
não estamos nem mesmo namorando. E não quero sair com você.
Neste momento, a última porra de coisa que quero fazer nesta
terra é ficar com você.”
As palavras doem, mas quase não sinto. A possibilidade de
ela se mudar para cá tanto me assusta até meus ossos quanto me
ilumina em lugares sombrios do meu coração.
É meu coração, cara, e você está desperdiçando.
Deus, a esperança caótica e o temor da situação estão me
deixando tonto, e agora estou tendo alucinações com a voz do
meu doador. Eu balanço a cabeça para clarear as ideias.
“O que... você realmente sairia da banda?”
“Sim, Jonah, eu realmente sairia.” Ela coloca as mãos nos
quadris. “Você está surpreso? Eu lhe disse coisas que eu não
contei a ninguém. Eu te contei tudo. Como estou infeliz... e com
medo...”
“Você contou. E eu esperava que você fosse sair. Mas não
achei que você se mudaria para cá.”
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Ela se encolhe com isso, e sua mandíbula se aperta contra
as lágrimas em seus olhos.
“Droga.” Esfrego minhas mãos sobre o rosto. “Eu não quis
dizer isso.”
“Não? O que você quis dizer?”
Nós nos encaramos, ela espera por uma resposta e eu tento
acabar com o caos que se alastra em mim. A influência da força
da atração em querer que ela fique e o que está por vir, se ela
ficar.
“Você odeia o deserto”, digo finalmente. “E o calor. E esta
cidade.”
“Eu nunca disse isso.”
“Eu acredito que suas palavras exatas foram, Eu odeio Las
Vegas.”
Ela olha para mim, a dor gravada em cada contorno de seu
rosto. Meus argumentos são estúpidos e vazios e nós dois
sabemos disso. Nós nos conhecemos apenas há alguns dias, mas
temos uma conexão.
“Olhe, deixe-me explicar”, digo. “Eu não quis dizer...”
“Não se preocupe com isso”, ela diz. “Não importa o que eu
disse, ou o que você disse. Nada do que alguma vez dissemos um
ao outro significa alguma coisa. Então, você está seguro, certo?
Eu não vou mais distrair o seu trabalho ou interromper sua
rotina preciosa.”
“Kace...”
“Eu não pensava em me mudar para cá por você”, ela diz,
com voz embargada agora. “Vamos apenas deixar isso claro. Eu
tinha essa ideia louca que realmente queria enfrentar toda a dor
de cabeça horrível que Chett me causou, na cidade onde ele me
abandonou. Ou escrever sobre o meu pai e exorcizar essa porra
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particular de demônio com uma canção. Ou dez. Ou cem. No
entanto, isso tudo demora até que eu termine. Pensei em tentar
ficar por conta própria, pela primeira vez na minha vida. Pensei
em levar a sério a minha música. E pensei, talvez, que teria um
amigo que poderia chamar e sair com ele algum dia.” Ela fecha a
bolsa. “Mas estou errada.”
“Você não está errada”, digo, esfregando os olhos cansados.
“Não? Você tem um jeito engraçado de mostrar isso.” Ela
pega a sua mochila e empurra a bolsa, ainda vestindo seu short
de dormir e uma camisa. Com os pés descalços, à uma da manhã
e lágrimas ameaçando derramar.
“Kace”, eu digo suavemente. “Onde você vai?”
“Eu não vou ficar aqui”, ela diz. “Eu vou pegar um táxi de
volta para Summerlin. De volta…”
As lágrimas transbordam e seus ombros afundam com o
peso da sua vida que se encaixa totalmente em uma pequena
mochila.
Vou para perto dela, pego a mochila de sua mão e a bolsa
do ombro, e as deixo cair no chão. Então passo meus braços em
torno dela. Ela endurece, então derrete contra mim. Abraço-a
enquanto ela chora contra o meu peito. Um grito feio vem de sua
garganta, porque ela sabe que é bom chorar assim. Comigo.
“Estou com tanto medo”, ela sussurra. “Estou com medo do
que eu quero... de ir atrás dele e foder tudo de novo. Medo de ter
que ligar para meus pais ou Lola... rastejar de volta para eles
para me ajudarem, porque eu tive a oportunidade de uma vida na
palma da minha mão e a joguei fora.” Ela se segura em mim mais
apertado. “Estou com medo de que estou tão ocupada em estar
com medo e que nunca serei nada.”
Acaricio seus cabelos. “Você irá. Você vai encontrá-lo. Você
pode estar com medo e ainda se encontrar. Eu sei que você pode.
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E não quero que você pense que eu não seria feliz por ter você
aqui em Vegas. Eu seria. Quero que você fique, mas...”
“Eu não espero que você cuide de mim”, ela diz. “Eu só
preciso de um amigo para me dizer que não estou louca. E eu
estava esperando que esse amigo fosse você.”
“Eu posso ser esse amigo, mas...”
Oh merda, aqui está...
Meu coração bate forte e adrenalina corre por minhas
veias.
“Eu tenho que te contar uma coisa.”
“O quê?”
Minha mandíbula se aperta e não sai nenhum som. Eu não
tenho nada planejado. Um discurso padrão. Mantive as pessoas
afastadas para que não tivesse que contar a elas. Mas agora aqui
está Kacey...
Ela olha para mim. Seus olhos são bonitos, brilhantes e
cheios de confiança, que eu não conquistei. Eu quase digo a ela
para esquecer. Que sou um idiota e ela ficará melhor se não falar
comigo nunca mais.
Mas uma parte de mim — a parte que pula de alegria com a
possibilidade dela ficar — quer algo mais com esta mulher linda,
enérgica, impulsiva. Meu mundo estava desaparecendo no cinza
até que ela explodiu como uma bomba de cor e luz, e caramba, eu
quero. Eu quero tê-la em minha vida, mesmo que apenas como
amiga. Tem que ser apenas como uma amiga, e mesmo que me
sinta egoísta e errado. Mas talvez, diz esta pequena voz, eu
poderia ser honesto com ela e deixá-la decidir por si mesma.
Mas não aqui. Não no meu simples e pequeno apartamento.
Eu tenho que levá-la a algum lugar bonito, para mostrar a ela o
que estou escondendo e por quê.
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“Você está pronta para uma viagem de campo?”
Ela balança a cabeça lentamente. “Ok.”
Dou um suspiro, mas ele não me traz qualquer alívio.
“Vista-se. Eu quero te mostrar uma coisa.”
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CAPÍTULO 16
kacey
No caminho para onde Jonah está me levando, minha
mente trabalha em centenas de possibilidades sobre o que ele
está planejando me contar. Algo grande. Algo que justifique essa
excursão. E, a julgar pelo olhar assombrado em seus olhos, não é
algo bom.
Meu coração acelera contra o peito.
Acalme-se. Pode não ser tão ruim quanto você pensa.
Seja o que for, estou dentro. Quando disse que estava
pensando em ficar em Vegas, um futuro nasceu entre nós. Não
um romântico. Apenas... estar juntos. Um vínculo. Temos uma
ligação inegável.
Logo a Torre Eiffel aparece à nossa direita. Do outro lado
Las Vegas Boulevard, o Bellagio Hotel e o Cassino iluminado
majestosamente por trás do lago. Jonah vira para a entrada do
cassino e estaciona.
“Outro show de águas?” Pergunto.
Ele dá um sorriso rápido, que aparece em sua boca. “Não
essa noite.”
A água ainda está escura quando caminhamos ao longo
dela. Nenhuma luz colorida ou jatos dançantes. Arrepios
percorrem meus braços nus, apesar do calor. Ao meu lado, Jonah
está bonito em jeans e uma camiseta preta. O bracelete de alerta
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médico em seu pulso direito brilha com as luzes cintilantes do
hotel.
O hall de entrada climatizado do Bellagio me faz tremer
ainda mais. Algumas pessoas andam pelos pisos de mármore ou
esperam nos balcões de check-in. O alerta refinado de um
elevador ecoa. Sob os meus pés, um mosaico lindo se espalha em
todas as direções, levando a uma área de estar luxuriante, com
plantas em vasos. Além da área de check-in ficam alguns arcos
elegantes de creme pálido e ouro. Um teto em formato de abóboda
me faz sentir como se eu tivesse entrado em um palácio romano.
Então, meu olhar é atraído para cima, para a peça central
do lobby Bellagio, e sem dúvida, a razão pela qual Jonah me
trouxe aqui. Vigas do teto fluem na direção de uma obra-prima de
luz e vidro. Centenas e centenas de o que parece ser guardachuvas
de cabeça para baixo, ondulando ao longo do teto em
turbilhão de cores.
“Fiori di Como”, Jonah diz, caminhando ao meu lado.
“Flores de Como de Dale Chihuly.”
“O seu ídolo”, murmuro, olhando para o magnífico buquê
de flores de vidro delicados que brotam do teto.
“Vinte e um metros de comprimento e nove metros de
largura”, Jonah diz, com sua voz baixa e reverente. “Mais de duas
mil peças.”
“É incrível”, digo, então olho para Jonah. “Sua obra é
melhor.”
Ele sorri, mas é um sorriso carregado com algo além de
tristeza. Algo tão forte e profundo, que desejo voltar atrás, para
encontrar uma saída e fugir de tudo o que ele quer me dizer.
“Dale Chihuly é um verdadeiro mestre”, Jonah diz. “Um
virtuoso. A minha esperança é poder criar algo como ele criou.
Algo mais do que apenas uma bela peça de vidro.”
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“Como o quê?” Pergunto em voz baixa.
“Um legado”, Jonah responde. “Vamos sentar por um
minuto.”
Ele me leva para os sofás marrons diretamente debaixo do
vidro soprado de Chihuly. O sofá é suave e me instiga a relaxar
em suas almofadas, mas me sento ereta, me preparando.
Jonah se inclina para frente, apoiando os antebraços nas
coxas e girando o bracelete de alerta médico ao redor. Eu posso
vê-lo medindo palavras e montando frases, articulando até ter a
coragem de me dizer algo que irá mudar tudo.
“Se você vai me pedir em casamento, a resposta é não”, eu
digo. “Nós mal nos conhecemos. Eu preciso de pelo menos mais
três cupcakes.”
Jonah ri levemente.
“Não é isso?” Eu digo, tentando aliviar o momento, mas
minha voz não ajuda muito. “Você é gay?”
Jonah olha para mim, em seguida, seus olhos escuros
ficam quentes e suaves. “Segundo erro”, ele diz.
“Ok”, digo, engolindo em seco. Minha próxima e última
questão presa na minha garganta. Uma vez feita e respondida,
minha vida nunca mais será a mesma. “Você está doente?”
“Sim, Kacey.”
“Quão doente?”
“Doente Terminal.”
As palavras caem no espaço entre nós como uma granada
pronta para explodir. Meu peito se aperta como se eu tivesse
inalado ar abaixo de zero. Eu balanço a cabeça vigorosamente,
enquanto tento processar e rejeitar a notícia.
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“Ok”, digo. Mexo minhas mãos pelo cabelo e as mantenho
cruzadas por trás do meu pescoço. “OK. É o seu coração?”
“Sim”, Jonah diz. “Rejeição crônica de transplante.”
Meu cérebro percorre tudo que eu já ouvi falar sobre a
rejeição de órgãos, o que não é muito. “Eu pensei que fosse algo
que já teria acontecido até agora.”
“A rejeição aguda, por vezes, acontece logo após a cirurgia.
Eles dão medicamentos para acalmar o sistema imunológico, e
normalmente eles funcionam.”
“Mas você toma todas as drogas.”
Ele assente. “Eu tomo. Mas em vez de um protesto
eventual, meu sistema imunológico tem estado combatendo meu
coração ao longo do tempo, rejeitando-o lentamente, apesar dos
remédios.”
Seus braços rodeiam minha cintura, agarrando punhados
de minha camisa e me abraçando apertado. “Como você sabe que
é o que está acontecendo? Você não parece doente.”
“Receptores de transplante de coração tem que fazer uma
biópsia a cada mês para testar esse tipo de coisa. Na minha
terceira biópsia, há oito meses, eles encontraram evidências de
aterosclerose, e...”
“O que é isso?” Eu digo, com minha voz áspera e acusando,
como se ele estivesse inventando as palavras.
“Endurecimento das artérias”, ele diz. “O diagnóstico real é
cardíaca doença vascular do enxerto. CAV. O sistema imunológico
ataca o coração, a partir de tecido de cicatriz. O tecido cicatricial
acumula e começa a desgastar o coração até que, eventualmente,
ele falha.”
Eu odeio o teto então. Todas as cores brilhantes e alegres e
bonitas. Uma festa em fúria sobre o horror e injustiça me
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estrangulando. Eu olho para o chão lustroso e liso, tentando
respirar.
“Como...?” Mais uma vez, tenho que engolir o caroço duro
depositado na minha garganta. “Quanto tempo?”
“Quatro meses, neste momento. Talvez mais. Talvez
menos.”
Meu coração entra em queda livre, e minha pele fica fria, da
cabeça aos pés como se eu tivesse sido mergulhada em água
gelada. “Quatro meses?”
Quatro meses.
Dezesseis semanas.
Cento e vinte dias.
Quatro meses é nada.
“Oh meu Deus”, eu sussurro, as palavras espremidas para
fora do meu peito. Sinto as lágrimas molhadas no meu rosto.
Sinto uma lâmina gotejando sob meu queixo e rastejando pelo
meu pescoço. Estou chorando. Estou respirando, pulsando e viva.
E Jonah está morrendo.
Ele estende a mão como se quisesse me confortar, mas a
deixa cair. “Sinto muito”, ele diz.
Uma gargalhada escapa de mim, ecoando os arcos de
mármore. “Por quê? Por que você está pedindo desculpas a mim?
E por que você não me contou antes?”
“Se você pudesse ver seu rosto agora, você saberia o
porquê.”
As lágrimas escorrem do meu queixo, ainda mais. Eu só o
encaro, boquiaberta e perplexa.
“Foda-se”, ele diz, esmagando um punho no braço do sofá.
“Eu odeio fazer isso com as pessoas. Eu odeio o que isso faz com
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você, e o que faz comigo. Torna tudo tão real, quando tento
manter minha cabeça baixa e sobreviver. Superar. Chegar até
outubro com uma obra acabada e...” Ele aponta para o teto
acima. “Isso. Um legado. Eu só quero deixar uma parte de mim
para trás que signifique algo.”
“Sua rotina...” Eu digo, usando um pouco de minha manga
para limpar meu rosto. “Agora entendo. Mas não entendo por que
você afastou todos os seus amigos. Para poupá-los? Você não
acha que eles preferem decidir por si mesmos? Você não acha que
eles gostariam de estar com você...?”
“Eu sei que eles gostariam”, ele diz. “Eu tive que dizer a
minha mãe o que eu te disse. Eu tenho que ver minha família e
amigos e contar os minutos, sempre que estão comigo. A dor em
seus olhos, as palavras cuidadosas, os abraços de despedida que
duram um pouco de tempo demais. Percebo através do Oscar,
Dena e Tania, percebo pelo Theo e meus pais... vejo neles, o
porquê tenho que fazer. Qualquer outra pessoa... não suportaria.
Eu tenho o meu círculo e é isso. Eu não quero dizer às pessoas
que estão fora desse círculo. Não quero que elas tenham que
descobrir. Eu não deixo ninguém entrar...”
“E ainda assim”, digo, engolindo o ar, tentando obter
autocontrole. “Aqui estou.”
“Aqui você está...”, Jonah diz, com os olhos varrendo meu
rosto. “Acredite em mim, eu não queria te deixar entrar. Mas foi
quase como se...”
“O quê?” Eu sussurro.
“Como se eu não tivesse escolha”, Jonah diz. “Eu tentei
manter o círculo fechado e minhas paredes erguidas, manter a
minha rotina... Mas você entrou de qualquer maneira.” Ele
gentilmente limpa uma lágrima do meu queixo. “Você sente isso
também, certo?”
Eu balanço a cabeça. “Sim.”
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“Kace...” Ele balança a cabeça, passa as mãos pelo cabelo,
lutando consigo mesmo. “Eu não quero que você tenha que
passar... pelo que vai acontecer. É por isso que agi como um
idiota mais cedo esta noite. Vi isso se desenrolar até o fim, e...
não posso fazer isso com você.”
Ficamos em silêncio. As pessoas iam e vinham passando
pelo nosso sofá, alheias ao que estava acontecendo.
“Como é que sabem que são quatro meses?” Eu digo.
“Como podem ser tão específicos?”
“Eles podem dizer. Apesar…”
“Apesar do quê?” Digo, agarrando a cada palavra como uma
mulher se afogando, agarrando um pedaço de bote salva-vidas.
“Eu deveria fazer uma biópsia a cada mês. Assim, os
médicos poderiam ser ainda mais específicos. Mas eu parei de ir.”
“Por quê?”
“Porque é um processo terrível de merda e isso me derruba
por quarenta e oito horas. Eu tenho muito trabalho a fazer na loja
para perder esse tempo. Em segundo lugar, não preciso de uma
biópsia para saber. Os sintomas vão aparecer.”
“Quais sintomas?” Pergunto.
“A fadiga e falta de ar, principalmente.” Jonah brinca com o
bracelete de alerta médico. “Eu tenho isso por agora, mas é
pouco. Eu não posso mais correr, ou ir na academia como eu
costumava fazer. Mas quando começar a ficar cansado fazendo
pequenas coisas, ou achar que é difícil recuperar o fôlego, sem
motivo, eu vou saber. Não preciso contar os dias no mesmo
período.”
Um raio de esperança, uma pequena chama no meio da
tempestade, vem à tona no meu coração. “Então... você não sabe
de verdade. Você não tem ideia de quão ruim — ou não — a
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cardio... a coisa CAV é. Talvez tenha sido interrompido. Talvez os
remédios que está tomando estejam funcionando.”
“Não...”, ele diz.
Não dou ouvidos. “Você é como o gato de Schrödinger.
Enquanto não fizer outra biópsia, a tampa da caixa está fechada.
Você poderia viver um longo tempo. Anos, mesmo. Felizmente no
escuro.”
Ele sorri um pouco. “A ignorância é felicidade, certo? Mas
eu não tenho falsas esperanças, e não quero que você tenha. Eu
não estou em negação, mas não estou convidando à luz dura e
fria do dia para me torturar. Você pode ver a diferença?”
Eu balanço a cabeça, e ele pega minha mão. Seus dedos
enrolados em torno dos meus e segura firme. Sua mão... forte e
sólida. A cicatriz de queimadura na ponta do polegar... mas fora
isso, saudável. Ele tem que ser saudável...
“Eu tentei me convencer que os médicos estão errados”,
Jonah diz. “Mas você não pode fugir da verdade. Não estou sem
esperança, mas sou realista. Eles podem estar errados. Eles
provavelmente não estão. Essa é a minha conclusão.”
“Mas e se estiverem errados? E se...?”
Ele balança a cabeça. “Tudo o que posso fazer é viver dia a
dia... Eu tomo medicamentos extras para tentar retardar o CAV.
Faço a minha dieta rigorosa ainda mais rigorosa e durmo em uma
cadeira em vez de uma cama. Qualquer coisa para conseguir um
pouco mais de tempo para fazer o meu trabalho e ver a exposição
da galeria.”
Eu luto por um outro argumento, mas não tenho nada.
Exalo profundamente. “Pode ficar registrado que passei por essa
conversa sem uma bebida ou um cigarro?”
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Ele ri e nossos olhos se encontram, um momento, num
piscar de olhos, e então nós estamos nos braços um do outro,
segurando forte.
“Jonah...” Eu sussurro contra o seu pescoço.
“Eu sei.”
“Eu não... Eu não posso...”
Ele me embala gentilmente. “Eu sei.”
Ficamos lá um longo tempo, até que Jonah me dá um
aperto final e me segura pelos ombros. “Vamos voltar. Está tarde.
Vamos dormir um pouco e na parte da manhã...”
“Jimmy vem para me levar ao aeroporto”, digo. “O que faço,
então?”
“Você vai com ele. Fale com Lola. Decida se quer ficar com
a banda ou encontrar uma maneira de sair se é isso que você
precisa fazer. Você vai encontrar um caminho.”
“E você?”
“Não se preocupe comigo.”
Eu olho para ele bruscamente. “Um pouco tarde para isso,
amigo.”
Seu sorriso é suave e tranquilo, e sua voz treme enquanto
fala. “Você pode manter contato comigo ou não. Se quiser
continuar, eu estarei aqui para você. E se você não fizer, vou
entender. Eu prometo que vou entender. Ok?”
Eu não respondo que tudo bem. Nada disso está bem.
Minha mente não processou tudo, porém; tenho mais lágrimas
para chorar, mas agora os meus olhos se sentem drenados e
dormentes. Nós caminhamos para fora do Bellagio de mãos
dadas, para fora sob as flores de vidro; um jardim que nunca vai
murchar ou morrer.
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Voltamos para a sua casa. Sem discussão, eu empilho os
travesseiros no alto da cama para que ele fique inclinado, então
deito enrolada ao lado dele.
Eu entendo por que ele não conta a todos sobre sua
situação. Dor como esta, está além do âmbito privado ou pessoal.
Fica lá no fundo, abaixo de tudo que é superficial, e convoca a
todos que sabem para ir lá no fundo com ele. Fecha distâncias.
Nós ficamos enrolados um no outro, e coloco minha cabeça
contra seu peito.
“Será que isso dói?” Eu sussurro.
O estrondo de sua voz no meu ouvido está sonolento. “Não.
Estou bem.”
“Alguma coisa está doendo agora?”
“Não, Kacey.” Jonah acaricia meu cabelo, me segura mais
apertado. “Neste momento, nada dói.”
Ele sobe e desce com a respiração fácil. Sob o meu ouvido,
seu coração bate forte e constante.
Um lampejo de esperança em mim queima, determinado a
perdurar por toda a noite.
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CAPÍTULO 17
kacey
Olho pela janela para ver um sedan preto no
estacionamento da casa de Jonah. Jimmy Ray sai, encosta-se ao
para-choque e acende um cigarro.
Viro para ficar de frente para Jonah no balcão da cozinha.
“Ele está aqui”, digo.
“Ok.”
“Tenho que ir”, digo, tentando reunir forças para a decisão
que está por vir. Eu fui dormir na noite passada flutuando sobre
a paz, esperança, e acordo me sentindo enjoada. O impacto da
revelação de Jonah desce como uma tempestade uivando pela
minha cabeça. Na noite passada eu pensei que sabia o que fazer.
Esta manhã, não sei onde eu estou e não confio em mim mesma
para ser forte o suficiente por qualquer um. A banda, Jonah, nem
sequer eu mesma.
Minha única certeza é de que se não continuar a turnê
enquanto tento descobrir as coisas, vou quebrar o meu contrato,
e serei deixada sem opções.
Viro para a janela. “Vamos.”
fora.”
Jonah toca meu ombro suavemente. “Eu vou levá-la lá
Ele carrega minhas bolsas para mim até o estacionamento,
onde Jimmy espera com impaciência, o enjoativo calor, o torna
ainda mais ansioso do que o habitual.
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Eu me inclino para perto de Jonah. “Não quero dizer adeus
com ele assistindo.”
“Nem eu.”
“Preciso de mais de um minuto, Jimmy”, eu falo, minha voz
áspera com o eco das lágrimas.
Jimmy olha para o relógio e murmura algo enquanto Jonah
coloca as bolsas na beira do estacionamento. Nós caminhamos
para o pequeno pátio e eu noto que ele usa uma jaqueta leve
embora a temperatura deva estar em torno dos 37°C. Ele puxa
uma caixa pequena do bolso e a estende para mim.
“Um presente de despedida”, ele diz, com um tremor na
borda de sua voz.
Pego a caixa e abro. O sol brilha sobre vidro e lágrimas
turvam meus olhos. É o frasco de perfume, acabado e perfeito.
Faixas elegantes de violeta e índigo giram em torno de seu corpo
pequeno e achatado. O pescoço aberto em um círculo plano e a
rolha é um belo mármore, claro. Seguro, deixando o sol brilhar
através do interior vazio.
Não está vazio, penso. Ele carrega a respiração de Jonah.
Medo de que eu deixe cair, coloco a garrafa de volta em sua
caixa e seguro firmemente para mim. Olho para ele. “Estou com
medo”, sussurro. “Eu tenho medo de que se eu for embora, esteja
falhando. Se eu ficar, estarei falhando com a banda. E com você.
Você disse que rodear em torno dos hospitais não era coisa da
sua ex-namorada. Não é a minha também. Estou com tanto medo
de deixar você se eu ficar.”
Seu sorriso é tão doce e quente, mas triste também.
Amarelo tingido com azul. “Você não pode me deixar. Não espero
nada de você, Kacey. Apenas amizade, muito ou pouco, o quanto
você quiser dar.”
“Eu não sei o que fazer.”
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“Você saberá”, Jonah diz. “Vá para o seu quarto em sua
próxima casa ou no hotel, longe da banda. Feche a porta e
tranque-a, e com calma, pergunte-se o que você realmente quer
fazer. Você, Kacey Dawson. O que você quer para si mesma? Não
pense em mim, em Lola ou Jimmy ou qualquer outra pessoa. Só
pense em você.”
O que eu quero. Eu achava que sabia, mas poderia voltar
aqui para isso? Eu poderia encontrar força para ficar sozinha? E
se eu fizesse, o quão rápido os quatro meses passariam? Eu
poderia assistir Jonah...?
Estremeço, disposta até mesmo terminar o pensamento, e a
covarde em mim sussurra que não tenho fibra para o que quero.
“Os contratos são quase impossíveis de quebrar”, digo. “Eu
poderia ser presa, não importa o quê.”
“Você pode. Mas a coisa certa vai sempre encontrar um
caminho.” Ele dá um passo mais perto. “Cuide-se, ok? Acima de
tudo, cuide de si.”
Eu balanço a cabeça e me inclino contra ele. Seus braços
me rodeiam e viro meu rosto em seu peito, inalando
profundamente. Eu quero levar algo de Jonah comigo, a parte que
me mantém firme, calma e tranquila.
Nós caminhamos de volta para o estacionamento, onde
Jimmy está andando na frente do sedan e puxando a gola de sua
camisa com o calor.
“Jesus, gatinha, estou morrendo aqui fora. Vamos ir logo.
Temos que estar no aeroporto em duas horas.”
Ele e Jonah olham um para o outro enquanto o motorista
do sedan leva minhas bolsas e as arruma no porta-malas. O
motorista abre a porta para mim, e Jimmy faz sinal para eu
entrar.
Jonah nivela um dedo para Jimmy. “Você, cuide dela.”
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“Claro. Temos uma banda de abertura completamente
nova, como prometido.” O sorriso de Jimmy é brilhante e falso.
“Eu cuido das minhas meninas. São como filhas para mim.”
Jonah levanta uma sobrancelha, e seu olhar endurece
como gelo.
Jimmy tosse. “Não importa”, ele diz, subindo no carro.
“Temos um horário a cumprir.”
Viro para Jonah. Ele olha para mim e nossos olhos se
encontram. No segundo seguinte eu estou de pé na ponta dos pés
e pressionando meus lábios nos dele. Ele faz um som dentro do
seu peito, como tivesse dor, e sinto a dor em mim. Eu me afasto
antes do beijo suave se tornar uma promessa forte que eu não
poderia manter.
Eu me viro e entro no carro e sem olhar para trás. Nem
mesmo para acenar.
Eu não estou pronta para dizer adeus.
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CAPÍTULO 18
kacey
A mansão em Summerlin está destruída. Estou no centro
do meu quarto, olhando para a bagunça. As queimaduras de
cigarro no carpete, o resíduo de maquiagem na pia, manchas não
identificáveis sobre o tapete.
“Eu fiz suas malas”, Lola diz da porta.
Eu pulo, meu coração acelerado. “Você me assustou.” Meus
nervos estão em frangalhos. Sento na cama desfeita e aliso o
edredom, como se ajudasse. “Este lugar está um desastre.”
Lola dá de ombros. “É para isso que servem os depósitos de
caução.” Ela cruza os braços. “Então... Você está com a gente?”
“Estou aqui, não estou?”
“Você está aqui, mas você está com a gente. Eles não te
chamam para fazer parte de uma banda para nada, você sabe.
Precisamos tocar como um todo. Você está pronta para fazer isso
agora?”
Dou de ombros, sem olhar para ela. “Certo.”
Ouço Lola suspirar e deslocar sobre os calcanhares. “É o
cara? O motorista da limusine?”
“O que tem ele?”
“Ele é um outro Chett? Outro cara que vai te foder sabe
Deus quantos anos? Porque, honestamente, Kacey...”
“Ele está morrendo.”
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Os braços de Lola caem em suas laterais. “O que quer dizer
com ele está morrendo?”
Olho para ela, balanço a cabeça.
O queixo inclinado. “Quer dizer, como, morrendo,
morrendo?”
Eu balanço a cabeça.
“Câncer?”
“Insuficiência cardíaca. Lenta falência cardíaca.”
Lenta falência que vai levá-lo rápido pra caralho...
“Merda.” Lola senta ao meu lado na cama. “Oh, querida, eu
sinto muito.” Ela coloca os braços em volta de mim, embora
quase não a sinta. “Bem. Você o conheceu na sexta-feira à noite,
certo? Ou sábado de manhã? Quando você recuperou a
consciência em seu sofá?”
“Sim”, digo. “E daí?”
“Então... É chato que ele esteja doente, mas você o
conheceu há quatro dias. Se isso.”
Eu pisco para ela. “E?”
“Eu só estou dizendo, você descobriu antes de ficar muito
profundo. A última coisa que você quer é se envolver com alguém
que não pode te dar um futuro.”
“Não.” Eu me levanto da cama, balançando a cabeça
vigorosamente agora. “Não, você não vai fazer isso.”
“Fazer o quê? Trazer você de volta à realidade?”
“Falar sobre ele. Você não o conhece.” Aceno minhas mãos.
“Deixa para lá. Não vou falar com você sobre ele. Ou sobre esses
quatro dias. Eles são meus. Então, vamos... porra, logo. Temos
que pegar um avião.”
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“Fico feliz em ouvir isso”, uma voz diz da porta. Jeannie se
encosta na moldura, com braços cruzados sobre o camisa preta,
mostrando o sutiã de renda preto. Ela afasta uma mecha de
cabelo escuro de seus olhos. “Você está pronta para se juntar a
nós?”
“Nós estamos bem, Jeannie”, Lola diz, olhando para mim,
seus olhos suaves com compaixão, mas rígidos dizendo para não
foder com isso. “Ela está pronta. Certo? Só precisava de uma
pequena pausa. Algum tempo para relaxar. Nada de errado com
isso.”
“Sim, eu descansei”, digo. “Agora estou pronta.”
“Bom” Jeannie responde. Quando passo por ela, a garota
lança para fora a ameaça vazia que vem jogando em mim desde
que entrei para a banda: “Porque há uma centena de guitarristas
que morreriam para ter o seu trabalho.”
Eu murmuro, “Não diga?”
Sexta-feira é o primeiro concerto em Denver e faço o show
sóbria.
Dizer que foi um desastre seria gentil.
Eu fodi o meu solo em “Talk Me Down” entrei tarde demais
em três músicas diferentes, e errei os acordes da introdução de
“Taste This” no final do compasso, esquecendo que já tinha
tocado. Jeannie teve que parar o show e fazer uma piada sobre
um refrão precoce, enquanto me lançava um olhar mortal.
“Que porra é essa, Kacey?” Ela grita para mim na sala
verde. “Você vai e tira um tempo por quatro dias, supostamente
para se recompor, e depois volta mais esquisita do que antes.
Você está tentando nos arruinar?”
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Violet e até mesmo Lola estão à espera de uma resposta.
“Sinto muito”, digo. “Eu estava fora de mim esta noite. Vou
ficar bem amanhã, prometo.”
Mas não fico. Não lá dentro, de qualquer maneira. Eu
consigo acertar no show na noite seguinte, sem foder, mas no
segundo que acaba, me afogo na bebida da sala verde.
O primeiro gole queima com o uísque que quase me faz
vomitar. O segundo é melhor. Até o quinto, a dor no meu coração
não sumiu totalmente, mas fica suportável.
Nós festejamos de volta no nosso hotel, com a banda — e
cinquenta dos nossos mais próximos amigos lotam as suítes que
Jimmy alugou. Eu nunca fui claustrofóbica, mas sinto isso
aquela noite. Muitos corpos, falando muito alto e bebendo
demais. Fumaça — de maconha e cigarros — paira no ar como
uma névoa cinzenta, e a música está tão alta que eu mal posso
ouvir o cara pendurado meu ombro. Ele é alto, bonito como um
espécime masculino deveria ser. Como um mafioso. Sua barba
arranha meu rosto quando ele se inclina. Não é um fã ou parte da
equipe. Um amigo dos executivos de gravadoras, talvez. Ou não.
Eu não sei quem ele é e eu estou bêbada demais para descobrir.
Será que isso importa?
Ele poderia ser qualquer um, e eu poderia ser qualquer uma
para ele.
“Qualquer um, mais ninguém é igual a ninguém”, eu
divago.
“Você está perdida”, ele ri. E se inclina, sua respiração
molhada com vodca na minha orelha. “Você quer sair daqui?”
“Sim”, digo. “Eu realmente quero. Eu realmente quero sair
daqui, porra.”
Ele sorri com os olhos meio entreabertos e começa a me
puxar. Eu resisto e me afasto dele, cambaleando um pouco.
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“Vou retocar a maquiagem”, eu digo.
Isso o anima ainda mais. “Você tem um pouco de pó?”
“Eu tenho que fazer xixi”, digo em voz alta.
Passo por Jimmy, Violet e Lola, todos conversando e rindo.
Eu abaixo e me esquivo para evitar ser notada. Ignorando o
banheiro, corro para fora da suíte, até o fundo do corredor, para o
meu quarto. O desenho padrão de roda no tapete me faz ficar
tonta. Eu espero que o mafioso apareça qualquer momento atrás
de mim, como se fosse um filme de terror ruim que eu já tinha
visto e sabia o que ia acontecer.
Eu me atrapalho com o cartão chave na fechadura e
praticamente caio lá dentro. Bato a porta, tranco e jogou o cartão.
A força se esvai de mim e deslizo pela porta, com lágrimas
escorrendo pelo meu rosto. Esfrego meus olhos e meu rímel
mancha a parte de trás das minhas mãos.
Mesmo a dois quartos de distância, ainda posso ouvir a
festa. Eu cubro meus ouvidos, olhando para a bolsa no meu colo,
meu celular deslizando para fora. Eu o pego, vou para meus
contatos e encontro o número de Jonah. Meu polegar paira sobre
o botão de chamada, mas não o toco. Não posso ligar para ele
bêbada e histérica. Isso iria preocupá-lo até a alma e o que ele
poderia fazer de qualquer maneira?
É muito humilhante, porra. Nós fomos separados antes
mesmo de estarmos juntos, e eu já caí fora. Ele provavelmente já
terminou mais oito peças de sua obra. Seu legado. Estou bêbada
em um quarto de hotel.
Tiro meus sapatos de salto alto preto e me esforço para
ficar em pé, minha visão focada no minibar. Abro, pego uma
pequena garrafa de algo marrom e começo a torcer o topo, pronta
para virar a noite no esquecimento.
Então meu olhar turvo pousa no frasco de perfume. O belo,
perfeito desenho com suas faixas delicadas de espiral roxo em
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torno do seu meio. Eu encaro. Não por acaso a minha pessoa
sóbria colocou essa peça em cima do pequeno armário acima do
minibar, em vez de deixá-la no banheiro com o resto do meu
perfume.
Eu solto a bebida, mas não pego o frasco de perfume.
Jonah fez para mim. Se o quebrar, não teria nada dele.
Faço uma respiração profunda, pego uma garrafa de água
do bar e fecho a porta com força.
Então vou para a cama.
Por trás de minhas pálpebras fechadas, meus pensamentos
nadam em uma infusão borrada: água e luzes dançantes, fogo e
vidro, e um verde e laranja em torno dos meus ombros. Eu me
enrolo com as cores e, finalmente durmo.
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CAPÍTULO 19
jonah
“Oi. Jonah.”
Eu levanto meu olhar das bolhas flutuando à superfície da
minha cerveja sem álcool. Oscar olha para mim.
“Você ainda está conosco?” Pergunta.
“Desculpa?”
“Você está bem, cara?”
“Certo. Estou bem.” Tomo um gole e finjo estar interessado
nas pessoas que se deslocam e falam em torno de nós. Theo teve
que trabalhar até tarde na Vegas Ink, então são só Oscar e Dena
sentados à minha frente em uma mesa no Aria Hotel, um dos
poucos que não é permitido fumar em qualquer lugar nas
instalações.
The Lift está bem longe de ser os restaurantes pequenos
que normalmente íamos, ou da pequena casa que Oscar e Dena
alugaram em Belvedere. O elevador tem enormes colunas grossas
do que parecia casca de árvore como se fosse ouro, se erguendo
de um tapete redondo roxo e violeta. Os clientes bebem coquetéis
de $12 em mesas e cadeiras roxas, e tem uma parede de ouro
maciço apoiada no bar. É elegantemente berrante, na minha
mente, mas preciso da distração.
Ou pelo menos foi o que eu disse a mim mesmo. Nunca
fiquei insatisfeito com as nossas saídas habituais antes, mas
Kacey Dawson jogou cor e luz em minha vida, e o que era
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habitual para mim agora parece simples e monótono. O elevador
não é nada simples e monótono, mas o roxo me faz pensar em
Kacey. Esfregando sua ausência na minha cara.
Quem estou enganando? Tudo me faz pensar em Kacey.
“Conte-me sobre a menina”, Oscar diz. “Eu ouvi de Theo
que você tinha uma estrela do rock dormindo com você. Rapid
Confession está na rádio o tempo todo no trabalho. São a grande
sensação do momento, homem, e você estava com a guitarrista
em seu sofá?”
“Não é grande coisa. Ela precisava de uma pausa das festas
e agora está de volta com sua banda.”
“Mas ela ficou com você por quatro dias.” Oscar balança as
sobrancelhas. “Qualquer coisa interessante que você gostaria de
relatar aconteceu durante esse período de tempo?”
Eu esperava que Dena repreendesse o namorado por ser
grosseiro, mas seu olhar escuro não tinha essa intenção. “Ela foi
uma boa companhia? Você gostou de tê-la ali? Conte-nos tudo.”
Eu sei que o interesse de Dena é ligeiramente mais
refinado: ela estudou literatura clássica e poesia do Oriente
Médio, e é uma verdadeira romântica. Ainda assim, é uma
anomalia ter deixado alguém entrar no meu círculo, e a
curiosidade flui deles em ondas, me atingindo de todos os lados.
Eu tomo um gole da minha falsa cerveja para ajudar a acalmar a
minha irritação. Eles têm boas intenções, mas me sinto como
uma criança voltando para casa para relatar a primeira paixão.
“Não há muito para dizer”, explico. “Ela principalmente
descansava enquanto eu trabalhava na Hot shop ou na A-1. Eu
fui jantar com minha família no domingo e ela pediu uma pizza
sozinha.”
“Você cancelou com a gente, embora, para ficar com ela”,
Oscar diz. Ele sorri conscientemente sobre sua cerveja. “E Theo
disse que ela é gostosa.”
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“Ele disse?” Eu tomo um gole de cerveja. “Isso é
interessante.”
“Ele disse.” Oscar recosta-se na cadeira. “Então você teve
uma estrela do rock linda em seu apartamento durante quatro
dias. Por favor, me diga que você não deixou uma situação como
essa terminar com um abraço ou um aperto de mão.”
Dena golpeia o braço de Oscar. “Você vai vê-la novamente?”
“Eu não sei. Acho que não. Ela quer romper seu contrato
com a banda, mas não é fácil. Se é mesmo algo que ela quer
fazer...”
“Você gostaria de vê-la de novo?”
Com tudo o que eu...
“Não tenho muito a dizer. Ela vai estar em turnê por
meses.”
“Existem dispositivos mágicos chamados telefones.” Dena
descansa a palma da mão em seu queixo, com as sobrancelhas
levantadas. “Você pode ligar para ela, não pode? Mensagens?
Skype?”
“Ela precisa de espaço para descobrir o que quer, sem
minha interferência”, digo. Oscar começa a responder, mas eu o
interrompo. “Olha, não sei o que vai acontecer daqui em diante,
ok? O que eu sei é que tenho um monte de trabalho a fazer antes
da exposição da galeria. Portanto, é melhor não ter distrações.”
Um curto e tenso silêncio paira, seguido pela culpa que
sempre me golpeia nos raros momentos que brigo com alguém.
Começo a pedir desculpas por ser uma companhia de merda, mas
Oscar e Dena não são meus melhores amigos atoa. Suas
preocupações comigo são palpáveis nesse bar chamativo e
barulhento. Oscar se inclina para mim, com a expressão séria,
enquanto Dena desliza a mão por cima da mesa pegando a dele.
“Conta pra gente.”
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Coloco o meu copo de cerveja na mesa, fico girando e
girando sobre a mesa roxa. “Ela teve que ir”, digo calmamente.
“Eles acabariam com ela se quebrasse o contrato. Kacey precisa
decidir o que é melhor para ela, e de qualquer maneira eu não
podia pedir para ela ficar.”
“Por que não?”
Dou a eles um olhar. “Você sabe o motivo. Você sabe por
que não me envolvo. Não tenho nada para oferecer, somente a
amizade com uma data de expiração.” Esfrego minhas mãos pelo
cabelo. “Foi estúpido. A coisa toda. Imprudente e estúpido.”
“E sobre o que você quer, Jonah?” Dena pergunta. “O que
você quer?”
Olho para os meus amigos que estão juntos durante o
tempo que eu os conheço. A procura de Dena por significados
mais profundos é o contrapeso perfeito para Oscar, que percorre
a vida somente na superfície como um jet-ski. Ela o castiga, ele a
faz rir. Meu olhar se desvia para as mãos dadas, sua pele escura
contra a pálida, seus dedos entrelaçados. Lembro da mão de
Kacey na minha no restaurante.
Não foi o suficiente. Eu quero mais…
Mas eu não posso ter mais.
Dou um sorriso. “Quero terminar a minha obra, e quero
outra cerveja sem álcool de oito dólares.”
Oscar começa a rir e parece contente em deixar o assunto
morrer. O sorriso de Dena é direcionado a mim o resto da noite, e
sei que ela não irá me deixar escapar tão facilmente.
Sendo sempre o motorista da rodada, deixo Oscar e Dena
em sua casa.
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“Não se esqueça”, Oscar diz, apertando a minha mão e me
puxando para um meio abraço antes de ir embora. “Great Basin,
viagem de acampamento em três semanas. Certifique-se de tirar
um tempo do trabalho.”
“Já está agendado”, eu digo.
A alegria na minha voz é forçada: estou preocupado com a
perda de trabalho no Hot shop e a perda de dinheiro do meu
trabalho, mas Oscar e Dena planejaram esta viagem há meses.
Eles querem passar tempo comigo e não posso dizer não. São
meus amigos mais antigos, os únicos amigos que eu não posso
deixar de lado quando meus últimos resultados da biópsia já são
conhecidos. Eles estão enraizados em minha essência, não
importa quanto tempo minha vida ainda vá levar.
Dena dá a volta para o lado do motorista, usando o olhar
maternal que significa que vem um sermão, geralmente precedido
por uma citação de seu poeta favorito, Rumi.
“O que é falso incomoda o coração, mas a verdade traz uma
alegre tranquilidade”, ela diz.
“E o que isso significa, amor?”
“Significa que você sente falta desta garota. Não finja que
não. Você vai se sentir melhor sendo fiel a seus sentimentos.” Ela
apoia as mãos na janela aberta. “Eu não gosto de falar sobre sua
agenda, você sabe disso.”
Balanço a cabeça. ‘Minha agenda’ tornou-se um eufemismo
para o tempo que me resta. A ‘exposição da galeria’ é a linha de
chegada que preciso atravessar.
“E sei que você quer deixar uma bela peça de arte para
trás. O seu foco está apenas no destino, não na jornada.” Dena
coloca a mão na minha bochecha. “Você não deveria também
tentar fazer a coisa mais importante ao longo do caminho?”
Eu cubro sua mão com a minha. “O que é?”
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“Ser feliz.”
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CAPÍTULO 20
kacey
Cidade: Salt Lake
Nove dias sem Jonah. Cinco dias sem bebida.
Observo as bolhas dançarem na minha taça de
champanhe, mas eu não bebo. Nem uma gota desde a última
noite de bebedeira no quarto de hotel de Denver. Cada nervo do
meu corpo grita por um gole, mas só giro o copo delicado dando
voltas e voltas. Dão fichas de sobriedade por cinco dias? Eu
duvido disso, mas deveriam. Cada porra de hora em que não cedo
à necessidade é uma batalha.
Sento em uma enorme cabine com formato de meia-lua
com dez outras pessoas na seção VIP do clube. A música é alta e
implacável; posso sentir as batidas na base do meu peito. Corpos
se contorcem na pista de dança um nível abaixo. Em nossa
cabine, conversa e risos giram em torno de mim. As meninas do
RC estão flertando com os caras da nossa nova banda de
abertura. Todo mundo está feliz que nosso mais recente conjunto
de shows correu bem, mas tudo que eu consigo pensar é que
estou no lugar errado, fazendo a coisa errada com as pessoas
erradas.
Sento apertada entre Jimmy Ray e Phil Miller, o
proprietário deste clube e, por acaso, do Pony Club, em Las
Vegas. Ele se vira para mim agora, mudando o volume em minha
direção com uma rajada de suor e muita colônia.
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diz.
“Então você é a pequena criadora de problemas, não é?” Ele
Ele fuma um charuto que cheira vagamente como alcaçuz.
Eu odeio alcaçuz. Meus ombros se retraem e fico lá. Tem quatro
pessoas à minha direita, cinco à minha esquerda. Estou presa e
espremida no meio da cabine.
“Sabe, vai me custar uma pequena fortuna para consertar
meu salão verde.”
“Desculpe por isso”, eu murmuro.
Jimmy vira em nossa direção. “Vamos lá, Phil. Não vamos
pular direto para os negócios sem um pouco de prazer em
primeiro lugar, certo?” Ele passa o braço em volta de mim, sua
mão deslizando em meu braço nu. Estou usando um top de seda
em camadas sobre o outro, parte superior mais apertada, tanto
como o de baixo. O olhar de Phil parece permanentemente colado
ao meu decote. “Kacey gosta de se divertir, isso é tudo. Às vezes
um pouco demais.”
O proprietário do Pony Club mastiga com a boca molhada
seu charuto. “O inferno, eu não posso culpá-la, querida. Eu gosto
de me divertir também.” Sua mão direita pousa na minha coxa
sobre a calça de couro. Humilhação e raiva aquecem meu rosto.
Phil e Jimmy trocam um olhar que eu não gosto, e, em
seguida Jimmy sussurra em meu ouvido. “Uma ação judicial
seria muito ruim agora, gatinha. Nossa gravadora não tem os
bolsos cheios de uma Sony ou Interscope.” Ele dá um aperto no
meu ombro. “Você estaria fazendo a todos nós um grande favor se
colocar Phil Miller em um humor realmente bom.”
Minha cabeça vira para ele lentamente. “E como,
exatamente, você gostaria que eu fizesse isso, Jimmy?”
Ele se inclina um pouco para trás, rindo. “Que brilho de
aço azul é esse? Só... tome algumas bebidas com ele. Talvez uma
dança ou duas. Veja o que acontece.”
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“Veja o que acontece.”
De repente, sentada naquela cabine, cercada por pessoas
em um clube lotado, eu me sinto completamente sozinha. Se
Jonah estivesse aqui ele quebraria o nariz de Jimmy e os dedos
assanhados de Phil. Isso é o que iria acontecer.
Mas ele não está aqui. Eu tenho que me defender.
Eu não acerto Jimmy no nariz — eu não quero ferir a
minha própria mão que preciso para tocar guitarra e escrever
canções. Em vez disso, pego o gin de Jimmy e jogo no rosto dele.
Os outros na mesa cessam suas conversas imediatamente e ficam
em silêncio sob a música pulsante, olhando para nós, ou — no
caso dos caras da banda de abertura — rindo ato.
Jimmy tira um lenço. Cubos de gelo pequenos e gin
brilham nas lapelas de seu casaco. “Isso foi um pouco
precipitado, gatinha...”
“Foi atrasado”, digo, e empurro minha bolsa pequena. Fico
de pé na minha cadeira, minhas botas cavando rasgos afiados no
estofamento, e depois subo na mesa. Copos derrubados e
derramo tudo pelo meu caminho.
“Que diabos está fazendo?”
“Estou desistindo, que é que parece que estou fazendo?” Eu
pulo para fora da mesa e aterrisso sem quebrar um tornozelo, que
teria estragado a minha saída, e vou embora do clube. Vozes
gritam atrás de mim, Lola grita mais alto, mas continuo sem
olhar para trás.
Deixo o clube e chamo um táxi. O percurso até o hotel
parece uma eternidade, minutos passando lentamente, mais
tempo gasto fora do contato com Jonah. Nem uma palavra em
nove dias, ou até mesmo uma mensagem de texto. Meu telefone
mudo se ilumina com textos abundantes de Lola, de Jimmy, e
depois telefonemas de ambos. Eu ignoro todos.
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Na minha suíte, com a porta fechada e trancada, sento na
cama, meu coração batendo forte. O telefone na mão, olho para a
garrafa de vidro roxo na minha mesa de cabeceira. Agora ela
contém um pouco de meu perfume favorito.
Inspiro fundo quando meu dedo escolhe o número de
Jonah, mas meu fico pairando sobre o botão de chamada. São
duas da manhã de uma sexta-feira.
Ele ainda pode estar no trabalho. Ele pode não ser capaz de
falar. Eu poderia mandar uma mensagem de texto em vez disso.
E se ele estiver melhor agora? Talvez ele tenha seguido em
frente, voltado à sua agenda, focado e determinado, sem mim
para distraí-lo.
Talvez ele estivesse falando sério quando disse ser melhor
se eu não entrasse em contato com ele novamente?
Meu olhar volta para o frasco de perfume — a minúscula
bolha de vidro, mas que tem sido meu talismã de força e de
vontade nestes últimos nove dias. Eu tenho que contar ao Jonah
que saí da banda, mas prometi lhe contar: uma mensagem de
texto era fácil de ignorar, e se ele não respondesse, eu não iria
enviar outra.
Saí da banda. Espero que você esteja bem. <3 Kacey
Eu aperto o enviar antes que possa me arrepender do emoji
de coração. Vejo quando o status do texto muda de ‘entregue’
para ‘lido’. Aparecem os pontos que uma mensagem está sendo
digitada.
“Ok. Isso é bom”, digo, com minha voz tremendo, e então
solto um grito assustado quando meu telefone se ilumina com o
número de Jonah.
“Oi”, digo, piscando através das lágrimas estranhas e
súbitas nos meus olhos.
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“Você está bem?” Sua voz profunda cheia de preocupação e
—tenho certeza — felicidade.
“Eu estou. Estou realmente bem. Eu fiz isso. Saí da banda.
Agora mesmo. Esta noite. Jimmy tentou me prostituir para o
dono do Pony Club...”
“Ele o quê?”
“... mas eu joguei uma bebida em seu rosto. Sério. Foi
incrível.”
“Bom para você”, Jonah diz, mas posso ouvir a raiva por
trás das suas palavras.
“Então, agora eu posso ter arruinado minha vida, ou eu
posso ter me descontrolado. Eu não sei ainda, mas sei que era a
coisa certa. Posso sentir isso. E eu não teria tido a força para
fazer se não fosse por você.”
“Não”, ele diz. “Você teria conseguido. Eu sabia que você
seria capaz.”
Uma risada emocionada explode de mim. “Eu não sabia.”
“Estou realmente feliz por você, Kacey”, Jonah diz
calmamente, e o imagino do lado de fora de sua limusine, à
espera de uma corrida, de costas para o mundo para que pudesse
falar comigo. E ele estaria sorrindo.
“Eu também”, digo. “Mas agora sou uma mendiga semteto.”
Eu respiro enquanto as lágrimas enchem os olhos de novo,
me empurrando em uma onda de emoção que mal posso conter.
“Tem alguma boa dica imobiliária?”
Jonah não diz nada por um momento, e quando fala, sua
voz é grossa e rouca. “Ouvi dizer que Las Vegas é legal nessa
época do ano.”
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Minha mão dispara para o coração, e preciso de um
segundo antes de conseguir dar uma resposta sussurrada. “Eu
estava esperando você dizer isso.”
“Eu estava esperando você pedir.”
“Eu ainda estou com medo que vou deixar você assim como
Audrey fez.”
“Você não vai me deixar”, ele diz. “Você não é nada
parecida com a Audrey.”
A intensidade em suas palavras me atinge no coração e
envia um formigamento sobre mim. Limpo minhas lágrimas,
reforçadas por sua crença em mim.
“Não haverá erros, de qualquer maneira”, Jonah diz. “Você
vai ser minha amiga e eu serei o seu, e vamos devagar dia após
dia. Ok?”
Eu balanço a cabeça contra o telefone. “Dia após dia.
Momento a momento. Ok”, respondo, e solto um suspiro. “Eu
posso fazer isso.”
“Eu também”, ele diz. “Meu passageiro está vindo. Eu tenho
que ir…”
Sinto como se um fardo tivesse sido tirado dos meus
ombros, e todas as dúvidas que eu tinha sobre largar a banda
viraram cinzas.
“Vejo você em breve, Jonah. Boa noite.”
“Boa noite, Kacey.”
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PARTE II
Não nos lembramos dos dias, lembramo-nos dos momentos.
—Cesare Pavese
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CAPÍTULO 21
kacey
Estou em casa. Rua Banks, Número 212, Apartamento 2C,
Las Vegas, Nevada.
Da minha janela da sala, tenho uma visão da Flamingo
Avenue, e a poucos quarteirões depois fica a Strip. Eu posso ver o
vermelho da enorme placa do hotel e cassino Harrah’s. Eu tenho
um quarto, um banheiro, uma pequena cozinha e uma pequena
sacada. É todo meu.
E fica a três quadras de onde Jonah mora.
Eu encerrei tudo com o Rapid Confession há quatro dias,
com duas malas de roupas, minha guitarra e um acordo de US $
30.000.
Jimmy — com a ajuda involuntária de uma muito chateada
Jeannie — foi capaz de me tirar do meu contrato. Um executivo
da nossa gravadora tem uma sobrinha que pode tocar guitarra, e
eles reservaram um voo para ela antes das palavras “estou fora”
terem deixado minha boca. O nosso recente sucesso rendeu
algum dinheiro e para mim sobrou o valor de US$ 30.000. Foi o
que restou depois que meu adiantamento foi pago, dedução das
taxas, os custos dos danos ao Pony Club e contando com os
royalties projetados em vendas de turnês até agora.
Jimmy disse que eu tive a sorte de conseguir alguma coisa,
mas tenho uma sensação que fui roubada de seis maneiras
diferentes desde terça-feira, com o contrato quebrado ou não.
Lola confirmou. Ela ligou enquanto eu estava atarefada com o
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meu novo apartamento, esperando a minha última peça de
mobiliário — um sofá — chegar.
“Você foi roubada, porra”, ela me disse de Vancouver.
“Trinta mil? Você está brincando comigo? Jimmy disse que vamos
ficar com, pelo menos, um milhão cada depois dessa turnê. Para
cada uma.” A ouço exalar um cigarro. “Eu não sei, Kace...”
Sinto uma pontada no ‘milhão para cada’. Sou humana,
afinal. Mas, principalmente, eu me sinto feliz. “Está tudo bem,
Lola. Eu tenho um novo apartamento e comecei em um novo
emprego.”
“Você me disse. Servindo coquetéis no Caesar’s Palace?
Você honestamente acha que ficar perto de bebidas de graça
durante toda a noite vai ser melhor para você do que continuar
na banda?”
“Sim. Eu não bebia álcool porque estava lá”, digo. “Eu
bebia porque tornava mais fácil fingir.”
“Fingir o quê?”
Dou de ombros, e passo os dedos ao longo do azulejo
barato. Mas é o meu azulejo barato do meu balcão da cozinha.
“Finja que estou fazendo o que eu queria fazer. Ficar por conta
própria é o melhor para mim.”
Lola solta um suspiro. “Ninguém colocou uma arma na sua
cabeça para entrar na banda.”
“Lola”, digo com firmeza. “Eu te amo. Você é minha melhor
amiga. Você salvou a minha bunda e eu nunca vou ser capaz de
pagar por isso. Se continuasse daquele jeito, eu teria acabado
morta ou extremamente depressiva. Você sabe disso.”
Outro suspiro, este mais suave. “Sim, eu sei. Assim como
sei o simples fato que estou uma porcaria porque sinto sua falta?”
Eu sorrio. “Também sinto sua falta. Como está a nova
garota?”
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“Ela vai bem. A Jeannie não a odeia. Ainda.”
“Dê-lhe um tempo.”
“Como está a sua casa nova? Você não vai exagerar com
sua enorme fortuna, não é? Trinta mil parece muito, mas acaba
rápido. Especialmente com um salário de garçonete.”
“Sem brincadeiras. Eu tive que comprar um carro — usado
— e abastecer minha pequena casa. Abriram uma IKEA aqui no
mês passado. Meu apartamento parece um anúncio ao vivo.”
Eu não tive a coragem de dizer a ela que eu também gastei
US $5.000 em uma cama top de linha, neste momento a caminho
— ou talvez, já entregue — na casa de Jonah. Com ajuste para
levantar a cabeça ou pé, assim uma pessoa pode dormir em
qualquer posição que queira. Eu não posso suportar a ideia de
Jonah passar mais uma noite em uma maldita cadeira apenas
para manter o peito elevado, e sei que ele nunca compraria uma
cama como esta por conta própria.
“Então, o que acontece depois?” Lola pergunta. “Você irá
escrever suas próprias canções de novo? Tornar-se uma estrela
do YouTube? Eu não estou sendo irônica — você é realmente
talentosa, querida. Este poderia ser o começo de algo grande.”
“Obrigada, Lo”, digo, meu olho virando-se para o frasco de
perfume no peitoril da janela. Eu sorrio. “Vou devagar. Ver o que
acontece.”
Uma pausa. “E como está seu amigo? O cara com a doença
cardíaca?”
“Ele está bem. Ele e seu irmão vieram sempre que podiam
para me ajudar a montar os móveis.”
O pensamento faz meu sorriso ampliar. Jonah tinha
tomado o seu tempo pessoal entre a Hot shop e A-1 para me
ajudar, arrastando Theo com ele sempre que seu irmão não
estava trabalhando no Vegas Ink.
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As palavras seguintes de Lola matam o meu sorriso. “Seu
amigo, Jonah... ele pode levantar coisas pesadas como móveis?”
Deus, todo mundo é médico.
“Claro”, digo. “Ele está totalmente bem.”
“Totalmente bem? Uma semana atrás, você me disse que
ele estava morrendo.”
Eu cerro os dentes. Poderia controlar as palavras quando
estão na minha cabeça. Ouvir alguém dizer em voz alta faz a
emoção surgir dentro de mim.
“Eu estava passando por maus momentos quando disse
isso”, eu digo. “Péssima escolha de palavras.”
“Kacey...”
“Ele está bem. Ele é forte...”
“Puta que pariu...”
“Estou falando sério, Lola. Eu tenho que ir.”
“Para onde?” Lola exige. “Voltar para enterrar a cabeça na
areia? Isto não é como uma conta que você não pode pagar, que
se joga no lixo e finge que nunca recebeu. E quando perceber,
cortam suas luzes e você é deixada no escuro. Eu sei que é o que
você faz, Kacey. Você só deixa as coisas de lado e finge que está
tudo bem até que não tenha mais como fingir.”
“Não é assim”, eu sussurro.
“Não? Soa claramente desse jeito.”
“Ele está bem. Ele realmente está.”
Meus pensamentos se voltam para quando Jonah me pegou
no aeroporto há dez dias. Ele levantou uma grande placa com o
meu nome escrita nela e brincou que era a última vez que ele
seria meu motorista de limusine. Eu joguei meus braços em torno
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dele e o abracei apertado, e senti seu coração contra o meu peito,
forte e estável...
“Então ele está curado?”
“Cale a boca, Lola. Ele está bem agora. Eu não vou gastar o
tempo que temos com o se e talvez. E é fodidamente terrível de
que você tente arruinar a minha felicidade.”
“Eu não estou tentando estragar nada para você, Kacey. Eu
estou tentando protegê-la.”
“Bem, não preciso de sua proteção. Eu sei o que estou
fazendo.”
“Você sabe? Porque parece que você saiu de uma situação
de merda e entrou bem no meio de outra.” Uma pausa. “Vocês
dois estão... juntos? Por favor me diga que você não é louca o
suficiente para se envolver com um cara que está... realmente
doente.”
“Nós somos apenas amigos. Bons amigos. Um dos melhores
que já tive em um tempo. Ele me faz sentir que eu posso ser eu
mesma.” Soo petulante, mas fiz um plano em viver momento a
momento. E não estou pronta para encarar quatro meses a
frente. Ainda não.
Talvez nunca mais. Talvez seus remédios estejam fazendo
efeito...
“Bem, eu estou feliz por você, Kacey”, Lola diz, me puxando
para fora dos meus pensamentos. “E eu quero o melhor para
você. Mas não quero que fique perdida.”
“Perdida?”
“Quando as luzes finalmente se apagarem.”
Mordo o lábio, tentando encontrar algo a dizer, alguma
réplica. A campainha toca. “Eu tenho que ir, Lola. Pessoal do
IKEA está aqui.”
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“Ok, querida. Cuide-se.”
“Te amo. Tchau.” Eu desligo e coloco o telefone no balcão.
Em seguida, coloco no modo silencioso. Depois, viro a tela para
baixo.
E atendo a porta da frente, não para a IKEA, mas para
Jonah. Meu rosto se abre em um sorriso enorme como se eu não
tivesse visto o garoto dois dias antes, e o sangue corre para
minhas bochechas.
Caramba, se controla.
Ele está bonito como o inferno de jeans e uma camisa verde
escura. Está com as mãos enfiadas nos bolsos da frente da calça
jeans, com um olhar divertido no rosto.
“Você não é o meu sofá”, digo, fingindo confusão.
“Não desde a última vez que verifiquei. Mas, falando de
grandes móveis domésticos, eu recebi uma entrega muito
interessante ontem”, ele diz, balançando-se nos calcanhares.
“Você recebeu?”
“Sim. Você não sabe nada sobre uma cama cara como o
inferno que você pode dormir sentado, com controle remoto que
encontrei na minha porta, saberia?”
Finjo estar assustada. “À sua porta? Deus, eu espero que
não. Aquela cama parece incrível. Eu imaginaria que viesse com
pessoal treinado para ajudar na instalação.”
“Oh, ela veio. Toda uma equipe de técnicos que estavam
‘sob ordens’ para não aceitar um não como resposta.” Ele suspira
e balança a cabeça, sua expressão ficando séria. “Kace, é demais.
Muito caro. Você não precisa fazer isso.”
“Sim, preciso”, digo. “Eu não teria saído da banda se você
não tivesse me dado um lugar para dormir e colocado minha
cabeça no lugar. Este é o meu agradecimento.” Coloco uma mão
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no quadril. “Você vai ficar na porta durante toda a tarde? Você
está deixando tudo quente.”
Jonah olha para mim por mais um momento, com os olhos
apertados.
Olho para trás. “O quê?”
“Estou debatendo se vai adiantar discutir com você.”
“Não vai”, digo. “Dentro ou fora? Você é como um maldito
gato.”
Ele cede com uma pequena risada e um aceno de cabeça, e
se abaixa para pegar algo do chão ao lado dele. “Então, esse é o
seu presente de bem-vinda a casa, do qual eu me orgulhava
muito até que você me enviou a Mega cama.” Ele arqueia uma
sobrancelha. “Eu deveria ter feito um candelabro.”
Ignoro o sarcasmo, muito ocupada olhando para a bela
lâmpada em suas mãos. São duas lâmpadas, na verdade, feitas
de antigas garrafas âmbar uísque em forma de quadrados. A
parte inferior de cada uma foi cortada, e lâmpadas de Edison
retangulares foram anexadas dentro. Os cabos saem dos pontos
de estrangulamento e foram tecidos através de pequenos elos de
uma corrente de ferro que ligam as duas lâmpadas como um par.
“Oh meu Deus.” Eu olho para as luminárias, em seguida,
para ele. “Que lindo! Você fez isso? O que estou dizendo? Claro
que você fez.”
“Quer testar?”
Mordo o lábio, olhando ao redor. “Eu não sei onde... Oh, a
varanda.”
Vamos para a porta de vidro que leva a minha pequena
varanda com vista para a rua. “Eu pretendo montar uma área de
estar aqui fora. Vasos de plantas e uma pequena cadeira e mesa
para tomar café da manhã.”
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Jonah me dá um olhar. “Você? Com este calor?”
“Eu preciso me acostumar com ele. Ninguém gosta de
alguém que resmunga sobre o tempo a cada minuto.”
“Você tem esse direito”, ele murmura.
Dou-lhe um pequeno empurrão em direção a porta da
varanda. “Fora. Luzes. Pendurar.”
Ele pendura as lâmpadas de garrafa de uísque em dois
ganchos e um pouco menor do que o outro e os conecta em uma
tomada, ao ar livre. Iluminado por dentro, o vidro âmbar brilha
como se ainda estivesse preenchido com uísque.
“Que lindo”, digo. “Mal posso esperar para ver à noite.” Eu
olho para ele ao meu lado. “Agora eu tenho duas obras originais
Jonah Fletcher. Não vou ter que trabalhar no Caesar’s para
sempre, afinal. EBay, aqui vou eu.”
Seus olhos rolam. “Eu não pediria demissão ainda.”
“Eu nunca me separaria de suas peças de qualquer
maneira. Mas acho que é apenas uma questão de tempo antes
que o mundo descubra como você é talentoso.”
Ele olha para mim. “Eu poderia dizer o mesmo sobre você.”
O ar pesa entre nós, e seus olhos castanhos são suaves.
Quando seus olhos se rendem aos meus, eu me sinto como se ele
estivesse olhando profundamente, para um lugar que eu
raramente me examino, mas onde poderia ter uma boa música à
espreita, se olhasse.
Os segundos passam. Deveria olhar para longe, mas não
desvio o olhar e nem ele, até que um carro passando freia em
uma luz vermelha no semáforo, o som rasgando o momento.
Jonah enfia as mãos no bolso e meus olhos procuram algo para
olhar para além dele.
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“Então, as garrafas de uísque”, digo, apontando para as
luzes. “Você está redirecionando meus maus hábitos?”
Ele sorri. “Não, apenas um lembrete amigável.”
“Sobre o quê?”
“Que se pode encontrar beleza em toda parte, mesmo nas
coisas que mais te assustam.”
Um calor se espalha no meu peito, e quase brinco com ele
por ser profundo, mas o telefonema com Lola se volta para mim, e
como ela expressou o que realmente me assustou mais: ficar
perdida no escuro.
Viro meus olhos para as novas luminárias, em seguida,
para o homem que as fez. Lola está errada. Seja como for, de
alguma forma, suas luzes permanecerão acesas e eu nunca estarei
perdida no escuro.
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CAPÍTULO 22
jonah
Quando o sofá de Kacey chega, toma dela, do Theo e de
mim metade da noite para montá-lo. Quando terminamos e a
caixa vazia e as páginas de instruções são jogadas fora, seu
apartamento está completo.
“Bem”, ela diz, examinando o produto acabado. “É
definitivamente como uma daquelas salas modelo na loja IKEA.
Eles deveriam me pagar pela publicidade gratuita.”
Theo dá sua versão de um sorriso. Ele começou a gostar
dela — ligeiramente — nos últimos dez dias. Seus olhos não
rolam automaticamente quando ela fala com ele e Theo realmente
se envolveu em um par de suas observações provocantes.
Agora, à medida que se prepara para sair, ela joga os
braços em volta do pescoço dele. “Obrigada, Teddy”, ela diz e beija
sua bochecha. “Tudo bem chamá-lo assim?”
Definitivamente não está bem. Eu me preparo para
repreensão dura de Theo contra ser chamado de Teddy, mas ele
só murmura algo sobre esperando por mim na caminhonete, e vai
embora.
De olhos arregalados, eu o observo ir, então viro meu olhar
de volta para Kacey. “Ele odeia Teddy. Ninguém o chama de
Teddy.”
Ela sorri, encolhe os ombros. “Não pareceu se importar
vindo de mim. Além disso, se encaixa. Ele tem um lado suave.”
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“Sim, ele tem”, digo. Um breve silêncio se desenrola entre
nós. Acontece muitas vezes desde que ela voltou. As piadas e
provocações acabam, e somos apenas Kacey e eu no espaço um
do outro, esperando algo acontecer a seguir. Uma palavra ou um
toque que poderia mudar tudo...
Mas não pode. Eu não posso levá-la por esse caminho
comigo porque eventualmente nós vamos chegar ao ponto em que
tenho que seguir em frente, e ela não pode ir comigo.
“Ok”, digo. “Eu vou antes de Theo ficar bravo.”
Kacey coloca os braços em volta do meu pescoço e me dá
um beijo na bochecha, assim como fez com Theo. Eu sinto o
corpo dela ao longo do meu, e minha respiração fica presa. Meus
próprios braços estão rígidos e cheio de cuidados, como se eu
pudesse quebrá-la.
Ou me quebrar.
“Obrigada por me ajudar esta noite e todas as outras
noites”, ela diz, suas mãos deslizando pelos meus ombros antes
de cair fora.
“De nada”, digo. “Tenha uma boa noite, Kace.”
“Você também. Oh, ei, eu estava pensando em passar pela
Hot shop algum tempo esta semana. Posso levar vocês para
almoçar?”
“Mais uma vez? Isso vai ser a quinta vez em duas semanas.
Você não tem que nos alimentar.”
“Eu sei”, ela diz. “Mas eu quero. Deixe isso comigo,
Fletcher. Eu cuidarei de você.”
É muito. Diga não. Mantenha a rotina...
Grande chance. Kacey está aqui agora, e parte da minha
rotina. Eu disse-lhe para voltar a Vegas porque sentia falta dela, e
a queria na minha vida, mas não tinha ideia de quão difícil seria
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mantê-la a uma distância segura. Eu sou um homem morrendo
de fome, exposto a um banquete, com fome todos os dias e
cobiçando o que está bem na minha frente.
“Parece ótimo, então”, digo, e de lá antes de fazer algo
estúpido.
Theo se senta ao volante de sua caminhonete. Mas em vez
de uma carranca ou uma queixa sobre fazê-lo esperar, ele só me
olha entrar, estuda o meu rosto como se estivesse procurando
algo.
“O que é agora?”
Theo se vira para a frente. “Nada.”
Ele nos leva ao longo das ruas laterais principalmente
vazias em complexos de Vegas — de apartamentos residenciais e
pequenas casas de ambos os lados. A Strip não é visível, mas eu
posso ver o seu brilho acima dos telhados.
Nós paramos no semáforo vermelho e Theo diz “Ela está a
fim de você.”
Olho para o meu irmão, minha boca seca. “Você acha?”
“Não é óbvio?”
“Esclareça.”
Ele encolhe os ombros. “O jeito que ela olha para você.”
Meu coração pula no peito. Eu faço o melhor para parecer
casual como o inferno e não como um garoto no colegial. “Como
ela estava olhando para mim?”
Theo olha para mim de lado. “Como se não pudesse parar.
E você também. Estou espantado que conseguiu montar o sofá.”
Olho para a frente, meus pensamentos correndo com essa
revelação. Claro, meus olhos são atraídos para Kacey a qualquer
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hora que ela estava na sala. Eu não consigo evitar. Ela estava
radiante. Mas ao saber que estava fazendo o mesmo por mim...
Um grande calor se espalha através de mim, um brilho
suave de esperança que me esforcei em manter sufocado.
“Ela tem medo de me abandonar”, digo lentamente. “Como
Audrey.”
“Então, você já falou sobre isso?” Theo pergunta. “Estar
juntos? É por isso que ela se mudou de volta?”
“Não, nós somos apenas amigos. É tudo o que podemos
ser.” Esfrego o lugar na minha bochecha, onde Kacey me beijou.
“É difícil o suficiente.”
“Mas você tem sentimentos por ela”, Theo diz. Não é uma
pergunta, e sua voz está curiosamente calma.
“Eu... talvez. Eu não sei”, digo. “Às vezes acho que não
deveria ter lhe dito para voltar aqui.”
“Mas você disse”, Theo diz no mesmo tom baixo, “porque
você tem sentimentos por ela.”
Eu suspiro, parcialmente com surpresa por poder falar
sobre isso com Theo quando esperava receber outro sermão. É
bom falar sobre isso com o meu irmão em vez de ser emparedado
por sua preocupação.
Ela olha para você como se não pudesse parar...
Nós chegamos ao meu apartamento. Theo estaciona a
caminhonete no local reservado e se vira para mim. “O que você
quer fazer?”
“O que eu posso fazer? Não tenho tempo, e ela sabe disso.
Eu disse a ela sobre a última biópsia.”
“Bem, lá vai você”, ele diz, acenando com a mão. “Você
contou a ela.”
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“Sim? E?”
“E ela ainda está aqui.”
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CAPÍTULO 23
jonah
Noite de sexta-feira. Eu estava deitado na minha cama,
lendo. Ou tentando. Meu foco sempre vacilante. Três da manhã é
a hora mais silenciosa, mais sossegada da noite, mesmo em uma
cidade como Las Vegas, e o silêncio amplifica os pensamentos
chocalhando na minha cabeça e no coração. Eles enchem a sala,
exigindo reconhecimento, implorando por respostas.
Kacey...
“Pare com isso”, digo baixinho.
O que ela está fazendo agora?
Ela teria saído de seu turno uma hora atrás. Já estaria em
casa há vinte minutos, se não estiver atrasada.
“Ela está dormindo”, digo. “É o que você deve fazer.”
Jogo o livro de lado, desligo a lâmpada e me ajeito em
minha cama.
Ela comprou uma cama para mim.
“Eu estou ciente”, digo.
A cama é infinitamente mais confortável do que a cadeira,
mas ainda não consigo dormir. Deito no lado direito. O lado
esquerdo parece se estender por milhas, como tundra nevada.
Frio e estéril.
Eu sinto falta dela.
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“Cale-se, Fletcher. Vá dormir.”
Fecho os olhos, sabendo que é inútil. Então meu celular na
mesa de cabeceira apita com uma mensagem de texto.
“Droga, Theo.”
Mas não é Theo. Sento, com o coração batendo no peito.
Kacey.
Está acordado?
Eu consigo esperar dez segundos antes de responder.
Sempre. E aí?
Liguei para o meu pai.
“Puta merda”, eu sussurro, sabendo o que isso significa
para ela. Espero para ver se vai dizer mais. Não há pontos
pequenos piscando, indicando que está escrevendo. Eu hesito,
mil respostas prontas. Respostas que poderiam confortar a partir
de uma distância segura. Como foi? Você está bem? Fale mais
sobre isso?
Mas mando uma mensagem de volta, Eu posso ir aí.
Sem pontinhos na tela. Nem uma pergunta, nem um
comunicado. Vaga o suficiente, ela poderia me dizer não.
Pontos rolam, e, em seguida, a resposta dela:
Ok.
Eu poderia ter caminhado para o apartamento de Kacey,
mas são só três minutos se for dirigindo. Do lado de fora de sua
porta, eu hesito.
O que você está fazendo?
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“Sou um amigo.” O ar da noite sufocante mastiga a palavra
‘amigo’ e a lança de volta para mim. “Um amigo que faz visitas em
domicílio.”
Bato na porta e ouço um abafado, “Entre.”
O apartamento recém-mobiliado de Kacey cheira a seu
perfume e às velas perfumadas que ela ama. Inspiro
profundamente, tanto para recuperar o fôlego por causa do lance
de escadas, como me encher com ela.
Ela está sentada, enrolada em seu sofá, com as pernas
debaixo do corpo. A mesa de centro na frente dela cheia de lenços
amassados. Apenas a lâmpada ao lado do sofá está acesa,
amarelo brilhante sobre os ombros curvados. Seu olhar é
direcionado para mim enquanto sento na cadeira em frente.
Mesmo com olhos vermelhos e um rosto inchado de tanto chorar,
ela é incrivelmente bonita.
“Você quer alguma coisa?” Ela pergunta. “Alguma coisa
para beber ou...?”
Eu balanço minha cabeça. “Estou bem.”
Limpo a garganta, meus nervos no topo do sofá, olhando.
Tanto a pele suave de suas pernas e a forma como elas foram
dobradas em um canto do sofá, acordam algum impulso
primitivo, do sexo masculino em mim. Eu quero protegê-la.
Segurá-la e protegê-la de tudo o que a machuque. Colocar o meu
corpo entre ela e o mundo, e enquanto estiver com ela, quero que
enrole as pernas em volta de mim e deslizarei dentro dela...
“Sinto muito, é tão tarde”, ela disse.
“Eu estava acordado de qualquer maneira.” Eu me inclino
para a frente. “Diga-me o que aconteceu.”
“Você... não importa.”
“O quê? O que eu posso fazer?” Qualquer coisa. Eu faria
qualquer coisa por você.
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Seus olhos encontram os meus e sua voz é pequena, uma
vez que pergunta “Você se importaria de sentar ao meu lado? Eu
prometo que não vou tentar pular em você ou qualquer coisa.”
“Claro”, digo. Troco a cadeira pelo sofá, deixando alguns
centímetros entre nós, mas ela fecha a distância de uma vez,
ficando ao meu lado. Automaticamente, o meu braço vai ao redor
de seus ombros.
Porque é isso que os amigos fazem quando um amigo está
chateado.
Só que minha amiga tem um cheiro incrível. E estou bem
consciente de tocar a pele da minha amiga, e do jeito que posso
sentir o arredondamento suave de seus seios contra o meu peito.
Eu esperava que ela fosse chorar. Saúdo a mim mesmo — por
reforçar a minha insistência que estou apenas sendo um tipo, de
amigo solidário. Mas ela se aconchega mais perto e coloca o braço
em volta da minha cintura, e quando fala, sua voz é aguada, mas
calma.
“Eu não tinha planos de ligar para o meu pai”, ela diz. “Eu
nem estava pensando nele hoje. Acidentalmente reservaram meu
turno junto com outra garota, então saí do trabalho cedo. Por
volta das oito. Cheguei em casa e liguei a TV, passei pelos canais
por algum tempo, e parei em um sobre o vestido ideal.” Ela
inclina a cabeça para olhar para mim. “Você já viu?”
“Nunca ouvi falar”, digo.
“É tão estúpido, bobo, reality show fabuloso onde eles
seguem diferentes noivas fazendo compras para o seu vestido de
casamento. Elas levam uma melhor amiga para ajudá-las a
escolher. Ou um grupo de amigos mal-intencionado. Ou sua mãe
dominadora. Mas hoje à noite, o episódio...” Kacey funga. “Uma
noiva levou alguns amigos. E seu pai.”
Ela inspira, e sinto o tremor oscilante de sua respiração
contra meu peito. Eu a seguro mais apertado.
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“Então ela está provando os vestidos, e todos eles são
lindos, mas nenhum é bom o bastante. Até que finalmente ela
tenta por um. E todo o seu grupo sabe que é O vestido, porque
todos eles começam a chorar. A noiva chora, e depois seu pai
chora, e depois eu choro porque queria tanto ter o que ela tinha.”
“O vestido?”
Kacey me dá uma cotovelada no lado. “Espertinho. O
vestido era terrível, na verdade. Estilo sereia. Parecia que estava
enrolada em bandagens. O ponto é, eu queria o que ela tinha com
o pai.”
O corpo dela murcha, inclinando-se mais forte contra mim.
“Conte mais”, digo.
“Este pai... ele tinha sido um fuzileiro naval, aposentado
agora, e parecia ser super sério. Mas um fofo total, quando se
tratava de sua filha. Ele não se preocupava em esconder seus
sentimentos. Ele disse para a câmera que ela seria a sua menina
para sempre. Ele disse o quanto a amava e que tinha orgulho
dela.” A voz de Kacey engasga, em seguida, ele desaba. “Esta
menina tem um belo relacionamento com seu pai, e eu nunca vou
ter com o meu. Isso dói. Eu odeio como dói. Eu quero não me
importar, mas não consigo parar de se importar. Eu não posso.
Ele é meu pai. Eu o amo. Ele não deveria sentir o mesmo?”
“Ele sente”, digo. Ainda abraçando-a, pego a caixa de
lenços em cima da mesa e arrancou um.
“Obrigada”, ela diz, enxugando os olhos.
“Então você ligou para ele?”
“Como uma idiota. Eu pensei, não posso ter o que essa
menina e seu pai tem, mas posso começar em algum lugar. Eu
posso tentar. Não pensei demais, apenas peguei meu telefone e
liguei para ele. E ele atendeu, sem minha mãe, e pensei, isso é um
sinal.”
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Ela pega outro lenço. “Sim, foi um sinal de tudo bem. Que
eu sou uma idiota.”
“Você não é uma idiota”, digo. “O que ele disse?”
“Ele ficou quieto, como de costume. Mas eu estava nervosa,
então comecei a balbuciar como uma idiota. Eu lhe disse que
larguei a banda de rock de sucesso e joguei fora milhões de
dólares e fama e fortuna. Assim eu poderia servir coquetéis no
Caesar’s, porque sabia que isso é mais saudável para mim. Eu
sou melhor para ele. Eu disse a ele que estava vivendo em meu
próprio apartamento, pagando minhas próprias contas, e
escrevendo minha própria música. Eu disse que estava feliz,
mesmo que as minhas músicas não estejam vendo a luz do dia e
nem saindo do notebook ainda.” Ela funga e enterra seu rosto
mais perto do meu peito.
Enfio minha mão em seu cabelo. “O que ele disse?”
“Ele disse, ‘Ok, então’.”
Eu espero por mais, mas nada vem.
“Ok, então o quê?” Eu digo.
“É isso. Ok, então. E desligou. Ele... desligou na minha
cara.”
Minha boca está entreaberta e não serve para nada
enquanto ela soluça contra o meu peito, as lágrimas molhando
minha camisa. Eu coloco o meu outro braço em torno dela, bem
apertado e segurou-a perto. “Sinto muito”, digo. “Eu sinto muito.”
Ela se solta e joga os lenços de papel molhados por toda a
sala. “Estou cansada de me sentir assim. Eu me sinto tão
patética querendo que meu próprio pai precise de mim em sua
vida.” Ela olha para suas mãos vazias. “Ele não precisa de mim.”
“Eu preciso de você.” É a verdade, e às vezes a verdade se
recusa a ser contida. Ela explode, normalmente quando é menos
conveniente, mas também quando é mais necessária.
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Ela dá um sorriso pálido, coloca a mão sobre o peito, onde
as lágrimas haviam umedecido minha camisa. “Você é doce. Eu
não tinha ninguém e você me deu amizade e um lugar para viver.”
“Eu preciso de você”, digo novamente.
Seus olhos pousam nos meus. “Você precisa?”
Balanço a cabeça. Deus, ela está tão perto de mim, posso
sentir o cheiro de sua pele. Doce, como caramelo. “Amigos servem
a propósitos diferentes, certo? Algumas coisas que você só pode
dizer a certas pessoas, algumas coisas que você pode dizer para
os outros.”
O olhar de Kacey é inabalável. “Diga-me algo que você não
pode dizer a seus outros amigos”, ela diz suavemente. “Algo que
você só pode me dizer.”
Por alguns segundos fico perdido nas piscinas azuis de
seus olhos, atingido por milhares de coisas que eu queria dizer a
ela.
“Estou com medo”, digo.
Sua mão se entrelaça na minha. “Ok.”
“Mas quem não estaria?”
Ela não diz nada. Sinto sua aceitação e confiança entrando
em mim de seus olhos. Eu poderia derramar minhas tripas para
ela e ela ouviria, ou eu poderia manter a mim e ela iria entender.
“Todo mundo está me olhando, o tempo todo. Eu me sinto
como... se não pudesse fazer ou dizer qualquer coisa sem pensar
cuidadosamente. Porque tudo o que faço significa alguma coisa,
mesmo quando isso não significa. Eu não posso levantar a minha
voz ou ficar zangado ou irritado porque não posso deixar esse tipo
de memória. Tenho apenas uma quantidade finita de palavras
para dizer. Tenho que escolhê-las com cuidado.”
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Ela assente com a cabeça e me deixa continuar. O que eu
faço, dizendo-lhe mais do que pretendia, dizendo-lhe coisas que
não posso contar a ninguém. As palavras saem de mim e vão para
o colo de Kacey.
“Minhas ações também. Estou sendo constantemente
vigiado, estudado, analisado. Estou cansado depois de um longo
dia na loja, ou é algo pior? Todos me tratam como se eu fosse
quebrável. Como se o mundo inteiro é uma ameaça potencial.
Alguém pode dizer a coisa errada e me perturbar, e Deus me livre
de ser perturbado. Mas estou chateado.”
Kacey assente.
“Eu fico com medo ou chateado que isso aconteça comigo”,
digo. “Eu cuidava de mim mesmo, sabe? Fazia exercício como um
bastardo, comia bem, e eu ainda fiquei realmente muito doente.
Como ser atingido por uma caminhonete, embora sempre olhe
para os lados e a rua esteja vazia.”
Eu esfrego minha mão com força no joelho, para não fechála
em um punho. Aperto a outra mão de Kacey. E me preocupo
que possa estar ferindo os dedos, mas não consigo soltar.
“Então, sim... estou com medo”, digo. “E isso é algo que não
posso dizer aos meus outros amigos.”
Ela solta minha mão e então está em meus braços,
abraçando ao redor do pescoço. “Obrigada por me dizer.”
Eu congelo, meus sentidos infundidos com ela. A suavidade
de seu cabelo na minha bochecha, o aroma de caramelo de sua
pele quente. Meus braços vão ao redor dela, rigidamente no
começo, mas ela é tão macia. Ela derrete em mim, querendo ser
abraçada. E como dizer a ela o que eu não posso contar a
ninguém, que quero abraçá-la como nunca abraçarei mais
ninguém. Acariciar seu cabelo, inalar sua doçura. Beijá-la e
nunca parar...
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Sua cabeça levanta do meu ombro, mas seus braços ainda
rodeiam meu pescoço. Ela olha para mim, os lábios entreabertos
com expectativa, seus olhos quentes e suaves. No silêncio, Kacey
levanta a mão, e coloca sobre meu peito. Meu coração bate forte
de volta sob seu toque, e um leve sorriso vem aos seus lábios.
“É uma sensação tão forte”, ela murmura.
O topo da minha cicatriz é visível na barra do meu
colarinho. Kacey engancha o dedo indicador na borda da minha
gola e puxa para baixo, revelando outro centímetro de vermelho.
Cabeça inclinada, ela estuda, corre seu polegar sobre a curva
brilhante.
Eu luto para não puxar para trás... ou inclinar para a
frente em seu toque. A meio caminho entre o pânico e desejo, eu
congelo, mas o meu coração está galopando.
“Você é a primeira mulher... a primeira pessoa a tocar a
minha cicatriz.”
“Isso não está certo”, ela murmura, e se inclina para
pressionar um beijo suave na cicatriz. Então se enrola contra o
meu peito, exausto e gasto, segura entre mim e as almofadas do
sofá.
Deito, levando-a comigo. Abraço-a, saboreando a sensação
de seu corpo junto ao meu, memorizando a suavidade de seu
cabelo caindo pelos meus dedos. Fecho os olhos, deixando todos
os meus outros sentidos absorverem o calor e o conforto de ter
uma mulher em meus braços. Essa mulher.
Estou tentado a ficar a noite toda. Beijá-la de manhã e que
se fodam as consequências. Mas quando a primeira luz da aurora
aparece pela janela, reflete o meu relógio. Eu tenho quarenta
minutos para chegar em casa e tomar meus imunossupressores.
Se atrasar, essas consequências me alcançariam.
Eu escorrego para fora do sofá, cubro Kacey com um
cobertor, e calmamente vou embora.
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CAPÍTULO 24
jonah
Dena e Oscar estão em êxtase sobre Kacey estar de volta à
cidade. Eles insistem em fazer algo especial para recebê-la em
Vegas. Sinto que há um motivo oculto, mas fico comovido por
quererem levá-la para nossos encontros regulares de segundafeira.
“Kacey está saindo com a gente hoje à noite”, digo a Theo
no telefone. “Será um jantar de boas-vindas. Você deveria trazer
Sally.”
“Holly”, Theo corrige.
Holly Daniels é a sua namorada vai e volta. Ou a coisa mais
próxima que ele tem de uma namorada em sua vida. Uma mulher
pequena com uma risada alta e, cabelo escuro e curto, ela foi
uma das clientes de Theo no Vegas Ink. Brinco com ele que Holly
queria apenas uma pequena tatuagem, mas continuou voltando
até que ganhou Theo. Toda vez que vejo suas tatuagens ao longo
dos braços inteiros, tenho que segurar uma risada.
“Então, é uma coisa de casais?” Theo diz.
“Não. Bem...” Minha mão vai até o colarinho, e no topo da
minha cicatriz, onde ainda podia sentir o beijo de Kacey. Um
pequeno toque de seus lábios marcado na minha pele e na minha
mente. Eu continuo pensando nisso.
“Olá?”
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Eu paro. “Não, não é uma coisa de casais. É uma coisa de
amigos. Traga Holly, traz mais alguém ou traz ninguém. Você
decide.”
“Aonde vamos?”
“Kacey quer ir jantar e depois um cassino. Eu pensei que o
MGM Grand seria bom para...”
“Você não pode ir a um cassino e ficar perto de qualquer
fumaça. Será que ela não sabe disso?”
“Ela sabe”, digo, “mas foi ideia minha. Ela nunca foi a um
cassino, e o MGM tem excelente ventilação. Eu pesquisei isso.”
Ele resmunga algo incoerente.
“Vamos, bro. Oscar e Dena também irão. Vai ser divertido.
Algo diferente.”
“Diferente”, Theo diz. “Cristo, isso não vai dar certo.”
“Eu estou sendo otimista”, digo com um sorriso. “Vamos lá,
Teddy.”
Uma pausa. “Onde vamos comer?”
“Seu favorito, o New Orleans Fish House”, digo. “Todos os
camarões de água doce picante-como-inferno que você possa
comer. Oito horas.”
Isso o conquistou. Ou talvez ele queira cuidar de mim como
uma mãe maldita toda a noite, mas concorda em ir.
Digo a Kacey que irei buscá-la às 7:45. Ela abre a porta
vestindo uma blusa de um ombro só em algum tipo de material
brilhante. A peça desliza sobre sua pele como prata derretida,
deixando um ombro nu e pendura até as coxas, onde uma saia
preta curta espreita. Mas são as meias pretas que ela usa até
pouco acima do joelho que drenam o sangue do meu cérebro.
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Ela tem seu cabelo amarrado e fixado com algum tipo de
grampo ou presilha com uma grande rosa preta de seda sobre
sua orelha direita. Suas feições marcantes foram contornadas,
maquiagem de olhos de gato e lábios vermelhos brilhantes. Uma
nuvem de seu perfume — o seu favorito e aquele que ela mantém
no frasco que fiz para ela — flutua por mim.
Estou tão ocupado olhando para ela que não percebo que
ela está olhando para mim.
“Uau, Fletcher”, ela diz. “Você... você está lindo.”
Estou vestindo um terno cinza-escuro com uma gravata
azul brilhante que pode ou não ser a mesma cor dos olhos de
Kacey.
“Você está...” Eu paro, olhando, porque as palavras não
existem.
Ela sorri e se move para endireitar a minha gravata.
“Obrigada.”
Quando chegamos no Emeril’s New Orleans Fish House, a
anfitriã nos leva através da elegância cor âmbar do restaurante
para a mesa onde Dena, Oscar, Theo e Holly estão sentados.
Kacey, é claro, abraça Dena e Oscar, dizendo o quanto tinha
ouvido falar sobre ela, e sem dúvida ela fica vermelha de
vergonha. Ela brilha com a felicidade sob a luz da recepção
calorosa de Dena e Oscar e nunca pensei que eu pudesse amar
meus amigos mais.
“Você está lindo”, ela diz para Theo, alisando o colarinho da
sua camisa. “Oi, eu sou Kacey”, ela diz para Holly, cujos braços
estão cheios de tatuagens em exibição com uma blusa sem
mangas. Eu prendo um sorriso enquanto Kacey puxa a mãos de
Holly para admirar a tinta.
“Uau, incrível.” Ela se vira para Theo. “Suas?”
Ele balança a cabeça, dá de ombros.
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No momento em que terminamos nossos aperitivos,
qualquer escrúpulo que eu tinha acerca de Kacey nesse encontro
desapareceu. Ela e Holly falam sobre tatuagens, e ainda tem o
Theo que arregaçou a manga para comparar as tatuagens, antes
de Kacey cair em uma conversa com Dena sobre poesia e
composição.
Oscar inclina-se ao meu lado esquerdo. “Você vai comer ou
olhar para Kacey a noite toda?”
Nenhum ponto em negá-lo. Eu nem sequer tento. “Eu vou
olhar para ela a noite toda.”
Oscar sorri e bate no meu braço. “Faça isso.”
Na sobremesa, Oscar lidera a conversa sobre acampar
mudando o tema, e pergunta a Kacey se ela já acampou.
“Nunca”, ela diz. “Eu não sou uma pessoa de natureza,
exceto praia. Onde você acampa?”
“Great Basin National Park.”
“É bastante impressionante”, Dena diz. “É um pouco de
tudo — deserto, floresta, lago. Você vai adorar.”
“Você deveria vir com a gente”, Oscar diz.
“Você deveria”, Dena diz. Ela se vira para Holly. “Você
também. Então, seríamos seis.”
“Estou dentro”, Holly diz, enquanto por trás do seu ombro,
Theo olha furiosamente para Dena.
“Parece ótimo”, Kacey diz, em seguida, se vira para mim. “O
que você acha? Será que você... gostaria da companhia?”
Talvez eu devesse ser mais cuidadoso ou cauteloso, mas
estou apenas feliz. Hoje à noite, estou seguindo o conselho de
Dena. Ser feliz. Ser normal. A parte do círculo, sobre não estar
sozinho no centro.
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“Eu adoraria a companhia.”
As bochechas de Kacey ficam lindamente avermelhadas, e
ela se vira para Oscar. “Obrigada por me convidar.”
“Não me agradeça até ter usado a floresta como banheiro e
ouvir os leões de montanha do lado de fora da sua tenda. Esta é a
sua iniciação, garota.”
“Manda ver”, Kacey ri.
E seu sorriso é a coisa mais linda que já vi.
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CAPÍTULO 25
kacey
“Então, quem está a fim de um pouco de jogo?” Eu digo
quando saímos do restaurante. “Eu tenho quarenta dólares
queimando um buraco no meu bolso.”
Dena troca um olhar com Oscar, então boceja. “Eu exagerei
no crème brulee”, ela diz. “Meu travesseiro está chamando.”
“Sim, eu também”, Oscar diz, olhando para Jonah. “Por que
vocês não vão em frente sem nós? Faremos isso novamente em
outro momento.”
“Tem certeza?” Digo.
“Da próxima vez”, Dena diz, me abraçando.
“Eu vou jogar”, Holly diz. “Não tenho em anos.” Ela puxa o
braço de Theo. “Você quer?”
Agora Theo ricocheteia um olhar entre Oscar e Jonah, e
sacode a cabeça. “Não tenho vontade. Estou encerrando a noite.”
Holly faz beicinho antes de me abraçar e dizer adeus. Theo
desliza seus braços duros em torno de mim e inclina a boca ao
meu ouvido. “Tente ficar no máximo uma hora no cassino. Ele
não deve ficar perto do fumo.”
“Entendi”, digo.
Theo parece hesitar, seus olhos passando para Jonah, em
seguida, de volta para mim. “Divirtam-se”, ele diz. Ele se vira
abruptamente, deixando Jonah e eu sozinhos.
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Vejo Holly correr para alcançá-lo.
“Ele e Holly estão juntos há muito tempo?” Pergunto.
“Pelos padrões dele, sim.”
“Oscar e Dena são pessoas maravilhosas.”
Jonah faz uma careta. “Eles são como um ato Vaudeville
ruim.”
Eu rio. “Vamos. Prometi a Theo que só ia ficar uma hora no
cassino.”
“Jesus, ele é ridículo.”
Enfio a mão na dobra do cotovelo. “Ele é protetor com seu
irmão.”
O cassino fica a uma curta caminhada do restaurante.
Entramos no ambiente ligeiramente escuro, aonde a maioria da
iluminação vem de máquinas caça-níqueis, filas e filas delas.
Uma legião de incandescência, luzes piscando. Cones de luz
brilhante soam nas mesas de Black Jack, refletindo camisas
brancas dos Croupiers e as cartas brancas no feltro verde.
“O que vai querer?” Jonah diz. “Blackjack? Roleta? Poker?”
“Blackjack”, digo.
O cassino está lotado e temos que perambular antes de
encontrar uma mesa com um assento disponível, à direita do
funcionário.
“É uma mesa de cinco dólares”, Jonah diz. “Vá em frente.”
“Não há espaço para você.”
“Eu vou assistir e ajudar de longe.”
“Não preciso de ajuda.”
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A sobrancelha dele sobe. “O assento à direita do Dealer é o
lugar mais importante na mesa. Está pronta para esse tipo de
responsabilidade?”
Aperto os olhos para ele. “Eu nasci pronta.” Sento e, em
seguida, faço uma pausa. “Espere. As cartas que tem caras valem
dez, certo?”
Jonah ri e tomo o lugar vago. Ele fica para trás para ver a
mão em progresso ser jogada.
À esquerda do Dealer estão sentados dois rapazes que
parecem sérios sobre seus cinco dólares. Ao lado deles, duas
senhoras mais velhas conversam sem parar e jogam quase como
uma reflexão tardia — contando totais de suas cartas e batendo
ou continuando no jogo automaticamente. Ao lado deles e à
minha direita está sentado um senhor mais velho com um
chapéu de vaqueiro. Ele puxa um maço de Marlboro Reds do
bolso da frente.
“Senhor”, digo. “Vou ganhar uma mão e depois irei embora.
Será que se importaria de não fumar até lá? Por favor?”
Ele me olha através da pele grisalha e enrugada em volta
dos olhos, e ri. “Você está na berlinda, garota. Você sabe como
jogar para ganhar?”
“Observe-me”, digo. O cowboy coloca os cigarros longe e eu
me inclino para trás em Jonah. “Como é que você joga para
ganhar?”
“Você precisa de fichas. Deite o dinheiro sobre a mesa.”
Eu coloco uma nota de vinte dólares no feltro verde. “Vou
querer uma ficha”, digo ao Dealer e ele me dá uma única ficha
listrada azul-e-branco com um 20 gravado em dourado na frente.
“É só uma aposta de cinco dólares”, Jonah diz.
“Vá com tudo ou vá para casa, certo?”
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“Você tem esse direito, garota.” O cowboy puxa uma ficha
vermelha de cinquenta dólares de uma das várias pequenas
torres de fichas, e coloca como sua aposta. “Faça o certo por mim
agora, querida. Estou contando com você.”
Jonah ri por trás de mim.
Eu me inclino para trás. “Dobro para baixo em onze,
certo?”
“Oh, agora você quer treinar?” Ele estala a língua.
O Dealer— um homem sem expressão em seus vinte e
tantos anos — habilmente desliza as cartas para fora do monte
para cada um de nós, viradas para cima. Ele se deu uma, para
cima — a três de paus.
O resto dos jogadores teve sorte: nada inferior que
dezessete, e o Cowboy divide a sua oito, e coloca outra ficha de
cinquenta dólares ao lado de sua primeira. Ele é recompensado
com dois dezoitos, e se acha sortudo.
Amargo com um três de ouros e um dois de coração.
“Você está brincando comigo”, eu murmuro.
O Cowboy faz uma careta para minhas cartas. “Não é bom,
menina.”
“Se você está me dizendo. Quero mais uma carta”
Dois de espadas.
“Mais uma”, digo novamente.
Cinco de paus.
“Merda.”
O resto da mesa começa a resmungar.
Jonah se inclina sobre mim. “Você está com doze. O Dealer
deve ter treze — provavelmente.”
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“Como você sabe? Você é o Rain Man?”
O sorriso de Jonah colore suas palavras. “Não, mas sou um
excelente motorista.”
“Ha ha. Socorro.”
Jonah se abaixa para que seu queixo fica pouco acima do
meu ombro nu. Sua respiração está quente no meu pescoço,
enviando agradáveis pequenos arrepios pela minha espinha.
“É uma estratégia segura assumir que a próxima carta do
Dealer vai valer dez. Os que estão na mesa vão ultrapassar.”
“Ok…”
“Então ele tem treze, nós assumimos. Você tem doze, e sua
próxima carta vai ser uma carta que vale dez...”
“Como... como você sabe?” Eu tento manter o foco, mas
Deus, Jonah cheira bem. E sua mão repousa sobre minhas
costas, esfregando o polegar em um círculo suave. Eu acho que
ele nem sabe que está fazendo isso. Aperto minhas pernas.
“Probabilidade”, ele responde. “Você recebeu um monte de
pequenas cartas. Boa chance de a próxima valer dez. Deixe que a
mesa pague. Não peça mais cartas.”
A dica é veementemente ecoada pelos outros jogadores.
“Não peça mais.”
“É provável, não definitivo.” Olho ao redor da mesa.
“Desculpe, gente, mas não posso ficar com este patético doze.”
Protestos altos são ouvidos enquanto esfrego meus dedos
ao longo do feltro verde. “Mais uma.”
O Dealer mostra um oito de ouros.
“Vinte.” Eu agarro o braço de Jonah e aperto. “Eu tenho
vinte.”
Ele balança a cabeça, rindo. “Sim, você tem.”
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“Você tem muita sorte, é o que você tem”, o Cowboy diz com
uma risada. “Agora pare, garota.”
“Isso, pare”, os outros jogadores ecoam.
Aceno minhas mãos sobre minhas fichas. “Paro.”
A mesa fica tranquila quando o Dealer vira sua carta para
baixo. Uma rainha que dá treze.
“O Dealer tem que passar do dezessete”, Jonah murmura
em meu ouvido.
Meu coração bate rápido enquanto observo o Dealer bater
com o Valete de diamantes. A mesa irrompe em aplausos.
Jonah agarra o meu ombro. “Puta merda.”
“Eu ganhei”, digo, quando o funcionário do cassino coloca
uma segunda ficha de $20 listrada de azul e branco ao lado da
minha primeira.
“Você não só ganhou”, Jonah diz. “Se você tivesse parado
com o seu doze, o Dealer teria tomado a sua oito e a sua treze.”
“E daria vinte e um”, digo.
“Toda a mesa teria perdido.”
“Ele está certo, garota”, Cowboy diz. “Você é uma
impostora, não é?”
“Pode ser.” Pego os meus ganhos e desocupo meu lugar.
“Boa sorte a todos! Prazer em conhecê-los.” Eu bato na aba do
chapéu do cowboy quando saímos da mesa. “Você pode fumar
agora, senhor.”
“Você arrancou de mim duzentos dólares, senhora
sortuda”, ele diz, rindo atrás de nós. “Talvez eu deva parar
enquanto posso.”
“E agora?” Digo a Jonah, pegando sua mão. “Para onde? Eu
juro que nunca me diverti tanto estando sóbria na minha vida.”
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Eu paro nas longas filas de máquinas caça-níqueis, cheias de
zumbido e ruídos e muito brilhantes. “Caça-níqueis. Oh meu
Deus, você quer? Apenas algumas vezes, depois vamos embora,
eu juro.”
Jonah ri. “Como eu poderia dizer não?”
Vou até a cabine de troca e volto com quatro rolos de
moedas.
“Você quer jogar nos caça-níqueis?” Jonah pergunta.
“Eu quero jogar em algum tipo de máquina, mas
desembolsar moeda após moeda em uma máquina parece um
desperdício. Desta forma, fico com a experiência sem sentir que
estou jogando uma tonelada de dinheiro fora.”
Jonah estreita os olhos e coça o queixo, pensativo. “Muito
esperta.”
“Engraçadinho.” Pego a mão dele novamente. “Vamos jogar
como grandes jogadores.”
Encontramos um único banco de níquel do cassino e me
instalo. Jonah tira o paletó e gravata e as joga sobre uma
máquina vaga. Então me entrega um balde de plástico de uma
pilha entre as máquinas.
“Para os seus ganhos”, ele diz.
“Melhor me dar dois”, digo, rasgando meus rolos de
moedas. “Estou com sorte... idiota.”
As máquinas de caça-níqueis têm botões de empurrar,
além das alavancas que fazem rolar imagens de cerejas,
diamantes e barras. Jonah aperta o botão, mas insisto em puxar
a alavanca.
“Para obter o efeito completo”, digo.
“Você realmente nunca jogou antes? Nem mesmo no
Caesars?”
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“Estou muito ocupada entregando bebidas gratuitas, e
quando o meu turno acaba, só quero sair de lá e trocar de roupa.
Puta merda, você deve ver a roupa que nos colocam para usar.
Togas, sandálias douradas e tiaras de folhas.”
O mergulho metálico de um pequeno punhado de moedas
atinge a bandeja de Jonah. Uma pequena vitória. Eu tenho o
mesmo; apenas o suficiente para nos manter jogando.
“É engraçado que temos o mesmo horário de trabalho”, ele
diz. “Quarta a sábado à noite, de dezoito a duas horas da manhã?
Exatamente a mesma programação.”
“Eu pedi por esse horário.” Viro o rosto para a máquina,
puxo a alavanca. “Porque são os melhores turnos.”
Com o canto do meu olho vejo Jonah sorrindo. “São os
melhores.”
Enfio a última moeda na máquina e nada vem.
“Eu estou fora”, digo com um suspiro. “Acho que o sistema
está viciado.”
Jonah ri. “Eu garanto que está. Estou quase com muito...”
Ele deixa cair uma moeda, aperta o botão e as imagens na
máquina giram e giram. Um desenho solitário de diamante com
jackpot escrito para bem no meio. Em seguida, dois. Em seguida,
três, todos alinhados em uma fileira perfeita. A máquina inteira
se ilumina com luzes piscando e música, e uma torrente de
moedas em cascata cai na bandeja que fica embaixo.
Salto da minha cadeira, minhas mãos voando para boca.
“Oh meu Deus, você ganhou. Você ganhou!”
Jonah olha, um meio sorriso de choque ao redor de sua
boca aberta. “Puta merda, olhe para isso.”
As moedas continuam caindo, transbordando a bandeja e
caindo sobre o tapete em uma avalanche tilintante.
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Agarro seu ombro. “Oh meu Deus, o quanto você ganhou?”
Olho para o topo da máquina para os pagamentos. “Diz que três
diamantes são... cinco mil moedas. Espera... Isso é...”
“Duzentos e cinquenta dólares”, Jonah diz, de pé, com as
mãos na cabeça.
“Você ganhou o jackpot”, digo, jogando meus braços em
volta do pescoço dele.
Ele olha para mim, com as mãos caindo lentamente. As
luzes da máquina refletem vermelho, azul e verde em seus olhos.
O ruído das moedas caindo desaparecem em meus ouvidos. Todo
o cassino desaparece ao fundo.
“Eu ganhei”, ele sussurra. Suas mãos pegam meu rosto e
ele me beija.
Congelo quando seus lábios cobrem os meus, então me
derreto contra ele. Sua boca quente, macia rouba a força das
minhas pernas e cambaleio para trás. Ele segue, apertando-me
contra o banco da máquina, moedas caindo sob os nossos pés.
Um pequeno gemido escapa de mim, um som inconsciente de
desejo emergindo. Eu não sabia o quanto queria isso até que
estava acontecendo.
Jonah passa os lábios sobre os meus e, em seguida, se
aproxima, pressionado com mais força. Meus lábios se abrem, e
eu gemo novamente no primeiro gosto de sua língua deslizando
contra a minha — um toque de calor doce e picante do nosso
jantar. Eu quero mais, mas ele se retira para beijar meus lábios,
sugando levemente, explorando todos os lugares, antes de voltar
a mergulhar mais fundo.
Minhas mãos encontram um caminho para seu cabelo
macio. Puxo levemente, trazendo-o para perto de mim, abro mais
a boca para aproveitar todo o seu beijo. Seu corpo pressiona o
meu, e desejo senti-lo na minha pele e em minhas veias.
Isso. Isso... O tempo todo tem sido isso.
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Jonah geme baixinho, suas mãos percorrem sobre cada
centímetro de pele disponível: meu pescoço, meu ombro, meu
rosto. Deus, a maneira como ele segura meu rosto, segurando
meu queixo nas mãos... Ele me beija como se eu fosse algo
delicado e precioso, algo que ama e quer manter com reverência.
O meu primeiro beijo. Este é o meu primeiro beijo de verdade.
O barulho de moedas para. Os lábios de Jonah roçam os
meus mais uma vez antes de ele se afastar. Ele abre os olhos.
E o meu coração se parte.
“Kace”, ele sussurra, com o rosto cheio de dor. “Oh droga,
eu não deveria ter feito isso.”
Todo sentimento bom e belo do nosso beijo é arrancado de
mim. “Jonah...”
“Eu não posso fazer isso com você. Ou comigo mesmo.”
Agarro-me a ele, puxando as mãos, ainda sem fôlego. “O
que você está dizendo...”
dele.
“Esta é sua máquina?” Ouvimos uma voz estridente atrás
Jonah abaixa as mãos e se vira. Uma velha senhora com
um olhar fixo para a luz amarela piscando no topo da nossa
máquina.
“Vão passar por aqui para preencher a máquina outra vez”,
ela diz. “Você vai querer o seu dinheiro ou não?”
“Queremos, obrigado.”
Jonah se ocupa em colocar as moedas nos baldes de
plástico. Eu ajudo, e cada vez que nossas mãos se tocam, o
desejo estala os meus braços. Eu o quero. Quero suas mãos sobre
mim, sua boca na minha, seu corpo em mim. Jonah, porém, não
olha para mim e sua boca está pressionada em uma linha fina,
como se ele estivesse tentando não respirar.
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Meus sentimentos batem em mim como um turbilhão de
dor, humilhação e confusão. Tinha apenas começado a provar
algo bom e perfeito e então foi arrancado.
Trocamos as cinco mil moedas por US$ 250. Jonah tenta
colocar o dinheiro na minha mão. “Pegue. Ou, pelo menos,
metade. Eram suas moedas para começar.”
“Foi o jackpot.”
Eu era o seu jackpot.
Ele balança a cabeça, mudo e relutante. A miséria exalando
dele é como mil pequenas lanças penetrando no meu coração.
“Vamos sair daqui”, digo, puxando seu braço. “Longe da
fumaça.”
“Sim”, ele diz com um sorriso amargo. “Não é bom para o
meu coração. Tudo o que faço é para o bem do meu coração
estúpido.”
Saímos do cassino e caminhamos em silêncio, pelas
calçadas movimentadas para sua caminhonete estacionada. No
caminho para o meu apartamento ficamos em silêncio. No
estacionamento, ele deixa o motor ligado e aperta o volante com
tanta força, que os nós dos dedos estão brancos.
“Eu sou um idiota”, ele finalmente diz. Ele se vira para
olhar para mim pela primeira vez desde que saímos do MGM
Grand, e seus olhos estão pesados e exaustos. “Kace, eu sinto
muito.”
“Por quê?”
“Eu não deveria ter te beijado. Foi errado e é estúpido, e
sinto muito. Nós somos amigos. Temos que continuar sendo
amigos. Só fui pego no momento, e você estava... tão linda.”
“Jonah ...” Estendo a mão para ele, mas ele se afasta.
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“Por favor, não. Estou fodido o suficiente por uma noite.
Minha força de vontade está pendurada por um fio maldito.”
Um breve silêncio se instala até que ouço apenas o meu
próprio coração, batendo com força contra meu peito. Chego
perto novamente e tiro a sua mão do volante. Seu bracelete de
alerta médico brilha.
“Você não tem que se desculpar. Não se desculpe. Aquele
beijo foi lindo. Você não sente? Pareceu certo e perfeito, e isso
significa algo. Jonah...”
“Deus, Kace”, ele sussurra, com sua voz embargada. “Você
deve ir. Por favor. Apenas vá.”
“Eu não quero”, digo, com minha voz embargada. “Eu não
quero desperdiçar mais um minuto. Estive longe de você durante
doze dias, quando saí da banda. Doze dias que nunca terei de
volta.” Lágrimas escorrem pelo meu rosto livremente agora.
“Escute. Tenho mais medo de não estar com você do que de estar
com você. Ou do que pode acontecer daqui a quatro meses.”
A mão de Jonah agarra a minha com força e seus olhos
brilham.
“Quatro meses”, ele diz, balançando a cabeça. “Você sabe
por que eu mantenho a minha agenda tão restrita? Por que eu
mantenho minha cabeça para baixo e trabalho todos os dias para
deixar a obra pronta para a exposição? Não é só para terminar o
trabalho. É porque quando faço só isso, mantenho o tempo que
falta como uma ideia abstrata. Em vez de um trecho linear de
dias é... uma esfera. Uma esfera de vidro a qual eu me mantenho,
visitar a minha família, ter bebidas com os amigos, mais e mais,
voltas e voltas. Cada semana não é diferente da seguinte. É assim
que sigo com o tempo.”
Lágrimas salpicam minha saia. “E agora eu estraguei
tudo?”
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Ele balança a cabeça, os olhos transbordando, sua voz
rouca e trêmula. “Não. Você tem sido uma luz brilhante no meu
mundo escuro e monótono. Mas se você me deixar te beijar de
novo... Se começarmos algo agora, o tempo não vai ficar parado.
Ao final, o meu fim, não vai ser alguma coisa insignificante à
distância. Ele virá em minha direção, porque...”
Sua voz é sufocada, e eu seguro sua mão com mais força,
as nossas lágrimas caindo juntas.
“Porque o quê?” Sussurro.
“Porque, Kace, os dias serão uma contagem regressiva até
que apenas uma saída exista”, ele diz com os dentes cerrados.
“Aquela em que eu tenho que dizer adeus a você.”
As palavras machucam meu coração, que racha e se
quebra.
É real. Como disse Lola. Eu não posso fingir que está longe.
Jonah inspira e se afasta, enxugando o rosto na manga de
sua camisa. “Vai ser difícil o suficiente como amigos”, ele diz, sua
voz embargada. “Vai ser muito pior se tentarmos ser mais. Se
fizermos amor. Se nós entrarmos...” Ele balança a cabeça,
frustração colore a sua expressão de agonia agora.
“Jonah...”
“É tarde. Eu tenho um monte de trabalho para fazer
amanhã.”
Não me passa despercebido a frieza em seu tom. Eu
balanço a cabeça em silêncio e alcanço a porta. “Tudo certo.
Obrigada pelo jantar e pela minha primeira vez em um cassino...”
E o meu primeiro beijo.
Jonah estende a mão sobre o assento para segurar a minha
mão novamente. Ele a segura com força, aperta meus dedos sobre
os lábios, em seguida, me deixa ir.
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CAPÍTULO 26
jonah
Nas primeiras horas da manhã da sexta-feira da viagem de
acampamento, meu celular vibra com uma mensagem de texto de
Kacey.
Ontem no almoço, Tania me disse que encontrou um
bônus de US$ 250 em seu salário.
Quem disse que as máquinas de caça-níqueis não
pagam? Eu digito de volta.
Não eu. Espertinho. :P
Solto um suspiro de alívio. As coisas não estão tensas entre
Kacey e eu desde a semana passada, mas não estão 100% de
volta ao normal também. Ela está tão doce como sempre, ainda
levando Tania e eu para almoçar ou me enviando textos
aleatórios, engraçados como este. Ela está fazendo o que pedi
para fazer: ela está sendo minha amiga. Cumprindo sua parte do
acordo, enquanto eu estou sendo o bastardo egoísta, que a beijou
e quase fodeu tudo entre nós.
Nenhum de nós — Oscar, Theo, ou eu — tem um carro ou
caminhonete grande o suficiente para comportar seis passageiros
e nosso equipamento de acampar, por isso, cada um de nós
decidiu ir em duplas. O caminho para Great Basin National Park
é de quatro horas e meia. Tenho certeza de Kacey e eu
passaremos o tempo todo em um silêncio constrangedor, devido
ao beijo que quase fodeu tudo entre nós.
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Mas silêncios longos e Kacey Dawson não se misturam. Ela
é toda sorrisos quando vou buscá-la em seu apartamento, e
conversa sem parar sobre vários assuntos, e o camping em si.
“Eu nunca passei uma noite ao ar livre”, ela diz. “Será que
vamos ver estrelas?”
“Você vai ver muitas estrelas, será incrível”, digo a ela.
“Eu nunca vi um céu repleto com elas. As luzes da cidade
sempre as escondem.”
“Eu sei. A primeira vez que fui, eu não podia acreditar no
céu. Você vai amar.”
“Eu sei que vou”, Kacey diz, sentando em seu assento,
chutando as botas no painel. “Mas eu ainda não sei se trazer
minha guitarra foi uma boa ideia. Eu serei aquela garota que
invade a festa com música.”
“Você já nos privou de seu talento o suficiente. Você nos
deve pelo menos uma música. Considere o preço da admissão.”
Ela me joga dezenas de outras perguntas sobre a viagem,
nenhuma delas é sobre como iremos dormir. Não que eu sequer
sabia de alguma coisa. Oscar me garantiu que ‘iria cuidar disso’ e
murmurou algo sobre Holly e Kacey partilharem uma tenda.
Quando chegamos no parque de campismo, o carro preto
de Theo e a SUV prata do Oscar já estão estacionados lado a lado,
de frente para uma clareira de terra plana em Upper Lehman
Creek. Árvores — pinheiro, pinho e carvalho — se impõem no
meio com sua altura, gramas verdes cobrem o chão da floresta.
Posso ver o riacho do nosso lugar. Ele serpenteia através de todos
os acampamentos, correndo suavemente sobre a pedra lisa. Uma
peça de metal está no centro do lugar, e Theo já está montando
sua tenda laranja no lado leste.
Kacey salta para abraçar todos, e Oscar me puxa de lado.
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“Holly mudou os nossos planos, mano”, ele diz. “Ela não
pode ficar separada de Theo. Parece que você e Kacey vão ser
parceiros na barraca.”
Cruzo os braços sobre o peito e levanto uma sobrancelha.
“Você está tão cheio de merda.”
Oscar ri. “Você e Kacey. Uma barraca. Essa é a pura
verdade.”
“Eu sei, mas... não importa.”
“Uau, isso é incrível”, Kacey diz, se juntando a nós, seu
olhar varrendo a vista. Ela está adorável em sua despojada calça
jeans tamanho grande, botas pretas, uma camiseta branca
apertada e uma camisa xadrez verde aproximadamente dez
tamanhos maior. Considere a temperatura do dia uns trinta
graus. Kacey usa um gorro de malha na cabeça de qualquer
maneira, como se estivesse fazendo treze graus Celsius.
“Oscar, este lugar é tão bonito.”
“Não é?” Seu sorriso é nostálgico. “Eu costumava vir aqui
com os meus pais todos os anos quando era criança. Eles
eventualmente se cansaram, mas eu nunca parei de vir. Forço
meus amigos mais próximos e minha garota preferida, pelo
menos quatro vezes por ano.”
“Pelo menos”, Dena diz, envolvendo os braços em Oscar por
trás, o queixo contra seu ombro. “Mas amo isso aqui. Acho que é
inspirador.” Ela vira seus olhos escuros para Kacey. “Espero que
você ache o mesmo. Ouvi dizer que você trouxe sua guitarra?”
“Sim.” Kacey olha para baixo, chuta uma pedra. “Talvez eu
toque alguma coisa. Sei tocar Kumbaya.”
Oscar empurra o queixo para mim. “J, por que você não
mostra a ela o nosso lugar, leve-a para se familiarizar com a área.
Nós vamos chamar o Theo para montar sua barraca para você.”
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“O inferno que eu vou”, Theo resmunga por trás, de joelhos
em uma poça rasa de nylon laranja, orientando Holly sobre como
ajudá-lo.
Viro para Kacey. Seus olhos azuis aparentemente mais
impressionantes na neblina do lugar, em vez do branco calor
implacável de Vegas.
“Você quer ver o riacho?” Pergunto.
“Quero ver tudo.”
Levo-a para dar uma volta no local, através dos bosques e
ao longo do riacho. Tem apenas alguns centímetros de largura,
mas com uma corrente contínua de água limpa, fria. Kacey põe as
mãos nela e salta para trás com um grito. Então agita as mãos
secas e as envolve em sua camisa.
“Por favor, não me diga que tenho que tomar banho aqui”,
ela diz, rindo.
“De modo nenhum. Na cidade de Baker tem chuveiros
pagos.”
“Graças a Deus.”
“Apenas a uma curta caminhada, de quatro horas descendo
a montanha.”
Seu sorriso desaparece. “Sério?”
“Oscar gosta de tudo ou nada. Estamos metidos nisso,
menina da cidade, por dois dias inteiros.”
Kacey morde seus lábios. “É melhor que apareçam algumas
estrelas incríveis hoje à noite.”
“Eu garanto.”
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Caminhamos por entre as árvores, o barulho do riacho
sendo o único som.
“Você sabe onde está indo, Fletcher?” Ela pergunta,
pisando com cuidado sobre uma árvore caída.
Eu paro de andar. “Achei que você tinha trazido o mapa?”
“Muito engraçado. Se você se perder, eu não vou comer
insetos ou musgo ou... líquen. Digo isso desde já.”
“Você não terá que comer. O pé grande provavelmente vai
chegar até nós antes disso.”
Kacey congela. “Por favor, não brinque. Pé Grande? Sério?
Existem Pé grandes? Grande... aqui em cima?”
“Pés grandes?” Minha risada começa como um ruído,
ganha força, e então estou rindo com lágrimas picando em meus
olhos.
“Cala a boca!” Kacey diz, dando-me um empurrão
brincalhão ao tentar esconder sua própria risada. “Eles me
assustam. E são reais, sabe”, ela insiste, apontando o dedo para
mim. “Você não pode me dizer que não são. Uma vez vi um
documentário... não dormi por uma semana.”
“Vamos”, digo, enxugando os olhos. “Eu vou te mostrar o
lugar, por isso que estamos aqui. Território livre de pés grandes,
eu prometo.”
Caminhamos até as árvores desbastadas, e depois dá lugar
a uma clareira com grama longa, parecida com cabelo, na borda
do mundo. As montanhas se levantam em todos os lados,
vestidas do verde claro, cheio de árvores de verão, não mais o
verde vibrante da primavera e ainda não os dourados e vermelhos
do outono. Abaixo de nós, a bacia se espalha por quilômetros, um
lago azul prateado escondido entre mais verdes. Não há
velejadores ainda para perturbar a superfície; é ainda como como
vidro.
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“É tão bonito”, Kacey murmura, seu olhar varrendo todo o
perímetro, e depois o céu nublado. “Se as nuvens passarem,
devemos ver as estrelas esta noite.”
Eu balanço a cabeça. “Se for claro o suficiente, você poderá
ver a borda da Via Láctea.”
“Sério? Isso seria incrível.”
Vejo seu olhar seguir um falcão quando ele sobe por toda a
bacia. Ver as estrelas refletidas em seus olhos... seria incrível. A
oportunidade de uma vida.
O crepúsculo vem e nós seis nos sentamos em cadeiras
dobráveis ao redor da fogueira, assamos cachorros-quentes e
marshmallows. Discussão e risos cruzam o círculo, histórias
terminadas e outras deixando seu rastro. Vejo que a luz do fogo
lança um brilho nos rostos das pessoas que mais gosto. Capturo
esses momentos em imagens mentais.
O rosto engraçado do Oscar, a luz do fogo captura o brinco
de Dena, um grito de alarme de Holly quando seu marshmallow
pega fogo, Theo segurando um cachorro-quente para cima e
virando a cabeça de lado para mordê-lo. E Kacey inclinando o
queixo sobre a palma da sua mão, olhando de soslaio para mim,
inclinando-se para mim...
Guardo esses momentos na memória com a esperança de
que possa levá-los comigo aonde quer que eu vá depois.
Logo, a única luz é do nosso fogo baixo. As árvores
dobradas sobre nós para formar um dossel, e enquanto parece
que as nuvens haviam passado e apenas um punhado de estrelas
é visível.
Alimentos ingeridos e lixo limpo, Dena abre a parte artística
da noite recitando alguns poemas: um pouco de Walt Whitman,
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alguns versos de Thoreau. Ela fecha, como sempre faz com Rumi,
e enquanto a maioria das poesias não me emociona, Dena recita
um verso que chama a minha atenção:
“Você não é uma gota no oceano. Você é todo o oceano em
uma gota.”
Olho para Kacey sentada ao meu lado. Ela não é apenas um
oceano. Ela é um universo inteiro.
Oscar convida Kacey para tocar para nós.
“Estrela do rock na casa”, Holly diz.
“Sério?” Ela diz de sua cadeira ao lado de Theo, de mãos
dadas.
“A ex-estrela do rock”, Kacey diz. “E não acho que você
pode me chamar de ‘estrela’ quando saí da banda oito nano
segundos antes de ficar famosa.”
Ela está certa. Ouvi no rádio da Hot shop que sua antiga
banda estava rasgando as cidades e adicionou mais quatro shows
à sua série de concertos esgotados.
“Qual banda?” Holly pergunta.
“Rapid Confession”, digo enquanto Kacey está buscando
sua guitarra para fora da tenda.
Holly quase cospe a cerveja de sua garrafa. “Você está de
brincadeira? Porra, eu amo essa banda.”
Theo lança a ela um olhar irritado. Kacey apenas sorri
enquanto coloca a correia da guitarra em seu ombro.
“Por que você desistiu?” Holly pergunta.
“Não era pra mim.” Kacey está sentada no chão na frente
de sua cadeira, perto de minhas pernas. A luz do fogo faz seu
rosto brilhar. “Então”, ela diz, afinando sua guitarra. “Algum
pedido?”
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“Hum, sim, o que acha de ‘Talk Me Down’?”
Kacey sorri ligeiramente, mas mantém os olhos em sua
guitarra. “Eu não toco mais essa.”
Estou nervoso pra caramba por algum motivo. Além de
alguns sons de guitarra altos — mas intrigante — elétricos no
rádio, eu nunca ouvi Kacey tocar. Ou cantar. Meu coração bate
rápido como se eu fosse o único no centro das atenções, e minhas
mãos estão tão suadas que tenho que limpá-las na frente do meu
jeans.
“Que tal um clássico?” Dena diz. “Tom Petty?”
Kacey assente enquanto dedilha algumas notas. Em
seguida, os dedos batem os cinco acordes da introdução ‘Free
Fallin’.
“Ótimo”, Dena murmura.
Os acordes são repetidos, então Kacey começa a cantar.
Depois de dois versos, fecho os olhos, bloqueando tudo,
exceto sua voz. Pura e doce, mas um pouco rouca também.
Resistente como o inferno, tingida de vulnerável. Ela canta sobre
uma boa garota que amava sua mãe e um menino mau que
quebrou seu coração. A mão de Kacey dedilha as cordas mais
difíceis quando o verso termina, e ela atinge uma nota alta e
complexa, com uma boa afinação no final.
Antes do próximo verso, Kacey sorri para Dena,
murmurando, “Don’t leave me hanging (Não me deixe
esperando)…” Dena se junta a ela, em seguida, nós todos estamos
cantando. Pelo resto de ‘Free Fallin’ e em ‘I Am Yours’ de Jason
Mraz, ‘Brass in Pocket’ dos Pretenders, e ‘Wonderwall’ do Oasis.
Por último, Kacey canta ‘Chasing Cars’ de Snow Patrol’s
sozinha, sua voz enchendo a noite. Debruço-me na minha
cadeira, apenas a lateral do seu rosto visível para mim, iluminada
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com a luz do fogo enquanto sua voz doce, forte pede a alguém
para se deitar com ela e esquecer o mundo.
A dor em meu coração sobe para a minha garganta, e sinto
algo mudar dentro de mim. Uma mudança. A esperança egoísta e
imprudente que talvez, se Kacey ainda estiver disposta, eu
poderia deitar com ela esta noite e todas as noites depois dessa, e
todas as outras que eu ainda tiver.
A música termina. Seguida pelo silêncio.
Holly funga e enxuga os olhos. “Você tem uma bela voz.”
Kacey sorri enquanto os outros murmuram em acordo.
Com um estalar de sua cabeça, Theo sai do seu devaneio como
um homem esteve sob hipnose. Todas as suas paredes voltam
para cima. Seu rosto endurecido, com a testa franzida e ele toma
um longo gole de sua garrafa de cerveja.
Os olhos de Kacey encontram os meus, suaves e serenos à
luz do fogo.
“Tudo bem, garotos”, Oscar diz, pegando um jarro de água
para apagar o fogo. “Hora de dormir.”
Boa noite é dito, e nos retiramos para as nossas tendas.
Kacey e eu nos revezamos esperando do lado de fora enquanto o
outro se troca para as roupas de dormir. Ela veste leggings e um
blusão azul masculino bem comprido. A temperatura cai para
quinze graus ou menos, e ela estremece enquanto se aconchega
em seu saco de dormir.
Vestindo calças de flanela e uma camisa, deslizo para o
meu saco. Ficamos deitados em silêncio olhando para o teto da
barraca, um raio de luz prata das estrelas é a nossa única
iluminação.
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“Holly está certa”, digo. “Sua voz é bonita. Você poderia ter
uma carreira solo, se quisesse.”
Ela rola de lado para mim. “Se eu quisesse...”
“Você quer?”
“Eu não sei. Ainda esta manhã tentei terminar uma canção
que comecei há vários anos. Sobre Chett. Eu a escrevi na estrada.
Toda a dor dele me largando. Puxo as palavras do meu coração
para pôr na página. Deus, a dor sentida foi tão real naquela
época. Mas quando li hoje... pareceu vazio. Bobagem, até.” Ela dá
um suspiro. “Acho que não vale a pena escrever qualquer canção
de Chett. Irônico, já que é por isso que voltei para Vegas. Para
escrever sobre ele.” Ela mexe em sua bolsa. “Acho que é hora de
encontrar algum material novo.”
Balanço a cabeça, lutando por algo mais a dizer.
Kacey deita de volta. “Esta tenda é a pior.”
“Como?”
“Esta é a pior tenda que existe”, ela diz, apontando para o
teto de nylon angular sobre nossas cabeças. “Olhe para ela. Que
diabos adianta dormir na natureza, se você não pode vê-la?”
“Para protegê-la contra os elementos”, digo. “Apenas uma
fina tira de nylon separa você da chuva, vento... do pé grande.”
“Cale-se.”
“O pior que a mãe natureza tem para oferecer.”
“E o melhor”, ela diz. “Quero dizer, não há nem mesmo
uma janela para ver as estrelas. As tendas não têm geralmente
uma tela ou algo assim?”
“Algumas tem”, digo. “Essa não.”
Kacey sai do seu saco e o enrola em um monte
desengonçado e o enfia debaixo do braço.
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“Onde você vai?”
“Eu quero as estrelas.” Ela para na porta da tenda e olha
por cima do ombro para mim, uma pergunta em seus olhos.
Você vem?
Ela não espera por uma resposta, mas sai. Para onde eu
não faço ideia, mas se não a seguir, ela pode se perder na
escuridão da floresta. Pelo menos, é isso que digo a mim mesmo,
quando junto o meu próprio saco de dormir e a sigo para fora.
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CAPÍTULO 27
jonah
O chão está frio e duro sob meus pés descalços quando
sigo o brilho do cabelo claro de Kacey pela floresta, para longe da
clareira de tendas escuras onde meus amigos dormem. Ela segue
o riacho e eu acho que sabe para onde está indo. O único lugar
que ela conhece para ir; a clareira perto da borda do vale, cerca
de noventa metros de distância do acampamento.
Apenas algumas árvores cortam a clareira, elevando-se em
colunas no escuro. Abaixo, o vale se espalha em colinas de verdeescuro
que parecem quase preto no meio da noite, e um dossel de
estrelas que brilham como diamantes. A lua está enorme e cheia,
e lança luz prateada sobre tudo.
Ela deixa o saco de dormir cair na parte mais suave do
chão, amortecida por agulhas de pinheiro secas e macias, grama
longa. Kacey para por um momento, de costas para mim, esbelta
e luminosa ao luar. Sua cabeça se vira, tendo a vista do vale à
sua frente, e depois se inclina para as estrelas acima. Seus
ombros sobem e descem com uma inspiração profunda. A
respiração enche meus próprios pulmões, juntamente com uma
vontade desesperada de me mover atrás dela, trazer seu corpo ao
meu, colocar minha mão em seu cabelo e beijar a pele macia de
seu pescoço.
Kacey sacode o saco de dormir e entra nele. Eu coloco o
meu ao lado do dela, e juntos nos deitamos, olhando para as
estrelas.
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“Tão incrivelmente bonito”, ela diz. “Incrível como tudo isso
está aqui, em todos os céus noturnos, mas raramente podemos
ver.” Ela se vira para olhar para mim. “Você está muito quieto
esta noite. O que você está pensando?”
Em você. Meus pensamentos estão preenchidos com você.
Sempre.
“Posso dizer o que eu estou pensando?” Ela diz antes que
eu possa responder. “Estou pensando agora, que estamos
deitados aqui com menos de um centímetro entre nós, mas em
sacos de dormir separados. Porque nós somos amigos. Você está
aí, e eu estou aqui, e nós estamos fingindo amizade que nos
mantém a uma distância segura.”
Meu coração começa a bater. “Eu sei. Não deveria ter dito a
você para voltar a Vegas. E eu não deveria ter te beijado.”
“Eu tinha que voltar”, ela diz. “Eu nunca deveria ter ido
embora. Se tivesse mudado para alguma outra cidade, eu estaria
sozinha e infeliz e sentindo sua falta. Perdemos doze dias quando
parti. Eu quero que o tempo volte e não quero perder mais.”
“Kacey...”
“Eu não posso continuar assim, Jonah”, ela diz, virando-se
para olhar para mim. “Como amigos. Eu sei que deveria tentar,
mas não posso. Eu não consigo... não tocar em você. Eu quero
poder beijá-lo se eu sentir vontade, e acho que você quer isso
também. Tal como o nosso primeiro beijo no cassino. Foi tudo
para mim. Tudo.”
“Foi para mim também”, digo. “Eu quero te beijar
novamente. E quero te beijar tanto, que não posso respirar. Eu
quero estar com você a cada segundo da minha vida, mas... Deus,
Kacey, quanto tempo é isso? Como faço para colocá-la nisso?”
“E você? Você continuará sozinho?” Ela balança a cabeça.
“Você pode confiar em mim. Confie em mim quando digo que
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posso aguentar. Você e eu. Eu consigo. Aconteça o que
acontecer.”
“Eu confio em você. Eu me afastar nunca foi sobre
desconfiar de você. Foi sobre não querer machucá-la. Isso é tudo
que eu sempre quis, desde o primeiro momento que a vi. Protegêla.
Mantê-la segura.”
Ela sorri, com os olhos cheios de felicidade. E Deus, de
alguma forma, mesmo com todas as coisas loucas acontecendo
na minha vida, tudo se resume à possibilidade ou não de Kacey
estar feliz. Quero fazê-la feliz de qualquer maneira que eu possa,
porque é isso que ela faz por mim. Pouco a pouco, dia a dia, como
a luz solar que escoa através das rachaduras de uma casa
abandonada, Kacey está me invadindo. Derrubando as persianas,
arrancando as placas e iluminando tudo.
“Venha aqui”, digo.
Ela se contorce em seu saco de dormir por um momento
antes de sair dele. Meu coração acelera ao ver suas pernas nuas,
um flash da roupa íntima rosa, e o contorno de seus seios sob o
blusão. Seguro meu saco de dormir aberto e ela desliza dentro,
seu corpo curvando-se perfeitamente no meu, certo e perfeito
assim como o nosso beijo.
Ela suspira, vibra quando coloca as mãos no meu rosto.
“Sinto muito por ter te deixado.”
“Eu lhe disse para ir.”
“Eu deveria ter ficado. Nunca deveria ter deixado todos. E
prometo a você, Jonah, nunca vou deixá-lo novamente. Nunca
mais.”
“Eu vou deixar você”, digo, minha voz pouco mais alta que
um sussurro. As palavras penduradas entre nós, o ponto crucial
de toda a nossa dor, lágrimas e hesitação.
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Mas Kacey sorri — sorri — com lágrimas correndo pelo seu
rosto. “Ainda não. Não essa noite. Podemos não ter meses ou
anos, mas nós temos momentos. Milhares e milhares deles.
Vamos dar a cada momento, o nosso melhor. Ok?”
Olho para ela. “Ok.”
“Este é um bom momento”, ela sussurra.
“Um dos melhores...” Deixo minha cabeça afundar na
direção dela. Nossos lábios se encostam e os dela se separam
para mim imediatamente. Nossas línguas se encontram e eu
tremo como uma vibração correndo através de mim, queimando
através de mim como um fusível.
“Deus”, sussurro contra sua boca.
“Isso”, ela respira de volta. “Este momento.”
Ela me puxa para o beijo e estamos um sobre o outro. Ela
fica perfeita debaixo de mim, se encaixando perfeitamente contra
mim, e nossas bocas se movem em perfeita sintonia, nossas
línguas percorrendo e se tocando tão suavemente. A necessidade
que esteve crescendo e fervendo entre nós desperta e pega fogo.
Minhas mãos são gananciosas. Ela geme e se contorce com meu
toque, enquanto suas próprias mãos percorrem —meu cabelo,
minhas costas, em volta da minha cintura. Ela me encontra duro
e me acaricia através das calças de flanela.
“Jonah...” Ela se empurra contra mim, puxando-me para
perto com a perna. “Eu quero. Tanto. Você pode?”
“Oh, eu posso”, digo. “E eu vou.”
Ela deixa escapar um pequeno som em minha boca
enquanto a beijo muito, enquanto minhas mãos procuram os
seios sob a blusa. A sensação deles, o peso deles e sua pele suave
contra as palmas das mãos ásperas. Tudo dela, a respiração, o
cheiro, o jeito como me beija... Eu nunca quis uma mulher assim.
Nunca.
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“Não pare de me beijar”, ela sussurra contra a minha boca
quando tomo uma respiração. “Eu vou morrer se você parar...”
Minha boca toma a dela novamente, enquanto os nossos
corpos balançam juntos, seus quadris subindo para encontrar o
meu. Puxo-a com força, pressionando com vontade, como se já
estivéssemos nus e eu dentro dela.
Seus dedos lutam com os botões de sua camisa. “Tira isso”,
ela sussurra.
Eu a rasgo em vez disso, botões voando, e ela dá um
pequeno grito de surpresa, quando os seios se libertam. O ar frio
endurece seus mamilos imediatamente e coloco minha boca em
um, sugando e girando minha língua. Desejo percorre da minha
virilha até minha cabeça. Tonto de desejo e necessidade, sigo
para o outro seio enquanto ela arqueia as costas em minha boca.
“Oh Deus, sim...” A voz está ofegante e sua mão desliza sob
o cós da minha calça. Seus dedos se fecham ao redor da minha
dolorosa ereção, me acariciando.
“Se você continuar fazendo isso”, digo, minha boca em seu
pescoço, chupando e beliscando, “não será uma noite muito
divertida para você.”
“Não”, ela diz. “Você vai gozar comigo. Nós gozaremos
juntos.”
“Você é otimista.”
“E você não está nu suficiente”, ela responde. Ela puxa
minha camisa para fora e a joga de lado. Pele com pele, os seios
pressionados contra o meu peito. Minhas mãos emaranhadas em
seus cabelos, segurando sua cabeça enquanto eu beijo o doce
gosto de caramelo de sua boca.
“Eu quero isso... você...” Eu quero sentir toda a sua
suavidade requintada e calor em toda parte.
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Tiro minha calça e a cueca boxer. Ela tira a calcinha e me
puxa de volta. Sua boca toma a minha novamente e suas pernas
se abrem e estou tão duro...
“Merda, eu não tenho nada...”
“No bolso da camisa”, ela sussurra em meu pescoço.
Eu poderia chorar de alívio, mas isso teria levado muito
tempo. Pego um preservativo do bolso da frente da blusa rasgada
que ela está parcialmente vestindo e rasgo a embalagem. Em
questão de segundos, estou pronto.
“Jonah”, Kacey sussurra, abrindo suas coxas e me pegando
com a mão para me guiar. “Eu te quero tanto...” As palavras se
desfazem quando ela arqueia as costas e deslizo dentro dela.
Eu não tenho palavras. Sem pensamentos. Só a pura
sensação, o perfeito aperto quente e molhado levando-me a
entrar, me segurando, prendendo e envolvendo-me até que estou
enterrado tão profundamente quanto posso ir. Em seguida, suas
unhas se cravam em meus ombros, ela inclina os quadris, e estou
ainda mais profundo.
“Jesus, Kace”, eu gemo. Seguro seu quadril com uma mão,
levantando seu corpo para encontrar o meu. Empurrando para
baixo dentro dela, pressionando-a em meus impulsos, mantendo
lento. À luz da lua, com o rosto contorcido de prazer, os olhos
fechados, a boca aberta, garganta e costas arqueadas para me
levar todo o caminho de cada vez.
“Jonah”, ela respira. “Mais por favor…”
Seus quadris sobem e descem mais rápido agora, e eu
combino com seu ritmo, mantendo simultâneo sem pensar. Suas
pernas se enrolam ao redor da minha cintura, empurrando o saco
de dormir para fora de nós. Eu não sinto frio. Somente sua pele
na minha, o doce calor de seu corpo e os sons de seu prazer
sufocados no meu ombro.
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“Você é tão gostosa”, digo a ela, movendo mais rápido
agora. “Como você pode ser assim?”
“É você. Deus...” Seus olhos se arregalam por cima do meu
ombro. “Você precisa ver as estrelas.”
Eu passo meus braços ao redor dela e viro de costas,
puxando-a em cima de mim. Ela se levanta contra o céu, me
montando. E Deus Santo, as estrelas... Milhões delas em um
cenário brilhante para a beleza de Kacey. Elas não são nada se
comparadas a ela. Nada.
Ela encolhe os ombros saindo de sua camisa rasgada e a
joga longe. Sua pele nua brilha e irradia, a tinta escura de suas
tatuagens enlaça seus braços como uma trepadeira. Seus seios,
cheios e bonitos quando se levantam e caem, com as costas
arqueadas, o cabelo como seda branca derramando pelas costas.
Eu luto para não gozar, agarro-me ao mundo para esperar
por ela, para fazer com que seja tão incrivelmente bom para ela
quanto posso. Seus suspiros viram choramingos, meu nome é
sussurrado cada vez mais alto em sua boca. Ela se inclina para
trás, e coloca as mãos nas minhas coxas atrás dela, seu corpo
arqueado e aberto para mim. Isso acaba comigo. Não aguento
mais. Eu meio que sento, agarrando seus quadris com força e a
levo para baixo quando gozo dentro dela, uma e outra vez.
“Goze, Kace”, rosno entre os dentes. “Deixe-me vê-la gozar.”
Ela grita e seu corpo estremece e aperta em volta de mim. A
visão de seu rosto enquanto ela goza, a beleza inacreditável do
mesmo, o fato de que fiz isso com ela, a trouxe para esse prazer,
me toca profundamente.
Impulsiono uma última vez e gozo mais forte do que já
gozei na minha vida. Gozo, explodindo em Kacey, que está
choramingando agora, com a voz embargada, e então finalmente o
silêncio é quebrado apenas pela nossa respiração forte.
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Kacey olha para mim, um sorriso desconcertado em seu
rosto. Lentamente, se deixa cair sobre mim, seus seios
pressionados contra o meu peito arfante. Ela enfia a cabeça
debaixo do meu queixo e a suavidade de seu cabelo cai sobre o
meu pescoço. Com esforço, levanto meus braços trêmulos e a
abraço, a pele sedosa de suas costas nuas sob minhas mãos.
Olho para o dossel de estrelas no céu, me perdendo.
E me encontrando.
“Você está bem?” Ela sussurra.
“Oh sim.”
“Seu coração está batendo tão rápido.”
Enfio a mão entre nossos peitos. “Então, é culpa sua.”
Eu a sinto rir e suspirar por toda a minha pele nua. “Isso
foi incrível”, ela sussurra. “Eu nunca... Quero dizer, eu já, mas
não assim. Nunca como agora.”
Uma estrela cadente desce em todo o profundo azul-negro
do céu, cruzando o dossel repleto de diamantes. “Sim”, sussurro.
“Nunca assim.”
“Você acha que os outros nos ouviram?”
“Eu tenho certeza que toda a área estadual nos ouviu.”
Minhas mãos arrastam preguiçosamente sobre suas costas. “Um
guarda do parque vai vir por aquela colina a qualquer momento
para investigar quem estava torturando um leão da montanha.”
“E quem é o leão da montanha neste pequeno cenário?”
isso.”
“Você, é claro. Eu tenho as marcas de garras para provar
Kacey se aconchega mais contra mim. “Eu não me importo
que ouviram”, ela murmura depois de um momento. “Eles
querem isso para você, de qualquer maneira. Oscar e Dena.”
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“Todos querem que eu fique com alguém?”
“Todos eles querem que você fique com alguém.”
Eu balanço a cabeça. “Sim. Eu acho que querem.”
Kacey levanta a cabeça. “E agora você está comigo.” Seus
olhos se voltam para baixo por um segundo e, em seguida, para
encontrar os meus. Hesitante.
Eu sorrio suavemente para ela, essa linda mulher deitada
nua comigo, sua pele nivelada com a aresta dura da minha
cicatriz e ela não tem medo.
“Estou com você, Kacey. Não posso não ficar com você.”
“Não há volta, ok? Sem dúvidas. Se o fizermos, nós apenas
perderemos tempo. Eu não quero desperdiçar um único momento
com você. Nenhum.” Ela se levanta sobre os cotovelos. “Você me
promete? Não vai voltar atrás?”
Seguro seus ombros e a puxo para cima de mim, então
coloco minhas mãos em seu cabelo. Seus olhos estão arregalados
e intensos, e sei que ela ainda está me pedindo para confiar nela,
quando ninguém mais confiou.
“Não há volta”, digo, e selo o voto com um beijo que é suave
e gentil, mas no fundo com intenção. Minhas melhores intenções,
apesar de meus piores medos.
Pequenos momentos, de dia após dia. Isto é o que eu tenho
para dar.
Beijo Kacey mais profundamente e a necessidade de tê-la
me consome novamente. Ela geme baixinho na minha boca e
sinto que seu corpo começa a se mover contra o meu.
“Eu suponho que você não tenha um segundo preservativo
no bolso mágico, tem?” Pergunto entre beijos. “Por favor diga que
sim.”
Kacey ri contra os meus lábios. “Veja por si mesmo.”
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Minha mão direita serpenteia para fora e pega sua camisa
descartada. Sinto um estalo no bolso e minha cabeça cai para
trás.
“Você sabia que íamos dormir juntos esta noite?”
“Eu tinha esperanças que sim.”
Levanto uma sobrancelha enquanto abro o pacote. “Duas
vezes?”
Sua voz, seus olhos e seu sorriso suavizam. “Eu tinha
muita esperança...”
Ela me coloca dentro dela, e quando meu corpo é sacudido
com prazer, sinto a mais agridoce emoção, subindo e caindo ao
mesmo tempo: alegria, por ter essa mulher na minha vida, e uma
profunda dor por tê-la conhecido tarde demais.
Eu te amaria para sempre, Kacey, se tivesse a chance.
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CAPÍTULO 28
kacey
O sol está bem acima do horizonte quando Jonah e eu
caminhamos de volta para o acampamento, de mãos dadas. Agora
que posso tocá-lo, não quero mais parar. Meu corpo ainda
cantarola como um passarinho, e em vez de se sentir saciada
depois de dois orgasmos alucinantes, eu só quero mais.
Chegamos às barracas para encontrar todos os outros
sentados em torno de um fogo baixo, tomando café. Todos param
para olhar para nossa abordagem. Oscar começa a bater palmas
até Dena lhe dar uma cotovelada na lateral, escondendo um
sorriso por trás da mão, enquanto nos observa com os olhos
calorosos. Holly enterra um risinho constrangido em seu ombro,
embora pareça cansada, como se não tivesse dormido muito na
noite anterior. Theo é o único boquiaberto, com sua expressão
ilegível. Retorno seu olhar com um pequeno sorriso que ele não
corresponde, e rapidamente desvia o olhar.
Jonah para, encarando todos os olhares. “Será que vocês
ouviram algo na noite passada? Leão da Montanha. Um alto
demais.”
Todo mundo começa a rir. Exceto Theo.
Golpeio o braço de Jonah e tomo o meu lugar ao redor do
fogo. O olhar escuro de Theo me segue, formigando na minha
pele. Dena me entrega uma garrafa térmica de café preto e
quente. Nossos olhos se encontram, os dela cheio de calor e algo
como gratidão.
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Sento no chão entre os pés de Jonah, inclinando-me para
trás com os cotovelos sobre os joelhos. Um ajuste perfeito.
Tudo isso, penso, tomando meu café. Tão perfeito.
Todos nós caminhamos pela floresta, nessa manhã,
seguindo uma trilha íngreme para baixo em direção a um
pequeno lençol de água chamado Stella Lake. Os caras ignoram
as rochas em toda a superfície, insultando um ao outro em uma
competição afetuosa, mas implacável. Holly, Dena, e eu andamos
em torno do perímetro sob um céu de chumbo que ameaça com
chuva.
Holly tem estado tranquila durante toda a manhã. Ela fica
perto de nós durante a caminhada, mas diz pouco, as mãos
enfiadas na frente de seu moletom.
“Eu traí a regra ‘sem telefones celulares’ e dei uma olhada
na previsão do tempo”, ela finalmente diz. “Uma enorme
tempestade vai rolar por aqui.”
Dena e eu olhamos para cima, ao mesmo tempo. O céu está
plano e cinza, e à distância, nuvens mais escuras e mais pesadas
aparecem.
“Então, queria saber se vamos embora mais cedo”, Holly
diz. “Como hoje. E se formos, será que eu poderia pegar uma
carona com um de vocês?”
A expressão de Dena demonstra preocupação. “Por quê? O
que aconteceu?”
“Theo e eu terminamos”, Holly diz.
“Quando?” Pergunto.
“Na noite passada.” Ela puxa o piercing na sobrancelha.
“Logo depois que todos foram para a cama.”
Dena olha para mim, depois de volta para Holly. “Eu sinto
muito, Holly. Posso perguntar o porquê?”
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“Ele é um idiota, é por isso”, ela diz com fogo súbito. “Ele
me disse que estava cansado de tentar fazer isso dar certo,
quando obviamente não queria. Ele sempre foi meio... quente e
frio comigo. Mas desta vez parece mesmo... que chegou ao fim.”
Seus olhos se enchem de lágrimas que ela rapidamente afasta.
“De qualquer jeito. Não quero passar tanto tempo dirigindo de
volta apenas com ele no carro.”
“Não, claro que não”, Dena diz, colocando o braço ao redor
dela. “Você pode ir com a gente. Vou descobrir com o Oscar o que
ele pensa sobre esta tempestade em potencial e nós vamos
resolver isso, ok?”
Holly assente. “Muito obrigada. Eu agradeço. Vou voltar a
subir. Estou farta de acampar.” Ela olha para mim, sua voz
endurecendo em petulância. “Você tem o irmão bom.”
Dena e eu observamos a sua partida de volta para a trilha,
então trocamos olhares de olhos arregalados.
“Bem, por um lado”, Dena diz enquanto nós continuamos
no caminho, “é uma merda Theo romper com ela enquanto ela
está presa, centenas de quilômetros de casa. Por outro lado, eu
não sei por que ele a trouxe em tudo. Ela é o mais próximo que
ele chegou de ter uma namorada, mas ela nunca fica.”
Dou de ombros. “Ela não é especial.”
“Definitivamente não. Ele não está procurando por uma. E
ele não deveria.”
“Não?”
“Os amantes não se encontram finalmente em algum lugar.
Eles estão um no outro o tempo todo”, ela recita.
Eu sorrio, um calor expandindo lá em baixo no meu íntimo,
juntamente com uma memória sensorial de Jonah deslizando
dentro de mim. “Eu gosto disso”, digo.
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“Eu também”, Dena diz com sua voz suave, o tipo de tom
tranquilo que faz você se sentir como se estivesse lhe dizendo algo
que apenas significa para você ouvir. “Rumi, novamente. Nunca
deixa de me surpreender como suas palavras ainda são tão
verdadeiras e potentes, centenas de anos depois que viveu.”
Paramos e observamos os caras pulando as pedras. Mesmo
a quarenta e cinco metros de distância, eu posso ver o riso em
Jonah e a posição de Oscar, e o carrancudo de mau humor em
Theo.
“Jonah é um dos melhores homens que já conheci”, Dena
diz. “Tem sido difícil vê-lo fechar a parte dele que anseia por amor
e querer cuidar de alguém. Quando ele fez essa última biópsia...
Ele tomou uma decisão de não se envolver com alguém
novamente. Ele usou o rompimento de Audrey como desculpa.
Mas agora ele está com você. Ele desfez essa decisão. Agora tem
uma chance.”
“Chance de quê?”
“De ser feliz. Ele está feliz com você.” Os olhos escuros de
Dena encontram os meus atentamente. “Ele não vai saltar de
aviões ou visitar lugares distantes da terra. Ele não tem nenhuma
lista de coisas a fazer. Ele só quer terminar a sua obra. E eu me
preocupei — todos nós nos preocupamos — que isso não fosse o
suficiente. Não tenho dúvidas de que ele vai termina-la. Mas eu
queria que ele compartilhasse sua linda arte com alguém. E agora
ele compartilha.”
Ela coloca a mão na minha, dá um aperto. “Você não tem
que me dizer. Tenho certeza que ele lutou para protegê-la. Para
manter você...”
“A uma distância segura”, digo.
Ela suspira, acena com a cabeça. “Ele empurrou tantos
amigos para longe pelo mesmo motivo. Mas não foi capaz de se
manter afastado de você, não é?”
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Balanço a cabeça, um sorriso espalhando meus lábios.
“Não, ele não conseguiu.”
“Claro que não”, Dena diz com uma risada, e volta seu
olhar sobre Jonah. “Vocês estavam um no outro o tempo todo.”
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CAPÍTULO 29
jonah
Oscar confirma que uma tempestade está vindo em direção
a nós em Basin. Pelas nuvens escuras no céu, ele acha que temos
uma hora no máximo.
“Eu vi a previsão do tempo antes de sairmos”, Oscar diz,
“mas esperava que fosse se dissipar então arrisquei uma
oportunidade. Desculpem amigos.”
“Isso é péssimo”, Kacey diz para mim. “Acontece que gostei
de acampar. É calmo aqui. Longe da cidade, carros e outras
pessoas. E eu queria mais tempo aqui com você.” Ela olha para
mim e acaricia a linha da minha mandíbula, em seguida, seus
olhos vão em direção aos outros que estão fazendo as malas.
“Podemos ficar? Eu quero ver a chuva.”
Coloco meus braços em volta da sua cintura. “Trovoadas
aqui são muito fortes”, digo. “Você tem certeza?”
Ela assente com a cabeça. “Eu sou de San Diego, lembra,
onde uma garoa que dura mais de cinco minutos é um
aguaceiro.” Ela aperta meu corpo mais perto do seu, roça os
lábios sobre a minha boca. “Quero dançar na chuva.”
Eu a encaro, todo o sangue no meu cérebro escoando para
o sul. “Ficaremos.”
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“Apenas atentem para os leões da montanha”, Oscar diz.
Suas sobrancelhas se erguem duas vezes. “Você sempre pode
perceber por onde eles estão vindo pelo volume de seus rugidos.”
Ela golpeia o ombro dele. “Eu nunca vou ficar me livrar
disso, vou?”
“Nunca.”
Theo anda a passos largos, nos puxando de lado.
“Acho que não consigo te fazer desistir?”
“Ela quer sentir a chuva”, digo.
“Chuva real”, Kacey. “Eu nunca vi chuva de verdade antes.
Sou uma idiota, eu sei...”
“E eu sou um maldito mala, preocupado com o sistema
imunológico de Jonah que não pode lidar com a chuva fria. Todos
nós temos um trabalho aqui.”
“Eu juro, Teddy”, Kacey diz. “Quero ele saudável, tanto
quanto você.”
“Jesus, estou de pé aqui, gente”, digo.
Theo olha para mim por um longo tempo. “Sim, você está.”
Ele agita a cabeça e aponta um dedo para mim. “Fique seco.”
“Palavra de escoteiro”, digo, levantando a mão.
Theo bufa e começa a se afastar. “Você nunca foi um
escoteiro.”
“Disso você pode ter certeza”, digo. Puxo Kacey para perto
de mim assim que os carros desaparecem descendo a colina. Eu a
abraço com força, a beijo com força.
“Você tem que esperar a chuva”, ela diz contra os meus
lábios.
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“Não quero”, digo, minhas mãos deslizando por sua camisa.
Agora que posso tocá-la, eu não consigo manter as mãos longe.
Não é possível me cansar de sua proximidade, seu corpo, seus
beijos...
“Você tem que ficar seco”, ela diz, levando-me para a
barraca. “Prometemos ao Teddy.”
Lá dentro, eu a dispo de tudo o que ela usa, exceto o blusão
de botão. Quando ela se derrete contra mim, pronta para desistir,
o céu se abre. Um flash de luz ilumina o mundo do outro lado da
tenda. Kacey se senta e puxa a aba da tenda, observando as
folhas inclinadas com a chuva lá fora.
“Meu Deus. Isso é chuva de verdade.”
Ela escorrega para fora da tenda e dá um pequeno grito
quando a água fria a acerta, encharcando-a instantaneamente.
“Oh merda, Theo estava certo. É frio como o inferno.”
“Volte”, digo.
“Ainda não”, ela diz, deixando a chuva cair sobre seu corpo,
seus quadris balançando levemente. “Eu gostaria que você
pudesse vir dançar comigo.”
“Você vai me agradecer mais tarde, quando estiver
tremendo de frio e eu seco.”
“Você vai me aquecer com o calor do seu corpo?”
“Pode ter certeza.”
Ela fecha os olhos e deixa a chuva cair sobre si, com o
rosto para o céu. Seus seios ficam visíveis através do tecido
molhado de sua camisa, com seus mamilos duros, e posso ver
todos os contornos, cada linha e curva. A água corre em riachos
por suas bochechas como lágrimas, mas seu sorriso é calmo e
reservado.
“Eu poderia ficar sozinha aqui fora.”
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“Estou vendo você”, digo. “Eu gosto de observar você.”
“Gosto de você me observando”, ela diz. E levanta seu
cabelo de seus ombros e seus seios sobem muito.
Eu respiro fundo, e luto contra o desejo de ir até lá. De
colocar minhas mãos sobre ela.
Espere. Basta esperar... E assistir.
Kacey deixa as mãos cair e abre os olhos. Seus lábios estão
entreabertos, a água escorre pelo queixo, e ela lentamente passa
a língua ao longo de seu lábio inferior. Seus olhos nunca
deixando os meus, suas mãos sobem novamente, desta vez para
sua camisa. Ela desabotoa os quatro botões de cima, mas não
mais, revelando o vale perfeito de pele lisa entre seus seios. As
pontas dos dedos puxam de lado o tecido encharcado e traçam
sobre um mamilo duro.
“Jesus...” Digo, com minha voz rouca de desejo.
Sua mão escorrega para baixo, até a barra da camisa,
levantando-a. Uma enorme dor se estabelece em minha virilha, e
minha boca fica seca como se estivesse morrendo de sede, e lá
está ela, encharcada de água da chuva.
“Venha aqui”, digo.
“Se eu fizer isso, você vai me tocar?” Ela pergunta, seus
dedos roçando a carne nua entre as coxas.
“Sim”, digo, de joelhos.
“Você vai colocar a sua boca em mim?”
“Sim.”
Seus dedos se movem em um círculo lento. “Aqui?”
“Deus, sim.”
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Ela lentamente vem em minha direção, com as mãos
desfazendo o resto dos botões. O último se desabotoa quando ela
chega à beira da tenda, e a camisa cai de seus ombros até o chão.
“Você está certo”, ela diz, caindo na toalha que estou
segurando. “Estou com frio.”
A enrolo e puxo, até os joelhos, a minha boca encontrando
a dela imediatamente. Sua pele está fria, mas o calor de sua
língua desliza contra a minha...
“Kacey... quero você...”
Beijo-a, minhas mãos percorrendo a toalha sobre seu
corpo, secando sua pele e a deixando quente e macia.
“Você cheira a chuva”, digo, movendo minha boca entre os
seios. Ela geme baixinho quando tomo um mamilo, aquecendo-a
com a minha língua e, em seguida, beliscando e sugando para
mantê-lo duro.
“Jonah... Deus, o que está fazendo comigo?”
Seus dedos envolvem meu cabelo enquanto eu mudo para o
outro seio, sugando e alisando meus dentes enquanto seco suas
costas e quadris. Então ponho um braço em volta da cintura dela
e coloco-a no chão da tenda. Esfrego a toalha sobre a barriga,
para baixo, entre as coxas, para baixo de cada perna, em seguida,
jogo a toalha de lado. Ela está aberta e se espalha diante de mim,
os lábios ligeiramente entreabertos e os olhos vidrados de desejo.
Quero me despir e mergulhar nela, satisfazer o desejo. Mas há
algo elétrico e poderoso sobre eu estar completamente vestido
enquanto ela está nua embaixo de mim.
E ainda assim sou completamente dela. Ela me pertence.
Nenhuma outra mulher jamais me fez sentir assim: desfeito,
completamente desvendado e ainda completo. Kacey me curou.
Saudável. Invencível. E meu corpo está desesperado para mostrar
isso a ela.
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Ajoelho por cima dela, abaixo minha boca na dela, e nossas
línguas se encontram em um beijo rude, cru. Ela estende a mão
para a minha ereção, me acaricia através da minha calça e gemo
com o toque. Quero apertar a mão em torno de mim com força,
encontrar essa liberação...
“Eu quero que seja bom para você...” Eu suspiro.
“Isso já é bom”, ela diz, mordendo meu lábio inferior.
Eu balanço minha cabeça. “Eu posso fazer melhor do que
bom.” Abaixo minha boca para sua orelha. “Eu quero fazer você
gozar tanto que todo o vale vai te ouvir.”
Pego os pulsos dela e os prendo acima de sua cabeça.
Nossos olhos se encontram e nos encaramos, os dela refletindo o
desejo em mim. Beijo-a de novo, forte e áspero, e ela se contorce
debaixo de mim, seus quadris se esforçando para encontrar os
meus, empurrando contra as minhas mãos que a prendem.
Liberando os pulsos dela, arrasto minha língua e os dentes
para baixo, para a pele suave de sua garganta, entre os seios,
distribuindo beijos de boca aberta ao longo de seu estômago.
Quando chego em suas coxas, ela está choramingando, e levo um
momento para respirar, reservo o momento de um meio segundo,
antes de dobrar a cabeça para ela e saboreá-la.
Ela grita, seus quadris sobem, as costas se arqueiam. Giro
a minha língua sobre sua pele mais sensível, esquecendo a
necessidade furiosa que corre em minhas veias como um rastilho
de pólvora. Mergulho mais profundamente, mais forte, minha
boca a explorando até que ela grita meu nome.
Sim, imagino. Sim. Mais forte... Seu corpo fica tenso, com
as costas arqueadas. Sua mão vai para a minha cabeça e me
puxa mais perto dela enquanto goza na minha língua, a voz
preenchendo a tenda. Eu poderia ter ficado ali, mas, em seguida,
ela se empurra sobre os cotovelos, sem fôlego e exausta.
“Jonah”, ela engasga. “Venha aqui. Por favor…”
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Afasto minha boca dela, deixando-a trêmula e molhada, em
seguida, tiro minha camisa e jeans. As mãos trêmulas me ajudam
a colocar um preservativo — Senhor, eu alguma vez estive tão
duro na minha vida? — então rastejo sobre seu corpo.
Ela me segura pelo pescoço, me puxando e me beijando,
saboreando seu próprio sabor nos meus lábios, enquanto as
coxas estão bem abertas para mim.
“Eu quero você tanto”, digo.
Ela assente em silêncio, com os lábios apertados. Eles se
abrem para além de um grito quando empurro profundamente
dentro dela.
“Sim....”, ela grita. “Oh, Deus, sim...”
Sim, meu corpo concorda. Sim para como eu me encaixo
perfeitamente dentro de seu calor. Sim como é bom pra caralho
tê-la em torno de mim. Sim para quão doce sua boca é. Sim para
quão bom é entrar e sair de nossos corpos em direção ao limite. E
Deus, sim ela, essa mulher que caiu em minha vida como uma
bola de demolição, esmagando a minha rotina, trazendo-me de
volta à vida quando eu já tinha me resignado à morte. Sim para o
seu caos, sua emoção crua, sua necessidade desesperada de ser
tocada e amada. E sim, mais do que tudo, porra sim, que sou o
que ela quer, sim ao que ela desencadeia em toda a sua
imperfeição confusa em mim.
“Sim”, sussurro. Para tudo isso. Para nós. A ela. “Sim…”
Sinto a construção lenta nela, ouço seus gritos assumindo
um ritmo, cada um mais alto do que o último. Suas mãos
apertam meu pescoço, as pernas enroladas em torno da minha
cintura. Empurro profundamente, forte e lento, preso em meu
próprio ritmo, mas me segurando para ela. Ela está gozando de
novo, construindo outro orgasmo a partir do primeiro,
alimentando as chamas de volta. É necessário todas as minhas
forças para esperar, mas, finalmente, ela joga a cabeça para trás
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e levanta seus quadris para mim como uma oferenda. Seguro
Kacey com força e mergulho fundo e se nós não gozamos juntos
foi bem perto.
A chuva finalmente cede um pouco depois do meio-dia, e
Kacey e eu embalamos nossa barraca e os nossos pertences.
Nossos olhos se encontram enquanto trabalhamos. O ar é
espesso entre nós, cheio de amor pelo que fizemos. E meu
coração está crescendo completo com ela.
Mandamos uma mensagem para Theo, para que ele saiba
que estamos vivos e secos, em seguida, dirijo de volta para Las
Vegas. Mantenho minha mão direita sobre sua coxa e ela enrosca
a mão esquerda no meu cabelo. Nós conversamos e rimos como
de costume, mas entre isso temos grandes silêncios calorosos que
não precisam ser preenchidos com qualquer coisa.
Dificilmente fechamos a porta da frente do meu
apartamento, quando ela está em meus braços de novo e eu a
tenho contra a parede, beijando, minhas mãos rasgando suas
roupas. Ela ainda cheira a chuva e café quente da nossa parada
para o almoço. Eu queria tomar um banho, lavar a estrada de
mim. De nós. Somos um casal agora, e isso alimenta meu desejo,
quase tanto como o corpo de Kacey.
De alguma forma, entramos no banheiro e na ducha, quase
incapaz de ficar limpo, já que não conseguimos parar de tocar um
ao outro. Nós nos beijamos entre beijos roubados e um
ensaboando o outro. Tento colocá-la contra a parede, mas ela
escorrega por entre meus braços e cai de joelhos. Meus ombros
batem na parede. Olho fixamente para o teto cheio de vapor
quando sua boca deliciosa tira o que resta da minha sanidade.
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Fora do chuveiro, seco sua pele como fiz na tenda, em
seguida, a coloco em cima da bancada, para que eu possa abrir
as suas coxas e colocar minha boca sobre ela. Fico ali
saboreando-a até que ela está batendo nas coisas e as jogando
para baixo, seus gritos fazendo o armário de remédios tremer.
Quero ir mais fundo e mais forte para que ela possa gritar mais
alto. Preciso dela preenchendo minha boca e ouvidos, quero-a
tanto que nem consigo processar direito. Quero todos os
momentos que puder agarrar antes que eles escorram pelos
meus dedos.
Famintos, pedimos comida de um restaurante japonês e
conseguimos ficar vestidos tempo suficiente para comer.
“Agora vamos para a cama”, ela diz.
Deito sobre os travesseiros, e ela se arrasta para cima de
mim. Agarra a cabeceira sobre minha cabeça, o cabelo caindo
sobre mim como chuva clara, seus seios balançando enquanto
me cavalga, descendo forte enquanto levanto para encontrá-la. E
dessa vez, sem dúvida, gozamos juntos.
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CAPÍTULO 30
kacey
Acordo enrolada nele. Minha cabeça apoiada em seu
ombro, o braço jogado sobre o peito. Agitada, olho para cima para
ver que Jonah já está acordado. Ele quase não dorme, meu
Jonah, mas nunca parece cansado. Mesmo na noite passada, ele
sentiu falta de ar após o nosso amor, mas se recuperou
rapidamente.
Meu Jonah, penso. Ele é meu agora, e eu sou sua.
Percorro meu dedo ao longo de sua cicatriz. Na luz da
manhã, nu para mim, posso examiná-lo pela primeira vez. O
comprimento do seu coração em seu peito, um pouco acima das
linhas fracas de seu órgão de quinze centímetros que já foram
mais proeminentes antes dele ficar doente. Eu tinha visto uma
foto dele na América do Sul, sem camisa. Possivelmente no
mesmo lugar onde contraiu o vírus. Seus músculos já foram mais
definidos, mas ainda são.
Porque ele é forte, penso fortemente.
Jonah pega a mão que toca a cicatriz. “Não é muito bonito,
não é?”
“Não é ruim”, digo suavemente.
“Isso é lindo”, ele diz, virando a mão para inspecionar a
tatuagem que começa no meu pulso e vai até o interior do meu
braço, quase até ao cotovelo. É uma guitarra, toda a tinta em
branco, feita de claves e notas musicais. “Mostre-me as outras.
Me apresente-as.”
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Sento, para mostrar as flores subindo no meu ombro
direito, envolvidas em videiras espinhosas e botões que se
arrastam pelo meu braço. “Eu fiz essa em Seattle. A caveira
mexicana fiz em Portland, e essas pequenas estrelas”, eu lhe
mostro o punhado de pequenas estrelas negras no meu dedo
médio direito “foi em San Diego. Meu segundo ato de rebeldia
contra o meu pai. O primeiro foi tocar uma guitarra elétrica. O
segundo, esta tatuagem impossível de esconder, especialmente
quando se toca guitarra.”
ele.
Jonah ri levemente enquanto me aconchego de volta contra
“Que horas são?” Pergunto.
“Quase sete.” Ele aperta um beijo suave contra a minha
testa. “Eu tenho que ir trabalhar um pouco. Depois, essa noite é o
jantar de domingo na casa dos meus pais.”
“Ah sim. Lembro do primeiro domingo, quando Theo
distintamente me desconvidou para o jantar de família.”
Jonah faz um som que pode ter sido uma risada. “Bem,
estou convidando você agora. Você quer ir?”
Levanto sobre um cotovelo. Ele é tão bonito, seu cabelo
escuro contra a fronha branca. “Você quer que eu conheça seus
pais?”
Ele balança a cabeça e torce uma mecha do meu cabelo em
seus dedos. “Eu quero que eles te conheçam. Além disso, não
quero ficar longe de você por mais tempo do que o necessário.”
“Você realmente quer ter esta conversa agora?”
“Eu tenho praticado, você pode perceber?”
“Muito sutil.”
Ele silencia meu riso com beijos. Deus, a primeira coisa na
manhã e ele tem um gosto tão bom. Tão limpo. Paro com um
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pequeno suspiro, descanso o queixo no peito. “Eu adoraria
conhecer seus pais. Na verdade, retiro o que disse — estou
nervosa como o inferno para conhecer seus pais, mas não posso
esta noite. Eu tive que pegar o turno de outra moça no Caesar’s
para cobrir o fim de semana. Eu vou distribuir bebida de graça
vestindo uma toga de uma hora até as nove.”
“Próximo domingo?”
“No próximo domingo com certeza”, digo. “Isso vai me dar
uma semana para me preparar. E uma semana para o Theo se
acostumar com a ideia. Ainda não tenho certeza se ele gosta de
mim. Nenhum pouco.”
Jonah usa um sorriso engraçado. “Eu acho que ele gosta
muito de você.”
“Ele não mostra isso bem. E a pobre Holly — a maneira que
ele apenas terminou com ela no meio da floresta?”
“Sim, isso foi uma merda”, Jonah diz. “Um dos Pé Grande
poderia ter agarrado a garota e a levado para lhe fazer
companhia.”
“Oh, não é engraçado?” Inclino para beijá-lo novamente,
simplesmente porque posso. O beijo se aprofunda e começa a se
transformar em algo mais, então o alarme do relógio de Jonah
desperta na mesa de cabeceira.
“Os seus remédios”, digo, beijando ao redor de sua boca.
“Sim, meus remédios.”
Visto uma camisa comprida e calcinha, ele coloca calça de
pijama e uma camiseta branca. Vamos juntos para a cozinha, e
ele me apresenta seu esquema.
Ele me dá o rápido resumo de como fazer o seu shake de
proteína. Começa a engolir um comprimido após o outro,
enquanto misturo os pós e os suplementos. Logo, ele tem que se
segurar no balcão e respirar por causa de uma onda de náusea.
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“Não sei o que é pior”, ele diz, com a cabeça abaixada.
“Quando aparece ou que eu sei que está por vir.”
Dou-lhe um copo de água e esfrego suas costas.
Isso é real. Isto é o que significa estar com ele.
Um sussurro em minha mente me diz que não tenho
coragem de lidar com qualquer coisa ruim. Engulo, silencio o
pensamento. Eu quero estar com ele. Não apenas por um
momento romântico sob um céu estrelado, mas respirando ladoa-lado
com ele através das náuseas.
“Você tem outros efeitos colaterais?” Pergunto.
Ele assente, tomando um longo gole de água. “Tesão
insaciável.”
Solto uma risada. “Percebi. O que mais?”
“Os esteroides causam crescimento excessivo de pelos. Em
toda parte. Passo umas boas duas horas por dia raspando.”
Aperto os olhos para ele.
“Na verdade, estou feliz que você está aqui”, ele diz. “Minha
bunda tem alguns lugares que são difíceis de alcançar.”
“Espertinho.” Reviro os olhos e beijo a ponta do seu nariz.
“Vamos, estou falando sério. Ou tentando.”
“Tenho náuseas, às vezes meus tornozelos incham, mas
não muito.” Ele dá de ombros. “Eu não tenho muitos outros
efeitos colaterais. Tenho sorte a esse respeito.”
Balanço a cabeça enquanto ele se ocupa fazendo café para
mim. Sento no banco para tomar o café, mesmo em frente à
Jonah engasgando com o seu shake de proteína. Déjà vu. Menos
a grande ressaca.
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Jonah encontra meus olhos. Seu sorriso é quente, quase
orgulhoso. “Olhe para você, aqui”, ele diz suavemente. “Assim
como antes, mas tudo está diferente.”
“Diferente e melhor”, digo, e subo do outro lado do balcão
para beijá-lo.
“Espera...”, ele começa a dizer, mas meu beijo é mais
rápido.
Faço uma careta e sento no meu lugar.
“Eu tentei avisá-la”, ele ri.
“Humm, tem gosto de grama e galhos, uma pitada de leite
em pó, e leve sabor de bunda.” Limpo a boca com as costas da
minha mão, enquanto Jonah ri. “Vou aprender a fazer algo com o
gosto melhor do que... seja lá o que for isso.”
“Descubra isso e você será muito recompensado.”
“Na cama?”
“Na cama. Em cima do balcão. Piso, sofá...”
“Isso não é recompensa, é a nossa vida agora”, digo, saindo
do meu banquinho para ir para perto dele e beijá-lo novamente.
Não dou a mínima para o gosto ruim. Sempre que a vontade de
beijá-lo surgir, vou satisfazer e beijá-lo. Não há mais vidas pelo
caminho. Temos que ir a toda velocidade, assim como os
jogadores de cartas fazem. Vou apostar em vez de esperar.
Sempre.
Vestimos roupas e Jonah me leva de volta para o meu
apartamento. Saio de seu carro e dou a volta para o lado do
motorista. “Tenha um ótimo dia, me ligue mais tarde.”
“Eu ligo”, ele diz.
Beijo-o profundamente, minha mão desliza para a parte de
trás do seu pescoço enquanto a sua segura meu rosto.
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“Já sinto sua falta”, digo.
Ele passa o polegar pela minha mandíbula e diz
suavemente. “Falo com você em breve, Kace.”
Observo-o dirigir, e é como se algum relógio invisível
começasse a funcionar na minha cabeça. Contando os segundos
e, ao mesmo tempo, adicionando para formar minutos, e,
eventualmente, as horas até que eu possa vê-lo novamente.
“Momentos”, murmuro para mim mesmo enquanto o calor
de Nevada me atinge. “Teremos milhares de momentos.”
Às onze mais ou menos, estou assistindo um filme na TV
enquanto enxugo meu cabelo depois banho quando alguém bate
na porta, com força suficiente para fazê-la sacudir. Coloco a TV
no mudo e pego meu telefone, pronta para apertar o botão de
emergência.
“Quem é?”
“Theo.”
Bem, merda. Jogo o telefone para baixo e abro as
fechaduras. Theo aparece na porta, com os braços tatuados,
musculosos cruzados sobre o peito largo.
Cruzo os braços também. “Da próxima vez traga um aríete. 4
É mais eficaz.”
“Posso entrar ou não?”
“Está convidado.”
4 Aríete é uma arma antiga para derrubar portas, edificações etc..
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Ele passa por mim determinado, mas uma vez que está lá
dentro, parece inseguro. Ele enfia as mãos no bolso da frente da
calça jeans.
Assim como Jonah faz, penso.
Theo olha para a minha TV silenciada onde Jon Cryer está
dançando como uma aberração em uma loja de discos.
“É Pretty in Pink”, digo ao Theo. “Você já viu?”
Ele bufa negando.
“Filme clássico! Todo mundo fica tudo puto que Andie
termina com Blaine no final, em vez de Ducky. Mas,
honestamente, se o filme tivesse passado por mais um ano,
Blaine teria quebrado seu coração. E Ducky estaria lá para ela,
assim como sempre esteve. Não estou dizendo que Blaine é ruim
para ela. De modo nenhum. Eles fazem o outro feliz, mas Ducky?
Ducky estará com ela por um longo tempo.”
Assisto mais alguns segundos antes de perceber
suavemente que Theo está olhando para mim como se eu fosse
uma forma de vida alienígena.
“Desculpe”, digo. “Eu adoro filmes dos anos oitenta. Eles
sustentam a filosofia de vida para mim.” Desligo a TV. “Então.
Posso pegar algo para você beber?”
“Não.”
Ele tem um brilho assustador, mas não me intimido.
Mesmo agora, quando seu olhar endurece para algo perto de
raiva.
“Ok, então”, digo. “Você quer me dizer o propósito desta
visita? Tenho certeza que você não veio aqui para ver Pretty in
Pink 101.”
“Você e Jonah”, ele diz. “Vocês estão dormindo juntos.”
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“Pensei que isso tivesse sido esclarecido na volta do Grand
Basin.”
Theo começa a andar na minha pequena sala de estar, sua
mão esfregando o cabelo. “Ouça, há alguma merda que você
precisa saber se você vai ficar... com ele. Merda, ele não irá te
dizer porque é muito teimoso.”
“Como?”
“Seu sistema imunológico está ferrado, ok? Por causa das
drogas que ele tem que tomar. Se ele pega um resfriado ou uma
infecção, não é como você ou eu quando ficamos doentes. Poderia
matá-lo.”
“Estou ciente”, digo. “Ele parece saudável agora...”
“Sim, agora. Quatro meses atrás, ele pegou um resfriado de
algum lugar, e se transformou em pneumonia. Ele ficou no
hospital por dois dias.”
Tremo involuntariamente. “Oh. Tudo bem.”
“Então você tem que ter cuidado. Se você achar está
ficando doente, você tem que ficar longe dele. Você não pode...
beijá-lo ou dormir na mesma cama. Prometa.”
Balanço a cabeça. “Claro. Jonah falou comigo sobre isso e
eu entendo. Tomarei cuidado.”
“E quanto a sexo...” O rosto de Theo fica vermelho e ele
olha para qualquer lugar da sala, menos em mim. “Você tem que
ter calma sobre o sexo.”
“Tudo bem, esse tipo de assunto entra na categoria de não
é da sua conta.”
“Não se a vida dele está em jogo”, Theo grita. “Tudo que ele
faz é da minha conta.”
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“Eu acho que ele pode lidar com os assuntos do quarto, seu
mandão”, digo, tentando aliviar a energia entre nós. “Ele sabe o
que pode. Sem trocadilhos.”
O rosto de Theo fica ainda mais vermelho. “Ele pode, ou ele
não pode”, ele diz. “Como eu disse, Jonah é um bastardo
teimoso.”
E você é a epítome da graça e tato, Theodore. Mantenho a
frase para mim mesma. “Parece que ele está fazendo um trabalho
muito bom em ter cuidado”, digo. “E também vou. Eu vou, Theo,
prometo.”
Ele balança a cabeça, seu olhar duro e implacável. Seguro
seu olhar, deixando que veja que não estou brincando. Apesar de
seu jeito áspero, gosto do Theo. Ele é família de Jonah e quero
que goste de mim também, especialmente agora que Jonah e eu
estamos juntos.
“Eu prometo”, digo novamente.
Suas mãos vão para trás, nos bolsos. “Tudo certo.”
“Tem outra coisa te incomodando?”
“Eu quero saber quais são suas intenções.”
Pisco. “Minhas intenções? Se vou fazer dele um homem
honesto?”
Eu rio e dou-lhe um empurrão brincalhão, mas ele se
afasta. “Você vai fugir?”
Eu congelo, meu riso engasgando na garganta. “Não, eu
não vou”, digo suavemente. “Eu nunca…”
“Essa é uma coisa importante”, Theo diz. “Esse é o resto de
sua vida. Você entende isso? O resto de sua vida. Se você o
machucar...”
Inclino meu quadril na parte traseira do sofá como suporte.
“Feri-lo é a última coisa que quero.”
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Nos olhamos através do espaço da minha pequena sala de
estar. Lentamente, o brilho de aço nos olhos de Theo se suaviza.
Suas mãos relaxam, procura algo para fazer, e então ele cruza os
braços sobre o peito. “Ok. E o que acontece quando ficar ruim? O
que você vai fazer?”
“Eu não estou pensando assim”, digo, e sinto minha
própria raiva crescendo. “E quanto a esperança? E quanto a não
estar assim tão certo de que ele não tem uma chance?”
“Ele tem uma chance. Ele tem…”
Os braços de Theo caem para os lados, e seus ombros caem
um pouco. Seu rosto parece rasgar ao meio, revelando a dor ali
embaixo. Lembro de Jonah me dizendo que Theo tem estado ao
seu lado a cada minuto de sua doença. Ele estava lá quando
Audrey foi embora. Ele estava sentado ao lado de Jonah, quando
os resultados da última biópsia foram entregues. Ele teve um
assento na primeira fila para todas as coisas terríveis na vida de
Jonah. Eu teria que estar cega para não ver que ele assumiu a
responsabilidade por seu irmão da única maneira que sabia.
“Você é um ótimo irmão para ele”, digo suavemente. “Você
não precisa me dizer, mas vou. Você é.” Vou para perto dele,
descanso minha mão em seu braço. Seu ombro vai para cima e
para baixo com desdém, mas ele não hesita ao meu toque.
Eu hesito. “Como você está?”
Ele faz uma cara. “O quê?”
“Eu acho que... talvez não te perguntem ultimamente...
como você está? Especialmente recentemente. Então, estou
perguntando. Como vai você?”
Ele olha para mim, as sobrancelhas grossas franzindo,
como se eu estivesse falando uma língua estrangeira. Sob a
minha mão, sua pele se arrepia, os cabelos finos de seu
antebraço se levantam. Nós dois notamos ao mesmo tempo, e ele
se afasta.
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“Estou bem”, ele diz, caminhando em direção à porta. “É
dele que precisamos cuidar.” A porta bate quando sai.
“Ok”, digo para o espaço vazio. “Boa conversa.”
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CAPÍTULO 31
kacey
No dia seguinte, uma segunda-feira, chego à Hot shop
prontamente ao meio-dia, com dois sacos da SkinnyFATS na
mão: saladas de frango com rúcula e alcaparras para mim e
Jonah, uma salada de frango à milanesa com búfala para Tania.
Tenho que fazer malabarismos com o saco e com uma bandeja de
três smoothies quando arrasto a porta de correr aberta. A porta
grita e protesta, e por algum milagre consigo não derramar nada.
Tania e Jonah estão trabalhando em extremidades opostas
de um maçarico. Os olhos de Jonah se estreitam em
concentração enquanto ele rola e molda.
“Ar”, ele diz.
Atrás dele, Tania sopra no tubo. O vidro incha.
“Logo ali”, Jonah diz, olhando para a peça. “Perfeito.”
Quando é seguro interromper, me aproximo. “Ei, estão com
fome?”
“Famintos!” Tania me envolve em um abraço que cheira a
suor e papel queimado. “Você está nos estragando com essas
visitas na hora do almoço. Não que eu esteja reclamando...”
Eu a abraço de volta, pensando, tenho cinco amigos aqui
agora. Nunca tinha ficado em um lugar tempo suficiente para ter
tantos.
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Olho por cima do ombro de Tania para Jonah. Ele sorri
para si mesmo, como se estivesse satisfeito, e desliga o maçarico
do teto. Ele se junta a nós e me beija dizendo olá.
“SkinnyFATS”, Tania diz, cutucando os sacos. “Eu amo
essa lanchonete.” Sua cabeça se move. “Espere, o que
aconteceu?”
“Nada”, Jonah diz, dando-me um segundo beijo.
“Aconteceu de novo.” Tania olha dele para mim e para trás.
“Quando isto aconteceu?”
Eu rio. “No final de semana.”
“Duas vezes no domingo”, Jonah acrescenta.
“Oh meu Deus.” Reviro os olhos para ele.
“Puta merda!” Tania me abraça de novo, então se junta a
Jonah. “Estou tão feliz por vocês. Isso é incrível.”
“Não, é apenas o almoço”, Jonah diz, remexendo no saco e
achando uma vitamina de laranja. Ele levanta uma sobrancelha
para mim. “Eles estavam sem folhagem?”
“Fruta fresca, espertinho” eu provoco.
Seu celular toca. Ele o tira do bolso de trás e olha para o
número. “É Eme”, ele diz. “Oi, é Jonah...” Ele sai da loja com seu
chiado constante de fornos queimando e produzindo ar para
atender a chamada.
“Quem é Eme?” Pergunto para Tania, enquanto arrumamos
o almoço na mesa e cadeiras dobráveis, bem longe do fogo e
bandejas de vidro soltas.
“Eme Takamura”, Tania diz, dando uma mordida em sua
salada. “Ela é a curadora da galeria que vai exibir a obra de
Jonah no Wynn.”
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Meus olhos se arregalam. “Sua obra no Wynn? Isso não é
um hotel importante?”
“Super famoso”, Tania diz. “Jonah não lhe contou?” Ela
inala quando balanço a cabeça. “Figura. Ele é modesto a ponto de
ser irritante. De qualquer forma, Eme ficou sabendo dele através
da Carnegie e depois de ver alguns de seus trabalhos, arranjou
tudo para abrigar seu projeto na Wynn Galleria.”
“Isso é incrível.”
“O que é incrível é você e Jonah. Estou tão feliz por vocês,
não posso aguentar.”
“Você parece surpresa”, digo.
“Você está brincando?” Ela diz em torno de uma boca cheia
de verduras. “Estou chocada. Sinceramente, pensei...” Ela para
enquanto limpa a boca com um guardanapo.
“Você pensou o quê?”
Tania olha para mim, então para a porta onde se pode ver
Jonah andando e falando. “O Jonah eu sei que sempre foi muito
sério. Com a intenção com seu trabalho, sabe? Desde que você
está de volta na cidade ele tem sido diferente. Ele sorri mais. Ri
mais. Ele sempre foi um espertalhão, mas agora é... um
espertalhão mais gentil. Ele ainda trabalha muito duro — e eu
também — mas é como se algum tipo de peso ou sombra tivesse
ido embora. E agora, descobrir que você dois estão juntos...” Ela
balança a cabeça. “Não é todos os dias que ele permite a entrada
de alguém em sua vida. Você é a primeira que eu conheço. É uma
grande coisa. Talvez agora ele possa repensar e deixar todo
mundo de volta.”
“Pelo menos para a sua obra”, digo. “Eu quero que todos
vejam isso.”
“Eu também. Ele é tão talentoso. E realmente um bom
rapaz. Altruísta. Talvez muito abnegado, tentando proteger a
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todos com quem se preocupa, tanto que negligencia a sua própria
felicidade.”
A porta abre e Jonah volta, com as mãos inquietas com o
seu celular. “Eme queria um relatório de progresso. Eu disse a ela
mais duas semanas e podemos começar com a caixas de
mudança para o espaço.”
“Duas semanas é o suficiente”, Tania diz.
Mas observando seu telefone, Jonah parece pálido.
“Algo errado?” Pergunto.
“Eme disse que enviou convites para a abertura da
exposição”, ele diz, com a voz tensa. “Grandes nomes, um monte
de seus contatos foram convidados. Ela enviou um para o Studio
Chihuly.”
Os dedos de Tania sobem para os lábios. “E?”
O olhar de Jonah percorre entre nós. “Ela recebeu uma
resposta dizendo que Dale estaria muito ocupado no início de
outubro, mas que vai tentar o seu melhor para vir.” Jonah esfrega
a mão pelo cabelo. “Eme enviou um convite para o estúdio. Eu
pensei que talvez eles quisessem enviar um representante,
mandar alguém.”
“Mas Dale pode vir?” Tania se levanta. “Pessoalmente?”
“Puta merda”, digo.
“Oh meu deus, puta merda.” Tania joga os braços ao redor
de Jonah, que parece atordoado por cima do ombro. “Santo...” Ela
sai, pega o seu garfo e colocando algumas mordidas na boca.
“Coma. Se apresse. Vamos voltar ao trabalho. Há um monte de
coisas com a água que ainda quero terminar.”
“E os raios de sol”, Jonah diz.
“E puta merda, Dale Chihuly. Em pessoa.” Uma última
mordida e Tania se apressa para a sala, deixando Jonah e eu
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sozinhos. Levanto e coloco os braços em volta do seu pescoço, o
abraçando com força. Deixo minhas mãos entrelaçadas em seu
cabelo, e fecho os olhos com ele.
“Olhe para o meu namorado talentoso.”
“Namorado, hein?” Ele passa os braços em volta da minha
cintura. “Eu...” Ele desvia o olhar com uma risada curta. “Eu ia
fazer uma piada, mas gosto muito de namorado.”
“Dale Chihuly”, digo.
“Eu sei. É surreal. Mas não é certeza. Ele está ocupado.
Talvez não consiga...”
“Ou talvez ele venha.” Olho para baixo, passo a mão sobre o
peito de Jonah. “O que posso fazer para ajudar? Talvez entrar em
contato com alguns de seus velhos amigos da UNLV ou
Carnegie?”
Jonah fica tenso. “Eu não sei. Veremos. Tenho muito
trabalho a fazer no momento. “
“Farei isso.” Eu o puxo para perto. “Você vai fazer uma
exibição no Wynn, pelo amor de Deus. É um grande negócio. Você
não acha que seria fantástico ter todos os seus velhos amigos lá?”
“Eu não falo com eles há um ano”, Jonah diz. “A primeira
coisa que ouvem de mim é um convite para uma mostra da
galeria? Eles vão pensar que sou um idiota pretensioso.”
“Não se você me deixar lidar com isso.”
Jonah se inclina para trás, deslizando as mãos pelos meus
braços para tirar as minhas mãos dele. “Eu não posso ser
distraído com reuniões agora, Kace. O fato de que Dale Chihuly
pode vir e olhar está embaralhando o meu cérebro o suficiente.
Eu agradeço, mas tenho muito que fazer. Ok?”
“Ok”, digo. “Só me prometa que vai pensar sobre isso.”
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“Eu vou.” Ele me responde e me beija longo e forte.
“Namorado”, ele murmura.
“Você sabe o que as garotas fazem para seus namorados?”
“Isso é uma pegadinha?”
“Elas cuidam deles. Você tomou conta de mim desde o dia
em que nos conhecemos. Deixe-me fazer isso também.”
Ele suspira com um pequeno sorriso. “Veremos.”
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CAPÍTULO 32
kacey
O resto da semana passa voando em um borrão. Jonah
trabalhou duro na Hot Shop. Servi bebidas no Caesar’s à noite e
comecei a escrever uma meia dúzia de canções durante o dia,
nenhum das quais me tocou. O convite feito a Chihuly deixou
Jonah uma pilha de nervos. A aproximação do jantar de domingo
com seus pais tem o mesmo efeito em mim.
Faço compras em um brechó local, procurando algo mais
claro do que minhas habituais roupas. Algo que cubra minhas
tatuagens e não seja feito de couro ou vinil. Passando pelas
prateleiras, determinada a causar uma boa impressão. Tudo o
que encontro são ecos de meu pai, dizendo-me a decepção que
sou. Todos os velhos demônios me seguem até os vestiários
enquanto tento encontrar algo. Eu me sinto como uma fraude em
tudo. Volto para casa sem nada.
“Ou eles gostam de mim ou não”, murmuro para mim
mesma de volta em casa, vestida com minhas próprias roupas e
aplico o meu delineador preto olho de gato como de costume e
batom vermelho. Tomo um Coca Diet, desejando que tivesse um
gole de rum nele.
Amarro meu cabelo em uma trança lateral e coloco um
vestido preto sem mangas. Olho para o meio da coxa, e encontro
as minhas botas pretas altas que ficam um pouco mais para cima
do meu joelho.
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Jonah chega em minha casa vestindo calça jeans e uma
camisa escura enrolada no braço, com o cabelo ainda úmido do
chuveiro.
“Você está maravilhoso”, digo, observo um longo colar com
um pingente de prata de aspecto celta. “Como sempre.”
“Essa fala é minha”, ele diz, com seus olhos me analisando
de cima e baixo. “E você... tão fodidamente bonita.”
Minhas bochechas queimam enquanto aliso as dobras
onduladas do vestido. “Pensei em usar um vestido normal. Mas
pareceu errado. Quer dizer, esta é quem eu sou. Com tatuagens e
o cabelo e a maquiagem... não uma performance de estrela de
rock, sou eu.”
Jonah se aproxima para me levar em seus braços. Sua mão
corre pelo meu braço tatuado. “Gosto disso”, ele diz. “Eu gosto de
você.”
“Só quero que eles gostem de mim. Temo que pode não ser
o que eles estão esperando.”
“Ouça.” Ele me segura mais apertado. “Meus pais não
esperam ninguém. O simples fato de que estou levando alguém
para o jantar é algo em seu favor. Confie em mim, minha mãe vai
pirar em você.”
Olho para ele. “E seu pai?”
Jonah gentilmente tira uma mecha de cabelo do meu olho.
“Ele vai te amar.”
Os Fletchers vivem em uma modesta casa de dois andares,
em um bairro bonito, suburbano de Belvedere. Nós dirigimos
passando por fileira de casas, todas separadas por gramados e
cercas de ferro forjado. A caminhonete de Theo já está
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estacionada junto ao meio-fio em frente da casa Fletcher. Eu não
vi ou falei com ele desde a sua visita inesperada na semana
passada. Outro nó torce meu íntimo quando saio do carro.
São dezoito e quinze numa tarde de julho, o calor abrandou
a uns suportáveis trinta e dois graus. Las Vegas tem sido a minha
casa oficial por três semanas e eu já me acostumei com o clima.
Agarro o braço de Jonah quando ele me leva até a curta
distância para a porta da frente. “Merda, eu não trouxe nada para
sua mãe”, digo. “Podemos voltar? Eu vi uma loja de flores na...”
A porta da frente se abre e uma baixinha, senhora parruda
sorri para nós do limiar. Ela está em meados dos seus cinquenta
anos, com cabelos castanhos na altura do queixo, vestida com
calça e uma blusa de manga curta.
“Pensei ter ouvido vozes”, ela diz.
“Oi, mãe”, Jonah diz.
Ela o abraça apertado e segura seu rosto por um momento,
o observando. “Você está maravilhoso”, ela diz. Ela se vira para
mim. “Ele não está maravilhoso? E você deve ser Kacey.”
Ela se aproxima para me abraçar. “Estou muito feliz em
conhecê-la.”
O abraço dela cheira como pão quente e acalma os meus
nervos. “Estou feliz em conhecê-la também, Sra. Fletcher” digo,
lágrimas inexplicáveis enchem meus olhos. Não consigo me
lembrar da última vez que minha própria mãe me abraçou.
“Por favor, por favor, me chame de Beverly.” Ela começa a
voltar para a casa, nos chamando para dentro. “Theo já está aqui,
e a lasanha está praticamente pronta. Você gosta de lasanha,
Kacey?”
“Eu amo”, digo, deslizando minha mão em Jonah.
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“Esqueci de mencionar que ela é uma abraçadora?” Ele
sussurra para mim.
Balanço a cabeça. “Eu amo sua mãe.”
Beverly nos leva através da sala de estar. É decorada com
simplicidade, um pouco desordenada, com belas peças de vidro
de Jonah exibidas em mesas laterais, estantes e janelas. Uma
galeria de fotos em uma parede mostra a arte do Theo — ele é
talentoso desde criança — e Theo e Jonah em todas as fases da
vida: Beisebol infantil, retratos escolares, fotos de formatura.
fotos da pré-escola até a adolescência, um sorrindo
brilhantemente, o outro fazendo uma careta ou carrancudo.
“Você foi adorável toda a sua vida”, digo, fazendo uma
pausa para examinar uma foto do ensino médio, com os dentes
de Jonah obscurecidos por aparelho.
“Vamos seguir em frente, nada para se ver aqui”, ele diz,
gentilmente me arrastando para a cozinha.
Theo está sentado à ilha com bancada de granito marrom
que combina com a decoração. Os armários são de um tom
branco caloroso, desgastado. Como a sala de estar, a cozinha é
simples e desordenada. O coração da casa, repleto de aromas,
cheiros reconfortantes e boa comida. Meu nervosismo se esvai, e
envolvo meus braços por trás de Theo e beijo sua bochecha.
“Bom te ver, Teddy.” Ele cheira bem — limpo, uma colônia
sobre o cheiro suave de seu sabonete.
Ele tolera meu abraço e o beijo, e se debruça sobre sua
garrafa de cerveja.
Beverly fecha a porta do forno e me lança um sorriso.
“Theodore tem o nome do bisavô de meu marido, que todos
chamavam de Teddy. Mas Theo se recusa a aceitar. Não é
querido?”
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A mandíbula de Theo se aperta. “Não que alguém me
escute, porra.”
“Vocabulário”, diz uma voz na porta da cozinha. Sr.
Fletcher se junta a nós na ilha. Ele é um homem alto, magro, com
o cabelo escuro grisalhos nas laterais. Ele estende a mão para
mim como se eu fosse um potencial parceiro de negócios. “Henry
Fletcher”, ele diz, dando um aperto firme. “Um prazer, moça.”
Jonah me lança um olhar divertido, mas assinto
educadamente. “Obrigada, senhor. Prazer em conhecê-lo.”
“Não há senhores aqui. Você pode me chamar de Henry ou
Henry.” Ele pisca. “O que você preferir.”
“Alguma coisa para beber, querida?” Beverly pergunta,
abrindo a geladeira. “Eu tenho cerveja, refrigerante, vinho.
Comprei O'Douls para você, Jonah.”
“Eu vou querer um desse, também” digo.
Beverly entrega as garrafas verdes para nós. “A noite está
tão linda, pensei em comermos no quintal. Você se importa,
Kacey? Podemos ficar em casa, se você preferir.” O nervosismo
presente em suas palavras. E suas mãos nunca param de se
mover. Arrumando, organizando, fazendo.
“Ao ar livre é perfeito”, digo.
“Maravilhoso”, ela diz. “Vou acender as lanternas que
Jonah fez no seu primeiro ano no Carnegie. Você nunca viu nada
tão bonito em sua vida.”
“Elas são mesmo”, Henry diz.
“Acredito nisso”, digo. “O trabalho de Jonah é
surpreendente.”
Jonah acena com a mão. “Já chega.”
“Maravilhoso, sim”, Beverly diz, seus olhos descansando em
seu filho.
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“E um amplo retorno do investimento da faculdade”, Henry
acrescenta.
“Pai”, Jonah diz calmamente.
Os ombros musculosos de Theo se curvam e ele pega com
calma, deliberadamente a sua garrafa de cerveja.
“Estou apenas afirmando um fato”, Henry continua. “As
artes não são um setor fácil de ganhar a vida. A pessoa tem que
direcionar seus talentos de forma adequada.”
“E não desperdiça-lo trabalhando em um estúdio de
tatuagem”, Theo diz.
Como um galho preso em uma engrenagem, a leveza do
ambiente chega a um ponto insuportável. Henry e Theo trocam
longos olhares duros.
“Quem quer me ajudar a pôr a mesa?” Beverly pergunta,
sua voz assumindo um tom estridente. Ela abre em um armário e
levanta uma pilha de pratos.
“Eu.” Theo toma os pratos das suas mãos e sai em direção
ao pátio.
“Eu vou ajudar também”, digo, pegando guardanapos,
talheres e os sigo.
Sra. Fletcher agradece, e a noite está rolando novamente.
“Maravilhoso”!
A mesa de jantar ao ar livre fica debaixo de uma pérgola,
aglomerados de globos de vidro pendurados nela como frutas
elegantes. Ali nós comemos lasanha, pão e uma salada verde. Boa
e verdadeira comida caseira. O tipo de refeição que minha mãe
fazia quando eu era criança. Mas a hora do jantar em minha casa
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era um evento soturno, frio onde eu estava sempre falando muito
alto, mesmo quando não estava falando. A presença dura e fria do
meu pai, a presença opressiva transformava uma boa comida em
pó na minha boca.
A mesa dos Fletchers é cheia de risos, falando sem parar e
implicâncias normais. Um pouco de tensão silenciosa permanece
entre Theo e Henry, mas Beverly neutraliza com histórias da
juventude de seus filhos, que me fazem engasgar com o meu pão.
“Eu juro”, ela diz, servindo-se de um copo de cabernet. Seu
terceiro, reparo. “Lake Tahoe tem uma enorme praia. Muita areia
para todos. Milhões de grãos, e estes dois brigaram inúmeras
vezes.”
Eu cutuco Jonah à minha direita. “Você brigou pela areia
na praia?”
“Era apenas uma criança”, Jonah diz. “Areia é um
brinquedo educacional apropriado e fundamental para quatro e
seis anos de idade.” Ele olha para Theo com um sorriso malicioso.
“Assim como borboletas imaginárias.”
Theo aponta o garfo na direção de Jonah. “Nem comece.”
Jonah ignora. “Uma vez, Theo ficou chateado comigo
porque pegou uma borboleta imaginária e eu a deixei ir embora.”
Theo o alcança através da mesa para cutucar seu irmão
com o garfo. “Cale. A. Boca.”
“Eu amo essa história”, Beverly suspira.
“Pelo menos um de nós”, Theo diz.
Jonah limpa o garfo, e apoia os cotovelos sobre a mesa,
encarando seu irmão com carinho. “Theo levantou as mãos e me
disse que tinha capturado uma borboleta. Eu pedi para ver, mas
ele estava com medo que ela fosse voar.”
“Quando foi isso?” Pergunto.
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“Na semana passada”, Jonah diz.
“Tente vinte anos atrás, idiota”, Theo murmura.
“O vocabulário, por favor”, Henry diz.
A voz de Jonah aumenta um pouco, a provocação vazando
por seus poros. “Finalmente, ele disse que eu podia segurá-la.
Colocou as mãos na minha, durante todo o tempo descrevendo as
asas brilhantes da borboleta azul, bordadas em preto. Abrindo e
fechando, como se estivesse respirando. Ele mesmo me contou
como suas pernas pareciam cabelos pretos contra a minha pele.
Lembra, Theo?”
Olho para o alto homem duro, tatuado sentado na minha
frente, olhando com se pudesse disparar canivetes para o irmão.
No entanto, posso facilmente ver o menino doce que tinha sido,
descrevendo esta borboleta inexistente, mas preciosa.
“Mas eu não fui cuidadoso o suficiente”, Jonah diz. “Eu
abri minhas mãos muito e Theo disse que a borboleta voou para
longe. Ele chorou e chorou.”
“Você está satisfeito, porra?” Theo diz.
“Vocabulário”, Henry murmura.
Toda a provocação desapareceu do rosto de Jonah agora.
“Eu nunca pedi desculpas por deixá-la escapar”, ele diz. “Eu
tentei dar-lhe outra — uma monarca laranja e preta, mas era a
borboleta azul que ele queria. E ela se foi para sempre. Eu sinto
muito por isso, mano.”
Theo se recosta na cadeira. “Você está falando sério?”
Jonah dá de ombros. “Só esclarecendo as coisas.”
Os irmãos se olham em silêncio. Um silêncio cheio de amor,
apesar do tom duro de Theo. Cheio de uma memória e milhares
como essa.
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“Então”, Beverly junta as mãos. “Quem tem alguma coisa
boa para compartilhar?” Ela se vira para mim. “Eu acredito que
todo mundo tem uma boa notícia em relação à semana anterior,
mesmo que seja só um pouco.”
“Jonah tem uma notícia surpreendente.” Coloco minha mão
sobre a dele e dou um aperto. “Certo?”
Sua mãe se inclina. “O que é, querido?”
Jonah brinca com o garfo, seu olhar piscando para Theo e,
em seguida, para baixo para o seu prato. “Então, Eme Takamura
— a curadora da galeria? Ela disse que Dale Chihuly vai tentar
vir assistir à exposição da minha obra.”
A mão de Beverly voa para a garganta. “Sério? Querido, isso
é uma notícia maravilhosa.”
“Notável”, Henry diz. “Muito bem, filho.”
Jonah se ajeita na cadeira. “Bem, espere, ela não disse que
ele vai estar lá. Só que ia tentar.”
“Ainda assim, o fato dele mesmo considerar isso”, Henry
diz. “Isso significa que ele reconhece seu trabalho.”
“Eu acho”, Jonah diz.
“É impressionante para caralho”, Theo diz. “Ele deveria
aparecer. Seria um idiota se não viesse.”
Pela primeira vez, seu vocabulário não é contestado. Um
outro olhar carregado passa entre os irmãos e me vejo sorrindo,
como se houvesse me tornado uma tradutora das suas trocas não
ditas.
“Theo tem uma boa notícia”, Jonah diz. “Um de seus
clientes vai ser fotografado pela revista Inked. Ele vai ser
creditado em um dos projetos.”
O sorriso sincero cintila sobre os lábios de Theo.
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“Isso é maravilhoso”, Beverly diz.
“Uma poluição do corpo, é o que é”, Henry diz.
Jonah abaixa sua garrafa vazia com força. “Jesus, pai.”
Eu me inclino na cadeira, lutando contra o desejo de cobrir
as tatuagens em meus braços nus.
“O quê?” Henry diz. “Ninguém maior fã dos talentos de
meus filhos. Theo é um artista excepcional, mas confunde a
minha mente ao pensar em passar a vida colocando tinta em
outras pessoas.”
“Porque é arte”, Theo diz. “É a arte permanente que as
pessoas carregam consigo. E quando eu tiver meu próprio
estúdio, serei um empresário legítimo.”
“Você estará assumindo um risco”, Henry responde.
“Será que podemos não discutir isso agora?” Jonah diz.
Enquanto os homens Fletcher encaram um ao outro, penso
que Henry está longe de ser tão intimidador como meu pai, mas
sua desaprovação com Theo deixa o mesmo gosto ruim na minha
boca.
“Nem todo cara que sabe desenhar pode ser um tatuador”,
digo no silêncio. “É uma habilidade especial, ser capaz de tomar a
visão de uma pessoa e transformá-lo em uma realidade. E você
está absolutamente certo que é um risco. O artista tem que
colocar a tinta perfeita na primeira vez, porque não há uma
segunda chance. Jonah pode reciclar o vidro e recomeçar. Theo
só tem uma única chance. Sem consertos.”
Sinto todos os olhos em mim, mas só olho para Theo, que
olha de volta dessa maneira que ele tem, como se não pudesse
acreditar que sou real.
“Obviamente, eu sou suspeita”, digo, passando a mão pelo
meu braço. “Mas não vejo isso como uma poluição no meu corpo.
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É expressão. Cada uma das minhas tatuagens significa alguma
coisa. E começar a tatuagem é tanto uma parte dela como tendo
uma. Por causa da confiança e colaboração com o artista.” O
silêncio se aprofunda. Dou de ombros e tomo um gole da minha
falsa cerveja. “Apenas o que eu acho.”
Henry se mexe na cadeira. “Acho que essa é uma maneira
de olhar para isso.”
Todo mundo parece exalar de uma só vez. A mão de Jonah
encontra a minha debaixo da mesa e ele me dá um aperto.
Beverly se levanta, recolhendo os pratos. “Quem quer
sobremesa?”
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CAPÍTULO 33
kacey
São quase vinte e três horas quando nos despedimos.
Beverly me puxa para um longo abraço. “Estou tão feliz de ter te
conhecido. Volte no próximo domingo. Todos os domingos. Você
pode?”
Eu balanço a cabeça, me derretendo em seu abraço.
“Gostaria muito.”
Ela me solta, e se vira para Jonah. “Vejo você na próxima
semana, querido?”
“É claro”, ele diz.
Ele beija a bochecha dela e ela bate no ombro dele. Ela
ainda o segura então, seu olhar assumidamente memorizando
cada detalhe de seu rosto.
Eu desvio o olhar, meus olhos ardendo. Sinto uma
mudança na minha alma presenciando este momento entre uma
mãe e seu filho. Durante todo o caminho de carro, até a minha
casa eu não consigo pensar em nada para dizer. Palavras não
descrevem. Elas podem até mesmo arruinar...
“O que você disse sobre o Theo foi incrível”, Jonah diz.
“É verdade.”
“Mas isso é novo. Meu pai é muito duro com T e ele não dá
ouvidos ao que eu digo quando tento defendê-lo. Ele precisava de
uma nova perspectiva.”
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“Eu estava preocupada que tivesse ultrapassado algum
limite.”
“De modo nenhum.”
“Vi semelhanças de meu pai em seu pai. Não me interprete
mal, o seu é nada parecido com o meu. E só eu sei como Theo se
sente.”
“Nunca ser bom o suficiente.”
“Para dizer o mínimo. Será que ele realmente deseja abrir
sua própria loja?”
“Ele quer, mas a menos que receba uma grande quantia de
dinheiro para uma entrada, ele precisa de um fiador para um
empréstimo. Isso é um enorme ponto de discórdia entre ele e
papai. Meus pais tiveram que tirar uma segunda hipoteca para
ajudar a cobrir as minhas contas de hospital porque meu seguro
não foi tão longe.”
“Oh.”
“Theo nunca reclamaria sobre isso, é claro. É apenas que
nossos pais sempre foram cem por cento favoráveis comigo, e
menos com ele. O equilíbrio está totalmente distorcido.”
Jonah dirige em direção ao meu apartamento e estaciona.
“Deve ser difícil para ele”, digo.
Jonah roça os nós dos dedos sobre a minha bochecha. “Eu
acho que você o ganhou um pouco esta noite. E os meus pais
amaram você. Eu sabia.”
“Foi uma boa noite”, digo. Solto o cinto de segurança e
subo em seu colo, abraçando-o. “Vamos terminar com uma
explosão.”
“No sentido literal ou figurativamente?” Jonah murmura,
suas mãos deslizando para cima das minhas coxas enquanto
nossas bocas se encontram.
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“Nos dois.” Nossos beijos rapidamente se tornam mais
quentes, até que um carro passa e ilumina o interior do carro e o
volante cravado nas minhas costas.
“Isto não é tão fácil quanto parece nos filmes”, Jonah diz,
respirando com dificuldade. “Mudança de local?”
Balanço a cabeça. “Lá em cima”, digo, e acrescento com um
sotaque rouco sulista, “Leve-me para a cama ou me perca para
sempre.”
A testa de Jonah fica franzida. “Body Heat?”
“Top Gun.”
“Passei perto.”
No meu quarto, humor de Jonah some e ele pega fogo. Eu
nunca me senti tão desejada por um homem na minha vida. Seus
beijos viram hematomas, com as mãos tirando minha roupa.
Seus olhos estão dilatados, o marrom profundo deles quase preto.
Ele arranca sua camisa, se atrapalha no zíper da calça jeans.
“Deixe isso”, ele diz, quando toca as meias até as coxas que
uso sob as minhas botas. “E o colar.”
A emoção quente passa através de mim com a sua
necessidade e sua voz roupa e apressada. Sua respiração se torna
mais rápida quando ele olha para mim, nua, mas com a meia
preta ao longo de minhas pernas, e o curvo, colar de prata entre
os meus seios.
“Kacey...”
Deixo escapar um pequeno suspiro, minhas pernas
enfraquecendo. Agarramos um ao outro novamente e ele me
empurra contra a parede do quarto, a sua língua, dentes e lábios
devorando minha boca. Posso senti-lo entre as minhas coxas,
duro e pronto. Eu me atrapalho na mesa de cabeceira ao lado de
mim e cegamente pego um preservativo.
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Ele agarra meus quadris, mal se contendo, enquanto rasgo
o invólucro do preservativo e rolo sobre ele. Então suas mãos
escorregam debaixo de mim, me levanta, e envolvo minhas pernas
com a meia em torno de sua cintura enquanto ele geme em
minha boca. Meus braços vão ao redor de seu pescoço, minhas
unhas arranhando sua pele e os dentes mordendo o músculo
entre o pescoço e o ombro. Já, a sensação dele dentro de mim é
tão intensa, tão estonteante e quente, que estou delirando.
“Nunca foi assim. Eu juro...” Digo em sua pele, agarrandoo,
abraçando ele.
“Nem eu”, ele diz encontrando minha boca novamente.
“Tudo que eu quero é isso. Você…”
Seu corpo se move contra o meu rápido e forte. Ele me
preenche, a forte pressão alimentando uma dor de doce prazer em
algo que ruge e consome. Me seguro com toda a força que posso,
recebendo suas estocadas profunda, enquanto o brilho de
necessidade na minha barriga queima mais que o vidro fundido.
Meus ombros batem contra a parede com a força dele.
Sussurro seu nome, e depois grito enquanto ele estoca em mim
uma e outra vez, até que estou no ápice e caio drasticamente.
Meu corpo estremece e aperta em torno dele. Ele solta seus
próprios gemidos masculinos com o clímax, do fundo de seu peito
e Deus, se isso não é o som mais sexy que já ouvi na minha vida.
Os quadris de Jonah desaceleram. Ele solta minhas
pernas, deixando meus pés encontrarem o chão, mas seu corpo
ainda segura o meu contra a parede, com as mãos fechadas em
torno dos meus pulsos. Dentro do aperto, sua boca é gentil,
acalmando a queimadura de sua barba por fazer e a mordida de
seus beijos anteriores na minha pele. Necessidade carnal e suave
cuidado. Desejada e valorizada.
Amada.
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E m m a S c o t t
Jonah faz amor comigo, penso, beijando-o de volta, meus
dedos acariciando suavemente sua pele onde o arranhei. Não
importa quão duro ou áspero sejamos, ele ainda está fazendo
amor comigo.
“Você me faz sentir tão bem, Jonah”, sussurro. “Melhor do
que bem. Como se eu pudesse começar tudo de novo.”
“Kacey.” Ele segura meu rosto em suas mãos, seus olhos
escuros com intensidade. “Você me faz sentir vivo.”
Ele me beija de novo, lenta e suavemente, enquanto queimo
com a esperança, com certeza não há milhares de momentos nos
sobrando, mas milhões.
Milhões.
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CAPÍTULO 34
kacey
“Alguma vez você já foi a uma praia?” Pergunto ao Jonah.
“Não a um lago, mas um verdadeiro oceano?”
Nós estamos deitados na cama, em uma noite de terça —
normalmente é a nossa noite de encontro, mas nós optamos por
ficar em casa e dar uns amassos.
“Certo. Por quê?”
“Tenho saudade. Na infância, a praia era uma parte da
minha vida diária. Eu costumava matar a escola no período da
manhã, e meu melhor amigo e eu íamos a um dos cafés ao longo
do calçadão na Pacific Beach, ou um lugar no café da manhã que
tinha pranchas penduradas nas paredes. Ficávamos na praia até
depois do almoço, em seguida, voltávamos para a escola, para
não perdermos a última chamada. Às vezes isso nos levava a uma
viagem à sala do diretor. Na maioria das vezes isso não acontecia,
mas sempre vale a pena.”
Jonah passa a mão sobre a minha bochecha. “Você é muito
branca para uma amante de praia.”
“Chapéus grandes e filtro solar 1000”, digo. “E eu preferia
nadar ou fazer bodyboard na medida em que entrava no mar.
Grande e interminável. Se você acha que as estrelas são
espetaculares no Great Basin, espere até ver a lua sobre o
Pacífico.”
Ele acaricia minha orelha. “Parece que você está planejando
uma viagem.”
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“Eu realmente quero levá-lo para San Diego. Andar na
praia e te levar em todos os pontos legais que eu costumava
amar.”
“E ver seus pais?”
Estremeço. “Não. Deus, não. Seria apenas estranho e
desconfortável...”
“Posso lidar com estranho e desconfortável. Se você quiser
vê-los, você deve.”
“Não. Quero estar com você nos lugares que eu costumava
amar.” Levanto minha cabeça para olhar para ele. “Você pode?
Dois dias. Voos são muito baratos e ainda tenho alguma reserva
da Rapid Confession...”
“Você deve guarda-la. Não gastar comigo.”
“Eu quero gastar conosco. Mas se você não pode perder
qualquer tempo na Hot shop eu entendo.”
“Eu posso.”
Acaricio seu rosto. “Sério?”
“Se é importante para você, eu posso.”
Deixo escapar um pequeno grito de emoção e o beijo.
“Vamos na próxima segunda-feira e terça-feira. Então, não
tomaremos o tempo com seus pais. Naturalmente, Theo vai ter
um ataque...”
Jonah ri. “Ele pode, mas te ver lindamente feliz como você
parece agora mais do que vale a pena.”
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A demonstração de segurança de voo que Theo faz durou
meia hora. Desde o que fazer se a pressão da cabine do avião cair,
até ter certeza que trouxemos todos os remédios de Jonah e que
os armazenamos corretamente para que não sejam confiscados
pela TSA — a agência de segurança. E, claro, onde fica o hospital
mais próximo do nosso hotel. Mas nunca tomei a preocupação de
Theo por Jonah como algo fútil. Encosto em seu rosto e digo a ele
que vou cuidar bem do seu irmão.
Eu reservei um lugar com o nome mais perfeito de San
Diego sempre: o Beach Hotel Surfer da Pacific Drive. A sua
proximidade com a praia o torna um pouco mais caro para o meu
orçamento, mas quero que sejamos capazes de caminhar ao longo
do mar à noite, na parte da manhã, ou a qualquer momento que
o impulso nos atinja. O preço vale a pena.
No aeroporto, Jonah me leva até um conversível Ford
Mustang preto.
“Você não achou que toda essa viagem seria por sua conta,
não é?” Ele pergunta, segurando a porta aberta. “Eu tenho uma
poupança. Em dois, podemos fazer estes dois dias muito
impressionante.”
Descemos a capota, acionamos a música, e Jonah liga o
motor com um grito de gargalhada. Cantando alto, nós dirigimos
ao longo de um trecho de estrada tranquila e chegamos no hotel
por volta das dez. Temos todo o restando do dia livre para nós.
“O que você quer fazer primeiro?” Pergunto, amarrando a
parte superior do meu biquíni preto.
“O que você quer fazer em segundo?” Ele responde, me
jogando para cima da cama.
“Sim”, sussurro, enquanto ele deposita beijos no meu
pescoço, suas mãos trabalhando o nó na parte de trás do meu
biquini. “Isto primeiro.”
É depois das onze quando nós chegamos à praia.
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Ficamos perto da costa, e tiro meus chinelos para enterrar
os pés na areia quente e macia.
“Você sente o cheiro?” Pergunto, inalando profundamente.
“Alga?” Jonah pergunta, olhando para um conjunto de
algas que está na areia e rodeados por moscas.
“O oceano”, digo.
Seus braços deslizam em volta de mim por trás. “Eu quero
cheirá-lo em seu cabelo depois de nadar”, ele murmura. “E sobre
os lençóis mais tarde...”
Viro e o beijo, minhas mãos deslizando sobre seu peito e
braços. Sua pele está quente, escorregadia com protetor solar.
Puxo Jonah para a água.
O frio do oceano bate com força, tirando o fôlego antes de
relaxar em seu frescor suave. Eu mergulho sob a espuma de uma
onda, assim como costumava fazer quando era criança. A água
fria no meu rosto e a força do oceano são exatamente como eu me
lembrava, e a nostalgia é tão forte, tenho que me orientar por um
minuto. Mas tenho Jonah. Meu, aqui e agora, e no momento me
sinto tão grande como o oceano.
Jonah mergulha para trás com uma onda que quebra e
desaparece sob a superfície. Ele emerge na água, com o sol
brilhando nas gotas de água ao longo de seu peito. Água escorre
pela sua cabeça quando ele chicoteia o cabelo de seus olhos.
Mordo o lábio quando um arrepio sobe pelas minhas coxas.
Jonah nada para cima e me beija. Deus, ele tem um gosto
tão bom. Como ele mesmo — limpo e quente — mas com o sabor
de mistura de água salgada. Ele geme em minha boca, em
seguida, para com um suspiro.
“Puta merda”, ele diz. Posso sentir sua ereção lutando
contra o short. “Você tem gosto de caramelo salgado.” Ele me
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beija de novo, e pressiono meus quadris para os dele. “Nós vamos
ter que viver aqui.”
“Ah, é?” Digo, colocando meus braços em volta do pescoço.
sair.”
“Literalmente aqui mesmo na água. Eu vou ser preso se eu
Eu rio e ando para trás, mais profundo no oceano,
protegendo a frente de seu corpo com o meu. Caio para trás,
levando-o comigo, e nos beijamos acima da superfície e abaixo
dela, antes de voltarmos para descansar na água, nenhum de nós
falando.
Jonah me segura enquanto eu flutuo nas minhas costas,
minha cabeça na curva de seu ombro, e tenho o desejo fugaz que
pudéssemos viver aqui. Não em San Diego, mas neste dia, estes
momentos, uma e outra vez, para sempre.
Jantamos no Chart House, um restaurante à beira-mar que
é caro, mas a vida é curta e dinheiro é para gastar hoje. Depois
disso, caminhamos ao longo da ressaca, de mãos dadas, levando
nossos sapatos. A lua cheia paira sobre o horizonte. Sua luz
derramando sobre o oceano preto em um cone de prata derretida.
“Essa foi uma boa ideia”, Jonah diz. Ele para de andar e
lança o seu olhar para fora sobre as ondas. “Todas as decisões
que fiz desde que conheci você têm sido boas. Te levar para casa
naquela primeira noite, comer naquele restaurante, permitir que
você ficasse por alguns dias, te pedir para voltar quando você foi
embora.”
“Eu fui um pouco persistente em algumas coisas”, digo.
“Graças a Deus.” Ele se vira para olhar para mim e seus
olhos se enchem de ferocidade. “Minha família e amigos me
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perguntam o que eu quero. O que quero fazer ou ver além de
fazer vidro. E só digo a eles o que não quero. Não quero viajar
para algum lugar longínquo, só para dizer que fui. Eu não quero
escalar uma montanha ou saltar de um avião. Um pouco de
alegria e depois de volta ao chão de novo — aqueles momentos
fabricados não são o que eu quero.”
Ele passa a mão sobre o meu cabelo, me puxando para
perto.
“Isso é o que eu quero. Você e eu, em um lugar como este.
Do lado de fora, no tempo. Sair para um passeio ao longo da
praia, comer ou nadar ou fazer amor quando nos sentimos
vontade.” Ouço a sua respiração e suas próximas palavras saem
roucas. “Isso é viver, Kace. É exatamente o que eu queria, mas
não sabia a quem pedir.”
Sinto as lágrimas ardendo em meus olhos, e deixo escapar
uma risadinha ofegante. “Foi a mim.”
“Foi você.” Ele segura meu rosto em suas mãos, roça os
lábios sobre os meus. “Sempre, só você.”
Nós fizemos muito no dia seguinte, começando com um
passeio de manhã cedo na praia e café da manhã no café
Pannikin.
“Esse é o lugar onde eu e minha melhor amiga, Laura,
costumávamos vir quando matávamos a aula”, digo. “Este edifício
foi outrora uma estação de trem.”
Jonah arranca o canto do guardanapo, rasgando em tiras
cuidadosas. “A casa dos seus pais deve ser perto.”
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“Dois quilômetros e meio a leste”, digo. “Mas não estamos
aqui para isso. As coisas que gosto sobre San Diego estão longe
da minha casa.”
Jonah sorri gentilmente. “Mostre-me todas.”
Eu o levo para provar meu taco de peixe favorito para o
almoço, seguido de um donut da melhor loja de donuts no
mundo. Fazemos um passeio no calçadão da Pacific Beach, cheio
de pedestres e skatistas.
“Você quer ver o lugar onde eu tive meu primeiro beijo?”
“Não especialmente.”
“O quê? Pense assim, você pode se comparar a um garoto
de quatorze anos de idade, Ricky Moreno com seu aparelho e mau
hálito?”
A torção da boca de Jonah é presunçosa quando desliza a
mão ao redor da parte de trás do meu pescoço e me beija. Beijo
de um homem, exigente e profundo, deixando-me sem fôlego.
“Ricky quem?” Murmuro.
Ele arqueia a sobrancelha da forma que amo. “Isso
mesmo.”
Começamos a andar de novo, os braços dados.
“O beijo no MGM Grand foi o meu primeiro beijo de
verdade”, digo.
“Meu beijo de sorte grande?”
“Foi a primeira vez que um homem me beijou porque era o
momento perfeito e lugar para um beijo. O momento certo. Não
porque esperava que fosse conseguir algo mais.”
Nós.”
“Mas eu queria que levasse a outra coisa”, Jonah diz. “Isso.
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Sorrio para o calor que se espalha através de mim com
essas palavras. “É a primeira vez, também.”
O dia passa rápido enquanto passeamos por San Diego, em
seguida, voltamos ao hotel. Para fazer amor, para dormir um
pouco. Tomamos banho e vamos jantar em um pequeno Crab
Shack, e depois, subimos no alugado conversível quando o
crepúsculo se aprofunda em noite.
“Ainda há tempo, se você quiser ver os seus pais”, Jonah
diz. “Não vá por minha causa, Kace. Não é sobre mim.”
Eu suspiro. “Eu realmente não quero ver ou falar com eles.
Mas talvez... Podemos passar pela casa. Eu não me importaria.” A
verdade: Quero — preciso — saber se a casa ainda é a minha
casa.
Jonah liga o motor. “Vamos lá.”
“Tudo certo. Mas... pode colocar capota para cima, ok?
Assim eles não podem me ver.”
Ele sorri e aperta o botão. Eu guio Jonah pelo bairro de
Bridgeview, onde as casas são menores do que os grandes
gigantes de Mission Hills, a oeste.
“Aquela”, digo, meu coração martelando em meus ouvidos.
“Pare aqui.”
Jonah para no meio-fio. Do outro lado da rua e um pouco
para baixo está a casa de dois andares em tinta azul pálida com
guarnição branca. O velho Subaru dos meus pais está
estacionado na rua.
“Eles não podem usar a garagem”, digo, distraída. “Está
cheia de móveis antigos e antiguidades que meu pai herdou
quando minha avó morreu.” Meus olhos percorrem a casa, se
demorando sobre os quadrados amarelos de luz das janelas da
frente. “Eles estão em casa”, digo suavemente.
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Jonah se inclina sobre o console, a cabeça no meu ombro.
Ele pega minha mão e dá um aperto. “Tudo o que você quiser
fazer, Kace.”
A casa fica borrada enquanto as lágrimas enchem meus
olhos. “Estou tão orgulhosa que você está comigo, Jonah. Seria
difícil assistir o meu pai elogiar coisas maravilhosas sobre você,
porque ele tem vergonha de mim.”
“Você quer ir sozinha?”
“Eu acho que não posso.”
“Talvez ele tenha mudado”, ele diz. “Ele é frio no telefone,
mas talvez, se vir seu rosto, cara a cara... Talvez veja como você é
linda, e quanto o ama. Porque está tudo em seus olhos, Kace. Ele
pode enxergar e as coisas seriam diferentes.”
“Eu não sei”, digo lentamente.
A porta da frente se abre e meus pais saem.
Agarro a mão de Jonah bem apertada enquanto eles
descem a calçada em direção ao seu carro. À luz dos postes posso
ver minha mãe, pequena e frágil, com um vestido azul com uma
bolsa preta. Ao lado dela, meu pai está alto e magro em um terno
azul-marinho e gravata amarela.
“Eles vão sair”, digo.
“Você pode fazer isso”, Jonah diz suavemente.
Reúno a minha coragem, minha vontade, acrescentando o
esmagador desejo de falar com os meus pais. Vê-los depois de
quatro anos me inunda em nostalgia, mesmo que tão pouco do
meu pai tenha sido bom.
“Ok”, digo, e estendo a mão para a maçaneta da porta.
Mas, em seguida, meu pai para na porta do passageiro da
Subaru. Ele se vira para minha mãe.
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“Espere”, sussurro, colocando a mão sobre Jonah.
Meu pai está dizendo alguma coisa. Estamos estacionados
muito longe para ouvir, mas posso ver minha mãe inclinar a
cabeça para cima. Seu jeito frágil, seu sorriso floresce em algo
espontâneo e alegre. Ela joga a cabeça — como um gesto
despreocupado, quase de menina que eu nunca vi antes. A risada
dela flutua para o outro lado da rua e meu pai passa o polegar
acariciando seu queixo como um amante. Romântico.
“Pai.” Minha boca está em forma da palavra sem um som
quando ele abre a porta do passageiro para minha mãe. Quando
vai para o lado do motorista, seu passo é quase um passo de
dança, o seu rosto angular, suave e divertido.
“Kace, eles vão”, Jonah diz.
“Deixe-os ir”, eu sussurro.
“Você tem certeza?”
Mas o carro se afasta do meio-fio e desaparece na rua.
Meus dedos levantam da janela em um pequeno aceno.
Os dedos de Jonah acariciam a minha nuca. “Por quê?”
“Eles pareciam tão felizes”, sussurro. “Eu nunca os vi... Foi
um grande momento, sabe? Se eu tivesse saído e surpreendido os
dois, teria arruinado.”
Sua mão é suave no meu cabelo. “Eu sinto muito.”
“Talvez ele esteja melhor”, digo, “agora que fui embora. Não
estou tentando ser a mártir. Eu só quero dizer... talvez ele esteja
mais feliz. O que os torna melhor em conjunto. Eu não gostaria
de estragar tudo. Deus, eles pareciam tão apaixonados...” Exalo, e
olho para Jonah com um sorriso fraco. “Vamos voltar para o
hotel. Temos um voo de manhã cedo.”
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Jonah liga o carro, dirige três metros, em seguida, freia e
estaciona em um parque. Ele se vira para mim, com uma mão no
volante, a outro ao longo das costas do meu assento.
“Quando estiver pronta, você vai voltar”, ele diz. “E o seu
pai pode falar e reconciliar, ou ele pode continuar com sua raiva
estúpida e manter você afastada. Se ele fizer isso, então é um
idiota maldito. Você querer ser amada por ele não te torna alguém
quebrada, Kace. Ele é o único que está perdendo em deixá-la ir. É
sua perda. Eu quero odiá-lo pelo que ele fez com você, mas em
vez disso, só sinto pena dele.”
Ele me beija então, ferozmente, como se selasse um pacto,
sua mão apertada no meu cabelo.
“Precisava tirar isso do peito, não é?” Pergunto.
“Sim”, ele diz.
“Sente-se melhor?”
“Muito.” Ele coloca o carro em movimento e se afasta do
meio-fio novamente.
Viro para a janela para ver a minha antiga casa ficando
para trás. “Eu também.”
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CAPÍTULO 35
kacey
Final de setembro
Sento na minha cama, guitarra no colo e caderno aberto
ao meu lado. Bato a caneta na parte inferior do corpo acústico da
guitarra Taylor, suspirando nas páginas em branco. Não há fluxo
lírico hoje. Não está rolando. Chett é um assunto morto para
mim, e eu não quero escrever sobre o meu pai. Basicamente,
estou muito feliz para revirar os poços escuros de meu passado.
ter.
O que, bem vistas as coisas, é um bom problema para se
Durante seis semanas, Jonah e eu estivemos juntos. Um
casal. Quase todas as noites depois do trabalho ele veio para o
meu apartamento, ou eu fui para o dele. Ele não precisa dormir
muito e eu sou uma coruja com nenhum lugar para estar de
manhã. Passamos as horas profundamente perdidos um no
outro, fazendo amor — às vezes duro e áspero, às vezes lento e
suave — então conversando, comendo e rindo, antes de cair de
volta na cama.
Temos nossas pequenas rotinas. Noites de domingo na casa
dos Fletchers, jantares ao ar livre debaixo de lâmpadas de
incandescência de Jonah. Muitos risos, boa comida e melhor
conversa. Terças-feiras são os nossos encontros. Cupcakes na
máquina automática, show da fonte do Bellagio ou apenas ficar e
assistir a um filme.
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Ele deixou um estoque de seus medicamentos na minha
cozinha, e comprei um liquidificador em um mercado para que
pudesse fazer suas vitaminas. E quase todos os dias, levo o
almoço para a Hot shop onde Jonah e Tania dão duro no trabalho
de acabamento das peças da obra. A exposição no Wynn está
apenas a duas semanas de distância, mas Jonah diz que se sente
confiante de que vai conseguir cumprir seu cronograma.
Ele vai conseguir, penso. E além. Ele está saudável. Seu
corpo é forte.
Sinto a força em seu corpo quase todas as noites. Minha
pequena chama de esperança é uma tocha agora, e nem mesmo
um furacão pode extingui-la.
Meu celular toca na mesa de cabeceira, me tirando dos
meus pensamentos.
“Alô?”
“Kacey Dawson?” Pergunta uma voz de mulher.
“Sim, sou eu.”
“Senhora Dawson, sou da revista Sound Addiction. Eu
queria saber se você tem quaisquer comentários sobre os recentes
abalos na sua antiga banda, Rapid Confession?”
Faço uma careta. “Abalo recente?”
“Dizem que a banda está em perigo de cancelamento de
shows devido a disputas entre Jeannie Vale e a nova guitarrista,
Elle Michaels. Isso é verdade?”
“Eu não faço ideia.”
“Há também boatos de um processo por mau
comportamento com um proprietário do clube. Os fãs estão se
queixando de que os shows ao vivo não são tão sólidos como
eram quando você estava no palco.”
“Bem, merda, é bom ouvir isso.”
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“Dado o fato de que sua substituto, Ms. Michaels, agora
está declaradamente à beira de desistir, ou ser demitida —
dependendo de quem está dando a notícia — me pergunto se você
tem qualquer pensamento em voltar?”
Eu sorrio. “Nem um segundo.”
“Isso é interessante, Dawson. Ninguém foi capaz de
conseguir um comentário de você sobre a sua saída da banda.
Gostaria de fazer uma declaração agora?”
“Não, mas obrigada pela oportunidade.”
Desligo e dou um clique no número de Lola. Caixa de
mensagens.
“Lola, sou eu”, digo. “O que diabos está acontecendo?
Acabei de receber um telefonema de uma revista sobre a banda
estar cancelando os shows? Me liga.”
Termino a chamada e olho para o meu laptop velho. Eu só
o uso para assistir tutoriais de maquiagem no YouTube. Com
poucos comandos em uma barra de pesquisa do Google, posso
obter respostas às minhas perguntas, mas agora não tenho
certeza se eu quero saber. Os meus dias como guitarrista da
Rapid Confession parecem distantes agora. E gostaria que
continuasse assim.
Chega uma mensagem da Lola: Não posso falar agora.
RC está prejudicada s/ você. Jimmy quer conversar. Apenas
para sua informação.
Merda, a última coisa que quero é minha antiga vida se
intrometendo na nova. Além de telefonemas ocasionais com Lola,
deixei a banda no retrovisor. O dinheiro está apertado, e não
estou perto de fazer nem mesmo uma música decente, mas...
Estou feliz.
Mando uma mensagem de volta, Diga a ele para
esquecer.
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Nenhuma resposta. Lola está ocupada ou pegando um
avião, mas espero que transmita a minha mensagem. Penso sobre
mensagens de texto de Jimmy para mim, mas isso é como levar
um martelo na minha pequena bolha de vidro da felicidade.
“Sem chance”, murmuro. Vejo que horas são. É quase o
almoço. Arrumo sanduíches e saladas e levo tudo para a Hot
Shop.
Jonah sai, quando paro o carro. “Como você está?” Digo
através do pequeno estacionamento.
“Feito”, ele diz.
“Feito?” Digo, confusa.
Tania sai também. Ela abre os braços, repetindo,
“Terminado.”
“Vocês terminaram?” Digo. “A obra? Tudo?”
“Feito”, Jonah diz. “Com nove dias de sobra.”
Tania solta uma risada. “Eu preciso abraçar alguém —
além do chefe, aqui — ou vou explodir.”
“Eu”, choro, avançando em correr. Abraço Tania, em
seguida, viro para lançar meus braços ao redor do pescoço de
Jonah.
“Puta merda”, ele diz. “Está feito.”
De repente, não gosto dessa palavra. De repente, o chão
desaparece debaixo dos meus pés. Inundado com milhares de
emoções, seguro Jonah perto, puxando-o com força contra mim,
estranhamente com medo de soltar. Com medo de algo que eu
não posso nomear ainda.
Feito.
Acabado.
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Eu me afasto o suficiente para procurar os seus olhos.
“Você está feliz com isso?”
“Eu acho que ainda estou em choque. Tenho me
empenhado nisso por tanto tempo...” Ele esfrega suas bochechas
e dá um sorriso vacilante. “Eme diz que vai enviar um
caminhonete para buscar as últimas peças e todo o material que
estará à venda.”
“Eu não posso acreditar.” Eu tomo seu rosto e o beijo.
“Estou tão orgulhosa de você.”
“Obrigado”, ele diz, mas seus olhos parecem espelhar a
emoção estranha que transborda no meu coração. Seu olhar
perplexo se prende ao meu enquanto balança a cabeça
lentamente. “Está acabado…”
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CAPÍTULO 36
jonah
“Jonah”, Eme Takamura diz, apertando a minha mão.
“Estou tão contente de vê-lo novamente.”
A curadora da Wynn Galleria é leve e inteligente, usa terno
escuro risca de giz, impecavelmente sob medida. Ela é chefe de
negócios da cabeça aos pés, mas tem uma flor de hibisco de seda
vermelha dobrada atrás da orelha conferindo-lhe uma explosão
artística de cor.
“Isto é tão excitante”, ela diz enquanto caminhamos pelo
saguão. A voz dela está alegre e ligeiramente acentuada. “Minha
equipe está no espaço, aguardando sua orientação para montar a
obra-prima. Sua assistente enviou um fax sobre os esboços e do
diagrama, e Wilson — ele é meu líder de equipe — disse que as
especificações estão dentro do orçamento. Um ajuste perfeito.”
“Isso é ótimo. Realmente uma boa notícia.”
“Você está bem, Jonah?” Ela pergunta, olhando para mim.
“Você parece um pouco pálido.”
“Estou nervoso demais”, digo com uma risada curta. “Eu
quero que não seja uma porcaria.”
Ela ri, um som formal, delicada na parte traseira de sua
garganta. “Sim, prefiro que não seja uma porcaria também. Mas a
partir das peças que vi — ainda nas caixas, e com você —
acredito que você tenha evitado esse destino.”
“Falando nisso, ouviu algo mais do Sr. Chihuly?”
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“Infelizmente, não. Mas, para mim, isso significa que ele
ainda tem o objetivo de ver a exposição na noite de abertura.
Conto nenhuma notícia como uma boa notícia.”
“Eu também.”
Ela me leva para a galeria, um pequeno espaço em forma
de L, explicando como a minha exposição de vidro será exibida. A
longa asa irá segurar as peças individuais para venda, e a obra
seria exposta na ala mais curta.
Andaime já havia subido na curta asa, e uma equipe de
dois homens e uma mulher está cuidadosamente trazendo caixas
a partir de uma sala de armazenamento adjacente. Cada caixa foi
marcada com números e o seu local para a instalação.
Eme me apresenta a Wilson, o líder da equipe. Imagino que
ele está na casa dos cinquenta, um cara enorme e musculoso
como um barril que parece que ele quebraria mais vidro do que
não.
Ele deve ter lido os meus pensamentos, porque dá uma
risada quando aperta minha mão, dizendo: “Fui emprestado de
um estúdio de vidro em Los Angeles. Eu sei que pareço como um
lenhador, mas não vou quebrar nada.”
“Eu confio em você”, digo. Não que tivesse outra escolha.
Nervosismo está disparando pequenos arrepios em minhas mãos
e pés, tornando-os dormentes.
É isso. Isso está realmente acontecendo.
“Minha assistente deve chegar a qualquer minuto”, digo.
“Deixe-me ligar para ela para ver onde está.”
“Ela está aqui”, Tania grita, apressando-se. “Eu sinto
muito. Acidente na avenida. Terrível pelo visto. Complicou tudo.”
Ela é apresentada para a equipe e, em seguida, todos os olhos se
voltam para mim. “Pronto?” Tania diz.
Tomo um fôlego enorme. “Vamos fazer isso.”
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Saímos em torno das quatro horas. Os outros
trabalhadores já foram, e Tania e eu afundamos em um banco,
examinando o trabalho até agora.
“Vai ser brilhante”, ela diz. “Olhe para isso. Nem mesmo a
terceira peça está montada e já está de tirar o fôlego. Você fez
isso.”
“Nós fizemos isso. Isso não aconteceria sem você.”
Olho para a minha obra, nas bobinas amarelas e as fitas
azuis que tinham sido ligados entre si e suspensas do teto até o
momento. “Você acha que Kacey vai gostar?”
“Querido, Kacey vai perder a cabeça com isso.” Ela coloca o
braço sobre os meus ombros. “E se você não se importa que eu
diga, estou tão feliz que ela esteja aqui para compartilhar isso
com você. Que você a tem para compartilhar sua arte.”
“Eu também”, digo. Durante todo o dia, através dos
meandros mentais e físicos necessários à criação do vidro, meus
pensamentos nunca deixaram Kacey. Ela esteve comigo o tempo
todo. Cem vezes parei o trabalho para olhar por cima do ombro,
ter certeza que ela estava lá assistindo.
Sinto a falta dela.
Tania dá um puxão na minha camisa. “Quer sair? Pegar
um jantar mais cedo?”
“Não estou com fome”, digo. “Eu tenho que chegar na A-1
logo de qualquer maneira.”
“Merda, você deveria parar. Em uma semana, você vai ser
famoso.”
Reviro os ombros. “Não sei nada sobre isso.”
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“Eu sei. Você já viu a lista de convidados da Eme?” Ela
assobia baixo em seus dentes. “Mesmo sem Chihuly, será uma
multidão de ouro, e todos aqui para vê-lo.” Ela se levanta do
banco e estica as costas. “Talvez você devesse tirar a noite fora.
Levar Kacey em algum lugar e comemorar.”
“Boa ideia. Eu posso fazer isso.”
Ela bagunça meu cabelo. “Ou talvez você devesse tirar a
noite apenas para dormir um pouco. Parece que precisa.”
Depois que ela sai, fico sentado por alguns momentos mais,
olhando ao redor da sala.
Está acontecendo.
Levanto. Ou tento. Minha respiração fica presa duramente
em meus pulmões, e depois desaparece sem que eu mesmo
expire. Tento conseguir ar e não consigo por causa da minha
garganta, é como se tivesse uma faixa de aço enrolado em volta
do meu peito.
Ah Merda…
Sento de volta, puxando lufadas rasas de ar.
Leve. Leve e fácil, digo a mim mesmo, assim como meu
coração soa no meu peito. Meu olhar corre de um trabalhador de
rua ou para o zelador. Pego meu telefone para ligar para a
emergência...
Não! Não é tão ruim. Não é…
Gradualmente a faixa que aperta em torno de minhas
costelas alivia. Finalmente, passa e consigo respirar mais fundo.
Fadiga. Estou trabalhando pra caramba. Isso foi tudo.
Balanço a cabeça, levanto cuidadosamente do banco e
deixo a galeria. Meu caminho está certo, minha respiração
profunda e regular. Mas cada terminação nervosa grita por Kacey.
Preciso dela. Cada inalar e exalar marcam os segundos que se
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passam sem ela, e sinto-os deslizando através de meus dedos
como areia.
Aceito alguns dos conselhos de Tania e digo que estou
doente na A-1. A minha primeira vez nos cinco meses que
trabalho lá. Harry fica chateado que estou avisando em cima da
hora, e me pergunto por que não me incomoda mais, e se posso
deixar o trabalho de vez.
Porque Kacey é mais importante do que dirigir para cima e
para baixo na rua toda a noite.
Tenho uma necessidade quase desesperada de vê-la.
Esfrego as palmas das mãos sobre as coxas do meu jeans como
se eu fosse um viciado buscando uma dose. Ligo para ela e
mesmo tendo muito que trabalhar, ela consegue sair.
Eu levo a minha linda namorada a um restaurante chique
no Mandalay Bay, que tem vista para a brilhante Strip. Ela á
mais radiante do que todas as luzes além das janelas, e me
provoca por ficar encarando-a mais de uma vez.
A comida é deliciosa e é o que eu precisava depois de um
longo, emocional e fisicamente desgastante dia. No momento em
que saio do restaurante, a minha necessidade de estar com Kacey
se transformou em um forte desejo de tê-la sozinho. Tínhamos
planejado ver outro show da fonte no Bellagio, mas enquanto
esperamos a conta chegar, deslizo ainda mais perto dela em
nossa mesa.
“Eu quero te levar para casa”, digo ao seu ouvido, minhas
mãos deslizando pelo tecido liso do vestido. Ela usa elaboradas
botas altas atadas à frente e um vestido preto de botões. O tecido
revela o vale suave de seu decote e termina aberto logo acima
suas botas quando ela anda.
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“Sem show das águas?” Ela pergunta.
“Você se importa se a gente pular isso?”
Sua mão desliza entre as minhas pernas, sobre as minhas
calças. Ela encontra minha ereção crescente e dá um aperto
suave.
“Eu quero isso mais”, ela sussurra de volta.
No meu apartamento, desfaço os laços de suas botas —
uma de cada vez — e os botões do seu vestido — também um de
cada vez — até que ela está apenas em seu sutiã e calcinha
pretos. Então nós comemoramos a exposição da obra.
Comemoramos muito e bem para a noite, até que caio sobre os
travesseiros, exausto e saciado. Meu corpo está pesado e
vibrando com o clímax. Kacey está suave e mole, enrolada ao meu
lado, a cabeça apoiada no meu ombro. O rádio relógio marca
duas e quinze da manhã.
“Você está intenso esta noite”, ela diz.
“Eu não te machuquei, não é?”
“Deus, não.” Ela se aconchega mais perto. “Eu posso não
ser capaz de andar amanhã, mas valeu a pena.”
Estico-me para beijar seu cabelo. “Basta fazer o que você
disse no Great Basin. Tomar cada momento e torcer para tudo
valer a pena.”
“Eu estava pensando...” Ela percorre os dedos sobre meu
peito, em toda a minha cicatriz, e ao longo do meu ombro. “Se
você tivesse pensado melhor sobre me deixar convidar alguns de
seus antigos amigos da universidade para a exposição na próxima
semana. Carnegie também, no entanto, será a curto prazo. Eu sei
que você não...”
“Sim”, digo sem pensar. “Vamos convidar alguns. Os
amigos que eram mais próximos.”
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Kacey levanta a cabeça para olhar para mim, seu sorriso
radiante. “Sério?”
Balanço a cabeça. “Vou tentar desenterrar alguns
endereços de e-mail para você. Eu tenho certeza que eles vão
pensar que sou um babaca por esperar até agora...”
“Eu fazer com que não pensem isso. Vou explicar que você
estava ocupado, no fim do prazo, mas agora o seu projeto está
pronto.” Kacey se apoia em seus cotovelos, a elevação de seus
seios empurrando contra o meu peito. “Estou tão feliz que você
mudou de ideia. Posso perguntar o porquê?”
Penso em dizer a ela que estou bem em fazê-la feliz, ou que
eu realmente queria ver meus velhos amigos. Digo a ela a
verdade, no entanto.
“Eu não sei. Já não faz tanta diferença mantê-los longe. “
Ela traça o dedo no meu peito. “Talvez seja porque você
conseguiu o que se propôs a fazer. Sem distrações.” Ela sorri
timidamente. “Bem, com exceção de uma.”
“Uma bela, distração incrível.” Puxo sua boca com a minha,
beijando-a suavemente no início, depois mais profundo.
Você precisa ter calma...
“Espere assim um pouquinho”, murmuro contra seus
lábios. “Eu preciso de água. Quer um pouco?”
“Certo.”
Levanto e caminho nu para o banheiro. A luz explode em
meus olhos quando a acendo, e eles se encolhem com o brilho
áspero. Eu tento pegar um dos dois copos na pia e erro por causa
das luzes brancas subitamente dançando por toda a minha visão.
Agarro o balcão quando o chão gira sob os meus pés e minha
respiração volta a ficar superficial.
Mas que…?
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O episódio, ou o que quer que fosse, passa em instantes.
Minha visão clareia, e respiro fundo algumas vezes até que meu
equilíbrio está restaurado. Um efeito colateral dos medicamentos,
provavelmente. Ou, mais provavelmente apena exagerei com
Kacey. Isso, provavelmente é isso. Mesmo quando estava
tomando-a como um louco, eu sabia que era demais. Mas hoje
não consegui me saciar dela. Precisava preencher as minhas
mãos com ela, tocá-la em todos os lugares, inspirá-la, absorvê-la,
como se pudesse levá-la comigo, mesmo quando estávamos
separados.
Leve e fácil. Fique frio. A obra está pronta e você tem todos
os dias livres para vê-la.
Encho dois copos de água com mãos firmes e volto para o
quarto.
“Obrigada”, Kacey diz e bebe quando volto para a cama. Ela
coloca o copo sobre a mesa de cabeceira e toma o meu quando
acabo. “Agora... Onde estávamos?”
Ela me beija docemente, então sedutoramente, mas eu
gentilmente recuo. “O dia finalmente me cansou. Ou isso, ou você
me desgastou. Certeza que é o último.”
Ela bufa um suspiro dramático. “Provocação.”
“Eu sei. Venha aqui.”
Enrolo Kacey em meus braços, acomodo sua cabeça
debaixo do meu queixo, e beijo seu cabelo. Mesmo após o sexo
suado, voraz, ela ainda cheira a caramelo. Encho meus pulmões
com ela, levando-a comigo para dormir, onde sonho com um
barco balançando suavemente e uma costa rapidamente ficando
para trás.
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CAPÍTULO 37
kacey
É a noite de abertura da exposição de Jonah na Wynn
Galleria. Eu não fico tão nervosa e animada desde a noite antes
do primeiro grande concerto da Rapid Confession.
Milagrosamente, não quero uma bebida. Eu não tomei uma
bebida desde que deixei a banda e não fumei um único cigarro
também. Tenho vontade de vez em quando, mas nunca irei fumar
perto de Jonah, e se fumasse no meu apartamento, estaria tudo
contaminado quando ele viesse.
ele.
Então me livrei de dois maus hábitos. Um por mim, um por
Coloco um vestido preto que vai até o meio da coxa na
frente, com alças largas e uma saia que cobre os meus joelhos.
“É um vestido reverse mullet”, disse a Jonah no telefone
mais cedo naquele dia. “Indecente na frente, profissional nas
costas. Você acha que vai ser apropriado?”
“Eu não sei”, ele diz. “Minha principal preocupação é a
facilidade com que ele sai.”
A piada é um alívio. Jonah tem estado distraído, nervoso e
estressado essa última semana. Eu ainda não vi o produto final, e
antecipação corre através do meu ventre enquanto arrumo meu
cabelo no alto da cabeça, deixando algumas mechas soltas. Aplico
a minha maquiagem de costume, com olhos esfumados e lábios
vermelhos brilhantes, e depois passo pela minha pequena sala de
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estar, esperando. Um olhar para fora da janela revela uma
limusine o meu telefone soa com uma mensagem:
Aqui, mas atrasado. Pode me encontrar lá embaixo?
Corro para baixo e chego ao meio-fio, assim que o motorista
abre a porta do passageiro e Jonah sai. Ele congela quando me
vê, fica de queixo caído.
“Eu cuido disso”, ele diz ao motorista, que tira o quepe e
volta a se sentar atrás do volante.
“Boa noite”, digo.
“Você está...” Ele balança a cabeça quando se aproxima e
passa os braços em volta da minha cintura.
“Você não precisa”, digo. “Eu amo seus elogios silenciosos.”
“Toda vez que te vejo, eu penso, é isso. Ela não pode parecer
mais bonita do que ela está agora. E então vejo você na próxima
vez.”
Lágrimas saltam aos meus olhos enquanto percorro minhas
mãos pelas lapelas de seu terno cinza-escuro. “Você parece... tão
bonito, Jonah. Deus, o que há de errado comigo?” Eu pressiono a
parte de trás do meu pulso cuidadosamente sob um olho, depois
pelo rosto do meu rosto. “Eu não sei do que se trata. É uma noite
especial para você e estou tão feliz e orgulhosa... Animada para
ver o seu belo vidro. Merda, eu deveria ter uma caixa de lenços
para levar comigo. Eu sei que vou precisar.”
Jonah se inclina e beija a minha boca. “Obrigado por estar
aqui comigo.”
Posso sentir a tensão em seus músculos. Sua expressão é
perturbada, como se ele tivesse milhares de pensamentos na sua
mente e quisesse dizer mais. Mas as luzes da rua se acendem
acima de nós. A noite já começou a cair, e Jonah se vira para me
direcionar para dentro da limusine.
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“Cortesia de A-1?” Pergunto.
“Deus, não”, Jonah diz, deslizando ao meu lado. “Eme
enviou para mim. É ridículo, mas não posso dispensar e arruinar
a noite do motorista. Mas estou feliz que não seja da A-1 ou eu
ouviria piadas dos caras de lá para sempre.”
“Eu amo Eme por fazer isso”, digo. “Você merece.”
“Eu não sei nada sobre isso”, Jonah diz.
A limusine se afasta do meio-fio e Jonah se vira para
observar Vegas de fora da janela. Sua perna balança e escorrego
minha mão na sua. Ele a segura firmemente toda a viagem, e, em
seguida, dá um aperto quase doloroso quando chegamos ao
Wynn.
“Puta merda”, ele murmura.
A frente do hotel é uma cavalgada rotativa de sedans,
limusines e carros, derramado convidados vestidos com trajes
semi-casual.
“Eu não achei que haveria tanta gente”, Jonah diz. “Eme
deve ter convidados metade de Las Vegas.” Ele se vira para mim,
seu belo rosto torcido pelo pânico. “O que faço se odiarem?”
Começo a dizer-lhe que eles ninguém vai odiar nada, mas
sei por experiência própria como é colocar minha alma em
exposição, derramar o meu coração em uma canção e, em
seguida, entregá-la a outra pessoa. É claro que ninguém vai
detestar, mas não há muito paliativo contra esse tipo de
ansiedade.
“Você ama o que fez?” Pergunto. “É a exposição que você
imaginou?”
Jonah concorda. “Sim é.”
Sorrio e encolho os ombros. “Aí está.”
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Ele solta uma risada curta. “Bem, isso foi fácil.” Ele acaricia
minha bochecha, estudando-me atentamente, e abre a boca para
dizer algo mais. Ele me beija em vez disso, assim que o motorista
abre a porta para nós e é hora de ir.
A longa ala em forma de L da galeria exibe as peças
individuais para venda, cada uma em pé, em stands, de
diferentes alturas. Garrafas e vasos ricocheteiam com cores nos
complexos padrões ainda precisos. Esferas e cubos que contém
inacreditáveis buquês de flores. Um grupo de flores silvestres em
roxo e amarelo tem abelhas pairando sobre ele. Outro parece
como se tivesse sido suspenso debaixo d'água, turvo e fluido na
sua forma. Outras peças penduradas no teto em torções de vidro
multicolorido. Algumas são luminárias, as suas lâmpadas
escondidas entre as bobinas.
Tenho que morder o interior da minha bochecha enquanto
caminhamos pelas pessoas formalmente vestidas que apreciam o
lindo trabalho de Jonah. Eles tomam champanhe em taças de
cristal ou comem alimentos delicados pegando com os dedos das
bandejas de garçons que estão passando. Uma corrente de
murmúrios, conversa se passa entre a multidão. Todas as
direções que viro minha cabeça ouço os convidados exclamarem
como é belo o vidro e quanto apreciariam a ter uma peça
daquelas em seu lar.
Jonah olha para a frente, sua mão segurando a minha com
força, enquanto seguimos para a extremidade curta do L, onde
sua obra está pendurada. Viramos no canto da sala e nos
juntamos à multidão reunida, todas as vozes e suspiros
apontando para cima, em direção ao teto.
Um mar…
Olho para cima, também. Três metros de uma cachoeira de
vidro em todos os tons de azul. Fitas e cachos caindo dele, em
uma espuma opalescente. Jogados debaixo de uma esfera
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ajustada no centro. Um sol em laranja, vermelho, dourado e
amarelo. Uma bola de fogo cheia de lava derretida.
Na parte inferior da cachoeira, a água foi transformada em
um azul plácido feito a partir de erupções de vidro, como placas
em forma de quadrados com bordas ondulantes, bastante
compridas e bem amplas. As almofadas de lírio em verde,
cobertas com cachos de flores de cristal cor de rosa, pontilham o
lago azul espalhado ao longo do chão. Luzes escondidas em locais
estratégicos iluminam a vida animal entre a água e vegetação:
peixes de vidro com escamas de bronze, cubos de corais e algas, e
até mesmo um polvo com seus tentáculos se espalhando e
tentando agarrar alguma coisa.
Minha mão em Jonah aperta tão forte, meus dedos doem.
“Jonah, é...” Eu não tenho uma palavra para dizer o que é.
Ele se vira para olhar para mim e só posso olhar para trás.
“Obrigado”, ele diz.
Meus olhos lentamente encontram Tania, Dena e Oscar, os
pais de Jonah e Theo no meio da multidão. Então Eme Takamura
nos vê. Sem uma palavra, ela aponta, espera que os olhares a
sigam, em seguida, começa a bater palmas. O resto da multidão
se junta quando percebe que o artista está entre eles. Logo, o
espaço é preenchido com aplausos e Jonah dá um passo para
trás, emocionado. Eu gentilmente cutuco-o para frente.
“É tudo para você”, sussurro. “Aproveite.”
O resto da noite é meio que um borrão. Dena, Oscar, e
Theo ficam comigo, enquanto Jonah, Tania, e os Fletchers são
levados ao redor por Eme, conhecendo vários artistas,
colecionadores e críticos. Meus olhos não se cansam de ver Jonah
ser recebido e parabenizado por seu belo legado. Então amigos da
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UNLV se aproximam e Jonah é cercado e abraçado, uma e outra
vez, por pessoas que não via em quase dois anos.
“Seu trabalho é impressionante”, Dena diz, admirando uma
grande escultura, em forma de ovo cheia de cacos geográficos,
como um prisma, pedras preciosas flutuando entre eles. “Nós
vimos o seu trabalho na UNLV, mas isso... Ele levou para um
nível totalmente novo.”
“Ele é um maldito gênio”, Theo diz. Ele é quem está menos
bem vestido, mas ainda penso que parece extremamente bonito
em uma camisa de botão preto enrolada até um pouco abaixo dos
cotovelos, revelando seus antebraços cheios de tatuagem.
“Veio sozinho, T?” Oscar pergunta.
Theo sacude a cabeça.
“Essa é a primeira vez.”
Theo dá de ombros e murmurou alguma coisa ininteligível
contra a boca de sua garrafa de cerveja.
“Chihuly está aqui?” Pergunto. Se o ídolo de Jonah chegar,
a noite seria completa.
Dena examina a multidão para cima e para baixo ao longo
do L. “Eu não creio. Pelo menos, ainda não.”
“Ele vai aparecer”, Oscar diz.
“É melhor”, Theo diz.
Mal ele diz isso quando a multidão se separa, e um homem
atravessa, acompanhado por uma comitiva. Ele é baixo, rotundo e
parrudo, todo vestido de preto. Seu cabelo prateado roça seus
ombros e uma mancha negra cobre o olho esquerdo.
“Theo...?” Eu sussurro, pegando sua mão.
“É ele”, Theo diz.
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Minha mão na sua aperta com mais força e minha
respiração fica presa frente a este homem, este mestre de vidro,
esta lenda que caminha até Jonah e bate em seu braço. Jonah se
vira. Seu rosto fica surpreso, assustado e cheio de espanto,
choque e reverência.
“Jesus, olhe para ele”, Theo diz suavemente.
Pisco as lágrimas quando Dale Chihuly oferece a Jonah sua
mão e Jonah sacode. Estou de pé muito longe para ouvir todas as
palavras, mas Chihuly está animado enquanto fala, os braços
gesticulando, os dedos apontando para diferentes peças. A cabeça
de Jonah balança. Sua boca pronuncia obrigado mais e mais.
Então ele e Chihuly se movem em torno da curva do L e
desaparecem de nossa vista.
“Oh, meu Deus, Theo”, eu sussurro.
Olho para cima para vê-lo piscando com força, sua
mandíbula cerrada de modo que os músculos estão contraídos.
Ele olha para mim, suas pupilas dilatadas, agora deixando as
lágrimas se acumularem.
“Ele veio”, Theo diz. “E ele gostou do trabalho de Jonah.
Vimos isso acontecer.”
Eu balanço a cabeça, lutando contra as lágrimas.
“Vimos”, ele diz. “Você sabe o que eu quero dizer?”
Eu sei. Jonah conheceu seu ídolo. Seu herói elogiou seu
trabalho. Theo e eu testemunhamos isso. Esse seria para sempre
um dos mais preciosos momentos de nossas vidas.
Durante uma hora, Jonah e Dale Chihuly ficam sentados
em um banco na frente da cachoeira de vidro, em uma conversa
profunda, enquanto a multidão é dizimada em torno deles.
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Finalmente, o mestre se levanta, troca um aperto de mãos
caloroso com Jonah, depois com Eme e Tania, e deixa a galeria
com sua pequena comitiva.
“Esgotado”, Eme diz, consultando seu iPad. “Toda a obra
está esgotada. Cada peça. Tudo vendido.”
Jonah passa a mão pelo cabelo, olhando para o seu
trabalho, com o rosto feliz, atordoado, e um pouco cansado.
“Parabéns”, digo, abraçando-o com força. “Mas precisava
encontrar uma palavra melhor. Uma palavra maior.”
“Mesmo sem palavras”, Oscar diz, apontando o polegar
para Dena. “Nem mesmo uma citação Rūmī.”
A mão cobre metade de um sorriso, Dena sacode a cabeça.
“Estou sem palavras.”
Oscar fica boquiaberto. “Vocês ouviram isso, senhoras e
senhores? Jonah se reúne com velhos amigos, que ficaram
durante toda a exposição, conheceu seu ídolo, e — maravilha de
todas as maravilhas — Dena Bukhari está sem palavras.”
Dena o empurra. “Infelizmente para você é apenas uma
falha momentânea.” Ela levanta a taça de vinho. “Rūmī diz: Deixe
a beleza do que você ama ser o que você faz. Eu brindo ao nosso
querido amigo, Jonah, cuja exposição é a incorporação dessas
palavras. Você criou tanta beleza, meu amigo, que o mundo não
pode deixar de ser grato a você por isso.”
Na limusine a caminho para casa, sento descansando
minha cabeça no ombro de Jonah. “Dena está certa, sabe.” Digo.
“O mundo da arte vai perder a cabeça com sua obra. E você
merece cada pedacinho do que está acontecendo.”
Ele acena com a cabeça contra a minha cabeça. “Um
legado”, ele diz. “Isso é tudo o que eu queria.” Seus dedos pegam
meu queixo para cima e ele me olha, as sobrancelhas franzidas
na penumbra. “Eu nunca pensei em pedir mais.”
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Uma pontada de mal-estar infecta minha felicidade, como
uma gota de tinta preta em uma bacia. “Você está bem? Você
parece um pouco...”
“Cansado”, Jonah diz. “Esta noite foi... surreal. Mais do que
eu tinha imaginado. Eu me sinto um pouco desgastado.”
“Vamos para o seu apartamento”, digo, minha mão sobre
sua coxa. “Celebrar.”
Ele sorri e pega a minha mão na sua. “Tem algo específico
em mente?”
“Eu posso pensar em algumas coisas.”
Mas de volta em casa, depois de ter trocado seu terno e
saído do banheiro em suas calças de pijamas, é uma questão
diferente.
“Eu sei que vou me arrepender disso mais tarde”, ele diz,
com o olhar à direita em cima de mim enquanto estou deitada na
cama, com uma calcinha vermelha de renda. “Mas estou pronto
para dormir. Pode me dar algumas horas para recarregar?”
Vou em sua direção e o beijo para dar boa noite. Eu me
enrolo ao lado dele e fecho os olhos, esperando acordar na parte
mais profunda da noite com beijos ao longo do pescoço — a sua
habitual forma de ataque. Em vez disso, meus olhos se abrem em
plena luz do dia. O relógio na mesa de cabeceira diz que são seis
horas e Jonah ainda está dormindo, seu hálito quente flutuando
sobre mim.
Não é grande coisa, penso. Ele esteve trabalhando sem
parar durante meses. Nenhuma surpresa, a ficha caiu. Ele precisa
— e merece — um longo descanso.
Eu cochilo até o alarme despertar uma hora mais tarde,
indicando que é hora de tomar os remédios. Ele vai até a cozinha
e eu mergulho entre estar acordada e dormindo, agradavelmente
antecipando seu retorno, certa de que faríamos amor agora. Mas
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ao invés disso ele volta para a cama, passa os braços em volta de
mim, e volta a dormir.
Agora estou bem acordada, ouvindo-o respirar. Inspirando
e expirando, um metrônomo sussurrando, mantendo o tempo, a
contagem regressiva em minutos.
Quando ele finalmente se agita e acorda já são durante a
oito e quarenta e cinco, ele franze a testa para o relógio como se
não pudesse acreditar no que vê. Vejo uma lasca de medo em
seus olhos, e sinto o seu medo deslizar em meu coração.
“Venha aqui”, sussurro. Beijo-o com força, e ele responde
imediatamente, fico agradecida. Nós caímos um no outro, nos
agarramos e balançamos até a cabeceira bater na parede.
Depois digo a mim mesma que foi a intensidade do nosso
amor que fez Jonah cair no sono novamente.
Nada mais.
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CAPÍTULO 38
kacey
Dois dias após a exposição. Duas manhãs depois de Jonah
dormir até tarde, acordar apenas para tomar seus remédios, em
seguida, voltar para a cama. Dois dias dele andando por aí,
mexendo no Facebook em seu telefone, mal dizendo uma palavra
para mim, ou assistindo o ruído sem sentido na TV. Dois dias de
crescente tensão entre nós, que não tinha nenhuma fonte, mas
que me assustou até os ossos.
No terceiro dia, Jonah e eu tomamos café no Baby Stacks,
uma casa de panquecas perto da Strip. Lá, tem sido meu hábito
sempre encomendar os mesmos tipos de alimentos que Jonah
come, parcialmente por solidariedade, mas também porque, em
última análise, me sinto mais saudável. Tudo o que fiz desde que
me mudei para Las Vegas foi melhorar a minha saúde, mental e
física.
A garçonete vem anotar nosso pedido.
“Eu vou querer uma omelete de clara de ovo...”, começo.
“Jesus, Kace, você pode comer panquecas, se quiser”,
Jonah diz. “Peça o que quiser.” O sorriso dele vem um pouco
tarde demais. “Aqui tem panquecas maravilhosas.”
Olho quando ele se vira para a garçonete. “Eu vou querer
uma panqueca, um descafeinado, e batatas fritas da casa.”
“Batatas fritas são muito gordurosas”, digo.
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Ele entrega o seu menu para a garçonete, não olhando para
mim. “Uma porção não faz mal.”
Peço uma omelete de clara de ovo com frutas e café. A
garçonete pegas nossos menus e sai. Os olhos de Jonah estão
sobre a mesa, sobrancelhas franzidas enquanto rola a colher
entre as mãos, como um mini maçarico.
“Ei”, digo suavemente.
São necessárias três tentativas chamando seu nome antes
que ele olhe para cima.
“Desculpe, Kace, o que foi?”
“Diga você. Tem andado estranho ultimamente.”
“Eu tenho?”
“Sim, você tem. Eu me sinto atordoada tentando entender.”
Ele se contrai um pouco e estende a mão sobre a mesa
para pegar a minha. “Sinto muito. Estou um pouco distraído
ultimamente. Não estou acostumado a passar tanto tempo sem
ter o que fazer. Eu não sei o que fazer comigo mesmo. Acho que
isso está me deixando um pouco irritado.”
Sim, ok. Isso faz sentido.
Aperto sua mão. “Por que não vai para a Hot shop de
qualquer maneira? Faça algo apenas para você?”
Ele dá de ombros e murmura algo que parece como,
“Talvez”, e leva a mão para trás.
Silêncio.
“Tania me disse que três galerias diferentes querem a sua
obra”, eu finalmente digo. “Londres, Paris e Nova York. Esse é o
tripé do mundo da arte, não é?”
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“Por quê? Vegas não é bom o suficiente?” Ele acena com a
mão. “É vidro. Como é que pensam que podem carregar isso
através do oceano está além de mim, mas podem tentar.”
Endireito-me na minha cadeira, sentindo como se estivesse
tomando café da manhã com um estranho. Ou pior, com meu pai.
Mais dez minutos de silêncio passam antes da nossa
comida chegar. Olho para a minha omelete, meu apetite
desaparece. Jonah olha para o seu prato de comida e, finalmente,
parte uma fatia de batata. Observo por baixo dos meus cílios
enquanto mastigo devagar, como se fosse um pedaço de barro
cinza. Ele engole em seco e toma um gole de água. Em seguida,
ele empurra o seu prato.
“Acho que não estou tão com fome.”
Depois do que eu sempre chamarei do pior café da manhã,
vamos para o Vegas Ink. Quero uma nova tatuagem e tirei um
tempo para visitar o estúdio de Theo e ver seu trabalho.
Jonah diz quase nada no decorrer da viagem até lá. Mas só
quando o silêncio está começando a ser opressivo, de repente ele
encontra um sorriso, pega minha mão e a beija.
Vegas Ink está localizada em um minisshopping bem perto
da Strip. Suas paredes são vermelho fogo e coberta de exemplos
emolduradas dos trabalhos dos artistas de tatuagem de lá. As
cadeiras são estofadas de couro falso, também em vermelho, e
três artistas estão inclinados sobre os seus clientes, Theo entre
eles. O zumbido das agulhas quase é abafado pelo jateamento de
metais pesados no sistema de som. A recepcionista com a cabeça
raspada nos diz que vai avisar Theo que estamos aqui. Tomamos
um banco na área de espera, o que é realmente nada mais do que
um banco estofado perto da porta da frente, de frente para uma
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parede de fotografias. Clientes passam, revelando tatuagens
frescas, a pele ainda vermelha.
Jonah afunda pesadamente no banco e pega uma edição da
revista Inked.
“Tem alguma ideia do que você está querendo?” Ele
pergunta. É a primeira vez que ele fala voluntariamente durante
toda a manhã.
“Nada”, digo. “Mas estou ansiosa para ver o trabalho do seu
irmão.”
“Ele é talentoso como o inferno”, Jonah diz. “Meu pai fala
muita merda para ele. Você vai ver quando verificar o seu
portfólio.”
Balanço a cabeça e espero até que Theo aparece de canto,
chamando, “Oi, pessoal.”
O simples fato dele parecer otimista e animado me enche
de alívio e tudo, mas me levanto. “Ei. Obrigada por arranjar um
tempo para mim.”
Theo empurra o queixo em direção ao Jonah. “Você vem?”
“Vocês podem ir em frente”, Jonah diz. “Preciso ligar para
Eme. Ver o que está acontecendo com as peças que foram
vendidas.”
“Você não vai me ajudar a escolher alguma coisa?”
Pergunto, incrédula. Forço meu sorriso. “Ou onde no meu corpo
devo fazer?”
Atrás de mim, Theo tosse.
“Surpreenda-me”, Jonah diz. Ele pega seu telefone celular,
a conversa acabou.
Meu rosto queima, sigo Theo para a sua cadeira, passando
pelos outros artistas. Um deles é um cara enorme, corpulento,
com uma cabeça careca tatuada, que está colocando um spray
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feminino de flores violetas no braço de uma mulher. O outro
artista é uma jovem em roupas pretas e maquiagem pesada. Ela
tem grandes olhos verdes claros, quase de desenho animado em
seu rosto pequeno. Parece uma fada gótica. Ela me dá um aceno
enquanto pinta um sangue escorrendo de uma presa de uma
cobra sibilante na parte de trás da panturrilha da jovem.
Eu me sento na cadeira de Theo e pego um lenço de papel
da caixa que ela usa para limpar o sangue. Enxugo os olhos, mas
não tenho lágrimas. Minhas emoções estão muito confusas para o
meu corpo saber o que fazer, então eu me sento, ansiosa e
nervosa. Na minha frente, Theo se encosta ao pequeno armário
espelhado onde está sua pistola, agulhas e tinta.
“Vocês tiveram uma briga?” Ele pergunta em voz baixa.
“Não”, digo. “Ou sim. Quer dizer, talvez eu tenha feito algo
para irritá-lo, mas não sei. Ele está agindo de modo estranho
ultimamente. Desde a inauguração da exposição.”
A expressão petrificada de Theo endurece, mas seus olhos
vão em outra direção, enchendo-se de preocupação e algo que
parece com medo. Percebo que estou assustando Theo sem uma
boa razão, e aceno com a mão rapidamente.
“Você sabe o quê? Esta manhã ele disse que se sente
distraído. Sem ter que estar na Hot shop durante todo o dia, ele
não tem certeza do que fazer com o tempo livre. Acho que está
apenas descomprimindo.”
Theo balança a cabeça lentamente. “Faz sentido.”
“Posso ver o seu trabalho agora?”
Theo me entrega um fichário espesso de três anéis, cheio de
fotos e amostras de sua arte. Jonah estava certo: o talento de
Theo é incrível. Já vi a minha dose de tatuagens. Cada uma das
minhas tatuagens veio de alguém diferente, cada uma é linda e
perfeita para mim.
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Theo abrange a todos. Seu livro tem tudo: representações
básicas contorno preto, letras em qualquer fonte ou script que
você possa querer. Tatuagens de motoqueiro — rosas, crânios e
cobras. Retratos realistas, formas abstratas e complexas, góticos,
animais fantásticos, ícones da cultura pop. Página após página
cheia de arte. Se eu estivesse em um melhor estado de espírito,
poderia passar horas debruçada sobre o seu trabalho, certa de
que poderia filtrar uma ideia ou um conceito.
“Você é incrível, Teddy”, digo. “Este é o melhor portfólio que
já vi. Quero algo que ninguém mais tem, mas você torna difícil eu
ser mais específica.”
Quero Jonah sorrindo novamente.
Fecho a pasta e a entrego de volta para ele. “Deixe-me
pensar sobre isso, ok? Vou ligar ou mandar mensagem assim que
tiver uma ideia.”
“Claro”, ele diz, jogando o fichário na gaveta superior do
armário e fechando.
“Desculpe se desperdicei o seu tempo”, digo, levantando da
cadeira.
“Você não fez, Kacey”, ele diz. É a primeira vez que diz o
meu nome.
Nós voltamos para a sala de espera. Jonah está sentado à
vontade, passando o polegar distraidamente sobre o seu telefone.
Ele olha para cima quando nos aproximamos.
“Encontrou algo?” Ele pergunta.
Me abaixo ao lado dele e beijo sua bochecha. “Ainda não.
Seu irmão é tão incrivelmente talentoso, tenho que vir com algo
digno dele.”
Theo sacode a cabeça, braços grossos cruzados sobre a
camisa preta.
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“O que você quiser, ele consegue”, Jonah diz, finalmente,
colocando o telefone para longe.
Os irmãos trocam olhares, fico examinando o olhar de
Theo. “Esta noite é dia de sair com Dena e Oscar”, ele diz. “Você
ainda vem?”
Jonah sorri amargamente, uma expressão tão diferente
dele, tenho que piscar duas vezes. “Não há necessidade de manter
qualquer rotina agora”, ele diz. “Qual é o ponto? Eu te mando
uma mensagem e te aviso.”
Os braços de Theo caem para os lados. “Oscar e Dena estão
esperando sair...”
“Eu não disse que não, eu disse que vou te avisar.”
Os irmãos se enfrentam e, em seguida, Jonah dá a si
mesmo um aceno e um riso estranho. Ele se levanta e sai pela
porta sem nem dar um olhar para mim.
Sorrio fracamente para Theo. “Eu falo com você em breve.”
Ele agarra meu braço com força, então afrouxa o aperto,
mas não solta. “Se precisar de mim... Se ele precisar de mim,
ligue imediatamente. Ok?”
Penso em protestar e, em vez disso me encontro acenando.
“Ok”, digo em voz baixa.
Deixo Vegas Ink e subo na caminhonete de Jonah, que já
deu ré no espaço de estacionamento.
Ele não olha para mim quando fecho a porta e, finalmente,
não aguento mais.
“Que diabos está acontecendo?” Exijo. “Você acabou de sair
e me deixar lá?”
“Estava quente pra caralho”, Jonah diz. “Vim ligar o ar
condicionado.”
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“É outubro”, rebato. “Talvez uns 23 graus.”
“Então está aqui há três meses e de repente virou uma
especialista?”
Meus olhos se arregalam. Ele nunca falou assim comigo.
Nem uma única vez. “O que aconteceu com você?” Pergunto.
“Você está diferente desde a exposição na galeria. Aconteceu
alguma coisa? Dale Chihuly disse alguma coisa que o
incomodou?”
Jonah balança a cabeça. “Não”, ele diz, sua voz suavizando.
“Não, nada disso. Ele disse coisas surpreendentes sobre o meu
trabalho... Eu nem me lembro as palavras, mas ainda posso
senti-las, se isso faz sentido.”
“Então o que está te incomodando? Você pode me dizer.”
Jonah encontra meus olhos pela primeira vez no que
parece ser dias, e por uma fração de segundo, são quentes do
marrom rico do homem que eu conhecia. Em seguida, um muro
se ergue e ele dá um aperto na minha mão.
“Nada está me incomodando. Só não tenho nada para fazer.
Não há mais trabalho. Estou no humor para ficar em casa hoje e
assistir a um filme. Tem algum filme clássico dos anos oitenta
para assistir?”
Balanço a cabeça lentamente. “Aluguei um DVD de
Airplane!”
“Certamente você não pode estar falando sério?”
“Estou falando sério”, respondo sem entusiasmo. “E não me
chame de Shirley.”
É uma versão dolorosa e desajeitada do nosso humor
habitual. A imitação pobre da nossa brincadeira típica.
Talvez ele só precise de uma boa risada, penso.
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De volta ao meu apartamento, vamos até as escadas de
concreto no exterior, que levam ao segundo andar. Minhas chaves
da casa migraram para o fundo da minha bolsa. Só quando as
localizo percebo que Jonah não está mais atrás de mim.
Eu me viro. A pequena área de frente está vazia. “Jonah?”
Volto para trás da mesma maneira que vim, quase na ponta
dos pés.
Ele está sentado no meio da escada, de costas para mim. A
forma como seus ombros sobem e descem rapidamente trazem
um terror ao meu íntimo, como um vapor venenoso.
Ele não consegue respirar.
Desço as escadas com as pernas pesadas como chumbo,
agarrando o corrimão de metal enferrujado. Sento ao lado dele,
tentando manter a calma e não alimentar o pânico.
“Ei.”
Seus cotovelos estão apoiados sobre os joelhos, as mãos
balançando, assim como sua cabeça enquanto ele tenta aspirar o
ar. “Eu tentei subir muito rápido”, ele diz entre as respirações. E
joga a cabeça para trás, parecendo como um corredor que acabou
de fazer um sprint de quarenta e cinco metros.
“Tudo bem”, digo. “Estou aqui.”
Minha mente corre através das memórias de todas as
outras vezes que Jonah subiu aquelas escadas, ou levantou um
maçarico pesado, ou fez amor comigo vigorosamente. Em todos as
ocasiões ele ficou sem fôlego, por causa do dano que a doença
está fazendo em seu coração. Mas nunca foi assim. Ele sempre se
recuperava rapidamente.
Sempre.
“Eu menti”, Jonah diz, como se estivesse lendo meus
pensamentos. Ele recupera o fôlego lentamente, uma inspiração
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de cada vez. “Eu não estava subindo rápido demais. Eu estava
subindo.”
Ele olha para mim, a respiração, o suor escorrendo pela
testa, e seus olhos... Oh Deus, o medo que vejo neles. Um
pressentimento que me aterroriza no núcleo da minha alma. Ele
desvia o olhar e sem outra palavra, se ergue para levantar e
começar a subir novamente. Um pé em um degrau. Em seguida, o
outro. Quero tocá-lo, ajudá-lo, mas não posso. Eu não posso
admitir para mim mesma que ele precisa de ajuda.
Uma vez no meu apartamento, Jonah vai para a cozinha e
se serve um pouco de água. Então cai contra o balcão, inspirando
profundamente e até mesmo respirando.
“É a primeira vez que isso acontece?” Pergunto, minha
própria respiração descendo mais profundo do que a minha
garganta.
“Não”, ele diz. “De vez em quando. Desde a exposição.”
“Isso foi há nove dias”, digo. “Você fez...?”
Minhas palavras são sufocadas em um grito, quando Jonah
varre o recipiente de comprimidos do dia para fora do balcão. Os
comprimidos e cápsulas caem espalhadas em cores de azul,
branco e laranja, rolando e fazendo barulho sobre o meu chão de
linóleo barato.
Eu congelo na sala de estar, incapaz de falar.
“Eu pensei...” Jonah arranca suas palavras, engolidas,
depois cospe as próximas rapidamente. “Eu pensei que seria
suficiente. Mas é apenas uma porra de vidro. É areia aquecida,
porra. Quem se importa?”
“O que você está falando?” Digo, encontrando a minha voz.
“Seu trabalho? É lindo...”
“É besteira. E não significa nada. Não é importante.”
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“Claro que é.”
Ele dá um risinho de descrença. “Não, Kace. Não. Você é
importante. Você é a coisa mais importante na minha vida e sou
tão estúpido por pensar... a esperança...”
Suas palavras se apagam, e ele sacode a cabeça, lábios
apertados, olhos brilhando.
“Não fale assim”, consigo dizer depois de um curto silêncio.
“Você se cansou, e daí? Você teve uma semana desgastante,
depois de um grande evento. Eu me senti da mesma forma depois
do meu primeiro grande show.”
Vou para a cozinha e me agacho, recolhendo as pílulas.
Elas estão por toda parte, as lágrimas nos meus olhos borram as
pequenas manchas azuis, brancas ou laranja. Eu alcanço o
recipiente que deslizou sob a geladeira e coloco nele os remédios.
Todas as pílulas erradas em todos os dias errados, mas posso
corrigir isso depois. Posso consertar tudo. Eu sei qual é sua dieta.
Eu sei o que deve ir para onde. Eu posso corrigir isso.
“Você não pode simplesmente jogar isso fora”, digo,
fungando e limpando os olhos. “Você precisa dos remédios. Eles
são importantes.”
Jonah se vira para encostar a palma de suas mãos no
balcão atrás dele, com a cabeça pendendo, suas palavras caindo
no chão. “Eles não estão funcionando.”
“Sim, estão.”
“Kacey...”
“Você não desiste”, grito, fazendo-o recuar. Fazendo-me
recuar na histeria que está à espreita logo abaixo da superfície.
Olho para baixo — cheia de hostilidade. “Você está cansado, isso
é tudo. Vá tirar um cochilo. Empilhe os travesseiros na minha
cama e tire um cochilo. Vou limpar isso e pedir o jantar. Vamos
ver esse filme e dar grandes gargalhadas, ok?”
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Ele não me tranquiliza ou me diz que estou certa. Apenas
se desencosta do balcão e vamos para o meu quarto. Empilhamos
os travesseiros e ele deita sem protestar, afundando pesadamente
sobre a cama.
Porque ele está cansado e precisa de uma soneca, penso,
fechando a cortina. Isso é tudo.
Jonah joga o braço sobre os olhos, sem dizer nada. Estou
na porta quando ele chama meu nome.
“Sim?” Agarro-me no batente da porta.
“Sinto muito”, ele diz debaixo do braço. Agora ele parece
genuinamente arrasado. Exausto até o osso. “Lamento muito,
porra.”
“Não há nada para se desculpar. Apenas descanse. Você vai
se sentir melhor depois de um cochilo.”
Volto para a cozinha. Ainda há pílulas espalhadas por toda
parte. Eu as persigo, pego e amontoo dentro do recipiente, como
posso. As tampas não fecham. Pílulas caem das minhas mãos
trêmulas, rolando novamente. Fugindo de mim. Tudo está ficando
longe de mim. Deslizo até o chão na frente da geladeira e me
curvo em uma bola, chorando com as mãos tapando minha boca.
Choro fortemente, grandes soluços arfando estrangulados,
e sufocados. Choro até meu rosto doer. Sei que está vermelho e
feio, meus olhos inchados. Tenho que sair antes que Jonah
acorde e me veja assim.
Pego os últimos comprimidos soltos e fico trêmula ao
levantar de pé. Coloco o recipiente com cuidado sobre o balcão,
em seguida, lavo o rosto na pia com água fria. Seco com um pano
de prato, rastejo de volta para o meu quarto.
Jonah dorme agora, seus olhos já não estão cobertos pelo
braço. Suas pálpebras fechadas estão lisas, sua respiração
profunda e regular. Apenas um pequeno sulco em sua testa,
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como se o que o estivesse perturbando estivesse junto com ele no
sono.
Volto para a sala e procuro o celular da minha bolsa. Peço
uma pizza. Vegetariana. Que é melhor para ele. Ou talvez
saladas. Muito queijo em uma pizza...
Abro minha tela de agenda e clico em um nome. A voz
profunda e rouca atende.
“Teddy”, sussurro, lágrimas inundando meus olhos
novamente. “Está começando.”
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PARTE III
Um homem que vive plenamente está preparado para morrer a
qualquer momento.
— Mark Twain
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CAPÍTULO 39
kacey
No dia seguinte, Jonah vai para o Sunrise Medical para
uma biópsia do miocárdio. Alguém me diz — não consigo me
lembrar quem — que é um procedimento de laboratório de
mesmo dia, mas o seu médico, Dr. Morrison, quer que Jonah
permaneça durante a noite para mais exames. Exames de rim,
fígado e um eletrocardiograma.
“Namorada dele?” Dr. Morrison pergunta no corredor do
lado de fora da sala de Jonah. Theo fica ao meu lado.
“Sim”, digo, abraçando meus braços. “Kacey Dawson.”
“É bom conhecê-la, Kacey”, Morrison diz. Ele é um homem
adorável, com uma barba grisalha e olhos amáveis e atentos.
Gosto dele de cara, mas ao mesmo tempo em que trocamos
gentilezas eu grito com ele na minha mente...
CONSERTE ISSO.
FAÇA-O MELHORAR.
TRAGA-O DE VOLTA.
Dr. Morrison explica o que será necessário para Jonah
enquanto se recupera de uma biópsia. “Seria ideal se alguém
ficasse com ele nas vinte e quatro horas após o procedimento.
Presumindo que seja liberado amanhã de manhã como
planejado.”
“Por que ele não seria liberado?” Pergunto.
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“Não há razão neste momento. Vamos deixar os resultados
dos exames voltarem e veremos, tudo bem?”
Nós somos autorizados a ir ao quarto de Jonah então.
Deitado e reclinado na cama, um fluido intravenoso claro paira
sobre ele e está ligado na parte de trás da sua mão direita, a
agulha cravada logo acima de seu bracelete de alerta médico. Ele
nos lança um olhar de saudação. Ele tem estado mal-humorado e
silencioso durante toda a manhã. Inacessível. Quando Theo e eu
tomamos um assento em cada lado da cama, ele olha para
nenhum de nós, mas encara distraidamente a TV na parede que
está silenciada.
“Mamãe e papai estão a caminho”, Theo diz.
“Eles não precisam vir.”
“Você está no hospital”, seu irmão responde, mal mantendo
a ponta afiada de sua voz. “Você acha que a mamãe vai ficar
longe?”
Jonah dá de ombros e não diz nada.
“Oscar me mandou uma mensagem”, Theo continua. “Ele
está no trabalho e quer vir. Ele e Dena. Eu disse que não é uma
emergência.”
“Bom.”
Coloco minha mão sobre a de Jonah, consciente do
intravenoso. Ele não reage, não se mexe para pegar minha mão
ou olhar para mim. Eu engulo a dor rugindo dentro de mim, não
sou forte o suficiente para isso. Eu não sou, não sou, não sou...
Os olhos de Theo encontram os meus, penetrantes. Assim
como Lola, está pronto, apenas esperando que eu dê um grande
show, só que as apostas são um bilhão de vezes mais altas.
Você sabia que isso ia acontecer, digo a mim mesma. Você
sabia que não ia ser só longas caminhadas na praia em San Diego
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e fazer amor a noite toda, todas as noites. É isso. Isso é real, e
agora você vai ficar e aguentar.
Só que não acredito que nós realmente estamos aqui. Eu
sempre tive uma pequena chama de esperança e agora ela está se
apagando.
Um enfermeiro ou técnico traz um carrinho de rodas, e
Theo se levanta para dar espaço. Quando o Dr. Morrison e o
técnico se movimentam em torno das máquinas, o coração e o
pulso monitorado de Jonah apitam mais rápido, traindo a
expressão estoica no seu rosto.
“Ei”, sussurro.
Ele balança a cabeça, os olhos para a frente.
“Você quer segurar minha mão?”
“Eu vou esmagá-la.” Ele vira a cabeça no travesseiro e olha
para mim pela primeira vez durante toda a manhã. Dentro das
linhas frias planas de seu rosto, seus olhos estão cheios de terror.
Porque isso está acontecendo. Nós, nesse lugar terrível, e é pior,
muito pior, do que eu jamais poderia ter imaginado.
Eu não posso, não posso, não posso...
Solto a mão dele. “Talvez Theo, então...”
O queixo de Jonah se levanta, em seguida, desce.
Passo o meu lugar para Theo. Ele pega a mão de Jonah na
sua e vejo que trocam um olhar. Compaixão. Theo sabe o que
fazer, e Jonah confia nele.
O técnico dá a Jonah uma injeção de anestésico no
pescoço, logo acima de sua clavícula, enquanto o Dr. Morrison
prepara um instrumento de aparência horrenda.
“Tudo bem, Jonah”, Morrison diz, “você vai sentir uma leve
picada e depois uma pressão.”
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“Mentiroso”, Jonah diz, seu corpo inteiro está tenso e os
nós dos dedos estão brancos na mão que Theo segura.
“Culpado”, Morrison diz, seus olhos passando rapidamente
entre as mãos e o monitor que mostra a pequena câmera agora
enfiada dentro da jugular de Jonah. E posso ver tudo. Posso ver
dentro do corpo de Jonah, avistando um caminho estreito e
escuro para dentro do coração que está falhando.
“Quase lá”, Morrison diz. “Você está indo bem. Tente ficar
relaxado.”
“Respire”, Theo murmura. “Não prenda a respiração.”
Jonah deixa o ar sair pelo nariz, mantendo os dentes
cerrados. O monitor do coração continua a apitar a noventa e oito
pulsos por minuto.
“Aqui estamos”, o médico diz, e Jonah fecha os olhos.
Através do cateter, Morrison insere um biótomo — um
dispositivo com pequenas garras na ponta. Ele belisca um pedaço
do tecido do coração de Jonah, em seguida, recua de volta pela
veia.
Jonah faz um som profundo em seu peito, e tenho que
colocar minha mão sobre a boca para não fazer o mesmo.
“Eeeeee acabamos.” Dr. Morrison se direciona para a mesa
com a bandeja. O técnico guarda e rotula o pequeno pedaço de
tecido cardíaco para levar para o laboratório, enquanto uma
enfermeira se ocupa com o local da incisão. Morrison arranca as
luvas de látex azul e as joga em um recipiente de resíduos
hospitalar.
“Você foi muito bem”, ele diz, batendo na perna de Jonah.
“Ah, e aqui estão os seus pais.” Ele sorri calorosamente para
Henry e Beverly na porta. “Acabamos de terminar. Devemos ter os
resultados a qualquer hora amanhã de manhã.”
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“Maravilha”, Beverly diz através de um sorriso nervoso e
tenso. Ela acena para mim em saudação, em seguida, passa para
o lado de Jonah. “Como você está, querido? Você está tão bem.”
“Estou cansado”, Jonah diz, olhando para o nada. “Eu
gostaria de descansar um pouco agora.”
“Oh.” Beverly engole. “Mas nós chegamos aqui...”
Henry diz “Ele precisa descansar.” E pega sua esposa pelos
ombros. “Vamos, Beverly. Todos. Vamos deixá-lo dormir.
Podemos visitar em algumas horas...”
“Não”, Jonah diz. “De manhã. Voltem pela manhã.”
“De manhã?” A mão de Beverly se arrasta até o decote de
seu casaco.
“Enquanto aguardamos os resultados de vários exames,
vamos manter Jonah pelo restante do dia”, Morrison diz.
“Puramente como precaução.”
Ninguém se mexe. Olhares são trocados aqui e ali até que o
médico limpa a garganta e faz um gesto firme em direção à porta.
Todos nós saímos, e espero Jonah olhar para mim ou me chamar.
Ele não faz nada.
No corredor, os Fletchers perguntam. Theo responde. Dr.
Morrison explica. Fico em silêncio dormente, ouvindo o barulho
de sapatos com sola de borracha em linóleo quando os
enfermeiros passam. Máquinas apitam alarmes e uma voz ecoa
por um intercomunicador médico.
“Kacey?”
Eu pulo. Eles estão todos olhando para mim. O sorriso de
Beverly uma careta congelada enquanto seus olhos começam a
entrar em pânico. “Você vai ficar com Jonah depois que ele tiver
alta amanhã?”
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“Claro”, digo, consciente dos olhos de Theo em mim. “Na
verdade, eu deveria ir para casa e arrumar algumas coisas para
ficar mais...”
Os olhos cor de uísque de Theo encontram os meus. Em
seu olhar suplicante, posso ouvir um eco de uma conversa
anterior.
Você vai dar o fora...
Balanço a cabeça para ele, como se tivesse falado em voz
alta. “Estou indo arrumar uma bolsa”, digo. “Então voltarei. Eu...
Eu...”
Então Beverly coloca a mão no meu braço. “Sabe, Kacey, eu
adoraria um pouco de café. Você quer se juntar a mim?”
Eu respiro fundo e concordo. “Sim claro. Claro.”
Sua mão ainda está dobrada em meu cotovelo, nós saímos
para a primeira cafeteria mais próxima. Um espaço que
normalmente é associado com a escola, cheio de risos, gritos e
altas conversas cruzadas. A cafeteria do hospital é pouco povoada
e tranquila, como uma biblioteca. Apenas algumas pessoas
ocupam as mesas, comendo em silêncio. Um ou dois pacientes
em cadeiras de rodas se sentam com enfermeiros ou membros da
família.
Beverly pega uma pequena mesa perto da janela, enquanto
eu compro dois copos de café. Sentamos sem beber por um longo
tempo em silêncio, observando pequenos pássaros pretos em
torno do pátio exterior.
“É difícil para você estar aqui, não é?” Beverly diz depois de
um momento. “É difícil para todos nós, mas ao contrário de você,
a gente conhece Jonah a nossa vida toda. Antes do vírus. Antes
do transplante. Mas você o conheceu há apenas alguns meses.
Quando ele já estava doente.”
Balanço a cabeça.
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“E aqui está você”, ela diz. “Ele estava doente quando o
conheceu, mas aqui está você. Isso é uma coisa extraordinária,
penso, começar tão perto do fim.”
“Eu... estou com medo.” Coloco a minha xícara de café na
mesa antes de minhas mãos trêmulas derramarem-no. “Eu não
acho que sou forte o suficiente.”
“Posso te contar uma história, querida?” Seu tom diz, eu
vou lhe contar uma história e você vai me ouvir. Mas aprecio.
Preciso de distração. Preciso das palavras de outra pessoa para
empurrar para fora o medo e o pânico que ricocheteiam em torno
de meus pensamentos como um raio.
“Quando Jonah nasceu, eu mudei. Profundamente. Para
sempre. Acho que é assim com cada nova mãe. Você gasta nove
meses carregando esse pequeno ser dentro de você, isso é pouco
estranho, até que finalmente nascem, e você vê seu rosto...”
Ela olha fixamente para além da janela, além dos
passarinhos, a um momento de vinte e seis anos atrás. “Quando
vi o rosto de Jonah pela primeira vez, foi como ver alguém
novamente depois de uma longa ausência. Não é um encontro,
mas uma reunião.”
Ela estende a mão e brevemente acaricia a minha. “Eu amo
os meus filhos também, é claro. Mas eles são tão diferentes. Theo
e eu passamos nossas vidas inteiras conhecendo um ao outro e
nem sempre tem sido fácil. Mas com Jonah, é fácil.”
As sobrancelhas de Beverly arqueiam, como se ela estivesse
tentando lembrar alguma coisa agora esquecida. “Eu conheci o
Jonah antes. Eu sei que sim. Pode chamar de reencarnação ou o
que quer que você goste. Não sou religiosa ou mesmo
particularmente espiritual. Mas não posso deixar de sentir que o
universo é um lugar vasto, e a alma de um ser humano é infinita,
mesmo se o corpo for temporário.” Ela assente com a cabeça para
si mesma, certa agora. “Conheci Jonah antes, e sei que vou vê-lo
novamente. E isso me dá conforto. Não muito, mas um pouco.”
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Ela se vira para mim. “E você, Kacey. Você me dá conforto.
Bastante conforto nos dias de hoje, mais do que qualquer outra
coisa.”
Engulo o caroço irregular na minha garganta, mas não
posso me mover de jeito nenhum. As palavras de Beverly
embrulham em torno de mim e apertam até que tudo que posso
ouvir é a voz do meu próprio coração batendo no meu peito.
“Tenho certeza que você sabe que Jonah tinha uma
namorada séria na faculdade”, ela diz.
“Audrey.”
“Sim. A menina legal, mas séria. Orientada. Ela era...
precisa sobre como ela queria que sua vida fosse.” A boca de
Beverly se torna uma linha fina, e sua voz endurece. “Eu fiquei
zangada com ela por deixar Jonah quando ele mais precisava
dela. Furiosa. Mas você quer saber algo estranho? O dia depois
que ela voou para fora do país, no dia seguinte, recebemos uma
ligação dizendo que haviam localizador um doador. Não é alguma
coisa?”
Eu não digo nada. Nenhuma resposta é necessária, de
qualquer maneira.
“Jonah estava em cirurgia, e ela foi embora. Eu tentei
pensar em maneiras de contar a notícia e consolá-lo. Eu pensei
que certamente ele ficaria arrasado. Traído. No entanto, quando
pensava em seu tempo juntos, não podia me lembrar de qualquer
coisa que pudesse ser considerado uma grande perda. Nada de
importante em três anos. Seus olhos não brilhavam quando ele
olhava para ela em nossa mesa de jantar. Sua voz não se alterava
quando ele dizia o nome dela. Ele nunca falou dela com...
reverência. Apenas fatos. Audrey e eu estamos pensando em voar
para Cabo. Audrey e eu estamos participando da exposição na
galeria. Audrey e eu vamos jantar com amigos... Era uma
reportagem de acontecimentos.” Ela olha para mim, seu sorriso
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envolvido com uma tímida culpa. “Isso é mesquinho e cruel, mas
é verdade.”
“Eu entendo.”
“Seu coração não está bem agora, mas ele é muito saudável
de outras maneiras. Maneiras que eu sempre esperava ver
quando ele estava com Audrey, mas nunca foram observadas.”
Sinto um aperto no peito, uma antecipação de algo que
preciso ouvir, algo que irá me salvar da minha coragem vacilante.
“Jonah sempre insistindo em não falar sobre listas de
projetos”, Beverly diz. “‘Não faça lista de desejos para mim, mãe’.
Mas as mães... todas nós temos nossa própria lista para os
nossos filhos — esperança que temos para eles. Sonhos e
aspirações. Minha lista é completa, e todas as coisas que Jonah
nunca poderá fazer ou experimentar pesam sobre mim. São bem
pesadas. Um casamento, filhos...”
Ela olha para mim, com os lábios trêmulos, seus olhos
brilhando. “Apaixonar-se e ser amado em troca. Esse é o mais
pesado. Mas você está aqui agora. E a maneira como ele fala de
você...” Seus olhos se enchem e transbordam. “Seus olhos se
iluminam e ele muda sua voz quando diz seu nome. Seu sorriso
quando você entra em uma sala é uma das coisas mais bonitas
que já vi.”
Um calor formigante começa a se espalhar através de mim,
aquecendo-me contra o frio gelado de medo e dor. Beverly estende
a mão e afasta uma lágrima do meu rosto e segura meu queixo.
“E sabe ainda o que é mais bonito que isso, Kacey? Os seus
olhos se iluminam quando o meu filho está próximo. Sua voz
muda quando você diz o nome dele. E o sorriso que você estampa
quando está olhando para ele e acha que ninguém está vendo...
Esses são os presentes que eu nunca vou ser capaz de lhe
agradecer. Por saber que meu Jonah é amado. Ele vai deixar esse
mundo sendo amado, não vai?”
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Balanço a cabeça, com lágrimas em meus olhos. “Sim”, eu
sussurro. “Ele é amado e será amado para sempre.”
O sorriso de Beverly brilha em meio às lágrimas, como um
raio de sol através da chuva. “Muito bem.” Ela toca no meu rosto
e deixa sua mão cair. “Risque isso da minha lista, então.”
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CAPÍTULO 40
jonah
Seis semanas.
Dr. Morrison explica para mim. Os resultados da biópsia
são como eu esperava: o endurecimento das artérias está
acelerando, e exames de sangue mostram que a quantidade de
anticorpos do meu sistema imunológico está se desenvolvendo em
disparada contra o coração do doador. A insuficiência cardíaca é
iminente. Estou de volta à lista de doadores com pedido de
emergência, mas para adicionar insulto à injúria, os
medicamentos imunossupressores tem cobrado um pedágio dos
meus rins, comprometendo minhas chances de um segundo
transplante. Aos olhos do Conselho, eu não sou um candidato
viável.
Seis semanas. Não mais meses.
Questão de dias.
Dificilmente mais de mil horas.
Mas dentro dessas horas, milhares e milhares de
momentos...
Olho para as partículas de poeira que dançam em um raio
de luz da manhã na janela. Realmente, a luz está quente contra
as lâmpadas fluorescentes acima de mim.
Dr. Morrison chega perto da cama para colocar a mão sobre
o meu pulso. “Jonah?”
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E m m a S c o t t
Eu respiro fundo e exalando em um suspiro tempestuoso
de alívio, como se algo pesado tivesse sido pressionado no meu
peito e agora se foi.
O doutor aperta a mão no meu braço. “Jonah?”
“Estou bem”, digo, virando para ele. “Eu estou bem, na
verdade. Conhecer a verdade brutal... é melhor. Eu me sinto
melhor.”
Estranhamente, posso respirar novamente. A emoção
torcida de ansiedade, medo e pavor foram desaparecendo. Minhas
emoções têm estado em queda livre por uma semana, quando o
primeiro ataque de fadiga indevida me bateu pouco antes da
exposição na galeria. Kacey disse que andei estranho, lhe dando
com uma gama de emoções. Quente e frio, raiva e culpa, cheio de
medo e lutando para conseguir a paz. Passei através dos cinco
estágios do luto, um após o outro — cada etapa com duração
inferior a um minuto — em seguida, volto para o início para
começar novamente. Eu tive que mandar todos embora na noite
passada — até Kacey para que eu pudesse lidar com o inevitável.
Olho para o Dr. Morrison agora, uma sensação de paz em
cima de mim, e profundo alívio das emoções caóticas dos últimos
dias.
“Gostaria de falar com alguém?” Dr. Morrison pergunta.
“Um psicólogo, talvez? Ou o padre?”
“Eu quero apresentar uma queixa junto ao Conselho
Médico”, digo. “Pior. Biópsia. De todos os tempos.”
Ele ri. “Você sempre foi um dos meus pacientes favoritos,
Jonah. Sempre.” Sua risada se acalma. “Eu já tomei a liberdade
de explicar a situação para todos.”
“Obrigado”, digo. “Não é a melhor parte de seu trabalho,
presumo.”
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E m m a S c o t t
“Nunca. Mas eles sabiam que essa era uma probabilidade e
estão levando tudo muito bem. Tão bem quanto possível, melhor
dizendo. Eles estão esperando por você lá fora.”
“Dena e Oscar?” Pergunto.
Dr. Morrison assente. “Tania também.”
Eu balanço a cabeça. “E a minha namorada?”
Ele sorri. “Ela está aqui.”
“Estou aqui”, ecoa uma voz na porta. Kacey está com a mão
na porta. Seu rosto pálido, os olhos inchados e vermelhos, o
cabelo num rabo de cavalo desleixado caindo solto. Ela parece tão
fodidamente linda que mal posso respirar.
“Desapareça, doutor”, digo.
“Com prazer.” Ele se levanta e Kacey passa por ele vindo
em minha direção, e me abraça o melhor que pode sobre a cama e
enterra o rosto no meu pescoço.
“Preciso te dizer uma coisa”, ela diz, com a voz abafada.
“Preciso te dizer uma coisa também.” Eu a puxo para longe
o suficiente, também olhando para ela, afastando o cabelo que
ficou preso às lágrimas em suas bochechas, como vidro fiado. “Eu
tenho sido tão babaca com você, Kace. Sinto muito. Estava
pirando. Cada minuto que estava sentindo uma emoção diferente
e eu...”
“Eu te amo”, ela diz.
Olho para ela.
“Eu te amo”, ela diz. “Estou apaixonada por você.”
Suas palavras penetram no meu coração. Não o órgão no
meu peito, mas a parte de mim que quer bater para ela, viver por
ela. Eu me sinto saturado com calor e uma felicidade que não
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E m m a S c o t t
acho que é possível experimentar. Não em um momento como
este. Não em um lugar como este.
A mão de Kacey desliza contra a minha bochecha, os olhos
se enchendo. “Seu rosto agora? Nunca, em milhões de anos eu
poderia imaginar um homem olhando para mim do jeito que você
está me olhando agora. Eu te amo”, ela diz novamente. “Eu sei
que você quer me proteger e não facilito o seu trabalho. Só te amo
ainda mais por isso. Você não pode me manter a uma distância
segura. Eu te disse, não há distância segura. Nunca houve.”
“Você está certa”, sussurro. “Nunca houve. Eu te amo,
Kacey. Eu te amo tanto…”
Ela deita a cabeça para baixo outra vez, logo no ponto
sensível da minha incisão, mas não me importo. Amor e dor,
quero tudo.
“Eu te amo”, digo. “Deus, nunca pensei que isso iria
acontecer comigo.”
“Mas aconteceu”, ela sussurra. “Foi o que aconteceu e tudo
o que podemos fazer agora é cuidar uns dos outros. Viver os
pequenos momentos, certo? Assim como prometemos. Os
pequenos momentos. Temos tantos. Milhares e milhares deles.”
“Demais para contar”, digo. Aperto forte com meus braços
ao redor dela e a abraço. Tão perto de mim quanto posso, meus
lábios beijando seu cabelo. “E esse aqui... O melhor momento da
minha vida.”
Nos abraçamos por um longo tempo, e penso sobre as
escolhas de Kacey feitas para chegar a esse momento. Para estar
aqui comigo, sabendo que não iria durar.
“Você é tão valente” digo. “Você é a pessoa mais corajosa
que conheço.”
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E m m a S c o t t
“Eu não”, ela diz. “Corajosa ou com muito medo, não tenho
uma escolha, mas sim amá-lo.” Ela levanta a cabeça e funga. “É
tudo culpa sua, realmente. Você é tão amável.”
Rio um pouco. “Eu pensei que fosse um espertalhão
teimoso.”
“Isso também.” Ela enxuga os olhos. “Há um monte de
outras pessoas na sala que querem dar a você um pouco do que
se passa em suas mentes. Eu posso ir buscá-los?”
Balanço a cabeça, sorrio. “Sim. Todos eles. Eu quero
todos.”
Todos vieram, meus melhores amigos, meus pais, meu
irmão. Olho para o círculo de pessoas que mais amo e chamo a
atenção deles para o discurso que ensaiei uma centena de vezes
nos últimos seis meses. Eu pensei que estaria sozinho. Que teria
que enfrentar o inevitável com uma mão vazia. Mas Kacey
Dawson está lá, seus dedos entrelaçados com os meus. Não estou
sozinho e minha mão não está vazia.
Limpo a garganta dolorida. “Ok, pessoal, o plano é: não há
nenhum plano. Sem viagens. Nenhuma aventura. Sem lista de
desejos. Isto é o que eu quero: sair juntos. Vamos ter churrascos
e pequenos almoços. Um bom jantar em um restaurante chique
ou um almoço no Mulligan. Ou cupcakes de uma máquina
automática. Vamos conversar e contar piadas estúpidas e rir
muito e... viver.”
Acenos e murmúrios concordando.
“O que eu não quero é que alguém me pergunte como me
sinto uma centena de vezes por dia”, digo. “Prometo que vou dizer
se precisar de alguma coisa, mas tudo o que eu posso precisar ou
querer está bem aqui nesta sala. Vocês são os amores da minha
vida. Eu não quero nada, apenas ficar juntos o máximo que
pudermos. Dessa forma, quando chegar a hora...”
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E m m a S c o t t
Engulo em seco, a minha visão borrando os rostos das
minhas pessoas favoritas. “Vocês não precisam se preocupar se
eu estava feliz. Ou se eu tenho arrependimentos. Eu não tenho
nenhum.” Olho para Kacey, minha linda menina, e toco seu rosto
manchado de lágrimas. “Sem arrependimentos.”
“Não”, ela sussurra. Ela beija a ponta dos dedos e toca em
meus lábios.
Levo um momento para me recompor e, rapidamente, limpo
os olhos.
“Então esse é o meu grande discurso. Amo todos vocês e é
isso. Vamos dar o fora daqui.”
Meu público ri suavemente através de fungadas ou tosse, e
é como se uma tensão horrível tivesse sido afastada. Não quero
conformismo ou restrição. Quero ser eu mesmo e nada mais.
Eu quero os momentos.
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E m m a S c o t t
CAPÍTULO 41
jonah
Dois dias depois, Theo vem ao meu apartamento no final da
tarde.
“Onde está Kacey?” Ele pergunta.
Entrego a ele uma cerveja da geladeira e pego um chá verde
para mim. “Ela está fazendo compras no supermercado.”
Theo assente, caindo sobre o sofá. “Você não está
trabalhando hoje à noite?”
“Eu pedi demissão hoje”, digo, sentado na outra
extremidade. “Harry perguntou se fui roubado para uma outra
empresa de limusine.”
“O que você disse a ele?”
“Que a empresa dele é o único serviço de limusine que
trabalharei em toda a minha vida.”
“Merda, Jonah...”
“O quê?” Digo, sorrindo. “Vamos lá, foi um pouco
engraçado.”
Theo bufa, vira a cerveja em torno de sua mão. “Morrison
disse que seus rins estão comprometidos.”
“Aparentemente, sim”, digo.
Ele olha para mim. “E isso é o que está impedindo você de
ficar mais no começo da lista de transplante.”
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“Eu sei onde isso vai dar.”
“Só estou dizendo que eu poderia dar-lhe um rim”, Theo
diz. “Seria compatível. Seu corpo não vai rejeitar porque temos o
mesmo sangue. Nós somos irmãos. Você é meu irmão...” Sua voz
falha. Ele senta curvado, os cotovelos apoiados nos joelhos.
Espero até que ele se recompõe e coloco minha mão em seu
braço.
“A medicação acabaria destruindo esse rim, enquanto o
meu corpo destruiria um segundo transplante do coração graças
ao meu tipo raro tipo de tecido.” Eu lhe toco no ombro. “Portanto,
mantenha seus malditos órgãos internos para si mesmo.”
Ele ri. Uma pequena risada, mas verdadeira. “Bem. Mas é
só dizer uma palavra e ele é seu. Tudo o que você quiser ou
precisar... se eu puder dar a você, ele é seu. Ok?”
“Eu poderia ter um favor a lhe pedir.”
Sua cabeça dispara. “Qualquer coisa. Nome, me dê alguma
coisa...”
Mas a maçaneta sacode. Olho para ele, levantando um
dedo. “Agora não…”
Kacey aparece na porta, com os braços carregados de
sacolas de supermercado. “Ei, meus dois homens favoritos no
mundo em um só lugar. Deve ser meu dia de sorte.”
Theo se levanta para pegar as sacolas. Ela sorri e brinca
com ele por ser secretamente cavalheiresco. Em seguida, eles
guardam as compras, brigando levemente o tempo todo, enquanto
estou sentado no sofá e viro o meu sorriso, para eles não verem.
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E m m a S c o t t
Jantamos na casa dos meus pais naquela noite, como
fazemos quase todas as outras noites agora. Oscar, Dena e Tania
sempre são convidados. Quero meu povo em torno de mim o mais
rápido possível.
Logo no início, Kacey conversa com Tania, e Dena está
ajudando meus pais com o jantar. Oscar olha sorrateiramente
para a cozinha e puxa a cadeira para mais perto do mim. Ele
esfrega as mãos para cima e para baixo em seus jeans como se
suas mãos estivessem suadas.
“E aí, cara?” Pergunto. “Você está queimado com Dena?”
Um sorriso cintila sobre seus lábios, em seguida, vai
embora novamente. “Não, mas posso ficar se eu não fizer isso
direito.” Ele incha suas bochechas com ar e diz, “Eu vou pedi-la
em casamento.”
Endireito-me na minha cadeira, meu peito inundado com a
felicidade. Mas Oscar está nervoso o suficiente sem eu ficar
emocional sobre ele. Finjo choque total. “Mas Oscar, só se
passaram seis anos. Você tem certeza? Você não quer se apressar
para isso...”
“Eu sei, eu sei.” Ele ri e passa a mão sobre seu cabelo
curto. “Eu não quero estar com mais ninguém, mas não acho que
preciso — ou quero — alguma cerimônia ou um pedaço de papel
para deixar tudo oficial. Mas vê-lo com Kacey nestas últimas
semanas...” O sorriso de Oscar congela em seu rosto, seus olhos
sem piscar, como se pudesse bloquear a emoção para baixo antes
que posse se revelar. “Se você ama alguém tanto quanto eu amo
Dena, então você mantém essa pessoa com você, certo? Contanto
que consiga, o mais forte que conseguir.”
“Sim, cara”, digo suavemente. “Parece exatamente correto.”
Oscar balança a cabeça e espera um momento; Ele toma
um gole de cerveja e espero até que esteja pronto para falar
novamente.
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“Então, quando é o grande dia?” Pergunto.
“Ela tem que dizer sim primeiro”, Oscar diz, e limpa a
garganta. “Mas isso é outra coisa que eu queria falar com você. A
data. Eu quero que você esteja lá. Meu melhor amigo. Vegas é a
capital dos casamentos rapidinhos.” Ele para quando agito a
cabeça e as mãos. “O quê?”
“Você não pode ter um casamento apressado com Dena
Bukhari”, digo. “Você pode imaginar a nossa menina em um
vestido tradicional iraniano, em uma capela berrante sendo
oficiada por Elvis? Não, não. Ela precisa do pacote completo.”
Oscar se mexe na cadeira. “Eu sei isso. Mas os pais dela
estão em Londres e avós no Irã. A situação de visto, vai levar seis
meses.”
Eu me inclino para a frente e bato no ombro do meu amigo.
“É o suficiente para mim, saber que vai acontecer. Estou feliz por
você, cara. Por ambos. Dê a ela o casamento que ambos
merecem. Estarei lá em espírito.” Eu lanço um braço sobre ele.
“Literalmente.”
Oscar dá uma gargalhada e olha para longe. “Eu vou sentir
sua falta, cara”, ele diz para sua garrafa de cerveja.
“Obrigado por dizer”, digo, porque eu sei o quão difícil é
para ele admitir. “Sentirei sua falta também. Vocês dois. E estou
realmente muito feliz em saber que tomarão conta um do outro.”
“Ela vai cuidar de mim”, Oscar diz. “Eu vou passar o resto
da minha vida tentando não se um mimado.”
Rio e ele ri, e pulamos o obstáculo emocional, como uma
roda de carroça, finalmente, balançando sobre uma rocha. Eu
não preciso de lágrimas do Oscar para saber que ele se importa
comigo, ou esperar um monte de palavras sentimentais. Só
preciso estar perto dele e isso é o suficiente.
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E m m a S c o t t
Depois da sobremesa, meu pai bate a faca na lateral do seu
copo de vinho e pega um pedaço de papel dobrado do bolso da
camisa.
“Isto chegou pelo correio esta tarde”, ele diz. “Da Carnegie
Mellon. Presumi que era lixo eletrônico ou uma carta de
formulário. Ainda bem que eu abri.” Ele limpa a garganta e
começa a ler. “Prezado Senhor. Esta carta é para informá-lo, Jonah
Miles Fletcher, que você atingiu o grau de Mestrado de Belas Artes
da Universidade Carnegie Mellon e todas as honras, benefícios e
direitos conferidos na presente decisão...”
Há mais, mas a mesa explode em gritos e aplausos,
abafando meu pai. Os braços de Kacey passam ao redor do meu
pescoço, em seguida, ela empurra a cadeira para trás e se arrasta
bem no meu colo. Eu seguro seu rosto, olho para as profundezas
azuis de seus olhos. Ela é muito. Eu poderia passar um milhão
de vidas completas e nunca me cansaria dela.
Ela é um universo...
Percebo naquele momento que meu legado de vidro é
lamentavelmente incompleto. A noite se aproxima do fim, aos
poucos todos começam a sair, com abraços e apertos de mão, e
recolhendo os casacos. Puxo Tania lado.
“Sim, Mestre das belas artes?” Ela diz. “Como posso servilo?”
“Pare com isso”, digo. “Eu não teria feito nada se não fosse
por você.”
Ela acena com a mão. “Não foi nada.”
“Foi tudo. Devo-lhe muito, Tania. E eu…”
Ela se inclina para frente. “Sim…?”
Eu sorrio. “Percebi que eu poderia muito bem pedir-lhe
mais uma coisa.”
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E m m a S c o t t
Tania bufa uma risada e dá um tapa no meu braço. “Sou
muito boa, sabe.”
Tomo suas mãos nas minhas. “Encontre-me na Hot shop
amanhã?”
Seu rosto se ilumina. “Uma nova peça?”
“Uma última peça”, digo. “A peça mais importante da
minha vida.”
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E m m a S c o t t
CAPÍTULO 42
kacey
Dirijo de volta para o apartamento de Jonah com um
friozinho na barriga.
“O que você está rindo?” Ele pergunta.
Olho para ele. “Eu fico pensando sobre a sua confirmação
de grau.” O que é apenas parcialmente verdadeiro. Tenho planos
para a noite, e uma vez dentro do apartamento, o levarei para o
sofá.
“Eu tenho uma surpresa para você”, digo.
“Será que isso envolve você nua?”
“Talvez”, digo sobre meu ombro no caminho para o quarto.
“Me dê um minuto.”
Puxo uma caixa que guardei debaixo da cama. Há uma
dúzia de velas que coloco ao redor do quarto: em seu armário e
mesa de cabeceira, duas no parapeito da janela. Uma vez que
desligo a lâmpada, o quarto brilha com esferas de luz amarela
suave.
Tarefa feita, chamo Jonah para se juntar a mim.
Na porta, ele para e observa as velas, depois a mim. Ele
inclina seu antebraço alto no batente da porta, sua sobrancelha
arqueada. “Você não está nem remotamente nua.”
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“Ainda não”, digo, movendo-me para ele e passando minhas
mãos sobre sua camisa. “Eu sei que nós temos que ter calma,
então andei fazendo algumas pesquisas.”
“Pesquisa”, Jonah diz, tocando os braços em volta da
minha cintura. “Por algo erótico. O que você tem pesquisado?”
“O sexo tântrico”, sussurro. Então uma risada irrompe de
mim. “Oh meu Deus, isso soa brega demais. Mas eu li sobre isso
e acho que vai ser bom para nós. Seguro.”
Dr. Morrison não proibiu exatamente o sexo, mas já se
foram os dias de Jonah me levando contra uma parede em um
sexo de paixão desenfreada. Nós só dormimos juntos duas vezes
desde que ele teve alta do hospital, e apesar de nossos esforços
para ir devagar, em ambas ele sentiu uma assustadora falta de
ar. Era como se o coração acelerasse, como uma pedra que
lentamente é derrubada de uma colina íngreme e agora está
rolando, e ganhando velocidade a cada momento que passa.
“Quer tentar?” Pergunto.
“Como se eu fosse dizer não para você.” Ele estende a mão
para mim e nós nos beijamos, despimos um ao outro.
“Vem sentar na cama”, digo a ele. “Posição de Lotus.”
“Eu não falo Tantra.”
“De pernas cruzadas.”
Ele senta no meio da cama, conforme as instruções. Seus
olhos à luz de velas estão amplos e pesados de desejo quando eu
me arrasto para ele. Sento em seu colo, envolvo minhas pernas
em sua cintura, mas não o coloco dentro de mim, e de alguma
forma isso parece mais íntimo do que se eu tivesse.
“Eu gosto disso”, ele diz contra o meu pescoço. Sua boca se
move sobre meu queixo. “Me beije.”
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“Ainda não”, digo. “Nós temos que passar por todas as
etapas primeiro.”
“Etapas? Existe um manual que eu possa consultar?”
“Pare de rir.”
“Certo. Desculpa. O sexo tântrico é um negócio sério. O
primeiro passo é...?”
“Passo um: me segurar confortavelmente e olhar nos meus
olhos. Em nenhum outro lugar.”
Jonah descansa suas mãos nas minhas coxas, e seguro
seus braços que me prendem. Olho para os ricos de veludo
marrom de seus olhos.
Por todos os três segundos.
Nós dois quebramos o contato rindo, nossos corpos
inquietos com o nervosismo. Tentamos novamente, rimos
novamente, e continuamos tentando. Aos poucos, os risos
recuam. Eu relaxo e me sinto afundar em seu olhar. Com cada
piscar de olhos, a minha memória relembra um momento que
tivemos — milhares e milhares compartilhados — a primeira vez
acordando em seu sofá, agora, a cintilação da luz de velas em
torno de nossos corpos.
“E agora?” Ele diz suavemente.
“Agora nós compartilhamos a respiração um do outro”,
digo, aproximando os meus lábios, roçando nos dele. “Encontrar
o ritmo.”
É o que acontece rapidamente. Dentro de instantes
estamos respirando um para o outro, respirando como um. Ele
inala o que eu exalo. Eu respiro o que ele deixar sair, enchendo
meus pulmões com Jonah. O mundo e suas necessidades se
afastam. Tempo deixa de existir. Somente agora. Este momento.
E não preciso de nada, mas somente do que ele me dá.
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Com cada respiração, meus pensamentos se afastam.
Quando mergulho mais fundo na beleza de seus olhos, sinto eu
mesma deixar de existir. Não há eu. Sem ele. Somente nós. Nossa
pele se funde, criando uma terceira presença, compartilhando o
ar, a partilha de nossos corpos.
Seu domínio sobre meus quadris aumenta e ele me levanta
em cima dele. Uma pausa no ritmo da nossa respiração quando
Jonah desliza dentro de mim.
“Sim.” Sua boca forma a palavra sem um som.
Sim, isso…
Empurro para a frente, meus seios pressionados contra o
peito cheio de cicatrizes. Meus braços em volta de suas costas, as
pernas em torno de seus quadris, levando-nos tão profundamente
quanto posso.
Jonah desliza um braço em volta da minha cintura. Sua
outra mão desliza contra o meu rosto, seu polegar roçando meus
lábios. Nossa respiração em sincronia novamente. Nós não nos
movemos, apenas para respirar.
“Você”, ele sussurra.
“Você...” Tudo o que sei ou sinto ou vejo. Você. O mundo
inteiro em meus braços. As profundidades desdobram de seus
olhos. Um calor intenso dele dentro de mim. Um prazer macio,
pulsante que cresce a cada momento, até que começamos a nos
mover.
Nossos lábios se encontram em um delicado beijo,
profundo. Inspiro, reviro os quadris para trás. Expiro, empurro
para a frente. Jonah me segue, balançando sua pélvis contra a
minha. A maré, fluindo e refluindo. Ondas do mar que caem
suavemente sobre a costa quando nos beijamos e a respiração
compartilhada. Olhos abertos, nunca quebrando o contato, a
pesada dor de prazer toma mais peso, cresce mais intensa.
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E m m a S c o t t
“Kace”, ele sussurra.
Enfio os dedos pelo seu cabelo, adicionando novos pontos
de contato, novas conexões. Eu o sinto em cada poro, cada
respiração e bater do nosso coração. Eu nunca experimentei nada
assim na minha vida. Ele é um universo. Meu amor por ele é tão
sem limites.
Lágrimas enchem os olhos quando os nossos corpos rolam
e deslizam em direção a um prazer agridoce. Lágrimas de amor.
Para a perda. Para as semanas que ainda temos e os anos que ele
não tem. Para a alegria e o riso, a mágoa e tristeza. Para este
homem solitário e a mulher perdida que ele resgatou. Para nós, e
o tempo se aproximando rapidamente, quando haverá apenas eu.
Fecho os olhos, mergulho em seu beijo, e vou em direção ao
clímax. Ele se ergue e rola através de nós, em suaves estocadas
em câmera lenta, em vez de um rebentar.
“Olhe para mim”, ele sussurra. “Não pare.”
Abro os olhos.
“Eu te amo, Kacey.”
“Jonah.” Meus olhos são apenas ele. Minha respiração é
para seus pulmões, minhas lágrimas umedecem sua pele. Minhas
mãos são feitas para ser envolvidas em seu cabelo. Nasci para
senti-lo em cima de mim para sempre.
“Jonah ... Meu Jonah...”
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CAPÍTULO 43
jonah
Giro o maçarico para frente e para trás. O vidro na
extremidade é do tamanho de uma bola de boliche infantil, mas
sinto uma centena de vezes mais pesado. Minha respiração é um
chiado raso dentro e fora do meu peito — não consigo respirar
fundo a menos que esteja sentado.
“Tania...”
Ela tira o maçarico da minha mão enquanto sento
pesadamente no banco e o coloco sobre os trilhos. Recomeço
rolando e moldando. Meus braços parecem chumbo quando pego
os valetes e os serro. Tania está lá, suas mãos cobertas com luvas
grossas, em forma de concha sob a esfera.
“Pare se você tiver que parar”, ela me diz.
Eu não respondo. Não tenho fôlego e não teria parado de
qualquer maneira. O globo de vidro solta do tubo e Tania o pega
habilmente em suas mãos. Ela o leva para o forno, mas é muito
grande para que consiga segurá-lo e abrir a porta.
Usando o maçarico como uma bengala, me impulsiono para
levantar e ando tão rápido quanto posso nos três metros. Abro a
porta do forno e Tania coloca cuidadosamente o vidro dentro,
enquanto caio contra a parede, tentando recuperar o fôlego.
Ela arranca as luvas para definir o temporizador de
resfriamento, em seguida, pega-me pelos braços.
“Diga-me…”
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Temos um acordo de pé, eu e meu círculo de pessoas. Eles
não perguntam se preciso de ajuda, desde que prometi dizer se eu
precisasse.
“Estou bem”, digo, e é verdade. Meu coração é como um
coelho no meu peito, rápido e irregular, mas está se acalmando.
Meus pulmões sugam mais e mais ar e, finalmente, sou capaz de
me empurrar para fora da parede.
Tania engancha seu braço no meu e ajuda. Juntos,
olhamos através da porta de forno de vidro.
“Está feito”, digo. Levou duas horas por dia, durante quatro
dias, mas está pronto.
“É a melhor coisa que você já fez”, Tania murmura.
“Porque amá-la foi a melhor coisa que já fiz.”
Desligamos tudo, limpo a mesa de trabalho e nos dirigimos
para as portas de correr da frente. Paro e me viro, observando o
espaço que é como uma segunda casa para mim.
“Você se esqueceu de alguma coisa?” Ela pergunta.
“Não. Estou apenas…”
Me despedindo.
“... lembrando.” Olho para a minha assistente. Há lágrimas
em seus olhos. “Você vai cuidar da última peça?”
Ela assente com a cabeça. “Tem sido uma honra e um
privilégio trabalhar com você.”
“Pra mim também, Tania. Eu só queria poder ficar por aqui
para ver a sua brilhante carreira.”
“Eu também, caramba”, ela diz ferozmente, e joga os braços
em volta do meu pescoço. “Embora não tenho certeza sobre o
brilhante...”
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E m m a S c o t t
Eu sei. Ela se inscreveu para o Studio Chihuly em Seattle.
Sei que o representante de Dale recebeu a minha carta de
recomendação, e sei que eles estão ‘extremamente
entusiasmados’ com o trabalho de Tania. Sei que estarão a
notificando em breve para marcar uma rodada de entrevistas e
uma avaliação em estúdio.
Eu poderia lhe contar o que está por vir, mas alguns
momentos — quando ela abrir aquela carta do Studio — são para
serem vividos no momento em que acontecem.
Eu também sei disso.
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CAPÍTULO 44
kacey
Numa manhã, Jonah está mais lento para sair da cama, e
quando levanta é só para ir à cozinha antes de parar para
descansar as mãos no balcão, recuperando o fôlego. Ele passa a
maior parte do dia na cadeira na sala de estar.
A velocidade do seu declínio me aterroriza. Segundos
escorregam, levando nossos momentos com eles. Luto para
agarrá-los. Para fazer deles alguma coisa que seja mais do que o
medo, a dor e agonia. Perder Jonah é uma agonia, e se eu pensar
nisso devagar, por um momento, me afogaria.
Tenho que me manter em movimento. Ficar à frente, pelo
amor de Jonah e pelo meu. Faço telefonemas, preparo seus
medicamentos e faço as nossas refeições. Acompanho os banhos,
o ajudo a lavar o corpo e o cabelo, em seguida, ajudo a sair. Faço
um jogo de paquera dele, mas além de alguns beijos quentes, o
corpo de Jonah está desligado.
Larguei meu emprego no Caesar’s alguns momentos atrás,
e estou vivendo do último dinheiro da Rapid Confession. Esses
fundos estão diminuindo também, mas não há nenhuma chance
de deixar Jonah agora. Se eu perder meu apartamento, que assim
seja. Por agora, estou vivendo na casa de Jonah e, mais tarde
tenho muitos amigos em Las Vegas com quem posso ficar até
poder caminhar com meus próprios pés.
Como se o universo estivesse me testando, Jimmy Ray me
ligou uma tarde e me ofereceu tudo o que eu poderia desejar: um
novo contrato com a RC, um contrato de solo adicional para
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E m m a S c o t t
escrever e produzir o meu próprio álbum, e um adiantamento que
teria me deixado estabilizada por anos.
“A gravadora está desesperada por você”, ele diz. Sua voz é
amorosa, mas praticamente posso sentir seu desespero através
do telefone. “Elle é uma boa menina, mas não é você. Você esteve
lendo os jornais? Os fãs a querem de volta. Nós queremos você de
volta.”
Eu quis rir do ridículo. Jimmy conversa como um
negociante de carro usado ou um feirante. O que ele oferece é tão
superficial e barato em comparação com o que tenho com Jonah.
Por toda a dor que está vindo — e que Deus me ajude, pois será
uma avalanche — valeu a pena. Jonah vale tudo.
“Não, obrigada, Jimmy.”
Ouço um grito e uma gagueira. “Não, obrigado? Você vai
arruinar tudo para quê? Pelo motorista da limusine?”
“Sim.”
“Ouça, gatinha, este é o meu ato de desespero. Não quero
jogar sal em uma ferida, mas Lola disse que ele está morrendo. E
você vai escolher ele ao invés de tudo o que estou oferecendo?”
“Não”, digo. “Não estou escolhendo nada. Não há escolha.
Nunca houve.”
Silêncio nunca soou tão bom.
Eu desliguei.
Na manhã seguinte, verifico meu saldo bancário no laptop
com um olho quase fechado, preparando-me mentalmente para
ver um monte de zeros, ou dígitos vermelhos com um grande
sinal negativo na frente deles. Em vez disso a minha tela mostra
US $ 5000. Um depósito foi feito, vindo de uma conta da Wynn
Galleria.
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E m m a S c o t t
Encontro Jonah descansando no sofá, assistindo When
Harry Met Sally — eu o converti completamente para a religião
dos filmes dos anos oitenta. Estou na frente dele, coloco as mãos
nos quadris e tento o meu melhor para levantar uma
sobrancelha, sem a ajuda do meu dedo.
Ele olha para a minha tentativa fraca. “Ou você está com
uma dor de cabeça muito ruim... ou você está tentando ler algo
impresso a um quilômetro de distância.”
“Cinco mil dólares misteriosamente apareceram na minha
conta corrente.”
O sorriso de Jonah desaparece. “Lamento, isso não é
muito.”
“Muito?” Afundo no sofá ao lado dele. “O que é? De onde
vem?”
“É o que restou da venda na exposição da galeria depois
que paguei a hipoteca dos meus pais e dei ao Theo o suficiente
para começar seu próprio studio de tatuagem.”
“Seu próprio studio. Puta merda, você é um manda chuva.”
“Eu acredito nele”, Jonah diz simplesmente. “Acredito em
você. Cinco mil não é muito, mas desse modo você pode
continuar a viver aqui, conseguir um novo emprego, e continuar
trabalhando em seu álbum. O que você quiser fazer.”
“Não preciso disso”, digo, minha garganta se enchendo de
lágrimas. “Posso pensar em alguma coisa...”
“Eu sei que você pode”, ele diz. “Você pode ficar por conta
própria, mas se posso tornar mais fácil para você, farei isso.”
Balanço a cabeça, piscando as lágrimas. Não posso chorar
muito estes dias. Depois que começo, tenho medo de que nunca
consiga parar.
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E m m a S c o t t
Jonah me puxa para baixo e fico deitada enrolada com ele,
minhas costas contra seu peito. Na TV, a cena está em New Year’s
e Harry corre para a festa, para Sally, para declarar seu amor por
ela. Porque ele queria que o resto de sua vida começasse o mais
cedo possível.
“Minha vida começou neste sofá”, sussurro. “No momento
que acordei naquela manhã.”
Ele acena com a cabeça contra a minha cabeça. “A minha
também, Kace. A minha também.”
Naquela noite, deitamos juntos na cama, nos beijando
suavemente. Minhas mãos percorrem sua pele, tentando
memorizar cada linha e contorno. Esperando, querendo que
chama baixa de desejo se desperte e pegue fogo.
“Querida, estou tão cansado”, diz ele.
“Isso não é problema”, digo, sorrindo largamente,
esforçando-me para transformar a minha voz trêmula em
sedutora e brincalhona. Passo as mãos pelo seu peito, em direção
à cintura de suas calças de pijama. “Talvez, um pouco de
estimulação oral?”
Jonah balança a cabeça contra o travesseiro. “Não essa
noite, Kace.”
Foi o décimo ‘não essa noite’ consecutivos, e o sorriso
escorrega do meu rosto como a máscara frágil que é.
Não essa noite. Mas por trás dos olhos de Jonah, por trás
do calor, tristeza e as infinidades de pensamentos, leio o que ele
está realmente dizendo.
Não essa noite.
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E m m a S c o t t
Não qualquer noite.
Nunca mais.
“Ok”, digo, com a respiração apertada no meu peito que, de
repente pesa quatrocentos quilos, lágrimas queimam meus olhos
e estou muito lenta para me virar e fraca demais para segurar.
“Eu odeio essa parte”, ele diz.
“Shh.”
“Eu sinto muito.”
“Não. Não se desculpe, Jonah. Lamentar significa que você
gostaria que não tivesse acontecido, e não o perdoaria por isso.
Você lamenta?”
Ele balança a cabeça, seus próprios olhos cheios. “Estes
últimos meses têm sido tudo.”
“Tudo. Eu não estou arrependida. Mas vou chorar um
pouco agora, ok? Não posso evitar. Eu não posso...”
Não posso te perder, é o que eu queria dizer, mas vou
perdê-lo, e então choro e ele me abraça até que eu paro.
Limpo meus olhos, em seguida, tiro minha camisa e solto o
sutiã.
“O que você está fazendo?” Ele murmura com uma voz
sonolento, moderando sua voz para dizer qualquer coisa, para ter
ar suficiente para falar.
“Quero estar perto de você.” Aconchego-me abraçada contra
ele. Ele cheira a calor e sabão e seu próprio perfume que é
exclusivamente dele.
Jonah me segura perto e cai no sono rapidamente, está tão
terrivelmente cansado o tempo todo, mas fico acordada por
longas horas, a minha forte batida do coração contra o seu não
tão forte. Eu quero toda a força que tem dentro dele. Tento
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visualizar uma corrente de energia, vibrante e dourada, que
emana de, se infiltrando nele. Fazendo-o melhorar. Deixando-o
bem.
Não me deixe.
Na manhã seguinte, ele acorda com falta de ar, mal
conseguindo sentar sem ajuda. Nossos olhos se conectam e ele
passa os dedos ao longo da minha bochecha. “Está na hora.”
Pensei que fosse desmoronar contra ele, em seguida, chorar
e lamentar deixando a tristeza sair de mim. Deus sabe o quanto
quero. Mas então eu teria que levá-lo para o hospital e este último
momento, aqui na nossa cama, teria sido desperdiçado em choro.
Em vez disso, eu o beijo como amante — com profundidade
e duradouro, com tudo o que tenho. Com cada gota de amor
infinito que habita em mim.
Beijo Jonah Fletcher com todo o meu coração, e com cada
pedaço da minha alma que irá amá-lo para sempre.
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E m m a S c o t t
CAPÍTULO 45
kacey
Eles colocam Jonah em um quarto privado, perto do
elevador, da capela, máquinas de venda automática e dos
banheiros. Nosso círculo de amigos e familiares — os sete, liguei
para eles — têm acesso a tudo o que precisamos, nos permitindo
acampar na sala de espera.
Ninguém vai embora por mais de algumas horas de cada
vez, e sempre verificando por mensagem a cada poucos minutos:
Ele está bem?
Qualquer notícia sobre um doador?
O que o médico disse?
As respostas permanecem as mesmas durante as primeiras
vinte e quatro horas: Jonah está descansando, não há notícias de
um coração para transplante e o médico disse que não é
susceptível de obter um. Jonah, com seus rins — devastados
pelos medicamentos — está falhando e ele foi colocado em diálise,
o que está sendo bom para ele, mas não o elege para um segundo
transplante de coração.
“Se você me deixar dar um dos meus...”, Theo diz. Ele
parece terrível — com anéis escuros sob os olhos vermelhos. Ele
não teve uma noite de sono decente em semanas.
“Isso não ajudaria”, Morrison diz. “A contagem de
anticorpos dele está muito elevada. A doença está muito
implacável.”
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E m m a S c o t t
“Então, simplesmente o tiram da lista?”
“Nem um pouco”, Morrison diz. “Jonah nunca foi removido
da lista de transplante. Mas se um novo coração estivesse
disponível, já teríamos ouvido. Sinto muito.”
Ele se vira para ficar de frente com nós sete. “Neste
momento, a melhor coisa para Jonah é permanecer confortável e
passar tempo com vocês.”
“Ele não está com dor, não é?” Henry diz.
“Não”, Dr. Morrison diz gentilmente. “E farei tudo ao meu
alcance para garantir que ele continue assim. Eu prometo.”
Nos próximos dois dias, permanecemos em seu quarto,
conversando e relembrando. Rindo perto dele e saindo para
chorar no corredor. No terceiro dia, quando Jonah está lutando
através dos minutos, alguma realização instintiva toma conta do
grupo.
É hora de dizer adeus.
Tania, Oscar e Dena se revezam sozinhos em seu quarto.
Em seguida, os Sete se tornam Quatro: os Fletchers e eu.
“Como você está?” Pergunto a Theo. Sentados em cadeiras
na sala de espera, enquanto Henry e Beverly estão com Jonah.
“Meu irmão morrendo e não há uma maldita coisa que eu
possa fazer sobre isso. É assim que estou.”
Olho para as minhas mãos durante um momento de
silêncio.
“Como você está?” Ele pergunta.
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“Eu realmente não posso ficar aqui sozinha”, digo. “Posso
segurar sua mão?”
Theo se senta ao meu lado. Sua mão grande, forte
engolindo a minha. Estudo as tatuagens que serpenteiam em
torno de seus antebraços.
“São projetos seus?”
“Algumas.”
“O que o atraiu à tatuagem?” Minha voz soa como se
tivesse gritado por horas — chorado — rouca.
“Permanência”, Theo diz. “Tatuagem é a arte que corrói
profundamente. Deixa sangue. Nunca pode ser lavada. Ela dura.”
Ele olha para mim com seus olhos cor de uísque. “Você ficou.”
Eu sorrio. “Eu quero uma tatuagem sua.”
“É só dizer.”
“Não tenho certeza ainda. Vou pensar sobre isso.”
Ele balança a cabeça e esperamos, de mãos dadas. Os
Fletchers saem com Beverly parecendo frágil e delicada, Henry
ereto, estoico e duro com sua dor fervendo abaixo da superfície.
“Theo, querido”, Beverly diz em uma voz trêmula. “Ele quer
ver você.”
Theo entra, e eu me sento apertada entre os Fletchers,
segurando suas mãos, descansando minha cabeça em seus
ombros. Eles não são os meus pais, mas eu os amo. E me sinto
amada por eles de uma forma que nunca fui com meus próprios
pais. Mesmo Henry, com seu carinho reservado, é um milhão de
vezes mais quente do que meu pai.
Eu não pensei nele desde San Diego. Ou em minha mãe.
Eles nunca conheceram Jonah, e agora eles nunca o
conheceriam.
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E m m a S c o t t
Eles quem perdem, penso amargamente, mas no instante
seguinte a amargura se transforma em um orgulho feroz, e até
mesmo alegria. Eu conheci Jonah Fletcher. Fui amada por ele, e
foi um privilégio e gostaria de levar comigo para o resto da minha
vida.
Theo surge, parecendo confuso. Ele me dá um olhar
estranho, não consigo distinguir, em seguida, diz “Ele está
chamando por você.”
Jonah está deitado na cama de hospital, reclinado assim
como fazia em sua cadeira no seu apartamento. A cânula nasal
corre abaixo de seu nariz, fornecendo oxigênio, mas sua
respiração é irregular. Ele toma pequenos goles de ar, o peito
sacudindo em vez de subir e descer. Seus olhos escuros estão
gritantes contra o seu rosto pálido. Seu cabelo grosso agora está
fino e quebradiço. Tubos e fios instalados em seu braço direito,
fixados com fita branca. A máquina de diálise apita
continuamente do lado da cama. Outra monitora seu coração. Eu
não entendo os números de pressão arterial, mas o salto, tic
elétrico de seu pulso no monitor soa rápido e agitado nos meus
ouvidos.
“Você mandou me chamar?” Digo, enquanto afundo na
cadeira ao lado da cama. Eu me inclino em meus cotovelos no
colchão e pego a mão dele na minha.
“Estou arrancando promessas”, ele diz, entre respirações
curtas e superficiais. “Ninguém... pode dizer não para um cara...
na minha posição.”
Tento encontrar uma resposta inteligente, mas não tenho
nenhuma. Somente o desejo dele estar em outra situação que não
essa.
“Você quer alguma coisa?” Pergunto. “Qualquer coisa
mesmo.”
“Não, Kace. Só você. Aqui comigo.”
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Balanço a cabeça. “Estou aqui. Não estou indo a lugar
nenhum.”
Ele sorri com um tique fraco de seus lábios. “E que que
você me prometa uma coisa.”
“Qual é?”
“Prometa-me”, Jonah diz. Sua voz é fraca e suave, mas uma
intensidade desesperada envolve seu olhar.
“O que, baby...”
“Amar de novo.”
Olho um instante, depois sacudo a cabeça.
Ele luta para conseguir um fôlego. “Há muito mais para
você do que nós, Kace. Por favor... não se prenda. Você tem muito
para dar. Tanto amor, Kacey... tanto.”
Meu peito se aperta. “Eu não posso sequer pensar nisso
agora, Jonah...”
“Com o tempo”, ele diz. “Prometa-me. Se você encontrar
alguém...”
“Nunca.”
Seus dedos tecem os meus. “Não. Você vai. Ame o cara.
Ame-o com tudo. Como você me amou. Ame-o mais.” Seus olhos
se fecham. “Estou tão feliz, Kace. Como nunca antes em minha
vida. É um presente. Você sabe?”
Acaricio com os meus dedos ao longo de seu rosto. “Eu sei.”
Seus olhos se abrem lentamente. “Faça outra pessoa... tão
feliz como sou agora. Ok? Promete?”
Eu quero balançar a cabeça e dizer que não posso prometer
isso. Nunca poderei cumprir. Eu nunca mais sentirei por
ninguém o que sinto por ele.
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E m m a S c o t t
“Eu te amo, Kace”, ele diz entre soluços rasos de pouco ar.
“Eu te amo tanto. Prometa…”
“Eu amo você, Jonah. E... Ok. Sim. Eu prometo.” Lágrimas
derramam sobre o meu rosto enquanto eu concordo. “Eu
prometo.”
Seus olhos se fecham novamente. Seu corpo se acomoda
nos travesseiros e sua inspiração seguinte parece suave, exalando
aliviado. Os cantos de sua boca se elevam, em seguida, se
estendem ainda mais. Ele sorri. Ele está bonito, então. Pacífico.
Sereno.
“Eu preciso te dizer uma coisa”, digo. “Eu sei que você está
cansado. Apenas descanse e ouça.”
Ainda sorrindo, ele assente. “Ainda aqui.”
“Eu te amo”, digo. “Você é a melhor coisa que já aconteceu
para mim. Eu não mudaria um segundo de nosso tempo juntos.
Nenhum.”
“Kace...” ele suspira. Sua mão na minha sacode, tentando
levantá-la. Levo-a para ele e aperto minha bochecha na palma da
mão. As pontas dos dedos esfregam lentamente no meu cabelo.
“Meu coração está destroçado”, digo. “E estou tão feliz.
Você me faz tão feliz. Seu amor me deixou forte. Você me fez uma
pessoa melhor...” Soluços são como pequenas facas na minha
garganta, palavras tentando se esquivar ao seu redor. “Ser amada
por você, Jonah... é a maior honra da minha vida.”
Ele olha para mim, as lágrimas escorrendo pelo seu rosto
pálido. “Deus, você... Tão linda”, ele sussurra. “Tão bonita. Não
quero parar de olhar para você... mas... cansado.”
“Durma”, digo, puxando o lençol. “Estarei aqui quando você
acordar. Eu vou estar aqui o tempo todo.”
Debruço-me sobre ele, beijo seus lábios suavemente, e
seguro seu rosto em minhas mãos. “Eu te amo.”
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E m m a S c o t t
“Eu te amo, Kace. Te amo...” Seus olhos se fecham, e
dentro de um minuto, ele dorme.
Eu descanso minha cabeça dolorida na cama ao lado dele,
exausta além de qualquer coisa que já tinha conhecido. Sinto-me
vazia de tudo. Nenhuma alegria, nem dor, nem esperança e sem
arrependimento.
Deixo nenhuma palavra não dita.
Minha cabeça no quadril de Jonah, afundo no sono, onde
sonho que estou flutuando em um mar de vidro. Suspensa e sem
peso, beleza que me rodeia nas fitas coloridas e redemoinhos de
luz. Silêncio. Pacífico.
Feliz.
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E m m a S c o t t
CAPÍTULO 46
jonah
Kacey...
Sem arrependimentos.
Apenas amor.
Só você.
Posso ver uma praia recuando sob um céu cheio de
estrelas. Milhões e milhões de estrelas. Milhões e milhões de
momentos. Todos eles com o nome dela.
Eu a amo mais do que amei alguém e sou amado em troca.
O reconhecimento está gravado em mim, trancado em meu
coração, e quando paro de lutar contra ela e deixo meus olhos se
fecharem...
Não posso mais ver a praia, mas sei que está lá.
Um vento sussurra, como um sopro. Minha última
respiração.
Eu te amarei para sempre.
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E m m a S c o t t
CAPÍTULO 47
kacey
Quatro dias depois...
Sento na cama, ainda usando meu vestido preto, embora o
funeral tenha acabado há muito tempo. Minha mão agarra um
lenço enrugado e úmido de lágrimas e enegrecido com rímel.
A partir dos pedaços que eu posso lembrar, foi um belo
funeral. Amigos de Carnegie vieram, juntamente com professores
e instrutores. Um representante da Chihuly Estúdio trouxe uma
escultura de vidro requintado de lírios brancos para a mãe de
Jonah e uma nota de condolências do próprio Dale. O mundo
tinha perdido um novo talento vibrante muito cedo, ele escreveu.
Um padre falou, Dena recitou um poema, e todos se
revezavam falando sobre Jonah: contando histórias engraçadas, a
partilha de memórias comoventes. Mais e mais, ouvi as pessoas
dizendo como ele as fez rir, como ele trouxe o melhor de todos.
Como sua crença neles os fez serem valentes. Eu acho que eu
também fui.
Depois, Beverly veio para onde Theo e eu ficamos juntos,
com uma pequena urna de bronze em suas mãos.
“No deserto, à noite, sob as estrelas”, ela diz, pressionando
a urna nas mãos de Theo. “É o que ele queria. Mas não consigo
fazer. Eu não posso...”
Eu não posso, penso, sentada sozinha na minha cama. Não
quero ficar aqui sem você. Preciso de você.
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E m m a S c o t t
Apenas uma batida na minha porta me desperta e me
obriga a me mover. Tania do lado de fora, ainda em seu vestido
preto do funeral, com os olhos avermelhados. Em seus braços
está uma caixa de papelão.
“Eu não posso entrar”, ela diz. “Vou para Seattle amanhã e
ainda tenho uma tonelada de coisas para embalar.” Ela coloca a
caixa em minhas mãos. “Mas isto é para você.”
“O que é?”
“Jonah fez isso para você. Eu ajudei, mas ele fez o trabalho.
Deus, sua arte... Ele era um mestre. Ele soprou sua vida na sua
obra. Eu nunca vou trabalhar com alguém melhor que ele.”
Nós nos abraçamos em despedida, as duas rígidas com a
dor, sabendo que se demorássemos aqui, desmoronaríamos.
Fazemos planos para ver uma à outra, quando ela voltar de sua
entrevista. Se voltar.
Levo a caixa para o sofá e o coloco na minha mesa de
centro para abrir.
Dentro há uma esfera de vidro, do tamanho de um melão,
pesada e escura. Estrelas de cristal estão espalhadas em cores
azuis escuros e preto. Um planeta — vermelho, verde e preto —
paira no centro, cercado por redemoinhos e espirais de luz em
azul pálido que parecem possuir a sua própria iluminação. Um
pedaço do céu da noite preso em uma esfera.
“O universo”, murmuro, embalando a esfera no meu colo,
passando minhas mãos sobre sua superfície lisa. Sua rara beleza
prende minha respiração. Com medo de quebrar, procuro na
caixa de algum tipo de suporte para colocá-la.
Um bilhete está na parte inferior da caixa.
Cuidadosamente, coloco a esfera de lado e tiro o papel dobrado
com as mãos trêmulas. Meus olhos se enchem de lágrimas
quando vejo sua caligrafia. Toco as palavras, ouço sua voz
falando por trás de cada traço de caneta.
F u l l T i l t # 1
E m m a S c o t t
Kacey,
Se você está lendo isto, significa que eu estou (espero) em
algum restaurante celestial, enchendo minha cara de bacon e
batatas fritas, e bebendo cerveja de verdade. Quando eu terminar,
vou pagar ao garçom em rolos de fichas. Porque qualquer um pode
fazer um jackpot, certo? Você apenas tem que jogar.
E você tem que viver. Você me ensinou isso. Minha vida era
parada e fechada até você. Incolor e monótona, até você. Eu
mantive meu coração quebrado para mim, até que você veio e o
levou em suas mãos suaves e deu vida a ele. A mim.
Você me ensinou a encontrar a vida em cada momento. Você
curou meu coração, Kacey, quando nada mais podia.
Esta esfera de vidro e fogo é o mais perto que eu vou
conseguir chegar de mostrar o que você tem sido para mim. Tentei
colocar tudo o que somos e tudo o que sinto por você em um só
lugar. Mas capturar a enormidade do que você é, é impossível. Não
é o suficiente. Nada jamais será suficiente.
Você é um universo, Kacey.
Fiquei esperando encontrar o final do seu amor e da sua
beleza, o fim do seu coração generoso. Eu nunca consegui. E nunca
vou. Eu não sei como ou por que você me escolheu para amar, mas
escolheu. Você poderia ter me afastado e se salvado. Em vez disso,
você escolheu ficar, e assim me salvou. Esse é o meu legado: Eu te
amei e fui amado por você.
Estou em paz, e espero que Deus lhe dê a mesma alegria
que você me deu. Espero que o amor que temos supere a dor
quando eu me for.
Viva plenamente, cante alto. Partilhe a sua beleza com o
mundo e saiba que estarei olhando por você do outro lado.
Todo o meu amor para você, Kacey. Meu anjo, meu coração.
F u l l T i l t # 1
E m m a S c o t t
Seu Jonah.
Seguro a carta perto do meu coração, protegendo-a contra
as lágrimas pingando da borda do meu queixo.
Que o amor que temos supere a dor...
Sinto-me balançando a cabeça enquanto um sorriso se
espalha debaixo das minhas lágrimas. Se tivesse que fazer tudo
de novo, eu faria. Não mudaria um minuto, a não ser para dizer
mais cedo a Jonah que o amava e que estar com ele não era mais
uma escolha, assim como comer ou respirar.
“Sem arrependimentos, Jonah”, Digo a ele, com minha mão
deslizando sobre a peça de vidro. “E te amarei para sempre.”
F u l l T i l t # 1
E m m a S c o t t
EPÍLOGO
kacey
Theo nos leva para oeste, no coração do deserto em County
Road 20555. Nenhum farol de carro passa por nós. Nenhuma rua
ou luzes da cidade ou até mesmo a lua escurecida com o céu
cheio de estrelas. Não é o dossel de diamantes estrelados do
Great Basin, mas há centenas de pontinhos prateados na lona da
meia-noite acima de nós.
Ficamos em silêncio no carro através do terreno sinuoso,
colinas escuras ao nosso redor em todos os lados.
“Aqui parece ser bom”, Theo diz, enquanto os faróis
iluminam uma pequena parada de descanso com vista para o
deserto. À luz das estrelas, a terra é ondulante de formas
indistintas, estendendo-se por quilômetros.
Theo estaciona no acostamento de terra, em seguida, dá a
volta para abrir a porta do passageiro para mim. Seguro a urna
em meus braços, seu peso de bronze quente na minha pele, e
pesado. Lá fora, o vento sopra frio e cortante.
Os faróis da caminhonete projetam cones amarelos de luz
em torno de nós, brilhando junto a urna enquanto Theo a pega
suavemente dos meus braços. Nenhum de nós fala enquanto ele
remove a tampa e deixa o vento levar as cinzas. Pela luz da
caminhonete, observo o vento levantar as partículas para o céu,
onde são levadas em tufos — como fumaça — e, em seguida,
desaparecem.
F u l l T i l t # 1
E m m a S c o t t
Sinto-me sem amarras, como se o vento fosse me levar
também. Me levantando e me destruindo em um milhão de
pequenos pedaços jogados contra o céu.
Em seguida, sua mão se fecha ao redor da minha.
“Fique aqui”, Theo diz suavemente. Sinto sua pulsação
através da palma, quente e forte contra a minha, me impedindo
de levantar voo. Mantendo-me inteira.
Meus dedos se apertam ao redor dele enquanto olhamos em
direção à borda do universo, onde Jonah agora vive.
“Eu vou ficar.”
F u l l T i l t # 1