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FESTIVAL INTERNACIONAL DE QUADRINHOS 2005<br />

O INÍCIO DE UM BELO FRENESI<br />

Por Velot Wamba<br />

Escrever sobre o Festival Internacional de Quadrinhos (FIQ) de Belo Horizonte, é uma tarefa que se apresenta<br />

como um desafio, porque não dá pra falar <strong>em</strong> UM evento, e sim <strong>em</strong> diversos eventos aglutinados sobre o mesmo espaço<br />

físico. Se há uma expressão certeira para defini-lo é esta: multiplicidade! Multiplicidade de t<strong>em</strong>as, de propostas, de<br />

público, de expectativas... uma variedade e riqueza que instiga, como todas as boas coisas na vida.<br />

Realizado entre os dias 5 e 9 de Outubro de 2005, novamente no belíssimo espaço cultural conhecido como<br />

<strong>Casa</strong> do Conde, no bairro Floresta, o evento reuniu novamente cerca de 25 mil pessoas segundo dados da organização<br />

- alcançando o mesmo número de visitas da última edição <strong>em</strong> 2003. A arquitetura típica do início do século XX, o amplo<br />

espaço aberto onde os visitantes paravam pra trocar um "cadim" de prosa, beber e comer - mesmo sob um sol terrível,<br />

que não cessou durante todo o evento - e até o barulho de tr<strong>em</strong>, que passa atrás do casarão principal (onde aconteciam<br />

as exposições), dão um charme todo especial ao evento, ressaltando el<strong>em</strong>entos que invariavelmente são associados às<br />

Minas Gerais. A cordialidade e extr<strong>em</strong>o respeito no trato para com o outro dos belo horizontinos, de uma forma geral,<br />

também chamam a atenção. S<strong>em</strong> contar a beleza das mulheres, t<strong>em</strong>a recorrente na conversa nos diversos Clubes do<br />

Bolinhas que espontaneamente se estabeleciam durante o evento. Vale l<strong>em</strong>brar, obviamente <strong>em</strong> tom de ressalva, que<br />

pelo que observei durante o FIQ, sim, quadrinhos ainda é uma arte masculina.<br />

Cheguei ao início da tarde do dia 5, sol cozinhando os miolos, malas pesadas e a impressão não era das<br />

melhores: muitas exposições inacabadas, outras sequer montadas, o estande de compras ainda por montar (ok, meu<br />

orçamento para compras não passava de 15 reais para todo o evento - muito aquém do que se espera de um turista),<br />

pouquíssimo público... n<strong>em</strong> os estandes de alimentação não estavam por lá! Paralelo a isso, já estava ciente que deveria<br />

ficar por ali até as 19 horas, porque seria após este horário que meu anfitrião viria me pegar. Tal qual o lendário Vicente<br />

Matheus, se estava na chuva, era pra se queimar, afinal. Durante a viag<strong>em</strong>, li um pouco do Ratos e Homens do John<br />

Steinbeck e reli os dois últimos volumes da edição nacional do Do Inferno - já que o desenhista Eddie Campbell era um<br />

dos convidados internacionais deste ano. Mal sabia que esse era o prenúncio da última notícia ruim de todo o evento...<br />

Belo Horizonte é uma cidade curiosa. Diz<strong>em</strong> meus amigos de lá, que a cidade fora projetada para se expandir<br />

até os limites da Avenida do Contorno - uma grande via que cerca o que hoje é apenas a região central da cidade. Esse<br />

planejamento do Centro é providencial porque facilita a vida de qu<strong>em</strong> visita a cidade, mesmo se o turista estiver<br />

acostumado ao caos do urbanismo paulistano. É simples: dentro da Avenida do Contorno, há umas 20 grandes avenidas<br />

que se cruzam ou segu<strong>em</strong> paralelas. Tudo <strong>em</strong> linha reta. De onde estava, no alto da Afonso Pena - avenida belíssima<br />

que cruza o centro - andava uns dois quilômetros até a Rua da Bahia; dali descia toda vida até o fim da rua, que acabava<br />

na esquina da <strong>Casa</strong> do Conde. Na volta, só com ônibus mesmo, afinal as ladeiras de Belo Horizonte são um espetáculo<br />

a parte e eu não me preparo para nenhuma maratona no momento. Essa breve - e pobre - descrição urbanística da<br />

cidade me veio à cabeça fatalmente inspirado no conspiracionismo de Alan Moore <strong>em</strong> relação ao urbanismo e<br />

arquitetura de Londres. Falta-me sagacidade e criatividade para enxergar paralelos <strong>em</strong> Belo Horizonte mas... Voilà! Eis o<br />

t<strong>em</strong>a principal do segundo dia no evento!<br />

Eddie Campbell não viria ao evento! A notícia chegou primeiro <strong>em</strong> tom de fofoca, pescada de orelhada. Vou à<br />

sala de imprensa e constato que boatos algumas vezes são fatos. Fiquei mal com aquilo! Havia preparado entrevista<br />

com o desenhista, havia relido o Do Inferno e estava naquele estado de euforia que só boa arte é capaz de causar.<br />

Como eu, muita gente que veio de outras cidades e estados ficou frustrado. E n<strong>em</strong> entendi direito o porquê de sua<br />

ausência. Enfim, eram 11 horas da manhã e finalmente olharia todas as exposições montadas. Maravilha! E confesso:<br />

depois de interrogá-las com meu olhar faminto, dissipou-se a frustração pela ausência do Eddie Campbell.<br />

AS EXPOSIÇÕES<br />

Se para alguns o que importava era poder encontrar variedade de títulos para compras, para outros eram as<br />

mesas-redondas, para outros a mostra de animação, para mim o que interessava era rever amigos e sobretudo, as<br />

exposições.<br />

As duas grandes salas na entrada da <strong>Casa</strong> do Conde são dedicadas ao Atelier des Voges, da França, por onde<br />

já passaram mais de 27 artistas. Os mais famosos são David B, Marjane Sartrapi (Persépolis), Joan Sfar, o Christopher<br />

Blain e o Frédéric Boillet - este, convidado do Festival. Blain e Boilet haviam sidos publicados a pouco pela Conrad<br />

Editora. Todos os trabalhos eram reproduções e estavam devidamente traduzidos. As informações sobre cada autor que<br />

se encontrava na exposição chamavam muito a atenção dos visitantes. Essa nova produção parece ter poucos


eferenciais no venerado quadrinho francês de linha clara e dá uma boa idéia do papel central que a produção francesa<br />

ainda t<strong>em</strong> quando o assunto é nona arte.<br />

No corredor à direita - após a exposição do Atelier des Vosges - há a exposição do Phillipe Squarzoni, que<br />

também estava presente no festival. Autor jov<strong>em</strong> francês é ativista do grupo ATTAC. A exposição é de dois álbuns -<br />

Garduno <strong>em</strong> T<strong>em</strong>pos de Paz e Zapata <strong>em</strong> T<strong>em</strong>pos de Guerra (ambos inéditos no Brasil). A t<strong>em</strong>ática de seus trabalhos<br />

segue uma linha parecida com a de um Joe Sacco só que mais militante, mais engajada e menos jornalística. O trabalho<br />

s<strong>em</strong>pre <strong>em</strong> preto e branco, por outro lado, não é devedor da estética dos quadrinhos underground estadunidense. Ao<br />

mesmo passo que era possível encontrar paralelos com trabalhos do Atelier de Vosges, era visível uma certa ligação<br />

com o trabalho da nova geração de artistas/ativistas estadunidenses, como Seth Tobocman, Eric Drooker e Peter Kuper,<br />

ainda que o desenho seja s<strong>em</strong>pre mais limpo e icônico que o destes três.<br />

Depois da exposição de Squarzoni, havia uma sala dedicada à revista Grafitti, uma das melhores publicações<br />

de quadrinhos autorais no Brasil, dedicada ao quadrinho mineiro. Na sua primeira fase havia <strong>texto</strong>s sobre cin<strong>em</strong>a, HQs,<br />

entrevistas com músicos malditos como Itamar Assumpção e Tom Zé, por ex<strong>em</strong>plo, e mais recent<strong>em</strong>ente, voltada aos<br />

quadrinhos e ilustração. A exposição mostrava a evolução da revista ano a ano e alguns trabalhos coloridos e originais<br />

de artistas como Piero Bagnariol, Luciano Irrthum - que faz um trabalho excelente com xilogravura e é pouco conhecido<br />

fora de Minas Gerais. A maioria dos trabalhos expostos eram reproduções. Havia uma parede onde todas as revistas<br />

estavam penduradas para ser folheadas pelo público. Havia um esmero na montag<strong>em</strong> da exposição que a tornava<br />

verdadeiramente muito atraente ao público.<br />

No corredor a esquerda da expo do Atelier Des Vosges, havia a exposição Dom Quixote - não anunciada<br />

previamente pela organização. Eram adaptações de duas páginas de trechos do Dom Quixote de Miguel de Cervantes,<br />

com trabalhos de Carlos Nine, Luiz Duran, Miguelanxo Prado entre outros.<br />

Na sala adjunta ao corredor dos trabalhos baseados <strong>em</strong> Dom Quixote, havia a exposição Quadrinhos na<br />

Imprensa de Minas: uma panorâmica dos quadrinistas mineiros que v<strong>em</strong> publicando nos jornais de Minas Gerais. Havia<br />

trabalhos do João Marcos (Mendelévio), da Chantal (curadora desta expo também), do Lor - um dos mais velhos por ali,<br />

do Ari Moraes (caricaturas), do São Salvador (colorido e s<strong>em</strong> balões), do Nani, do Melado (trechos de HQ <strong>em</strong> p & b),<br />

Neusinha Santos (tiras infantis), Ed da Silva (revista MAD), do Marcelo Lelis entre outros. Dá a impressão que os<br />

quadrinistas de Minas dispõ<strong>em</strong> de um bom espaço na imprensa regional, o que por si só é muito significativo.<br />

Na última sala a esquerda no primeiro piso, estava a exposição do Gary Panter - um dos convidados<br />

estrangeiros desta edição do FIQ. Ilustrador, pintor e músico estadunidense. Ficou famoso nas HQs pelo personag<strong>em</strong><br />

punk Jimbo, ganhou três prêmios Emmy pelos cenários que realizou para um programa de TV, chamado Pee Wee's<br />

Playhouse. Muito influente para além das HQs, é mundialmente reconhecido como o artista gráfico mais influente de sua<br />

geração. Muito antes da ascensão da cultura pop japonesa no Ocidente, já utilizava s<strong>em</strong> grandes diferenciações, cultura<br />

erudita e cultura pop, de forma b<strong>em</strong> peculiar, s<strong>em</strong> distinção de valores. No FIQ, há 26 pranchas de HQs recentes - uma<br />

de 2002 e outra de 2003. Todos originais. É, obviamente, um recorte mais voltado às HQs. Ainda que raramente<br />

publicado no Brasil, dá pra sacar que o trabalho multifacetado de Gary Panter é pra lá de influente nas HQs underground<br />

brasileiras - sobretudo a partir da década de 1990. Fiz uma ótima entrevista com ele, que estranhamente, não interessou<br />

a nenhum órgão de imprensa daqui. Vai entender...<br />

No segundo piso, o salão maior era dedicado ao Lourenço Mutarelli - grande homenageado desta edição e<br />

autor do cartaz do FIQ. Mutarelli é o mais famoso quadrinista autoral brasileiro na atualidade, e v<strong>em</strong> abandonando<br />

gradativamente as HQs e dedicando-se a literatura e ao teatro. A exposição chamava-se Auto-retrato Mutarelli, com<br />

curadoria e um <strong>texto</strong> de apresentação muito interessante da Lucimar Mutarelli sobre o trabalho do Mutarelli. Havia mais<br />

de 40 pranchas de originais, coloridas e p&b, s<strong>em</strong>pre seguindo a sugestão da t<strong>em</strong>ática proposta. O que chamava muito<br />

a atenção eram os quadros de página inteira - realmente muito detalhistas - realizados numa prancha pouco maior do<br />

que a própria página onde seria publicada. No exterior - via de regra - os desenhistas usam pranchas b<strong>em</strong> maiores do<br />

que a medida do resultado final. Esse detalhismo tão condensado impressionava aos visitantes, sobretudo aos que se<br />

dedicam à ilustração. O trabalho colorido costuma ter um traço muito parecido com o do trabalho p&b, mas mais simples.<br />

Homenag<strong>em</strong> pra lá de merecida, devidamente aclamada pelo público visitante.<br />

Após a expo do Mutarelli - à direita - havia a exibição de um filme chamado Cidades Ilustradas, com as<br />

imagens da série de álbuns homônimas publicadas pela <strong>Casa</strong> <strong>21</strong>. Trabalhos de Prado (Belo Horizonte), Jano (Rio de<br />

Janeiro), Gaú (Salvador), César Lobo (Curitiba), Lelis (Cidades do Ouro). S<strong>em</strong>pre muito visitada, foi um dos destaques<br />

para o público e destacou a importância destes trabalhos pioneiros, que colocam o trabalho de artistas tão importantes<br />

ao alcance de pessoas comumente não interessadas <strong>em</strong> quadrinhos - ainda assim, s<strong>em</strong> diminuir a pujança dos trabalhos<br />

ao colocá-lo <strong>em</strong> outra perspectiva.<br />

Na última sala à direita, havia a exposição chamada Ilustradores do Brasil, organizada pela Sociedade dos<br />

Ilustradores do Brasil. Se o quadrinho autoral brasileiro ainda não alcançou o nível de excelência e respeitabilidade de<br />

seus primos franceses, por ex<strong>em</strong>plo, o mesmo não pode ser dito da ilustração. Com trabalhos de desenhista mais


jovens, sobretudo, a expo dava a exata medida da qualidade da ilustração nacional. Fábio Zimbres, Eloar Guazzelli,<br />

Fábio Moon, Gabriel Bá, Marcelo Lelis, Ivan Zigg, o Newton Foot (rendendo homenag<strong>em</strong> ao Dennis Hopper), Daniel<br />

Bueno, Jô Oliveira, Renato Alarcão, eram alguns dos muitos nomes nesta exposição.<br />

Nesta mesma sala, havia trabalhos de diversos desenhistas da série Mágico Vento - um dos diversos títulos da<br />

linha de quadrinhos da Bonelli Editora - publicados aqui pela Mythos Editora. O autor da série, Gianfranco Manfredi foi<br />

um dos convidados do FIQ - que ministrou também um concorrido workshop de roteiros. Nomes como Pasquale<br />

Frisenda, José Ortiz e Ivo Milazzo contam entre os desenhistas presentes no espaço. Deleite para os poucos porém,<br />

ardorosos fãs da série e para o público <strong>em</strong> geral, que pôde tomar contato com a estética do s<strong>em</strong>pre ativo fumetti<br />

comercial italiano.<br />

Na primeira sala a esquerda da expo do Mutarelli, havia uma parte da Gibiteca de Belo Horizonte, uma das<br />

salas mais concorridas pelo público mais jov<strong>em</strong>, porque havia revistas que podiam ser folheadas, além de raridades <strong>em</strong><br />

exposição. O curioso que a Gibiteca começou com uma doação do Sr. Antônio Roque Gobbo (um dos homenageados<br />

do FIQ) de mais de 15 mil títulos - muitos deles verdadeiras raridades. O Tico-Tico, O Amigo da Onça, Kripta, e até a<br />

curiosa revista Dona Beija, contavam entre os itens raros expostos.<br />

Na sala logo após a da gibiteca, havia a exposição de trabalhos do Nelson Cruz. Ilustrações coloridas para uma<br />

adaptação infantil da obra Moby Dick, de Hermann Melville. Ao lado de cada resultado final (as pranchas coloridas),<br />

havia os esboços - o que dá uma visão b<strong>em</strong> interessante do processo do ilustrador, da pesquisa iconográfica etc. e<br />

permitia ao visitante conhecer um pouco mais do nada fácil trabalho do artista. Havia uma mesa com alguns esboços de<br />

pesquisa para o trabalho. A grande surpresa para mim de toda a exposição.<br />

Uma sala intitulada Novos Autores era o que se via após o trabalho de Nelson Cruz. Não havia informações<br />

sobre os jovens artistas e n<strong>em</strong> dava pra entender o porquê daquela exposição ali, já que os trabalhos eram muito<br />

amadores, normalmente decalque de mangás e quadrinhos da Marvel e DC.<br />

Na última sala à esquerda no segundo piso - a exposição do Andrea Pazienza - um dos maiores nomes dos<br />

quadrinhos italianos dos útimos 40 anos, que morreu ainda jov<strong>em</strong> <strong>em</strong> 1988. Sobretudo originais, havia também duas<br />

histórias autobiográficas de sua viag<strong>em</strong> pelo Brasil, <strong>em</strong> 1987 - devidamente traduzidas. Originais da Extraordinária<br />

Aventura de Penthotal - um trabalho narrando a vida de Penthotal (seu alter ego) no meio da agitação política na<br />

Universidade de Bolonha <strong>em</strong> 1977. Ficou muito conhecido no Brasil pelas histórias do Zanardi e seus amigos -<br />

publicadas na já lendária Animal, no Brasil. Havia trabalhos coloridos e p&b que dimensionavam o trabalho inovador de<br />

Pazienza e fotos de sua viag<strong>em</strong> pelo Brasil <strong>em</strong> 1987. Um destaque na sua exposição é a exibição de duas animações<br />

com desenhos do Pazienza (uma foi animada recent<strong>em</strong>ente, a outra - mais rústica - na época) e um vídeo que mostra<br />

Pazienza desenhando com um pincel preto uma parede <strong>em</strong> Nápoles, <strong>em</strong> 1988. O desenho retratava uma cena de guerra<br />

(t<strong>em</strong>a de seus últimos trabalhos), onde leão, cavalo e homens se misturam. Pazienza v<strong>em</strong> de uma geração fantástica de<br />

autores como, Tamburini, Liberatore, Scozzari dentre outros. Marina Comandini, viúva de Pazienza presente no FIQ,<br />

havia me dito sobre a grande influência de Pazienza nas novas gerações. Folheio agora uma ComicArt italiana de janeiro<br />

de 1990 e é impossível não enxergar seu peso na obra de um Saichann ou O'Kif e sobretudo, de um Peiró, por ex<strong>em</strong>plo.<br />

Um grande probl<strong>em</strong>a na divulgação do trabalho do Pazienza <strong>em</strong> todo o mundo é a sua linguag<strong>em</strong> um tanto hermética -<br />

já que abusava de dialetos italianos e reconfigurava essa mesma linguag<strong>em</strong>, criando uma nova dicção - muito pertinente<br />

dada à originalidade de seu universo t<strong>em</strong>ático. Qu<strong>em</strong> viu, com certeza não se esquecerá dessa exposição tão cedo!<br />

OUTROS QUETAIS<br />

A mostra de animação s<strong>em</strong>pre movimentava uma pequena legião de pessoas todas as noites. Eu vi umas 3<br />

animações no máximo, então não posso opinar muito. O que dá para se dizer é que essa inserção na programação é pra<br />

lá de positiva, até porque reforça a importância dos quadrinhos <strong>em</strong> outras mídias. A animadora estadunidense esteve<br />

presente no evento e pude ver uma de suas animações, chamada The Witch and the Cow, que me chamou muita<br />

atenção. Na realidade, fiquei com a sensação que havia perdido muito não atentando a essa parte do Festival.<br />

As oficinas são um grande trunfo do evento, isso é certo! As oficinas chamadas Iniciação aos quadrinhos,<br />

realizada por professores da escola <strong>Casa</strong> dos Quadrinhos atraiam muitas crianças e era comum ver pais trazendo<br />

exclusivamente seus filhos para participar destas oficinas. Das outras oficinas (foram 6 ao todo) muito comentada e<br />

concorrida fora a de Manfredi - inclusive, o próprio Mutarelli participou.<br />

As Mesas redondas e o Encontro Com os Criadores foram destaques desta edição também! Fui pra cadeira<br />

cativa <strong>em</strong> grande parte destas, e não me arrependi nenhuma vez. A mesa Políticas Editorias de Quadrinhos me chamou<br />

a atenção por vários motivos, sobretudo por sentir o quão alienado é o público com as nuances que mov<strong>em</strong> o "lado de<br />

lá" das histórias <strong>em</strong> quadrinhos. Providencial esta mesa, que deveria se repetir <strong>em</strong> todas as edições. A mesa dedicada<br />

ao Mutarelli foi a mais concorrida de todo o evento e arrancaram gargalhadas e aplausos entusiasmados por parte da<br />

audiência. A técnica de resolução de nós criativos do Mutarelli causou espécie, mas não é possível descrevê-la neste<br />

espaço. A mesa redonda do Humor engraçado foi, por falta de palavra melhor... engraçada! A presença entre o público


do Matias Maxx - editor da Tarja Preta e exatamente por isso, figura central do tal humor engraçado - foi um verdadeiro<br />

happening etílico. De certo mesmo, como evidenciou a fala de um Arnaldo Branco ou de um Ed da Silva, é que há uma<br />

crescente e fantástica produção humorística que não encontra espaço nos Salões de Humor Brasileiros.<br />

A maior crítica por parte dos visitantes se dava para o ínfimo espaço dedicado ao comércio, já que apenas a<br />

livraria Leitura comercializava álbuns e revistas. E pela conversa que tive com Marcio Jr, 25 anos, coordenador do<br />

estande da Leitura, o evento é muito rentável sim senhor. Por outro lado, esse esmero e requinte na escolha das<br />

exposições do Festival, acompanham um público pra lá de conservador. Veja o que o público consome, neste trecho da<br />

entrevista:<br />

O que t<strong>em</strong> vendido muito aqui no Festival?<br />

Os encadernados do Sandman, os gibis da Panini, Batman, X-Men, Hom<strong>em</strong>-Aranha. Mangá como está pela<br />

metade do preço vende b<strong>em</strong> também.<br />

E de Quadrinho adulto, além de Sandman?<br />

Sin City, Hellblazer e o Watchmen encadernado.<br />

Os autores estrangeiros gostam muito do evento: diz<strong>em</strong> não deixar a desejar <strong>em</strong> relação aos festivais do<br />

primeiro mundo e gostam, sobretudo, desse caráter mais descontraído, mais informal, onde as pessoas conversam<br />

tranqüilamente com os autores, onde o assédio não é muito pesado. E esse é exatamente um dos trunfos do evento:<br />

esse espaço privilegiado de troca de figurinhas é fantástico!<br />

A cada edição do evento, fica-se a impressão de incomunicabilidade deste meio, algo pra mim fundamental.<br />

Essa falta de diálogo, de crítica, <strong>em</strong>perra o avanço da nona arte. Veja o perfil do consumidor de quadrinhos exposto<br />

acima e entenderá o que digo. É fato: <strong>em</strong> todas as artes, os seus períodos de maior efervescência vêm acompanhados<br />

de grande diálogo e de grandes críticos. O público, seja o especializado ou o leigo, deixa a entender nas entrelinhas, que<br />

uma publicação de fôlego e alcance nacional, seria pra lá de b<strong>em</strong>-vinda. Uma publicação que abraçasse a produção<br />

nacional e estrangeira e desse espaço a crítica descomprometida, não ditada pelo mercado ou interesses editoriais.<br />

Pra encerrar, queria l<strong>em</strong>brar o povo da revista Quase, de Vitória, que alugaram um estande, divulgaram seu<br />

trabalho e venderam revistas e camisetas o suficiente para cobrir os custos da viag<strong>em</strong> de toda a trupe, e ainda<br />

reafirmaram laços com muita gente do meio. E aprontaram muito! Seu método um tanto quanto agressivo de vendas<br />

(eles jogavam as revistas <strong>em</strong> qu<strong>em</strong> passava pelo estande) e um garoto de 10 anos que eles "adotaram" (o garoto vendia<br />

suas caricaturas para as pessoas e fazia desenhos que a galera expôs no próprio estande) invariavelmente chamava a<br />

atenção do público. Prova de que corag<strong>em</strong> e cara de pau são pra lá de necessárias neste meio (<strong>veja</strong> a matéria sobre<br />

quadrinhos e mercado de trabalho). Prova também, é o depoimento de um dos responsáveis pela revista, a respeito do<br />

ótimo público mineiro:<br />

"Pôxa, só t<strong>em</strong>os que agradecer aos mineiros. Se aprontáss<strong>em</strong>os o que fiz<strong>em</strong>os aqui <strong>em</strong> Vitória, iriam nos xingar,<br />

<strong>em</strong> São Paulo nos bater e no Rio (de Janeiro) iriam nos matar. Tão de parabéns mesmo..."<br />

Enfim, não precisa dizer que este é o melhor evento de quadrinhos do país e que <strong>em</strong> 2007 irei bater ponto por lá<br />

também né? Keppin on truckin, man!

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