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O Desaparecimento da Infância Neil Postman

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1<br />

RESENHA<br />

O <strong>Desaparecimento</strong> <strong>da</strong> <strong>Infância</strong><br />

<strong>Neil</strong> <strong>Postman</strong><br />

Livro favorito de <strong>Neil</strong> <strong>Postman</strong>, O <strong>Desaparecimento</strong> <strong>da</strong> <strong>Infância</strong><br />

chega ao Brasil após 17 anos de sua primeira edição. A principal<br />

tese é de que a infância, como a conhecemos, está em fase de<br />

extinção. Da mesma forma, o conceito do que é ser adulto está<br />

desaparecendo.<br />

por Laura Tuyama<br />

Segundo o autor, as evidências vão desde o fato de as crianças<br />

estarem usando os mesmos estilos de vestimenta e linguagem dos<br />

adultos, os hábitos alimentares, a profissionalização precoce, o<br />

acesso a informações que antes eram considera<strong>da</strong>s adultas, até o aumento do<br />

número de crimes cometidos por crianças e a erotização precoce.<br />

O livro é dividido em duas partes. Na primeira, o autor descreve como surge o<br />

conceito de infância, que tem seu prenúncio na Grécia Antiga e que desaparece na<br />

I<strong>da</strong>de Média junto com a capaci<strong>da</strong>de de ler e escrever, a educação e a vergonha.<br />

"Sem uma noção bem desenvolvi<strong>da</strong> de vergonha a infância não pode<br />

existir".<br />

Para <strong>Postman</strong>, o que separa o mundo <strong>da</strong> infância do mundo do adulto é o acesso a<br />

determina<strong>da</strong>s informações.<br />

"Num mundo letrado, ser adulto implica ter acesso a segredos culturais codificados<br />

em símbolos não naturais. Num mundo letrado, as crianças precisam<br />

transformar-se em adultos. Entretanto num mundo não letrado não há<br />

necessi<strong>da</strong>de de distinguir com exatidão a criança e o adulto, pois existem poucos<br />

segredos e a cultura não precisa ministrar instrução sobre como entendê-la".<br />

Foi com a invenção <strong>da</strong> prensa tipográfica que passou a ser criado um mundo cujo<br />

acesso é permitido aos letrados. Nasce também to<strong>da</strong> a estrutura social, como a<br />

família, a escola, que vão definir os papéis de crianças e adultos.<br />

A segun<strong>da</strong> parte do livro trata do desaparecimento <strong>da</strong> infância. Para o autor, a<br />

infância começa a desaparecer com o surgimento de outra tecnologia de<br />

comunicação: o telégrafo.<br />

"A infância foi o fruto de um ambiente em que uma forma especial de informação,<br />

exclusivamente controla<strong>da</strong> por adultos, tornou-se pouco a pouco disponível para as<br />

crianças por meios considerados psicologicamente assimiláveis. A subsistência <strong>da</strong><br />

infância dependia dos princípios <strong>da</strong> informação controla<strong>da</strong> e <strong>da</strong> aprendizagem<br />

seqüencial. Mas o telégrafo iniciou o processo de extorquir do lar e <strong>da</strong><br />

escola o controle <strong>da</strong> informação. Alterou o tipo de informação a que as crianças<br />

podiam ter acesso, sua quali<strong>da</strong>de e quanti<strong>da</strong>de, sua seqüência, e as circunstâncias<br />

em que seria vivencia<strong>da</strong>."<br />

www.aurora.ufsc.br


2<br />

Para <strong>Postman</strong>, a televisão é o mecanismo que vem diluindo a fronteira entre<br />

o que é ser adulto e o que é ser criança. Isso porque o meio só requer aptidões<br />

naturais e o entendimento <strong>da</strong> fala, adquirido no primeiro ano de vi<strong>da</strong>. Neste trecho,<br />

é significativo o ponto de vista que o autor tem <strong>da</strong> TV:<br />

"A questão é que todos os acontecimentos na TV surgem completamente<br />

destituídos de continui<strong>da</strong>de histórica ou qualquer outro contexto, e numa sucessão<br />

tão rápi<strong>da</strong> e fragmenta<strong>da</strong> que caem sobre a nossa cabeça como uma enxurra<strong>da</strong>.<br />

Esta é a televisão como narcose, entorpecendo a razão e a sensibili<strong>da</strong>de".<br />

O que chama atenção no livro é a idéia de que o conceito de infância não existe<br />

num contexto em que há escassez de informação. Da mesma forma, no mundo<br />

saturado de informação, ele também desaparece.<br />

"A mídia elétrica propõe um sério desafio tanto à autori<strong>da</strong>de do adulto como à<br />

curiosi<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s crianças. (...) Até certo ponto, a curiosi<strong>da</strong>de chega naturalmente<br />

aos jovens mas a evolução dela depende <strong>da</strong> crescente consciência do poder de<br />

perguntas bem concatena<strong>da</strong>s para descobrir segredos. O mundo do conhecido e do<br />

ain<strong>da</strong> não conhecido está ligado pela ponte do espanto. Mas o espanto acontece em<br />

grande parte numa situação em que o mundo <strong>da</strong> criança está separado do mundo<br />

do adulto, onde as crianças devem procurar entrar mediante suas perguntas. Como<br />

a mídia funde os dois mundos, como a tensão cria<strong>da</strong> pelos segredos a serem<br />

desven<strong>da</strong>dos diminui, o cálculo do espanto mu<strong>da</strong>. A curiosi<strong>da</strong>de é substituí<strong>da</strong> pelo<br />

cinismo, ou pior ain<strong>da</strong>, pela arrogância. Restam-nos, então, crianças que<br />

confiam, não na autori<strong>da</strong>de do adulto, mas em notícias vin<strong>da</strong>s de parte<br />

nenhuma. Restam-nos crianças que recebem respostas a perguntas que nunca<br />

fizeram. Em resumo, não nos resta mais nenhuma criança."<br />

<strong>Postman</strong> não tem a pretensão de mostrar soluções que possam reverter esse curso.<br />

Ele acredita que há duas forças de resistência, a família e a escola, mas que estão<br />

perdendo a luta.<br />

As discordâncias a esta teoria surgem <strong>da</strong>s próprias crianças. No prefácio de 1994,<br />

<strong>Postman</strong> cita uma crítica que recebeu de uma criança, Joseph: "A infância não<br />

desaparece porque a gente assiste à TV. Acho que a infância é<br />

desperdiça<strong>da</strong> quando vamos à escola cinco dias na semana. Na minha<br />

opinião, isto é demais. A infância é preciosa demais pra se ir à escola mais do que<br />

meia semana".<br />

_____________<br />

O <strong>Desaparecimento</strong> <strong>da</strong> <strong>Infância</strong>. Graphia Editoral. Tradução de Suzana Menescal<br />

de A. Carvalho e José Laurenio de Melo. 190 páginas. R$ 26,00.<br />

<strong>Neil</strong> <strong>Postman</strong> é professor titular do Departamento de Comunicação <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong>de<br />

de Nova York. Tem mais de vinte livros publicados, dos quais boa parte trata <strong>da</strong>s<br />

conexões entre mídia e educação. Destacam-se Amusing Ourselves to Death,<br />

Conscientious Objections, Teaching as a Subversive Activity (com Charles<br />

Weingartner), Teaching as a Conserving Activity, Crazy Talk, Stupid Talk e The End<br />

of Education.<br />

www.aurora.ufsc.br

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