Capítulo 6 - Descrição articulatória do português - FALE
Capítulo 6 - Descrição articulatória do português - FALE
Capítulo 6 - Descrição articulatória do português - FALE
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
C A P Í T U LO 6<br />
<strong>Descrição</strong> <strong>articulatória</strong><br />
<strong>do</strong> <strong>português</strong><br />
Introdução<br />
Há poucas descrições <strong>articulatória</strong>s <strong>do</strong> <strong>português</strong> brasileiro, baseadas<br />
em técnicas instrumentais. Entre outras, podemos citar Casaes, Cagliari,<br />
Matta Macha<strong>do</strong>, Reis e Antunes, Reis e Espesser, e Reis. 1 Apresentamos em<br />
seguida uma classificação <strong>articulatória</strong> <strong>do</strong>s fones <strong>do</strong> <strong>português</strong> brasileiro e<br />
discussão de alguns processos fonéticos e fonológicos.<br />
As vogais <strong>do</strong> <strong>português</strong><br />
O sistema fonológico <strong>do</strong> <strong>português</strong> possui 12 vogais: sete vogais orais<br />
/ / e cinco vogais nasais / /. Ao contrário <strong>do</strong><br />
francês, em que a nasalidade ocorre em vogais mais baixas, / /,<br />
no <strong>português</strong>, as vogais nasais são preferencialmente mais altas. Por essa<br />
razão, as vogais médias baixas não se nasalizam e a vogal baixa é a única<br />
que sofre forte modificação na apertura, quan<strong>do</strong> nasalizada, aproximan<strong>do</strong>-<br />
-se <strong>do</strong> nível de apertura das vogais médias altas.<br />
As vogais orais<br />
Zona de articulação<br />
As vogais orais <strong>do</strong> <strong>português</strong> podem ser classificadas, <strong>do</strong> ponto de vista<br />
fonético, no eixo horizontal, de acor<strong>do</strong> com a elevação máxima da língua,<br />
PRODUCAO_FALA_MIOLO_2011 .indd 163 17/4/2012 15:41:02
em vogais anteriores [ ], vogais centrais [ ] e vogais posteriores<br />
[ ] ou, com referência explícita a uma zona anatômica, em vogais<br />
palatais [ ] e vogais velares [ ]. A chamada vogal central baixa<br />
pode ser produzida na região palatal, como na palavra [] e na região<br />
velar, como em [] e, em alguns dialetos, como naqueles em que há<br />
a aproximante retroflexa []. Pode-se dizer que há uma simetria no<br />
sistema vocálico, quanto à zona de articulação.<br />
Figura 6.1 – Representação da apertura, zona de articulação e labialização <strong>do</strong>s sons vocálicos.<br />
A apertura<br />
No <strong>português</strong>, no eixo vertical, há quatro aperturas. A apertura é<br />
definida tradicionalmente como a distância entre o ponto mais alto da<br />
língua, no momento da articulação da vogal, e o palato, no local em<br />
que o canal bucal é mais estreito. As vogais podem assim ser classificadas,<br />
<strong>do</strong> ponto de vista fonético, em baixas [ ], semibaixas [ ],<br />
semialtas [ ] e altas [ ]. A apertura é fortemente<br />
controlada pelo acento primário, que provoca neutralização de<br />
oposição de apertura tanto em posição pretônica como postônica. 2 As<br />
vogais altas apresentam assim alofones mais baixos em posição átona.<br />
Da mesma forma a vogal mais baixa [a] sofre, inversamente, diminuição<br />
da apertura em posição átona e, em particular, quan<strong>do</strong> nasalizada 3<br />
(Figuras 6.2 e 6.3).<br />
164 <strong>Descrição</strong> <strong>articulatória</strong> <strong>do</strong> <strong>português</strong><br />
PRODUCAO_FALA_MIOLO_2011 .indd 164 17/4/2012 15:41:02
Figura 6.2 – Alofones das vogais altas.<br />
Figura 6.3 – Alofones da vogal baixa [a].<br />
Alain Marchal | César Reis 165<br />
PRODUCAO_FALA_MIOLO_2011 .indd 165 17/4/2012 15:41:03
Figura 6.4 – Vogais orais.<br />
A posição <strong>do</strong>s lábios<br />
Três graus de labialidade são suficientes para classificar as vogais <strong>do</strong><br />
<strong>português</strong>. As vogais [ ] são produzidas com os lábios estira<strong>do</strong>s.<br />
Esses fones são considera<strong>do</strong>s não labializa<strong>do</strong>s; as vogais [ ]<br />
são protrusas, porque os lábios estão projeta<strong>do</strong>s para frente, toman<strong>do</strong> uma<br />
forma arre<strong>do</strong>ndada pela aproximação das comissuras labiais; nas vogais<br />
baixas [ ] não há participação ativa <strong>do</strong>s lábios. A labialidade pode ser<br />
considerada, <strong>do</strong> ponto de vista fonológico, um traço redundante no <strong>português</strong>,<br />
enquanto que, no francês, é fonologicamente distintiva, poden<strong>do</strong>-se<br />
distinguir três graus de labialidade: [ ], produzidas com os lábios<br />
estira<strong>do</strong>s, [ ], com ligeira projeção labial, e [ ], com avanço e<br />
arre<strong>do</strong>ndamento importante <strong>do</strong>s lábios.<br />
Colocan<strong>do</strong>-se num gráfico as vogais segun<strong>do</strong> sua disposição nos eixos<br />
ântero-posterior e vertical, obtém-se o trapézio articulatório das vogais. As<br />
três vogais mais extremas, / /, constituem o “triângulo de Hellwag”.<br />
Considera-se que essas três vogais são existentes em todas as línguas <strong>do</strong><br />
mun<strong>do</strong>.<br />
166 <strong>Descrição</strong> <strong>articulatória</strong> <strong>do</strong> <strong>português</strong><br />
PRODUCAO_FALA_MIOLO_2011 .indd 166 17/4/2012 15:41:04
Essas diferenças <strong>articulatória</strong>s podem ser também representadas acusticamente<br />
(Figura 6.5). F1 está correlaciona<strong>do</strong> com a apertura e F2 com a<br />
zona de articulação. 4<br />
Figura 6.5 – Espectrograma das vogais orais <strong>do</strong> <strong>português</strong> brasileiro (um locutor masculino).<br />
Quadro 6.1<br />
Formantes 5 (F1, F2 e F3, valores em Hz)<br />
das vogais orais da Figura 6.5<br />
Formantes Vogais<br />
[] [] [] [] [] [] []<br />
F1 210 290 384 560 520 400 263<br />
F2 2030 1950 1790 1380 990 1570 1670<br />
F3 3120 2620 2600 2500 2440 2830 2870<br />
Alain Marchal | César Reis 167<br />
PRODUCAO_FALA_MIOLO_2011 .indd 167 17/4/2012 15:41:04
As vogais nasais<br />
Quan<strong>do</strong> o véu palatino se abaixa, uma parte <strong>do</strong> ar fonatório passa<br />
pela cavidade nasal, acrescentan<strong>do</strong> uma ressonância nasal à ressonância<br />
orofaríngea. Contrariamente ao francês, em que a posição da língua é aproximadamente<br />
a mesma tanto para vogais orais como para vogais nasais,<br />
no <strong>português</strong>, isso vale para as vogais altas e semialtas, mas a vogal baixa<br />
sofre uma importante modificação na sua apertura, passan<strong>do</strong> de baixa<br />
[] para uma qualidade próxima da semialta []. Cagliari, 6 Matta<br />
Macha<strong>do</strong>, 7 Medeiros e Demolin, 8 realizaram estu<strong>do</strong>s articulatórios sobre<br />
a nasalidade <strong>do</strong> <strong>português</strong>, haven<strong>do</strong> também estu<strong>do</strong>s fonológicos sobre as<br />
vogais nasais <strong>do</strong> <strong>português</strong> (Mattoso Câmara Jr.; 9 Mattoso Câmara Jr.; 10<br />
Abaurre; 11 Nobling; 12 Bisol 13 ) (Figura 6.6).<br />
] ] <br />
] ] <br />
] ] <br />
Figura 6.6 – Diagrama das vogais nasais (adapta<strong>do</strong> de Matta Macha<strong>do</strong>, 1981).<br />
168 <strong>Descrição</strong> <strong>articulatória</strong> <strong>do</strong> <strong>português</strong><br />
] ] <br />
] ] <br />
Além da nasalidade fonológica que opõe os pares []\[]<br />
(mu<strong>do</strong>/mun<strong>do</strong>), []\[] (li<strong>do</strong>/lin<strong>do</strong>), []\[] (ce<strong>do</strong>/sen<strong>do</strong>),<br />
[]\[] (lobo/lombo), []\[] (babo/bambo), uma nasalidade<br />
fonética nasaliza vogais que precedem consoantes nasais. Ainda aqui o acento<br />
primário pode intervir, distinguin<strong>do</strong> dialetos que só nasalizam vogal em<br />
posição tônica daqueles em que o acento não restringe a aplicação da regra.<br />
Sen<strong>do</strong> assim, em alguns dialetos, teremos [], [], []<br />
(chama, famoso, banana), noutros [], [], []. Em um<br />
único condicionamento morfofonológico, numa assimilação progressiva,<br />
PRODUCAO_FALA_MIOLO_2011 .indd 168 17/4/2012 15:41:05
a vogal pode nasalizar a consoante oclusiva alveolar vozeada. Isso acontece<br />
no gerúndio: [], [] (falan<strong>do</strong>, mancan<strong>do</strong>) que são pronunciadas<br />
[], []. Também numa assimilação progressiva, a consoante<br />
nasal pode nasalizar a vogal que se segue, normalmente antes de pausa<br />
(ex.: []). 14<br />
Figura 6.7 – Vogais nasais.<br />
Observa-se uma variação dialetal da nasalidade no <strong>português</strong> <strong>do</strong> Brasil,<br />
em que os dialetos <strong>do</strong> sul, provavelmente a partir de São Paulo, apresentam<br />
uma ressonância nasal mais breve ou completa desnasalização. Cagliari 15<br />
registrou, no dialeto paulista, a pronúncia da palavra [], no lugar de<br />
[] (cama), isto é, conserva-se a qualidade da vogal, desnasalizan<strong>do</strong>-a.<br />
Fenômeno semelhante, ou um perío<strong>do</strong> reduzi<strong>do</strong> de nasalização, que ainda<br />
não foi estuda<strong>do</strong>, pode ser uma característica de dialetos <strong>do</strong> sul <strong>do</strong> Brasil.<br />
Em dialetos de São Paulo, observa-se, também, a ditongação da vogal nasal<br />
anterior semifechada, [] (enten<strong>do</strong>). Não há ainda uma descrição<br />
fonética dessa ditongação das vogais nasais <strong>do</strong> <strong>português</strong> brasileiro.<br />
Alain Marchal | César Reis 169<br />
PRODUCAO_FALA_MIOLO_2011 .indd 169 17/4/2012 15:41:06
As vogais nasais são de difícil descrição acústica. Apresentam queda<br />
global de intensidade, enfraquecimento de F1 e a presença de formantes<br />
nasais (Figura 6.8).<br />
Além <strong>do</strong> deslocamento de formantes das vogais orais correspondentes,<br />
podem-se observar três outros fenômenos na espectrografia das vogais nasais:<br />
a) baixa na intensidade global <strong>do</strong>s formantes da vogal; b) presença de<br />
zonas de antirressonância (por ex.: na vogal [], formante nasal na altura <strong>do</strong>s<br />
2000 Hz e, logo acima, uma antirressonância na altura de 2490 Hz; na vogal<br />
[], formante nasal na altura de 1070 Hz); e c) presença de formantes nasais.<br />
Figura 6.8 – Espectrograma das vogais nasais <strong>do</strong> <strong>português</strong> brasileiro (um locutor masculino).<br />
Quadro 6.2<br />
Formantes F1, F2 e F3 (valores em Hz)<br />
das vogais nasais da Figura 6.8<br />
Formantes Vogais<br />
170 <strong>Descrição</strong> <strong>articulatória</strong> <strong>do</strong> <strong>português</strong><br />
[] [] [] [] []<br />
F1 260 300 370 340 350<br />
F2 2270 2040 790 2140 1390<br />
F3 3140 2700 2990 3200 2730<br />
PRODUCAO_FALA_MIOLO_2011 .indd 170 17/4/2012 15:41:06
Os ditongos<br />
Além das vogais com uma única qualidade, os monotongos, o <strong>português</strong><br />
possui, também, vogais com duas qualidades, os ditongos. Há restrições<br />
quanto a possíveis combinações de qualidades vocálicas para os ditongos: a<br />
qualidade vocálica inicial ou a final deve tender para uma apertura menor.<br />
Sen<strong>do</strong> assim, pode-se ter um início alto palatal (ex.: [] (estacionar))<br />
ou um início alto velar (ex.: [] (enxaguar)). Da mesma forma,<br />
o final pode tender para uma apertura alta palatal (ex.: [] (pai)) ou para<br />
uma apertura alta velar (ex.: [] (pau)). Os ditongos que se iniciam com<br />
uma qualidade fechada são chama<strong>do</strong>s de ditongos crescentes e os ditongos<br />
que terminam com uma qualidade fechada são chama<strong>do</strong>s de decrescentes.<br />
Mattoso Câmara Jr. 16 e Bisol17 consideram que os verdadeiros ditongos são<br />
os decrescentes, pois os crescentes variam livremente com o hiato (ex.:<br />
[]\[] (vigia<strong>do</strong>), []\[] (atuação)). Deve-se,<br />
entretanto, observar que os ditongos decrescentes também variam com os<br />
monotongos (ex.: []\[], []\[] (cadeira, roupa)) e<br />
que alguns monotongos também tendem a variar com ditongos, sobretu<strong>do</strong><br />
em palavras oxítonas, em alguns dialetos (ex.: []\[], []\<br />
[], []\[], []\[] (arroz, três, nascer, <strong>do</strong>ze). Além<br />
disso, tanto o ditongo decrescente pode variar com hiato como o ditongo<br />
crescente variar, embora raramente, com monotongo (ex.: []\<br />
[]; []\[] (traição, questão)). 18,19<br />
Há, também, ditongos nasais decrescentes, [ ], [ ], [ ], [ ],<br />
[] (mãe, feijão, põe, sem) e crescentes, [], [] (quan<strong>do</strong>,<br />
aguenta). 20 São considera<strong>do</strong>s tritongos sequências de semivogal + vogal +<br />
semivogal (ex.: []; [] (qual, saguão)) (Figura 6.9).<br />
<br />
Figura 6.9 – Ditongos orais, nasais e tritongo <strong>do</strong> <strong>português</strong> brasileiro (um locutor masculino).<br />
Alain Marchal | César Reis 171<br />
PRODUCAO_FALA_MIOLO_2011 .indd 171 17/4/2012 15:41:07
Quadro 6.3<br />
Formantes (F1 e F2, início e final) <strong>do</strong>s ditongos orais, nasais.<br />
Para o tritongo, F1 e F2 inicial, medial e final.<br />
Valores para os ditongos orais e nasais e tritongo da Figura 6.9<br />
Formantes Vogais<br />
[] [] [] [] []<br />
F1 380 - 280 630 - 440 620 - 380 640 - 400 420 - 740 - 500<br />
F2 1800 - 1980 1050 - 770 1480 - 1820 1200 - 1090 620 - 1320 - 1920<br />
As consoantes <strong>do</strong> <strong>português</strong><br />
As consoantes são produzidas pela realização de algum obstáculo à<br />
passagem <strong>do</strong> ar fonatório. Obstáculo esse que pode ser total ou parcial.<br />
Quan<strong>do</strong> a passagem <strong>do</strong> ar é completamente entravada, ocorre um tipo<br />
de consoante denomina<strong>do</strong> de oclusiva. Num outro mo<strong>do</strong> de produção,<br />
em que a obstrução não é total, não haven<strong>do</strong> interrupção da passagem <strong>do</strong><br />
ar, a classe de fones produzida depende <strong>do</strong> tipo de obstrução e de fatores<br />
aerodinâmicos, conforme veremos abaixo.<br />
As consoantes oclusivas<br />
No nível fonológico, existem 10 consoantes oclusivas em <strong>português</strong>:<br />
sete oclusivas orais [ ] e três oclusivas nasais [ ]. As consoantes<br />
[ ], [ ] e [ ] são chamadas de consoantes homorgânicas<br />
porque são articuladas pelo mesmo órgão, no mesmo ponto de articulação.<br />
As consoantes <strong>do</strong> primeiro grupo são bilabiais, as <strong>do</strong> segun<strong>do</strong> grupo, dentais<br />
ou alveolares e, finalmente, as <strong>do</strong> último grupo são <strong>do</strong>rsovelares. As dentais<br />
ou alveolares podem ser apicodentais, laminodentais ou interdentais,<br />
apicoalveolares, laminoalveolares.<br />
As consoantes oclusivas apresentam três fases <strong>articulatória</strong>s: a intensão,<br />
a tensão e a distensão. A intensão corresponde aos movimentos <strong>do</strong>s articula<strong>do</strong>res<br />
na direção <strong>do</strong> alvo, que é uma obstrução; a tensão, ao intervalo<br />
de tempo durante o qual os articula<strong>do</strong>res mantêm uma obstrução total e a<br />
distensão corresponde ao afastamento brusco <strong>do</strong>s articula<strong>do</strong>res em busca de<br />
172 <strong>Descrição</strong> <strong>articulatória</strong> <strong>do</strong> <strong>português</strong><br />
PRODUCAO_FALA_MIOLO_2011 .indd 172 17/4/2012 15:41:07
novo alvo articulatório ou <strong>do</strong> repouso. Do ponto de vista da aerodinâmica,<br />
em decorrência da obstrução no conduto vocal, o ar acumula-se durante o<br />
perío<strong>do</strong> de tensão, provocan<strong>do</strong> um aumento da pressão intraoral. Com a<br />
soltura brusca, o movimento <strong>do</strong> ar fonatório provoca um ruí<strong>do</strong> de explosão.<br />
Dependen<strong>do</strong> da sua posição na palavra e <strong>do</strong> contexto fonético, certas<br />
consoantes oclusivas não possuem necessariamente as três fases. No <strong>português</strong>,<br />
ao contrário <strong>do</strong> inglês e <strong>do</strong> francês, por exemplo, há uma tendência<br />
para se manter as três fases da oclusiva. O caso mais comum, em que a fase<br />
de distensão pode desaparecer, é quan<strong>do</strong> a oclusiva se encontra no meio<br />
da palavra, seguida por outra oclusiva [].<br />
As oclusivas orais<br />
[ ] e [ ] distinguem-se pelo vozeamento. Durante a tensão<br />
de [ ], as pregas vocais vibram, enquanto que em [ ], o ar passa<br />
entre as pregas vocais afastadas. No caso <strong>do</strong> tapa, [], 21 o vozeamento não<br />
é distintivo e depende <strong>do</strong> contexto fonético. Trata-se de um fonema que<br />
possui, normalmente, uma variante aproximante e uma variante fricativa.<br />
As oclusivas nasais<br />
Na realização de oclusivas nasais, como [ ], o véu palatino está<br />
abaixa<strong>do</strong>. Como há oclusão <strong>do</strong> conduto vocal no nível da cavidade bucal,<br />
o ar fonatório escapa pela cavidade nasal, provocan<strong>do</strong> uma ressonância<br />
nasal. Isso impede a ocorrência <strong>do</strong> ruí<strong>do</strong> de explosão, uma vez que, com<br />
a abertura da passagem velofaríngea, a pressão intraoral é muito fraca. As<br />
oclusivas nasais são normalmente vozeadas.<br />
Da série de oclusivas nasais, a consoante [] é a menos frequente e a<br />
que mais sofre modificações <strong>articulatória</strong>s. Palatal na articulação cuidada, é<br />
normalmente pronunciada pós-palatal, haven<strong>do</strong>, também, articulação pós-<br />
-alveolar ou pré-palatal [] (ex.: []) ou aproximante palatal nasal []<br />
(ex.: []), por um processo de enfraquecimento. Registro palatográfico<br />
(p. 238) mostra que também pode ser pós-palatal.<br />
As fricativas<br />
Em <strong>português</strong>, existem sete consoantes fricativas, fonologicamente<br />
distintas [ ] e o “r”. O “r” representa uma classe de sons fricativos,<br />
Alain Marchal | César Reis 173<br />
PRODUCAO_FALA_MIOLO_2011 .indd 173 17/4/2012 15:41:07
que se estende <strong>do</strong> ponto velar até o glotal, incluin<strong>do</strong>-se, também nessa<br />
categoria, o tapa e sua variante fricativa. A escolha <strong>do</strong> ponto de articulação<br />
e <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> da glote vai depender de fatores contextuais ou dialetais. O<br />
traço de vozeamento distingue as fricativas labiodentais / / (ex.: []\<br />
[] (faca, vaca)), as laminoalveolares / / (ex.: []\[] (selo,<br />
zelo)) e as pós-alveolares / / (ex.: []\[] (chato, jato)). As fricativas<br />
/ / são as únicas que apresentam projeção <strong>do</strong>s lábios. Em posição<br />
de coda, há neutralização <strong>do</strong> vozeamento (ex.: []\[]\<br />
[]\[] (as costas, as alas, as tuas, as duas). Nas fricativas<br />
<strong>do</strong> grupo “r”, o vozeamento é contextual (ex.: []\[]\<br />
[]\[] (martelo, amargo, carpa, carga)).<br />
As laterais<br />
As consoantes / / são descritas como laterais, porque, embora haja<br />
uma obstrução central, o ar escapa pela borda da língua. A lateral ápico-<br />
-alveolar apresenta duas variantes contextuais, na posição de coda: na maioria<br />
<strong>do</strong>s dialetos, é a semivogal posterior (ex.: []/[]) (males, mal)),<br />
mas sobretu<strong>do</strong> em dialetos <strong>do</strong> sul, é uma lateral velarizada (ex.: []/<br />
[] (sulista, sul)). Assim como acontece com a nasal palatal, [], também a<br />
lateral palatal possui variantes: uma alveolar palatalizada, que corresponde<br />
a uma produção lâmino-pós-alveolar (ex.: []), uma aproximante palatal<br />
(ex.: [] (filha)), a lateral ápico-alveolar (ex.: []), além da lateral<br />
palatal, no estilo culto ou formal (ex.:[] (mulher)).<br />
As semivogais<br />
As semivogais correspondem à apertura mais fechada <strong>do</strong> ditongo.<br />
Nos ditongos decrescentes, vamos preferir o termo semivogais, enquanto<br />
que nos ditongos crescentes, semiconsoantes, em razão das características<br />
fonéticas desses segmentos. As semiconsoantes [ ] constituem, numa<br />
terminologia mais recente, a classe das aproximantes. 22 Pela sua apertura<br />
(apertura 6), encontram-se na fronteira entre o som vocálico e o som<br />
consonantal. Correspondem articulatoriamente às vogais [] e [], isto é,<br />
[] é produzida com uma rápida aproximação <strong>do</strong> <strong>do</strong>rso da língua no nível<br />
<strong>do</strong> palato duro, enquanto [] é produzida com uma rápida aproximação<br />
174 <strong>Descrição</strong> <strong>articulatória</strong> <strong>do</strong> <strong>português</strong><br />
PRODUCAO_FALA_MIOLO_2011 .indd 174 17/4/2012 15:41:07
<strong>do</strong> <strong>do</strong>rso da língua no nível <strong>do</strong> palato mole, ocorren<strong>do</strong>, neste último caso,<br />
simultaneamente, uma projeção <strong>do</strong>s lábios. Constituem variantes das<br />
vogais altas (ex.: []\[], []\[] (piedade,<br />
voa<strong>do</strong>r, coa<strong>do</strong>r)). O acento secundário pode ser um fator nesse processo de<br />
variação. A semiconsoante velar ocorre normalmente precedida de oclusiva<br />
velar (Figura 6.10).<br />
Figura 6.10 – Imagens palatográficas de fones consonantais <strong>do</strong> <strong>português</strong> (Reis e Antunes 23 ).<br />
A apertura<br />
Nas vogais, a apertura é determinada pelo ponto mais eleva<strong>do</strong> da língua,<br />
definida pelos eixos horizontal e vertical. Nas consoantes, a apertura<br />
designa a largura mínima <strong>do</strong> canal no ponto de articulação.<br />
Alain Marchal | César Reis 175<br />
PRODUCAO_FALA_MIOLO_2011 .indd 175 17/4/2012 15:41:09
Seguin<strong>do</strong> essas definições, propomos a seguir um quadro com os graus<br />
de apertura de vogais e consoantes <strong>do</strong> <strong>português</strong>.<br />
0. [] [] []<br />
[] [] []<br />
1. [] [] []<br />
2. [] [] [] [] []<br />
3. [] [] [] [] []<br />
4. [] []<br />
5. [] []<br />
6. [] []<br />
7. [] [] [] []<br />
8. [] [] [] [] []<br />
9. [] []<br />
10. [] []<br />
A força <strong>articulatória</strong><br />
Uma consoante pronunciada energicamente apresenta um contato<br />
mais largo que a mesma consoante pronunciada fracamente. Isso porque<br />
a língua se levanta mais, aderin<strong>do</strong> mais intimamente à abóbada palatina.<br />
Ao contrário, na consoante pronunciada com mais frouxidão, o contato<br />
no palato se estreita, a língua sobe menos, de forma que a pressão contra<br />
a região alveolar e palatal diminui.<br />
Classificação das consoantes<br />
Vários foneticistas 24 propõem uma classificação das consoantes, de acor<strong>do</strong><br />
com a força de articulação. Trata-se de uma noção de difícil definição, 25<br />
referin<strong>do</strong>-se, segun<strong>do</strong> os autores, à energia muscular, à tensão <strong>do</strong>s órgãos<br />
176 <strong>Descrição</strong> <strong>articulatória</strong> <strong>do</strong> <strong>português</strong><br />
PRODUCAO_FALA_MIOLO_2011 .indd 176 17/4/2012 15:41:09
fona<strong>do</strong>res ou ainda à energia total mobilizada na sua produção. Como essa<br />
classificação não foi feita para o <strong>português</strong>, apresentamos a classificação<br />
feita para o francês, que serve, pelo menos, como uma primeira proposta<br />
para o <strong>português</strong>.<br />
Variação da força <strong>articulatória</strong> consonântica<br />
A posição inicial de sílaba é a mais forte; a posição intervocálica é menos<br />
forte, em razão da assimilação de apertura das vogais adjacentes. A posição<br />
final de sílaba é fraca, e se a consoante é implosiva, é ainda mais fraca.<br />
Força <strong>articulatória</strong> vocálica<br />
diante de consoante<br />
Os palatogramas mostram que uma vogal pronunciada com energia<br />
abre-se com relação à vogal pronunciada mais fracamente, isto é, o contato<br />
observa<strong>do</strong> no palato diminui. O abaixamento da língua na vogal forte<br />
opõe-se diametralmente ao comportamento da língua na pronúncia de<br />
consoantes fortes. Podemos, então, concluir que sons vocálicos são sons<br />
da fala que tendem à abertura, enquanto que os sons consonantais tendem<br />
ao fechamento (Figura 6.11).<br />
Figura 6.11 – Comportamento das vogais e consoantes sob o efeito da força de articulação.<br />
Alain Marchal | César Reis 177<br />
PRODUCAO_FALA_MIOLO_2011 .indd 177 17/4/2012 15:41:09
As modificações das articulações<br />
Apresentamos até aqui os diferentes fones <strong>do</strong> <strong>português</strong> pronuncia<strong>do</strong>s<br />
isoladamente. Não se deve concluir, entretanto, que os fones <strong>do</strong> <strong>português</strong><br />
serão sempre idênticos à descrição proposta, pois, quan<strong>do</strong> se encontram<br />
na cadeia falada, sofrem certo número de modificações, em decorrência<br />
da vizinhança fônica, de aspectos prosódicos, sociolinguísticos, dialetais e<br />
individuais. Parte desses fenômenos é tratada com mais detalhe no capítulo<br />
sobre a produção da fala. Próximos ou em contato direto, por exemplo,<br />
os fones influenciam-se mutuamente, poden<strong>do</strong> trocar ou modificar uma<br />
ou várias de suas características. É o caso da oclusiva velar, que tem o seu<br />
ponto de articulação velar avança<strong>do</strong> para a região pós-palatal, quan<strong>do</strong><br />
seguida da vogal anterior [].<br />
O estu<strong>do</strong> <strong>do</strong>s fatos fonéticos que ocorrem na cadeia da fala recobre os<br />
fenômenos de coarticulação, estuda<strong>do</strong>s pela fonética, e pelos fenômenos<br />
fonotáticos, que interessa à fonologia.<br />
Quan<strong>do</strong> as modificações são causadas por razões físicas (inércia <strong>do</strong>s<br />
órgãos articulatórios, tempo de reação <strong>do</strong>s coman<strong>do</strong>s e tempo de deslocamento<br />
<strong>do</strong>s articula<strong>do</strong>res), trata-se de mecanismos essencialmente fonéticos,<br />
enquanto que as mudanças linguísticas serão expressas por meio de<br />
formalizações fornecidas pela fonologia.<br />
Na prática, é muitas vezes difícil delimitar os <strong>do</strong>mínios respectivos da<br />
fonética e da fonologia, porque uma restrição de tipo articulatório pode<br />
acabar sen<strong>do</strong> explorada para fins linguísticos (como é o caso das vogais<br />
nasais em <strong>português</strong> e em francês).<br />
Trataremos abaixo <strong>do</strong>s principais fenômenos de modificação das articulações<br />
em razão da força de articulação e <strong>do</strong> contexto.<br />
Papel da força de articulação<br />
Força<br />
Oclusivas<br />
A elevação da língua é mais importante e traduz-se por um fortalecimento<br />
e alargamento <strong>do</strong> contato na oclusão. Nas consoantes anteriores,<br />
a maior força provoca um alargamento na direção posterior, haven<strong>do</strong><br />
178 <strong>Descrição</strong> <strong>articulatória</strong> <strong>do</strong> <strong>português</strong><br />
PRODUCAO_FALA_MIOLO_2011 .indd 178 17/4/2012 15:41:10
tendência à palatalização. Nas consoantes posteriores, o movimento se<br />
traduz pelo avanço da oclusão, o contato se desloca para a região <strong>do</strong><br />
palato duro.<br />
Fricativas<br />
A maior força de articulação provoca um maior estreitamento da<br />
constrição. Quan<strong>do</strong> a força é muito grande, os contatos laterais podem se<br />
unir, ten<strong>do</strong> como resulta<strong>do</strong> uma verdadeira oclusiva ou africada.<br />
O enfraquecimento<br />
Oclusivas<br />
O enfraquecimento da articulação tem como resulta<strong>do</strong> um abaixamento<br />
da língua. Na consoante anterior, o contato da oclusão diminui na frente;<br />
na consoante posterior, o contato da oclusão recua. O enfraquecimento <strong>do</strong><br />
contato da oclusão pode chegar à ruptura da oclusão.<br />
Fricativas<br />
O abaixamento da língua provoca um estreitamento <strong>do</strong>s contatos<br />
laterais nas fricativas produzidas com a língua.<br />
Nos casos de um enfraquecimento maior, pode haver o desaparecimento<br />
<strong>do</strong>s contatos e de toda a articulação consonântica.<br />
Quadro 6.4<br />
Fonemas consonantais <strong>do</strong> <strong>português</strong><br />
Alain Marchal | César Reis 179<br />
PRODUCAO_FALA_MIOLO_2011 .indd 179 17/4/2012 15:41:10
A influência <strong>do</strong> contexto vocálico<br />
Velarização<br />
A velarização consiste em um recuo da articulação da consoante que<br />
pode ocorrer no contexto de uma vogal posterior. Em alguns casos, o contato<br />
para a consoante se faz simultaneamente com uma ligeira elevação<br />
<strong>do</strong> <strong>do</strong>rso da língua.<br />
Labialização<br />
A projeção e o arre<strong>do</strong>ndamento <strong>do</strong>s lábios ou labialização que<br />
acompanha a produção de vogais arre<strong>do</strong>ndadas provocam a labialização<br />
da consoante ou consoantes que se encontram na mesma sílaba. As consoantes<br />
fricativas / / são as únicas que labializam a vogal que se segue.<br />
Palatalização<br />
A palatalização é um alargamento <strong>do</strong> contato <strong>do</strong> <strong>do</strong>rso da língua na<br />
direção <strong>do</strong> palato duro, seja para consoantes anteriores como posteriores,<br />
o que pode resultar em mudança <strong>do</strong> ponto de articulação na direção <strong>do</strong><br />
palato duro.<br />
No <strong>português</strong>, o processo de palatalização das oclusivas alveolares<br />
no contexto da vogal alta anterior é que iniciou o processo de africatização:<br />
[] [], [], [] (tela, tu<strong>do</strong>, deli, <strong>do</strong>ca), mas [] e []<br />
(tia, dia). O que ocorre também a partir de processos morfológicos (ex.:<br />
[]\[] e []\[] (morta, morte, corda, cordinha)).<br />
Os processos de palatalização mais frequentes ocorrem com a nasal e lateral<br />
pós-alveolares, que substituem as palatais correspondentes [] em vez<br />
de [] [] (olho, companhia) em vez de [], surgin<strong>do</strong> daí<br />
uma oposição entre alveolar e pós-alveolar. Ocorre, também com a fricativa<br />
alveolar, em posição de coda, seguida por africadas e fricativas pós-alveolares<br />
[], [] 26 (poste, as chaves) e em posição postônica seguida de<br />
vogal alta ([] (posse)).<br />
Como mostramos acima para o <strong>português</strong>, o processo de palatalização<br />
pode ser o início de um processo de mudança sonora. No caso <strong>do</strong> <strong>português</strong>,<br />
as oclusivas alveolares mudam para africadas, quan<strong>do</strong> seguidas de<br />
vogal alta. No francês canadense acontece fenômeno pareci<strong>do</strong>: há também<br />
africatização, mas o ponto permanece alveolar [] (tu), [] (dictée). 27<br />
180 <strong>Descrição</strong> <strong>articulatória</strong> <strong>do</strong> <strong>português</strong><br />
PRODUCAO_FALA_MIOLO_2011 .indd 180 17/4/2012 15:41:10
As assimilações consonânticas<br />
A assimilação consonântica designa a mudança fonética que sofre<br />
uma consoante em contato com outra consoante. A consoante mais forte<br />
transmite, parcialmente ou totalmente, uma ou várias de suas particularidades<br />
fonéticas. 28 Essa mudança assimilatória pode se exprimir pela<br />
transferência de traços fonéticos ou de traços fonológicos. A assimilação<br />
consonântica caracteriza-se pelo tipo de assimilação e pela direção <strong>do</strong><br />
processo assimilatório.<br />
A direção da assimilação<br />
A assimilação progressiva<br />
A assimilação se produz da esquerda para a direita, isto é, um fone<br />
modifica o fone que se segue imediatamente. Nos <strong>do</strong>is primeiros exemplos,<br />
trata-se de assimilação de vozeamento e, nos <strong>do</strong>is últimos, de nasalidade<br />
(ex. [], [], [], [] (bloco, placa, uma, andan<strong>do</strong>)).<br />
Assimilação regressiva<br />
A assimilação pode ser o resulta<strong>do</strong> de uma antecipação <strong>articulatória</strong>.<br />
A consoante “programada” influencia a consoante realizada antes dela.<br />
A modificação acontece então da direita para a esquerda. É o processo<br />
assimilatório mais frequente no <strong>português</strong>. Assimilação de vozeamento no<br />
primeiro par de palavras e de nasalidade no segun<strong>do</strong>, sen<strong>do</strong> que a assimilação<br />
de nasalidade acontece apenas na sílaba tônica na maioria <strong>do</strong>s dialetos<br />
(ex.: []\[] e []\[] (mesmo, cesto e canal, cano)).<br />
No primeiro caso, há uma assimilação de vozeamento e, no segun<strong>do</strong>,<br />
assimilação de nasalidade.<br />
Assimilação retroprogressiva<br />
Quan<strong>do</strong> uma consoante influencia tanto a consoante que precede<br />
quanto a consoante que se segue, fala-se, então, de assimilação retroprogressiva,<br />
como no caso de [] (as claras), em que a consoante<br />
oclusiva determina o vozeamento ou não <strong>do</strong> fone que precede e que se<br />
segue.<br />
Alain Marchal | César Reis 181<br />
PRODUCAO_FALA_MIOLO_2011 .indd 181 17/4/2012 15:41:10
Tipos de assimilação<br />
A natureza <strong>do</strong> traço modifica<strong>do</strong> pela assimilação define o tipo de<br />
assimilação. Os tipos mais comuns são de nasalidade, desvozeamento e<br />
vozeamento.<br />
A assimilação de vozeamento<br />
A assimilação de vozeamento consiste na transferência <strong>do</strong> traço de<br />
vozeamento de uma consoante vozeada para uma consoante não vozeada<br />
ou uma consoante não marcada para o traço de vozeamento. No <strong>português</strong>,<br />
esse fenômeno é regressivo no contexto da fricativa em posição de coda e<br />
é progressivo em grupo consonantal em posição de ataque (ex.: []<br />
[] (corda, bloco)).<br />
A assimilação de não vozeamento<br />
ou desvozeamento<br />
Quan<strong>do</strong> a consoante não vozeada e uma consoante vozeada ou<br />
não marcada para o traço de vozeamento estão em contato, fala-se de<br />
assimilação de não vozeamento ou de desvozeamento 29 (ex.: []<br />
[] (festa, trato)).<br />
A assimilação de nasalidade<br />
Na produção da consoante nasal, o véu palatino se abaixa. Se esse<br />
abaixamento acontece mais ce<strong>do</strong>, ocorre a nasalização parcial ou total da<br />
consoante que precede a consoante nasal. É a assimilação regressiva de<br />
nasalidade. Observa-se uma assimilação de nasalidade no francês, []<br />
(cadenas), que se pronuncia [] e [)], que se pronuncia []<br />
(maintenant).<br />
No <strong>português</strong> ocorre uma assimilação progressiva, principalmente no<br />
dialeto mineiro, da consoante alveolar [d], no contexto sufixo de gerúndio<br />
(ex.: []\[]; []\[] (falan<strong>do</strong>, andan<strong>do</strong>)).<br />
182 <strong>Descrição</strong> <strong>articulatória</strong> <strong>do</strong> <strong>português</strong><br />
PRODUCAO_FALA_MIOLO_2011 .indd 182 17/4/2012 15:41:10
A assimilação vocálica<br />
A nasalização<br />
O fenômeno de nasalização não afeta apenas as consoantes. As consoantes<br />
podem infuenciar as vogais. Uma das características mais significativas<br />
<strong>do</strong> <strong>português</strong> é a assimilação de nasalidade. A vogal assimila a nasalidade da<br />
consoante nasal que se segue. Dialetos <strong>do</strong> <strong>português</strong> distinguem-se quanto<br />
à generalidade desse processo. Em alguns dialetos, apenas a vogal tônica<br />
se nasaliza (ex.: [] (banana)), enquanto que em outros dialetos a<br />
nasalização se espalha para a esquerda (ex.: []).<br />
O desvozeamento<br />
Quan<strong>do</strong> em posição postônica, antes de pausa, ocorre muito frequentemente<br />
o desvozeamento da vogal ou da sílaba, poden<strong>do</strong> mesmo ser<br />
sussurrada (ex.: []/[] (muito, novo)).<br />
A harmonia vocálica<br />
Na cadeia da fala, as vogais podem exercer influência sobre a qualidade<br />
de vogais vizinhas ou próximas. Esse fenômeno é conheci<strong>do</strong> como harmonia<br />
vocálica e é normalmente trata<strong>do</strong> pelos fonólogos como alçamento de<br />
vogal pretônica 30 (ex.: []\[]; []\[] (pedi<strong>do</strong>,<br />
torcida)).<br />
Processos fonéticos<br />
Resumin<strong>do</strong>, alguns processos fonéticos são bem conheci<strong>do</strong>s no <strong>português</strong>,<br />
como a nasalização de vogais seguidas de consoantes nasais []\<br />
[] (lama, lamaçal); a ditongação [] (bule azul) e a elisão<br />
vocálica [] (casa escura) 31 na fronteira de palavras; a assimilação<br />
<strong>do</strong> esta<strong>do</strong> da glote da consoante em posição de ataque pela fricativa em<br />
posição de coda, []/[] (as terras, as dunas), além de outros<br />
processos fonéticos, condiciona<strong>do</strong>s por fatores de várias ordens, como a<br />
Alain Marchal | César Reis 183<br />
PRODUCAO_FALA_MIOLO_2011 .indd 183 17/4/2012 15:41:10
monotongação de ditongos []\[] (cadeira), []\[]<br />
(couro), 32 a ditongação de monotongos []\[] (arroz), a diminuição<br />
da apertura da vogal da sílaba pretônica, assimilan<strong>do</strong> a apertura da vogal<br />
em sílaba tônica []\[] (menino), []\[] (escuro) 33<br />
e a abertura das vogais pretônicas, [ ]\[ ] (coração). Esses<br />
processos carecem, entretanto, de uma descrição fonética.<br />
Estu<strong>do</strong>s experimentais<br />
Os raros estu<strong>do</strong>s experimentais realiza<strong>do</strong>s sobre o <strong>português</strong> brasileiro<br />
se concentraram no estu<strong>do</strong> da nasalidade, principalmente vocálica 34 e na<br />
descrição <strong>articulatória</strong> de fones consonantais. 35<br />
184 <strong>Descrição</strong> <strong>articulatória</strong> <strong>do</strong> <strong>português</strong><br />
PRODUCAO_FALA_MIOLO_2011 .indd 184 17/4/2012 15:41:10