Do Feminismo a Judith Butler - Miguel Vale de Almeida
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produz as i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s e <strong>de</strong>sejos inadmissíveis que reprime, <strong>de</strong> modo a estabelecer e<br />
manter a estabilida<strong>de</strong> das i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> género e sexo aceitáveis – no que é um uso<br />
da crítica da hipótese repressiva feita por Foucault. A Lei que proibe uniões<br />
incestuosas ou homossexuais simultaneamente inventa-as e convida-as. A<br />
heterossexualida<strong>de</strong> requer a homossexualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> forma a po<strong>de</strong>r <strong>de</strong>finir-se e a manter<br />
a sua estabilida<strong>de</strong>.<br />
Vejamos agora a questão da performativida<strong>de</strong>. <strong>Butler</strong>, como vimos, colapsou a<br />
distinção sexo-género <strong>de</strong> modo a argumentar que não há sexo que não seja <strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo<br />
e sempre género, não havendo corpo natural pré-existente à sua inscrição cultural. O<br />
género não é algo que se é, mas algo que se faz, um acto ou, melhor, uma sequência<br />
<strong>de</strong> actos, um verbo e não um substantivo. Eis uma famosa passagem: “o género é a<br />
estilização repetida do corpo, um conjunto <strong>de</strong> actos repetidos <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma moldura<br />
reguladora rígida, que congelam ao longo do tempo <strong>de</strong> modo a produzirem a<br />
aparência <strong>de</strong> substância, <strong>de</strong> um ser natural.” Isto mostra que ela não sugere que o<br />
sujeito seja livre <strong>de</strong> escolher o género que quer colocar em acto.<br />
É aliás por isso que é importante a distinção entre performance e performativida<strong>de</strong>. A<br />
performance necessita <strong>de</strong> um sujeito pré-existente, a performativida<strong>de</strong> questiona a<br />
própria noção <strong>de</strong> sujeito. Ela explicitamente liga a sua noção <strong>de</strong> performativida<strong>de</strong> à<br />
teoria <strong>de</strong> Austin em How to do things with words e à <strong>de</strong>sconstrução <strong>de</strong>ssa teoria feita<br />
por Derrida no ensaio “Signature Evenement Contexte”.<br />
Mas se há vinheta pela qual <strong>Butler</strong> ficou famosa é a que utiliza a imagem do drag em<br />
geral e da drag queen em particular. Todo o género é uma forma <strong>de</strong> paródia, mas<br />
algumas performances <strong>de</strong> género são mais paródicas que outras. Performances<br />
paródicas como o drag revelam eficazmente a natureza imitativa <strong>de</strong> todas as<br />
i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> género, não presupondo um original já que é a própria noção <strong>de</strong><br />
original que está a ser parodiada. É claro que o problema está em que a subversão e a<br />
agência estão condicionadas por discursos a que não po<strong>de</strong>m escapar. Há, <strong>de</strong> facto,<br />
formas <strong>de</strong> drag que não são subversivas, por ex., Tootsie ou Mrs <strong>Do</strong>ubtfire, pois<br />
servem para reforçar as estruturas <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r. Mas a subversão po<strong>de</strong> existir. Não se<br />
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