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Um Homem Marcado por ETs [Segunda edição]<br />
Introdução<br />
Sonda ufológica<br />
ou uma nave<br />
extraterrestre?<br />
Não me lembro do dia, mas me recordo que foi nas primeiras<br />
horas da madrugada de uma segunda-feira do mês de abril de<br />
1951. Encontrava-me na companhia de Zeno Zanchetta, que<br />
residia em Chapecó (SC), e Guilherme Conte, hoje já falecido.<br />
Vínhamos a pé das casas de nossas respectivas namoradas. O incidente<br />
começou em um pequeno trecho da estrada. O lugar era ermo e tinha o<br />
nome de Barrinha, porque é ali que o córrego Paiol Novo desemboca no Rio<br />
Carreteiro, então em terras do município de Getúlio Vargas e ora pertencentes<br />
à cidade de Tapejara, ambos no Rio Grande do Sul.<br />
Caminhávamos de volta às nossas residências, falando sobre coisas de<br />
pouca importância, quando vimos, do outro lado do rio, em terras da família<br />
de Zeno, um poderoso facho de luz. A “coisa” emergia do meio de um mato<br />
de árvores altas e, com movimentos pendulares, projetava-se à grande altura,<br />
produzindo um efeito extraordinário e despertando-nos certa sensação de<br />
medo. Um pouco mais adiante, numa casinha à margem da estrada, velava-se<br />
um natimorto da família amiga de José Carlin Artuso.<br />
Pois aquela coisa começou a nos inquietar muito mais quando<br />
frenteamos a capela: do outro lado do rio, ainda em terras da família<br />
Zanchetta, um luminoso corpo ovalado, de tamanho variável – porque, de<br />
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Antônio Nelso Tasca<br />
forma estranha, ora se fazia relativamente grande, ora pequeno –, saiu do<br />
mato em que antes víramos o facho de luz. Surgiu e, a um ou dois metros de<br />
altura do solo, deu-se a “passear” ligeiro entre as muitas árvores do extenso<br />
potreiro ali existente, contornando-as inteligentemente, de maneira como<br />
se as enxergasse. Em seguida, a bola de luz dirigiu-se ao casarão da família<br />
Zanchetta, ali efetuando diversas evoluções.<br />
Num de seus muitos movimentos, sobrevoou aquela imensa casa<br />
residencial, iluminando-a de tal maneira que pudemos ver, por uma janela<br />
aberta no sótão, um feixe de vassouras preso a um caibro daquele compartimento.<br />
Minutos depois, o corpo luminoso rumou para um córrego seco, no<br />
sopé de um morro coberto de mata branca e pinheiros, onde havia um pequeno<br />
canavial. E foi lá que a coisa diminuiu de tamanho a ponto de assemelhar-se<br />
a um pirilampo, pois piscava como aquele inseto.<br />
Pouco depois, após termos percorrido mais um trecho de estrada, paramos<br />
defronte ao prédio da escola local, Barão de Cotegipe. Do outro lado do<br />
rio havia um paiol para a guarda de cereais. Então, para aumentar muito mais<br />
nosso descontrole emocional, aquela bola de luz fez-se maior, saiu do canavial<br />
do córrego seco, elevou-se e passou a “picar” nitidamente, como uma bola de<br />
pingue-pongue. Então veio até perto de nós, a uns 80 m de distância, parando<br />
junto ao citado paiol e iluminando-o fortemente, fazendo com que eu e os<br />
meus companheiros perdêssemos a fala. Trancara-nos a garganta e tolhera-nos<br />
a língua aquela estranha coisa. Sem voz e paralisados, ali permanecemos por<br />
alguns minutos, até que o objeto tornou a se mover, desta vez para voltar à<br />
casa do companheiro Zanchetta, por trás da qual se ocultou.<br />
Ainda inteiramente mudos, retomamos o nosso caminho. Ao chegarmos<br />
à velha ponte de madeira do Rio Carreteiro, Zeno tomou a direção à<br />
esquerda, rumo a sua casa, e Guilherme e eu, que éramos vizinhos de porta,<br />
prosseguimos pelo caminho que dava para as nossas residências. Então – isto<br />
até me parece mentira –, só encontramos em nós a coragem de dizer um tímido<br />
e muito acovardado boa noite ao companheiro Zanchetta.<br />
Mesmo anos depois daquele incidente inesquecível, Guilherme e eu<br />
relembramos tal episódio e ainda nos incriminamos pela covardia com que<br />
agimos em relação àquele nosso amigo. Por que não o acompanhamos até a<br />
sua casa – local em que o “diabo” daquela coisa se escondera e certamente<br />
ainda estava? O que, então, Guilherme, Zeno e eu pensamos de tudo aquilo?<br />
Ora, tão somente encaixados nos poucos e deficientes conhecimentos da gente
Um Homem Marcado por ETs [Segunda edição]<br />
interiorana daqueles dias, atribuímos procedência sobrenatural àquela inteligente<br />
bola de luz. Lembro-me, inclusive, de que, entre outras idéias descabidas,<br />
aventamos a hipótese de que aquele estranho corpo luminoso devia ter algo a<br />
ver com a alma do natimorto que estava sendo velado naquela localidade.<br />
Zeno Zanchetta faleceu poucos anos depois daquele incidente, aparentemente<br />
vítima de uma doença estranha. A propósito, hoje, espiritualista<br />
que sou, tenho plena convicção de que ele está imerso num mundo de<br />
luz e saber, e já terá compreendido e perdoado a covardia de seus pobres<br />
companheiros naquela noite. Mas, enfim, o que era aquele objeto de forma<br />
redonda, luminoso e de movimentos indiscutivelmente inteligentes? Um<br />
disco voador? Uma sonda extraterrestre?<br />
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44<br />
“ Quando<br />
Antônio Nelso Tasca<br />
fui procurado por Antônio Nelso<br />
Tasca, ouvi sua história por um longo tempo.<br />
E antes de colocar a matéria no ar, que teve<br />
repercussão estadual e até nacional, eu o<br />
levei a um médico, que se declarou surpreso<br />
com a lesão apresentada em suas costas.<br />
‘Nunca vi isso antes. A marca deixada é uma<br />
queimadura de fora para dentro, sem atingir<br />
os pêlos, o que seria normal para um caso<br />
assim’. Preciso dizer mais?<br />
”<br />
— Claudério Augusto, profissional que atuou por mais de<br />
20 anos nas emissoras de televisão RBS e SBT, de Chapecó<br />
(SC), e durante 10 anos foi apresentador de um programa<br />
diário exibido por uma afiliada da Rede Globo
Um Homem Marcado por ETs [Segunda edição]<br />
<strong>Capítulo</strong> 01<br />
Minha primeira<br />
informação sobre os<br />
discos voadores<br />
Era um dia frio do inverno de 1945. O vento minuano soprava sem<br />
piedade. Com um chapéu velho de palha debruçado sobre os olhos<br />
e protegido por uma velha capa Renner, montei a cavalo e, procurando<br />
abrigar-me do chuvisco gelado que o vento me atirava de<br />
todo o jeito, cavalguei até a casa comercial do “seu” Spagnoletto, situada na<br />
Linha Caçador, então lugarejo do interior do município de Passo Fundo, no<br />
Rio Grande do Sul. Meu pai mandara-me ali para um conserto de sela, pois<br />
que a casa era um misto de boteco, casa de pasto e selaria.<br />
Enquanto o artífice dos couros consertava a peça do arreio, fiquei<br />
vendo e ouvindo 10 ou 12 homens que ali, na qualidade de fregueses e<br />
amigos da casa, cavaqueavam e prestavam homenagens ao “verde amargo”<br />
e à “água que passarinho não bebe”. E foi então que um daqueles<br />
homens, um mulato de compleição franzina e todo encapotado, usando<br />
uma linguagem cabocla usual, falou do que tinha visto há poucos dias.<br />
Mas, então, com certeza, nem o narrador nem os presentes àquela conversa<br />
devem ter feito idéia da importância de que o caso se revestia. Ali,<br />
naqueles dias, como certamente ocorria em quase todas as localidades do<br />
interior, o povo era simples, sobremodo inculto, e as rodas de bate-papo<br />
quase sempre giravam em torno de banalidades.<br />
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Antônio Nelso Tasca<br />
Vez por outra, entretanto, as conversas abrangiam notícias vagas da<br />
guerra em que o mundo se debatia. Também eram amiudemente comentadas<br />
as bravuras de alguns delegados e inspetores de polícia que, invocando<br />
questões de segurança nacional, prendiam e maltratavam colonos italianos e<br />
alemães – só porque estes não sabiam falar a língua portuguesa. E assim disse<br />
o roceiro que, sem ser esta a sua intenção, deu-me a primeira notícia sobre<br />
disco voador. “Mas escutem: eu tava trabaiando lá na berada do mato, oiei pro céu e vi<br />
uma coisa redonda como pedra de munho. Sem fazê baruio, passô por riba do mato e ali<br />
não pude vê pra adonde ela foi”. O homenzinho fez uma pausa, salivou a parte<br />
sedosa da palha de milho alisada a canivete, fechou o baita, tacou-lhe fogo,<br />
puxou uma fumaça e concluiu: “Meu irmão tava comigo e também viu”.<br />
As pessoas presentes ouviram o relato em silêncio. A novidade não<br />
causou nenhum impacto. Não houve as interjeições e as perguntas de curiosidade<br />
muito próprias do homem da roça. Mas ninguém duvidou das palavras<br />
do caboclinho que contara ter visto uma “pedra de munho” (moinho)<br />
voando sobre um pedaço de mata daquele ainda selvático recanto de Passo<br />
Fundo. Então, com apenas 11 anos de idade, eu me considerava um tanto<br />
sabidinho em razão de já ter lido e relido várias vezes o monte de obras que<br />
meu pai trouxera do colégio de padres em que ele estudara. Mas ali, estranhei<br />
o fato de que, naquelas dúzias de bons livros e de contos ilustrativos, eu não<br />
lera nada sobre pedras de moinho voadoras. Então me dei conta de que não<br />
sabia tanto quanto imaginava saber. A partir de então, passei amiudemente<br />
a matutar sobre o relato do homenzinho do cigarrão de palha. Do que seria<br />
feita aquela roda voadora, qual a sua finalidade entre ou sobre nós, donde ela<br />
teria vindo, para aonde teria ido, quem a estaria dirigindo?<br />
Anos mais tarde, quando era professor no interior do município de<br />
Iraí, no Rio Grande do Sul, vim fazer idéia do que devia ter sido aquela coisa<br />
semelhante a uma “pedra de munho”. Foi quando a extinta revista O Cruzeiro<br />
publicou reportagens sobre discos voadores. Ao ler aquelas notícias, convencime<br />
de que a pedra de moinho de Linha Caçador era uma nave do além, igual<br />
ou semelhante a tantas outras vistas por pessoas de várias partes da Terra,<br />
conforme informava a citada revista. Aquelas memoráveis reportagens de O<br />
Cruzeiro fizeram-me retroceder espiritualmente no tempo. Voltei em pensamento<br />
àquele dia frio de 1945 e prestei uma silenciosa, mas afetiva homenagem<br />
pessoal ao matuto que vira aquela pedra de munho, que talvez nunca tenha<br />
sido cabalmente informado da importância do seu avistamento.
Um Homem Marcado por ETs [Segunda edição]<br />
Mal sabia aquele homem simples que a tal pedra que ele avistara<br />
não era outra coisa senão uma nave espacial de outro mundo. E mal tomara<br />
conhecimento o curioso menino de 11 anos de idade que, décadas<br />
mais tarde, não naqueles rincões gaúchos, mas em terras barrigas-verdes<br />
[Em Santa Catarina], seria ele mesmo raptado por uma espécie de pedra<br />
de munho, levado para um fundo de mar, feito elo de ligação humana<br />
com outro mundo, e que, dali em diante, passaria a ser portador de uma<br />
mensagem alienígena destinada a todos os povos da Terra, e ainda, pessoalmente,<br />
se veria feito um homem marcado por um ET.<br />
Mas não foi bem assim...<br />
Em absoluto, não me era estranho o assunto sobre discos voadores no<br />
dia em que fui seqüestrado por um deles. Muito pelo contrário. Até aqueles<br />
dias, eu já havia lido bastante sobre esta matéria e era um dos poucos que, na<br />
minha terra, acreditava em naves e em criaturas de outros mundos em visitas<br />
ao nosso planeta. Em decorrência desses conhecimentos, muitas vezes eu<br />
desejara a oportunidade de encontrar-me um dia com um disco voador e nele<br />
viajar pelo espaço afora. Com bilhete de ida e volta, obviamente.<br />
No tocante àquele meu velho desejo, eu já havia formado uma imagem<br />
muito especial e praticamente imutável dentro de mim. Inveterado caçador de<br />
perdizes que eu era, via-me, sempre, em uma bonita manhã de Sol, caçando<br />
num vasto campo de barba-de-bode, tão somente acompanhado pelo meu<br />
cão perdigueiro. Então, de repente, vindo de algum ponto do espaço, surgiame<br />
um disco voador, que pousava a poucos metros de mim, e dele desciam<br />
dois ou três astronautas de elevada estatura, sorridentes, vestidos com roupas<br />
brancas, metalizadas, e falando uma língua estranha.<br />
Depois, através de sinais, convidavam-me a entrar, eu aceitava o convite<br />
e deixava à guarda do perdigueiro os apetrechos de caça e o carro que<br />
eu usava para o esporte cinegético, um automóvel Ford, ano 1940. Então,<br />
ali eu embarcava, o disco voador partia velozmente para o alto, efetuava<br />
diversas evoluções, e, de lá de cima, olhando por uma escotilha, contemplava<br />
a paisagem da Terra. Então, o retorno. Muito feliz pela experiência,<br />
eu desembarcava da astronave, os tripulantes diziam-me adeus com largos<br />
acenos de mãos, partiam para o seu destino, e eu, atônito, mas de pé, via-me<br />
festivamente recepcionado pelo meu bom batedor de campos.<br />
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Antônio Nelso Tasca<br />
Até que um dia o caso<br />
aconteceu. Mas não do jeito que<br />
sempre imaginara, mas tudo muito<br />
diferente. Não ocorreu o fato<br />
numa linda manhã de Sol, mas<br />
nas primeiras horas de uma noite<br />
escura. Não vi um disco voador<br />
no meio de um sossegado campo<br />
de capim barba-de-bode, e sim ao<br />
longo de uma agitada estrada de<br />
asfalto. Também não me deparei<br />
com uma nave surgida de algum<br />
lugar do céu, pousada a poucos<br />
metros de mim, mas com o que<br />
imaginei ser um ônibus sombrio e<br />
silencioso, que se interpôs em meu<br />
caminho. Da mesma forma, não vi astronautas de porte elevado, sorridentes<br />
e trajando roupas alvas de metal, e falando uma língua estranha. O que vi foi<br />
uma mulher de pequena estatura, que usava um vestido de seda azul claro,<br />
de feição impassível e que falou comigo por telepatia.<br />
Também não tive um cachorro cortando campos e farejando perdizes,<br />
mas criaturas que me farejavam ganindo como um cão que geme<br />
baixinho. Não deixei meu carro, espingarda e cartucheira aos cuidados de<br />
qualquer cachorro perdigueiro. O que larguei foi um automóvel quase novo<br />
abandonado à beira da estrada. Não contemplei a Terra de lá do alto, e sim<br />
a fascinante mensageira de Agali, de algum ponto do fundo do mar. Não<br />
vi astronauta algum me dizendo adeus com acenos de mão, mas vi Cabalá<br />
apontando uma mão para o alto e transmitindo-me sentimentos de paz e<br />
de amor. Por fim, ao retornar a minha casa, não fui alegremente recebido<br />
pelo meu fiel batedor de campos e banhados, mas tive a mais comovente e<br />
lacrimosa acolhida de meus familiares e parentes…<br />
A numerosa e tradicional família Cella emprestou o seu nome à<br />
localidade em que se estabeleceu há muitos anos, bem como ao povoado<br />
a que ajudou a fundar, a 10 km da cidade de Chapecó, em Santa Catarina.<br />
Situado numa pequena elevação topográfica, onde a BR-282 possui um<br />
entroncamento de quatro vias, o vilarejo de Colônia Cella não só assiste a<br />
Arquivos do autor
Arquivos do autor<br />
Um Homem Marcado por ETs [Segunda edição]<br />
Antônio Nelso Tasca mostra o ponto exato em que surgiu a esteira de luz que<br />
foi até onde se encontrava, junto ao carro, ao fundo. A luz transportou-o até<br />
o veículo voador, estacionado mais à frente<br />
incessante movimentação de veículos que transportam cereais e produtos<br />
industrializados do oeste catarinense para os centros consumidores e exportadores<br />
do país, mas também contribui, ativa e vigorosamente, para a<br />
expansão da economia em que se firma a região: a agroindústria.<br />
Mas Colônia Cella é um lugar de pequenas propriedades rurais, com<br />
terras caríssimas e de quase nenhuma oferta de venda. Diante disso, a família<br />
de Pedro Cella – que sempre esteve em destacada posição no processo<br />
de produção e desenvolvimento agrícola local – decidiu expandir as suas<br />
atividades agropecuárias numa região promissora e de terras baratas. Por<br />
estas razões, Pedro comprou uma fazenda de considerável dimensão em<br />
Barreiras, no extremo oeste baiano, coincidentemente não muito longe<br />
de minha propriedade. Assim, nós, além de conterrâneos e amigos em<br />
Chapecó, também passamos a ser virtuais vizinhos de terras na Bahia. Naquele<br />
meado de dezembro, fazia poucos dias que meu filho Léo, também<br />
corretor de imóveis, viajara a Barreiras com dois sulistas interessados em<br />
adquirir terras. Eu fiquei em Chapecó a fim de cuidar de outros negócios,<br />
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Antônio Nelso Tasca<br />
mas certo de que, dentro de uma semana, também estaria naquele município<br />
para ultimar a transação imobiliária a que Léo acompanhava.<br />
Para o transporte particular de compradores de terras, meu veículo era<br />
uma brasília, ano 1981, de Barreiras. Como eu teria que viajar só – circunstância<br />
que não me agradava –, lembrei-me de que Pedro Cella talvez também<br />
necessitasse ir até àquele local, caso em que ele poderia viajar para lá em minha<br />
companhia. Disposto, pois, a oferecer-lhe carona, fui à sua casa, em Colônia<br />
Cella, naquele entardecer do dia 14 de dezembro de 1983. Mas ele não estava.<br />
Encontrava-se numa praia no litoral catarinense. Então, baldado o meu intento,<br />
retornei ao carro e tomei o caminho de regresso à cidade de Chapecó.<br />
Rumo àquela localidade, eis que, quando me encontrava a três quilômetros<br />
fora do vilarejo de Colônia Cella, nas proximidades da Indústria<br />
de Refrigerantes Coca-Cola, obedecendo a um comando estranho, saí da<br />
pista de rolamento para a parte contígua, à direita. Em conseqüência das<br />
grandes enchentes de julho daquele ano, o acostamento encontrava-se em<br />
péssimas condições. O veículo estremeceu fortemente à falta de revestimento<br />
e aos buracos que se sucediam naquela parte da estrada. Ali, dei-me<br />
conta de que estava fazendo algo absurdamente anormal. Mesmo assim,<br />
e sem atinar com o porquê daquilo, conduzi o carro um pouco mais até<br />
o ponto em que há um trevo de acesso à Granja Tozzo.<br />
Ali, senti-me inexplicavelmente impelido a entrar, à direita, parando<br />
a meia dúzia de metros da pista de asfalto. Então os faróis do veículo<br />
mostraram-me que, a 30 m daquele lugar, exatamente no ponto em que o<br />
citado trevo se bifurca, havia um ônibus branco-esverdeado, estacionado<br />
de través, com a parte interna iluminada, mas sem movimento de pessoas<br />
e de quaisquer outras coisas. À primeira vista pareceu-me um daqueles<br />
carros de transporte coletivo da extinta empresa Águia Branca, que era de<br />
Carazinho, no Rio Grande do Sul. No entanto, instantes depois, após um<br />
exame visual mais atento, depreendi que aquele “trem” não era um ônibus,<br />
porque não apresentava rodas, estava suspenso a um metro do solo, tinha<br />
formato circular e as suas bem visíveis oito, nove ou 10 janelas retangulares<br />
não escoavam a iluminação interna. Aquele objeto estava longe, muito longe<br />
de ser um ônibus convencional. Na verdade, era muito outra coisa…<br />
“É o bicho”, pensei, servindo-me do vocábulo popular que se equivale<br />
ao de “bicho-papão” – monstro imaginário com o qual antigamente se punha<br />
medo a crianças. A minha intenção, no entanto, foi a de dizer a mim mesmo
Um Homem Marcado por ETs [Segunda edição]<br />
que aquilo era um disco voador. Nunca tive e nem tenho a pretensão de ser<br />
mais homem do que os outros homens. Mas se a total ausência de medo<br />
diante de um objeto voador não identificado significa ser bem homem, então,<br />
modéstia à parte, eu o fui naquela inesquecível noite de 14 de dezembro de<br />
1983, porque, ao invés de sentir medo, experimentei um indubitável sentimento<br />
de satisfação. Estava realmente feliz pela oportunidade que tive, pois que há<br />
mais de 20 anos me interessava vivamente pelo assunto e sempre acalentava<br />
o desejo de encontrar-me com um disco voador.<br />
Uma esteira de luz e um túmulo de gelo<br />
Não hesitei. Desliguei a chave de ignição e as luzes do carro, e desembarquei.<br />
O escuro da noite permitiu-me ver mais nitidamente os contornos<br />
das janelas do disco voador. A iluminação interna não se projetava para fora.<br />
Não ouvi ruídos nem vozes. Não senti odores. De estranho ali só havia<br />
aquele “ônibus”. Curioso por ver e sentir, fechei a porta do automóvel e<br />
caminhei em direção à “coisa”, com a intenção de vê-la mais de perto, de<br />
ouvir-lhe possíveis ruídos e até mesmo de tocá-la com as minhas próprias<br />
mãos. Mas, ao percorrer de 10 ou 12 m, senti-me atingido por lufadas de<br />
calor que pareciam vir rolando pelo chão.<br />
Avancei mais um pouco e então senti que seria temeridade ir mais para<br />
frente, porque as silenciosas, mas sucessivas ondas de calor eram cada vez mais<br />
fortes. A prudência aconselhou-me a tomar cuidado. Retrocedi e voltei ao carro,<br />
decidido a assistir dali ao que viesse a acontecer depois. Tinha como certo<br />
que, mais cedo ou mais tarde, o disco voador decolaria, e eu, então, poderia<br />
contemplar o fato comodamente sentado no automóvel. No entanto, ao pôr<br />
a mão na maçaneta da porta do carro, um clarão repentino alertou-me de que<br />
algo mais estava acontecendo. E aconteceu: de sob o disco voador saiu uma bem<br />
delineada esteira de luz, com um metro de largura, de grande luminosidade. A<br />
esteira deslizou, por alongamento, até onde eu me encontrava, passou sob meus<br />
pés e, num ato contínuo, encolheu-se, carregando-me até o disco voador. Viajei<br />
de pé no luminoso tapete rolante. Mesmo diante da superfície irregular daquele<br />
pedaço de estrada de terra, a esteira de luz deslizou suavemente, sem trepidações,<br />
e tudo se realizou rapidamente – talvez em não mais de três segundos.<br />
Não me lembro como fui introduzido no disco voador, nem de ter<br />
visto porta ou qualquer outra forma de abertura. Lembro-me, sim, de que a<br />
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Antônio Nelso Tasca<br />
fuselagem do “ônibus” era fosca e não branco-esverdeada, como me parecera<br />
à primeira vista. E foi ali, a dois metros da nave, que eu, de pé sobre a estranha<br />
esteira de luz, perdi a noção dos acontecimentos – e também de mim próprio.<br />
De todos os episódios distintos do meu caso ufológico, este, sem dúvida<br />
alguma, é o que contém conotações dramáticas e aterradoras. Guardo a mais<br />
absoluta certeza de que não há neste mundo homem valoroso e destemido<br />
que não se entregue às mais grossas lágrimas e a um quebrantado desespero<br />
se passar pelos maus bocados pelos quais passei num recinto indefinido do<br />
disco voador, e a que convencionei denominar túmulo de gelo.<br />
Não sei quanto tempo depois do meu inexplicável ingresso na nave<br />
recobrei os sentidos. Senti-me estremunhado. Pareceu-me ter dormido um<br />
longo sono – um sono diferente, povoado de coisas difíceis. O ambiente estava<br />
escuro, terrivelmente escuro! Pode-se dizer que aquela escuridão era do mundo<br />
a maior, a mais espessa possível. Uma escuridão quase palpável. E fazia frio<br />
como nunca sentira antes, e que se tornava mais intenso a cada instante. E havia<br />
um silêncio ameaçador, pungente, esmagador! Então, passou-me pela mente<br />
conturbada a idéia de que seria o silêncio que, mais cedo ou mais tarde, desaba<br />
irrevogavelmente sobre os homens. No entanto, instantes depois constatei que<br />
aquele ainda não era o meu ininterrupto silêncio da eternidade, porque era quebrado<br />
e interrompido pela minha respiração ofegante, pelos meus chamados<br />
aflitivos e pelo meu choro desesperado.<br />
Deitado de costas numa estrutura plana e com a cabeça nesta apoiada,<br />
com os braços estirados e colados ao longo do corpo, as pernas estendidas e<br />
os pés unidos entre si. Ah, como me senti mal! Como me foi horrível aquela<br />
posição no túmulo de gelo. Procurei, então, mover o corpo, mas este não<br />
obedeceu à minha ordem cerebral. Só consegui mexer os pés para frente,<br />
como se ambos espremessem um pedal qualquer, e ali tocaram no que me<br />
pareceu ser uma parede fria e firme. Foi o bastante. Sim, o bastante para que<br />
eu fosse assaltado pela pavorosa idéia de que estava enterrado vivo. Liguei os<br />
acontecimentos de há pouco – o disco voador, o rapto pela esteira de luz, a<br />
perda dos sentidos – e concluí, a mil por hora, que eu teria sido encontrado<br />
aparentemente morto e, como tal, sepultado em um caixão convencional<br />
e em cuja exigüidade eu não podia, então, mover-me. E, para dar corpo e<br />
curso à tão macabra idéia, ainda havia ali quatro elementos inerentes ao<br />
mundo que cerca um cadáver humano condignamente entregue à sepultura:<br />
a escuridão, o silêncio, a imobilidade e o frio.
Um Homem Marcado por ETs [Segunda edição]<br />
Então, supondo que o meu caixão funerário estivesse colocado um<br />
tanto à flor da terra e na esperança de que ainda houvesse gente no cemitério,<br />
decidi-me a gritar por socorro: “Ei, tem gente aí? Alguém está me ouvindo?<br />
Ei, tirem-me daqui!” Porém, não pude continuar. Minha respiração tornou-se<br />
deficiente. Era difícil falar. Eu próprio não reconheci a minha voz. Desisti<br />
de pedir ajuda e tratei de enfrentar a morte da melhor maneira possível.<br />
Então, com a rapidez do raio, numa sucessão caleidoscópica, passou-me<br />
pela mente a imagem dos meus familiares. Vi-os, um por um, e por eles o<br />
amor e a saudade se projetaram no fundo da minha alma e me explodiu<br />
na garganta um choro de padecimento atroz. Pelo quanto me cabe, talvez<br />
tenha sido aquele o choro da suprema angústia humana.<br />
A sensação de se ver morrendo<br />
Oh, sim, é deveras terrível a convicção de que se está morrendo. A<br />
este respeito, e sem medo de exagerar, eu diria que o superlativo absoluto<br />
sintético aqui empregado não passa de simples eufemismo. Acho que os<br />
nossos lingüistas não criarão jamais os adjetivos imagéticos correspondentes<br />
ao desespero de um homem que agoniza conscientemente. E acho, ainda,<br />
que não há filólogo nem ninguém neste mundo que consiga as palavras<br />
necessárias para descrever, à altura da realidade, a angústia de constatar a<br />
convicção de que eu estava sepultado vivo.<br />
A pressão esmagadora do frio aumenta a olhos vistos. Aos poucos,<br />
sinto-me encerrado em um bloco de gelo. Debato-me para obter oxigênio para<br />
os pulmões, mas a respiração me é cada vez mais difícil. Não tenho dúvidas de<br />
que a morte me está a caminho e de que não tardará a chegar até aqui. Penso<br />
que sofreria menos se pudesse mover-me, sentar-me, agitar os braços e abrir<br />
as pernas. Já quase não respiro. A muito custo, recebo apenas um filete de ar<br />
para os pulmões. Resfolego, estertoro, agora já não sinto o corpo. Mas sinto<br />
que existo. Já não mais me oprime a pressão do frio, nem tenho necessidade<br />
de respirar. Que será isto? Será que morri? Mas como posso ter morrido se<br />
ainda delibero sobre mim? Estarei raciocinando pelo corpo etéreo? Então,<br />
assim sendo, até em outra vida há mistérios para a consciência humana?!<br />
Naquelas circunstâncias, vivi a sensação de estar perdido em todas as dimensões<br />
imagináveis, com exceção da do sentir espiritual. Era-me, aquela, uma<br />
situação paradoxal: eu existia, mas ao mesmo tempo não existia. Tinha certeza<br />
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Antônio Nelso Tasca<br />
de que tudo aquilo me advinha em razão de ter passado para outra existência<br />
– uma existência cujas energias não sabia dimensionar, definir suas formas,<br />
nem mesmo estabelecer-lhe um plano astral. É impossível para eu precisar<br />
quanto tempo permaneci naquele inexplicável estado de imponderabilidade,<br />
mas posso dizer como retornei à vida física. De maneira súbita, dei-me conta<br />
de que voltara ao meu corpo quando neste foi emitido um sinal de vida de<br />
que eu nunca ouvira falar: uma relampagueada quente na parte inferior do<br />
osso esterno. Lembro-me de que aquilo me causou uma sensação sumamente<br />
agradável. E foi a partir daquela sensação que, de maneira gradativa, mas<br />
relativamente rápida, meu corpo descongelou e minha respiração voltou à<br />
normalidade. Em seguida, como se eu fosse um relógio recém saído de uma<br />
eficiente oficina de consertos, meu coração batia ritmicamente, recebendo e<br />
bombeando sangue como se nada lhe houvesse acontecido.