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<strong>As</strong> históri<strong>As</strong> <strong>em</strong> quAdrinhos como meio de diss<strong>em</strong>inAção científicA<br />

Bianca de Angelo Banzato<br />

Luana Fernanda Ibelli<br />

Natália Alexandre H. Martinelli<br />

Fouad Camargo A. Matuck<br />

Talita de Cassia Mota<br />

Roberta Danielle de O. V<br />

resumo<br />

O presente estudo pretende analisar a divulgação científica feita por meio das histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong><br />

e como se dá essa inserção no cotidiano do público leitor. Considerando a diversidade do<br />

público, esse meio como fonte de divulgação científica atua de maneira eficiente, uma vez que<br />

atinge diferentes faixa etárias e classes sociais, que muitas vezes não teriam acesso a esse conteúdo<br />

de outra maneira.<br />

Palavras-chave: Ciência. Divulgação. Histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong>. Entretenimento. Sociedade.<br />

introdução<br />

A divulgação científica é mais ampla do que aparenta, além de revistas, sites e programas de<br />

televisão que são especialmente voltadas para o t<strong>em</strong>a, pode-se encontrar el<strong>em</strong>entos da ciência <strong>em</strong><br />

produtos diversos, um ex<strong>em</strong>plo disso são as histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong>.<br />

Crianças e adultos do mundo inteiro consom<strong>em</strong> histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong>, como conhec<strong>em</strong>os<br />

hoje, há quase c<strong>em</strong> anos. A linguag<strong>em</strong> acessível e o custo baixo tornam a historia <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong><br />

um el<strong>em</strong>ento presente no cotidiano das pessoas.<br />

Pod<strong>em</strong>os analisar a trajetória do hom<strong>em</strong> <strong>em</strong> relação às <strong>historias</strong> contadas <strong>em</strong> imagens de uma<br />

perspectiva mais ampla. Se considerarmos as pinturas rupestres, as tapeçarias produzidas na anti-


guidade e até mesmo as pinturas sacras ter<strong>em</strong>os el<strong>em</strong>entos que culminaram no desenvolvimento<br />

dos <strong>quadrinhos</strong>.<br />

A sociedade influencia de forma determinante na constituição das narrativas, o que leva o<br />

leitor, mesmo que indiretamente, a fazer uma reflexão sociológica e cultural sobre o presente,<br />

passado e futuro. Além das referências sociais, as histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong> também utilizam conceitos<br />

da psicologia para construir personagens complexos que reflitam as questões e angústias<br />

que cercam o hom<strong>em</strong> moderno.<br />

S<strong>em</strong> deixar de lado a ciência, voltada para as áreas de exatas e biológicas, as <strong>historias</strong> <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong><br />

pod<strong>em</strong> ser consideradas grande fonte de divulgação e inovação, levando <strong>em</strong> conta que<br />

muitos avanços ocorridos ao longo do século XX surgiram antes, no mundo da imaginação de<br />

alguns autores de <strong>historias</strong> <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong> aficionados por ciência.<br />

Levando <strong>em</strong> conta a dimensão do t<strong>em</strong>a, o trabalho se focou <strong>em</strong> fazer um levantamento do que<br />

seria a orig<strong>em</strong> das <strong>historias</strong> <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong>, desde o início da civilização, abordando as influencias<br />

sociais e psicológicas do século passado e, por ultimo, apresentar a ciência como instrumento<br />

no desenvolvimento de algumas narrativas, atuando como el<strong>em</strong>ento precursor dentro e fora das<br />

histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong>.<br />

histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong>: origens<br />

<strong>As</strong> histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong>, ou HQs como conhec<strong>em</strong>os no Brasil, são sucesso <strong>em</strong> todo o mundo<br />

e por isso são conhecidas por vários nomes dependendo do lugar: Comics nos Estados Unidos,<br />

Bande Dessinée (França), Mangá (Japão), Fumetti (Itália), Tebeo (Espanha) e Historieta na América<br />

Latina <strong>em</strong> geral. Mas, o interessante é saber que essa idéia de contar histórias com desenhos<br />

não veio do nada, e sim que levou anos para ser o que é agora.<br />

Uma das principais características das histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong> é o fato de que a história é<br />

contada <strong>em</strong> sequência de imagens. Considerando-se esse detalhe, pod<strong>em</strong>os perceber que até se<br />

tornar como é hoje a HQ percorreu um logo caminho de evolução, cuja raízes históricas estariam<br />

nos homens da caverna.<br />

<strong>As</strong> primeiras histórias contadas pela humanidade são encontradas nas paredes das cavernas.<br />

São sequências que mostram o dia-a-dia do hom<strong>em</strong> primitivo, geralmente imagens de caça e de<br />

animais feitas no sentido horizontal. A pintura rupestre é considerada a primeira manifestação<br />

que deu orig<strong>em</strong> aos <strong>quadrinhos</strong>. Esses primeiros símbolos possibilitaram estudos sobre inteligência,<br />

iconografia e a representação da imag<strong>em</strong> na evolução das culturas e sociedades.<br />

Outras formas de expressão antigas também baseavam-se <strong>em</strong> desenhos de pessoas e objetos<br />

para representar a realidade e assim contar histórias. Algumas deram orig<strong>em</strong> a alfabetos, como<br />

é o caso dos egípcios e dos chineses. O monumento “coluna de Trajano”, trazido do Egito pelo<br />

Império Romano conta uma história enrolada, de cima a baixo como se fosse um papiro.<br />

Durante o século IV a.C, os hieróglifos, escrita egípcia, esculpidos <strong>em</strong> baixo-relevo mostravam<br />

as diversas fases da alma até o além. <strong>As</strong>sim também<br />

as pinturas e os relevos egípcios continuaram esta narrativa através das imagens<br />

pintadas ou modeladas no interior dos t<strong>em</strong>plos, nos túmulos, nos quais apareciam<br />

figuras do faraó, da corte, reportando episódios repletos de símbolos e que<br />

representavam cenas de caçadas, de colheitas, de oferendas ou mesmo cenas<br />

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domésticas. (...) Estas imagens, além de proporcionar inestimáveis produções<br />

e informações culturais, forneceram e ainda fornec<strong>em</strong>, el<strong>em</strong>entos de comunicação<br />

social sobre os valores e a sensibilidade humanas, então apoiadas pela<br />

escrita cuneiforme, que explicava a narrativa histórica, reforçando o poder iconográfico<br />

formal¹.<br />

Entre os séculos V e XIII encontram-se outros momentos de evolução da imag<strong>em</strong> na forma<br />

de história. Elas estão presentes nas cerâmicas da Grécia e nas paredes da “Villa dei Misteri”<br />

<strong>em</strong> Pompéia, contando os feitos mitológicos. Também estão relacionadas à via-sacra, nos vitrais<br />

góticos, <strong>em</strong> toda a arte da Idade Média, sendo o ex<strong>em</strong>plo mais famoso a tapeçaria de Bayeux,<br />

obra francesa feita entre 1070 e 1080, com setenta metros de imag<strong>em</strong> descrevendo a conquista da<br />

Inglaterra pelos Normandos (que teve início <strong>em</strong> 1066).<br />

Os cantores da Idade Média se utilizavam de pôsteres com imagens seriadas para ilustrar suas<br />

histórias. No contexto dessa época <strong>em</strong> que era preciso ter algum prestígio junto ao clero para se<br />

conseguir livros, e ainda assim, o número de alfabetizados era muitíssimo baixo, as histórias com<br />

imagens foi uma grande solução. Devido a isso, ficaram famosas, inclusive como uma forma de<br />

notícia, as historietas com detalhes gráficos das torturas praticadas pela inquisição. Acredita-se<br />

que essa preferência por história de condenação esteja ligada às condições de vida da época e ao<br />

poder e medo exercidos pela Igreja.<br />

Outro ponto importante para o que poderíamos chamar de ord<strong>em</strong> seqüencial de narrar histórias,<br />

por meio de quadros, o que caracteriza a linguag<strong>em</strong> das HQs encontra-se na História da Arte. A<br />

divisão da obra <strong>em</strong> três painéis imprime um ritmo de leitura à narrativa. Um quadro que pode<br />

ilustrar adequadamente esse momento seria o tríptico (três painéis) de Bosch O Jardim das Delícias<br />

Terrenas (1504), que descreve a história do mundo a partir da criação, apresentando o Paraíso<br />

terrestre e o Inferno nas asas laterais. Ao centro aparece um Bosch que celebra os prazeres da<br />

carne, com participantes desinibidos, s<strong>em</strong> sentimento de culpa.<br />

Ainda no século XVI, outra obra de arte que pode ser associada ao surgimento das HQs é o teto<br />

da Capela Sistina. A Capela Sistina está situada no Palácio Apostólico, residência oficial do Papa<br />

na Cidade do Vaticano. Foi erigida entre os anos 1475 e 1483. O Teto da Capela Sistina é um monumental<br />

afresco de Michelangelo realizado entre os anos de 1508 e 1512. <strong>As</strong> pinturas representam<br />

narrativas bíblicas, do livro Gênese. É difícil acreditar que tenha sido obra de um só hom<strong>em</strong>,<br />

e que o mesmo ainda encontraria forças para retornar ao local, duas décadas depois, e pintar na<br />

parede do altar sacrificando, inclusive, alguns afrescos de Perugino o “extraordinário espetáculo”<br />

do Juízo Final entre 1535 e 1541, já sob o pontificado de Paulo III. A superfície da abóbada foi<br />

dividida <strong>em</strong> áreas concebendo-se arquitetonicamente o trabalho de maneira que resultasse numa<br />

articulação do espaço dividido por pilares. Nas áreas triangulares alocou as figuras de profetas<br />

e sibilas; nas retangulares, os episódios do Gênese. Para entender estas últimas deve-se atentar<br />

para as que tocam a parede do fundo: Deus separando a Luz das Trevas; Deus criando o Sol e a<br />

Lua; Deus separa a terra das águas; A criação de Adão; A criação de Eva; o Pecado Original e a<br />

expulsão do Paraíso; o Sacrifício de Noé; o Dilúvio Universal e Noé Embriagado.<br />

É interessante destacar que a representação imagética das histórias biblícas, o que chamamos<br />

aqui de história sequenciada, ajudou a difundir o conteúdo das mesmas, uma vez que a maioria<br />

_____________________________________<br />

¹RAHDE, Maria Beatriz. Origens e evolução das histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong>. Revista FAMECOS, Porto Alegre: nº5,<br />

nov<strong>em</strong>bro de 1996.


das pessoas não eram alfabetizadas na época.<br />

Avançando alguns anos, nos deslocamos ao século XIX, quando começam a surgir os jornais e<br />

com eles as caricaturas, que se tornavam cada vez mais populares, e a partir das quais surg<strong>em</strong> as<br />

primeiras “histórias com estampas”. Essas histórias eram formadas pelo quadro com um desenho<br />

e uma ou duas linhas de texto <strong>em</strong>baixo da mesma. <strong>As</strong> ilustrações desta eram feitas a traço, <strong>em</strong><br />

geral com estilo caricato e <strong>em</strong> uma única cor, pois esses eram os recursos dos meios de impressão<br />

da época.<br />

Essas pequenas histórias eram feitas s<strong>em</strong> nenhuma espécie de herói, algo comum nos <strong>quadrinhos</strong><br />

de hoje. Contavam fatos do dia das pessoas, sua rotina, seus probl<strong>em</strong>as, etc. Dentre os<br />

autores deste tipo de história, precursora dos atuais <strong>quadrinhos</strong>, alguns merece, destaque, como<br />

o suíço Rudolph Topffer. Nascido no ano de 1799, Topffer criava histórias simples com personagens<br />

do cotidiano, que <strong>em</strong> busca de pequenas coisas acabavam provocando catástrofes, como o<br />

Mr. Vieux Boix, Festus, Jabot e Albertus. Mesmo s<strong>em</strong> existir ainda os balões de fala, e utilizando<br />

uma linguag<strong>em</strong> muito simples, Topffer montava histórias completas para seus personagens. Essas<br />

histórias eram tão atrativas que Topffer tinha entre seus leitores o al<strong>em</strong>ão Goethe, que dizia ler as<br />

histórias do suíço de dez <strong>em</strong> dez páginas para não ter uma indigestão de idéias. Rodolphe Töpffer<br />

é considerado o “pai dos <strong>quadrinhos</strong> modernos”, pois começou a juntar desenhos satíricos e caricaturas<br />

ao texto escrito, já <strong>em</strong> 1827.<br />

Nessa época, a sátira e a ironia acompanhavam todas as criações, tanto as de Topffer como as<br />

de seus cont<strong>em</strong>porâneos, entre eles o francês Colomb e o pi<strong>em</strong>ontês radicado no Brasil Angelo<br />

Agostini e também Wilheum Busch que t<strong>em</strong> entre suas obras “Max und Moritz”, que foram conhecidos<br />

no Brasil como Juca e Chico. Já no final do século XIX, havia tiras com pequenas histórias<br />

cômicas nos jornais americanos e, graças a esse conteúdo alegre e satírico, os americanos<br />

começaram a chamar as tiras de “comics”.<br />

De modo suscinto, pod<strong>em</strong>os dizer que as formas de representação percursoras das história <strong>em</strong><br />

<strong>quadrinhos</strong> surg<strong>em</strong> quase que de modo intuitivo no hom<strong>em</strong>, como forma representar sua história<br />

e seu cotidiano, por uma linguag<strong>em</strong> que se vale fundamentalmente da combinação da linguag<strong>em</strong><br />

verbal e não-verbal. Nesse sentido, as HQs também estimulam o imaginário do leitor uma vez<br />

que lhe permite imaginar, especular os movimentos do quadros.<br />

Por fim, parece-nos fundamental pontuar que os primórdios das HQs serviram como ferramenta<br />

de divulgação científica para o conhecimento científico da época: na pré-história para elucidar<br />

a descoberta do fogo e a domesticação do animal como alimento, a caça; na Idade Média como<br />

forma de compartilhar narrativas do credo católico, como as histórias presentes no Teto da Capela<br />

Cistina, b<strong>em</strong> como impôr uma cultura de medo a partir da represnetação imagética da Inquisição;<br />

na arte clássica dividir a obra <strong>em</strong> três quadros, para amplair o sentido para a tela central, como<br />

d<strong>em</strong>onstramos no cado de O Jardim das delícias; e com Topffer já mais próximo à estética das<br />

HQs como as conhec<strong>em</strong>os, t<strong>em</strong>os as narrativas ilustradas como modo de satirizar e criticar a<br />

sociedade.<br />

Logo, todo o percurso do surgimento das HQs nos leva a uma função primordial desse tipo de<br />

arte: especular sobre a a realidade e conhecimento científico que a ficção pode incitar, <strong>em</strong> diálogo<br />

constante com a realidade e o imaginário coletivo, <strong>em</strong> busca de soluções para os conflitos do<br />

desenvolvimento humano mais variados<br />

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<strong>quadrinhos</strong> do século XX – influências da sociologia e Psicologia<br />

A divulgação científica permeia a historia <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong> desde o início. Mas qu<strong>em</strong> pensa que<br />

os criadores se importavam apenas <strong>em</strong> criar personagens com super poderes que utilizass<strong>em</strong> aparelhos<br />

revolucionários e fizess<strong>em</strong> viagens espaciais se engana.<br />

<strong>As</strong> <strong>historias</strong> <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong> apresentam <strong>em</strong> sua estrutura narrativa muitos el<strong>em</strong>entos da sociologia<br />

e da psicologia que, por vezes, foram utilizados para guiar os leitores a refletir sobre a<br />

sociedade <strong>em</strong> que viviam e entender um pouco mais sobre a subjetividade existente <strong>em</strong> cada um.<br />

No fim do século XIX surge, nos Estados Unidos, o primeiro quadrinho a utilizar balão. O aparecimento<br />

do Yellow Kid, <strong>em</strong> 1894, no jornal sensacionalista de Joseph Pulitzer marcou a nova<br />

forma de se produzir <strong>quadrinhos</strong>. O Yellow Kid, criado por Richard Outcault, era uma criança<br />

dentuça, que s<strong>em</strong>pre aparecia com um sorriso bobo e vestindo um camisolão amarelo que exibia<br />

frases cômicas ou panfletárias. Através do Yellow Kid surgiu o termo jornalismo amarelo para<br />

designar imprensa sensacionalista.<br />

No Brasil dia 11 de outubro de 1905 foi lançado o primeiro número da revista Tico-Tico. A<br />

revista misturava assuntos diversos e entretenimento, como poesias, contos, jogos, atrações educativas,<br />

referências a datas históricas, além de textos sobre as séries mais populares do cin<strong>em</strong>a,<br />

partituras, letras de músicas e até peças teatrais. Foi na Tico-Tico que estreou o primeiro quadrinho<br />

com balão no país.A estrela é Buster Brown de Richard Outcault, com o pseudônimo de<br />

Chiquinho.<br />

Em 1911, George Herriman lança nos EUA a revista Krazy Kat, que resultou no posterior<br />

aparecimento do Gato Félix e toda a fauna de Walt Disney. A revista se tornou tão popular que<br />

<strong>em</strong> 1918 o então presidente dos Estados Unidos Thomas Woodrow Wilson foi flagrado por um<br />

fotógrafo lendo Krazy Kat <strong>em</strong> seu gabinete <strong>em</strong> pleno expediente de trabalho na Casa Branca.<br />

O bom des<strong>em</strong>penho econômico dos EUA com o término da Primeira Guerra Mundial facilitou<br />

a ascensão de muitos americanos e imigrantes. Baseado nesse quadro social George McManus<br />

apresenta na Krazy Kat, Bringing up Father, traduzido por no Brasil como Pafúncio e Marocas<br />

que aborda t<strong>em</strong>as familiares, desencadeando um surto de histórias pequeno burguesas americanas<br />

de subúrbio <strong>em</strong> ascensão.<br />

Segundo Sônia M. Bibe-Luyten no livro O que é História <strong>em</strong> Quadrinhos “A nação americana<br />

havia crescido na segurança de um eterno milagre econômico, e o decênio de 20 caracterizou-se<br />

por um esbanjamento alegre e insensato da burguesia rica das cidades”.<br />

O sucesso econômico que permeou a vida dos americanos na década de 1920 também desencadeou<br />

um renascimento do interesse pela divulgação científica. Em 1926 surge o primeiro número<br />

de Amazing Stories, revista com histórias de ficção científica e aventuras nos planetas Marte e<br />

Vênus, sendo considerada a primeira revista de ficção científica <strong>em</strong> todo o mundo.<br />

Em 1929 o crack da bolsa de valores de Nova York gerou uma escassez de bens materiais,<br />

dinheiro e comida. Nesse sentido, o que restou para preencher as lacunas deixadas pela crise foi<br />

o espírito encontrado nas histórias contadas nos <strong>quadrinhos</strong>, nos desenhos animados e nos filmes.<br />

O gênero aventura é a nova mina de ouro, os heróis envolvidos nas histórias compensam as<br />

perturbações e inseguranças da realidade. Em virtude do momento de incertezas que os norteamericanos<br />

viviam a tendência notada foi uma necessidade escapista na qual as pessoas se viravam<br />

para épocas consideradas como idade de ouro (Idade Média) ou para espaços onde ainda se


pode viver segundo a natureza (t<strong>em</strong>a da selva)<br />

Dessa maneira o interesse por <strong>historias</strong> que levass<strong>em</strong> o leitor para lugares desconhecidos, indica<br />

um desejo de evasão e a criação de mitos, revelando a necessidade de novos modelos que<br />

inspirass<strong>em</strong> o ser humano. O aumento das vendas fez com que o formato das histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong><br />

ganhasse força aumentando o volume de criação e a boa qualidade do material.<br />

<strong>As</strong> novas histórias mostravam a vitória do hom<strong>em</strong> branco diante da adversidade. Tarzan surgiu<br />

como o herói que luta contra outras civilizações, encarnando a superioridade do hom<strong>em</strong> branco<br />

sobre outras culturas. O Príncipe Valente retomou as aventuras épicas vividas <strong>em</strong> um passado<br />

tido como glorioso, no caso a Idade Média, <strong>em</strong> que se travavam batalhas pela defesa da cultura,<br />

do território e da honra. Por outro lado, Buck Rogers popularizou a science fiction e na construção<br />

de sua narrativa recebeu a colaboração de um cientista e um professor universitário.<br />

A crise social que atingia os EUA na década de1930 tinha como principais referências a lei<br />

seca e o gangsterismo popularizados pela figura de Al Capone. Esse cenário fez proliferar nas<br />

grandes cidades americanas os heróis policiais. Dick Tracy, era um personag<strong>em</strong> rude e violento<br />

que apresentou vilões sádicos, trens, aviões e batidas de carro, abrindo espaço para a ação <strong>em</strong><br />

detrimento do raciocínio.<br />

A conjuntura política da época fez <strong>em</strong>ergir um sentimento de nacionalismo refletido nos <strong>quadrinhos</strong><br />

por Popeye que com seu famoso bordão “I am what I am” ou “Eu sou o que sou”,<br />

representava a necessidade de afirmação da sociedade americana. Popeye era um defensor da<br />

d<strong>em</strong>ocracia, tinha sua violência justificada pela falta de opção, uma vez que Popeye só recorria a<br />

ela quando não havia mais forma de diálogo para defender sua honra e salvar sua amada Olivia<br />

Palito. O marinheiro que conseguia grande força quando consumia uma porção do espinafre foi<br />

considerado a salvação da lavoura, literalmente, já que a personag<strong>em</strong> incentivou o consumo do<br />

produto que teve um aumento de 33% <strong>em</strong> sua produção na época.<br />

Com a Segunda Guerra Mundial mobilizando soldados que precisavam defender sua nação<br />

de Hitler, Popeye se alistou na marinha e mudou seu uniforme para lutar contra os nazistas. O<br />

Capitão América surgiu sob a bandeira do patriotismo, <strong>em</strong> algumas edições do quadrinho o herói<br />

chegava a bater <strong>em</strong> Hitler, protagonizando uma luta que estava no inconsciente de todos os<br />

americanos.<br />

Para enaltecer o American way of life, Walt Disney criou Mickey Mouse e cia que diss<strong>em</strong>inaram<br />

o estilo de vida estadunidense. Para os sociólogos chilenos Dorfman e Mattelart as <strong>historias</strong><br />

de Disney difundiam o capitalismo americano e faziam lavag<strong>em</strong> cerebral <strong>em</strong> populações infantojuvenis<br />

do mundo todo, transmitindo lições de como obter lucro fácil s<strong>em</strong> produzir, tirar proveito<br />

dos mais fracos e desprezar as sociedades primitivas.<br />

Ainda durante a segunda guerra aparece um novo herói, o primeiro de outro planeta. Superman<br />

representa o imaginário americano, pois com sua identidade secreta ele durante o dia encarna um<br />

trabalhador comum, repórter tímido e classe média, para nos momentos de necessidade dar vazão<br />

ao seu lado heróico e salvar o dia. È o que todo americano gostaria de ser, principalmente os que<br />

se alistaram para lutar contra os nazistas. Trabalhadores comuns que viravam heróis de guerra.<br />

Superman foi também um contra-peso dos super-homens fascistas.<br />

Com o fim da guerra, a produção dos <strong>quadrinhos</strong> entra <strong>em</strong> crise. A falta de material e a dificuldade<br />

<strong>em</strong> produzir humor <strong>em</strong> t<strong>em</strong>pos sombrios diminuíram a circulação das revistas. Em meio<br />

a essa escassez surgiu uma campanha que tentava provar que as narrativas eram prejudiciais à<br />

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criança e ao adolescente que a consumiam. Frederic Wertham lança na época o livro A sedução<br />

dos inocentes que tentava d<strong>em</strong>onstrar que os <strong>quadrinhos</strong> eram responsáveis por todos os males<br />

do mundo.<br />

Nos anos 50 a produção das histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong> entra <strong>em</strong> uma fase pensante e intelectual,<br />

ao contrário da década anterior, os estudiosos se voltam para as narrativas com o intuito de analisar<br />

a construção e o alcance do produto. O mundo intelectual supervaloriza o assunto, que passa a<br />

ser discutido por cineastas, escritores e pintores como Alan Resnais, Fellini, Lelouch, Humberto<br />

Eco, Marshall McLuhan, Marcuse e Roy Liechenstein.<br />

É nessa época que Charles Schulz lança A turma do Charlie Brown, que se torna a tira de jornal<br />

mais lida <strong>em</strong> todo mundo. Schulz, conhecido como o Freud dos <strong>quadrinhos</strong>, cria o anti-herói<br />

Charlie Brown que d<strong>em</strong>onstra toda insegurança, insucesso, duvida e impossibilidade de reação,<br />

gerando identificação com seu público. O personag<strong>em</strong> é a síntese de todos os complexos adquiridos<br />

na infância de qualquer pessoa.<br />

O mundo dos Peanuts fez tanto sucesso que se tornou nome de módulo lunar da agência espacial<br />

norte americana e os personagens acabaram aparecendo na televisão, viraram bonecos, capa<br />

da Time e musical na Broadway, tal a catarse coletiva que inspiraram.<br />

Ao contrário dos outros super-heróis que já nasc<strong>em</strong> vencedores, Charlie Brown pode ser considerado<br />

o que os americanos chamam de loser. No quadrinho de Schulz o silêncio é essencial, o<br />

que está subentendido é muito mais importante do que é dito.A ação depende mais da psicologia<br />

profunda dos personagens do que dos acontecimentos exteriores. Diferente dos outros superheróis,<br />

no mundo de Charlie Brown não se pode fazer e compreender tudo.<br />

Os estudos de comunicação de massa <strong>em</strong> voga nos anos sessenta também chegaram aos <strong>quadrinhos</strong>.<br />

<strong>As</strong> narrativas <strong>em</strong>erg<strong>em</strong> como um dos meios de informação e formação de conceitos mais<br />

eficientes dentro dos fenômenos de comunicação de massa.<br />

Nesse contexto, as mulheres ganham destaque dentro das <strong>historias</strong>, passando de personagens<br />

que apareciam <strong>em</strong> segundo plano, para grande símbolode vitória e vingança do sexo f<strong>em</strong>inino<br />

sobre os homens. <strong>As</strong> novas heroínas faz<strong>em</strong> parte da nova onda de HQ para adultos, <strong>em</strong> que o<br />

erotismo serve de escudo para os anseios de <strong>em</strong>ancipação social, econômica e sexual presentes<br />

nos movimentos f<strong>em</strong>inistas da Europa e dos Estados Unidos.<br />

O movimento de contra-cultura foi representado nos <strong>quadrinhos</strong> através de Robert Crumb e um<br />

grupo de estudantes que resolveram na metade da década de sessenta quebrar alguns tabus nos<br />

<strong>quadrinhos</strong>, com o objetivo de revolucionar todo o sist<strong>em</strong>a vigente, o estabilishment.<br />

<strong>As</strong> HQs americanas tiveram como base de organização os syndicates, que impunham certas<br />

regras que tornass<strong>em</strong> as narrativas mais pasteurizadas, passíveis de ser<strong>em</strong> lidas no mundo todo,<br />

como por ex<strong>em</strong>plo, os sinais gráficos utilizados para representar palavrões.<br />

Em 65, a guerra no Vietnã fez com que as duas potências do mundo, EUA e URSS, gastass<strong>em</strong><br />

milhões <strong>em</strong> armamentos e submetess<strong>em</strong> a juventude à luta. Dessa maneira, t<strong>em</strong>as como comunidades<br />

marginais, sexualidade, hippies, violência, droga e ecologia passaram a ser abordados pelas<br />

revistas underground que tinham <strong>em</strong> comum um estilo realista e caricatural.<br />

Fritz, the cat foi criado <strong>em</strong> 1967 por Crumb e retrata um gato estudante, contestador, revolucionário,<br />

terrorista e drogado. Robert Crumb coloca Fritz <strong>em</strong> orgias com as gatinhas e s<strong>em</strong>pre<br />

fugindo da polícia. S<strong>em</strong> editoras, o movimento vendia as revistinhas <strong>em</strong> lugares públicos.<br />

Nos anos setenta surge um novo gênero de aventura a fantasia heróica, baseada <strong>em</strong> ficção


científica e feitiçaria medieval. Blackmark foi fundamentado na fantasia heróica e conta a historia<br />

de um cavaleiro do mundo pós-guerra atômica, onde a sociedade volta a ser primitiva. Num<br />

contexto de tensão e expectativa a respeito da terceira guerra mundial, que para muitos destruiria<br />

o planeta.<br />

Na década de oitenta as minisséries passara a fazer sucesso. Elas mantém o formato de gibi,<br />

mas os roteiros e a arte são mais elaborados. A capa e o papel interno são de melhor qualidade e<br />

ocorre uma reformulação narrativa com a introdução de novos personagens.<br />

Nos últimos vinte anos a popularização do mangás, histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong> japonesas, foram<br />

responsáveis por uma nova configuração nos modos de construir as narrativas. Todo o conteúdo<br />

e estilo dos mangás passaram a ser incorporados às histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong> ocidentais. Recent<strong>em</strong>ente<br />

os brasileiros também puderam conhecer essas modificações <strong>em</strong> histórias nacionais através<br />

da repaginada pela qual passou a Turma da Mônica.<br />

Através de um panorama do século XX pod<strong>em</strong>os notar como as histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong> atuaram<br />

na formação de conceitos e na divulgação de ideais, antes restritos apenas ao meio acadêmico.<br />

É importante ressaltar que <strong>em</strong>bora os <strong>quadrinhos</strong> tenham tido um papel fundamental no<br />

retrato da sociedade de cada época, b<strong>em</strong> como na difusão de ideologias, a ciência humana é menos<br />

explícita do que as inserções de divulgação científica ligadas às áreas de exatas e biológicas,<br />

como ver<strong>em</strong>os a seguir.<br />

ciências nos <strong>quadrinhos</strong>: ficção e não-ficção<br />

O século XX assistiu não só a evolução das histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong> enquanto fruto da comunicação<br />

<strong>em</strong> massa, mas também o desenvolvimento de diversos sub-gêneros, entre eles a ficção<br />

cientifica – que por sua vez também possui subdivisões.<br />

O gênero ficção cientifica apareceu pela primeira vez nas histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong> norte-americanos,<br />

comics, com a estréia do herói espacial Buck Rogers no ano de 1929. A história de Buck<br />

Rogers foi baseada <strong>em</strong> um conto do escritor Philip Nowlan, Armagedon 2419 A.D., publicado na<br />

revista de ficção cientifica Amazing Stories <strong>em</strong> 1928. Desenhado pelo cartunista Richard Calkins,<br />

Buck Rogers se passa <strong>em</strong> um futuro pós-apocalíptico, onde os Estados Unidos foram dominados<br />

por invasores mongóis e forçados a viver <strong>em</strong> florestas. A tecnologia no mundo de Buck Rogers é<br />

bastante avançada, possuindo, como nos l<strong>em</strong>bra Marco Aurélio Luchetti <strong>em</strong> A Ficção Cientifica<br />

nos Quadrinhos, “armas de desintegração, as astronaves a jato, as botas magnéticas, as cidades<br />

submarinas, os cintos voadores, o circuito fechado de televisão, a minissaia, as plataformas espaciais,<br />

o raio laser e os robôs”. Para desenvolver as histórias, Calkins trabalhava com uma equipe<br />

de escritores especialista <strong>em</strong> ciências, dando fundamentações teóricas para as idéias retratadas.<br />

A tecnologia desenvolvida <strong>em</strong> Buck Rogers era, <strong>em</strong> geral, influencia de tecnologias reais ainda<br />

<strong>em</strong> desenvolvimento ou <strong>em</strong> fase de testes, antecipando ao grande público diversos aparatos que<br />

teriam destaque somente anos após sua publicação, como a movimentação de astronautas no<br />

espaço e a explosão atômica. O sucesso da tira <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong> acabou por levar as aventuras espaciais<br />

de Buck Rogers para as mais diversas mídias, como televisão e cin<strong>em</strong>a.<br />

O sucesso de Buck Rogers acarretou no surgimento de um herói concorrente <strong>em</strong> 1932. Brick<br />

Bradford, personag<strong>em</strong> que inicialmente explorava diversos pontos da Terra, tornou-se famoso<br />

ao realizar viagens no t<strong>em</strong>po, principalmente ao passado, onde eram mostrados os costumes de<br />

439


440<br />

sociedades antigas. Apesar de não ter como foco principal a antecipação cientifica e tecnológica,<br />

como acontecia <strong>em</strong> Buck Rogers, Brick Bradford trazia conceitos sólidos de história, além de ter<br />

bases <strong>em</strong> teorias cientificas. Em uma de suas histórias, Bradford viaja ao centro de um átomo de<br />

cobre, onde descobr<strong>em</strong> um sist<strong>em</strong>a solar, uma metáfora para a estrutura do átomo.<br />

Mas o mais famoso herói das histórias <strong>em</strong> quadrinho de ficção surgiria somente <strong>em</strong> 1934:<br />

Flash Gordon. Criado pelo cartunista Alex Raymond, Flash Gordon é considerado por Sérgio<br />

Augusto ”a obra-prima absoluta e inigualada da Space-Opera quadrinizada, marco fundamental<br />

dos comics modernos”, além de ser, s<strong>em</strong> dúvidas, a história <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong> que mais divulgou<br />

feitos da ciência moderna, como o microscópio eletrônico e o videofone, além de antecipar aparatos<br />

tecnológicos que seriam inventados somente no futuro. Entre eles estão o radar e mecanismos<br />

presentes nas naves espaciais desenvolvidos pela NASA.<br />

Ainda na década de 30 surgiria um dos mais importantes subgêneros da ficção cientifica nos<br />

<strong>quadrinhos</strong>, e até mesmo dos <strong>quadrinhos</strong> <strong>em</strong> geral: os super heróis. Os precursores desse movimento<br />

foram Jerry Siegel e Joe Shuster, que criaram, <strong>em</strong> 1938 o Superman, O surgimento do<br />

sub-gênero dos super-heróis nas histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong> abriu um novo paradigma para a ciência<br />

e a ficção cientifica nos <strong>quadrinhos</strong>. Os super-heróis utilizam de maneiras variadas a ciência. O<br />

Superman, primeira história <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong> de super herói, teve alguns de seus poderes inspirados<br />

<strong>em</strong> insetos e animais do mundo real.<br />

A ciência e os <strong>quadrinhos</strong> de super-heróis t<strong>em</strong> mantido um relacionamento muito próximo deste<br />

então. Muitas vezes, os poderes dos super-heróis provê<strong>em</strong> de alguma forma da ciência, como<br />

<strong>em</strong> Capitão América (1941) e do Spiderman (1962), por ex<strong>em</strong>plo. O Capitão América, inclusive,<br />

foi o primeiro super-herói que sofreu modificações graças à ciência, já que ganhou seus poderes<br />

ao se oferecer como cobaia para um experimento do governo norte-americano, que buscava criar<br />

o soldado perfeito para enfrentar a Segunda Guerra. Já o Spiderman, ou Hom<strong>em</strong> Aranha, como<br />

é conhecido no Brasil, adquire seus poderes após ser picado por uma aranha que fora exposta<br />

a radiação. Os seus inimigos são também, <strong>em</strong> grande parte, vítimas de experimentos científicos<br />

falhos, ou utilizam alguma maneira conceitos científicos. Outra história <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong> que traz<br />

<strong>em</strong> seu plano de fundo termos científicos é X-men, de 1963, que inseriu no vocabulário de seus<br />

leitores conceitos como evolução e mutação genética.<br />

A ciência nos <strong>quadrinhos</strong> não se restringiu às publicações norte-americanas. Na Europa, a ciência<br />

adquiria, inclusive, um papel diferente daquele que possuía nos Estados Unidos, onde era<br />

uma solucionadora de probl<strong>em</strong>as. Durante e após a Segunda Guerra, vários títulos não escondiam<br />

a preocupação com o destino mundial, principalmente devido à tensão atômica. Entre eles estão<br />

Lê Rayon U, publicado no s<strong>em</strong>anário belga Bravo <strong>em</strong> substituição a “Flash Gordon, considerado<br />

persona non grata pelas autoridades nazistas”². Nos anos 50, o personag<strong>em</strong> Tintin, de Les Aventures<br />

de Tintin, criação do artista belga Hergé, visitou a Lua.<br />

Nos Estados Unidos dos anos 50, surge a Editora EC<br />

(Entretain<strong>em</strong>ent Comics), que entraria na história como a editora que causou a ira dos conservadores<br />

norte-americanos ao atacar o militarismo e mostrar que a ciência s<strong>em</strong> controle poderia<br />

destruir o mundo. Merece destaque o fato de que com o inicio da Segunda Guerra houve uma<br />

mudança na representação da figura do cientista nas histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong>. Se antes ele era o<br />

_____________________________________<br />

²AUGUSTO, Sérgio. Space Comics: um esboço histórico in MOYA, Álvaro de. SHAZAN!. São Paulo, Perspectiva,<br />

1977, p 192


visionário solitário, talvez até “louco”, ele passa a ser parte de grandes projetos governamentais,<br />

até mesmo armamentistas.<br />

Os <strong>quadrinhos</strong> acompanham as novas teorias e descobertas, e ainda nos anos 60 surg<strong>em</strong> referências<br />

à geometria fractal e à teoria do caos na série Hom<strong>em</strong> Animal, da DC Comics.<br />

Um dos casos mais claros de influência da teoria do caos nos <strong>quadrinhos</strong> ocorre nos anos 80,<br />

com a publicação de Watchmen. Aqui, a existência de seres com poderes especiais daria rumos<br />

completamente diferentes para a história do mundo, <strong>em</strong> vez de servir como uma forma de manter<br />

a ord<strong>em</strong> como a conhec<strong>em</strong>os.<br />

conclusão<br />

Após analisar o desenvolvimento e as nuances das histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong> pud<strong>em</strong>os perceber<br />

a eficiência da sua narrativa para transmitir el<strong>em</strong>entos da ciência. Por se tratar de um veículo com<br />

linguag<strong>em</strong> acessível e custo baixo as <strong>historias</strong> são encontradas no mundo todo.<br />

A universalidade dos t<strong>em</strong>as abordados encontra identificação e consegue conquistar desde<br />

crianças <strong>em</strong> fase de alfabetização até jovens e adultos. Graças a essa identificação imediata do<br />

leitor os <strong>quadrinhos</strong> são utilizados hoje <strong>em</strong> dia como forma de divulgação de campanhas sociais<br />

feitas pelo governo, por ex<strong>em</strong>plo, as campanhas de vacinação infantil e de prevenção de doenças<br />

sexualmente transmissíveis.<br />

O potencial de divulgação científica é apresentado <strong>em</strong> forma de números, no Brasil, a Editora<br />

Abril, responsável pela distribuição de títulos como Tio Patinhas, Mickey e Zé Carioca segundo<br />

dados do Projeção Brasil de Leitores, com base nos estudos Marplan, ano base 2007, vendeu cerca<br />

de 5.308.000 ex<strong>em</strong>plares para um público de 8 a 19 anos de ambos os sexos.<br />

Ao colocar <strong>em</strong> união dois códigos distintos, o verbal e o imagético, as histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong><br />

formam um novo código e uma nova linguag<strong>em</strong>. Para Waldomiro Vergueiro, “a linguag<strong>em</strong> dos<br />

<strong>quadrinhos</strong> coloca <strong>em</strong> funcionamento os quadrantes do cérebro, fazendo atuar, paralelamente e<br />

<strong>em</strong> perfeita sintonia, tanto o esquerdo, responsável pela racionalidade e espaço por excelência<br />

do domínio científico, como o da imaginação criativa, âmbito privilegiado da produção poética<br />

e ficcional, o direito”. <strong>As</strong>sim, a informação transmitida via histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong> acaba por<br />

ter uma forma informativa maior que aquela que é transmitida unicamente por código verbal ou<br />

imagético.<br />

Os <strong>quadrinhos</strong> também são responsáveis por despertar a curiosidade de seus leitores, que muitas<br />

vezes, ao se deparar com termos e conceitos desconhecidos, irão buscar mais informações <strong>em</strong><br />

lugares especializados.<br />

Nesse sentido, as revistas <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong>, como fonte de diss<strong>em</strong>inação científica, possu<strong>em</strong><br />

potencial para apresentar e familiarizar o público com termos e inovações científicas que seriam<br />

inacessíveis se divulgadas apenas por meios especializados.<br />

Bilbiografia<br />

AUGUSTO, Sérgio. Space Comics: um esboço histórico in MOYA, Álvaro de. shAZAn!. São<br />

Paulo: Perspectiva, 1977.<br />

441


<strong>442</strong><br />

BIBE-LUYTEN, S. M.(Org.) histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong>: Leitura crítica. São Paulo: Edições<br />

Paulinas, 1989<br />

BIBE-LUYTEN, S. M. o que é histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong>. São Paulo: Brasiliense, 1993<br />

CIRNE, Moacy. Para ler os <strong>quadrinhos</strong>: da narrativa cin<strong>em</strong>atográfica à narrativa quadrinizada.<br />

Petrópolis: Vozes, 1975<br />

DANTON, Gian. A Divulgação Científica Nos Quadrinhos: Análise Do Caso Watchmen. São<br />

Paulo, 1997. Dissertação (Mestrado <strong>em</strong> Comunicação) Universidade Metodista De São Paulo.<br />

GRESH, Lois. WEINBERG, Robert. the science of superheroes. Disponivel <strong>em</strong> http://books.<br />

google.com/books?id=TCv0LyEnzsUC&pg=PA65#PPA66,M1<br />

LUCHETTI, Marco Aurélio. A Ficção Científica nos Quadrinhos. São Paulo, GRD, 1991.<br />

LUYTEN, Sonia Maria Bibe. o que é história <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong>. São Paulo: Brasiliense, 1987<br />

MARNY, Jacques. sociologia das histórias <strong>em</strong> quadradinhos. Porto: Civilização, 1970<br />

RAHDE, Maria Beatriz. origens e evolução das histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong>. Revista FAME-<br />

COS, Porto Alegre: nº5, nov<strong>em</strong>bro de 1996.<br />

VERGUEIRO, Waldomiro. ciência e histórias <strong>em</strong> <strong>quadrinhos</strong>: uma relação s<strong>em</strong> limites.<br />

Disponível <strong>em</strong> http://www.comciencia.br/reportagens/2004/10/13.shtml.

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