Edição Agosto de 2012 - Versão em PDF - Revista Anônimos
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ANÔNIMOS VIRTUAL ED 9:miolo Anonimos ed. 14.qxd 28/8/<strong>2012</strong> 16:36 Page 14<br />
Reflexões<br />
14<br />
Por Polyanna P.<br />
Será que existe recuperação?<br />
Hoje faz <strong>de</strong>z meses que meu esposo está limpo, graças<br />
a Deus. São 305 dias! Confesso que pareço estar sonhando.<br />
A confiança, o diálogo, a paz, a compreensão, o companheirismo<br />
e a cumplicida<strong>de</strong> são itens que foram sendo<br />
reconstruídos, pouco a pouco, entre nós dois. E hoje<br />
posso dizer que não exist<strong>em</strong> mais tantas marcas do seu<br />
t<strong>em</strong>po <strong>de</strong> ativa.Ele vai quase que diariamente às reuniões<br />
<strong>de</strong> Narcóticos <strong>Anônimos</strong>. Está se tratando com Psiquiatra,<br />
inclusive toma medicações diárias por ele receitadas, além<br />
da terapia com psicólogo. O segredo é que ele QUER se<br />
recuperar, e por isso t<strong>em</strong> dado tudo certo. Ele engordou<br />
14 quilos nesse período e está com uma aparência muito<br />
boa!<br />
Então recebi um e-mail <strong>de</strong> uma jov<strong>em</strong>, nova leitora do<br />
blog Amando um Depen<strong>de</strong>nte Químico, com as seguintes<br />
perguntas: “Existe mesmo recuperação <strong>de</strong> <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes<br />
químicos? Qual é o índice <strong>de</strong> pessoas que se tratam e<br />
voltam a usar drogas? Existe algum motivo que faça com<br />
que a pessoa volte a se drogar?”. Quando amamos um<br />
adicto, são tantas as dúvidas e as angustias que nos cercam<br />
e assombram, não é mesmo? Isso acontece porque buscamos<br />
certezas <strong>em</strong> um mundo totalmente incerto, quer<strong>em</strong>os<br />
garantias on<strong>de</strong> não há. Então quando <strong>de</strong>cidimos amar<br />
um <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte químico, <strong>de</strong>v<strong>em</strong>os apenas amar, sabendo<br />
dos riscos e das consequências, e assumindo-os. Vamos às<br />
respostas?<br />
Sim, existe recuperação para os <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes químicos,<br />
mas infelizmente não há cura para a <strong>de</strong>pendência química.<br />
Assim como o diabético que até o fim <strong>de</strong> sua vida <strong>de</strong>verá<br />
ter uma alimentação regrada e outros cuidados, o <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte<br />
químico também precisa <strong>de</strong> cuidados especiais, <strong>de</strong>ntre<br />
eles, manter-se longe da primeira dose e buscar um<br />
tratamento continuado.Conheço pessoas que estão limpas<br />
há dois, quatro, onze anos, ou seja, <strong>em</strong> recuperação.<br />
Entretanto, se falarmos <strong>em</strong> estatísticas, nos entristecer<strong>em</strong>os.<br />
Os números são baixos. Meu esposo saiu <strong>de</strong> sua ultima<br />
internação há cinco meses, e todos os que saíram com<br />
ele já recaíram. É preciso muita vonta<strong>de</strong> e força. É uma<br />
luta constante contra si mesmo. Não é fácil, mas é possível.<br />
Na verda<strong>de</strong>, prefiro me apegar a outra porcentag<strong>em</strong>: se<br />
nossos amados realmente quiser<strong>em</strong> se recuperar, buscar<strong>em</strong><br />
tratamento, e cumprir<strong>em</strong> o que é sugerido no programa<br />
dos Narcóticos <strong>Anônimos</strong>, a chance <strong>de</strong> se recuperar<strong>em</strong><br />
é <strong>de</strong> 100%. Mas, como po<strong>de</strong> perceber, isso não<br />
<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> mim n<strong>em</strong> <strong>de</strong> você.<br />
Quanto aos motivos que os levam a recair são muito<br />
subjetivos. Posso afirmar que se eles buscar<strong>em</strong> pessoas,<br />
hábitos e lugares da época <strong>de</strong> ativa, facilmente recairão. E<br />
também se tomar<strong>em</strong> bebidas alcoólicas, provavelmente<br />
buscarão as drogas. Entretanto, alguns reca<strong>em</strong> s<strong>em</strong> precisar<strong>em</strong><br />
disso. Reca<strong>em</strong> porque estão tristes, ou porque estão<br />
felizes. Reca<strong>em</strong> por não saber<strong>em</strong> lidar com sentimentos e<br />
<strong>em</strong>oções. Reca<strong>em</strong> porque caiu uma folha da árvore,<br />
porque choveu ou porque fez sol... Infelizmente não exist<strong>em</strong><br />
porquês concretos.<br />
Nós, familiares <strong>de</strong> <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes químicos, precisamos<br />
enten<strong>de</strong>r que não está <strong>em</strong> nossas mãos a chave para fazer<br />
com que eles se recuper<strong>em</strong>. Por um lado, isso nos dá um<br />
sentimento <strong>de</strong> tristeza e impotência, mas, por outro,<br />
po<strong>de</strong>mos nos livrar do peso <strong>de</strong>sse fardo. Não cabe a você<br />
n<strong>em</strong> a mim, somente a eles. Eles não são culpados n<strong>em</strong><br />
responsáveis pela doença que têm, mas, são responsáveis<br />
por sua própria recuperação.Se meu esposo está limpo só<br />
por hoje, é porque ele, enfim, após chegar ao fundo do<br />
poço, conseguiu <strong>de</strong>spertar o querer sincero <strong>de</strong> recuperarse.<br />
Gostaria <strong>de</strong> relatar a história <strong>de</strong> um senhor, a fim <strong>de</strong> alimentar<br />
a nossa esperança. Esse senhor faleceu há poucos<br />
anos numa queda <strong>de</strong> um helicóptero. Morreu dignamente<br />
e amado por muitos. Ele fez um trabalho lindo <strong>de</strong> ajuda a<br />
<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes químicos, durante vinte e cinco anos. Ele era<br />
<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte químico e alcoólatra. Sua esposa e filhos não<br />
aguentaram a dor e o colocaram para fora <strong>de</strong> casa. Ele foi<br />
mendigar. Chegou a ven<strong>de</strong>r o próprio sangue (anos 70)<br />
para comprar drogas e bebidas. Fez coisas inimagináveis<br />
para obter drogas e sob o seu efeito.<br />
Entretanto, um dia, no Rio <strong>de</strong> Janeiro, com seus pensamentos<br />
totalmente confusos, ele olhou para o Cristo<br />
Re<strong>de</strong>ntor, e falou para ele: “Se tu realmente existes, me dê<br />
um sinal hoje!” Ali mesmo na rua ele adormeceu. Ao acordar,<br />
<strong>de</strong>sesperado para usar mais, começou a apalpar seus<br />
bolsos <strong>em</strong> busca <strong>de</strong> algo que pu<strong>de</strong>sse trocar por mais drogas.<br />
E o que ele encontrou foi um cartãozinho dizendo:<br />
“Se você quiser continuar bebendo, o probl<strong>em</strong>a será seu,<br />
mas, se você quiser parar, o probl<strong>em</strong>a será nosso!” Era dos<br />
Alcoólicos <strong>Anônimos</strong>. De imediato ele se recordou das<br />
palavras que tinha dito <strong>em</strong> oração, e cruzou a cida<strong>de</strong> para<br />
buscar ajuda naquele en<strong>de</strong>reço do papelzinho. Ele questionava<br />
muitas coisas do A.A., era resistente, e não parou<br />
com as drogas instantaneamente, mas continuou voltando.<br />
Até que um dia, tomado por uma força maior do que a sua<br />
doença, ele disse a si mesmo: “a partir <strong>de</strong> hoje, nunca mais<br />
usarei droga nenhuma!” E ele cumpriu.<br />
Sabe por quê? Porque a vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> parar foi maior do<br />
que qualquer outra vonta<strong>de</strong>. Ele recuperou sua dignida<strong>de</strong>,<br />
sua família, sua vida profissional e ainda ajudou a muitas<br />
pessoas que sofriam do mal que ele conhecia tão b<strong>em</strong>. Se<br />
ele pô<strong>de</strong>, qualquer um po<strong>de</strong>, basta querer.