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O fortalecimento da estrutura institucional e regulatória do ... - UFRJ

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BROWN, Ashley; DE PAULA, Ericson. O <strong>fortalecimento</strong> <strong>da</strong> <strong>estrutura</strong> <strong>institucional</strong> e<br />

<strong>regulatória</strong> <strong>do</strong> setor energético brasileiro. Washington: Banco Mundial, 2002. 73 p. (Projeto<br />

PPIAF, Tarefa 4)<br />

Disponível em: http://siteresources.worldbank.org/BRAZILINPOREXTN/Resources/3817166-<br />

1185895645304/4044168-1186329487615/09Portugues.pdf Acesso em: 5 mar. 2009.<br />

BROWN, ASHLEY & DE PAULA, ERICSON. “O FORTALECIMENTO DA ESTRUTURA INSTITUCIONAL E<br />

REGULATÓRIA DO SETOR ENERGÉTICO BRASILEIRO”. PROJETO PPIAF. WASHINGTON: BANCO MUNDIAL,<br />

DEZEMBRO DE 2002. – 73 PÁGINAS<br />

--------------------------------------------------------<br />

BANCO MUNDIAL<br />

PROJETO PPIAF<br />

TAREFA 4: “O FORTALECIMENTO DA ESTRUTURA INSTITUCIONAL E<br />

REGULATÓRIA DO SETOR ENERGÉTICO BRASILEIRO”<br />

UM RELATÓRIO DE<br />

ASHLEY C. BROWN<br />

DIRETOR EXECUTIVO, HARVARD ELECTRICITY POLICY GROUP<br />

OF COUNSEL, LEBOEUF, LAMB, GREENE E MACRAE<br />

E<br />

ERICSON DE PAULA<br />

DIRETOR EXECUTIVO, DCT ENERGIA<br />

DEZEMBRO DE 2002


Ashley Brown, March 2002<br />

Este relatório foi produzi<strong>do</strong> através de financiamento <strong>do</strong> Public-Private Infrastructure<br />

Advisory Facility – PPIAF e administra<strong>do</strong> pelo Banco Mundial. Os autores agradecem<br />

aos entrevista<strong>do</strong>s e agentes regula<strong>do</strong>res, pelas idéias e opiniões apresenta<strong>da</strong>s e que<br />

gentilmente reservaram seu tempo para discutirem profun<strong>da</strong>mente o assunto. As idéias<br />

expressa<strong>da</strong>s e as recomen<strong>da</strong>ções feitas neste relatório são, no entanto, exclusivas <strong>do</strong>s<br />

autores e não representam necessariamente a opinião <strong>do</strong> PPIAF, <strong>do</strong> Banco Mundial ou<br />

de qualquer outra pessoa ou enti<strong>da</strong>de.<br />

2


INTRODUÇÃO<br />

Ashley Brown, March 2002<br />

O objetivo <strong>do</strong> PPIAF – Public Private Infrastructure Advisory Facility – é<br />

proporcionar apoio ao governo brasileiro, <strong>da</strong>n<strong>do</strong> ênfase particular nas questões mais<br />

urgentes a serem abor<strong>da</strong><strong>da</strong>s. Se o trabalho produzi<strong>do</strong> por consultores internacionais e<br />

brasileiros sobre as tarefas lista<strong>da</strong>s abaixo, resultar em soluções viáveis, a ANEEL e<br />

outras enti<strong>da</strong>des <strong>do</strong> setor assumiriam o coman<strong>do</strong> <strong>da</strong> implementação de soluções com<br />

sua autori<strong>da</strong>de legal atual ou proposta. O ponto central deste trabalho é a Tarefa 4:<br />

“O <strong>fortalecimento</strong> <strong>da</strong> <strong>estrutura</strong> <strong>institucional</strong> e <strong>regulatória</strong> <strong>do</strong> setor energético<br />

brasileiro.” Dependen<strong>do</strong> de recursos financeiros, um segun<strong>do</strong> trabalho será<br />

desenvolvi<strong>do</strong> com uma visão mais ampla, <strong>da</strong> <strong>estrutura</strong> <strong>da</strong> instituição e <strong>do</strong>s outros<br />

principais atores.<br />

Durante a semana de 5 a 9 de agosto de 2002, ambos os consultores conduziram<br />

21 entrevistas com diferentes atores <strong>do</strong> setor energético brasileiro (ver agen<strong>da</strong> de<br />

trabalho em anexo – Apêndice 1). A primeira reunião foi com a ANEEL e teve como<br />

ponto central obter opiniões <strong>da</strong> agência sobre as áreas em que os consultores<br />

poderiam apresentar melhores contribuições e sobre quem mais deveria ser<br />

entrevista<strong>do</strong>, além <strong>do</strong>s nomes propostos na lista. Outro ponto central foi o<br />

esclarecimento <strong>do</strong>s termos de referência. Apesar <strong>da</strong>s entrevistas não estarem limita<strong>da</strong>s<br />

à lista original de tópicos, o <strong>do</strong>cumento anexo “Questões <strong>da</strong> ANEEL” (ver Apêndice<br />

2) apresenta as perguntas coloca<strong>da</strong>s pelo termo de referência. Uma segun<strong>da</strong> ro<strong>da</strong><strong>da</strong> de<br />

18 reuniões foi conduzi<strong>da</strong> durante a semana de 10 a 15 de outubro, incluin<strong>do</strong> nova<br />

consulta com a ANEEL (ver agen<strong>da</strong> de trabalho em anexo – Apêndice 3). Além<br />

disso, algumas entrevistas adicionais foram conduzi<strong>da</strong>s por telefone.<br />

3


Ashley Brown, March 2002<br />

Um primeiro relatório foi prepara<strong>do</strong> pelos <strong>do</strong>is consultores e envia<strong>do</strong> aos<br />

coordena<strong>do</strong>res <strong>do</strong> Banco Mundial e foi apresenta<strong>do</strong> à ANEEL no final de novembro.<br />

No dia 11 de dezembro, uma reunião realiza<strong>da</strong> na sede <strong>do</strong> Banco Mundial em<br />

Brasília, com os entrevista<strong>do</strong>s, os funcionários <strong>da</strong> ANEEL, o Banco Mundial e os<br />

consultores, teve como objetivo revisar os pontos principais.<br />

Desenvolvimentos recentes na re<strong>estrutura</strong>ção <strong>do</strong> setor energético brasileiro<br />

O processo de reforma e desverticalização <strong>do</strong> setor é basea<strong>do</strong> principalmente na<br />

Lei 8.987/95 <strong>da</strong>s Concessões <strong>do</strong> Serviço Público e na Lei 9.074/95 que permite aos<br />

produtores independentes de energia e aos investi<strong>do</strong>res priva<strong>do</strong>s a oportuni<strong>da</strong>de de<br />

participar na área de geração e distribuição, através de processos de licitação.<br />

Também de grande importância é a Lei 9.427/96, que criou a ANEEL, a agência<br />

regula<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> setor elétrico, que tem como responsabili<strong>da</strong>de promover a<br />

concorrência e regular os monopólios naturais.<br />

Esta proposta de re<strong>estrutura</strong>ção foi traça<strong>da</strong> para dividir a indústria elétrica em<br />

gera<strong>do</strong>res competitivos, serviços de transmissão de alta tensão, distribui<strong>do</strong>res de<br />

energia e consumi<strong>do</strong>res livres e comercializa<strong>do</strong>res. O novo modelo previu a<br />

eletrici<strong>da</strong>de como uma commodity a ser vendi<strong>da</strong> no merca<strong>do</strong> livre. Com este objetivo<br />

em mente, a Lei 9.648/98 criou o MAE (Merca<strong>do</strong> Atacadista de Energia) e o ONS<br />

(Opera<strong>do</strong>r Nacional <strong>do</strong> Sistema), que proporcionaram uma nova dinâmica para o<br />

setor, com uma nova <strong>estrutura</strong> de merca<strong>do</strong> e maior nível de comercialização. Estas<br />

novas <strong>estrutura</strong>s também estabeleceram as regras que governam a concorrência e<br />

criaram condições para otimizar a operação <strong>do</strong> sistema, que é em mais de 90% de<br />

base hidráulica.<br />

4


Ashley Brown, March 2002<br />

A privatização de ativos públicos e a necessi<strong>da</strong>de de investimentos priva<strong>do</strong>s para<br />

a expansão <strong>do</strong> sistema foram elementos centrais no processo de re<strong>estrutura</strong>ção. Na<br />

ver<strong>da</strong>de, a privatização <strong>do</strong> setor energético no Brasil, diferentemente de muitos<br />

países, foi implementa<strong>da</strong> antes de qualquer forma de regulação ou <strong>estrutura</strong> de<br />

merca<strong>do</strong>. Muitos temas, como a meto<strong>do</strong>logia tarifária, que em outros países foram<br />

defini<strong>do</strong>s com detalhe considerável, tanto nos <strong>do</strong>cumentos de concessão, como na lei,<br />

foram trata<strong>do</strong>s com menos rigor no Brasil. De fato, os <strong>do</strong>cumentos de concessão<br />

fazem uso <strong>da</strong> palavra reposicionamento, sem mais definições, para descrever o futuro<br />

<strong>da</strong>s tarifas, após o vencimento <strong>do</strong> perío<strong>do</strong> estipula<strong>do</strong> para as primeiras revisões<br />

tarifárias. Sen<strong>do</strong> assim, a tarefa para os regula<strong>do</strong>res futuros não foi tão bem defini<strong>da</strong>,<br />

como em outros países, aumentan<strong>do</strong> de maneira substancial os riscos envolvi<strong>do</strong>s e a<br />

responsabili<strong>da</strong>de de tomar decisões <strong>regulatória</strong>s. Embora as questões que resultaram<br />

desta deficiência, terem si<strong>do</strong> abor<strong>da</strong><strong>da</strong>s neste relatório, trata-se de importante<br />

elemento <strong>do</strong> contexto <strong>do</strong> <strong>do</strong>cumento, que a ANEEL terá que continuar a discutir, a<br />

não ser que um governo futuro deci<strong>da</strong> propor emen<strong>da</strong>s para esclarecer e definir o<br />

sistema de fixação de tarifas para as empresass de distribuição.<br />

A privatização se deu primeiramente no setor de distribuição. A proprie<strong>da</strong>de<br />

priva<strong>da</strong> <strong>do</strong> setor, medi<strong>da</strong> em carga, saltou de 2% em 1994 para 70% hoje. Grande<br />

parte <strong>do</strong> setor de distribuição que continua sob proprie<strong>da</strong>de <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> está em<br />

grandes empresas verticalmente integra<strong>da</strong>s (em parte, pelo menos) como a CEEE, a<br />

COPEL, a CELESC e a CEMIG. Atualmente, no entanto, no setor de geração ,<br />

apenas 30% <strong>da</strong> capaci<strong>da</strong>de é priva<strong>da</strong>. Por uma série de fatores, os esforços para captar<br />

mais investimentos priva<strong>do</strong>s para o setor de geração não têm ti<strong>do</strong> êxito. O governo<br />

5


Ashley Brown, March 2002<br />

vem desenvolven<strong>do</strong> um processo de socie<strong>da</strong>de estratégica entre empresas estatais e<br />

investi<strong>do</strong>res priva<strong>do</strong>s, a fim de expandir a oferta de energia .<br />

A crise <strong>da</strong> energia de 2001<br />

Em abril de 2001, o Brasil enfrentou sua maior crise de energia, causa<strong>da</strong> pelo<br />

esvaziamento de seus reservatórios, resulta<strong>do</strong> de cinco anos de pouca chuva e atraso<br />

na construção de usinas. A falta de investimento no sistema de geração e transmissão<br />

também contribuiu de maneira significativa para a que<strong>da</strong> no fornecimento. Os<br />

protagonistas <strong>da</strong> privatização se empenharam mais no cumprimento <strong>da</strong>quela<br />

priori<strong>da</strong>de, <strong>do</strong> que no planejamento e abastecimento <strong>do</strong> suprimento de energia para<br />

atender à crescente deman<strong>da</strong>. Estas questões eram críticas para os especialistas <strong>do</strong><br />

setor, mas suas preocupações nunca estiveram integra<strong>da</strong>s de maneira adequa<strong>da</strong> ao<br />

processo de privatização. Em resumo, havia um profun<strong>do</strong> desentendimento entre os<br />

responsáveis pela privatização e os encarrega<strong>do</strong>s pelo planejamento para o<br />

fornecimento futuro.<br />

Para li<strong>da</strong>r com a crise, o Presidente criou, no dia 10 de maio de 2001, através de<br />

uma medi<strong>da</strong> provisória, o GCE, com o objetivo de gerenciar a crise no fornecimento<br />

de energia, nas áreas <strong>do</strong> Sudeste e Nordeste <strong>do</strong> país. O GCE, na prática, ficou<br />

responsável pela fiscalização <strong>do</strong> setor elétrico e acabou ocupan<strong>do</strong>, durante a crise, o<br />

papel <strong>do</strong> CNPE, <strong>da</strong> ANEEL e outras instituições com responsabili<strong>da</strong>des<br />

fiscaliza<strong>do</strong>ras. Uma <strong>da</strong>s decisões mais significativas toma<strong>da</strong> pelo GCE foi ordenar o<br />

racionamento de energia elétrica com o objetivo de estabelecer uma redução de 20%<br />

no consumo de energia. Ain<strong>da</strong> naquele ano, depois que os reservatórios voltaram a<br />

apresentar níveis suficientes de água, o programa de racionamento foi suspenso.<br />

6


Ashley Brown, March 2002<br />

Quan<strong>do</strong> a crise chegou ao fim, o GCE transferiu suas ativi<strong>da</strong>des para o<br />

Ministério de Minas e Energia, com a publicação <strong>do</strong> Acor<strong>do</strong> Geral <strong>do</strong> Setor de<br />

Energia (sob a Lei 10.438), ressarcin<strong>do</strong> os gera<strong>do</strong>res e distribui<strong>do</strong>res de energia por<br />

prejuízos que tiveram durante o perío<strong>do</strong> de racionamento. O GCE, ao final,<br />

apresentou 33 medi<strong>da</strong>s identifican<strong>do</strong> os problemas e as imperfeições na <strong>estrutura</strong> e na<br />

implementação <strong>do</strong> modelo original <strong>da</strong> reforma, a fim de retomar a captação de<br />

investimentos e aumentar o fornecimento de energia. Onze destas medi<strong>da</strong>s foram<br />

considera<strong>da</strong>s medi<strong>da</strong>s prioritárias e seriam executa<strong>da</strong>s ain<strong>da</strong> no ano de 2002 :<br />

• A implementação de uma meto<strong>do</strong>logia de preço<br />

• A comercialização de energia forneci<strong>da</strong> por empresas estatais<br />

• Requisitos para contratos bilaterais<br />

• Valor normativo –VN<br />

• Incentivos para geração a gás natural<br />

• Consumi<strong>do</strong>res livres e cativos<br />

• Desverticalização<br />

• Limites para a participação cruza<strong>da</strong> e contratação própria<br />

• Interrupção nas tarifas de distribuição<br />

• Alinhamento tarifário e<br />

• Critério para revisão tarifária<br />

Com o término <strong>da</strong> crise e a restauração <strong>do</strong>s poderes às instituições setoriais, é<br />

normal que se faça uma reavaliação <strong>do</strong>s aspectos <strong>do</strong> regime fiscaliza<strong>do</strong>r que existia<br />

antes <strong>da</strong> crise. Com isto em mente e com o desejo de assistir ao governo brasileiro, o<br />

7


Ashley Brown, March 2002<br />

Banco Mundial, através <strong>do</strong> Public-Private Infrastructure Advisory Facility (PPIAF),<br />

encarregou-se de apresentar algumas recomen<strong>da</strong>ções. Este relatório constitui apenas<br />

parte <strong>do</strong> empenho <strong>do</strong> PPIAF. As outras tarefas <strong>da</strong>s quais o PPIAF está encarrega<strong>do</strong><br />

são: a reforma <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> de energia e a concepção de um formato de leilão, a<br />

revisão <strong>da</strong> meto<strong>do</strong>logia <strong>da</strong>s tarifas de distribuição, o repasse <strong>do</strong> custo de aquisição de<br />

energia através de acor<strong>do</strong>s e a revisão <strong>do</strong>s programas que oferecem benefícios para<br />

consumi<strong>do</strong>res de baixa ren<strong>da</strong>. O objetivo <strong>da</strong> tarefa neste relatório é o de fortalecer os<br />

instrumentos institucionais na regulação <strong>do</strong> setor elétrico. A ênfase está na autori<strong>da</strong>de<br />

<strong>da</strong> regulação e não em decisões <strong>regulatória</strong>s específicas. Desta maneira, não foram julga<strong>do</strong>s<br />

os méritos de quaisquer decisões <strong>regulatória</strong>s e nenhuma crítica foi apresenta<strong>da</strong> sobre tais decisões. Ao<br />

invés disso, o ponto central <strong>da</strong> tarefa é analisar os desenvolvimentos através de uma<br />

perspectiva <strong>institucional</strong> e fazer recomen<strong>da</strong>ções que contribuirão para a melhora <strong>do</strong><br />

<strong>estrutura</strong> <strong>regulatória</strong> <strong>do</strong> setor de energia no Brasil.<br />

Importante reiterar que o foco deste relatório está em questões substantivas. A<br />

maneira como devem ser implementa<strong>da</strong>s as recomen<strong>da</strong>ções foi intencionalmente<br />

deixa<strong>da</strong> em aberto. Na medi<strong>da</strong> em que a implementação requer mu<strong>da</strong>nças na lei, os<br />

autores não estão em condições de fazer julgamentos técnicos legais e políticos para<br />

decidir se as mu<strong>da</strong>nças devem ser realiza<strong>da</strong>s através de uma Medi<strong>da</strong> Provisória ou<br />

mu<strong>da</strong>nças através <strong>do</strong> Congresso. Em alguns casos, com relação a questões menos<br />

<strong>estrutura</strong>is, medi<strong>da</strong>s toma<strong>da</strong>s pelo MME, pelo CNPE, pelas autori<strong>da</strong>des judiciais ou<br />

pela própria ANEEL podem ser suficientes. O princípio básico a ser segui<strong>do</strong> é<br />

garantir que a maneira de implementar a recomen<strong>da</strong>ção seja a mais adequa<strong>da</strong> para<br />

torná-la permanente e ativa.<br />

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AS RECOMENDAÇÕES<br />

Ashley Brown, March 2002<br />

Pelos motivos inteiramente detalha<strong>do</strong>s na análise abaixo, são feitas as seguintes<br />

recomen<strong>da</strong>ções :<br />

1. Deve-se atribuir à ANEEL autori<strong>da</strong>de legal para estabelecer suas próprias<br />

práticas de contratação de pessoal, ou ao menos, uma certa flexibili<strong>da</strong>de para<br />

abster-se de práticas normalmente aplicáveis, quan<strong>do</strong> a especialização e<br />

capacitação técnica requeri<strong>da</strong>s forem exclusivas.<br />

2. Deve-se permitir que a ANEEL tenha condições de estabelecer pacotes<br />

de remuneração de seus funcionários, para que recebam de acor<strong>do</strong> com os<br />

níveis salariais pagos pelas empresas regula<strong>da</strong>s, ou pelo menos, permitir que<br />

seus salários sejam comparáveis aos de outras agências governamentais cuja<br />

remuneração ultrapassa os níveis normalmente aplicáveis (por exemplo, os<br />

níveis <strong>do</strong> Banco Central).<br />

3. Deve-se permitir que a ANEEL contrate funcionários em caráter<br />

permanente.<br />

4. Os diretores e funcionários devem estar proibi<strong>do</strong>s legalmente, por um<br />

perío<strong>do</strong> de um ano após a saí<strong>da</strong> <strong>da</strong> agência, de exercer qualquer tipo de<br />

emprego, até mesmo como consultores, que esteja relaciona<strong>do</strong> direta ou<br />

indiretamente às questões pendentes na ANEEL. Com relação à questões<br />

específicas com as quais trabalhou enquanto funcionário <strong>da</strong> ANEEL, a<br />

proibição deve ser permanente.<br />

5. Instrumentos legais relevantes devem ser emen<strong>da</strong><strong>do</strong>s para listar a<br />

formação acadêmica <strong>do</strong>s diretores . Entre elas, devem figurar, no mínimo,<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

economia, direito, engenharia e contabili<strong>da</strong>de. Não mais <strong>do</strong> que <strong>do</strong>is diretores<br />

devem ter a mesma formação.<br />

6. A lei deve ser emen<strong>da</strong><strong>da</strong> para que a ANEEL, autoriza<strong>da</strong> a arreca<strong>da</strong>r 0,5%<br />

<strong>da</strong> receita <strong>da</strong> ven<strong>da</strong> <strong>da</strong>s concessionárias, tenha que se submeter ao mesmo<br />

processo de aprovação orçamentária a que outros setores <strong>do</strong> governo são<br />

submeti<strong>do</strong>s. Se o orçamento realiza<strong>do</strong> pela ANEEL resultar em menos de<br />

0,5%, a diferença entre gasto e arreca<strong>da</strong>ção deve ser sujeita às medi<strong>da</strong>s<br />

descritas na Recomen<strong>da</strong>ção 7.<br />

7. A segun<strong>da</strong> medi<strong>da</strong> é uma proibição, conti<strong>da</strong> em lei, contra o desvio destes<br />

recursos orçamentários para outros fins. O Governo pode até decidir fazer<br />

cortes orçamentários para to<strong>do</strong>s os seus órgãos e aplicar parte destes cortes à<br />

ANEEL, mas o excedente devi<strong>do</strong> às taxas <strong>regulatória</strong>s, será automaticamente<br />

reverti<strong>do</strong> às empresas regula<strong>da</strong>s, para repasse ao consumi<strong>do</strong>r. Assim, o<br />

governo pode impor um controle <strong>do</strong>s gastos em geral, mas sem o incentivo ou<br />

a capaci<strong>da</strong>de de desviar fun<strong>do</strong>s destina<strong>do</strong>s à ativi<strong>da</strong>de <strong>regulatória</strong>. Este tipo de<br />

mecanismo é comum em agências de regulação nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s e em<br />

outros países.<br />

8. A prática <strong>do</strong> contrato de desempenho entre o MME e a ANEEL deve ser<br />

extinta<br />

9. A lei deve ser emen<strong>da</strong><strong>da</strong>, ou então uma política deve ser estabeleci<strong>da</strong>, para<br />

possibilitar uma revisão transparente, periódica e pública <strong>da</strong>s ativi<strong>da</strong>des <strong>da</strong><br />

ANEEL por autori<strong>da</strong>des designa<strong>da</strong>s pelo Legislativo e/ou Executivo (talvez a<br />

ca<strong>da</strong> quatro ou cinco anos).<br />

10


Ashley Brown, March 2002<br />

10. As regras <strong>da</strong> ANEEL, ou ain<strong>da</strong> melhor, a própria lei, deve ser emen<strong>da</strong><strong>da</strong><br />

para que to<strong>da</strong> comunicação, entre ela e qualquer parte, principalmente órgão<br />

governamental, seja feita de maneira pública e transparente.<br />

11. To<strong>da</strong>s as decisões <strong>da</strong> agência devem ser feitas por escrito e seguir, de<br />

preferência, o seguinte formato:<br />

a) Uma descrição geral e o histórico <strong>da</strong>s questões sob consideração;<br />

b) Um resumo <strong>da</strong>s opiniões ofereci<strong>da</strong>s por to<strong>da</strong>s as partes sobre a questão;<br />

c) Uma análise <strong>da</strong> ANEEL <strong>do</strong>s fatos jurídicos, evidências e opiniões<br />

apresenta<strong>da</strong>s.<br />

d) Uma declaração formal <strong>da</strong>s decisões e seus fun<strong>da</strong>mentos.<br />

12. To<strong>da</strong>s as decisões devem ser toma<strong>da</strong>s através de votação <strong>do</strong>s diretores,<br />

em reunião aberta, ten<strong>do</strong> ca<strong>da</strong> diretor a oportuni<strong>da</strong>de de justificar sua decisão<br />

e apresentar, por escrito, uma opinião divergente, ou mesmo concor<strong>da</strong>nte,<br />

mas por razões diferentes <strong>da</strong>quelas considera<strong>da</strong>s na decisão <strong>da</strong> maioria.<br />

13. A ANEEL deve buscar opiniões formais de to<strong>da</strong>s as partes interessa<strong>da</strong>s,<br />

de como fazer melhor uso <strong>da</strong>s audiências públicas para checar informações e<br />

idéias que lhe foram apresenta<strong>da</strong>s. Ao receber e analisar estas colaborações, a<br />

agência deve a<strong>do</strong>tar regras e procedimentos que possibilitem maior<br />

transparência para checar as informações e avaliar determina<strong>da</strong> questão.<br />

14. Deve-se convocar uma conferência com a participação <strong>do</strong> CNPE,<br />

lideranças legislativas e regula<strong>do</strong>res e com a colaboração <strong>do</strong>s investi<strong>do</strong>res,<br />

para propor uma legislação básica esclarecen<strong>do</strong> e definin<strong>do</strong> claramente as<br />

respectivas autori<strong>da</strong>des <strong>do</strong> CNPE e <strong>da</strong> ANEEL. A legislação pode estipular os<br />

limites deseja<strong>do</strong>s, mas também deve incluir os seguintes princípios:<br />

11


Ashley Brown, March 2002<br />

a) Determinações <strong>do</strong> executivo só serão obrigatórias quan<strong>do</strong> dentro <strong>do</strong>s<br />

limites de sua autori<strong>da</strong>de e quan<strong>do</strong> ações ou articulações de políticas<br />

precederem qualquer decisão <strong>da</strong> ANEEL sobre determina<strong>do</strong> assunto.<br />

b) Apenas um tribunal devi<strong>da</strong>mente constituí<strong>do</strong> pode determinar se a<br />

ANEEL excedeu sua autori<strong>da</strong>de legal e reverter a decisão.<br />

c) Deve-se conferir à ANEEL, autori<strong>da</strong>de para buscar orientações no CNPE,<br />

sempre que necessário por razões de jurisdição, desde que este procedimento<br />

seja a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> de maneira transparente. O CNPE também deve agir de maneira<br />

transparente ao fornecer sua orientação.<br />

d) A ANEEL deve ter liber<strong>da</strong>de para decidir questões, no exercício de sua<br />

legítima autori<strong>da</strong>de, na ausência de uma definição de política setorial, mas<br />

cuja determinação se faz necessária para o cumprimento <strong>da</strong>s<br />

responsabili<strong>da</strong>des <strong>da</strong> agência e relevante para a solução de questão pendente.<br />

15. A ANEEL deve estabelecer um procedimento formal e público, com o<br />

objetivo de obter sugestões para se determinar o nível ótimo de centralização e<br />

descentralização <strong>da</strong> regulação <strong>do</strong> segmento de distribuição. Entre as<br />

perguntas feitas, devem figurar as seguintes:<br />

a) Deve a delegação ser igual para to<strong>do</strong>s os Esta<strong>do</strong>s?<br />

b) Existe alguma assimetria entre a posse <strong>da</strong> informação sobre quali<strong>da</strong>de<br />

de serviço e a autori<strong>da</strong>de para usá-la?<br />

c) Se a ANEEL deve delegar mais autori<strong>da</strong>de aos Esta<strong>do</strong>s, que nível de<br />

autori<strong>da</strong>de de supervisão e apelação deve manter? Qual o critério que a<br />

ANEEL deva estipular, para o exercício <strong>da</strong> autori<strong>da</strong>de <strong>regulatória</strong> pelos<br />

Esta<strong>do</strong>s? Quem deve supervisionar a garantia de quali<strong>da</strong>de na regulação?<br />

12


Ashley Brown, March 2002<br />

d) Será que o maior número de delegações aos Esta<strong>do</strong>s reduz a carga de<br />

trabalho <strong>da</strong> ANEEL ou vai simplesmente complicar a situação?<br />

e) Que garantias existem de que as agências regula<strong>do</strong>ras estaduais vão<br />

operar de maneira independente?<br />

f) Qual será o efeito <strong>da</strong>s regulações estaduais nas práticas de compra de<br />

energia <strong>da</strong>s empresas de distribuição?<br />

16. A responsabili<strong>da</strong>de de conduzir leilões e outorgar concessões deve ser<br />

atribuí<strong>da</strong> à outra enti<strong>da</strong>de (priva<strong>da</strong> ou pública), com experiência. To<strong>do</strong>s os<br />

<strong>do</strong>cumentos relaciona<strong>do</strong>s à concessão e a meto<strong>do</strong>logia usa<strong>da</strong> na condução de<br />

licitações devem ser antes aprova<strong>do</strong>s pela ANEEL.<br />

17. A ANEEL, através de procedimentos transparentes, deve estabelecer<br />

padrões de desempenho tanto para o MAE quanto para o ONS. Deve também<br />

buscar opiniões sobre quais tipos de incentivo são mais adequa<strong>do</strong>s para<br />

instituições sem fins lucrativos, como o MAE e o ONS e se os incentivos<br />

proporciona<strong>do</strong>s aos seus diretores produziriam os mesmos resulta<strong>do</strong>s que os<br />

<strong>da</strong><strong>do</strong>s à instituição como um to<strong>do</strong>. Uma vez estabeleci<strong>do</strong>s os padrões, a<br />

ANEEL deve conduzir procedimentos de supervisão sobre o MAE e o ONS,<br />

uma vez por ano, buscan<strong>do</strong> colaboração de to<strong>do</strong>s os participantes <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>,<br />

com relação à continui<strong>da</strong>de <strong>da</strong> aplicação <strong>do</strong>s padrões de desempenho e <strong>do</strong>s<br />

incentivos. Ao fim de ca<strong>da</strong> procedimento, a ANEEL deve emitir um relatório<br />

indican<strong>do</strong> sua avaliação <strong>do</strong> desempenho <strong>da</strong>s duas instituições. O relatório<br />

também deve indicar, quan<strong>do</strong> necessário, quais mu<strong>da</strong>nças devem ser feitas<br />

com relação aos incentivos e padrões de desempenho aplica<strong>do</strong>s.<br />

13


Ashley Brown, March 2002<br />

18. A ANEEL deve propor e buscar uma colaboração em audiência pública<br />

sobre a criação de um Monitor Independente de Merca<strong>do</strong> no Brasil. A<br />

proposta deve incluir uma <strong>estrutura</strong> recomen<strong>da</strong><strong>da</strong>, aspectos financeiros e um<br />

méto<strong>do</strong> de operação para a enti<strong>da</strong>de.<br />

19. A ANEEL deve estabelecer um processo de resolução de conflitos para<br />

li<strong>da</strong>r prontamente com qualquer reclamação apresenta<strong>da</strong> à agência com<br />

relação às ações <strong>do</strong> MAE e ONS. Deve também estabelecer um procedimento<br />

que lhe permita iniciar investigações no MAE e/ou no ONS por conta própria.<br />

20. To<strong>da</strong>s as apelações às decisões <strong>da</strong> agência regula<strong>do</strong>ra devem ser dirigi<strong>da</strong>s<br />

a um único fórum, cuja decisão, na ausência de qualquer questão<br />

constitucional, será final.<br />

21. Este fórum deve ser um tribunal especializa<strong>do</strong> cria<strong>do</strong> com o único<br />

propósito de receber recursos <strong>da</strong>s agências regula<strong>do</strong>ras ou, como alternativa,<br />

deve ser o Supremo Tribunal de Justiça. Um grupo de especialistas em<br />

assuntos jurídico-legais deve ser constituí<strong>do</strong> para consultar interlocutores<br />

acredita<strong>do</strong>s, públicos ou priva<strong>do</strong>s, para conduzir pesquisas necessárias e<br />

recomen<strong>da</strong>r o fórum apropria<strong>do</strong> a ser designa<strong>do</strong> através <strong>da</strong> elaboração <strong>do</strong><br />

<strong>do</strong>cumento necessário para executar sua recomen<strong>da</strong>ção.<br />

22. Órgãos recursais, reven<strong>do</strong> decisões <strong>regulatória</strong>s são obriga<strong>do</strong>s a ratificar a<br />

decisão <strong>da</strong> agência, a não ser que se caracterize especificamente que esta<br />

excedeu sua autori<strong>da</strong>de legal, ou agiu de forma arbitrária e irracional,<br />

contrária ao peso manifesto de evidências, ou deixou de seguir procedimentos<br />

e processos constitucionais e legais adequa<strong>do</strong>s. Ao considerar as apelações, os<br />

órgãos ficam proibi<strong>do</strong>s de avaliar qualquer evidência ou argumento que<br />

14


Ashley Brown, March 2002<br />

deixaram de ser apresenta<strong>do</strong>s ao regula<strong>do</strong>r e também, de reavaliar as<br />

implicações de políticas de qualquer decisão que não seja defeituosa pela<br />

razão menciona<strong>da</strong> acima. Na consideração de qualquer recurso o órgão de<br />

apelação deve supor que a decisão foi correta. Tal suposição, por motivos de<br />

suspensão temporária de uma decisão <strong>regulatória</strong>, pode ser refuta<strong>da</strong>, mas<br />

apenas diante de uma clara evidência de que a implementação <strong>da</strong> decisão<br />

causará <strong>da</strong>nos irreparáveis ao recorrente, e quan<strong>do</strong> este tiver uma chance<br />

substancial de sucesso no processo de apelação.<br />

23. Se o órgão de apelação considerar que a decisão <strong>da</strong> agência regula<strong>do</strong>ra<br />

deve ser reverti<strong>da</strong> e que medi<strong>da</strong>s corretivas adicionais precisam ser toma<strong>da</strong>s, o<br />

melhor méto<strong>do</strong> para encarregar-se de ações futuras, é enviar a matéria de volta<br />

à agência regula<strong>do</strong>ra, com instruções para que esta tome as medi<strong>da</strong>s<br />

necessárias e consistentes com a decisão <strong>do</strong> órgão de apelação. Este também<br />

pode estipular um prazo para reassumir a responsabili<strong>da</strong>de de <strong>da</strong>r a sentença,<br />

caso o regula<strong>do</strong>r não o faça.<br />

24. Nenhum indivíduo ou grupo pode recorrer <strong>da</strong> decisão <strong>do</strong> regula<strong>do</strong>r a não<br />

ser que tenha participa<strong>do</strong> <strong>do</strong> processo no qual foi toma<strong>da</strong> a decisão. Não se<br />

pode levantar nenhuma questão no processo de apelação, que não tenha si<strong>do</strong><br />

previamente apresenta<strong>da</strong> ao regula<strong>do</strong>r.<br />

25. A ANEEL deve tomar a iniciativa de coordenar, com outras enti<strong>da</strong>des<br />

governamentais e não-governamentais, formas de financiar permanentemente<br />

uma organização de defesa <strong>do</strong>s interesses de pequenos consumi<strong>do</strong>res .<br />

26. Uma força-tarefa com representantes <strong>da</strong> ANEEL, ANP e ANA, de<br />

legisla<strong>do</strong>res e de ministérios, deve ser organiza<strong>da</strong> para preparar um relatório<br />

15


Ashley Brown, March 2002<br />

propon<strong>do</strong> formas de se obter uma coordenação mais articula<strong>da</strong> <strong>da</strong>s três<br />

agências. Parte <strong>do</strong> estu<strong>do</strong> deve incluir o exame de to<strong>da</strong>s as sugestões<br />

relevantes para a coordenação <strong>da</strong>s ativi<strong>da</strong>des <strong>da</strong>s agências regula<strong>do</strong>ras (por<br />

exemplo, procedimentos, consoli<strong>da</strong>ção de funções ou regras comuns). Deve-<br />

se dedicar atenção especial às políticas de coordenação <strong>do</strong>s merca<strong>do</strong>s de<br />

combustível e geração. Recomendável contratar os serviços de consultores<br />

para facilitar o trabalho.<br />

27. Uma força-tarefa constituí<strong>da</strong> por regula<strong>do</strong>res, participantes <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>,<br />

acadêmicos e oficiais <strong>do</strong> governo deve ser convoca<strong>da</strong> para propor um<br />

programa nacional com o objetivo de fornecer infra-<strong>estrutura</strong> intelectual para a<br />

regulação econômica no Brasil. A proposta deve também incluir formas de<br />

financiamento e articulação com organizações internacionais .<br />

28. A ANEEL deve ter somente duas funções no processo de planejamento:<br />

uma é determinar que custos ou riscos devem ser socializa<strong>do</strong>s, através de<br />

repasse ao consumi<strong>do</strong>r e a outra é adjudicar disputas .<br />

29. A ANEEL deve promover um debate público sobre a a<strong>do</strong>ção de preços-<br />

teto na regulação <strong>da</strong>s empresas de distribuição, o qual deve focar os prós e<br />

contras <strong>do</strong> sistema existente e os benefícios ou as falhas potenciais de se<br />

substituir preços-teto por um sistema de receita máxima ou custo de serviço.<br />

ANÁLISE E FUNDAMENTOS DAS RECOMENDAÇÕES<br />

16


III. A) Recursos Humanos: as questões<br />

Ashley Brown, March 2002<br />

Um funcionário <strong>do</strong> alto escalão <strong>do</strong> governo deu um conselho útil para o sucesso<br />

deste relatório, que foi o de começar pelo básico. É claro que não existe na<strong>da</strong> mais<br />

básico <strong>do</strong> que a questão <strong>do</strong>s recursos. Infelizmente, é neste ponto que a ANEEL, não<br />

por culpa sua, tem enfrenta<strong>do</strong> grandes dificul<strong>da</strong>des. Os problemas enfrenta<strong>do</strong>s pela<br />

agência, que dizem respeito aos recursos humanos estão relaciona<strong>do</strong>s a baixos<br />

salários, obstáculos para contratar e manter funcionários e falta de diversi<strong>da</strong>de <strong>do</strong>s<br />

profissionais que ocupam os cargos mais altos <strong>da</strong> agência. Existem algumas<br />

preocupações com relação aos recursos financeiros que também merecem atenção.<br />

Será útil situar estas questões em pelo menos <strong>do</strong>is contextos.<br />

O primeiro contexto é o de que o senso de dedicação, a serie<strong>da</strong>de de propósitos<br />

e o grau de esforço <strong>do</strong>s funcionários <strong>da</strong> ANEEL, em to<strong>do</strong>s os níveis, são amplamente<br />

reconheci<strong>do</strong>s e valoriza<strong>do</strong>s pelos entrevista<strong>do</strong>s. Os problemas relaciona<strong>do</strong>s aos recursos<br />

humanos que foram identifica<strong>do</strong>s eram de natureza <strong>institucional</strong> e não decorrentes de uma falha<br />

específica <strong>do</strong>s funcionários <strong>da</strong> agência.<br />

O segun<strong>do</strong> contexto é histórico. Apesar de o Brasil ter ti<strong>do</strong> pouca experiência<br />

com o que pode ser chama<strong>do</strong> de regulação independente, a ver<strong>da</strong>de é que a ANEEL<br />

já teve uma agência antecessora, o DNAEE, que deixou planta<strong>da</strong>s as sementes para<br />

muitos <strong>do</strong>s problemas de recursos na ANEEL. Como o DNAEE fazia parte <strong>do</strong><br />

Ministério de Minas e Energia e como regulava empresas públicas, o departamento<br />

podia fazer uso ou estar sujeito a práticas considera<strong>da</strong>s impróprias para uma agência<br />

regula<strong>do</strong>ra independente. Duas destas práticas merecem destaque. A primeira está<br />

relaciona<strong>da</strong> ao número de funcionários permanentes que existiam dentro <strong>do</strong><br />

DNAEE. A maioria <strong>do</strong>s funcionários era proveniente de empresas públicas<br />

17


Ashley Brown, March 2002<br />

cumprin<strong>do</strong> uma tarefa temporária no departamento. Por conta disso, estes<br />

funcionários não eram remunera<strong>do</strong>s pela agência regula<strong>do</strong>ra de acor<strong>do</strong> com a tabela<br />

salarial <strong>do</strong> governo, e sim pelas empresas regula<strong>da</strong>s com os seus níveis salariais mais<br />

altos. A segun<strong>da</strong> prática está relaciona<strong>da</strong> ao tratamento orçamentário <strong>da</strong> agência<br />

regula<strong>do</strong>ra, como mais uma repartição <strong>do</strong> governo ao invés de uma enti<strong>da</strong>de<br />

“independente”. Por conta disso, as questões orçamentárias, administrativas e de<br />

pessoal eram trata<strong>da</strong>s exatamente como em qualquer outro órgão <strong>do</strong> governo.<br />

As leis que criaram a ANEEL, como uma agência regula<strong>do</strong>ra independente e<br />

moderna não foram capazes de resolver as diferenças, no âmbito <strong>do</strong>s recursos<br />

humanos e financeiros, entre o novo e o velho regime regula<strong>do</strong>r. As diferenças entre<br />

as agências regula<strong>do</strong>ras e outros órgãos <strong>do</strong> governo também foram deixa<strong>da</strong>s de la<strong>do</strong>.<br />

Sen<strong>do</strong> assim, por exemplo, apesar de a lei ter a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> providências para tornar os<br />

salários <strong>da</strong> ANEEL competitivos com os salários de cargos equivalentes em outros<br />

órgãos <strong>do</strong> governo, ela não levou em conta a mesma preocupação com relação<br />

àqueles níveis salariais <strong>do</strong> setor priva<strong>do</strong> regula<strong>do</strong>. Reconheceu, no entanto, o claro<br />

conflito de interesses <strong>do</strong> sistema, onde uma agência regula<strong>do</strong>ra independente é<br />

constituí<strong>da</strong> por funcionários temporários que continuam seguin<strong>do</strong> carreira e sen<strong>do</strong><br />

remunera<strong>do</strong>s por empresas regula<strong>da</strong>s. Era inevitável que a prática fosse aban<strong>do</strong>na<strong>da</strong>.<br />

As agências regula<strong>do</strong>ras independentes diferem em pelo menos três aspectos <strong>da</strong><br />

maioria <strong>da</strong>s outras repartições públicas. O primeiro é que sua responsabili<strong>da</strong>de e valor<br />

são defini<strong>do</strong>s menos pelo número de pessoas supervisiona<strong>da</strong>s e mais pela capacitação<br />

técnica e conhecimento substantivo. O segun<strong>do</strong> aspecto é que a estabili<strong>da</strong>de de<br />

funcionários é de muita importância para a regulação. Os funcionários constituem a<br />

memória <strong>institucional</strong>, que gera um grau de continui<strong>da</strong>de e estabili<strong>da</strong>de,<br />

18


Ashley Brown, March 2002<br />

proporcionan<strong>do</strong> aos investi<strong>do</strong>res e participantes <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> a medi<strong>da</strong> de segurança<br />

que eles exigem. Outro fator relevante é que a continui<strong>da</strong>de <strong>do</strong>s funcionários é<br />

essencial para o desenvolvimento completo de especialização e capacitação técnica<br />

através de treinamento formal e prático. O terceiro aspecto é que órgãos regula<strong>do</strong>res<br />

são responsáveis pela supervisão de empresas priva<strong>da</strong>s cujos funcionários,<br />

especialmente os de alto escalão, são remunera<strong>do</strong>s a níveis substancialmente mais<br />

eleva<strong>do</strong>s que pessoas em cargos equivalentes <strong>do</strong> setor público. Já que as empresas<br />

regula<strong>da</strong>s estão buscan<strong>do</strong> muito profissionais especializa<strong>do</strong>s em regulação, as<br />

dispari<strong>da</strong>des salariais entre regula<strong>do</strong>res e regula<strong>do</strong>s causam incentivos indeseja<strong>do</strong>s que<br />

deveriam ser evita<strong>do</strong>s, como o incentivo ao regula<strong>do</strong>r especializa<strong>do</strong> de buscar<br />

emprego nas empresas regula<strong>da</strong>s. Esta porta aberta pode criar, no mínimo, uma<br />

aparência de improprie<strong>da</strong>de, se é que ela mesma não constitui uma improprie<strong>da</strong>de.<br />

Tais eventos têm sérios impactos na credibili<strong>da</strong>de, se não na eficácia, <strong>da</strong> regulação.<br />

Ca<strong>da</strong> uma destas diferenças merece ser avalia<strong>da</strong> em detalhes no contexto <strong>da</strong> ANEEL.<br />

Normas de administração e recrutamento aplicáveis à administração pública não<br />

são sempre apropria<strong>da</strong>s para as agências regula<strong>do</strong>ras. Um exemplo clássico é que<br />

muitas vezes o nível de responsabili<strong>da</strong>de e, portanto, o nível de remuneração, está<br />

relaciona<strong>do</strong> à quanti<strong>da</strong>de de pessoas e verba que está sen<strong>do</strong> administra<strong>da</strong> por um<br />

indivíduo. Em agências regula<strong>do</strong>ras, o orçamento e o número de funcionários são, em<br />

geral, baixos quan<strong>do</strong> compara<strong>do</strong>s aos recursos encontra<strong>do</strong>s em outras agências <strong>do</strong><br />

governo. O valor real vem <strong>da</strong> capacitação em uma varie<strong>da</strong>de de questões técnicas e<br />

muitas vezes específicas <strong>do</strong> conhecimento de regulação. Dessa maneira, quan<strong>do</strong> as<br />

pessoas estão sen<strong>do</strong> recruta<strong>da</strong>s, a habili<strong>da</strong>de e o conhecimento exigi<strong>do</strong>s são muitas<br />

vezes focaliza<strong>do</strong>s e específicos, diferentemente <strong>da</strong>s qualificações exigi<strong>da</strong>s em outras<br />

19


Ashley Brown, March 2002<br />

ativi<strong>da</strong>des governamentais. Existe, portanto, uma lógica evidente para permitir às<br />

agências regula<strong>do</strong>ras, maior flexibili<strong>da</strong>de para contratar e remunerar seus<br />

funcionários. Aparentemente, a ANEEL tentou seguir esta lógica e se deparou com<br />

dificul<strong>da</strong>des legais relaciona<strong>da</strong>s aos critérios gerais normalmente aplicáveis ao<br />

governo. Sem entrar em detalhes sobre as questões legais, o governo deveria tomar as providências<br />

necessárias que possibilitem à ANEEL, implementar práticas mais adequa<strong>da</strong>s de contratação <strong>do</strong>s<br />

melhores indivíduos para cumprir suas responsabili<strong>da</strong>des específicas. Existe precedente de tal<br />

flexibili<strong>da</strong>de na Argentina, onde as agências regula<strong>do</strong>ras, nacionais e estaduais, têm<br />

usa<strong>do</strong> méto<strong>do</strong>s bastante inova<strong>do</strong>res e singulares para testar, treinar e contratar seus<br />

funcionários. Dentre eles, a seleção de candi<strong>da</strong>tos para determina<strong>do</strong>s cargos e a<br />

condução de sessões interativas de treinamento, incluin<strong>do</strong> avaliações subseqüentes <strong>do</strong><br />

desempenho de ca<strong>da</strong> candi<strong>da</strong>to. O Brasil deveria permitir uma flexibili<strong>da</strong>de<br />

equivalente para a ANEEL.<br />

Muitos <strong>do</strong>s entrevista<strong>do</strong>s comentaram e reclamaram sobre os problemas<br />

enfrenta<strong>do</strong>s pela ANEEL em manter funcionários. As preocupações mais<br />

contundentes, foram no senti<strong>do</strong> de que não havia continui<strong>da</strong>de e memória<br />

<strong>institucional</strong> entre os funcionários e que estes, por inexperiência, muitas vezes tinham<br />

que aprender no decorrer <strong>do</strong> cumprimento de seus deveres. A incapaci<strong>da</strong>de de<br />

manter funcionários parece ter sua causa em três fatores. O primeiro é a suspensão já<br />

menciona<strong>da</strong> <strong>da</strong> antiga prática <strong>da</strong> ANEEL de contratar funcionários de outras<br />

empresas regula<strong>da</strong>s. O fim desta prática obviamente exigiu a saí<strong>da</strong> de tais<br />

funcionários. O segun<strong>do</strong> problema é que o atrativo salarial em empresas regula<strong>da</strong>s,<br />

principalmente em cargos mais altos, é significativamente maior <strong>do</strong> que na ANEEL e<br />

alguns funcionários foram atraí<strong>do</strong>s por melhores oportuni<strong>da</strong>des financeiras. Por fim,<br />

20


Ashley Brown, March 2002<br />

problemas legais encontra<strong>do</strong>s pela agência, com relação às suas práticas de<br />

contratação deixaram-na na difícil posição de não poder contratar novos funcionários<br />

permanentes, sen<strong>do</strong> de três anos o limite para novos contratos.<br />

Embora alguma atenção já tenha si<strong>do</strong> <strong>da</strong><strong>da</strong> à primeira causa <strong>do</strong> problema, a<br />

segun<strong>da</strong> e a terceira também precisam ser coloca<strong>da</strong>s em perspectiva. Agências<br />

regula<strong>do</strong>ras precisam competir por funcionários no mesmo merca<strong>do</strong> de trabalho, <strong>da</strong>s<br />

empresas regula<strong>da</strong>s e de outros participantes <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>. Logo, pacotes salariais para<br />

os funcionários <strong>da</strong> ANEEL precisam ser minimamente competitivos com aqueles<br />

encontra<strong>do</strong>s no setor priva<strong>do</strong> regula<strong>do</strong>, a ponto de as agências regula<strong>do</strong>ras não<br />

poderem competir em termos de remuneração ofereci<strong>da</strong> aos funcionários e a<br />

quali<strong>da</strong>de <strong>da</strong> regulação baixar. Em segun<strong>do</strong> lugar, funcionários experientes e<br />

capacita<strong>do</strong>s vão encontrar melhores oportuni<strong>da</strong>des em outras empresas e vão deixar a<br />

agência. Nenhuma circunstância é favorável para a quali<strong>da</strong>de <strong>da</strong> regulação. De<br />

maneira semelhante, como já menciona<strong>do</strong> anteriormente, o incentivo de aperfeiçoar<br />

conhecimentos específicos de regulação em uma agência regula<strong>do</strong>ra e depois buscar<br />

emprego em outras empresas, constitui um problema a partir de <strong>do</strong>is pontos de vista.<br />

O primeiro é o gasto inerente no investimento de treinar e equipar um funcionário<br />

para então perdê-lo para uma empresa priva<strong>da</strong>. O segun<strong>do</strong> é a questão ética inerente<br />

<strong>da</strong> troca de pessoas entre agências regula<strong>do</strong>ras e empresas regula<strong>da</strong>s. Tal movimento<br />

cria uma aparência, se não uma reali<strong>da</strong>de, de conflitos de interesse. São inúmeros os<br />

exemplos ao re<strong>do</strong>r <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> em que tais situações têm causa<strong>do</strong> <strong>da</strong>nos consideráveis<br />

na credibili<strong>da</strong>de e eficácia <strong>da</strong> regulação independente. A equação é constituí<strong>da</strong> por<br />

duas variáveis: pacotes salariais competitivos para funcionários de agências<br />

regula<strong>do</strong>ras e padrões éticos aceitáveis. Muitas jurisdições têm decreta<strong>do</strong> leis ou<br />

21


Ashley Brown, March 2002<br />

normas limitan<strong>do</strong> a possibili<strong>da</strong>de de regula<strong>do</strong>res trabalharem para empresas regula<strong>da</strong>s<br />

depois de deixar a regulação. Apesar <strong>da</strong>s normas fazerem senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> ponto de vista<br />

<strong>da</strong> ética e <strong>da</strong> política pública, elas são um tanto injustas para funcionários e diretores<br />

<strong>da</strong>s agências regula<strong>do</strong>ras, na medi<strong>da</strong> em que as habili<strong>da</strong>des que desenvolveram só<br />

podem ser usa<strong>da</strong>s em empresas participantes <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> regula<strong>do</strong>. Já houve pelo<br />

menos uma controvérsia no Brasil, que não envolveu a ANEEL, sobre a saí<strong>da</strong> de um<br />

funcionário de uma agência regula<strong>do</strong>ra estadual, para trabalhar em uma empresa<br />

regula<strong>da</strong>. A solução óbvia, que proporciona equilíbrio entre os interesses <strong>do</strong>s<br />

funcionários de um la<strong>do</strong> e uma política pública consciente e restrições éticas <strong>do</strong> outro,<br />

é garantir que os salários pagos aos regula<strong>do</strong>res sejam minimamente competitivos<br />

com àqueles <strong>do</strong> setor regula<strong>do</strong>, impon<strong>do</strong> requisitos éticos razoáveis e pondera<strong>do</strong>s que<br />

produzam o equilíbrio entre garantir ética e credibili<strong>da</strong>de, sem impor restrições<br />

excessivas aos funcionários <strong>da</strong>s agências regula<strong>do</strong>ras. Estas restrições éticas não<br />

devem ser aplicáveis apenas aos diretores, mas também aos superintendentes e a<br />

outros funcionários de alto escalão. Muitas jurisdições de países em desenvolvimento,<br />

têm si<strong>do</strong> capazes de realizar este equilíbrio nivelan<strong>do</strong> a base salarial de regula<strong>do</strong>res aos<br />

níveis encontra<strong>do</strong>s em agências independentes <strong>do</strong> governo como o Banco Central, ou<br />

toman<strong>do</strong> como referência os salários pagos pelas empresas regula<strong>da</strong>s, ou ain<strong>da</strong> através<br />

de um outro meio de elevar os salários pagos aos regula<strong>do</strong>res a níveis mais altos <strong>do</strong><br />

que aqueles encontra<strong>do</strong>s em outros setores <strong>do</strong> governo. De fato, pelo menos um<br />

Esta<strong>do</strong> no Brasil tem si<strong>do</strong> capaz de fazer isto para seu regula<strong>do</strong>r, que é o caso <strong>da</strong><br />

AGERGS, a agência regula<strong>do</strong>ra de infra-<strong>estrutura</strong> <strong>do</strong> Rio Grande <strong>do</strong> Sul. A outra<br />

variável <strong>da</strong> equação, como já menciona<strong>da</strong>, é muitas vezes trata<strong>da</strong> através de<br />

proibições com relação a empregos futuros como recomen<strong>da</strong><strong>do</strong> a seguir.<br />

22


Ashley Brown, March 2002<br />

A terceira causa <strong>do</strong> problema está nas leis e na interpretação judicial <strong>da</strong>s leis que<br />

governam os empregos no setor público. As práticas de contratação <strong>da</strong> ANEEL<br />

foram desafia<strong>da</strong>s no tribunal, sob a teoria de que os indivíduos sen<strong>do</strong> contrata<strong>do</strong>s não<br />

estavam sen<strong>do</strong> submeti<strong>do</strong>s a concursos que são em geral exigi<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s funcionários<br />

públicos. A ANNEL perdeu a causa e está hoje efetivamente proibi<strong>da</strong> de contratar<br />

novos funcionários, a não ser que estejam sob um contrato de no máximo três anos.<br />

Esta restrição gera efeitos devasta<strong>do</strong>res e interfere de maneira significativa no<br />

trabalho <strong>da</strong> ANEEL. Claramente, uma solução precisa ser encontra<strong>da</strong>.<br />

Afirmar que a situação é muito insatisfatória é um eufemismo. Não é razoável<br />

esperar que a ANEEL alcance níveis ótimos em qualquer de seus desempenhos sob tais restrições.<br />

Na ver<strong>da</strong>de, os funcionários <strong>da</strong> agência devem ser louva<strong>do</strong>s por terem tão bom<br />

desempenho sob circunstâncias difíceis como estas. Desta maneira, as seguintes<br />

recomen<strong>da</strong>ções devem ser considera<strong>da</strong>s:<br />

1. Deve-se atribuir à ANEEL autori<strong>da</strong>de legal para estabelecer suas<br />

próprias práticas de contratação, ou ao menos, uma certa flexibili<strong>da</strong>de para<br />

abster-se <strong>da</strong>s práticas normalmente aplicáveis, quan<strong>do</strong> a especialização e<br />

capacitação técnica requeri<strong>da</strong>s forem exclusivas.<br />

2. Deve-se permitir à ANEEL condições para estabelecer pacotes de<br />

remuneração para funcionários que recebam de acor<strong>do</strong> com os níveis salariais<br />

pagos pelas empresas regula<strong>da</strong>s, ou pelo menos, permitir que seus salários<br />

sejam comparáveis aos de outras agências governamentais cuja remuneração<br />

ultrapassa os níveis normalmente aplicáveis (por exemplo, os níveis de<br />

remuneração <strong>do</strong> Banco Central)<br />

23


Ashley Brown, March 2002<br />

3. Deve-se permitir que a ANEEL contrate funcionários em caráter<br />

permanente.<br />

4. Os diretores e funcionários <strong>da</strong> ANEEL devem estar proibi<strong>do</strong>s, por um<br />

perío<strong>do</strong> de um ano após a saí<strong>da</strong> <strong>da</strong> agência, de obter qualquer tipo de<br />

emprego, até mesmo como consultor, que esteja relaciona<strong>do</strong> direta ou<br />

indiretamente às questões pendentes na ANEEL. Com relação à questões<br />

específicas com as quais trabalhou enquanto funcionário <strong>da</strong> ANEEL, a<br />

proibição deve ser permanente.<br />

Um outro item relaciona<strong>do</strong> aos funcionários é o <strong>da</strong> composição <strong>do</strong> quadro de<br />

Diretores. Enquanto que a autori<strong>da</strong>de a nomear os diretores tem ampla liber<strong>da</strong>de de<br />

ação com relação à qualificação <strong>do</strong>s indica<strong>do</strong>s, é surpreendente que to<strong>do</strong>s os<br />

nomea<strong>do</strong>s sejam engenheiros por formação. Existe uma lógica para isso, <strong>da</strong><strong>do</strong> que o<br />

setor elétrico no Brasil tem si<strong>do</strong> historicamente dirigi<strong>do</strong> por engenheiros, escolhi<strong>do</strong>s a<br />

partir de um excelente grupo de indivíduos talentosos. Não existe na<strong>da</strong> de<br />

excepcional sobre o Brasil com relação a estas circunstâncias. No entanto, a melhor<br />

prática que tem se desenvolvi<strong>do</strong> internacionalmente é a de diversificar a composição<br />

profissional <strong>da</strong> diretoria. Na ver<strong>da</strong>de, o conhecimento a ser aplica<strong>do</strong> é multi-<br />

disciplinar. A economia, o direito e a contabili<strong>da</strong>de, soma<strong>do</strong>s à engenharia e outras<br />

disciplinas desempenham um papel crítico na área <strong>da</strong> regulação. Da<strong>do</strong> que é uma<br />

tendência humana comum analisar as questões através <strong>do</strong> prisma <strong>da</strong> própria experiência, seria útil se<br />

ca<strong>da</strong> uma destas disciplinas fosse representa<strong>da</strong> na própria diretoria. Embora o Presidente e o<br />

Ministro tenham certamente liber<strong>da</strong>de para nomear pessoas de formações diferentes<br />

na diretoria, talvez fosse prudente estabelecer requisitos de diversi<strong>da</strong>de profissional na<br />

própria lei. Com isso, recomen<strong>da</strong>-se que:<br />

24


Ashley Brown, March 2002<br />

5. Instrumentos legais relevantes devem ser emen<strong>da</strong><strong>do</strong>s para listar a<br />

formação acadêmica <strong>do</strong>s diretores . Entre estas profissões devem figurar, no<br />

mínimo, economia, direito, engenharia e contabili<strong>da</strong>de. Não mais <strong>do</strong> que <strong>do</strong>is<br />

diretores devem ser <strong>da</strong> mesma formação.<br />

B. As Questões relaciona<strong>da</strong>s aos recursos financeiros<br />

O financiamento <strong>da</strong>s agências regula<strong>do</strong>ras constitui o ponto central para o<br />

equilíbrio entre independência e responsabili<strong>da</strong>de. Por um la<strong>do</strong>, é criticamente<br />

importante que os regula<strong>do</strong>res tenham condições financeiras para realizarem suas<br />

ativi<strong>da</strong>des de maneira consistente. E para isto, é preciso habili<strong>da</strong>de para evitar que o<br />

governo retenha os fun<strong>do</strong>s destina<strong>do</strong>s ao uso <strong>da</strong> agência regula<strong>do</strong>ra. Por outro la<strong>do</strong>,<br />

estas agências, como qualquer outro órgão <strong>do</strong> governo, precisam ter responsabili<strong>da</strong>de<br />

pelo uso de verbas públicas. Portanto, a agência deve estar sujeita a to<strong>do</strong>s os<br />

controles orçamentários e contábeis aplicáveis aos outros órgãos <strong>do</strong> governo. O<br />

problema é que o poder que o Governo tem de suspender os recursos <strong>da</strong> agência regula<strong>do</strong>ra no meio de<br />

ciclos orçamentários pode constituir uma maneira eficaz de minar a autonomia regula<strong>do</strong>ra. Além<br />

disso, incertezas orçamentárias no meio <strong>do</strong> ciclo geram um certo grau de imprevisibili<strong>da</strong>de no<br />

desempenho <strong>da</strong>s suas ativi<strong>da</strong>des, poden<strong>do</strong> causar <strong>da</strong>nos significativos tanto para os interesses <strong>do</strong><br />

investi<strong>do</strong>r quanto para os <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Por estas razões, um equilíbrio precisa ser<br />

encontra<strong>do</strong> entre responsabili<strong>da</strong>de, independência, previsibili<strong>da</strong>de e confiança.<br />

Não houve insinuação alguma de que o Governo tenha interferi<strong>do</strong> nos recursos<br />

financeiros <strong>da</strong> ANEEL, na tentativa de influenciar, penalizar ou recompensar a<br />

25


Ashley Brown, March 2002<br />

agência com relação a decisões que possa ter toma<strong>do</strong>, ou que terá de tomar em breve.<br />

No entanto, têm surgi<strong>do</strong> discussões dentro <strong>do</strong> Governo sobre a possibili<strong>da</strong>de de<br />

desviar verbas destina<strong>da</strong>s à regulação para outros fins. É provável que a causa <strong>da</strong><br />

discussão não tivesse relação com as decisões <strong>da</strong> ANEEL, mas sim motiva<strong>da</strong> por uma<br />

vontade de transferir recursos para outro uso governamental. O impacto disso sobre<br />

a ANEEL, no entanto, tenderia a impedir que a agência conduzisse seus negócios.<br />

A ANEEL tem o direito por lei de receber a “...taxa de fiscalização de 0,5% <strong>do</strong><br />

valor <strong>do</strong> benefício econômico anual auferi<strong>do</strong> pelo concessionário, permissionário ou<br />

autoriza<strong>do</strong>...”. A percentagem, compara<strong>da</strong> a padrões internacionais, não é nem um<br />

pouco excessiva. O conceito de que a agência deve ser financia<strong>da</strong> por “taxas<br />

<strong>regulatória</strong>s” também é consistente com a prática internacional. Um problema surge<br />

para a ANEEL, assim como para muitas agências regula<strong>do</strong>ras em outros países,<br />

quan<strong>do</strong> as taxas <strong>regulatória</strong>s são corta<strong>da</strong>s ou desvia<strong>da</strong>s, como se fossem iguais aos<br />

impostos cobra<strong>do</strong>s pelo governo. As taxas são pagas pelos consumi<strong>do</strong>res para serviços de<br />

regulação muito específicos, e não como um tipo de taxação generaliza<strong>da</strong>. Desviar estes fun<strong>do</strong>s para<br />

outros usos que não sejam aqueles especifica<strong>do</strong>s por lei é injusto e inapropria<strong>do</strong>, além de limitar<br />

profun<strong>da</strong>mente a autonomia <strong>da</strong> agência regula<strong>do</strong>ra. Dito isto, não há razão para que as<br />

agências regula<strong>do</strong>ras não sejam submeti<strong>da</strong>s às obrigações orçamentárias e de auditoria<br />

como as outras repartições <strong>do</strong> governo. Mesmo o fato de que a lei determina o uso<br />

específico <strong>da</strong> taxa de fiscalização <strong>da</strong> ANEEL, pode criar uma irresistível tentação para<br />

as autori<strong>da</strong>des fiscais de desviar parte desta verba, quan<strong>do</strong> o governo estivesse em<br />

situação financeira difícil. Parece apropria<strong>do</strong> buscar alternativas para a situação atual.<br />

O principal é encontrar um meio-termo entre a necessi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> ANEEL, por<br />

segurança orçamentária e a necessi<strong>da</strong>de <strong>do</strong> governo de supervisionar os gastos gerais<br />

26


Ashley Brown, March 2002<br />

e exercer o controle apropria<strong>do</strong>. Colocar a questão em perspectiva também é<br />

importante. O orçamento total <strong>da</strong> ANEEL é insignificante compara<strong>do</strong> ao orçamento<br />

geral <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>. Desviar parte deste orçamento só poderia servir para os mais<br />

limita<strong>do</strong>s objetivos. Apesar de não existir evidências de que o governo tenha desvia<strong>do</strong><br />

fun<strong>do</strong>s, como meio de punir ou influenciar a ANEEL, não existe recurso para<br />

impedir que isto seja feito por futuros governos. Desta maneira, legisla<strong>do</strong>res deveriam<br />

simplesmente eliminar a possibili<strong>da</strong>de de desvio de taxas <strong>regulatória</strong>s através de uma<br />

proibição na lei. Isto posto, o governo tem de fato um interesse legítimo em controlar<br />

os gastos totais e garantir que as verbas estão sen<strong>do</strong> aplica<strong>da</strong>s de maneira consistente<br />

com o controle adequa<strong>do</strong>.<br />

Duas medi<strong>da</strong>s merecem ser considera<strong>da</strong>s, na tentativa de equilibrar os interesses<br />

legítimos <strong>do</strong> Executivo e <strong>do</strong> Regula<strong>do</strong>r. De acor<strong>do</strong> com isso, duas recomen<strong>da</strong>ções<br />

são feitas:<br />

6. A lei deve ser emen<strong>da</strong><strong>da</strong> para que a ANEEL, autoriza<strong>da</strong> a arreca<strong>da</strong>r a taxa<br />

de fiscalização de 0.5% <strong>da</strong> receita <strong>da</strong>s operações de compra e ven<strong>da</strong> de<br />

energia elétrica, terá que ser submeti<strong>da</strong> ao mesmo processo de aprovação<br />

de orçamento a que outros setores <strong>do</strong> governo estão submeti<strong>do</strong>s. Se o<br />

orçamento realiza<strong>do</strong> pela ANEEL resultar em menos de 0,5% <strong>do</strong> benefício<br />

econômico anual auferi<strong>do</strong>, a diferença entre gasto e arreca<strong>da</strong>ção deve ser<br />

sujeita às medi<strong>da</strong>s descritas na Recomen<strong>da</strong>ção 7.<br />

7. A segun<strong>da</strong> medi<strong>da</strong> é uma proibição, conti<strong>da</strong> em lei, contra o desvio destes<br />

recursos orçamentários para outros fins. O Governo pode até decidir fazer<br />

cortes orçamentários para to<strong>do</strong>s os seus órgãos e aplicar parte destes cortes<br />

à ANEEL, mas o excedente devi<strong>do</strong> às taxas <strong>regulatória</strong>s, será<br />

27


Ashley Brown, March 2002<br />

automaticamente reverti<strong>do</strong> às empresas regula<strong>da</strong>s, para repasse ao<br />

consumi<strong>do</strong>r. Assim, o governo pode impor um controle <strong>do</strong>s gastos em<br />

geral, mas sem o incentivo ou a capaci<strong>da</strong>de de desviar fun<strong>do</strong>s destina<strong>do</strong>s à<br />

ativi<strong>da</strong>de <strong>regulatória</strong>. Este tipo de mecanismo é comum em agências de<br />

regulação nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s e em outros países.<br />

C. Contrato de Desempenho<br />

Existe um contrato de desempenho entre a ANEEL e o Ministério de Minas e<br />

Energia. Na teoria, o contrato deveria servir como meio de fazer com que os<br />

regula<strong>do</strong>res se responsabilizem por suas ações. Apesar de bem intenciona<strong>do</strong>, parece<br />

que não há evidências de que o contrato tenha cumpri<strong>do</strong> com o seu objetivo. O<br />

contrato venceu e houve pouca urgência, tanto por parte <strong>da</strong> ANEEL quanto <strong>do</strong><br />

Ministério, para conduzir uma revisão <strong>do</strong> <strong>do</strong>cumento ou para negociar um novo<br />

acor<strong>do</strong>. A falta de entusiasmo era compartilha<strong>da</strong> pelos investi<strong>do</strong>res, que não viam<br />

muita importância na existência de tal contrato. De fato, poucas pessoas pareciam<br />

conhecer seus termos. Além disso, não fica claro quais conseqüências a ANEEL teria<br />

que sofrer, caso ela não cumprisse com os termos <strong>do</strong> contrato. Do ponto de vista <strong>da</strong><br />

independência <strong>regulatória</strong>, na ver<strong>da</strong>de, as conseqüências podem ser inconvenientes.<br />

Os contratos de desempenho cumprem um papel pequeno em qualquer país ou<br />

Esta<strong>do</strong>. Da<strong>do</strong> que a eficácia <strong>do</strong> <strong>do</strong>cumento no Brasil tem si<strong>do</strong> no mínimo duvi<strong>do</strong>sa,<br />

continuar o seu uso parece ter pouco, ou nenhum, propósito.<br />

Apesar <strong>do</strong>s contratos de desempenho serem de pouco valor prático, o objetivo de fazer com que os<br />

regula<strong>do</strong>res se responsabilizem por suas ações através de uma revisão de desempenho é certamente<br />

louvável. A questão é como conduzir tais revisões sem comprometer a independência<br />

<strong>da</strong> agência.<br />

28


Ashley Brown, March 2002<br />

Em muitas jurisdições, particularmente nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, isto é feito através<br />

de revisões formais conduzi<strong>da</strong>s periodicamente por comissões legislativas. Estas<br />

revisões também podem ser conduzi<strong>da</strong>s pelo CNPE, ou outra agência executiva. Os<br />

resulta<strong>do</strong>s talvez fossem melhores se a revisão fosse conduzi<strong>da</strong> em conjunto com as<br />

autori<strong>da</strong>des legislativas e executivas. O objetivo destas revisões não seria o de impor qualquer<br />

ação específica ou o de punir regula<strong>do</strong>res que falharam em cumprir com as expectativas, mas sim o de<br />

avaliar a função e direção <strong>da</strong> agência, com um olhar volta<strong>do</strong> para possíveis mu<strong>da</strong>nças na lei ou<br />

política sugeri<strong>da</strong>s por experiência. A ativi<strong>da</strong>de desta revisão, para que seja mais eficaz, deve<br />

ser conduzi<strong>da</strong> em lugar público e aberta à participação pública. Esperamos que o<br />

procedimento público de tais condutas resulte em debates inteligentes, sobre questões<br />

de regulação e ajude o público a entender melhor o papel <strong>da</strong>s instituições regula<strong>do</strong>ras.<br />

Também aju<strong>da</strong>rá a manter o equilíbrio entre independência e responsabili<strong>da</strong>de. As<br />

seguintes recomen<strong>da</strong>ções são pertinentes:<br />

8. A prática <strong>do</strong> contrato de desempenho entre o MME e a ANEEL deve ser<br />

extinta<br />

9. A lei deve ser emen<strong>da</strong><strong>da</strong>, ou então uma política deve ser estabeleci<strong>da</strong>, para<br />

possibilitar revisão transparente, periódica e pública <strong>da</strong>s ativi<strong>da</strong>des <strong>da</strong><br />

ANEEL por autori<strong>da</strong>des designa<strong>da</strong>s pelo Legislativo e/ou Executivo<br />

(talvez a ca<strong>da</strong> quatro ou cinco anos).<br />

D. Transparência<br />

(Para informação contextual sobre transparência, ver Apêndice 4)<br />

As opiniões <strong>da</strong><strong>da</strong>s sobre transparência foram notavelmente uniformes. To<strong>do</strong>s que<br />

comentaram sobre o assunto acreditam que a ANEEL, talvez mais <strong>do</strong> que qualquer outra agência<br />

29


Ashley Brown, March 2002<br />

<strong>do</strong> governo, proporciona condições para a colaboração pública, faz excelente uso <strong>da</strong> Internet e é, de um<br />

mo<strong>do</strong> geral, transparente na declaração de suas intenções e colocação de suas posições. Interessante<br />

notar que esta visão otimista <strong>da</strong> transparência regula<strong>do</strong>ra tende a se dividir quan<strong>do</strong> as<br />

perguntas se voltam para questões <strong>do</strong> tipo : “ de que maneira a ANEEL faz uso <strong>da</strong><br />

colaboração que recebe, se é que usa essa colaboração, se a lógica por trás <strong>da</strong>s<br />

decisões é bem articula<strong>da</strong> e se o processo de raciocínio e deliberação usa<strong>do</strong> para se<br />

chegar a estas decisões é claro e articula<strong>do</strong>”. Houve também uma opinião geral de que<br />

a ANEEL manteve uma comunicação freqüente, não transparente, com outros<br />

setores <strong>do</strong> governo, como o Ministério <strong>da</strong> Fazen<strong>da</strong> e o Ministério de Minas e Energia.<br />

Embora não tenha havi<strong>do</strong> nenhuma tentativa no senti<strong>do</strong> de verificar a veraci<strong>da</strong>de de<br />

tais declarações e apesar de alguns funcionários terem nega<strong>do</strong> a existência de qualquer<br />

tipo de comunicação não transparente, o fato de ser esta a opinião compartilha<strong>da</strong> por<br />

grande parte <strong>do</strong>s interessa<strong>do</strong>s é relevante. Na ver<strong>da</strong>de, alguns observa<strong>do</strong>res notaram<br />

que a freqüente caracterização <strong>da</strong> ANEEL de ser implementa<strong>do</strong>ra e não articula<strong>do</strong>ra<br />

de políticas, indicava que os ministérios governamentais estavam sugerin<strong>do</strong><br />

“políticas” de maneira não transparente aos regula<strong>do</strong>res. Como veremos abaixo,<br />

muitos também criticaram a ANEEL pela atitude contrária de, em algumas<br />

circunstâncias, não seguir as instruções <strong>do</strong> governo. A questão não é se os críticos<br />

estão certos ou erra<strong>do</strong>s e sim quais providências podem ser toma<strong>da</strong>s para garantir a<br />

independência e a transparência <strong>da</strong> ANEEL e garantir a to<strong>do</strong>s os interessa<strong>do</strong>s que é<br />

este o objetivo.<br />

É importante discutir brevemente a relação entre independência e transparência.<br />

Elas estão intrinsecamente uni<strong>da</strong>s. Nenhum processo de regulação pode ser<br />

ver<strong>da</strong>deiramente transparente se não for independente em termos.<br />

30


Ashley Brown, March 2002<br />

Os participantes <strong>do</strong> processo de regulação devem ter to<strong>do</strong> o direito de esperar<br />

que estão envolvi<strong>do</strong>s num autêntico processo de toma<strong>da</strong> de decisões. Eles têm o direito<br />

de saber que nenhum interesse ou grupo contrário a um procedimento, tem melhor acesso aos<br />

responsáveis pelas decisões que eles, que qualquer evidência ou argumento sen<strong>do</strong> apresenta<strong>do</strong>s aos<br />

responsáveis pelas decisões, está disponível para to<strong>do</strong>s e que os regula<strong>do</strong>res não podem deixar de ser<br />

consulta<strong>do</strong>s por grupos defenden<strong>do</strong> seu caso junto a “autori<strong>da</strong>des superiores.” Resumin<strong>do</strong>, para<br />

que o processo regula<strong>do</strong>r seja independente em termos, precisa ser de absoluta<br />

transparência. Para este fim, recomen<strong>da</strong>-se que:<br />

10. As regras <strong>da</strong> ANEEL, ou ain<strong>da</strong> melhor, a própria lei, deve ser emen<strong>da</strong><strong>da</strong><br />

para que to<strong>da</strong> comunicação, entre ela e qualquer parte, principalmente órgão<br />

governamental, seja feita de maneira pública e transparente.<br />

O consenso geral de que a ANEEL tem proporciona<strong>do</strong> um acesso excelente a<br />

to<strong>do</strong>s, buscan<strong>do</strong> fornecer uma colaboração, cria condições favoráveis para as<br />

próximas medi<strong>da</strong>s em direção a uma total transparência <strong>do</strong> processo regula<strong>do</strong>r. As<br />

próximas medi<strong>da</strong>s dizem respeito às observações coloca<strong>da</strong>s por entrevista<strong>do</strong>s, com<br />

relação ao mo<strong>do</strong> como a ANEEL reage aos comentários que recebe, a natureza de<br />

suas deliberações, e como articula a lógica que sustenta suas decisões. Existem três<br />

motivos críticos para que haja transparência no processo decisório <strong>da</strong> agência:<br />

Primeiro, é o fato óbvio de que a transparência proporciona a to<strong>do</strong>s os<br />

participantes um insight de como a agência considerou as opiniões que recebeu.<br />

Algumas agências usam um formato para suas decisões que explicitamente apresenta<br />

31


Ashley Brown, March 2002<br />

ou resume os argumentos que vários grupos fizeram durante o procedimento. Esta<br />

prática tem três efeitos positivos:<br />

Permite que os participantes saibam que suas opiniões não foram ignora<strong>da</strong>s e que<br />

seu envolvimento no caso é de importância, tornan<strong>do</strong> to<strong>do</strong> o processo mais<br />

confiável. Talvez ain<strong>da</strong> mais importante é o fato de proporcionar aos participantes,<br />

um insight <strong>da</strong> lógica e análise <strong>do</strong>s responsáveis pelas decisões, permitin<strong>do</strong> que eles<br />

participem de maneira mais eficiente em questões futuras. Por fim, a prática obriga os<br />

regula<strong>do</strong>res a pensarem sobre as opiniões que receberam. Tanto o processo em si<br />

quanto os regula<strong>do</strong>res se beneficiam de uma participação pública mais intensa.<br />

O segun<strong>do</strong> motivo é que a transparência favorece de maneira imensurável a<br />

credibili<strong>da</strong>de e solidez <strong>do</strong> processo regula<strong>do</strong>r em si. A total revelação <strong>da</strong> capacitação<br />

técnica e substantiva, envolvi<strong>da</strong> no processo decisório é de infinito valor na defesa<br />

contra a interferência política em questões de regulação. Uma <strong>da</strong>s razões para a<br />

criação de agências de regulação profissionais é a de permitir a entra<strong>da</strong> de capacitação<br />

técnica para o auxílio no processo decisório. Demonstra que este requisito pode servir<br />

como obstáculo para aqueles que queiram interferir, mas falta a sofisticação técnica<br />

para fazê-lo em um processo totalmente transparente.<br />

Por fim, total transparência proporciona a to<strong>da</strong>s as partes um nível de segurança de que o<br />

processo é honesto, substantivo e confiável. Embora nem to<strong>do</strong>s os grupos fiquem satisfeitos<br />

com uma decisão, é de grande importância que eles sintam que o processo foi justo e<br />

que tiveram a oportuni<strong>da</strong>de de expor suas opiniões.<br />

Como alcançar uma total transparência? Basea<strong>do</strong> nas opiniões praticamente<br />

unânimes <strong>do</strong>s entrevista<strong>do</strong>s, a ANEEL já teve um excelente começo nesta direção. Só<br />

precisa aperfeiçoar as providências que já tomou. As medi<strong>da</strong>s adicionais devem ser<br />

32


Ashley Brown, March 2002<br />

feitas para manifestar como as opiniões foram considera<strong>da</strong>s, a natureza <strong>do</strong> processo<br />

lógico, e to<strong>da</strong>s as opiniões considera<strong>da</strong>s dentro <strong>da</strong> agência. Para este fim, as seguintes<br />

recomen<strong>da</strong>ções são apresenta<strong>da</strong>s:<br />

11. To<strong>da</strong>s as decisões <strong>da</strong> agência devem ser toma<strong>da</strong>s por escrito e devem<br />

seguir explicitamente o seguinte formato:<br />

a) Uma descrição geral e o histórico <strong>da</strong>s questões sob consideração;<br />

b) Um resumo <strong>da</strong>s opiniões ofereci<strong>da</strong>s por to<strong>da</strong>s as partes ;<br />

c) Uma análise <strong>do</strong>s fatos jurídicos, evidências e opiniões ofereci<strong>da</strong>s.<br />

d) Uma declaração formal <strong>da</strong>s decisões e seus fun<strong>da</strong>mentos.<br />

12. To<strong>da</strong>s as decisões devem ser toma<strong>da</strong>s através de votação <strong>do</strong>s diretores, em<br />

reunião aberta, ten<strong>do</strong> ca<strong>da</strong> diretor a oportuni<strong>da</strong>de de justificar sua decisão<br />

e de apresentar uma opinião por escrito, divergente ou mesmo<br />

concor<strong>da</strong>nte, mas por razões diferentes <strong>da</strong>quelas apresenta<strong>da</strong>s na decisão<br />

<strong>da</strong> maioria<br />

Ao discutir idéias sobre opiniões divergentes e convergentes, muitos <strong>do</strong>s entrevista<strong>do</strong>s sugeriram<br />

que embora a idéia tivesse mérito, ia contra uma tendência cultural no Brasil de evitar situações de<br />

confronto e de operar em consenso. Embora esta observação seja precisa, existem razões<br />

para que não seja a<strong>do</strong>ta<strong>da</strong>, contra o objetivo de se alcançar transparência. A primeira é<br />

que o processo decisório precisa seguir procedimentos que tenham credibili<strong>da</strong>de<br />

tanto para os brasileiros quanto para investi<strong>do</strong>res, que em muitas ocasiões são<br />

estrangeiros. Embora as normas brasileiras sejam <strong>da</strong>s mais fun<strong>da</strong>menta<strong>da</strong>s, um<br />

processo que aliena investi<strong>do</strong>res estrangeiros certamente terá o efeito de desencorajar<br />

investimentos externos. Um certo grau de equilíbrio, no entanto, é preciso. Em<br />

33


Ashley Brown, March 2002<br />

segun<strong>do</strong> lugar, o tal modelo de consenso não é pratica<strong>do</strong> no Brasil de maneira<br />

uniforme. Certamente que a maioria <strong>do</strong>s órgãos legislativos no Brasil, toma decisões<br />

que encontram oposição <strong>da</strong> opinião pública. De maneira similar, tribunais com vários<br />

juízes nem sempre operam sob consenso. Divergências são muitas vezes expressa<strong>da</strong>s<br />

por uma minoria de juízes decidin<strong>do</strong> uma questão. A ANEEL, sen<strong>do</strong> quasi-legislativa<br />

e quasi-judicial pode seguir o mesmo modelo. Cooperação e respeito pela instituição<br />

não devem ser confundi<strong>do</strong>s com uma necessi<strong>da</strong>de por consenso e unanimi<strong>da</strong>de. Se<br />

um ou mais diretores discor<strong>da</strong>rem <strong>da</strong> maioria, proporcionar oportuni<strong>da</strong>des de expor<br />

tais opiniões só aumenta a credibili<strong>da</strong>de <strong>da</strong> agência e seus processos. Além disso, a<br />

diversi<strong>da</strong>de de opiniões entre os diretores, quan<strong>do</strong> coloca<strong>da</strong>s com respeito e de<br />

maneira clara, aju<strong>da</strong> a focalizar a discussão dentro <strong>da</strong> agência e promove também um<br />

debate rigoroso e sério para os investi<strong>do</strong>res. O processo como um to<strong>do</strong> é<br />

enriqueci<strong>do</strong>. Parece mais honesto tanto para brasileiros quanto para estrangeiros reconhecer o<br />

óbvio, isto é, que nem sempre to<strong>do</strong>s os cinco diretores vão estar de acor<strong>do</strong>, e permitir declarações de<br />

divergências sinceras. O reconhecimento de uma diversi<strong>da</strong>de de opiniões parece ter bem<br />

mais chances de intensificar a credibili<strong>da</strong>de e enriquecer o processo <strong>do</strong> que um<br />

consenso superficial.<br />

A julgar por algumas <strong>da</strong>s entrevistas, talvez seja útil tornar o processo de<br />

estabelecer os fatos e analisar as questões, mais transparentes e rigorosas.<br />

“Informações” ofereci<strong>da</strong>s aos regula<strong>do</strong>res muitas vezes precisam ser verifica<strong>da</strong>s antes<br />

de serem usa<strong>da</strong>s no processo decisório. Nas agências regula<strong>do</strong>ras <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s<br />

Uni<strong>do</strong>s, o modelo para fazer isto tem si<strong>do</strong> judicial. To<strong>do</strong>s os grupos submeten<strong>do</strong><br />

qualquer informação devem fazê-lo sob penali<strong>da</strong>de de perjúrio e devem se submeter à<br />

contestação por grupos opostos. O processo tem si<strong>do</strong> critica<strong>do</strong>, talvez com razão, por<br />

34


Ashley Brown, March 2002<br />

ser ritualístico, caro e dispendioso. No entanto, não checar as informações de maneira<br />

aberta e formal seria inadequa<strong>do</strong> a um processo decisório rigoroso. Na Inglaterra, por<br />

exemplo, a falta de um processo como este contribuiu para que o regula<strong>do</strong>r ficasse<br />

alheio aos ver<strong>da</strong>deiros custos <strong>do</strong>s distribui<strong>do</strong>res. A falta de informação gerou algumas<br />

conseqüências lamentáveis. Existem inúmeras alternativas para os modelos extremos<br />

<strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s e Inglaterra. Estas podem incluir oportuni<strong>da</strong>de para contestações<br />

totais ou parciais, audiências públicas abertas a debates ou diálogos relevantes entre<br />

grupos ou especialistas e questionamentos formais pelos diretores ou funcionários <strong>da</strong>s<br />

partes e seus especialistas. Na ver<strong>da</strong>de, alguns entrevista<strong>do</strong>s sugeriram<br />

especificamente que a ANEEL devesse fazer melhor uso <strong>da</strong>s audiências públicas<br />

permitin<strong>do</strong> mais tempo para apresentações e debates mais substantivos. Ao invés de<br />

prescrever qualquer mecanismo específico, a seguinte recomen<strong>da</strong>ção é feita:<br />

13. A ANEEL deve buscar opiniões formais de to<strong>da</strong>s as partes interessa<strong>da</strong>s, de<br />

como fazer melhor uso <strong>da</strong>s audiências públicas para checar informações e<br />

idéias que lhe foram apresenta<strong>da</strong>s. Ao receber e analisar estas<br />

colaborações, a agência deve a<strong>do</strong>tar regras e procedimentos que<br />

possibilitem maior transparência para verificar as informações e avaliar<br />

determina<strong>da</strong> questão.<br />

E. Esclarecen<strong>do</strong> e delinean<strong>do</strong> os papéis e as responsabili<strong>da</strong>des<br />

Parece existir incertezas com relação à divisão de responsabili<strong>da</strong>des entre o<br />

Ministério de Minas e Energia (MME), a ANEEL, o Conselho Nacional de Política<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

Energética (CNPE) e outras agências. Como já foi menciona<strong>do</strong>, a ANEEL descreve<br />

sua missão como de implementa<strong>do</strong>ra de políticas e não de formula<strong>do</strong>ra. No decorrer<br />

<strong>da</strong>s entrevistas, ficou claro que não havia um consenso com relação ao significa<strong>do</strong><br />

disto. De fato, em termos de experiência internacional na área de regulação, esta<br />

distinção tem pouco significa<strong>do</strong>. Existem realmente poucas decisões que os regula<strong>do</strong>res tomam<br />

que não possuem componentes ou implicações políticas. De uma maneira ou de outra, regula<strong>do</strong>res, de<br />

fato formulam políticas. Logo, a questão é mais bem defini<strong>da</strong> como o estabelecimento<br />

<strong>do</strong>s parâmetros dentro <strong>do</strong>s quais as políticas podem ser articula<strong>da</strong>s pelos regula<strong>do</strong>res.<br />

Pode-se argumentar que a fronteira se dá entre políticas de energia e políticas de<br />

regulação, sen<strong>do</strong> esta responsabili<strong>da</strong>de <strong>da</strong> ANEEL. O fato é que as autori<strong>da</strong>des<br />

legislativas, e talvez o próprio CNPE em determina<strong>da</strong>s circunstâncias podem e devem<br />

articular as políticas básicas tanto de energia quanto de regulação. Infelizmente, isto<br />

não ocorreu e a questão <strong>da</strong> divisão de responsabili<strong>da</strong>des ain<strong>da</strong> é confusa. A recente<br />

controvérsia com relação à avaliação <strong>do</strong>s ativos <strong>da</strong>s empresas de distribuição é um<br />

excelente estu<strong>do</strong> de caso <strong>da</strong> questão.<br />

Apesar de estar além <strong>da</strong> proposta deste relatório, investigar a essência <strong>da</strong><br />

controvérsia <strong>da</strong> avaliação <strong>do</strong>s ativos, os aspectos institucionais <strong>da</strong> disputa são muito<br />

instrutivos. Quan<strong>do</strong> as empresas de distribuição foram privatiza<strong>da</strong>s e feitas as<br />

concessões iniciais, na<strong>da</strong> foi posto no papel para explicar a meto<strong>do</strong>logia a ser usa<strong>da</strong> na<br />

avaliação <strong>do</strong>s seus ativos, quan<strong>do</strong> as tarifas fossem revistas. Ao contrário, a legislação<br />

<strong>da</strong> Argentina, Bolívia, Chile e Peru proporcionam um grau razoável de especifici<strong>da</strong>de,<br />

de que o ativo de referência seja calcula<strong>do</strong> através <strong>da</strong> meto<strong>do</strong>logia <strong>do</strong> custo de<br />

reposição basea<strong>do</strong> no conceito de uma “companhia modelo eficiente”, em<br />

procedimentos tarifários futuros. De mo<strong>do</strong> semelhante, nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, muitos<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

estatutos regula<strong>do</strong>res estaduais designam claramente o uso <strong>da</strong> meto<strong>do</strong>logia a ser<br />

usa<strong>da</strong>, na maioria <strong>do</strong>s casos, o custo original menos a depreciação. Infelizmente, no<br />

Brasil, nem o estatuto nem a lei explicitaram a meto<strong>do</strong>logia. As empresas de<br />

distribuição acreditavam que existia um consenso de que a meto<strong>do</strong>logia a ser usa<strong>da</strong><br />

seria a mesma para determinar o preço <strong>do</strong> leilão para a concessão no ato <strong>da</strong> ven<strong>da</strong>.<br />

No entanto, nenhuma evidência quanto a isto foi encontra<strong>da</strong> em qualquer <strong>do</strong>cumento<br />

legal orientan<strong>do</strong> regula<strong>do</strong>res futuros. Na ver<strong>da</strong>de, quan<strong>do</strong> as várias concessões foram<br />

<strong>da</strong><strong>da</strong>s, o sistema de regulação ain<strong>da</strong> não existia. À medi<strong>da</strong> que se aproximava a revisão<br />

tarifária, alguns <strong>do</strong>s distribui<strong>do</strong>res acreditavam que o CNPE tinha se comprometi<strong>do</strong><br />

em anunciar uma meto<strong>do</strong>logia a ser emprega<strong>da</strong> antes <strong>da</strong> ANEEL tomar providências.<br />

A ANEEL, no entanto, sem saber <strong>da</strong> existência de qualquer acor<strong>do</strong> e sentin<strong>do</strong>-se<br />

obriga<strong>da</strong> a iniciar no momento devi<strong>do</strong>, a revisão <strong>da</strong>s tarifas, a<strong>do</strong>tou o procedimento<br />

de avaliação de ativos. Solicitou e recebeu propostas e idéias <strong>do</strong>s agentes e depois<br />

emitiu uma decisão a<strong>do</strong>tan<strong>do</strong> a meto<strong>do</strong>logia <strong>do</strong> custo de reposição. Os distribui<strong>do</strong>res,<br />

insatisfeitos com o resulta<strong>do</strong>, recorreram aos Ministérios com assento no CNPE,<br />

alegan<strong>do</strong> que a questão <strong>da</strong> avaliação de ativos era um assunto de política energética,<br />

que eles, não a ANEEL, tinham poderes para decidir.<br />

Os aspectos institucionais <strong>da</strong> controvérsia revelam um número de conflitos. O<br />

primeiro e mais óbvio foi o erro básico de privatizar, sem primeiro implementar<br />

regulação, ou pelo menos, especificar com mais detalhes o sistema de fixação de<br />

tarifas, que regula<strong>do</strong>res futuros precisariam implementar, ao fim <strong>do</strong> primeiro perío<strong>do</strong><br />

de rejuste de tarifas. Questões como a <strong>da</strong> meto<strong>do</strong>logia de avaliação de ativos<br />

provavelmente teriam si<strong>do</strong> discuti<strong>da</strong>s, se atenção suficiente tivesse si<strong>do</strong> <strong>da</strong><strong>da</strong> ao<br />

regime regulatório, antes <strong>da</strong>s concessões. Este erro de cronologia tem deixa<strong>do</strong> um<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

lega<strong>do</strong> de incerteza com relação ao limite <strong>da</strong> autori<strong>da</strong>de <strong>do</strong> regula<strong>do</strong>r e tem<br />

complica<strong>do</strong> desnecessariamente a questão <strong>do</strong>s limites entre política energética e<br />

<strong>regulatória</strong>.<br />

Uma segun<strong>da</strong> questão importante revela<strong>da</strong> pela controvérsia <strong>da</strong> avaliação de<br />

ativos é a contínua falta de clareza com relação à sua cronologia. Por exemplo, se a<br />

meto<strong>do</strong>logia constitui uma questão de política de energia ao invés de uma questão de<br />

regulação, ela deveria ser resolvi<strong>da</strong> antes de qualquer decisão por parte <strong>do</strong>s<br />

regula<strong>do</strong>res. A ver<strong>da</strong>de é que a ANEEL anunciou adequa<strong>da</strong>mente sua intenção de<br />

tratar a questão quan<strong>do</strong>, em 2000, conduziu a audiência pública 7/2000 para receber<br />

opiniões de to<strong>do</strong>s os grupos sobre este mesmo assunto. No entanto, só depois que o<br />

regula<strong>do</strong>r tomou a providência foi que os “articula<strong>do</strong>res de políticas” <strong>do</strong> CNPE<br />

assumiram a questão. Para quem vê de fora, pareceria que o CNPE estava agin<strong>do</strong><br />

como um tribunal de apelação ao invés de um articula<strong>do</strong>r. Muitos <strong>do</strong>s entrevista<strong>do</strong>s<br />

consideraram o tema sob esta perspectiva e sustentaram que o CNPE tinha<br />

autori<strong>da</strong>de decisória, mas simplesmente deixou de agir, antes <strong>da</strong> ANEEL. Eles<br />

argumentaram que o CNPE tinha to<strong>do</strong> o direito de reverter a decisão, mesmo que<br />

isso já tivesse si<strong>do</strong> decidi<strong>do</strong> pela ANEEL. Se este argumento estiver correto, ain<strong>da</strong><br />

vamos nos deparar com um processo decisório inverso. De que maneira a ANEEL<br />

pode ser subserviente às políticas <strong>do</strong> governo que permanecem desarticula<strong>da</strong>s?<br />

Uma terceira questão se refere ao fato de não existir clareza no que diz respeito<br />

às fronteiras entre política de regulação e política de energia. A avaliação de ativos<br />

possivelmente caberia em qualquer uma <strong>da</strong>s categorias, mas parece que ninguém está<br />

seguro com relação à política pública na questão. É de se esperar que nem to<strong>da</strong>s as<br />

questões de política possam ser antecipa<strong>da</strong>s e que as incertezas vão surgir. Certamente<br />

38


Ashley Brown, March 2002<br />

foi isto que aconteceu quan<strong>do</strong> a ANEEL conduziu a audiência pública 7/2000. Da<br />

mesma forma, vão sempre surgir situações onde questões de política terão que ser<br />

considera<strong>da</strong>s, mas talvez numa escala em que os articula<strong>do</strong>res de políticas não<br />

percebam. Quem então deve decidir questões desta natureza?<br />

A questão <strong>da</strong> relação entre articulação de política e regulação torna-se mais<br />

complica<strong>da</strong> no Brasil pelas funções <strong>do</strong> CNPE, que completa o papel <strong>do</strong>s articula<strong>do</strong>res<br />

<strong>do</strong> legislativo, o que não aconteceria caso o Congresso fosse o único articula<strong>do</strong>r. Esta<br />

complexi<strong>da</strong>de é intensifica<strong>da</strong> pelo fato de o CNPE ser ain<strong>da</strong> uma instituição nova<br />

tentan<strong>do</strong> definir inteiramente seu papel. A maioria <strong>do</strong>s países com regula<strong>do</strong>res<br />

independentes não possuem um órgão como este, apesar de que na maioria <strong>do</strong>s<br />

esta<strong>do</strong>s indianos, esta autori<strong>da</strong>de de articular políticas é reserva<strong>da</strong> ao governo que<br />

atua através <strong>do</strong> Ministério de Energia. Políticas básicas são estabeleci<strong>da</strong>s por estatutos<br />

e questões micro-econômicas são trata<strong>da</strong>s pelo regula<strong>do</strong>r ou Ministério, dependen<strong>do</strong><br />

de como os legisla<strong>do</strong>res deci<strong>da</strong>m alocar a responsabili<strong>da</strong>de. Além disso, a alocação de<br />

responsabili<strong>da</strong>de é, em geral, feita com base nas tarefas <strong>da</strong> agência, não no senti<strong>do</strong> de<br />

hierarquia <strong>do</strong> processo decisório. Portanto, se a responsabili<strong>da</strong>de de uma questão for<br />

atribuí<strong>da</strong> ao Ministério é, em geral, por ser consistente com as suas obrigações, não<br />

porque os legisla<strong>do</strong>res querem um ministério ditan<strong>do</strong> políticas a regula<strong>do</strong>res. A<br />

questão é tão delica<strong>da</strong> que em alguns países como na Argentina, as autori<strong>da</strong>des têm<br />

sustenta<strong>do</strong> que os regula<strong>do</strong>res constituem parte <strong>do</strong> poder legislativo, não <strong>do</strong><br />

executivo. Por fim, se uma política pode ser estabeleci<strong>da</strong> depois de uma decisão <strong>da</strong><br />

ANEEL e se o objetivo é reverter a decisão <strong>do</strong> regula<strong>do</strong>r, serão a transparência e<br />

independência na regulação seriamente comprometi<strong>da</strong>s? Que previsibili<strong>da</strong>de e<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

estabili<strong>da</strong>de podem ser espera<strong>da</strong>s de um regime regulatório que permite decisões ex<br />

post facto em questões de políticas setoriais?<br />

To<strong>da</strong> a questão <strong>do</strong>s limites de jurisdição deve ser abor<strong>da</strong><strong>da</strong> com mais clareza e o<br />

foco na articulação versus implementação de políticas deve ser substituí<strong>do</strong> por uma<br />

definição clara <strong>da</strong>s fronteiras jurisdicionais. Ao invés de fazer recomen<strong>da</strong>ções<br />

específicas com relação a essas fronteiras, é recomendável que:<br />

14. Deve-se convocar uma conferência com a participação <strong>do</strong> CNPE,<br />

lideranças legislativas e regula<strong>do</strong>res e com a colaboração <strong>do</strong>s investi<strong>do</strong>res,<br />

para propor uma legislação básica esclarecen<strong>do</strong> e definin<strong>do</strong> claramente as<br />

respectivas autori<strong>da</strong>des <strong>do</strong> CNPE e <strong>da</strong> ANEEL. A legislação pode<br />

estipular os limites deseja<strong>do</strong>s, mas também deve incluir os seguintes<br />

princípios:<br />

a) Determinações <strong>do</strong> executivo só serão obrigatórias quan<strong>do</strong> dentro <strong>do</strong>s<br />

limites de sua autori<strong>da</strong>de e quan<strong>do</strong> ações ou articulações de políticas<br />

precederem qualquer decisão <strong>da</strong> ANEEL sobre determina<strong>do</strong> assunto.<br />

b) Apenas um tribunal devi<strong>da</strong>mente constituí<strong>do</strong> pode determinar se a<br />

ANEEL excedeu sua autori<strong>da</strong>de legal e reverter a decisão.<br />

c) Deve-se conferir à ANEEL, autori<strong>da</strong>de para buscar orientações no CNPE,<br />

sempre que necessário por razões de jurisdição, desde que este procedimento<br />

seja a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> de maneira transparente. O CNPE também deve agir de maneira<br />

transparente ao fornecer sua orientação.<br />

d) A ANEEL deve ter liber<strong>da</strong>de para decidir questões, no exercício de sua<br />

legítima autori<strong>da</strong>de, na ausência de uma definição de política setorial, mas<br />

cuja determinação se faz necessária para o cumprimento <strong>da</strong>s<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

responsabili<strong>da</strong>des <strong>da</strong> agência e seja relevante para a solução <strong>da</strong> questão<br />

pendente.<br />

F. Delegação de autori<strong>da</strong>de às agências regula<strong>do</strong>ras estaduais<br />

A constituição brasileira atribui as responsabili<strong>da</strong>des <strong>do</strong> setor elétrico ao governo<br />

federal. Esta delegação de poder, no entanto, não impede que parte desta<br />

responsabili<strong>da</strong>de seja descentraliza<strong>da</strong> aos governos estaduais. Na ver<strong>da</strong>de, a lei que<br />

criou a ANEEL possibilita a delegação de complementação de poderes regulatórios<br />

aos Esta<strong>do</strong>s. A ANEEL possui contratos com 13 Esta<strong>do</strong>s, delegan<strong>do</strong> poderes no<br />

que diz respeito às reivindicações <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res e à fiscalização junto às<br />

concessionárias. A questão é saber se estes poderes são suficientes ou se mais<br />

autori<strong>da</strong>de deve ser delega<strong>da</strong>. Ao avaliar a questão, é apropria<strong>do</strong> avaliar os cinco<br />

contextos nos quais maior delegação é considera<strong>da</strong>.<br />

Em primeiro lugar, o único segmento <strong>da</strong> indústria, onde delegação aos Esta<strong>do</strong>s é<br />

viável é o de distribuição. Certamente, os poderes limita<strong>do</strong>s que a ANEEL delegou,<br />

estão relaciona<strong>do</strong>s apenas às empresas de distribuição. Ninguém sugeriu qualquer<br />

delegação deste tipo aos outros segmentos, apesar de grande parte <strong>da</strong> regulação<br />

ambiental de geração e transmissão ser de jurisdição <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s. No mesmo<br />

contexto, está a questão se de fato a regulação estadual <strong>da</strong>s empresas de distribuição,<br />

os maiores compra<strong>do</strong>res de energia no merca<strong>do</strong> de ven<strong>da</strong> por ataca<strong>do</strong>, permitiria<br />

maior flexibili<strong>da</strong>de, na maneira como as decisões de compra de energia são feitas,<br />

aperfeiçoan<strong>do</strong> e enriquecen<strong>do</strong>, assim, o merca<strong>do</strong>. Na teoria, se os Esta<strong>do</strong>s estivessem<br />

supervisionan<strong>do</strong> as ativi<strong>da</strong>des de compra de energia pelas empresas de distribuição,<br />

haveria a grande possibili<strong>da</strong>de de que os padrões aplica<strong>do</strong>s fossem menos rígi<strong>do</strong>s.<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

Menos rigidez permitirá maiores oportuni<strong>da</strong>des no merca<strong>do</strong>. Apesar <strong>da</strong> possibili<strong>da</strong>de<br />

de a teoria não se sustentar na prática, a questão merece consideração.<br />

O segun<strong>do</strong> contexto está relaciona<strong>do</strong> aos próprios Esta<strong>do</strong>s. Nem to<strong>do</strong>s eles<br />

implantaram agências regula<strong>do</strong>ras independentes. Parece existir uma acentua<strong>da</strong><br />

dispari<strong>da</strong>de na quali<strong>da</strong>de <strong>da</strong> administração e capacitação profissional <strong>do</strong>s diversos<br />

governos estaduais. Apesar <strong>do</strong>s autores deste relatório terem fica<strong>do</strong> impressiona<strong>do</strong>s<br />

com a serie<strong>da</strong>de e o nível de conhecimento demonstra<strong>do</strong> por regula<strong>do</strong>res estaduais,<br />

alguns <strong>do</strong>s entrevista<strong>do</strong>s foram <strong>da</strong> opinião de que alguns Esta<strong>do</strong>s nunca estiveram em<br />

condições de desempenhar a ativi<strong>da</strong>de complementar à regulação de maneira<br />

satisfatória. Um grande número de entrevista<strong>do</strong>s, manifestaram a opinião de que as<br />

agencias regula<strong>do</strong>ras estaduais eram muito politiza<strong>da</strong>s para exercer um julgamento<br />

independente. Um menor número, tinha esta mesma opinião sobre a ANEEL.<br />

Também foi observa<strong>do</strong> que a <strong>estrutura</strong> <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> de energia variava conforme o<br />

Esta<strong>do</strong>. Em alguns, a indústria permanece integra<strong>da</strong> verticalmente, enquanto que em<br />

outros, a distribuição já foi separa<strong>da</strong>. Nem to<strong>do</strong>s tinham privatiza<strong>do</strong> completamente<br />

sua indústria de energia e alguns não tinham feito privatização alguma. Em resumo,<br />

os Esta<strong>do</strong>s apresentam distintas características em termos de capacitações e evolução<br />

<strong>da</strong> indústria.<br />

O terceiro contexto está relaciona<strong>do</strong> ao volume de trabalho <strong>da</strong> ANEEL. Como<br />

já observamos, a agência está trabalhan<strong>do</strong> sob diversas limitações institucionais que<br />

são no mínimo desafia<strong>do</strong>ras. Apesar <strong>do</strong>s problemas, espera-se que a ANEEL seja<br />

responsável pela regulação de to<strong>do</strong>s os aspectos <strong>da</strong> indústria, pela condução de<br />

leilões, pelas concessões, pela supervisão <strong>do</strong> desenvolvimento <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>,<br />

monitoração <strong>do</strong> ONS e <strong>do</strong> MAE, pela articulação de regras para garantir quali<strong>da</strong>de de<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

serviço, pela realização <strong>da</strong> interface com outros setores <strong>do</strong> governo e por muitas<br />

outras tarefas. Não está claro se é viável a realização de uma gama tão extensa de<br />

responsabili<strong>da</strong>des, principalmente no contexto de to<strong>do</strong>s os problemas enfrenta<strong>do</strong>s até<br />

hoje. Em muitos outros sistemas federais de governo ao re<strong>do</strong>r <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, Índia,<br />

Canadá, Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, Austrália, Argentina e Rússia, por exemplo, a regulação <strong>do</strong><br />

setor elétrico é, em menor ou maior grau, descentraliza<strong>da</strong>. Neste contexto, delegar<br />

mais responsabili<strong>da</strong>de aos Esta<strong>do</strong>s pode ser uma idéia louvável.<br />

O quarto contexto está relaciona<strong>do</strong> aos investimentos priva<strong>do</strong>s já realiza<strong>do</strong>s.<br />

Grande parte <strong>da</strong> privatização <strong>do</strong> setor foi realiza<strong>da</strong> pelo governo federal. Alguns<br />

argumentam que o tratamento regulatório <strong>da</strong><strong>do</strong> a estas enti<strong>da</strong>des deve ser também<br />

responsabili<strong>da</strong>de <strong>do</strong> governo federal. O argumento é um tanto irônico à luz <strong>da</strong><br />

disputa sobre a avaliação de ativos, mas não pode ser desconsidera<strong>do</strong>. Tem havi<strong>do</strong><br />

certa preocupação no Brasil, desde o início <strong>do</strong> processo de privatização, de que<br />

demasia<strong>da</strong> descentralização de responsabili<strong>da</strong>de <strong>regulatória</strong> aos Esta<strong>do</strong>s confundiria<br />

investi<strong>do</strong>res estrangeiros e, por isso, desencorajaria a entra<strong>da</strong> de capital para o setor.<br />

Dessa maneira, percebe-se haver uma garantia implícita para os investi<strong>do</strong>res, de que a<br />

maior parte <strong>da</strong>s responsabili<strong>da</strong>des <strong>regulatória</strong>s deve permanecer em Brasília.<br />

O quinto e último contexto nasce <strong>da</strong> responsabili<strong>da</strong>de que já foi delega<strong>da</strong> aos<br />

Esta<strong>do</strong>s de li<strong>da</strong>r com fiscalização e reclamações <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res. Questiona-se se<br />

não há uma assimetria entre, possuir a informação e ser de fato responsável pela<br />

implantação de seus procedimentos. Por causa de suas responsabili<strong>da</strong>des<br />

complementares de regulação, controle e fiscalização <strong>do</strong>s serviços, os Esta<strong>do</strong>s com os<br />

quais a ANEEL mantém convênio de cooperação podem muito bem estar melhor<br />

informa<strong>do</strong>s <strong>do</strong> que a própria ANEEL.<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

Não obstante, a ANEEL tem reti<strong>do</strong> a autori<strong>da</strong>de de estipular tarifas e promulgar<br />

as regras no que diz respeito à quali<strong>da</strong>de de serviços e a comunicação entre empresas<br />

de distribuição e seus consumi<strong>do</strong>res. Apesar de os Esta<strong>do</strong>s estarem obriga<strong>do</strong>s a<br />

encaminhar à ANEEL relatórios periódicos com os <strong>da</strong><strong>do</strong>s que obtém, a familiari<strong>da</strong>de<br />

com a informação é provavelmente maior no nível estadual <strong>do</strong> que nacional. Dessa<br />

maneira, é importante questionar o senti<strong>do</strong> de se montar uma base de <strong>da</strong><strong>do</strong>s no nível<br />

estadual, quan<strong>do</strong> na ver<strong>da</strong>de esta informação só pode ser usa<strong>da</strong> por regula<strong>do</strong>res no<br />

nível federal.<br />

As opiniões expressa<strong>da</strong>s pelos entrevista<strong>do</strong>s variaram muito quan<strong>do</strong> a questão<br />

era delegar mais responsabili<strong>da</strong>de aos Esta<strong>do</strong>s. Comentários variaram de “nem<br />

pensar” até “parece uma boa idéia”. Não só os comentários foram varia<strong>do</strong>s e<br />

contraditórios, como também cruzaram as fronteiras <strong>do</strong>s grupos de interesse. Tanto<br />

empresas priva<strong>da</strong>s quanto grupos de consumi<strong>do</strong>res, manifestaram opiniões muito<br />

distintas. Alguns <strong>do</strong>s entrevista<strong>do</strong>s normalmente contra a delegação de autori<strong>da</strong>de aos<br />

Esta<strong>do</strong>s, admitiram que suas opiniões poderiam mu<strong>da</strong>r se a ANEEL mantivesse suas<br />

funções de supervisão e recurso administrativo sobre decisões toma<strong>da</strong>s pelas agências<br />

regula<strong>do</strong>ras estaduais. Da<strong>do</strong> que não houve consenso, é recomendável que:<br />

15. A ANEEL deve estabelecer um procedimento formal e público, com o<br />

objetivo de obter sugestões para se determinar o nível ótimo de centralização e<br />

descentralização <strong>da</strong> regulação <strong>do</strong> segmento de distribuição. Entre as<br />

perguntas feitas, devem figurar as seguintes:<br />

a) Deve a delegação ser igual para to<strong>do</strong>s os Esta<strong>do</strong>s?<br />

b) Existe alguma assimetria entre a posse <strong>da</strong> informação sobre quali<strong>da</strong>de<br />

de serviço e a autori<strong>da</strong>de para usá-la?<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

c) Se a ANEEL deve delegar mais autori<strong>da</strong>de aos Esta<strong>do</strong>s, que nível de<br />

autori<strong>da</strong>de de supervisão e apelação deve manter? Qual o critério que a<br />

ANEEL deva estipular, para o exercício <strong>da</strong> autori<strong>da</strong>de <strong>regulatória</strong> pelos<br />

Esta<strong>do</strong>s? Quem deve supervisionar a garantia de quali<strong>da</strong>de na regulação?<br />

d) Será que o maior número de delegações aos Esta<strong>do</strong>s reduz a carga de<br />

trabalho <strong>da</strong> ANEEL ou vai simplesmente complicar a situação?<br />

e) Que garantias existem de que as agências regula<strong>do</strong>ras estaduais vão<br />

operar de maneira independente?<br />

f) Qual será o efeito <strong>da</strong>s regulações estaduais nas práticas de compra de<br />

energia <strong>da</strong>s empresas de distribuição?<br />

G. O papel <strong>da</strong> ANEEL em leilões e concessões<br />

Além de to<strong>da</strong>s as suas obrigações <strong>regulatória</strong>s, ain<strong>da</strong> espera-se que a ANEEL<br />

conduza leilões e outorgue concessões para novos fornecimentos de energia e novas<br />

privatizações. Apesar de já se ter ouvi<strong>do</strong> falar sobre agências regula<strong>do</strong>ras cumprin<strong>do</strong> com<br />

tais responsabili<strong>da</strong>des, a única explicação <strong>da</strong><strong>da</strong> nas entrevistas, justifican<strong>do</strong> o<br />

desempenho destas tarefas, foi que estas eram funções novas e já que a ANEEL era uma<br />

agência nova, esta seria a decisão mais prática a se a<strong>do</strong>ta<strong>da</strong>. Outros países, como o Peru,<br />

decidiram que outorgar concessões e conduzir leilões, simplesmente não são funções<br />

regula<strong>do</strong>ras. À luz de experiências internacionais e <strong>da</strong><strong>do</strong> que há mais tempo para análise,<br />

é conveniente reavaliar se estas funções devem continuar sen<strong>do</strong> responsabili<strong>da</strong>de de uma<br />

agência regula<strong>do</strong>ra.<br />

A primeira pergunta a se fazer é sobre qual o interesse regulatório nos leilões e<br />

nas concessões. Certamente existe um interesse regulatório. Os termos e as condições<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

sob os quais empresas regula<strong>da</strong>s devem operar são questões significativas. O interesse<br />

regulatório está na essência <strong>da</strong>s concessões e <strong>da</strong>s licenças que são outorga<strong>da</strong>s e na<br />

justiça/transparência <strong>do</strong> leilão em si, e não na identi<strong>da</strong>de de fato <strong>do</strong> participante, a não<br />

ser que seja para algum critério de classificação geral. O regula<strong>do</strong>r é aquele com<br />

responsabili<strong>da</strong>de para garantir a compatibili<strong>da</strong>de entre as concessões, o merca<strong>do</strong> e regras<br />

<strong>regulatória</strong>s, além de ser responsável pela garantia <strong>do</strong> cumprimento <strong>do</strong>s termos e <strong>da</strong>s<br />

condições <strong>do</strong>s <strong>do</strong>cumentos de concessão. Sen<strong>do</strong> assim, existe um papel bem defini<strong>do</strong><br />

para os regula<strong>do</strong>res, em estabelecer os termos e as condições <strong>do</strong>s <strong>do</strong>cumentos de<br />

concessão e em garantir que os leilões sejam conduzi<strong>do</strong>s de maneira justa e transparente.<br />

Com relação aos procedimentos necessários para os leilões de concessões, o<br />

regula<strong>do</strong>r precisa li<strong>da</strong>r tanto com as responsabili<strong>da</strong>des quanto com os conflitos. As<br />

responsabili<strong>da</strong>des incluem tanto garantir que os participantes aten<strong>da</strong>m a determina<strong>da</strong>s<br />

qualificações mínimas (financeiras ou técnicas, por exemplo), por serem participantes<br />

licencia<strong>do</strong>s <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>, quanto garantir que as concessões outorga<strong>da</strong>s sejam<br />

compatíveis com o merca<strong>do</strong> e com as regras de regulação e garantir, de maneira geral,<br />

que os interesses <strong>do</strong> setor elétrico como um to<strong>do</strong>, sejam protegi<strong>do</strong>s. Um exemplo<br />

comum desta última responsabili<strong>da</strong>de é a tensão inerente, que existe na privatização de<br />

uma empresa pública, entre o interesse <strong>do</strong> governo de maximizar as receitas <strong>da</strong> ven<strong>da</strong> de<br />

um la<strong>do</strong>, e o interesse <strong>do</strong> setor de garantir que o ativo seja privatiza<strong>do</strong> de mo<strong>do</strong> a melhor<br />

permitir a fixação de preços justos, operação ótima <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> e benefícios ao<br />

consumi<strong>do</strong>r. Cabe necessariamente ao regula<strong>do</strong>r garantir os interesses <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

Os interesses podem ser protegi<strong>do</strong>s de maneira genérica ou através de medi<strong>da</strong>s<br />

previamente estabeleci<strong>da</strong>s. Estabelecer qualificações mínimas para os participantes <strong>do</strong><br />

merca<strong>do</strong> constitui uma questão de estipular critérios genéricos que os licitantes<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

satisfazem ou não. Aprovações específicas de empresas são desnecessárias e sujeitas a<br />

alegações de discriminação e favoritismo. Dessa maneira, a ANEEL, caso escolha, pode<br />

estabelecer critérios mínimos para candi<strong>da</strong>tos que queiram participar de leilões ou<br />

receber concessões. Do mesmo mo<strong>do</strong>, a ANEEL pode aprovar to<strong>do</strong>s os <strong>do</strong>cumentos<br />

relaciona<strong>do</strong>s à concessão e/ou autorizar os méto<strong>do</strong>s utiliza<strong>do</strong>s para a condução de<br />

leilões de maneira genérica ou, pelo menos, antes de serem identifica<strong>do</strong>s os possíveis<br />

atores.<br />

Evitar alegações de favoritismo e discriminação não é a única razão pela qual a<br />

ANEEL não deva envolver-se na seleção <strong>do</strong>s participantes <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>. A agência li<strong>da</strong><br />

com pelo menos três conflitos de interesses na determinação de quem receberá uma<br />

licença :<br />

O primeiro está no fato de que o regula<strong>do</strong>r precisará, inevitavelmente, fazer<br />

julgamentos sobre o desempenho <strong>do</strong> participante <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>. A agência regula<strong>do</strong>ra terá<br />

mais credibili<strong>da</strong>de e maior objetivi<strong>da</strong>de se não tiver se envolvi<strong>do</strong> na seleção <strong>do</strong>s<br />

participantes e fazer julgamentos sobre a empresa que especificamente escolheu para ser<br />

participante <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>.<br />

O segun<strong>do</strong> conflito está relaciona<strong>do</strong> ao fato de a agência ser o juiz final, para<br />

determinar se os leilões estão sen<strong>do</strong> conduzi<strong>do</strong>s de maneira correta ou se as concessões<br />

estão sen<strong>do</strong> outorga<strong>da</strong>s de mo<strong>do</strong> apropria<strong>do</strong>. É claro que se é a própria ANEEL que<br />

está encarrega<strong>da</strong> destas responsabili<strong>da</strong>des, ela então não pode julgar a própria conduta.<br />

O terceiro conflito é aquele menciona<strong>do</strong> anteriormente. O governo pode ter vários<br />

objetivos na concessão de licenças. Maximizar receitas e aperfeiçoar o setor são <strong>do</strong>is<br />

destes. A ANEEL possui um interesse inerente de proteger o setor e não se pode<br />

esperar que ela leve em consideração to<strong>do</strong>s os interesses <strong>do</strong> governo. Apesar de a<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

agência ter condições de articular certos princípios para que sejam segui<strong>do</strong>s, não se pode<br />

esperar que ela aten<strong>da</strong> a to<strong>do</strong>s os interesses <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>. Por fim, o próprio ato de<br />

conduzir leilões e outorgar concessões requer muito trabalho. Como já foi observa<strong>do</strong>, a<br />

ANEEL tem sobre si muitas responsabili<strong>da</strong>des e não deve ser exigi<strong>da</strong> mais esta, de<br />

desempenhar o que deveriam ser funções administrativas. Esta ativi<strong>da</strong>de pode muito<br />

bem ser atribuí<strong>da</strong> a uma outra enti<strong>da</strong>de <strong>do</strong> governo ou por atores <strong>do</strong> setor priva<strong>do</strong>. Na<br />

ver<strong>da</strong>de, a própria ANEEL reconheceu esta possibili<strong>da</strong>de e terceirizou as ativi<strong>da</strong>des<br />

operacionais <strong>do</strong> leilão, quan<strong>do</strong> <strong>do</strong> último relaciona<strong>do</strong> às expansões <strong>da</strong> transmissão. Por<br />

isso, é recomendável que:<br />

16. A responsabili<strong>da</strong>de de conduzir leilões e outorgar concessões deve ser<br />

atribuí<strong>da</strong> à outra enti<strong>da</strong>de (priva<strong>da</strong> ou pública), com experiência . To<strong>do</strong>s os<br />

<strong>do</strong>cumentos relaciona<strong>do</strong>s à concessão e à meto<strong>do</strong>logia usa<strong>da</strong> na condução de<br />

licitações, devem ser antes aprova<strong>do</strong>s pela ANEEL.<br />

H. Supervisão <strong>regulatória</strong> <strong>do</strong> MAE e <strong>do</strong> ONS<br />

O ONS e o MAE, respectivamente o opera<strong>do</strong>r e o merca<strong>do</strong> atacadista <strong>do</strong><br />

sistema, são instituições centrais para o seu funcionamento. É essencial que estejam sob<br />

rigorosa supervisão <strong>regulatória</strong>. Muitos <strong>do</strong>s entrevista<strong>do</strong>s acreditavam que a ANEEL<br />

tinha si<strong>do</strong>, antes <strong>da</strong> crise, muito passiva no exercício de seu poder de supervisão. No<br />

caso <strong>do</strong> MAE, a passivi<strong>da</strong>de foi, pelo menos em parte, motiva<strong>da</strong> pelo paradigma de que<br />

o comércio de energia seria auto governa<strong>do</strong> por um quadro de investi<strong>do</strong>res. Quase to<strong>do</strong><br />

mun<strong>do</strong> reconhece que o a idéia era fraca e, em última análise, anormal. Houve vários<br />

interesses em jogo para permitir acor<strong>do</strong>s mais satisfatórios e resoluções de controvérsias<br />

mais eficazes. Típico <strong>da</strong> incapaci<strong>da</strong>de de operar era o fato de que a quanti<strong>da</strong>de de<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

pagamentos a serem efetua<strong>do</strong>s aos participantes <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>, talvez o objetivo central <strong>do</strong><br />

MAE, chegava aos bilhões de reais, enquanto os diversos conflitos em discussão eram<br />

sobre quem tinha direito aos recursos. Embora na época houvesse a informação de que<br />

um acor<strong>do</strong> estaria próximo, não se pode admitir que um merca<strong>do</strong> opere diante de<br />

impasses tão demora<strong>do</strong>s sobre o destino de verbas devi<strong>da</strong>s. Mesmo sen<strong>do</strong> possível<br />

esperar uma intervenção <strong>do</strong> regula<strong>do</strong>r para resolver os impasses, o paradigma de auto<br />

governo, e talvez outros fatores, funcionaram como um freio para a ANEEL. Em abril<br />

de 2002, em resposta à crise, a diretoria <strong>do</strong> MAE foi altera<strong>da</strong>. O Conselho<br />

Administrativo agora consiste de cinco membros eleitos por assembléia geral,<br />

representa<strong>da</strong> por gera<strong>do</strong>res e comercializa<strong>do</strong>res. Estes, por sua vez, selecionaram uma<br />

<strong>estrutura</strong> organizacional composta por um superintendente e sete gerentes, to<strong>do</strong>s<br />

funcionários <strong>do</strong> MAE por um man<strong>da</strong>to de <strong>do</strong>is anos, os ver<strong>da</strong>deiros gerentes <strong>da</strong> agência.<br />

Neste momento, as posições de Superintendente e Presidente <strong>do</strong> Conselho são ocupa<strong>da</strong>s<br />

por uma mesma pessoa. Espera-se, atualmente, a fim de se evitar os erros e impasses <strong>do</strong><br />

passa<strong>do</strong>, que a ANEEL supervisione com mais rigor o MAE.<br />

A ANEEL acompanhou os impasses <strong>do</strong> MAE e como resposta criou um<br />

mecanismo para tentar mediar tais disputas. Embora o esforço seja útil e louvável, não<br />

está claro que uma mediação será suficiente. Faz senti<strong>do</strong>, portanto, somar a isto um processo de<br />

resolução de controvérsias que opere prontamente e tenha o poder de impor a resolução,<br />

no caso de um <strong>do</strong>s interessa<strong>do</strong>s buscar tal recurso para uma disputa. Uma possibili<strong>da</strong>de<br />

seria um árbitro independente nomea<strong>do</strong> pela ANEEL, sen<strong>do</strong> imperativo que este<br />

divulgue uma opinião formal e explanatória, pois é essencial que ela esteja inteiramente<br />

informa<strong>da</strong> sobre qualquer problema relaciona<strong>do</strong> à operação <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>. Vários<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

entrevista<strong>do</strong>s observaram que a ANEEL precisa manter um conhecimento profun<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong>s desenvolvimentos <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>.<br />

O desempenho <strong>do</strong>s regula<strong>do</strong>res com relação ao ONS também foi tema de vários<br />

comentários. Muitos <strong>do</strong>s entrevista<strong>do</strong>s acreditavam que o ONS era muito passivo diante<br />

<strong>da</strong>s pressões <strong>da</strong>s hidrelétricas estatais e conduzia suas ativi<strong>da</strong>des com excessivo enfoque<br />

no uso destas. Embora a opinião fosse unânime, a própria <strong>estrutura</strong> de governo <strong>do</strong> ONS<br />

é amplamente basea<strong>da</strong> nos participantes <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>. O Conselho Administrativo é<br />

composto por dezenove membros, sete representantes <strong>do</strong>s produtores, sete<br />

representantes <strong>do</strong>s interesses <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, quatro representantes <strong>da</strong> transmissão e<br />

to<strong>do</strong>s são nomea<strong>do</strong>s por uma assembléia geral de participantes <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>. Além disso,<br />

há um representante <strong>do</strong> Ministério de Minas e Energia. Este representante possui poder<br />

de veto. Ao contrário <strong>do</strong> MAE, o modelo de governança <strong>do</strong> ONS não foi altera<strong>do</strong>. O<br />

objetivo <strong>da</strong> presença <strong>do</strong> MME com direito a veto, é evitar impasses, como aquele que<br />

ocorreu no MAE. O Conselho Administrativo elege o presidente e quatro diretores que<br />

de fato dirigem a agência. Vários membros desta <strong>estrutura</strong> vieram <strong>do</strong> setor de geração<br />

hidrelétrica, talvez consoli<strong>da</strong>n<strong>do</strong> a percepção deste tendenciamento. Uma questão muitas<br />

vezes levanta<strong>da</strong> foi sobre por que a supervisão <strong>regulatória</strong> não foi capaz de atenuar este<br />

tendenciamento ou, se não foi comprova<strong>do</strong>, por que a ANEEL não tomou decisões<br />

específicas. Alguns, inclusive o ONS, negaram a existência de tal tendenciamento e, por<br />

isso, acreditavam que a ANEEL não tinha na<strong>da</strong> para corrigir. Também é interessante<br />

perguntar o que a ANEEL teria feito se tivesse concluí<strong>do</strong> que seria necessária uma ação<br />

para atenuar esta influência na operação <strong>do</strong> sistema. Deve-se destacar que a ANEEL tem<br />

esta<strong>do</strong> engaja<strong>da</strong> na supervisão <strong>regulatória</strong> <strong>do</strong> ONS. A agência tem conduzi<strong>do</strong> auditorias,<br />

monitora<strong>do</strong> operações e se encarrega<strong>do</strong> de outras ações <strong>regulatória</strong>s desta natureza.<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

Basea<strong>do</strong> nas observações de muitos <strong>do</strong>s entrevista<strong>do</strong>s, no entanto, parece que estas<br />

ativi<strong>da</strong>des não são muito divulga<strong>da</strong>s. Isso sugere que os regula<strong>do</strong>res deveriam conduzir<br />

sua ativi<strong>da</strong>de de regulação com o ONS de maneira mais transparente, para que to<strong>do</strong>s as<br />

partes tenham a oportuni<strong>da</strong>de de se informar sobre isso. Apesar de a agência ter podi<strong>do</strong><br />

tomar ação direta e exigi<strong>do</strong> moderação através de medi<strong>da</strong>s específicas ou através de um<br />

pedi<strong>do</strong> de mu<strong>da</strong>nça na governança, não está claro se uma medi<strong>da</strong> <strong>regulatória</strong> tradicional<br />

como a de estabelecer os incentivos adequa<strong>do</strong>s ao desempenho, funcionaria para uma<br />

instituição sem fins lucrativos como o ONS ou o MAE. Um possível incentivo que pode<br />

ser útil consiste no regula<strong>do</strong>r assumir um papel direto na determinação <strong>do</strong>s pacotes<br />

salariais para funcionários de alto escalão <strong>do</strong> ONS ou <strong>do</strong> MAE. Como já observa<strong>do</strong><br />

anteriormente, a intenção deste relatório não é avaliar qual versão <strong>do</strong>s acontecimentos é<br />

a mais adequa<strong>da</strong>. Na ver<strong>da</strong>de, a existência ou não de tendenciamento no ONS não é<br />

relevante para as recomen<strong>da</strong>ções feitas sobre este aspecto. O fato, basea<strong>do</strong> nos<br />

comentários <strong>do</strong>s entrevista<strong>do</strong>s, é que seria apropria<strong>do</strong> para a ANEEL exercer seu poder<br />

de supervisão sobre o ONS de maneira mais transparente e pública.<br />

Duas observações são relevantes nesta conjuntura. A primeira é que o regime de<br />

governança <strong>da</strong>s instituições <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> elétrico no Brasil tem si<strong>do</strong> um tanto problemático. O Brasil não<br />

é o único neste aspecto. Na Califórnia, o opera<strong>do</strong>r <strong>do</strong> sistema, sob controle de<br />

investi<strong>do</strong>res, ficou quase que inteiramente anormal e to<strong>do</strong> o sistema teve que ser<br />

substituí<strong>do</strong> e completamente re<strong>estrutura</strong><strong>do</strong>. A segun<strong>da</strong> está relaciona<strong>da</strong> à segregação <strong>da</strong>s<br />

operações de despacho. O Power Exchange, o equivalente ao MAE na Califórnia,<br />

também foi um total fracasso, e teve que ser completamente desmantela<strong>do</strong> pelos<br />

regula<strong>do</strong>res. Na ver<strong>da</strong>de, é interessante que o MAE e o ONS continuem como enti<strong>da</strong>des<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

separa<strong>da</strong>s. Nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, em grande parte por causa <strong>da</strong> experiência <strong>da</strong> Califórnia,<br />

as operações de merca<strong>do</strong> e despacho estão sen<strong>do</strong> uni<strong>da</strong>s sob uma única organização.<br />

Uma outra questão que preocupa nos comentários <strong>do</strong>s entrevista<strong>do</strong>s é se a<br />

ANEEL e até mesmo os próprios participantes <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> estavam suficientemente<br />

informa<strong>do</strong>s <strong>do</strong> que acontecia de fato no MAE e no ONS. Alguns entrevista<strong>do</strong>s<br />

observaram incisivamente que nenhum monitoramento contínuo <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> e de suas<br />

instituições estava em vigor. Comentários como este não devem ser considera<strong>do</strong>s<br />

necessariamente como uma crítica aos regula<strong>do</strong>res. Não se pode esperar que uma instituição<br />

regula<strong>do</strong>ra, em qualquer parte <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, monitore em tempo real as operações e as práticas <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>.<br />

Esta é uma tarefa para a qual as agências regula<strong>do</strong>ras não estão prepara<strong>da</strong>s. Nos Esta<strong>do</strong>s<br />

Uni<strong>do</strong>s, por exemplo, a Federal Energy Regulatory Comission, FERC, reconhecen<strong>do</strong><br />

esta deficiência, está exigin<strong>do</strong> que ca<strong>da</strong> Opera<strong>do</strong>r de Transmissão Regional (ISOs)<br />

possua um monitor de merca<strong>do</strong> autônomo e responsável pelo acompanhamento<br />

detalha<strong>do</strong> <strong>do</strong>s merca<strong>do</strong>s para denunciar a existência práticas abusivas, falhas na projeção<br />

ou problemas sistêmicos. Na prática, o monitor de merca<strong>do</strong> funciona como os olhos e os ouvi<strong>do</strong>s <strong>do</strong><br />

regula<strong>do</strong>r. Os monitores de merca<strong>do</strong> nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s possuem independência<br />

suficiente para denunciarem em público suas descobertas ou apelar diretamente aos<br />

regula<strong>do</strong>res, para apoio. Os monitores de merca<strong>do</strong> estão sen<strong>do</strong>, ca<strong>da</strong> vez mais,<br />

requisita<strong>do</strong>s ao re<strong>do</strong>r <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>. Já foram estabeleci<strong>do</strong>s na Europa e no Panamá e estão<br />

sen<strong>do</strong> propostos para a Bolívia e Peru. Há mérito na consideração <strong>da</strong> ANEEL, de<br />

estabelecer uma enti<strong>da</strong>de equivalente no Brasil.<br />

Vale a pena enumerar as funções específicas <strong>do</strong> monitor de merca<strong>do</strong>. Nelas está<br />

incluí<strong>da</strong> a observação em tempo real e detalha<strong>da</strong> de to<strong>do</strong>s os participantes <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>,<br />

incluin<strong>do</strong> opera<strong>do</strong>res <strong>do</strong> sistema, opera<strong>do</strong>res <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>, gera<strong>do</strong>res, companhias de<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

transmissão e os distribui<strong>do</strong>res. O papel <strong>do</strong> monitor de merca<strong>do</strong> é o de identificar, o<br />

quanto antes, práticas abusivas, exercício desordena<strong>do</strong> de poder , falhas na projeção ,<br />

deficiências em operações, comportamento fraudulento entre os competi<strong>do</strong>res e violação<br />

<strong>da</strong>s normas. O papel principal é o de observar o merca<strong>do</strong> em tempo real, ou<br />

periodicamente, e de denunciar suas descobertas se necessário. O monitor não teria<br />

poderes além de simplesmente identificar os problemas. Apenas o regula<strong>do</strong>r poderá<br />

decidir se haverá conseqüências, como penali<strong>da</strong>des ou suspensão de licença. O ponto é<br />

que haverá avisos antecipa<strong>do</strong>s para to<strong>do</strong>s os participantes <strong>do</strong>s problemas encontra<strong>do</strong>s no<br />

merca<strong>do</strong>, para prevenir uma crise de grandes proporções. O monitor poderia estar<br />

fisicamente localiza<strong>do</strong>, como uma enti<strong>da</strong>de independente, no opera<strong>do</strong>r <strong>do</strong> sistema ou na<br />

ANEEL. O próprio monitor teria que ser aprova<strong>do</strong> pela ANEEL. Além disso, o<br />

monitor não precisaria <strong>da</strong> aprovação de qualquer autori<strong>da</strong>de ou órgão <strong>do</strong> governo para<br />

tornar público suas descobertas e recomen<strong>da</strong>ções. O seu trabalho é o de divulgar sua<br />

responsabili<strong>da</strong>de e não deverá enfrentar qualquer barreira <strong>institucional</strong> para este fim.<br />

Pelos motivos observa<strong>do</strong>s, as seguintes recomen<strong>da</strong>ções são feitas:<br />

17. A ANEEL, através de procedimentos transparentes, deve estabelecer<br />

padrões de desempenho tanto para o MAE quanto para o ONS. Deve<br />

também buscar opiniões sobre quais tipos de incentivo são mais<br />

adequa<strong>do</strong>s para instituições sem fins lucrativos como estas e se os<br />

incentivos proporciona<strong>do</strong>s aos seus diretores produziriam os mesmos<br />

resulta<strong>do</strong>s que os <strong>da</strong><strong>do</strong>s à instituição como um to<strong>do</strong>. Uma vez<br />

estabeleci<strong>do</strong>s os padrões, a ANEEL deve conduzir procedimentos de<br />

supervisão sobre o MAE e o ONS, uma vez por ano, buscan<strong>do</strong> colaboração<br />

53


Ashley Brown, March 2002<br />

de to<strong>do</strong>s os participantes <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>, com relação à continui<strong>da</strong>de <strong>da</strong><br />

aplicação <strong>do</strong>s padrões de desempenho e <strong>do</strong>s incentivos. Ao fim de ca<strong>da</strong><br />

procedimento, a ANEEL deve emitir um relatório indican<strong>do</strong> sua avaliação<br />

<strong>do</strong> desempenho <strong>da</strong>s duas instituições. O relatório também deve indicar,<br />

quan<strong>do</strong> necessário, quais mu<strong>da</strong>nças devem ser feitas com relação aos<br />

incentivos e padrões de desempenho aplica<strong>do</strong>s.<br />

18. A ANEEL deve propor e buscar uma colaboração em audiência pública,<br />

sobre a criação de um Monitor Independente de Merca<strong>do</strong> no Brasil. A<br />

proposta deve incluir uma <strong>estrutura</strong> recomen<strong>da</strong><strong>da</strong>, aspectos financeiros e<br />

um méto<strong>do</strong> de operação para a enti<strong>da</strong>de.<br />

19. A ANEEL deve estabelecer um processo de resolução de conflitos para<br />

li<strong>da</strong>r prontamente com qualquer reclamação apresenta<strong>da</strong> à agência com<br />

relação às ações <strong>do</strong> MAE e ONS. A ANEEL também deve estabelecer um<br />

procedimento que lhe permita iniciar investigações no MAE e/ou no ONS por<br />

conta própria.<br />

I. Processos de Apelação<br />

Talvez o meio mais elementar de fazer com que as agências regula<strong>do</strong>ras se responsabilizem pelos<br />

seus atos é o processo de apelação de suas decisões. No momento, qualquer parte se sentin<strong>do</strong><br />

prejudica<strong>da</strong> por uma decisão <strong>da</strong> ANEEL tem o direito de recorrer aos tribunais federais.<br />

O caso seria primeiro apresenta<strong>do</strong> a uma primeira instância e se a parte não ficasse<br />

satisfeita, a questão poderia ser leva<strong>da</strong> aos diversos níveis de apelação <strong>do</strong> judiciário. São<br />

vários os problemas com esta situação. O primeiro, como observa<strong>do</strong> por inúmeras<br />

pessoas entrevista<strong>da</strong>s, é que regulação independente é um novo conceito no Brasil e os<br />

juízes em grande parte não estão familiariza<strong>do</strong>s com matérias desta natureza e com as<br />

54


Ashley Brown, March 2002<br />

questões que são de responsabili<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s agências. Na ver<strong>da</strong>de, a situação não é<br />

exclusiva com relação à ANEEL. Também se aplica à ANATEL, ANP, ANA e a outras<br />

agências. Várias pessoas entrevista<strong>da</strong>s informaram que muitos juízes discutem<br />

abertamente, que não se sentem à vontade em li<strong>da</strong>r com questões de regulação. Em<br />

segun<strong>do</strong> lugar, o fato de que as apelações podem chegar a qualquer tribunal federal, cria<br />

uma maior possibili<strong>da</strong>de de haver inconsistências significativas com relação à<br />

interpretação de leis relevantes, à autori<strong>da</strong>de <strong>do</strong>s regula<strong>do</strong>res e com relação às questões<br />

essenciais. Isso gera um grau de incerteza, em um contexto onde certeza é essencial. Em<br />

terceiro lugar, a multiplici<strong>da</strong>de <strong>do</strong>s níveis de apelação, pode prolongar o tempo de<br />

análise, durante o qual pre<strong>do</strong>mina um considerável grau de incerteza sobre um resulta<strong>do</strong><br />

específico. Isso é particularmente ver<strong>da</strong>de no Brasil, onde é conheci<strong>da</strong> a lentidão <strong>do</strong>s<br />

tribunais em tomar decisões. O quarto problema está relaciona<strong>do</strong> à falta de clareza com<br />

relação ao critério a ser aplica<strong>do</strong> na revisão judicial <strong>da</strong>s decisões <strong>regulatória</strong>s.<br />

De uma maneira geral, existem três opções para recorrer às decisões <strong>da</strong>s agências<br />

regula<strong>do</strong>ras independentes, com diversas varie<strong>da</strong>des para ca<strong>da</strong> opção:<br />

A primeira opção, é claro, é a de recorrer ao próprio governo.<br />

A segun<strong>da</strong>, é recorrer a um tribunal especial cria<strong>do</strong> especificamente para li<strong>da</strong>r com a<br />

questão <strong>regulatória</strong>.<br />

A terceira opção é a de recorrer ao judiciário em geral.<br />

A primeira opção apresenta <strong>do</strong>is problemas. O primeiro, e mais óbvio, é que se a<br />

apelação for direto para o governo, de pouco adiantou a criação de agências regula<strong>do</strong>ras<br />

“independentes”, já que as autori<strong>da</strong>des políticas vão acabar <strong>da</strong>n<strong>do</strong> a palavra final.<br />

O segun<strong>do</strong> problema é que em muitas jurisdições uma parte sentin<strong>do</strong>-se lesa<strong>da</strong>, tem<br />

o direito elementar de recorrer aos tribunais, e portanto, mesmo uma decisão <strong>do</strong><br />

55


Ashley Brown, March 2002<br />

próprio governo não impede uma revisão judicial. Na prática, existem mecanismos de<br />

apelação redun<strong>da</strong>ntes. Na ver<strong>da</strong>de, esta seria a situação <strong>do</strong> Brasil se os casos chegassem<br />

ao governo. Tribunais especiais podem ser cria<strong>do</strong>s para li<strong>da</strong>r com a questão <strong>regulatória</strong>,<br />

ou um tribunal já existente pode ter esta responsabili<strong>da</strong>de, como no caso <strong>da</strong> Comissão de<br />

Concorrência na Inglaterra. Tribunais especiais de apelação estão sen<strong>do</strong> usa<strong>do</strong>s em<br />

vários esta<strong>do</strong>s <strong>da</strong> Índia e na Bolívia. Estão sen<strong>do</strong> recomen<strong>da</strong><strong>do</strong>s para o Chile e a<br />

Tanzânia. A abor<strong>da</strong>gem é perfeitamente razoável, salvo pelo fato de que, a não ser que o<br />

tribunal especial seja judicial, suas decisões podem também ser sujeitas à revisão judicial.<br />

Ironicamente, na Inglaterra, as apelações vão diretamente <strong>da</strong> Comissão de Concorrência<br />

<strong>do</strong> governo, e depois, para o judiciário também.<br />

A terceira opção é o apelo direto aos tribunais. Esta opção tem a vantagem de<br />

satisfazer direitos constitucionais e legais disponíveis aos ci<strong>da</strong>dãos. No entanto, tem a<br />

desvantagem observa<strong>da</strong> acima, a <strong>do</strong> judiciário estar desprepara<strong>do</strong> muitas <strong>da</strong>s vezes para<br />

li<strong>da</strong>r com questões <strong>regulatória</strong>s, onde a regulação independente é um conceito novo. A<br />

não ser que hajam tribunais separa<strong>do</strong>s para li<strong>da</strong>r com as questões administrativas, é<br />

provável que o judiciário, como alguns juízes brasileiros observaram, esteja mal<br />

prepara<strong>do</strong> para decidir tais questões. Por fim, a não ser que a revisão judicial seja dirigi<strong>da</strong><br />

a um fórum muito específico e que critérios rigorosos sejam aplica<strong>do</strong>s na avaliação <strong>do</strong>s<br />

apelos, é bem provável que não haverá uniformi<strong>da</strong>de nem na interpretação ou aplicação<br />

<strong>da</strong> lei e nem no tratamento de questões substantivas. Já houve movimento no senti<strong>do</strong> de<br />

criar uma mediação entre a ANEEL e a parte que se sentia prejudica<strong>da</strong> por uma decisão<br />

<strong>da</strong> agência. Esta abor<strong>da</strong>gem nunca foi além <strong>da</strong> fase de discussão por <strong>do</strong>is bons motivos.<br />

O primeiro é que o processo seria voluntário. Por isso, não ficou claro o motivo que<br />

levaria a ANEEL, ou qualquer outro regula<strong>do</strong>r, a querer passar por tal processo. A<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

segun<strong>da</strong> razão, que torna a idéia problemática é que a ANEEL é uma agência legalmente<br />

cria<strong>da</strong> pelo Esta<strong>do</strong>. Ela opera de maneira de jure e, por uma questão legal, suas decisões<br />

podem ser recorri<strong>da</strong>s no judiciário. Dessa maneira, uma disputa entre uma agência<br />

regula<strong>do</strong>ra e uma parte é de natureza completamente diferente <strong>da</strong>quelas disputas entre<br />

partes individuais com status semelhantes, que se prestam bem à mediação.<br />

As características mais deseja<strong>da</strong>s no processo recursal são a competência técnica<br />

e legal <strong>do</strong>s responsáveis pelas decisões, independência, transparência e imparciali<strong>da</strong>de <strong>do</strong><br />

fórum, consistência nas decisões, dedicação ao cumprimento <strong>da</strong> lei, a rapidez <strong>do</strong><br />

processo decisório e a conclusão <strong>da</strong>s decisões. Levan<strong>do</strong> em consideração as opções<br />

apresenta<strong>da</strong>s acima e levan<strong>do</strong> em conta as características deseja<strong>da</strong>s, parece claro que seria<br />

preferível o Brasil ter um único fórum para to<strong>da</strong>s as audiências <strong>da</strong>s questões <strong>regulatória</strong>s,<br />

cujas decisões seriam definitivas, sujeitas apenas à revisão <strong>do</strong> Supremo Tribunal Federal,<br />

caso haja questões constitucionais envolvi<strong>da</strong>s. A existência de um corpo especial de<br />

recursos no judiciário parece que satisfaria aos direitos <strong>do</strong>s brasileiros de buscar<br />

compensação nos tribunais e de garantir que os regula<strong>do</strong>res sejam legalmente<br />

responsáveis por suas ações. Existe também precedente considerável, apesar de não ser<br />

universal, nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, de limitar apelos <strong>da</strong>s decisões <strong>regulatória</strong>s a um único<br />

tribunal. Na maioria <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s, as decisões <strong>da</strong>s agências regula<strong>do</strong>ras, na ausência de<br />

qualquer questão constitucional federal, só podem ser recorri<strong>da</strong>s no Supremo Tribunal<br />

<strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>. A decisão deste tribunal é final. Logo, a questão é decidir qual o fórum<br />

apropria<strong>do</strong>. Esta decisão depende, em grande parte, <strong>da</strong> Constituição e leis <strong>do</strong> Brasil.<br />

Parece existir, no entanto, duas opções: a criação de um tribunal especial para apelos de<br />

decisão <strong>regulatória</strong>, ou apelo direto ao Supremo Tribunal de Justiça, o tribunal de maior<br />

instância de apelação <strong>da</strong> nação em questões não constitucionais. Há prós e contras para<br />

57


Ashley Brown, March 2002<br />

ca<strong>da</strong> opção. Um tribunal especializa<strong>do</strong> pode querer interferir em questões de política ao<br />

invés de se concentrar nas questões legais. Por outro la<strong>do</strong>, é quase certo que desenvolva<br />

a capacitação técnica requeri<strong>da</strong>. Esta capacitação, por exemplo, seria necessária para<br />

determinar se os regula<strong>do</strong>res aplicaram corretamente a meto<strong>do</strong>logia de fixação de tarifa<br />

enuncia<strong>da</strong> no contrato. O Supremo Tribunal de Justiça tem menos probabili<strong>da</strong>de de se<br />

estender em questões de política, mas <strong>da</strong><strong>do</strong> seu man<strong>da</strong>to mais amplo, tem também<br />

menos possibili<strong>da</strong>de de desenvolver um nível de capacitação semelhante. Além disso,<br />

com uma carga de trabalho maior, pode ser mais lento na apresentação de decisões.<br />

Qualquer uma destas opções serviria ao propósito de limitar os apelos a um único fórum<br />

e permitir o desenvolvimento e a condução de capacitação <strong>regulatória</strong> na instância onde<br />

os apelos são recebi<strong>do</strong>s. A questão sobre qual seria a melhor escolha deve ser deixa<strong>da</strong><br />

para os especialistas legais brasileiros que podem determinar qual o mecanismo mais<br />

adequa<strong>do</strong>, dentro de uma perspectiva legal e constitucional, e qual proporcionaria o<br />

fórum mais eficaz. De acor<strong>do</strong> com isto, é recomendável que:<br />

20. To<strong>da</strong>s as apelações às decisões <strong>da</strong> agência regula<strong>do</strong>ra devem ser dirigi<strong>da</strong>s<br />

a um único fórum, cuja decisão, na ausência de qualquer questão<br />

constitucional, será final.<br />

21. Este fórum deve ser um tribunal especializa<strong>do</strong>, cria<strong>do</strong> com o único<br />

propósito de receber recursos <strong>da</strong>s agências regula<strong>do</strong>ras ou, como alternativa,<br />

deve ser o Supremo Tribunal de Justiça. Um grupo de especialistas em<br />

assuntos jurídico-legais deve ser constituí<strong>do</strong> para consultar interlocutores<br />

acredita<strong>do</strong>s, públicos ou priva<strong>do</strong>s, para conduzir pesquisas necessárias e<br />

recomen<strong>da</strong>r o fórum apropria<strong>do</strong> a ser designa<strong>do</strong> através <strong>da</strong> elaboração <strong>do</strong><br />

<strong>do</strong>cumento necessário para executar sua recomen<strong>da</strong>ção.<br />

58


Ashley Brown, March 2002<br />

Além de considerar o fórum apropria<strong>do</strong> para apelações, mais três questões<br />

importantes precisam ser considera<strong>da</strong>s. A primeira é definir o critério para decidir<br />

quanto aos recursos. A segun<strong>da</strong> é a questão de quais recursos devem estar disponíveis<br />

para o apelante vence<strong>do</strong>r. A terceira questão é saber quem tem o direito de recorrer a<br />

uma decisão <strong>da</strong> agência. A resposta para a primeira questão requer uma avaliação <strong>do</strong>s<br />

princípios envolvi<strong>do</strong>s. Agências regula<strong>do</strong>ras especializa<strong>da</strong>s são cria<strong>da</strong>s para<br />

desenvolver e aplicar capacitação técnica e substantiva no setor regula<strong>do</strong>. Sua missão<br />

é a de cumprir suas obrigações de maneira a suprir os objetivos sociais e econômicos<br />

no setor de sua responsabili<strong>da</strong>de. Para este fim, são necessárias articulação e aplicação<br />

consistente de políticas, incentivos, medi<strong>da</strong>s e processos para garantir o cumprimento<br />

<strong>da</strong> lei. Para realizar seus objetivos e se ajustar às diversas circunstâncias, um grau<br />

razoável de flexibili<strong>da</strong>de e amplitude deve ser concedi<strong>do</strong> à agência. As partes,<br />

procuran<strong>do</strong> influenciar as agências regula<strong>do</strong>ras devem ser obriga<strong>da</strong>s a apresentar<br />

to<strong>da</strong>s as evidências para sua avaliação. Seria impossível esperar consistência ou<br />

qualquer grau de certeza, se as partes fossem livres para omitir a evidência aos<br />

regula<strong>do</strong>res e apresentá-la às instâncias recursais. Os regula<strong>do</strong>res, por outro la<strong>do</strong>, não<br />

podem estar em posição de exceder sua autori<strong>da</strong>de legal, agir de mo<strong>do</strong> arbitrário ou<br />

irracional, ou negar a investi<strong>do</strong>res e outros ci<strong>da</strong>dãos uma oportuni<strong>da</strong>de justa de ser<br />

ouvi<strong>do</strong> sobre as questões que os afeta. O direito de apelação foi cria<strong>do</strong> para alcançar o<br />

equilíbrio visan<strong>do</strong> flexibili<strong>da</strong>de suficiente para o cumprimento de obrigações sem<br />

perder o senso de responsabili<strong>da</strong>de. Para alcançar este equilíbrio de maneira<br />

satisfatória, varas de apelação devem ser limita<strong>da</strong>s com relação ao que podem<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

considerar e ao critério que podem usar para revisar decisões <strong>regulatória</strong>s. Desta<br />

maneira, é recomendável que:<br />

22. Órgãos recursais, reven<strong>do</strong> decisões <strong>regulatória</strong>s são obriga<strong>do</strong>s a ratificar a<br />

decisão <strong>da</strong> agência, a não ser que se caracterize especificamente que esta<br />

excedeu sua autori<strong>da</strong>de legal, ou agiu de forma arbitrária e irracional,<br />

contrária ao peso manifesto de evidências, ou deixou de seguir<br />

procedimentos e processos constitucionais e legais adequa<strong>do</strong>s. Ao<br />

considerar as apelações, os órgãos ficam proibi<strong>do</strong>s de avaliar qualquer<br />

evidência ou argumento que deixaram de ser apresenta<strong>do</strong>s ao regula<strong>do</strong>r e<br />

também, de reavaliar as implicações de políticas de qualquer decisão que<br />

não seja defeituosa pela razão menciona<strong>da</strong> acima. Na consideração de<br />

qualquer recurso, o órgão de apelação deve supor que a decisão foi correta.<br />

Tal suposição, por motivos de suspensão temporária de uma decisão<br />

<strong>regulatória</strong>, pode ser refuta<strong>da</strong>, mas apenas diante de uma clara evidência<br />

de que a implementação <strong>da</strong> decisão, causará <strong>da</strong>nos irreparáveis ao<br />

recorrente, e quan<strong>do</strong> este tiver uma chance substancial de sucesso no<br />

processo de apelação.<br />

Também há a questão <strong>do</strong>s recursos disponíveis <strong>do</strong> corpo de apelação, para quem<br />

vence o caso. É importante, mais uma vez, permanecer foca<strong>do</strong> na necessi<strong>da</strong>de de<br />

consistência e aplicação <strong>da</strong> capacitação técnica <strong>da</strong> agência regula<strong>do</strong>ra. Por esta razão, é<br />

em geral aconselhável que o corpo de apelação se prive de introduzir qualquer recurso<br />

próprio, caso uma ação futura seja requeri<strong>da</strong>. De acor<strong>do</strong> com isso, é recomendável<br />

que:<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

23. Se o órgão de apelação considerar que a decisão <strong>da</strong> agência regula<strong>do</strong>ra<br />

deve ser reverti<strong>da</strong> e que medi<strong>da</strong>s corretivas adicionais precisam ser<br />

toma<strong>da</strong>s, o melhor méto<strong>do</strong> para encarregar-se de ações futuras, é enviar a<br />

matéria de volta à agência regula<strong>do</strong>ra, com instruções para que esta tome<br />

as medi<strong>da</strong>s necessárias e consistentes com a decisão <strong>do</strong> órgão de apelação.<br />

Este também pode estipular um prazo para reassumir a responsabili<strong>da</strong>de<br />

de <strong>da</strong>r a sentença, caso o regula<strong>do</strong>r não o faça.<br />

Com relação à terceira questão de quem está em posição legal para entrar com<br />

uma ação, existem diferentes modelos. Na Inglaterra, apenas a empresa regula<strong>da</strong> e o<br />

regula<strong>do</strong>r podem recorrer. Nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s e na Índia, qualquer pessoa ou<br />

empresa que participou <strong>do</strong> processo decisório e que se sente prejudica<strong>da</strong> pela decisão<br />

tem o direito de recorrer. Por uma questão de lei ou Constituição, o Brasil pode estar<br />

em situação semelhante a <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, mas se não estiver claro, esta questão<br />

pode ser assunto de uma audiência pública. Existem, no entanto, duas qualificações<br />

que qualquer apelante deve possuir. Seria extremamente inapropria<strong>do</strong>, uma parte<br />

recorrer a uma decisão de um procedimento <strong>do</strong> qual não participou, ou de levantar<br />

uma questão que não tenha si<strong>do</strong> previamente apresenta<strong>da</strong> ao regula<strong>do</strong>r. Se tais ações<br />

fossem permiti<strong>da</strong>s, o regula<strong>do</strong>r seria de fato substituí<strong>do</strong> pela vara de apelação como o<br />

fórum de jurisdição original. Portanto, recomen<strong>da</strong>-se que:<br />

24. Nenhum indivíduo ou grupo pode recorrer <strong>da</strong> decisão <strong>do</strong> regula<strong>do</strong>r a não<br />

ser que tenha participa<strong>do</strong> <strong>do</strong> processo no qual foi toma<strong>da</strong> a decisão. Não se<br />

pode levantar nenhuma questão no processo de apelação, que não tenha si<strong>do</strong><br />

previamente apresenta<strong>da</strong> ao regula<strong>do</strong>r.<br />

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J. Funções de Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

Ashley Brown, March 2002<br />

A credibili<strong>da</strong>de <strong>do</strong> processo regula<strong>do</strong>r é acentua<strong>da</strong> de maneira significativa<br />

quan<strong>do</strong> to<strong>do</strong>s os interesses são representa<strong>do</strong>s de maneira adequa<strong>da</strong> diante <strong>do</strong>s<br />

regula<strong>do</strong>res. Além disso, uma representação eficiente de to<strong>do</strong>s os interesses atingi<strong>do</strong>s<br />

pelas decisões <strong>do</strong> regula<strong>do</strong>r, enriquece substancialmente to<strong>do</strong> o processo. Não só os<br />

regula<strong>do</strong>res obtêm uma maior perspectiva e extensão <strong>da</strong> colaboração proporciona<strong>da</strong> para<br />

basear suas decisões, como também aumenta a possibili<strong>da</strong>de de negociar um resulta<strong>do</strong><br />

justo entre as partes. A ANEEL, através <strong>da</strong>s muitas oportuni<strong>da</strong>des que tem<br />

proporciona<strong>do</strong> a to<strong>da</strong>s as partes interessa<strong>da</strong>s a participarem <strong>do</strong> processo, tem idéia clara<br />

disto. No caso de to<strong>do</strong>s os participantes <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>, assim como os interesses <strong>do</strong>s<br />

maiores consumi<strong>do</strong>res, proporcionar uma oportuni<strong>da</strong>de de defesa de seus interesses já é<br />

suficiente. Estes grupos possuem tanto os recursos quanto a motivação para participar<br />

ao máximo. Os pequenos consumi<strong>do</strong>res, no entanto, sozinhos, tem pouca capaci<strong>da</strong>de<br />

para participar de maneira eficiente. Eles não têm recursos para participar de mo<strong>do</strong><br />

expressivo e não são, em geral, suficientemente organiza<strong>do</strong>s para captar recursos como<br />

um grupo. Felizmente, o IDEC, uma organização não governamental, tem aju<strong>da</strong><strong>do</strong> nos<br />

últimos anos a defender os interesses <strong>do</strong>s pequenos consumi<strong>do</strong>res, na sua maioria<br />

residenciais. O instituto foi capaz de fazer isso graças ao financiamento que recebeu <strong>do</strong><br />

BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento). Infelizmente, este financiamento está<br />

chegan<strong>do</strong> ao fim e precisa ser substituí<strong>do</strong>, para que os consumi<strong>do</strong>res continuem a ter<br />

uma representação adequa<strong>da</strong>.<br />

Existem diversos modelos ao re<strong>do</strong>r <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> que podem funcionar. Um é substituir o<br />

financiamento <strong>do</strong> BID, por uma pequena sobretaxa nas contas <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res residenciais,<br />

62


Ashley Brown, March 2002<br />

usa<strong>da</strong> para proporcionar ao IDEC (Instituto de Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r) ou outra organização<br />

designa<strong>da</strong> (não governamental ou governamental), os meios para representar de mo<strong>do</strong> eficaz<br />

os interesses <strong>do</strong>s pequenos consumi<strong>do</strong>res perante a ANNEL. Outra possibili<strong>da</strong>de é a de<br />

designar uma agência governamental para representar os direitos de pequenos consumi<strong>do</strong>res e<br />

que possa financiar suas ativi<strong>da</strong>des com verba de orçamento próprio. Em alguns países, esta<br />

responsabili<strong>da</strong>de é <strong>da</strong> Justiça ou de algum outro ministério. Em outras jurisdições existe uma<br />

agência governamental independente, responsável por representar os interesses <strong>do</strong>s pequenos<br />

consumi<strong>do</strong>res em questões <strong>regulatória</strong>s. Existem ain<strong>da</strong>, em outros países, departamentos<br />

parcialmente independentes dentro <strong>da</strong> agência regula<strong>do</strong>ra para advogar a favor <strong>do</strong>s pequenos<br />

consumi<strong>do</strong>res. No caso <strong>do</strong> Brasil, <strong>da</strong><strong>do</strong> sua experiência e capacitação, assim como o amplo<br />

reconhecimento <strong>do</strong> IDEC, talvez fosse melhor buscar financiamento para que possa continuar<br />

seu trabalho. É importante que a defesa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r seja <strong>institucional</strong>iza<strong>da</strong> de mo<strong>do</strong><br />

permanente. Ao invés de focalizar nos meios específicos para este fim, recomen<strong>da</strong>-se que:<br />

25. A ANEEL deve tomar a iniciativa de coordenar, com outras enti<strong>da</strong>des<br />

governamentais e não-governamentais, formas de financiar<br />

permanentemente uma organização de defesa <strong>do</strong>s interesses de pequenos<br />

consumi<strong>do</strong>res.<br />

K. Coordenação de ativi<strong>da</strong>des <strong>da</strong> ANEEL, ANP, e ANA<br />

Um <strong>do</strong>s aspectos mais surpreendentes <strong>da</strong> evolução <strong>do</strong>s merca<strong>do</strong>s de energia no Brasil é a<br />

falta de sinergia entre os merca<strong>do</strong>s de gás e eletrici<strong>da</strong>de. Embora um <strong>do</strong>s objetivos principais<br />

<strong>do</strong> desenvolvimento de um merca<strong>do</strong> de gás no Brasil seja fornecer combustível confiável para<br />

uni<strong>da</strong>des de geração térmica, a operação destas usinas é incompatível com a forma como o gás<br />

deve ser compra<strong>do</strong>. Como os campos de gás precisam ser desenvolvi<strong>do</strong>s e uma nova<br />

63


Ashley Brown, March 2002<br />

capaci<strong>da</strong>de de oleoduto viabiliza<strong>da</strong>, o gás só está disponível na mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong>de take-or-pay.<br />

Mecanismos sofistica<strong>do</strong>s <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> de gás natural, como merca<strong>do</strong>s secundários ou merca<strong>do</strong>s<br />

de commodities à vista, que permitiriam mais flexibili<strong>da</strong>de e eficiência, não evoluíram. Tais<br />

compromissos contratuais e inflexibili<strong>da</strong>des <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> são claramente incompatíveis com o<br />

uso de geração térmica como uni<strong>da</strong>de para suplementar as uni<strong>da</strong>des hidrelétricas de base.<br />

Embora haja uma varie<strong>da</strong>de de explicações para a falta de simetria entre os <strong>do</strong>is merca<strong>do</strong>s, que<br />

não tem relação com as agências regula<strong>do</strong>ras, a necessi<strong>da</strong>de de melhor coordenação entre a<br />

ANP e ANEEL ain<strong>da</strong> deve ser considera<strong>da</strong>.<br />

É evidente que as questões <strong>regulatória</strong>s na eletrici<strong>da</strong>de não são idênticas às <strong>do</strong> gás natural.<br />

Certamente, a ANP tem que li<strong>da</strong>r com o papel <strong>do</strong>minante representa<strong>do</strong> pela Petrobrás nos<br />

merca<strong>do</strong>s de petróleo e gás natural. Ela também tem que lutar com uma infra-<strong>estrutura</strong> menos<br />

desenvolvi<strong>da</strong> <strong>do</strong> que a encontra<strong>da</strong> na área de eletrici<strong>da</strong>de. Por outro la<strong>do</strong>, a Petrobrás está se<br />

tornan<strong>do</strong> um ator importante no setor de energia como um investi<strong>do</strong>r em usinas térmicas e<br />

como o fornece<strong>do</strong>r principal <strong>do</strong> combustível para gera<strong>do</strong>res térmicos. Em suma, os merca<strong>do</strong>s<br />

não são somente sinérgicos, mas estão convergin<strong>do</strong> ativamente. Desta forma, embora existam<br />

diferenças nos <strong>do</strong>is merca<strong>do</strong>s, a natureza ca<strong>da</strong> vez mais interliga<strong>da</strong> <strong>da</strong>s duas indústrias necessita<br />

de maior coordenação entre as regula<strong>do</strong>ras <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is setores.<br />

A ANA, uma agência mais nova <strong>do</strong> que a ANP e a ANEEL, tem uma série de<br />

responsabili<strong>da</strong>des que também a torna liga<strong>da</strong> aos merca<strong>do</strong>s de eletrici<strong>da</strong>de. Como a água é a<br />

fonte de energia para mais de 90% <strong>da</strong> geração <strong>do</strong> Brasil, a missão <strong>da</strong> ANA, de fiscalizar o uso<br />

<strong>da</strong> água, incluin<strong>do</strong> a monetização possível <strong>do</strong> seu valor , está intrinsecamente liga<strong>da</strong> à<br />

eletrici<strong>da</strong>de. Certamente, suas políticas exigirão coordenação com a ANEEL.<br />

As entrevistas deixaram claro que as três agências regula<strong>do</strong>ras estão em comunicação.<br />

Porém, elas não parecem se coordenar de forma satisfatória, como o relacionamento entre as<br />

64


Ashley Brown, March 2002<br />

três indústrias regula<strong>da</strong>s exigiria. Também não está claro como elas estão coordena<strong>da</strong>s em<br />

áreas de interesse comum, como o desenvolvimento de programas de treinamento para suas<br />

equipes, a criação de programas para estu<strong>do</strong>s sobre regulação, o desenvolvimento de órgãos<br />

comuns de apelação e em educar o público em questões como o papel e a importância <strong>da</strong><br />

regulação independente. Uma vantagem adicional <strong>da</strong> coordenação mais próxima é evitar a<br />

“captura” que, com freqüência, ocorre em agentes regulatórios para uma única indústria; isto é,<br />

o fenômeno onde os regula<strong>do</strong>res mantêm sintonia de pensamento com aqueles que estão<br />

regulan<strong>do</strong>. Responsabili<strong>da</strong>des em vários setores tendem a apresentar influências de novas<br />

idéias de outras indústrias, com freqüência, um antí<strong>do</strong>to eficiente contra a captura.<br />

Alguns <strong>do</strong>s entrevista<strong>do</strong>s sugeriram, em face <strong>da</strong> convergência entre os sistemas de gás e<br />

eletrici<strong>da</strong>de, que uma fusão <strong>da</strong> ANP e a ANEEL pode ser apropria<strong>da</strong>. Também foi observa<strong>do</strong><br />

que muitas <strong>da</strong>s habili<strong>da</strong>des técnicas exigi<strong>da</strong>s pela regulação, especialmente no que diz respeito à<br />

economia, lei, finanças e contabili<strong>da</strong>de, são as mesmas independentemente <strong>da</strong> indústria à qual<br />

são aplica<strong>da</strong>s. Pode haver oportuni<strong>da</strong>des significativas para ganhos na coordenação mais<br />

próxima e talvez na fusão <strong>da</strong>s agências. Em face <strong>do</strong>s comentários acima, esta hipótese parece<br />

merecer estu<strong>do</strong>. A ANA também pode ser parte deste estu<strong>do</strong>. Portanto, é recomendável que:<br />

26. Uma força-tarefa com representantes <strong>da</strong> ANEEL, ANP e ANA, de<br />

legisla<strong>do</strong>res e de ministérios , deve ser organiza<strong>da</strong> para preparar um<br />

relatório propon<strong>do</strong> formas de se obter uma coordenação mais articula<strong>da</strong><br />

entre as três agências. Parte <strong>do</strong> estu<strong>do</strong> deve incluir o exame de to<strong>da</strong>s as<br />

sugestões relevantes para a coordenação <strong>da</strong>s ativi<strong>da</strong>des <strong>da</strong>s agências<br />

regula<strong>do</strong>ras (por exemplo, procedimentos , consoli<strong>da</strong>ção de funções ou<br />

regras comuns). Deve-se dedicar atenção especial às políticas de<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

coordenação <strong>do</strong>s merca<strong>do</strong>s de combustível e geração. Recomendável<br />

contratar os serviços de consultores para facilitar o trabalho.<br />

L. Infra-<strong>estrutura</strong> intelectual para regulação<br />

Um <strong>do</strong>s interesses comuns de to<strong>do</strong>s os órgãos regula<strong>do</strong>res no Brasil, incluin<strong>do</strong> não<br />

somente a ANEEL, ANA e ANP, mas também regula<strong>do</strong>res nacionais e estaduais na área de<br />

telecomunicações, transporte e outras setores, é o de desenvolver uma infra-<strong>estrutura</strong><br />

intelectual que suporte as ativi<strong>da</strong>des <strong>regulatória</strong>s. A infra-<strong>estrutura</strong> intelectual inclui programas<br />

universitários multi-disciplinares de estu<strong>do</strong>s regulatórios, institutos de pesquisa, programas de<br />

treinamento para regula<strong>do</strong>res, patrocínio de conferências e seminários, periódicos volta<strong>do</strong>s a<br />

questões <strong>regulatória</strong>s e ativi<strong>da</strong>des relaciona<strong>da</strong>s. O valor de tal infra-<strong>estrutura</strong> não pode ser<br />

subestima<strong>do</strong>. Ela não só oferece a oportuni<strong>da</strong>de para melhorar habili<strong>da</strong>des técnicas nas<br />

agências e perante aqueles que desejam participar <strong>do</strong>s procedimentos regulatórios, mas<br />

também facilita e propicia a infusão de novas idéias e perspectivas. Ela também aju<strong>da</strong> a impor<br />

uma disciplina intelectual no processo decisório <strong>do</strong> debate regulatório, que enriquece<br />

imensamente o processo. Finalmente, ao focar em idéias, ela torna bem mais difícil para os<br />

regula<strong>do</strong>res agirem de forma arbitrária.<br />

Há anos discute-se no Brasil o investimento na criação <strong>da</strong> infra-<strong>estrutura</strong> intelectual. Há<br />

alguns anos atrás, um Secretário de Energia promoveu a idéia <strong>do</strong>s “Centros de excelência” nas<br />

universi<strong>da</strong>des de to<strong>do</strong> o país, para promover o estu<strong>do</strong> <strong>da</strong> regulação. Foi proposto que uma<br />

pequena parte <strong>do</strong> orçamento <strong>da</strong> ANEEL seria usa<strong>do</strong> para apoiar este esforço. Embora essa<br />

proposta tenha si<strong>do</strong> aban<strong>do</strong>na<strong>da</strong>, alguns programas foram cria<strong>do</strong>s. É recomendável analisar em<br />

detalhes, a obtenção de recursos para promover essas ativi<strong>da</strong>des, numa base consistente.<br />

Assim, recomen<strong>da</strong>-se que:<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

27. Uma força-tarefa constituí<strong>da</strong> por regula<strong>do</strong>res, participantes <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>,<br />

acadêmicos e oficiais <strong>do</strong> governo deve ser convoca<strong>da</strong> para propor um<br />

programa nacional, com o objetivo de fornecer infra-<strong>estrutura</strong> intelectual<br />

para a regulação econômica no Brasil. A proposta deve também incluir<br />

formas de financiamento e articulação com organizações internacionais.<br />

L. O papel <strong>da</strong> ANEEL no planejamento<br />

O papel <strong>do</strong> regula<strong>do</strong>r <strong>do</strong> setor de energia no planejamento é uma questão controversa e<br />

considera<strong>da</strong> em várias jurisdições. Nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, há um debate contínuo sobre o<br />

assunto desde os anos 70. Em vários países em desenvolvimento, moven<strong>do</strong> de um paradigma<br />

de monopólio de proprie<strong>da</strong>de <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> à proprie<strong>da</strong>de priva<strong>da</strong>, tem havi<strong>do</strong> debates sobre qual<br />

o nível que o planejamento deve atingir. Uma vez decidi<strong>do</strong> que o planejamento deveria<br />

continuar, o debate culminou na questão sobre quem deveria ser seu responsável . Da<strong>da</strong> a<br />

circunstância recente de escassez de energia no Brasil, não é surpresa que a questão esteja<br />

sen<strong>do</strong> discuti<strong>da</strong> seriamente.<br />

No nível político-setorial, há três considerações principais para avaliar o papel que o<br />

regula<strong>do</strong>r deve ter no planejamento. É claro que a primeira questão é se deveria haver<br />

planejamento. Certamente os entusiastas <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> refutariam que uma vez em<br />

funcionamento, pode-se presumir que os indica<strong>do</strong>res econômicos estimulariam respostas mais<br />

eficientes para deman<strong>da</strong> <strong>do</strong> que qualquer regime de planejamento. Há alguns problemas com<br />

esse ponto de vista. O primeiro é o fato óbvio, mais perceptível no Brasil e na Califórnia, de que a retórica d<br />

merca<strong>do</strong> não cria um merca<strong>do</strong>. A elaboração <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> é extremamente difícil e mesmo quan<strong>do</strong><br />

realiza<strong>da</strong> corretamente, os indica<strong>do</strong>res serão inadequa<strong>do</strong>s ou simplesmente erra<strong>do</strong>s. Há<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

aspectos que tornam questionável se os merca<strong>do</strong>s sozinhos são suficientes para atender à<br />

deman<strong>da</strong> por energia. Um aspecto é o fato de que o setor de energia é <strong>estrutura</strong><strong>do</strong> em rede. As<br />

ações toma<strong>da</strong>s em um local invariavelmente têm efeitos significativos em outros locais <strong>do</strong><br />

sistema. Desta forma, a geração, transmissão e distribuição precisam estar sujeitas a algum<br />

processo de planejamento. Outro aspecto é a constante necessi<strong>da</strong>de de expansão <strong>da</strong> geração e<br />

transmissão. Extensões na transmissão e geração são com freqüência realiza<strong>da</strong>s em uma escala<br />

bastante acima <strong>da</strong> deman<strong>da</strong> estima<strong>da</strong> no curto-prazo. Devem os investi<strong>do</strong>res assumir os riscos<br />

associa<strong>do</strong>s a essa circunstância ou esses custos devem ser socializa<strong>do</strong>s? Caso esta seja a<br />

expectativa, alguma forma de planejamento transparente é necessária para justificar a<br />

socialização de riscos. Outro aspecto <strong>do</strong> setor de energia é que os sinais de preço para<br />

consumi<strong>do</strong>res são quase sempre dispersos por uma varie<strong>da</strong>de de motivos. Assim, é provável<br />

que haja algum nível de falha no merca<strong>do</strong>. Por estas características e outros fatores como<br />

considerações sociais, ambientais, de infra-<strong>estrutura</strong>, alocação e disponibili<strong>da</strong>de de recursos, a<br />

confiança exclusiva em merca<strong>do</strong>s parece muito arrisca<strong>da</strong>. A questão não é que os mecanismos<br />

de merca<strong>do</strong> não funcionam. Eles funcionam e com freqüência resultam em respostas mais<br />

eficientes para a deman<strong>da</strong>, mas no setor de energia, por to<strong>do</strong>s os motivos observa<strong>do</strong>s, é<br />

extremamente arrisca<strong>do</strong> confiar somente nas forças <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>.<br />

Uma vez determina<strong>do</strong> que o planejamento é necessário, a questão é sobre quem fará o<br />

planejamento. Obviamente, se o investimento priva<strong>do</strong> for a fonte de recursos para a expansão<br />

de sistema, a enti<strong>da</strong>de planeja<strong>do</strong>ra deve ser neutra em relação ao resulta<strong>do</strong> de processos como<br />

leilões, licitação competitiva e outros tipos de transações encontra<strong>da</strong>s no merca<strong>do</strong> de energia.<br />

O planejamento deve ser escrupulosamente neutro em termos <strong>do</strong>s critérios de concorrência. O<br />

regula<strong>do</strong>r deve certamente ficar na posição de neutrali<strong>da</strong>de. Porém, não é a única parte neutra<br />

que poderia conduzir o planejamento sem tendenciamento.<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

Embora sua neutrali<strong>da</strong>de e competência permitam tornar o regula<strong>do</strong>r aceitável para<br />

conduzir o planejamento, há outros fatores a serem considera<strong>do</strong>s. O primeiro é que o<br />

regula<strong>do</strong>r é fun<strong>da</strong>mentalmente um árbitro econômico no senti<strong>do</strong> de definir e impor os<br />

incentivos e as regras <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>, seus padrões, estabelecer e administrar a meto<strong>do</strong>logia para o<br />

controle econômico <strong>do</strong> poder monopolista e proteger o consumi<strong>do</strong>r contra vários tipos de<br />

abuso. O regula<strong>do</strong>r não é um participante <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> ou o árbitro de quem deve prevalecer<br />

em um contexto de competição. Ele decide questões com um olhar neutro na questão <strong>do</strong><br />

vence<strong>do</strong>r e perde<strong>do</strong>r. Planeja<strong>do</strong>res, embora teoricamente não sejam participantes <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>,<br />

tomam decisões que determinam resulta<strong>do</strong>s de merca<strong>do</strong>, funções que o regula<strong>do</strong>r não executa.<br />

Se, por exemplo, houver uma escolha entre a geração e a transmissão ou até mesmo resposta<br />

de carga, para uma restrição <strong>do</strong> sistema, os planeja<strong>do</strong>res inevitavelmente terão que decidir qual<br />

opção selecionar. Os regula<strong>do</strong>res não devem ter a sobrecarga de tomar tal decisão, pois terão que tomar<br />

decisões sobre o desempenho <strong>do</strong> opera<strong>do</strong>r <strong>da</strong> opção seleciona<strong>da</strong>. Neste senti<strong>do</strong>, os regula<strong>do</strong>res, no<br />

planejamento, têm o mesmo conflito de interesses que têm na condução de leilões e na<br />

licitação de concessões. Além disso, os empresários sempre podem apresentar uma alternativa<br />

própria para expandir o sistema, não contempla<strong>da</strong> no processo de planejamento. Os<br />

planeja<strong>do</strong>res certamente terão que analisar os efeitos de tais propostas no sistema como um<br />

to<strong>do</strong>. Caso haja disputas em relação a esses cálculos, a questão teria que ser resolvi<strong>da</strong> pela<br />

ANEEL. Não faz senti<strong>do</strong> sobrecarregar a ANEEL com a toma<strong>da</strong> <strong>da</strong> decisão de planejamento<br />

e em segui<strong>da</strong> com o julgamento de seus próprios cálculos. Isso é injusto para os regula<strong>do</strong>res e<br />

para as partes, tentan<strong>do</strong> resolver uma disputa. O planejamento também é uma ativi<strong>da</strong>de<br />

intensiva, especialmente se empreendi<strong>da</strong>, como deve, de forma participativa e transparente.<br />

Para uma agência regula<strong>do</strong>ra já penaliza<strong>da</strong> em termos de recursos financeiros e humanos, é<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

uma tarefa que não deve ser assumi<strong>da</strong>. Assim, a agência regula<strong>do</strong>ra não deve, com duas<br />

exceções, ter uma função no planejamento.<br />

A primeira exceção é aquela na qual os planeja<strong>do</strong>res e/ou investi<strong>do</strong>res desejam socializar<br />

riscos como concentração, segurança ou o custo de efeitos no sistema como um to<strong>do</strong>.<br />

Somente os regula<strong>do</strong>res deveriam ser autoriza<strong>do</strong>s a fazer tal distinção. Embora haja uma<br />

questão legítima de política nesta toma<strong>da</strong> de decisão, eles deveriam antecipar providências de<br />

tal forma a atender solicitações de pré-aprovação e repassar determina<strong>do</strong>s riscos/custos aos<br />

consumi<strong>do</strong>res.<br />

A segun<strong>da</strong> exceção é aquela na qual a enti<strong>da</strong>de planeja<strong>do</strong>ra a<strong>do</strong>ta uma medi<strong>da</strong> que a parte<br />

acredita ser decidi<strong>da</strong>mente desvantajosa para ela, por motivos econômicos ou de<br />

confiabili<strong>da</strong>de. Embora a própria ANEEL não deva iniciar investigações nesses assuntos, uma<br />

parte injustiça<strong>da</strong> pode apelar <strong>da</strong> decisão <strong>da</strong> enti<strong>da</strong>de planeja<strong>do</strong>ra a fim de obter assistência<br />

contra seus efeitos adversos. Um exemplo seria uma empresa de distribuição que acredita que<br />

sua segurança de fornecimento seria ameaça<strong>da</strong> se um plano específico fosse implementa<strong>do</strong>. Ela<br />

poderia apelar à ANEEL, diante <strong>da</strong> resolução de uma decisão de planejamento. A alternativa<br />

para resolver essa questão é que a parte injustiça<strong>da</strong> vá aos tribunais. Seria mais apropria<strong>do</strong> que<br />

a ANEEL, uma agência especializa<strong>da</strong> em eletrici<strong>da</strong>de, resolvesse essas questões.<br />

Se a ANEEL não for responsável pelo planejamento <strong>do</strong> sistema, quem deve ser ? A lista de<br />

agências potenciais para essa tarefa inclue MME, ONS, Eletrobrás, CNPE e outras. Não há<br />

prós e contras associa<strong>do</strong>s a ca<strong>da</strong> uma <strong>da</strong>s enti<strong>da</strong>des pretenden<strong>do</strong> assumir esta tarefa. Também<br />

existe a possibili<strong>da</strong>de sugeri<strong>da</strong> por alguns, de que um instituto independente deveria ser cria<strong>do</strong><br />

para executar o planejamento <strong>do</strong> setor. Essa idéia certamente tem mérito. Também há uma<br />

proposta no Congresso, sen<strong>do</strong> vigorosamente debati<strong>da</strong> enquanto este relatório foi escrito, para<br />

atribuir a responsabili<strong>da</strong>de <strong>do</strong> planejamento. Está além <strong>do</strong> escopo deste relatório tomar alguma<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

providência além de restringir o papel <strong>da</strong> ANEEL no processo de planejamento. Portanto, é<br />

recomendável que:<br />

28. A ANEEL deve ter somente duas funções no processo de planejamento:<br />

uma é determinar quais custos ou riscos devem ser socializa<strong>do</strong>s, através de<br />

repasse ao consumi<strong>do</strong>r e a outra é adjudicar disputas .<br />

M. Regime de preços de distribuição<br />

Embora a responsabili<strong>da</strong>de básica <strong>do</strong>s autores deste relatório seja considerar o<br />

<strong>fortalecimento</strong> <strong>do</strong>s aspectos institucionais <strong>da</strong> regulação <strong>do</strong> setor de energia, as entrevistas e o<br />

debate atual no Brasil suscitaram de maneira clara, várias questões básicas relaciona<strong>da</strong>s ao<br />

preço de serviços de distribuição. Os autores seriam negligentes se não as considerassem.<br />

Pareceu lógico para o Brasil, a<strong>do</strong>tar o sistema de preço-teto para empresas de distribuição, no<br />

momento <strong>da</strong> privatização. Era e ain<strong>da</strong> é o regime mais comum em uso em to<strong>do</strong> o mun<strong>do</strong>. De<br />

fato, fora <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, <strong>do</strong> Panamá e <strong>da</strong> Noruega, é difícil pensar em jurisdições onde<br />

este sistema não é usa<strong>do</strong> para regular empresas de distribuição. Ele apresentava benefícios<br />

teóricos de exigir menos supervisões <strong>regulatória</strong>s, ser menos complexo, tendia a internalizar a<br />

maioria <strong>do</strong>s custos, parecia fornecer incentivos para ganhos de produtivi<strong>da</strong>de, parecia ter<br />

menos custos de transação e processos e tinha limites claros entre o gerenciamento operacional<br />

e as regulações. Ele parecia oferecer menos incertezas <strong>do</strong> que as alternativas, como os custos<br />

<strong>do</strong> serviço ou receita máxima. Porém, as controvérsias continuam desde que a privatização<br />

começou e suscitam questões muito sérias em relação à eficácia <strong>da</strong> continui<strong>da</strong>de <strong>do</strong> sistema de<br />

preços-teto.<br />

Há três controvérsias específicas que fornecem motivos suficientes para repensar a a<br />

<strong>do</strong>tação <strong>da</strong> regulação pelo sistema de preço-teto, pelo menos no que concerne ao momento no<br />

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Ashley Brown, March 2002<br />

Brasil. As três controvérsias são referentes à quali<strong>da</strong>de <strong>do</strong> serviço, alocação de riscos e a<br />

precipitação econômica oriun<strong>da</strong> <strong>da</strong> crise. Em relação à quali<strong>da</strong>de de serviço, as concessões<br />

iniciais outorga<strong>da</strong>s antes <strong>da</strong> regulação deixaram pouco espaço de manobra para os regula<strong>do</strong>res<br />

aplicarem pressão, através de outros mecanismos que não fossem a imposição de penali<strong>da</strong>des<br />

ou crítica pública. Estas ferramentas, em geral, são de menor valor <strong>do</strong> que as intrínsecas ao<br />

sistema de regulação. Embora as concessões pudessem ter impostas padrões de quali<strong>da</strong>de de<br />

serviço para acompanhar os preços-teto, elas falharam e essa falha foi agrava<strong>da</strong> pelo fato de<br />

que as ferramentas que poderiam ser usa<strong>da</strong>s no custo de regulação de serviço, por exemplo,<br />

baixar a taxa de retorno permiti<strong>da</strong>, ou condicionar o nível de receitas à quali<strong>da</strong>de de serviço,<br />

não estavam disponíveis à ANEEL. Mais importante talvez, os incentivos, ao falharem em<br />

distinguir entre ganhos de produtivi<strong>da</strong>de e mero corte de custos, foram a causa <strong>do</strong><br />

comprometimento <strong>da</strong> quali<strong>da</strong>de <strong>do</strong> serviço em algumas empresas de distribuição. Desta forma,<br />

há motivos suficientes para os consumi<strong>do</strong>res se sentirem prejudica<strong>do</strong>s pelo regime de preço-<br />

teto.<br />

As próprias empresas de distribuição agora estão se sentin<strong>do</strong> injustiça<strong>da</strong>s pela alocação de<br />

riscos no sistema de preço-teto. Elas acreditam que estão sen<strong>do</strong> requisita<strong>da</strong>s a assumir riscos<br />

que não deveriam e não podem suportar. Estes incluem riscos incontroláveis como flutuações<br />

<strong>da</strong> moe<strong>da</strong>. A dificul<strong>da</strong>de de debater essas questões durante o perío<strong>do</strong> de revisão tarifária é tão<br />

frustrante para os distribui<strong>do</strong>res, quanto a de revisar os incentivos para os consumi<strong>do</strong>res, no<br />

caso <strong>da</strong> quali<strong>da</strong>de <strong>do</strong> serviço. O problema não é que um sistema seja mais adequa<strong>do</strong> para li<strong>da</strong>r<br />

com a desvalorização <strong>da</strong> moe<strong>da</strong> <strong>do</strong> que o outro, mas que os regimes de preço-teto e talvez os<br />

de receita máxima também, por sua natureza, tendem a fornecer menos flexibili<strong>da</strong>de para<br />

a<strong>da</strong>ptação a perfis de risco altera<strong>do</strong>s subitamente, <strong>do</strong> que são os sistemas menos foca<strong>do</strong>s em<br />

evitar alterações de tarifas antes <strong>da</strong> conclusão de seu prazo contratual.<br />

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73<br />

Ashley Brown, March 2002<br />

A terceira controvérsia está relaciona<strong>da</strong> a um aspecto <strong>da</strong> precipitação econômica <strong>da</strong> crise<br />

de energia. Como as receitas recebi<strong>da</strong>s pelas empresas de distribuição estão amarra<strong>da</strong>s às<br />

ven<strong>da</strong>s de energia, o racionamento tirou dinheiro diretamente <strong>do</strong>s distribui<strong>do</strong>res. Um sistema<br />

diferente, como o de receita máxima poderia ter cria<strong>do</strong> um equilíbrio melhor entre as ven<strong>da</strong>s e<br />

os serviços de energia, como conservação e eficiência <strong>do</strong> uso final, com incentivos ofereci<strong>do</strong>s<br />

aos distribui<strong>do</strong>res. Caso os distribui<strong>do</strong>res, por exemplo, tivessem a receita máxima, em vez de<br />

preços-teto, determina<strong>da</strong> antes e durante a crise, eles teriam si<strong>do</strong> incentiva<strong>do</strong>s a vender o uso<br />

eficiente de energia e não o mero consumo. Se esse tivesse si<strong>do</strong> o caso, obviamente, a escala <strong>da</strong><br />

crise e seu lega<strong>do</strong> econômico teriam si<strong>do</strong> substancialmente reduzi<strong>do</strong>s.<br />

A questão apresenta<strong>da</strong> não é para sugerir a substituição <strong>da</strong> regulação via preços-teto pelo<br />

custo <strong>do</strong> serviço ou receitas máximas. Isso exige uma análise exaustiva e longa para ser<br />

determina<strong>da</strong>. Essa investigação parece ser apropria<strong>da</strong>. Portanto, é recomendável que:<br />

29. A ANEEL deve promover um debate público sobre a a<strong>do</strong>ção de preços-teto na<br />

regulação <strong>da</strong>s empresas de distribuição, o qual deve focar os prós e contras <strong>do</strong> sistema<br />

existente e os benefícios ou as falhas potenciais de se substituir preços-teto por um<br />

sistema de receita máxima ou custo de serviço.<br />

CONCLUSÃO<br />

O objetivo deste relatório foi focar possíveis melhoras nos aspectos institucionais <strong>da</strong><br />

regulação <strong>do</strong> setor de energia no Brasil. Embora haja problemas enormes a confrontar, as<br />

entrevistas deixaram evidente que há um grande número de pessoas dedica<strong>da</strong>s e inteligentes<br />

empenha<strong>da</strong>s em melhorar o sistema. Espera-se que as recomen<strong>da</strong>ções feitas neste relatório<br />

forneçam alguma assistência nesses esforços.

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