15.04.2013 Views

Espaço Literário (Resumo de Vidas Secas) - Faculdades do Centro ...

Espaço Literário (Resumo de Vidas Secas) - Faculdades do Centro ...

Espaço Literário (Resumo de Vidas Secas) - Faculdades do Centro ...

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

8 VIDAS SECAS<br />

CAPÍTULO X — CONTAS<br />

O patrão furta Fabiano, engana-o nas contas, o que constrange<br />

o vaqueiro e revolta-o. O narra<strong>do</strong>r capta-lhe o fluxo <strong>de</strong><br />

pensamento: com o avô fora assim, com o pai fora assim e com<br />

ele também se repetiria a mesma história?<br />

Não se conforma, mas é resigna<strong>do</strong>, oprimi<strong>do</strong> pelo patrão que<br />

lhe mostra o lugar <strong>do</strong>s <strong>de</strong>scontentes: a porta <strong>de</strong> saída.<br />

“Pouco a pouco, o ferro <strong>do</strong> proprietário queimava os bichos<br />

<strong>de</strong> Fabiano. E quan<strong>do</strong> não tinha mais nada para ven<strong>de</strong>r, o<br />

sertanejo endividava-se. Ao chegar a partilha, estava<br />

encalacra<strong>do</strong>, e na hora das contas davam-lhe uma ninharia.<br />

Ora, daquela vez, como das outras, Fabiano ajustou o ga<strong>do</strong>,<br />

arrepen<strong>de</strong>u-se, enfim <strong>de</strong>ixou a transação meio apalavrada e<br />

foi consultar a mulher. Sinha Vitória man<strong>do</strong>u os meninos<br />

para o barreiro, sentou-se na cozinha, concentrou-se,<br />

distribuiu pelo chão sementes <strong>de</strong> várias espécies, realizou<br />

somas e diminuições. No dia seguinte Fabiano voltou à<br />

cida<strong>de</strong>, mas ao fechar o negócio notou que as operações <strong>de</strong><br />

Sinha Vitória, como <strong>de</strong> costume, diferiam das <strong>do</strong> patrão,<br />

reclamou e obteve a explicação habitual: a diferença era<br />

proveniente <strong>de</strong> juros.<br />

Não se conformou: <strong>de</strong>via haver engano. Ele era bruto, sim<br />

senhor, via-se perfeitamente que era bruto, mas a mulher<br />

tinha miolo. Com certeza havia um erro no papel <strong>do</strong> branco.<br />

Não se <strong>de</strong>scobriu o erro, e Fabiano per<strong>de</strong>u os estribos. Passar<br />

a vida inteira assim, no toco, entregan<strong>do</strong> o que era <strong>de</strong>le <strong>de</strong><br />

mão beijada! Estava direito aquilo? Trabalhar como negro<br />

e nunca arranjar carta <strong>de</strong> alforria!<br />

O patrão zangou-se, repeliu a insolência, achou bom que o<br />

vaqueiro fosse procurar serviço noutra fazenda.<br />

Aí Fabiano baixou a pancada e amunhecou.”<br />

Submisso, Fabiano pediu <strong>de</strong>sculpas e saiu arrasa<strong>do</strong>, pensan<strong>do</strong><br />

mesmo que Sinha Vitória era quem errara.<br />

LITOBR5001<br />

CAPÍTULO XI — O SOLDADO AMARELO<br />

EDUCACIONAL<br />

Fabiano vai atrás <strong>de</strong> uma égua e da cria perdidas na catinga.<br />

Cortan<strong>do</strong> palmas espinhosas, embrenha-se no mato. E <strong>de</strong> facão<br />

levanta<strong>do</strong>, <strong>de</strong>u <strong>de</strong> cara com o solda<strong>do</strong> amarelo que, um ano<br />

antes, o levara à ca<strong>de</strong>ia, batera nele e o humilhara a frente <strong>de</strong><br />

to<strong>do</strong> mun<strong>do</strong>.<br />

“Baixou a arma. Aquilo durou um segun<strong>do</strong>. Menos: durou<br />

uma fração <strong>de</strong> segun<strong>do</strong>. Se houvesse dura<strong>do</strong> mais tempo, o<br />

amarelo teria caí<strong>do</strong> espernean<strong>do</strong> na poeira, com o quengo<br />

racha<strong>do</strong>. Como o impulso que moveu o braço <strong>de</strong> Fabiano foi<br />

muito forte, o gesto que ele fez teria si<strong>do</strong> bastante para um<br />

homicídio se outro impulso não lhe dirigisse o braço em<br />

senti<strong>do</strong> contrário.<br />

A lâmina parou <strong>de</strong> chofre, junto à cabeça <strong>do</strong> intruso, bem<br />

em cima <strong>do</strong> boné vermelho. A princípio o vaqueiro não<br />

compreen<strong>de</strong>u nada. Viu apenas que estava ali um inimigo.<br />

De repente notou que aquilo era um homem e, coisa mais<br />

grave, uma autorida<strong>de</strong>. Sentiu um choque violento,<br />

<strong>de</strong>teve-se, o braço ficou irresoluto, bambo, inclinan<strong>do</strong>-se<br />

para um la<strong>do</strong> e para o outro.<br />

O solda<strong>do</strong>, magrinho, enfezadinho, tremia. E Fabiano tinha<br />

vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> levantar o facão <strong>de</strong> novo. Tinha vonta<strong>de</strong>, mas os<br />

músculos afrouxavam. Realmente não quisera matar um<br />

cristão: proce<strong>de</strong>ra como quan<strong>do</strong>, a montar brabo, evitava<br />

galhos e espinhos.”<br />

O solda<strong>do</strong> amarelo tremia <strong>de</strong> pavor, o que irritou profundamente<br />

Fabiano. Meteu o facão na bainha, pensan<strong>do</strong> que po<strong>de</strong>ria<br />

matá-lo com as unhas se quisesse. Lembrou-se que passara<br />

uma noite na ca<strong>de</strong>ia e revoltou-se.<br />

O solda<strong>do</strong>, encolhi<strong>do</strong>, escon<strong>de</strong>ra-se atrás <strong>de</strong> uma árvore<br />

temen<strong>do</strong> morrer. Pela cabeça <strong>de</strong> Fabiano passaram humilhações,<br />

ódios mesquinhos. Mas, por fim, indica o caminho da cida<strong>de</strong><br />

ao solda<strong>do</strong>, tiran<strong>do</strong>-lhe o chapéu: “governo é governo”.<br />

“Tirou o chapéu <strong>de</strong> couro, curvou-se e ensinou o caminho<br />

ao solda<strong>do</strong> amarelo.”

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!