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Necessidade/Escassez e Síndrome do Pânico - Núcleo Castor ...

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Congresso Psicologia Ciência e Profissão<br />

São Paulo, 05 a 09 de setembro 2006.<br />

Caso: <strong>Necessidade</strong>/<strong>Escassez</strong> e <strong>Síndrome</strong> <strong>do</strong> <strong>Pânico</strong><br />

Psicóloga: Ana Cláudia de Souza – CRP 12/01567<br />

O caso que será apresenta<strong>do</strong>, está em execução, sen<strong>do</strong> realiza<strong>do</strong> em termos interdisciplinares<br />

pelos profissionais: psicólogas Lara Beatriz Fuck, CRP 12/01342, Luciana Cascaes, CRP 12/01361; os<br />

médicos Dr. Paulo Bittencourt, Dr. Evandro Russo, Dr. Carlos Garcia, e o filósofo Pedro Bertolino,<br />

sen<strong>do</strong> eu, Ana Cláudia de Souza, CRP 12/01567, psicóloga titular <strong>do</strong> caso.<br />

Os elementos que permitissem a identificação da paciente ou de sua família foram suprimi<strong>do</strong>s,<br />

sem prejuízo para a ancoragem empírico-científica das ocorrências. E a paciente assinou autorização<br />

para a comunicação deste caso, nos termos em que está aqui exposto, encontran<strong>do</strong>-se tal <strong>do</strong>cumento<br />

com registro em cartório em poder da psicóloga responsável.<br />

1 - O Clima Antropológico:<br />

1) A paciente quan<strong>do</strong> chegou a terapia, tinha 34 anos, era casada há 15 anos, tinha 2 filhas de 8 e<br />

15 anos, haven<strong>do</strong> casa<strong>do</strong> grávida da primeira filha. Iniciou graduação e não concluiu. Trabalhou<br />

em algumas empresas, e há 7 anos tinha uma empresa de prestação de serviços por cuja<br />

administração respondia; enquanto que o mari<strong>do</strong> administrava outra empresa <strong>do</strong> casal em<br />

sociedade com os irmãos dele. Saiu da casa <strong>do</strong>s pais aos 16 anos, para fazer cursinho noutra<br />

cidade, junto com a irmã. Entrou na universidade, in<strong>do</strong> morar com amigas. Nesse momento os<br />

pais brigavam muito. O apartamento deles estava hipoteca<strong>do</strong>, haviam perdi<strong>do</strong> carros. Ficaram<br />

apenas com um apartamento duplex em que moravam e um ponto comercial, aonde os pais<br />

montaram uma padaria por iniciativa da mãe. Conheceu o mari<strong>do</strong> numa festa, aos seus 17 anos.<br />

Começaram a namorar e ambos entraram para a universidade em cursos diferentes. No começo<br />

<strong>do</strong> namoro foi tu<strong>do</strong> muito bom, com 1 mês de namoro ele conheceu os pais dela. A sogra da<br />

paciente não apoiava o namoro por achar o filho jovem. A família dele tinha uma empresa e<br />

residência na cidade aonde a paciente estava estudan<strong>do</strong>.<br />

2) No primeiro ano de namoro começaram as inseguranças da paciente, pois o mari<strong>do</strong> era<br />

paquera<strong>do</strong>r. Brigavam bastante e terminaram algumas vezes. Após um ano e meio de namoro o<br />

atual mari<strong>do</strong> voltou a terminar dizen<strong>do</strong> ser ce<strong>do</strong> para compromisso tão sério. Continuaram se<br />

ven<strong>do</strong> e meses depois ele anunciou viagem ao exterior, seria a forma de esquecê-la. Neste<br />

perío<strong>do</strong> soube estar grávida, e desesperou-se com a decepção que provocaria nos pais, passan<strong>do</strong><br />

10 dias sem conseguir <strong>do</strong>rmir direito. Achou que o atual mari<strong>do</strong> fosse reverter sua posição de<br />

viajar, mas ele ficou bem confuso, sugeriu aborto e quan<strong>do</strong> ela se negou, ele tomou a posição de<br />

assumir o filho. Foram contar aos pais dela e o atual mari<strong>do</strong> informou que assumiria a<br />

paternidade, mas que estava de viagem marcada e apenas na volta decidiria se casariam.<br />

3) A paciente voltou para a cidade onde estudava e tentou aproximar-se da sogra, que se manteve<br />

arredia. Na data prevista para retorno de viagem, faltan<strong>do</strong> 4 meses para o nascimento <strong>do</strong> bebê, o<br />

atual mari<strong>do</strong> escreveu dizen<strong>do</strong> que ficaria mais tempo. Ela se desesperou e chorava<br />

compulsivamente to<strong>do</strong>s os dias, já estava financeiramente apertada, sem apoio <strong>do</strong>s pais, estava<br />

numa gravidez de risco, mas não parou de trabalhar por me<strong>do</strong> de ficar sem dinheiro. As amigas<br />

da paciente contaram para a mãe dela o que estava acontecen<strong>do</strong>, e foi quan<strong>do</strong> a mãe se reaproximou<br />

e veio cuidá-la.<br />

4) O mari<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> voltou de viagem estava infeliz, e a sogra fazia comentários mal<strong>do</strong>sos<br />

relacionan<strong>do</strong> a tristeza <strong>do</strong> filho a relação com a namorada, atual esposa.<br />

5) A filha nasceu prematura, deixan<strong>do</strong> a paciente em pânico de perdê-la. A mãe da paciente ficou<br />

cuidan<strong>do</strong> delas em casa, e a sogra levou 3 meses para visitar a neta. Após o nascimento da filha,<br />

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ela e seu atual mari<strong>do</strong>, passaram a morar juntos, mas ele saia muito e não dava atenção ou<br />

assistência à paciente e a filha. Numa ocasião ela descobriu uma traição e man<strong>do</strong>u-o embora,<br />

garantin<strong>do</strong> que ele poderia ver a filha sempre que quisesse. Depois de 3 dias <strong>do</strong> ocorri<strong>do</strong> ele<br />

voltou a procurá-la muito abati<strong>do</strong>, dizen<strong>do</strong> que queria ficar com ela e a filha e que estava<br />

disposto a mudar. A partir daí o casamento deles foi efetivamente diferente, ele passou a sair<br />

menos, e a reservar os finais de semana para a família, e posteriormente decidiram-se por outra<br />

filha. Casaram no civil há apenas 3 anos atrás por ocasião da comunhão de uma das filhas. Após<br />

o nascimento da primeira filha, a paciente voltou a trabalhar e não parou exceto nos meses de<br />

resguar<strong>do</strong> da segunda filha há 8 anos atrás.<br />

6) Há 7 anos atrás, a paciente saiu da empresa em que trabalhava e o mari<strong>do</strong> sugeriu montarem um<br />

negócio para que ela administrasse. Os familiares <strong>do</strong> mari<strong>do</strong> não foram a favor, mais ele deu<br />

prosseguimento e não se opuseram. A empresa foi se estruturan<strong>do</strong> e crescen<strong>do</strong>, e há cerca de 3<br />

anos adquiriu proporções maiores <strong>do</strong> que a administração que faziam comportava. Diante <strong>do</strong><br />

sucesso e crescimento da empresa a paciente começou a assustar-se com não dar conta e falir.<br />

Foi desde então que seus acessos de pânico se acentuaram. Desde que a empresa foi fundada, o<br />

mari<strong>do</strong> contribuía na administração. E também ficava a frente da administração <strong>do</strong> outro<br />

negócio que tinham em sociedade com os irmãos dele. Em 2005 quan<strong>do</strong> as dificuldades<br />

administrativas da empresa se acentuaram, e a condição emocional da paciente diminuiu, o<br />

mari<strong>do</strong> assumiu mais a dianteira da empresa deles, que antes ficava no cotidiano ao coman<strong>do</strong> da<br />

paciente.<br />

7) Quanto a relação familiar, o mari<strong>do</strong> é um pai presente, atencioso e carinhoso com a esposa e<br />

com as filhas, e ela <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong>. Fazem programas em família e com outras famílias de<br />

amigos. Fazem planos para o futuro, principalmente ele, que está sempre pensan<strong>do</strong> num bom<br />

negócio que traga mais conforto e boas condições de vida para a família.<br />

8) A sogra da paciente não apoiou o namoro deles, nem a gravidez e o casamento. Porém,<br />

atualmente faz visitas, tratan<strong>do</strong>-a com consideração, elogian<strong>do</strong>-a para parentes por ser<br />

cuida<strong>do</strong>sa com a família. A sogra trabalhava junto com os filhos nos negócios que o mari<strong>do</strong><br />

havia deixa<strong>do</strong>, após o falecimento prematuro, deixan<strong>do</strong> os filhos pequenos. Os irmãos da sogra<br />

a apoiaram no encaminhamento <strong>do</strong>s negócios após a viuvez. Desde pequeno o mari<strong>do</strong> da<br />

paciente e seus irmãos ajudaram a mãe nos negócios, o que os unificou muito.<br />

9) O pai da paciente veio de família muito humilde, era o filho mais velho, seu pai, avô da<br />

paciente, era alcoólatra, sem emprego fixo, e viviam numa escassez muito grande. Quan<strong>do</strong><br />

chegava bêba<strong>do</strong> maltratava ao pai da paciente. A avó da paciente cobrava muito <strong>do</strong> mari<strong>do</strong><br />

condição material, em brigas constantes. O pai da paciente não se relacionava bem com o pai e<br />

nem com a mãe dele, a quem chamava de materialista e relaxada, embora admitisse ser<br />

batalha<strong>do</strong>ra. O pai da paciente contava que saiu de casa por não agüentar a vida na família de<br />

origem. Começou a melhorar de vida quan<strong>do</strong> a<strong>do</strong>lescente, trabalhan<strong>do</strong> como operário, depois<br />

técnico, com apoio e incentivo de um patrão, que também aju<strong>do</strong>u-o na compra da primeira casa<br />

quan<strong>do</strong> a mãe da paciente engravi<strong>do</strong>u e eles casaram, ela com 20 anos e ele com 19 anos.<br />

10) Os avós paternos da paciente, quan<strong>do</strong> o pai desta era jovem, moravam em cidade vizinha, eram<br />

pessoas humildes mesmo com o bisavô ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong> coronel <strong>do</strong> exército.<br />

11) O pai da paciente sempre aju<strong>do</strong>u a família dele financeiramente. Aos 3 anos da paciente o avô<br />

paterno tentou suicídio com um tiro na cabeça por necessidade-escassez. O casal de pais dela<br />

foi ajudar aos pais dele, avôs paternos da paciente. Nesta viagem, antes de chegarem ao destino,<br />

os pais da paciente sofreram um acidente.<br />

12) Dentro <strong>do</strong> casamento o pai da paciente ascendeu financeiramente, o que fez a relação com os<br />

familiares da esposa melhorar, sem deixar de ser distante.<br />

13) O pai da paciente foi grande empresário. Mas por volta <strong>do</strong>s 14,15 anos da paciente faliu.<br />

Receberam muitas visitas de oficiais de justiça e cobra<strong>do</strong>res, que recolheram seus bens. O pai<br />

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desesperava-se, mas não conseguiu se re-erguer e abriu mão <strong>do</strong> negócio. Ficou com dívidas<br />

corren<strong>do</strong> na justiça, que sal<strong>do</strong>u anos depois. Teve imóveis hipoteca<strong>do</strong>s, e não perderam a casa<br />

aonde moravam porque não estava no nome <strong>do</strong> pai. Hoje possui um pequeno comércio com a<br />

mãe da paciente, que foi funcionária pública e aposentou-se. A mãe da paciente chorava e<br />

criticava muito o mari<strong>do</strong>, dizia que se ele tivesse ao menos pago o INSS teriam condição<br />

melhor, e que ficaria tu<strong>do</strong> dependen<strong>do</strong> da aposenta<strong>do</strong>ria dela. A mãe passou a fazer pães para<br />

vender, o pai passou a ajudar e abriram uma padaria, porém a mãe jamais conformou-se com<br />

não ter a velhice tranqüila que pensara. O pai da paciente, depois que faliu, não saiu mais de<br />

casa, os amigos se afastaram, e ele passou a ter problemas emocionais, vin<strong>do</strong> posteriormente a<br />

usar medicação e consultar psiquiatras. A mãe e as irmãs também fizeram tratamentos e uso de<br />

medicação.<br />

14) Quan<strong>do</strong> a paciente engravi<strong>do</strong>u, seus pais ficaram muito chatea<strong>do</strong>s com ela, a mãe ficou sem<br />

dirigir-lhe a palavra por um mês, dizen<strong>do</strong> que a filha tinha joga<strong>do</strong> a vida fora. A paciente<br />

chorava muito e por um momento pensou em aborto. Hoje vivem sozinhos, na mesma cidade<br />

em que vive uma das irmãs da paciente que se esta separan<strong>do</strong>. A outra irmã vive na mesma<br />

cidade que a paciente, separou-se e retornou para o casamento. Até hoje brigam muito. O pai<br />

queixa-se de não ter companheira, é muito irrita<strong>do</strong>, se trata com psiquiatra e faz uso de<br />

medicação, e já falou em suicídio.<br />

15) A mãe da paciente sai para jogar com amigas, e queixa-se <strong>do</strong> mari<strong>do</strong> não ser companheiro para<br />

passeios, jogar dinheiro fora, etc., sempre ressentida por terem fali<strong>do</strong>, dizen<strong>do</strong>-se<br />

sobrecarregada.<br />

16) Os familiares da mãe da paciente são <strong>do</strong> interior <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> e tem comércio desde a infância da<br />

mãe da paciente; ten<strong>do</strong> uma condição financeira muito melhor <strong>do</strong> que a da família paterna. Os<br />

avós maternos não foram a favor <strong>do</strong> casamento da mãe da paciente, a avó chorou durante o<br />

casamento inteiro, e o avô perguntou ao pai da paciente se poderia dar a filha dele as condições<br />

que ela tinha em casa. A mãe da paciente era professora, funcionária pública, e o pai da<br />

paciente, na época era operário.<br />

2 - Situação Psicopatológica: Complicações Psicológicas<br />

A paciente vinha sofren<strong>do</strong> afetações emocionais em episódios, regulares ou freqüentes como este:<br />

1) Numa segunda-feira de fevereiro de 2005 acor<strong>do</strong>u ansiosa com uma reunião que teria naquela<br />

manhã, suspeitava que o cliente fosse desistir de trabalhar com ela. Tentou levar na reunião sua<br />

gerente ou o mari<strong>do</strong> e como não poderiam, foi sozinha. No caminho estava muito ansiosa, com<br />

pressão na cabeça, taquicardia, pernas moles, tremen<strong>do</strong> o corpo to<strong>do</strong>, estan<strong>do</strong> difícil<br />

dirigir. Chegou na reunião e conversou com os clientes, estava muito tremula, com su<strong>do</strong>rese<br />

no corpo to<strong>do</strong>. No decorrer da conversa se acalmou um pouco, mas os clientes colocaram que<br />

tentariam trabalhar com outra empresa. Neste momento teve nó na garganta e aumentou a<br />

tremedeira. Saiu da reunião e entrou no seu carro choran<strong>do</strong>, sem energia, muito frustrada,<br />

experimentan<strong>do</strong>-se a responsável pelos problemas na sua empresa, pois andava sem condição<br />

emocional. Estava na certeza de que perderia to<strong>do</strong>s os clientes e sua vida desmoronaria. Voltou<br />

para sua empresa choran<strong>do</strong>, e contou o resulta<strong>do</strong> da reunião ao mari<strong>do</strong> e a gerente que ficaram<br />

chatea<strong>do</strong>s, mas o mari<strong>do</strong> conversou dizen<strong>do</strong> que iriam atrás de outros clientes. A paciente<br />

trabalhou mais um pouco, mais não conseguia se concentrar e foi para casa em frustração,<br />

permanecen<strong>do</strong> assim por alguns dias.<br />

2) Num dia de agosto de 2005 a paciente estava ven<strong>do</strong> TV em casa com as filhas e o mari<strong>do</strong>. A<br />

filha menor veio para a sala com o leite e o cereal. Man<strong>do</strong>u a filha para a cozinha várias vezes<br />

sem ser atendida e foi irritan<strong>do</strong>-se, entran<strong>do</strong> num acesso de pânico, na experimentação de ser<br />

mãe de uma filha desobediente, e que daria erra<strong>do</strong> na vida. Não conseguiu se conter, alterou a<br />

voz e deu uns tapas na filha, irritada com a filha e com o mari<strong>do</strong> por não ter levanta<strong>do</strong>-se <strong>do</strong><br />

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sofá. Passou esta noite em claro, com remorso e me<strong>do</strong> que a filha a odiasse, e viesse a querer<br />

sair de casa para se livrar dela.<br />

3) Num dia de fevereiro de 2005, a paciente chegou na empresa 18:00h e viu uma funcionaria<br />

entran<strong>do</strong> no carro antes <strong>do</strong> fim <strong>do</strong> expediente. Quan<strong>do</strong> a funcionaria a viu, veio agitada em sua<br />

direção, e imediatamente a paciente pensou: lá vem bomba! Já ficou ansiosa, com taquicardia,<br />

e quan<strong>do</strong> a funcionária falou que houve problemas com um funcionário, imediatamente<br />

perguntou se ele estava registra<strong>do</strong>, a funcionária respondeu que não, e ela ficou muito ansiosa,<br />

na certeza de que viria a fiscalização, receberia multa e não teria como pagar, vin<strong>do</strong> a falir.<br />

Quan<strong>do</strong> a secretaria continuou contan<strong>do</strong> que havia aconteci<strong>do</strong> um acidente de trabalho, que o<br />

rapaz desmaiou, a paciente se descontrolou, teve: frio na barriga, tremedeira, su<strong>do</strong>rese de<br />

pingar, choro compulsivo, ficou branca, gelada, com tontura, taquicardia; amolecimento<br />

nas pernas; sensação de desmaio; calorão no rosto, a cabeça começou a latejar e ficou<br />

aérea, teve ânsia de vomito, corpo leve, visão turva, foi conduzida para dentro da empresa, e<br />

nem sabe como chegou lá, não enxergava nada ao seu re<strong>do</strong>r. O mari<strong>do</strong> da paciente veio ao seu<br />

encontro dizen<strong>do</strong> que se acalmasse, pois o funcionário estava bem. Outras pessoas também<br />

intercederam tentan<strong>do</strong> acalmá-la, mas ela não conseguia parar de chorar compulsivamente. Só<br />

pensava que estava tu<strong>do</strong> erra<strong>do</strong> na sua empresa, que o funcionário poderia estar numa situação<br />

mais séria e teria que indeniza-lo, e a empresa não teria condições de bancar, além da<br />

repercussão negativa <strong>do</strong> fato entre os clientes. O mari<strong>do</strong> ven<strong>do</strong> seu desatino ficou bravo. Mas<br />

ela continuava choran<strong>do</strong> e martelan<strong>do</strong> que era tu<strong>do</strong> culpa sua, que não servia para a empresa,<br />

que não daria conta. Chorou compulsivamente por horas, chegou em casa exausta, com o corpo<br />

to<strong>do</strong> <strong>do</strong>lori<strong>do</strong> e muito frustrada, na experimentação de que o mun<strong>do</strong> tinha desaba<strong>do</strong> sobre a<br />

sua cabeça.<br />

4) Nas primeiras sessões realizadas com a paciente foram verifica<strong>do</strong>s acessos de pânico neste<br />

padrão acima, e constata<strong>do</strong> que eles estavam ocorren<strong>do</strong> diariamente, às vezes mais de uma vez<br />

ao dia, diante das situações mais simples. A ansiedade portanto, estava sen<strong>do</strong> uma constante,<br />

chegan<strong>do</strong> a picos em acessos de pânico. Tais acessos ocorriam desde a a<strong>do</strong>lescência da<br />

paciente, porém vinham se intensifican<strong>do</strong> desde o ano de 2004, quan<strong>do</strong> uma das irmãs dela<br />

passou a enfrentar problemas no casamento, e também após a paciente ter perdi<strong>do</strong> <strong>do</strong>is clientes<br />

importantes. No ano de 2005 os acessos se intensificaram ainda mais após problemas com<br />

alguns funcionários, num perío<strong>do</strong> de grande volume de trabalho. Acessos tais como estes já<br />

haviam leva<strong>do</strong> a paciente algumas vezes ao pronto socorro, e também ao cardiologista. Em<br />

nenhuma situação foi constatada anormalidade orgânica, e apenas indicaram-lhe calmantes. A<br />

paciente também vinha apresentan<strong>do</strong> recorrentes episódios de candidíase desde o ano de 2004.<br />

5) Os seus acessos diários estavam trazen<strong>do</strong> transtornos no trabalho e na vida pessoal, aonde ela<br />

diante <strong>do</strong> menor empecilho entrava em acessos de pânico: com ansiedade, taquicardia,<br />

tremedeira; tensão no corpo; falta de ar/respiração curta; frio na barriga; precipitação de<br />

preocupações; pernas moles; su<strong>do</strong>rese no corpo e nas mãos; ondas de calor na parte<br />

superior <strong>do</strong> corpo; cabeça leve e aérea; oras pressão na cabeça; tontura; sensação de<br />

desmaio; formigamento no corpo; ânsia de vomito; choro compulsivo, experimentan<strong>do</strong>-se<br />

na ameaça de algo terrível quan<strong>do</strong> depara-se com notícias de problemas por resolver na empresa<br />

ou em casa. Em certas noites conseguia <strong>do</strong>rmir bem, noutras não conseguia parar de pensar<br />

nas atividades <strong>do</strong> dia seguinte e tinha dificuldade para entrar no sono, acordan<strong>do</strong> várias<br />

vezes durante a noite, por vezes com compulsão por comida, e no dia seguinte acordava<br />

cansada. Quan<strong>do</strong> o desespero era maior levava-a a chorar por muitas horas, ocorren<strong>do</strong> a <strong>do</strong>r<br />

de cabeça, onde latejava as têmporas, sentia <strong>do</strong>rmência no braço direito, câimbra até o<br />

peito, pernas pesadas, <strong>do</strong>r nas pernas e ocorria compulsão por suicídio. Sen<strong>do</strong> que em<br />

duas ocasiões de desespero maior, tomou 1 cp de Valiun para conseguir <strong>do</strong>rmir.<br />

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6) Os acessos emocionais da paciente, nos quais era posta na certeza de falência, traição e<br />

desestruturação familiar, ocorriam diante de:<br />

a) Problemas no trabalho: admissão e demissão de funcionários, acertos com ministério<br />

<strong>do</strong> trabalho, problemas contábeis. Ocorren<strong>do</strong> desde que sua empresa começou a crescer;<br />

mas desde que o pai faliu quan<strong>do</strong> ela tinha cerca de 14,15 anos.<br />

b) Saídas <strong>do</strong> mari<strong>do</strong> para o lazer: desde o iniciou <strong>do</strong> namoro, mas desde que encontrou<br />

aos 10 anos um lápis de olho no carro <strong>do</strong> pai, na certeza <strong>do</strong> pai trair a mãe.<br />

c) Com as filhas quan<strong>do</strong> não a obedeciam em organização das tarefas. Essas<br />

ocorrências se intensificaram quan<strong>do</strong> a filha mais velha foi entran<strong>do</strong> na a<strong>do</strong>lescência, e a<br />

paciente foi fican<strong>do</strong> no me<strong>do</strong> de repetir sua mãe.<br />

d) Em atritos com o mari<strong>do</strong> em que este chamava a sua atenção por estar estourada. Esse<br />

me<strong>do</strong> ocorria desde o namoro e mais acentuadamente desde há 3 anos atrás.<br />

e) Quan<strong>do</strong> o mari<strong>do</strong> tomava alguma iniciativa de contenção de despesas, interpretava<br />

que ele estava deixan<strong>do</strong>-a na mão. Esse me<strong>do</strong> vinha desde a gravidez da primeira filha,<br />

porém desde a falência de seu pai, onde a mãe da paciente repetia em desespero que se<br />

dependessem <strong>do</strong> mari<strong>do</strong> não teriam como sobreviver.<br />

f) Quan<strong>do</strong> o mari<strong>do</strong> fazia atividades individuais, e ela precisava dar conta da casa e das<br />

filhas. Experimentava-se na mesma situação de sua mãe que repetia ter um mari<strong>do</strong><br />

egoísta que a sobrecarregava.<br />

3 - Caminho pelo Cógito Pessoal:<br />

1) A paciente quan<strong>do</strong> pequena saia de carro com os pais fican<strong>do</strong> em pânico com o pai bater o carro<br />

e se acidentarem. Desde pequena sempre que viajavam de carro, a mãe se apavorava na estrada<br />

e discutia dentro <strong>do</strong> carro com o mari<strong>do</strong> por suas ultrapassagens e distrações. Aos 8, 9 anos da<br />

paciente, a mãe queixava-se muito da ausência <strong>do</strong> mari<strong>do</strong>, que estava fora jogan<strong>do</strong>, caçan<strong>do</strong> ou<br />

pescan<strong>do</strong>, deixan<strong>do</strong>-a sobrecarregada com o cuida<strong>do</strong> da casa e das filhas. A mãe estava sempre<br />

muito nervosa, brigan<strong>do</strong> com to<strong>do</strong>s e dizen<strong>do</strong> não poder contar com o mari<strong>do</strong> que priorizava<br />

outras coisas. Antes <strong>do</strong>s 10 anos da paciente os pais já brigavam muito. A mãe queixava-se da<br />

ausência <strong>do</strong> mari<strong>do</strong>, com suspeitas de traição e com queixas de ficar sobrecarregada com os<br />

cuida<strong>do</strong>s com as filhas, fican<strong>do</strong> muito nervosa e estouran<strong>do</strong> em casa. O pai por seu la<strong>do</strong><br />

queixava-se de desatenção da esposa.<br />

2) Com 10 anos da paciente os negócios <strong>do</strong> pai prosperaram, e eles melhoraram de vida, ocasião<br />

em que o pai viajava muito. Nesta época as brigas não se extinguiram, mas a casa ficou cheia de<br />

amigos em reuniões sociais e a convivência ficou um pouco melhor. Aos 10, 12 anos<br />

presenciava discussões <strong>do</strong>s pais por desconfiança da mãe. Os pais ficavam dias sem se falar. A<br />

mãe ficava com o rosto incha<strong>do</strong> de tanto chorar. A mãe sempre foi áspera e dura, e naquela<br />

época era ruim conviver com ela que vivia nervosa e xingan<strong>do</strong> as filhas, o mari<strong>do</strong> e as<br />

empregadas. Noutra situação aos 10 anos encontrou um lápis de olho no carro <strong>do</strong> pai e não<br />

contou para ninguém, por me<strong>do</strong> que os pais brigassem ainda mais e se separassem. Aos seus 10,<br />

12 anos, os pais brigavam muito e falavam bastante em separação. A paciente ouvia as<br />

discussões e entrava em pânico pensan<strong>do</strong> o que seria feito da vida delas se houvesse separação.<br />

3) Com seus 12, 13 anos, muitas vezes ouviu conversas e choro de sua mãe e sua tia a respeito <strong>do</strong>s<br />

mari<strong>do</strong>s terem amantes, e de que to<strong>do</strong>s os homens traiam. Por volta <strong>do</strong>s 14 anos da paciente, o<br />

pai teve problemas sérios com a mãe dele, que não quis repassar terras que estavam no nome <strong>do</strong><br />

avô da paciente que veio a falecer. A mãe da paciente que já não gostava da sogra, se revoltou<br />

ainda mais, e incitava o mari<strong>do</strong> contra a mãe dele. Aos 14, 15 anos da paciente o pai começou a<br />

falir, por função de planos econômicos <strong>do</strong> governo e por problemas administrativos na empresa.<br />

Já haviam recolhi<strong>do</strong> vários bens <strong>do</strong> pai, que por fim nem atendia mais a porta, e rasgava as<br />

intimações sem abrir. Numa situação entre muitas <strong>do</strong> mesmo tipo ocorridas na infância da<br />

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paciente, um oficial de justiça tocou a campainha de sua casa, ela atendeu o interfone e ficou<br />

em pânico abraçan<strong>do</strong>-se a mãe e choran<strong>do</strong> com me<strong>do</strong> <strong>do</strong> que levariam daquela vez. A mãe<br />

ficava muito desesperada, brigava muito com o pai, chamava-o de desorganiza<strong>do</strong>, e acusava-o<br />

de ter joga<strong>do</strong> dinheiro fora na farra. O pai vivia tenso, com os olhos vermelhos e dizia que quem<br />

trabalhava de verdade não tinha valor. A paciente ficava muito aflita com o desespero da mãe e<br />

também o <strong>do</strong> pai.<br />

4) Por volta de seus 16 anos queria gravar fitas k7, e levou até a loja. Quan<strong>do</strong> pediu dinheiro para<br />

pagar, a mãe a repreendeu falan<strong>do</strong> que a situação em casa não estava boa. Ficou assustada com<br />

a precariedade da condição financeira na qual estavam. Dos 15 aos 17 anos da paciente<br />

passaram por um perío<strong>do</strong> infernal em casa, com mais brigas aonde a mãe muito nervosa<br />

acusava o pai de ter si<strong>do</strong> desorganiza<strong>do</strong>. A convivência da paciente e das irmãs com a mãe<br />

sempre foi difícil, pioran<strong>do</strong> após a falência. A irmã caçula, que era 7, 8 anos mais nova que a<br />

paciente, ficou muito revoltada na a<strong>do</strong>lescência, aprontou muito com namora<strong>do</strong>s e drogas e<br />

acabou engravidan<strong>do</strong> aos 15 anos e passan<strong>do</strong> por dificuldades até hoje.<br />

4 - Compreensão Científica: Com estes elementos foi possível o seguinte esclarecimento<br />

científico da situação da paciente:<br />

Pelos inventários realiza<strong>do</strong>s concernentes ao clima antropológico, de onde procedem as<br />

determinantes e as atmosferas sociológicas, aonde encontramos as variáveis dependentes, chegamos a<br />

constatação cientifica de que a paciente totalizou em seu cógito pessoal as certezas de ser na ameaça e<br />

no me<strong>do</strong> pela necessidade e escassez material derivante e, ao mesmo tempo, agente provoca<strong>do</strong>r da<br />

desestruturação <strong>do</strong> sociológico familiar.<br />

Várias eram as correlações noemáticas entre a situação atual e a situação passada. A mãe da<br />

paciente se dizia ten<strong>do</strong> que lutar para manter a família, com tu<strong>do</strong> dependen<strong>do</strong> dela. Ignoran<strong>do</strong> que em<br />

termos reais o pai tinha batalha<strong>do</strong> e enriqueci<strong>do</strong>, e o que sobrou após a falência era em grande parte<br />

fruto disso. Esse movimento da mãe foi ter função na paciente quan<strong>do</strong> chegou a sua hora e vez no<br />

casamento, onde ela foi para a situação da mãe em que as coisas estariam dependen<strong>do</strong> dela. Daí<br />

decorria o me<strong>do</strong> de ficar dependen<strong>do</strong> <strong>do</strong> mari<strong>do</strong>, porque mesmo não ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong> a realidade <strong>do</strong>s fatos, as<br />

atmosferas de gênese eram de que depender só <strong>do</strong>s negócios <strong>do</strong> mari<strong>do</strong> seria correr o risco de falência e<br />

ficar na miséria. Ela por função desse saber de ser instala<strong>do</strong> pelas peças a disposição dela nesse<br />

antropológico de gênese, era sempre na ameaça de ser condenada a ficar como a mãe teria fica<strong>do</strong> se<br />

não tivesse a aposenta<strong>do</strong>ria e o fazer pães para recompor a família: sen<strong>do</strong> esse o arranjo racional<br />

imanente pelo qual se lhe impunha em cada episodio, pela respectiva atmosfera, o campo de<br />

possibilidades em que estava destinada ao fracasso de ser sujeito <strong>do</strong> seu projeto e na viabilização <strong>do</strong><br />

seu desejo de ser, qual seja, num sociológico familiar seguro e numa situação material que não<br />

ameaçasse este mesmo sociológico.<br />

Então o que ocorria com a paciente era função da ameaça de necessidade-escassez quan<strong>do</strong> o pai<br />

foi à falência e sen<strong>do</strong> isso marca<strong>do</strong> pela mãe, se impôs a ela um arranjo racional tal que não ficaria<br />

sossegada não ten<strong>do</strong> ovos numa cesta própria, pois sempre haveria a ameaça <strong>do</strong> mari<strong>do</strong> falir, tal qual<br />

ocorreu com o pai. Daí des<strong>do</strong>brava a ansiedade de poder acontecer com ela o destino da mãe, e isso<br />

tirava-lhe a tranqüilidade para administrar a empresa, entran<strong>do</strong> ai também o me<strong>do</strong> de se perder na<br />

administração como o pai. Vin<strong>do</strong> daí a ansiedade por estabelecer-se numa situação que não fosse a<br />

mesma da mãe.<br />

Quan<strong>do</strong> o mari<strong>do</strong> saia para jogar com amigos, indiscutivelmente reproduzin<strong>do</strong> aquilo que o pai<br />

fazia, por correlação material das situações e conseqüente geração de forças virtuais e/ou noemáticas,<br />

(sen<strong>do</strong> que a falência foi atribuída a isso, assim a coisa foi versada e posta no interior da família), ela<br />

era posta no saber de ser ameaçada pela falência e desestruturação familiar. E o mari<strong>do</strong> sain<strong>do</strong> para o<br />

jogo, com homens solteiros, tu<strong>do</strong> isso tirava-lhe a segurança, ativan<strong>do</strong> o saber de ser que se estabeleceu<br />

na gênese da personalidade, especialmente naquele episódio em que ela encontrou o lápis de olho no<br />

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carro <strong>do</strong> pai, que em seu saber de ser ficou como ela ten<strong>do</strong> o segre<strong>do</strong> da falência <strong>do</strong> pai, vin<strong>do</strong> de sua<br />

infidelidade conjugal.<br />

Os impasses com o mari<strong>do</strong> no início <strong>do</strong> relacionamento, vieram a potencializar o saber de ser no<br />

qual a paciente já estava instalada. Com todas essas correlações materiais, virtuais ou noemáticas, no<br />

ninho as folhinhas formavam um fungo só, e ela se movia como se já tivesse si<strong>do</strong> aban<strong>do</strong>nada por ele e<br />

como se tivesse que se mover sozinha para não ir para a necessidade/escassez: embora a situação<br />

antropológica, isto é, material presente, não evidenciasse possibilidade de evolução de tal sorte. Ficou<br />

prisioneira daquela situação <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>, <strong>do</strong> saber de ser <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>.<br />

Diante de seu descontrole emocional vinha a ameaça das filhas se revoltarem contra ela como<br />

ela e as irmãs se revoltaram contra a mãe, ou <strong>do</strong> mari<strong>do</strong> perder a paciência como aconteceu <strong>do</strong> pai<br />

esgotar a dele com a mãe, e procurar outra mulher. Ela já vivia como estan<strong>do</strong> na situação de não ter<br />

pulso com filhas e nem condição emocional, já vivia como estan<strong>do</strong> separada. E procurava o tempo to<strong>do</strong><br />

garantir-se de ser capaz de lutar sozinha, sempre a espera <strong>do</strong> mari<strong>do</strong> arrumar outra e aban<strong>do</strong>ná-la como<br />

poderia ter aconteci<strong>do</strong> com o pai, e as filhas sofreriam como ela sofreu, no fun<strong>do</strong> estan<strong>do</strong> sempre a<br />

ameaça de ficar na escassez, como teria fica<strong>do</strong> a mãe se o pai a tivesse aban<strong>do</strong>na<strong>do</strong>. Tinha me<strong>do</strong> que o<br />

mari<strong>do</strong> ficasse com ela só porque se ele se separasse ela ficaria na escassez, então tinha necessidade de<br />

através de seu movimento próprio ter condição de se manter sem ele, para ter a experimentação de que<br />

ele estava com ela não porque ela precisava e sim porque desejava ficar. E ao mesmo tempo tinha que<br />

ter a empresa para se garantir se ele falisse, se a família dele o exigisse, ou se ele a aban<strong>do</strong>nasse,<br />

poderia fazer o que a mãe fez ten<strong>do</strong> seu negocio próprio. O que por outro la<strong>do</strong> acabava não sen<strong>do</strong> saída<br />

porque não foi a solução <strong>do</strong>s sofrimentos na família de origem. Sua insegurança na empresa era função<br />

da insegurança com a família, e tinha origem na falência da empresa <strong>do</strong> pai. O vetor era a relação da<br />

situação dela hoje, com a situação dela lá da infância, por funções virtuais e/ou noemáticas, sem<br />

sustentação na objetividade da realidade atual.<br />

Então havia na situação da paciente a correlação destas diversas situações materiais geran<strong>do</strong> as<br />

respectivas forças virtuais e/ou noemáticas que armavam as atmosferas em que ela era posta<br />

psicofisicamente nas suas afetações emocionais, inventariáveis experimentalmente. Ai que a paciente<br />

estava o tempo to<strong>do</strong> sem saída, presa por ter o cão ou não ter o cão. E o que a aprisionava era função <strong>do</strong><br />

aprisionamento no saber de ser passa<strong>do</strong>, sen<strong>do</strong> a intervenção psicoterapêutica a interrupção desse<br />

movimento circular uniforme, que a impedia de fazer a órbita elíptica, transcenden<strong>do</strong>-se para a<br />

constituição efetiva <strong>do</strong> sociológico familiar com seu mari<strong>do</strong> e suas filhas.<br />

Por fim, esta paciente com a problemática de <strong>Síndrome</strong> <strong>do</strong> <strong>Pânico</strong>, teve as condições para esta<br />

complicação psicológica dadas na gênese de sua personalidade, dada em contextos sociológicos e<br />

antropológicos que estabeleceram a paciente no saber de ser na ameaça da desestruturação familiar,<br />

condição de possibilidade para os padecimentos com os quais chegou na terapia. Como em toda a<br />

<strong>Síndrome</strong> <strong>do</strong> <strong>Pânico</strong> havia um monstro a distância que lhe aparecia como inevitável e a sua espera<br />

fatalmente, levan<strong>do</strong>-a à situações de emoções delicadas como sempre acontece nessa <strong>Síndrome</strong>. Sen<strong>do</strong><br />

esta a Hipótese de Trabalho Psicoterapêutico cientificamente próprio para o caso da paciente.<br />

5 - Planejamento para a Intervenção :<br />

1) Situar a paciente no seu clima antropológico, levan<strong>do</strong>-a ao confronto ou constatação das<br />

determinantes nele presentes e constitutivas <strong>do</strong> mesmo.<br />

2) Localizar a paciente quanto a função das determinantes <strong>do</strong> clima antropológico no sociológico<br />

familiar de origem, traduzidas por variáveis dependentes e independentes, que constituíam<br />

internamente o mesmo sociológico familiar de origem.<br />

3) Colocar a paciente em contato com a mediação <strong>do</strong> sociológico pelo antropológico e vice-versa,<br />

através <strong>do</strong> inventário de episódios e respectivas atmosferas de gênese e da situação atual.<br />

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4) Situar a paciente em suas afetações emocionais, valen<strong>do</strong>-se de episódios sociológicos, para<br />

evidenciar seu projeto e desejo de ser originários, com os respectivos impasses e seus<br />

padecimentos.<br />

5) Colocar a paciente em contato com as forças virtuais e/ou noemáticas, procedentes pelos pólos<br />

objetivos ou acontecimentos materiais que guardavam correlação entre si, na gênese e na<br />

situação atual.<br />

6) Conduzir a paciente a destotalização de seu cógito pessoal, possibilitan<strong>do</strong> a ocorrência de<br />

atmosferas sociológicas, cujo arranjo racional imanente a fizessem experimentar-se - como<br />

horizonte num campo de possibilidades com mediações viabiliza<strong>do</strong>ras para o seu projeto<br />

originário e seu desejo de ser.<br />

6 - Intervenção Psicoterapêutica:<br />

Depois de situada em seu clima antropológico, cui<strong>do</strong>u-se de colocar a paciente em contato ou<br />

confronto com as correlações materiais e virtuais/ou noemáticas entre as atmosferas em que ela padecia<br />

seus episódios e as outras da gênese da sua personalidade. Trabalhou-se então a constituição <strong>do</strong> saber<br />

de ser, das atmosferas e <strong>do</strong>s episódios esclarecen<strong>do</strong> e localizan<strong>do</strong> a paciente nos mesmos, como sujeito<br />

<strong>do</strong> seu ser.<br />

Com o Modelo de sistema solar, situamos a paciente de que estava acontecen<strong>do</strong> com ela o<br />

movimento de ganhar órbita própria, transcenden<strong>do</strong> a circularidade em que permaneceu durante certo<br />

tempo, fazen<strong>do</strong>-a balançar nessa transcendência. Localizamos como a passagem <strong>do</strong> movimento<br />

uniforme ao movimento elíptico, quer dizer, a transcendência <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>, no caso dela de ser filha,<br />

neta, para um movimento para um futuro, onde transcenderá em direção a ser mãe, esposa, ocorria com<br />

todas as pessoas. Porém quan<strong>do</strong> a pessoa não esta devidamente localizada de sua situação, o saber de<br />

ser instala<strong>do</strong> fica sen<strong>do</strong> função desse passa<strong>do</strong>, e as situações presentes, mesmo materiais, não são<br />

levadas para o ninho, e o saber de ser não se transforma. De sorte que a pessoa cresce, enriquece e<br />

continua sen<strong>do</strong> a menina ou a pobre. Dai a incompatibilidade entre o saber de ser da pessoa e a sua<br />

situação concreta.<br />

Quan<strong>do</strong> por exemplo, ela tratava com o cliente, armava-se a atmosfera virtual, por causa de<br />

todas as injunções, em que ela se experimentava ali na condição da filha <strong>do</strong> pai que teve a falência, <strong>do</strong><br />

avô que se deu o tiro, e da menina e mulher que sofreu com tu<strong>do</strong> isso. Daí que vinha a grande parte <strong>do</strong><br />

seu estremecer psicofísico, ou da sua afetação emocional. A paciente estava sofren<strong>do</strong> por um la<strong>do</strong> as<br />

forças <strong>do</strong> saber de ser passa<strong>do</strong>, e a localização inicial quanto ao funcionamento da personalidade,<br />

constituição <strong>do</strong> saber de ser e atuação <strong>do</strong> imaginário hipnagógico por correlações noemáticas,<br />

permitiria que ela se localizasse de como podia entrar em forte emoção sem que a realidade exigisse,<br />

muitas vezes.<br />

Outro procedimento realiza<strong>do</strong>, foi a verificação com a paciente da real situação da empresa<br />

aos nossos dias, que não era a mesma realidade <strong>do</strong> pai, ou <strong>do</strong> avô, ou pelo menos não teria necessidade<br />

de cometer os mesmos erros que eles. Para tanto na medida que a empresa crescia, ela precisava contar<br />

com assessoria contábil e econômica que a prevenisse das possibilidades legais e fiscais de sua<br />

empresa. Foi orientada a buscar profissionais que os orientassem para um crescimento planeja<strong>do</strong>, sem<br />

euforias e sem riscos. A psicoterapia não poderia trabalhar para tranquilizá-la relativamente ao me<strong>do</strong> da<br />

falência se houvesse qualquer elemento de risco real.<br />

Quanto ao uso de medicação, situamos a paciente da necessidade de controle de seus acessos<br />

por meio de bengala química, como um apoio imediato no controle de seus sintomas, para que ela<br />

adquirisse condição mínima de organizar a empresa, e seu cotidiano, sain<strong>do</strong> das atitudes atabalhoadas<br />

que vinha toman<strong>do</strong> por excesso de ansiedade.<br />

Posteriormente elegemos o episódio psicofísico em que a paciente entrou em um acesso de<br />

pânico diante da carta recebida <strong>do</strong> ministério <strong>do</strong> trabalho, verifican<strong>do</strong> detalhadamente com ela a<br />

sucessão de ocorrências, e localizan<strong>do</strong>-a de como foi possível sua afetação emocional a partir <strong>do</strong><br />

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elemento da realidade presente: a carta. Utilizamos o Modelo <strong>do</strong> Moi em Ato, trabalhan<strong>do</strong> como um<br />

acontecimento futuro ativou um passa<strong>do</strong> de falência, e essa função foi estourar sobre ela que ficou em<br />

pânico. Fomos objetivan<strong>do</strong> como sua reação emocional era função de um saber de ser <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>, e<br />

não <strong>do</strong>s elementos de realidade, visto que a carta não trazia ameaça efetiva, que sen<strong>do</strong> o caso<br />

provocaria uma emoção reativa.<br />

Com o Modelo das formigas carregadeiras, da formação <strong>do</strong> saber de ser, situamos a<br />

paciente de como o dinamismo de uma personalidade devia-se a um saber de ser constituí<strong>do</strong> a partir<br />

das folhinhas que a pessoa levava para o ninho, ou seja, da apropriação de algo que acabou de<br />

acontecer ou que a pessoa acabou de fazer. E que ao fazer a elaboração reflexiva para se apropriar <strong>do</strong><br />

imediatamente ocorri<strong>do</strong> esse pensar passava por um futuro, e aparecia como sen<strong>do</strong> o espaço de ser para<br />

onde a pessoa avançou ten<strong>do</strong> em vista o que acabou de acontecer ou fazer. Em conseqüência disso, esse<br />

saber de ser passava a impor a pessoa um arranjo racional que levava a situações emocionais ou<br />

psicofísicas, que quanto mais se repetiam mais reforçavam aquele saber de ser como o fungo <strong>do</strong><br />

formigueiro, forman<strong>do</strong> o núcleo de força <strong>do</strong> ser psicofísico da pessoa. As situações psicofísicas podiam<br />

ser viabiliza<strong>do</strong>ras ou inviabiliza<strong>do</strong>ras <strong>do</strong> ser da pessoa, as positivas ou viabiliza<strong>do</strong>ras lançavam a<br />

pessoa para o desejo de ser, força que a movia para o futuro e passava a puxá-la, e as inviabiliza<strong>do</strong>ras<br />

ou negativas seguravam a pessoa como que travan<strong>do</strong>-a e levan<strong>do</strong>-a a experimentação de<br />

impossibilitada de avançar para o futuro deseja<strong>do</strong>. Neste último caso tínhamos as complicações<br />

psicológicas as quais sempre eram resultantes de situações sociológicas e possibilitadas ou<br />

determinadas por um antropológico especifico de cada pessoa em tempo demarcável. Ou seja, as<br />

possibilidades da pessoa no mun<strong>do</strong>, em viabilização ou inviabilização, vão depender <strong>do</strong>s<br />

acontecimentos, ou das folhinhas que estiveram a disposição da pessoa.<br />

Verifican<strong>do</strong> as situações psicofísicas em que a paciente se abalava fomos demarcan<strong>do</strong> o que era<br />

reativo, e o que era psicopatológico, para que a paciente fosse se localizan<strong>do</strong> na realidade e sain<strong>do</strong><br />

gradativamente <strong>do</strong> mágico e <strong>do</strong> me<strong>do</strong> que o mágico gerava.<br />

O episódio psicofísico em que a paciente entrou em pânico quan<strong>do</strong> o mari<strong>do</strong> saiu para jogar, foi<br />

explora<strong>do</strong> para localizá-la tanto <strong>do</strong> movimento concreto <strong>do</strong> mari<strong>do</strong> na realidade atual, quanto da<br />

ativação <strong>do</strong> saber de ser por correlação noemática com atitudes <strong>do</strong> mari<strong>do</strong> no início da relação,<br />

provocan<strong>do</strong> a afetação emocional forte na qual entrou, que articulava-se ainda com a situação <strong>do</strong> pai<br />

dela in<strong>do</strong> jogar e deixan<strong>do</strong> a mãe sobrecarregada.<br />

A verificação de mais episódios e situações psicofísicas conduziram <strong>do</strong> centro <strong>do</strong> ciclone em<br />

seu núcleo que era o me<strong>do</strong> da falência, para o sociológico ao fun<strong>do</strong> <strong>do</strong> social que era a ameaça à<br />

família, tornan<strong>do</strong> evidente um projeto e desejo de ser em e com a família, que tinha certa viabilização,<br />

mas que a paciente experimentava ameaça<strong>do</strong>.<br />

Na relação com o mari<strong>do</strong> não obstante to<strong>do</strong>s os indicativos objetivos <strong>do</strong> companheirismo dele<br />

em decisões lúcidas e seguras quanto a empresa, a paciente não conseguia evitar a entrada no saber de<br />

ser na ameaça <strong>do</strong> aban<strong>do</strong>no, recorren<strong>do</strong> a acontecimentos <strong>do</strong> início da relação para justificar-se. Para<br />

fazê-la avançar na inserção nas suas possibilidades atuais, objetivamos a situação <strong>do</strong> mari<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> ela<br />

engravi<strong>do</strong>u, e o movimento dele no atual. Localizan<strong>do</strong>-a das turbulências pelas quais ele também<br />

passou naquela passagem de órbita de satélite em volta da família de origem, a órbita elíptica com ela e<br />

a filha. Da mesma forma foi localizada quanto as turbulências pelas quais a sogra passou ao ter que<br />

deixar o filho nascer para o mun<strong>do</strong>. Essas localizações se faziam importantes para que a paciente<br />

deixasse de ater-se a fatos isola<strong>do</strong>s, e prestasse atenção ao conjunto <strong>do</strong> fenômeno, ganhan<strong>do</strong> mais<br />

segurança de ser na relação com o mari<strong>do</strong>, que era segurança de ser na relação com a família, coisa que<br />

ela nunca teve nem quan<strong>do</strong> menina por to<strong>do</strong>s os alvoroços entre os pais, e nem quan<strong>do</strong> adulta quan<strong>do</strong><br />

inclusive na gravidez lhe faltou apoio e aconchego.<br />

Para desmontar essas funções virtuais, fez-se necessário, e ainda esta em curso esta intervenção<br />

na detecção da implicação noemática e no levantamento <strong>do</strong>s componentes da situação <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> e da<br />

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situação de hoje, com o objetivo de estabelecer distância nula entre ela e o passa<strong>do</strong>, promoven<strong>do</strong><br />

segurança de ser nas suas possibilidades atuais.<br />

Com os parentes <strong>do</strong> mari<strong>do</strong>, a paciente se referia ao me<strong>do</strong> de que o mari<strong>do</strong> sen<strong>do</strong> exigi<strong>do</strong> pela<br />

família de origem fosse sempre preterir a ela e as filhas, saber de ser no qual ela entrava, pelos<br />

problemas ocorri<strong>do</strong>s no início <strong>do</strong> relacionamento <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is. Fizemos a verificação científica <strong>do</strong><br />

movimento <strong>do</strong>s parentes dele, bem como <strong>do</strong> movimento <strong>do</strong> mari<strong>do</strong> relativamente à sua família de<br />

origem, aonde ficava evidente que ele transcendeu seu sociológico de gênese constituin<strong>do</strong> um<br />

sociológico com ela e com as filhas. Este ponto da intervenção tinha por objetivo proporcionar à<br />

paciente segurança de ser em suas possibilidades atuais.<br />

Outro episódio que foi trabalha<strong>do</strong> referiu-se a situação emocional intensa no me<strong>do</strong> da<br />

necessidade/escassez, na qual a paciente entrou por ocorrerem problemas financeiros na empresa, e por<br />

certas posições <strong>do</strong> mari<strong>do</strong> na administração da empresa e controle das contas. A paciente já estava<br />

numa atmosfera de me<strong>do</strong> da falência com os problemas de caixa, mesmo não poden<strong>do</strong> ignorar que a<br />

temporada se aproximava com a possibilidade de saudarem as dividas, e que mesmo que não fossem<br />

saudadas não colocavam em risco o patrimônio que possuíam. Mas o auge da situação emocional<br />

ocorreu quan<strong>do</strong> o mari<strong>do</strong> solicitou que segurasse os gastos com compras. Neste episódio a paciente<br />

entrou num acesso emocional com perder o controle da empresa para o mari<strong>do</strong>, o que a faria depender<br />

dele, não estan<strong>do</strong> protegida caso ele a aban<strong>do</strong>nasse. Foi sen<strong>do</strong> localizada de que o mari<strong>do</strong> estava ao<br />

la<strong>do</strong> dela, compartilhan<strong>do</strong> um problema em comum, em expressão conhecida: “fazen<strong>do</strong> caixas com<br />

ela”, mas ela não estava conseguin<strong>do</strong> compartilhar com ele por me<strong>do</strong> de ao compartilhar ficar sem<br />

nada, porque a sogra poderia levá-lo, ele poderia se encher dela e aban<strong>do</strong>ná-la. O mari<strong>do</strong> estava<br />

moven<strong>do</strong>-se sociologicamente para a família com ela, mas a paciente não conseguia mover-se nos<br />

mesmos termos, tinha que ter um futuro preserva<strong>do</strong> a parte, uma ilha aparente de segurança, que não<br />

dava segurança nenhuma porque era a proteção quanto a poder ser aban<strong>do</strong>nada. Novamente ai a<br />

preponderância da função virtual sobre as possibilidades atuais da paciente, que sen<strong>do</strong> re-localizada se<br />

permitiria compartilhar a vida com ele, tecer o futuro, e casar sociologicamente com o mari<strong>do</strong>, coisa<br />

que não conseguiu efetivar até então por função desse cógito absolutiza<strong>do</strong> no saber de ser na ameaça de<br />

desestruturação familiar levan<strong>do</strong> a necessidade/escassez.<br />

No final de 2005 inventariamos e trabalhamos outro episodio ocorri<strong>do</strong>.<br />

Num dia de janeiro a paciente estava conferin<strong>do</strong> o extrato bancário e notou que um cliente<br />

depositou um valor abaixo <strong>do</strong> acerto, descontan<strong>do</strong> um produto que a empresa havia danifica<strong>do</strong>. Na hora<br />

ficou ansiosa, com taquicardia, tremedeira, irritada, e ligou incessantemente para o cliente. Sem<br />

encontra-lo foi fican<strong>do</strong> cada vez mais irritada. Quan<strong>do</strong> falou com um funcionário que passaria o reca<strong>do</strong><br />

conseguiu acalmar-se um pouco. Foi para casa almoçar e contou ao mari<strong>do</strong> o ocorri<strong>do</strong>, e voltaram os<br />

sintomas de irritação, ansiedade, e taquicardia, ao citar tu<strong>do</strong> que poderiam ajeitar com aquele<br />

dinheiro. Começou a chorar compulsivamente, o mari<strong>do</strong> tentava acalmá-la, dizen<strong>do</strong> entender sua<br />

chateação, mas que não deveriam se indispor com o cliente. Se acalmou e almoçou e após o almoço,<br />

tomou uma <strong>do</strong>se extra da sua medicação. Ficou prostrada, com sonolência, mas 1 hora depois<br />

obrigou-se a ir para o trabalho para resolver esse contato com o cliente. Não encontrou o cliente e<br />

voltou para casa mais ce<strong>do</strong>, desanimada, prostrada, com o corpo pesa<strong>do</strong> e foi deitar. Um pouco mais<br />

tarde levantou-se para fazer lanche para as filhas, e quan<strong>do</strong> o mari<strong>do</strong> chegou contou-lhe das novas<br />

tentativas de contato com o cliente, e voltou a chorar compulsivamente, com dificuldade para<br />

respirar e tremedeira. O mari<strong>do</strong> buscava tranqüilizá-la e convi<strong>do</strong>u-a para ir deitar, ela foi, ainda<br />

choran<strong>do</strong> por algum tempo na experimentação de que estava perden<strong>do</strong> milhões. Na hora que deitou, o<br />

estomago embrulhou, teve ânsia de vomito e vomitou. Tomou sua medicação da noite, e conseguiu se<br />

acalmar e <strong>do</strong>rmir. No outro dia permaneceu prostrada, e só melhorou quan<strong>do</strong> verificou que o valor<br />

cobra<strong>do</strong> de alguma forma procedia. Neste momento, começou a afetar-se com ter ti<strong>do</strong> o acesso<br />

emocional desproporcional a situação, temen<strong>do</strong> que o mari<strong>do</strong> a considerasse excessiva e perdesse a<br />

paciência.<br />

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Neste episódio novamente estavam atuan<strong>do</strong> forças virtuais, colocan<strong>do</strong>-a em emoção forte, cuja<br />

antecipação era a de falir como o seu pai, e de ficar com a família desestruturada como a sua família de<br />

origem, em incompatibilidade com a situação atual.<br />

Tal incompatibilidade já vinha sen<strong>do</strong> trabalhada, porém a paciente não conseguia ficar segura.<br />

Alguns acontecimentos antropológicos no contexto atual da paciente, estavam arman<strong>do</strong> a atmosfera em<br />

que ela entrava na certeza da desestruturação familiar, o que possibilitava a entrada em episódios como<br />

o ocorri<strong>do</strong>. Acontecimentos tais como: a tentativa de suicídio de uma amiga naquele mês, por problema<br />

no relacionamento amoroso; a irmã da paciente que vinha num processo de separação e estava entran<strong>do</strong><br />

em acessos emocionais, nos quais acusava o mari<strong>do</strong> de traições, e de deixa-la em necessidade com o<br />

filho. A mãe da paciente estava envolvida com a separação da filha e em acessos emocionais e criticas<br />

ao genro; além de continuar queixan<strong>do</strong>-se <strong>do</strong> próprio mari<strong>do</strong>, e de dificuldades financeiras. A outra<br />

irmã da paciente estava se reconcilian<strong>do</strong> com o mari<strong>do</strong> após uma separação por motivos financeiros,<br />

sen<strong>do</strong> a família contra. Ambas as irmãs e a mãe queixan<strong>do</strong>-se de sobrecarga pelos mari<strong>do</strong>s. Enfim,<br />

to<strong>do</strong>s esses acontecimentos foram se soman<strong>do</strong>, arman<strong>do</strong> a atmosfera em que a paciente vinha se<br />

debaten<strong>do</strong>. Por função também de ativa<strong>do</strong>res atualiza<strong>do</strong>s.<br />

Esses acontecimentos antropológicos se constituíram em ativa<strong>do</strong>res situacionais que foram<br />

arman<strong>do</strong> uma atmosfera e alcançan<strong>do</strong> a paciente no seu saber de ser. O “gatilho” que armou essa<br />

atmosfera foi a tentativa de suicídio da amiga, que afetou a paciente com a função noemática de<br />

destruição da família, colocan<strong>do</strong>-a na atmosfera que esteve em sua família de origem. Utilizan<strong>do</strong> o<br />

Modelo <strong>do</strong> Sujeito objetiva<strong>do</strong> no mun<strong>do</strong>, fomos localizan<strong>do</strong> a paciente de como uma ocorrência com<br />

correlação noemática com ocorrências passadas, alcança o sujeito arman<strong>do</strong> a atmosfera em que ele é<br />

lança<strong>do</strong> para o saber de ser no qual entrou no passa<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong> sofreu a pressão da atmosfera passada.<br />

A paciente foi sen<strong>do</strong> localizada de que estava sujeita a essas situações em função de to<strong>do</strong>s os<br />

acontecimentos materiais atuais que estavam repetin<strong>do</strong> acontecimentos da formação de sua<br />

personalidade. A amiga, as irmãs, a própria mãe, em atitudes desatinadas, em desesperos tais quais os<br />

desesperos da mãe no passa<strong>do</strong> é que a estavam lançan<strong>do</strong> na ameaça de desestruturação familiar. São<br />

ativa<strong>do</strong>res situacionais em efervescência no atual, que fazem re-estabelecer a atmosfera em que a<br />

paciente vai experimentar-se como horizonte como esteve no seio da família.<br />

Esta demarcação e localização da paciente quanto ao que é reativo e o que é psicopatológico se<br />

fazia fundamental, pois assim como acontece em to<strong>do</strong>s os casos em que o contexto antropológico e/ou<br />

sociológico de origem da personalidade não foi ainda modifica<strong>do</strong>, ocorre <strong>do</strong> paciente se recuperar, mais<br />

ficar sensível, como cicatriz recente para qualquer acontecimento que tenha correlação noemática com<br />

a situação em que padeceu no passa<strong>do</strong>. E mesmo recuperada da sua situação ela vai sempre ser sensível<br />

para esses acontecimentos e não terá a mesma condição que outras pessoas tem de lidar, embora possa<br />

ganhar condição psicológica de não entrar em acessos emocionais. A diferença deve ser buscada entre a<br />

condição da paciente frente a estes acontecimentos reais e atuais quan<strong>do</strong> já localizada pela terapia, e<br />

quan<strong>do</strong> não estava ainda em processo terapêutico.<br />

Esses acontecimentos no contexto antropológico atual são elementos adversos ao processo<br />

terapêutico, que acrescem dificuldade retardan<strong>do</strong> o processo, mas com as quais a terapia tem que<br />

haver-se. A recuperação da paciente é possível, mas dependen<strong>do</strong> <strong>do</strong>s acontecimentos no antropológico<br />

a recuperação é mais rápida ou mais lenta.<br />

Algumas sessões de localização deste episódio, bem como das forças antropológicas em atuação<br />

no contexto atual foram feitas conjuntamente com o mari<strong>do</strong>, localizan<strong>do</strong>-o da situação emocional da<br />

esposa, de mo<strong>do</strong> que ele pudesse compreender o que estava ocorren<strong>do</strong> com a paciente. Esclarecen<strong>do</strong><br />

tecnicamente o trabalho que estava sen<strong>do</strong> realiza<strong>do</strong>, e o caminho que estava e permanecerá sen<strong>do</strong><br />

percorri<strong>do</strong> para desmonte das funções virtuais atuan<strong>do</strong> na paciente, assim como <strong>do</strong>s ativa<strong>do</strong>res<br />

situacionais que vem <strong>do</strong> antropológico atual. O mari<strong>do</strong> foi chama<strong>do</strong> num momento tecnicamente<br />

conveniente, de mo<strong>do</strong> a intensificar a possibilidade de sociologização entre eles, na direção da<br />

consolidação <strong>do</strong> casamento.<br />

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O trabalho segue com a paciente de mo<strong>do</strong> a localizá-la destas forças antropológicas, e da função<br />

que exercem na sua entrada nos episódios e acessos emocionais.<br />

Com a verificação <strong>do</strong>s acessos que se mostraram padrão, providenciamos consulta com um<br />

médico neurologista para avaliação <strong>do</strong> uso de bengala química, levan<strong>do</strong> relatório circunstancia<strong>do</strong> a<br />

respeito da situação da paciente.<br />

Comunicamos ao médico que nossa convicção cientifica seria quanto a necessidade de<br />

utilização por parte da paciente de uma bengala química, que controlasse a <strong>do</strong>minante: ansiedade,<br />

proporcionan<strong>do</strong> condições mínimas para que esta saísse <strong>do</strong> desespero diário em que se encontrava. Para<br />

tanto, estávamos submeten<strong>do</strong> nossa convicção à avaliação dele, bem como a indicação à outros<br />

especialistas que considerasse necessário.<br />

A paciente ficou medicada com: Rivotril 2 mg: ¼ cp manhã; ¼ cp tarde e ½ cp a noite, e mais<br />

½ cp em situação de maior ansiedade, e Topamax 25 mg: 1 cp, ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong> realiza<strong>do</strong>s os ajustes<br />

necessários a medicação em articulação entre a psicóloga e o médico.<br />

7 – Resulta<strong>do</strong>s da Intervenção Interdisciplinar: A situação atual da paciente encontra-se <strong>do</strong><br />

seguinte mo<strong>do</strong>:<br />

1) Na execução <strong>do</strong> primeiro ponto da intervenção psicoterapêutica, a paciente começou a<br />

constatar como as suas afetações emocionais eram incompatíveis com o sociológico futuro, em grande<br />

parte das situações de sua vida atual. A objetividade <strong>do</strong> movimento <strong>do</strong> mari<strong>do</strong>, das filhas, e a própria<br />

situação da empresa não exigiam em sua materialidade a fragilidade emocional em que entrava.<br />

Começou a localizar-se de que suas afetações emocionais tinham correlação com os episódios<br />

ocorri<strong>do</strong>s em sua família de origem, fican<strong>do</strong> mais leve ao encontrar estas determinantes.<br />

2) As verificações de episódios psicofísicos da paciente na relação com suas filhas, foram<br />

tornan<strong>do</strong> evidente como suas afetações emocionais frente as filhas reproduziam as afetações na relação<br />

com a mãe da paciente, onde esta entrava agora na função da mãe. Diante das localizações passou a sair<br />

<strong>do</strong> mágico com tais situações, começan<strong>do</strong> a ganhar distância, mesmo que num momento posterior ao<br />

acesso emocional, da atmosfera que se armou lançan<strong>do</strong>-a para a emoção. Atualmente ainda ocorriam<br />

afetações dela frente as filhas, porém em intensidade bem menor que anteriormente.<br />

3) Com a localização <strong>do</strong> efetivo movimento <strong>do</strong> mari<strong>do</strong> na situação atual, distinguin<strong>do</strong>-o <strong>do</strong><br />

movimento dele no início <strong>do</strong> relacionamento, a paciente foi confrontan<strong>do</strong>-se com a distinção entre os<br />

<strong>do</strong>is momentos antropológicos. Passan<strong>do</strong> a constatar que as situações socialmente semelhantes faziam<br />

com que fosse alcançada em função sociológica idêntica, por função <strong>do</strong> saber de ser na certeza de ser<br />

na qual entrou lá no passa<strong>do</strong>. E que na verdade vinha desde a gênese de sua personalidade onde foi<br />

posta no saber de ser de que to<strong>do</strong> homem inevitavelmente traia. Desta forma que a ocorrência <strong>do</strong><br />

mari<strong>do</strong> sair com amigos aqui, que se equivalia a sair com amigos lá, a deixava pressa nessa percepção<br />

empírica, de movimento aparente, sem localizar-se em termos <strong>do</strong> movimento real <strong>do</strong> mari<strong>do</strong> que já não<br />

era idêntico ao movimento lá. Progressivamente a paciente veio conseguin<strong>do</strong> tomar distância destas<br />

situações, ven<strong>do</strong> o conjunto das atitudes <strong>do</strong> mari<strong>do</strong> com planos para o futuro da família, e a<br />

incompatibilidade disto com o saber de ser que se impunha a ela na ameaça de perdê-lo. Assim os<br />

episódios de irritação ou desespero com o mari<strong>do</strong> foram sen<strong>do</strong> reduzi<strong>do</strong>s.<br />

4) A paciente passou a compreender que sua afetação na empresa des<strong>do</strong>brava <strong>do</strong> me<strong>do</strong> da<br />

desestruturação familiar no qual já saia de casa, chegan<strong>do</strong> na empresa sem tranqüilidade, o que fazia<br />

com que qualquer coisa fora de ordem a lançasse para o desespero, em acessos emocionais que em anos<br />

anteriores a levaram a pronto socorro com me<strong>do</strong> de problema cardíaco. Constatan<strong>do</strong> como conjuntos de<br />

ocorrências atuais se articulavam a conjuntos de ocorrências passadas, ativan<strong>do</strong> seu saber de ser<br />

passa<strong>do</strong>, a paciente começava a compreender suas crises emocionais.<br />

5) Quanto as suspeitas da paciente quanto aos parentes <strong>do</strong> mari<strong>do</strong>, as verificações <strong>do</strong><br />

movimento destes tornou evidente que havia uma transcendência e respeito <strong>do</strong> mari<strong>do</strong> para com eles e<br />

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vice-versa. Fican<strong>do</strong> assim inevitável para a paciente encarar que seu pé atrás vinha <strong>do</strong> seu saber de ser<br />

e não de ameaça atual.<br />

6) Quanto ao episódio de afetação dela com o mari<strong>do</strong> estar assumin<strong>do</strong> a administração da<br />

empresa, e ter coloca<strong>do</strong> limites nos gastos dela, foi localizada na atmosfera que se armou e da afetação<br />

na qual entrou de ter que ter a empresa na sua mão como um algo a parte no qual pudesse se segurar<br />

por não confiar no casamento. Começou a identificar atitudes <strong>do</strong> mari<strong>do</strong> de resguardar o futuro deles, e<br />

como foi atingida por estas, como pouco caso e aban<strong>do</strong>no. Confrontou-se novamente com não ter<br />

elementos objetivos quanto ao mari<strong>do</strong> estar aban<strong>do</strong>nan<strong>do</strong>-a, mas pelo contrário, estava<br />

sociologicamente teci<strong>do</strong> e sen<strong>do</strong> companheiro, e constatan<strong>do</strong>-se não conseguin<strong>do</strong> ser companheira nos<br />

mesmos termos, por não conseguir confiar no mari<strong>do</strong> e na possibilidade de uma família viabilizada por<br />

função <strong>do</strong> seu saber de ser.<br />

7) A partir da localização <strong>do</strong> último episódio que veio sen<strong>do</strong> trabalha<strong>do</strong>, a paciente conseguiu<br />

ser afetada com menos intensidade diante de um episódio na família de origem que antes a colocaria<br />

num acesso. Num <strong>do</strong>mingo de março de 2006, a paciente ligou para os pais e não os encontrou em<br />

casa. Telefonou para a casa da irmã e encontrou-os lá. Conversou com o pai que contou de problemas<br />

com o neto que estava revolta<strong>do</strong> com a separação <strong>do</strong>s pais, e com a filha que estava desatinada com a<br />

separação. Contou também que a mãe da paciente estava perden<strong>do</strong> o controle e dizen<strong>do</strong> bobagens ao<br />

neto. A paciente falou ao telefone com sua mãe tentan<strong>do</strong> acalmá-la, a mãe queixava-se da filha estar<br />

matan<strong>do</strong>-a de preocupação. Tentou interceder com a mãe que se calou ao discordar da paciente. Neste<br />

episódio não teve acessos emocionais, embora afetada conseguiu ganhar distância da situação ven<strong>do</strong><br />

que estavam perdi<strong>do</strong>s, crian<strong>do</strong> atritos desnecessários. Também não se assustou, como ocorria antes<br />

com as queixas de dificuldades financeiras, pois agora já conseguia ver que costumavam se queixar,<br />

mas não passavam efetivamente por dificuldades. Após o telefonema, a paciente estava triste, mas não<br />

arrasada como das outras vezes.<br />

8) Num outro episódio no dia seguinte a paciente recebeu uma <strong>do</strong>cumentação <strong>do</strong> conta<strong>do</strong>r que<br />

tinha que apresentar no perío<strong>do</strong> da tarde ao ministério <strong>do</strong> trabalho, após uma fiscalização que tinha<br />

ocorri<strong>do</strong> há uma semana. Ficou bastante ansiosa com os <strong>do</strong>cumentos a aprontar, e com o mari<strong>do</strong> que<br />

solicitava que fizesse um balancete. Teve tremedeira e su<strong>do</strong>rese nas mãos, mas conseguiu concluir o<br />

trabalho no horário previsto, sem descontrolar-se. Pediu que o mari<strong>do</strong> fosse no ministério, pois achou<br />

que ficaria muito ansiosa, e voltou para casa bem. Em momentos anteriores, na ocorrência de episódios<br />

<strong>do</strong> mesmo tipo, com uma situação administrativa até menos compromete<strong>do</strong>ra que a atual, a paciente<br />

teria entra<strong>do</strong> em severo acesso de pânico, tal qual encontramos em descrições anteriores. A sua<br />

localização inicial frente ao contexto antropológico atual, permitiu que tais acessos não se repetissem<br />

com a mesma freqüência e intensidade.<br />

9) Concluin<strong>do</strong>: com o apoio da bengala química, bem como com sessões psicoterapêuticas<br />

voltadas para resolver afetações emocionais em curso, a paciente vem com seus acessos emocionais<br />

consideravelmente reduzi<strong>do</strong>s na freqüência e na intensidade. E este processo de superação de sua<br />

complicação psicológica avança na medida em que se vai alteran<strong>do</strong> o seu saber de ser em suas<br />

possibilidades atuais, mesmo com as situações adversas em ato (quais sejam, as de suas família de<br />

origem atualmente) na medida em que a paciente vai sen<strong>do</strong> posta no seu efetivo campo de<br />

possibilidades presentes, aonde confronta-se com as mediações para a viabilização <strong>do</strong> projeto e desejo<br />

de ser fundamental, quais sejam: ser mãe, esposa, companheira, livre da ameaça da falência material, e<br />

da destruição <strong>do</strong> sociológico. Esse processo está em curso progressivo e irreversível pelas constatações<br />

científicas que vimos fazen<strong>do</strong> nas sessões psicoterapêuticas semanais.<br />

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