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Arquitetura do Sagrado em Francisco Bologna: O Mosteiro de ...

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<strong>Arquitetura</strong> <strong>do</strong> Sagra<strong>do</strong> <strong>em</strong> <strong>Francisco</strong> <strong>Bologna</strong>:<br />

O <strong>Mosteiro</strong> <strong>de</strong> Nossa Senhora das Graças <strong>em</strong> Belo Horizonte<br />

Marcia Aparecida da Costa Poppe (marciapoppe@yahoo.com.br)<br />

Programa <strong>de</strong> Pós-Graduação <strong>em</strong> <strong>Arquitetura</strong> (PROARQ) – FAU – UFRJ<br />

Bolsista CNPq<br />

Beatriz Santos <strong>de</strong> Oliveira (bsol@unisys.com.br)<br />

Programa <strong>de</strong> Pós-Graduação <strong>em</strong> <strong>Arquitetura</strong> (PROARQ) – FAU – UFRJ<br />

Resumo<br />

Este trabalho analisa o <strong>Mosteiro</strong> <strong>de</strong> Nossa Senhora das Graças (Belo Horizonte, 1949-99), obra <strong>do</strong><br />

arquiteto <strong>Francisco</strong> <strong>Bologna</strong> (n. 1923), e <strong>do</strong>cumenta a história <strong>de</strong> seu processo <strong>de</strong> projeto. Durou<br />

praticamente to<strong>do</strong> o t<strong>em</strong>po <strong>de</strong> uma carreira, e por isto, incorporou as modificações <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> novos<br />

requerimentos <strong>do</strong> programa ao longo <strong>do</strong>s anos e aquelas naturais <strong>de</strong> um amadurecimento profissional. Para<br />

analisá-la, optamos por vivê-la como um fenômeno, cuja compreensão correspon<strong>de</strong> à nossa abertura para a<br />

experiência das diversas situações que a engendram. O mosteiro é entendi<strong>do</strong> aqui como um espaço<br />

sagra<strong>do</strong> <strong>de</strong> habitação. Traz<strong>em</strong>os a relação existente entre a ord<strong>em</strong> religiosa beneditina e a ord<strong>em</strong><br />

arquitetônica para d<strong>em</strong>onstrar <strong>de</strong> que maneira a arquitetura <strong>do</strong> <strong>Mosteiro</strong> <strong>de</strong> Nossa Senhora das Graças<br />

reflete o mo<strong>do</strong> <strong>de</strong> vida da comunida<strong>de</strong>, evi<strong>de</strong>ncia a natureza <strong>de</strong>ste tipo <strong>de</strong> habitação e estabelece forte<br />

ligação entre o edifício e o senti<strong>do</strong> que ele possui. Em seguida, através da análise crítica, refletimos sobre<br />

os procedimentos <strong>do</strong> arquiteto e suas referências projetuais.<br />

Palavras-chave: <strong>Francisco</strong> <strong>Bologna</strong>, <strong>Arquitetura</strong> Mo<strong>de</strong>rna, <strong>Mosteiro</strong>.<br />

Abstract<br />

This paper analyses <strong>Francisco</strong> <strong>Bologna</strong>’s Monastery of Nossa Senhora das Graças in Belo Horizonte<br />

(Brazil, 1949-1999), and <strong>do</strong>cuments the history of its <strong>de</strong>sign process. The work lasted almost the entire time<br />

of a career, and because of that, merged the changes caused by different program requir<strong>em</strong>ents through the<br />

years and those natural of a professional growth and maturity. In or<strong>de</strong>r to analyze it, we see the piece as a<br />

phenomenon, whose comprehension corresponds to our openness to the variety of references which<br />

conceive it. The monastery is un<strong>de</strong>rstood as a space for sacred dwelling. We bring the relationship between<br />

the religious Benedictine Or<strong>de</strong>r and the architectonic or<strong>de</strong>r to d<strong>em</strong>onstrate the way with which the<br />

monastery’s architecture reflects the community’s way of life, shows clearly the nature of this kind of<br />

dwelling, and establishes a strong connection between the building and the meaning it has. Then, through an<br />

analytical review, we consi<strong>de</strong>r carefully the architect’s procedures, concerns and theories.<br />

Key words: <strong>Francisco</strong> <strong>Bologna</strong>, Mo<strong>de</strong>rn Architecture, Monastery.


Uma Obra <strong>de</strong> igreja<br />

Em 1949, Dom Inácio Accioly, Aba<strong>de</strong> <strong>do</strong> <strong>Mosteiro</strong> <strong>de</strong> São Bento no Rio <strong>de</strong> Janeiro, solicita a <strong>Francisco</strong><br />

<strong>Bologna</strong> o projeto para o <strong>Mosteiro</strong> <strong>de</strong> Nossa Senhora das Graças, a ser implanta<strong>do</strong> no alto <strong>de</strong> um morro, no<br />

bairro <strong>de</strong> Vila Paris. <strong>Bologna</strong> havia projeta<strong>do</strong> a casa <strong>de</strong> seus pais <strong>em</strong> Petrópolis, a Casa Accioly (1948-49),<br />

que receberia medalha <strong>de</strong> prata no IV Salão Nacional <strong>de</strong> Arte Mo<strong>de</strong>rna no ano <strong>de</strong> 1954, e cujo programa<br />

incluía além da Capela Santa Maria, um conjunto <strong>de</strong> celas, claustro e sacristia. Com apenas 4 anos <strong>de</strong><br />

forma<strong>do</strong>, <strong>Bologna</strong> já era autor <strong>do</strong>s projetos da Fonte Andra<strong>de</strong> Junior <strong>em</strong> Araxá, indicada como uma das <strong>de</strong>z<br />

melhores obras <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 1948 pela Architectural Journal, da residência Wellington <strong>de</strong> Souza (1948) <strong>em</strong><br />

Cataguases, e <strong>de</strong> um edifício <strong>de</strong> apartamentos para o Instituto <strong>do</strong>s Bancários (1948) <strong>em</strong> Vitória.<br />

A construção <strong>do</strong> mosteiro esten<strong>de</strong>u-se por 50 anos. Feita a fundação, o edifício começou a subir pela<br />

fachada su<strong>de</strong>ste, mais próxima à rua <strong>de</strong> acesso: os Blocos 1, 2 e 3, on<strong>de</strong> as irmãs se acomodaram <strong>em</strong><br />

1952 1 , apesar <strong>de</strong> toda a precarieda<strong>de</strong> <strong>do</strong> edifício. Sete anos <strong>de</strong>pois, completaram o Bloco 4 e fizeram o<br />

fechamento <strong>do</strong> primeiro claustro com a nave da Igreja <strong>do</strong> Coro. Outras etapas se seguiram, mas apenas <strong>em</strong><br />

1993, iniciaram a construção <strong>do</strong> Bloco 5. O edifício começava a ser prepara<strong>do</strong> para o cinqüentenário da<br />

fundação (1999), quan<strong>do</strong> seria inaugurada a Igreja <strong>do</strong>s Fiéis. Hoje, o projeto ainda não está como planeja<strong>do</strong><br />

por <strong>Bologna</strong>: falta-lhe o Bloco 6. Entretanto, as irmãs consi<strong>de</strong>ram a obra finalizada, pois algumas mudanças<br />

no programa ao longo <strong>do</strong> t<strong>em</strong>po 2 faz<strong>em</strong> com que não sejam necessárias compl<strong>em</strong>entações. O<br />

funcionamento <strong>do</strong> mosteiro d<strong>em</strong>onstra que suas instalações são plenamente satisfatórias.<br />

Ao longo <strong>do</strong>s anos, <strong>Bologna</strong> acompanhou <strong>de</strong> perto todas as etapas <strong>do</strong> processo 3 . Logo no início da<br />

elaboração <strong>do</strong> projeto, uma gran<strong>de</strong> modificação foi solicitada. As irmãs <strong>de</strong>sejavam ficar mais resguardadas<br />

da rua <strong>de</strong> acesso e da futura ocupação <strong>do</strong>s terrenos vizinhos, e pediram que suas <strong>de</strong>pendências ficass<strong>em</strong><br />

<strong>do</strong> la<strong>do</strong> oposto ao sugeri<strong>do</strong> por <strong>Bologna</strong>, no lugar <strong>de</strong>stina<strong>do</strong> originalmente ao novicia<strong>do</strong> e à ala <strong>de</strong><br />

hóspe<strong>de</strong>s, uma vez que estes ambientes não d<strong>em</strong>andavam tanta privacida<strong>de</strong>. Isso significou um<br />

espelhamento completo <strong>do</strong> edifício <strong>em</strong> relação ao seu eixo transversal. A obra construída apresenta<br />

inúmeras modificações se comparada ao segun<strong>do</strong> conjunto <strong>de</strong> <strong>de</strong>senhos. Dada a longevida<strong>de</strong> da obra, não<br />

é difícil compreen<strong>de</strong>r to<strong>do</strong>s os ajustes. Não encontramos nenhum <strong>de</strong>senho referente ao que chamamos <strong>de</strong><br />

terceira versão. Acreditamos que o arquiteto tenha resolvi<strong>do</strong> os eventuais probl<strong>em</strong>as no canteiro, mas que<br />

muitas questões tenham si<strong>do</strong> <strong>de</strong>cididas pela própria comunida<strong>de</strong> 4 e por D. Inácio, que além <strong>de</strong> monge,<br />

também era engenheiro e acompanhou toda a implantação. Desta convivência, fortaleceu-se a amiza<strong>de</strong><br />

entre o arquiteto e o engenheiro. Outra hipótese a ser levada <strong>em</strong> conta <strong>em</strong> relação à inexistência <strong>do</strong>s<br />

<strong>de</strong>senhos, é a <strong>de</strong> que <strong>Bologna</strong> tenha <strong>de</strong>les se <strong>de</strong>sfeito, como fez com a maior parte <strong>de</strong> seus trabalhos<br />

(MACEDO, 2003).<br />

Nos primeiros anos da obra, <strong>Bologna</strong> <strong>de</strong>dicou-se a projetos <strong>em</strong> diferentes esta<strong>do</strong>s <strong>do</strong> país. Ainda <strong>em</strong> 1950,<br />

conclui as residências Accioly <strong>em</strong> Petrópolis e Hercil La<strong>de</strong>ira Salga<strong>do</strong> <strong>em</strong> Cataguases. Muitas são as obras<br />

<strong>de</strong> <strong>Bologna</strong> nesta cida<strong>de</strong>: a Vila Operária e o Edifício Comercial para a Companhia Industrial <strong>de</strong> Cataguases<br />

(início da década <strong>de</strong> 50), a Maternida<strong>de</strong> (1951) e a residência José <strong>de</strong> Castro (1952). No Rio <strong>de</strong> Janeiro,<br />

<strong>de</strong>dica-se ao conjunto resi<strong>de</strong>ncial <strong>de</strong> Paquetá – primeiro projeto <strong>de</strong> autoria <strong>de</strong> <strong>Bologna</strong> no Departamento <strong>de</strong><br />

Habitação Popular – e ao Edifício Comercial Diogo <strong>de</strong> Brito (1952). Em Vitória, projeta um jardim <strong>de</strong> infância


(1952). Observamos um início <strong>de</strong> carreira b<strong>em</strong>-sucedi<strong>do</strong>, no qual <strong>de</strong>senvolve projetos com programas<br />

diversifica<strong>do</strong>s. Na segunda etapa <strong>de</strong> construção <strong>do</strong> mosteiro, <strong>Bologna</strong> projetou as residências Ottonio Alvim<br />

Gomes (Cataguases – 1954), Nilo Pacheco <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros (Muriaé – 1954), Nelson Collart <strong>em</strong> Itaipava (1955)<br />

e Alfredina Gonzaga <strong>de</strong> Oliveira <strong>em</strong> Niterói (1958). Projeta o Orfanato Dom Silvério (1954) e uma concha<br />

acústica para a Praça Rui Barbosa (1958) <strong>em</strong> Cataguases. O projeto <strong>de</strong> maior porte <strong>de</strong>sta época foi o<br />

Conjunto Resi<strong>de</strong>ncial <strong>de</strong> Vila Isabel (1955), obra não concluída <strong>do</strong> Departamento <strong>de</strong> Habitação Popular.<br />

Ressaltamos que o Orfanato Dom Silvério guarda algumas s<strong>em</strong>elhanças com <strong>Mosteiro</strong> <strong>de</strong> Nossa Senhora<br />

das Graças, <strong>em</strong> programa, organização espacial e disposição volumétrica. 5 No entanto, enquanto num<br />

projeto se observa uma discreta licença ao ornamento pela presença <strong>de</strong> afrescos e azulejaria, no outro, o<br />

que se vê é a nu<strong>de</strong>z própria <strong>do</strong> programa <strong>de</strong> vida religioso beneditino, <strong>de</strong>talha<strong>do</strong> a seguir.<br />

ANO BLOCOS EVENTO<br />

1949 Solicitação <strong>do</strong> projeto a <strong>Francisco</strong> <strong>Bologna</strong> e fundação da comunida<strong>de</strong> <strong>em</strong> Belo Horizonte:<br />

início <strong>do</strong> governo <strong>de</strong> Madre Luzia.<br />

1951<br />

Início da construção <strong>do</strong>s Blocos 1, 2 e 3.<br />

1952 Ocupação <strong>do</strong> edifício pelas 12 monjas.<br />

1958<br />

Início da construção <strong>do</strong> Bloco 4 e da Igreja <strong>do</strong> Coro – pare<strong>de</strong>s s<strong>em</strong> revestimento e piso<br />

cimenta<strong>do</strong>.<br />

1959 Missa inaugural da Igreja, <strong>em</strong> 06 <strong>de</strong> janeiro.<br />

1961 Chegada <strong>do</strong>s sinos da Al<strong>em</strong>anha e suspensão à torre <strong>do</strong> campanário.<br />

1970 Retirada das gra<strong>de</strong>s da Igreja <strong>do</strong> Coro e <strong>do</strong>s parlatórios.<br />

1983 Reforço na torre <strong>do</strong>s sinos - primeiras badaladas e início <strong>do</strong> governo <strong>de</strong> Madre Inês.<br />

1990 Início das preparações para o Cinqüentenário da comunida<strong>de</strong>: revestimento das pare<strong>de</strong>s e <strong>do</strong><br />

piso <strong>em</strong> granito na Igreja <strong>do</strong> Coro.<br />

1993<br />

1999 Fim da obra da Igreja <strong>do</strong>s Fiéis.<br />

Início da construção <strong>do</strong> Bloco 5 e <strong>do</strong>s acabamentos <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is claustros.<br />

2000 Inicio <strong>do</strong> governo <strong>de</strong> Madre Estefânia.<br />

2003<br />

Bloco 5 menor <strong>do</strong> que o tamanho original e Bloco 6 não construí<strong>do</strong>.<br />

Tabela 1: Etapas <strong>de</strong> construção.


Programa <strong>de</strong> Vida e <strong>de</strong> <strong>Arquitetura</strong><br />

Figura 1: Perspectiva da maquete com as diferentes etapas <strong>de</strong> construção.<br />

Destina<strong>do</strong> a abrigar aqueles que optaram pela vida religiosa, um mosteiro se caracteriza por necessitar <strong>de</strong><br />

uma arquitetura <strong>de</strong> conceitos claros, cuja ord<strong>em</strong> <strong>de</strong>ve se refletir num programa rigoroso. O<br />

<strong>de</strong>sconhecimento <strong>do</strong> cotidiano <strong>de</strong> uma comunida<strong>de</strong>, <strong>de</strong> seu programa <strong>de</strong> vida e <strong>de</strong> trabalho, dificulta a<br />

compreensão <strong>de</strong> que tipo <strong>de</strong> lugar ele <strong>de</strong>ve ser. Ao longo <strong>do</strong> t<strong>em</strong>po, a arquitetura <strong>do</strong>s mosteiros afirmou-se<br />

como verda<strong>de</strong>ira interpretação <strong>do</strong>s costumes beneditinos (BRAUNFELS, 1974). Aspectos como o silêncio, a<br />

humilda<strong>de</strong> e a simplicida<strong>de</strong>, característicos <strong>do</strong> programa <strong>de</strong> vida monacal, reflet<strong>em</strong>-se num ascetismo<br />

arquitetônico, que oferece aos usuários uma experiência <strong>de</strong> paz e tranqüilida<strong>de</strong>, auxilian<strong>do</strong> no anseio <strong>de</strong><br />

entrega pessoal.<br />

Ao nos aproximarmos <strong>de</strong>sta obra <strong>de</strong> <strong>Bologna</strong>, verificamos que o edifício representa as regras monásticas<br />

beneditinas 6 <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> especial. Através <strong>de</strong> inúmeras conversas com D. Inácio, <strong>Bologna</strong> <strong>de</strong>fine <strong>em</strong> primeiro<br />

lugar, as principais funções e os setores necessários, respeitan<strong>do</strong> as implicações <strong>de</strong> circulação e acessos, e<br />

chega à resolução da planta para Belo Horizonte. Ela é a gera<strong>do</strong>ra. S<strong>em</strong> ela, não há gran<strong>de</strong>za <strong>de</strong> intenção<br />

ou expressão, como também não há ritmo, volume ou coerência (LE CORBUSIER, 1923). No caso <strong>de</strong> um<br />

mosteiro, a coerência maior <strong>de</strong>ve ser justamente entre mo<strong>do</strong> <strong>de</strong> vida e edificação, e <strong>Bologna</strong> alcança<br />

gran<strong>de</strong> funcionalida<strong>de</strong> pela <strong>de</strong>terminação correta <strong>do</strong>s espaços segun<strong>do</strong> suas ativida<strong>de</strong>s específicas.


A Passag<strong>em</strong> das Horas<br />

A ord<strong>em</strong> beneditina é uma comunida<strong>de</strong> que celebra diariamente e <strong>em</strong> coro, além da Missa Conventual,<br />

aquilo que se chama Liturgia das Horas 7 . Como sua finalida<strong>de</strong> é santificar o dia e todas as ativida<strong>de</strong>s<br />

humanas, teve o curso modifica<strong>do</strong> para que, <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong> possível, cada hora mantivesse seu significa<strong>do</strong><br />

originário, e ao mesmo t<strong>em</strong>po foss<strong>em</strong> levadas <strong>em</strong> conta as condições da vida atual. É composta por um<br />

conjunto <strong>de</strong> 7 ofícios distribuí<strong>do</strong>s ao longo <strong>do</strong> dia: Vigílias (celebrada às 4:30 da manhã), Lau<strong>de</strong>s (6:20),<br />

Terça (9:20), Sexta (11:15), Noa (15:00), Vésperas (17:15) e Completas (19:25). 8<br />

Entre as orações, as irmãs realizam o restante das ativida<strong>de</strong>s. O trabalho, segunda principal função no diaa-dia,<br />

po<strong>de</strong> ser intelectual ou manual: estu<strong>do</strong> e leitura são incentiva<strong>do</strong>s <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o ingresso, assim como as<br />

habilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cada uma. Artesanato, <strong>de</strong>senho, pintura, costura ou borda<strong>do</strong> <strong>de</strong>senrolam-se nos ateliês,<br />

enquanto estu<strong>do</strong> e leitura, na biblioteca, salas especiais, e novicia<strong>do</strong>. Exist<strong>em</strong> ainda os serviços <strong>do</strong>mésticos,<br />

comuns à toda casa: limpeza, arrumação, lavag<strong>em</strong> e secag<strong>em</strong> <strong>de</strong> roupa, e todas as ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> copa e<br />

cozinha. Os serviços são dividi<strong>do</strong>s <strong>em</strong> grupos e realiza<strong>do</strong>s <strong>em</strong> conjunto, valorizan<strong>do</strong> a vida <strong>em</strong> comunida<strong>de</strong>.<br />

Tu<strong>do</strong> acontece <strong>de</strong> forma organizada, e principalmente, <strong>em</strong> silêncio.<br />

Entre trabalho e oração, os sinos marcam o dia e a passag<strong>em</strong> das horas, anuncian<strong>do</strong> o Ofício Divino.<br />

Depois das badaladas, as irmãs se agrupam <strong>em</strong> silêncio ao longo <strong>do</strong> corre<strong>do</strong>r que contorna o claustro. “No<br />

recolhimento, conciliam suas almas, como se afina um instrumento antes <strong>de</strong> fazê-lo soar”. 9 Iniciam as<br />

orações com o Canto Gregoriano 10 . Por ser originalmente um canto <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> ritual, ele não é um canto<br />

para a liturgia, ele é a própria liturgia cantada. Através <strong>do</strong> seu ritmo e poesia sonora, alcança gran<strong>de</strong><br />

expressivida<strong>de</strong> e leva naturalmente à meditação. Propicia toda uma ambientação, pois o som se expan<strong>de</strong> e<br />

reproduz sob formas musicais o seu valor litúrgico.<br />

No cotidiano das monjas, som e silêncio conjugam-se na sacralização <strong>do</strong> t<strong>em</strong>po.<br />

O Espaço Sagra<strong>do</strong><br />

A planta <strong>de</strong> mosteiro beneditino mais antiga que se t<strong>em</strong> referência é a <strong>do</strong> <strong>Mosteiro</strong> <strong>de</strong> San Gallen (Suíça,<br />

820). Segun<strong>do</strong> Braunfels (1974), este é o “mosteiro <strong>de</strong> utópica perfeição”, no qual o esqu<strong>em</strong>a da Ord<strong>em</strong><br />

encontrava-se praticamente <strong>de</strong>senvolvi<strong>do</strong>. Através <strong>de</strong> sua análise e com a história <strong>de</strong> sua evolução,<br />

observamos características que persist<strong>em</strong> até hoje <strong>em</strong> programas <strong>do</strong> mesmo tipo. Sua planta po<strong>de</strong> ser<br />

entendida como uma materialização da Regra Beneditina, na qual o mosteiro <strong>de</strong>ve ser tanto um lugar <strong>de</strong><br />

oração, como <strong>de</strong> trabalho.


Figura 2: Zoneamento <strong>em</strong> San Gallen, s<strong>em</strong> escala.<br />

Verificamos nesta planta, que todas as ativida<strong>de</strong>s e edificações estão or<strong>de</strong>nadas <strong>de</strong> forma setorizada. A<br />

Igreja envolvida pela maioria das outras funções, com o claustro <strong>em</strong> sua lateral, <strong>em</strong> torno <strong>do</strong> qual estão os<br />

<strong>do</strong>rmitórios (celas) e sanitários. V<strong>em</strong>os o refeitório, a cozinha e os serviços a eles relaciona<strong>do</strong>s. Fora <strong>de</strong>ste<br />

núcleo, a enfermaria, salas <strong>de</strong> estu<strong>do</strong>, <strong>de</strong>pendências para noviços e hospedaria, além <strong>de</strong> oficinas, hortas e<br />

pomares. O programa atendia à necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>sejada auto-suficiência da comunida<strong>de</strong> beneditina,<br />

correspon<strong>de</strong>nte à vida reclusa <strong>do</strong> monge e à localização isolada <strong>de</strong> seus claustros.<br />

Como <strong>de</strong>corrência da consolidação das or<strong>de</strong>ns religiosas <strong>em</strong> instituições b<strong>em</strong> organizadas, os mosteiros<br />

foram adquirin<strong>do</strong> o caráter unitário que têm hoje os edifícios conventuais. Conservou-se a antiga separação<br />

das ativida<strong>de</strong>s, correlata à idéia religiosa <strong>de</strong> que todas as coisas <strong>de</strong>v<strong>em</strong> ocupar o lugar que lhes cabe na<br />

ord<strong>em</strong> <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>. A <strong>de</strong>signação <strong>de</strong> um topos para tu<strong>do</strong> o que há, leva a uma organização espacial e social<br />

hierarquizada que estimula, sobretu<strong>do</strong>, no caso da vida religiosa, o exercício da humilda<strong>de</strong>.<br />

<strong>Bologna</strong> localiza a Igreja no centro da edificação. Na organização planimétrica <strong>do</strong> mosteiro, e <strong>em</strong> relação às<br />

funções <strong>de</strong>s<strong>em</strong>penhadas, ela é o edifício mais importante. Centro <strong>do</strong> mosteiro, é também o centro da vida<br />

das monjas: além <strong>de</strong> ser o lugar que mais freqüentam, é on<strong>de</strong> passam as horas mais importantes <strong>do</strong> dia<br />

(oração e celebração). Entretanto, to<strong>do</strong>s os outros lugares também são consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s dignos e perfeitos,<br />

pois a todas as ativida<strong>de</strong>s é conferi<strong>do</strong> um senti<strong>do</strong> superior. Este significa<strong>do</strong> sagra<strong>do</strong> ecoa <strong>em</strong> to<strong>do</strong>s os<br />

espaços.<br />

A separação que <strong>de</strong>ve se estabelecer entre <strong>de</strong>siguais distingue as partes <strong>do</strong> edifício e vincula-se a um<br />

aspecto essencial da opção pelo recolhimento, a clausura, cuja compreensão é necessária para que se<br />

possa enten<strong>de</strong>r melhor a funcionalida<strong>de</strong> <strong>do</strong> espaço <strong>de</strong> um mosteiro.


Clausura: Recolhimento e Cont<strong>em</strong>plação<br />

Figura 3: Segunda versão <strong>do</strong> projeto para o mosteiro, s<strong>em</strong> escala.<br />

A clausura consiste num recolhimento absoluto, que contribui para a entrega total ao culto divino na vida<br />

cont<strong>em</strong>plativa. Salvo <strong>em</strong> ocasiões especiais para a religião católica 11 , a maioria <strong>do</strong>s lugares não está<br />

acessível ao público comum. Espacialmente, a clausura representa uma privacida<strong>de</strong> total, tornan<strong>do</strong> o<br />

esqu<strong>em</strong>a das circulações extr<strong>em</strong>amente rígi<strong>do</strong>, não haven<strong>do</strong> cruzamento entre leigos e monjas. Ao estudar<br />

o esqu<strong>em</strong>a <strong>de</strong> acesso e circulações <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong> <strong>Mosteiro</strong> <strong>de</strong> N. S. das Graças, observamos que <strong>Bologna</strong><br />

separa estes fluxos completamente, sen<strong>do</strong> a portaria o único lugar <strong>de</strong> acesso comum.


Ao mesmo t<strong>em</strong>po <strong>em</strong> que observamos forte separação entre <strong>do</strong>is mun<strong>do</strong>s – o sagra<strong>do</strong> e o profano – a<br />

comunida<strong>de</strong> está aberta a qualquer pessoa que se aproxime. A acolhida ao próximo é uma característica<br />

importante na Ord<strong>em</strong> Beneditina, justifican<strong>do</strong> a presença <strong>de</strong> espaços especiais para a realização das trocas<br />

sociais. São os que chamamos <strong>de</strong> espaços <strong>de</strong> contato: parlatórios 12 , portaria, sacristia, confessionários,<br />

jardim externo da igreja, e hospedaria.<br />

Os limites da clausura no início da construção e primeiros anos <strong>de</strong> funcionamento eram muito claros pela<br />

presença <strong>de</strong> gra<strong>de</strong>s treliçadas <strong>em</strong> peroba, <strong>de</strong>senhadas pelo arquiteto. Na Igreja, através <strong>de</strong> uma única porta<br />

central, as monjas recebiam a comunhão. Antes <strong>de</strong> 1962, data <strong>do</strong> Concilio Vaticano II, não podiam ter<br />

contato visual direto com leigos ou m<strong>em</strong>bros da família. Os parlatórios eram também <strong>do</strong>ta<strong>do</strong>s <strong>de</strong> gra<strong>de</strong>s 13 .<br />

Em maio <strong>de</strong> 1970, todas foram retiradas por <strong>de</strong>cisão da Aba<strong>de</strong>ssa. Hoje, mesmo s<strong>em</strong> as da Igreja <strong>do</strong> Coro,<br />

o limite espacial não é na maioria das vezes ultrapassa<strong>do</strong>, pois a configuração formal da igreja o impõe<br />

tanto visual quanto simbolicamente. A presença <strong>do</strong> altar entre as naves também o reforça, pois<br />

tradicionalmente, é um lugar não permiti<strong>do</strong> para leigos.<br />

Iniciar<strong>em</strong>os a aproximação ao projeto, analisan<strong>do</strong> o lugar on<strong>de</strong> se insere.<br />

O lugar<br />

Vila Paris se situa na Regional Administrativa Centro-Sul <strong>de</strong> Belo Horizonte, entre os morros das Pedras e<br />

<strong>do</strong> Papagaio. O <strong>Mosteiro</strong> se encontra <strong>em</strong> uma elevação <strong>de</strong> apenas 20 metros <strong>de</strong> <strong>de</strong>snível <strong>em</strong> relação às<br />

ruas <strong>de</strong> acesso imediatamente circundantes. Em relação à parte plana da cida<strong>de</strong>, o <strong>de</strong>snível cresce para<br />

cerca <strong>de</strong> 100 metros, permitin<strong>do</strong> que a edificação seja vista no alto e à distância. O contato com a cida<strong>de</strong> é<br />

muito pequeno, mas este afastamento é constitutivo <strong>do</strong> mo<strong>do</strong> <strong>de</strong> vida monástico. O ‘estar no alto’ não<br />

significa estar <strong>em</strong> posição privilegiada <strong>de</strong> vigilância ou observação. Significa estar longe <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> e mais<br />

perto <strong>do</strong> céu. Como vimos, clausura e recolhimento são valores que se buscam preservar tanto na<br />

configuração <strong>do</strong> edifício quanto na escolha <strong>do</strong> lugar e implantação <strong>do</strong> sítio. A cont<strong>em</strong>plação não é exterior,<br />

mas interior: o voltar-se para <strong>de</strong>ntro das monjas repete-se na edificação. Assim como elas, o edifício se<br />

interioriza: fecha-se à cida<strong>de</strong> e à vista que po<strong>de</strong>ria ter <strong>de</strong>la.<br />

No fim <strong>do</strong>s anos 40, quan<strong>do</strong> D. Inácio leva <strong>Francisco</strong> e Regina <strong>Bologna</strong> para conhecer o lugar <strong>de</strong><br />

implantação, nada além <strong>de</strong> terra e mato existia por ali. N<strong>em</strong> ao menos uma rua, que <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> aberta, virou<br />

a Rua <strong>do</strong> <strong>Mosteiro</strong>. Uma clareira é aberta com o corte <strong>do</strong> topo <strong>do</strong> morro. O terreno cria<strong>do</strong> t<strong>em</strong> forma quase<br />

quadrada <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> às curvas <strong>de</strong> nível, e sugere <strong>do</strong>is eixos, ao longo <strong>do</strong>s quais <strong>Bologna</strong> localiza a edificação,<br />

com a fachada frontal, voltada para nor<strong>de</strong>ste.<br />

Aproximação ao Edifício<br />

A presença <strong>do</strong> muro alto nas divisas <strong>do</strong> terreno traz a dúvida <strong>do</strong> que existe <strong>do</strong> outro la<strong>do</strong>. É o <strong>de</strong>sconheci<strong>do</strong><br />

que se apresenta com sua linearida<strong>de</strong>-sinuosa, que fecha e acentua a curva <strong>de</strong> acesso, na esquina da rua.<br />

O longo caminho a ser percorri<strong>do</strong> é íngr<strong>em</strong>e e difícil: requer um t<strong>em</strong>po maior no movimento <strong>de</strong> chegada,


exigin<strong>do</strong> maior esforço e <strong>de</strong>cisão. Mais <strong>do</strong> que uma divisão entre duas realida<strong>de</strong>s opostas – o profano e o<br />

sagra<strong>do</strong> – o muro representa uma preparação. Escon<strong>de</strong> o mosteiro, mas permite que ele seja visto <strong>de</strong><br />

relance <strong>em</strong> alguns momentos, incitan<strong>do</strong> a <strong>de</strong>scoberta: a partir <strong>do</strong> movimento, o edifício é lentamente<br />

percebi<strong>do</strong>.<br />

Depois <strong>do</strong> portão, a segunda curva mais aberta consente a visão <strong>do</strong> mosteiro. No entanto, engana-se qu<strong>em</strong><br />

imagina vê-lo por inteiro. O edifício se implanta como que fazen<strong>do</strong> parte <strong>do</strong> morro. O uso <strong>de</strong> pedras na base<br />

da fachada frontal trava um singelo diálogo com a textura <strong>do</strong>s paralelepípe<strong>do</strong>s irregulares que faz<strong>em</strong> a<br />

pavimentação da la<strong>de</strong>ira, trazen<strong>do</strong> certa continuida<strong>de</strong> entre os planos. Percebe-se logo a presença da torre<br />

<strong>de</strong> concreto <strong>do</strong> campanário, apontan<strong>do</strong> para o céu num movimento <strong>de</strong> ascendência. Ela é um marco na<br />

paisag<strong>em</strong>. A cor e a textura <strong>do</strong> material <strong>do</strong> restante das fachadas – lito-cerâmica <strong>em</strong> tom amarela<strong>do</strong> – por<br />

outro la<strong>do</strong>, prend<strong>em</strong> o edifício ao chão, numa atitu<strong>de</strong> contrária <strong>de</strong> enraizamento.<br />

No alto <strong>do</strong>s 25 metros da torre, cinco sinos numa esbelta estrutura <strong>de</strong> metal, não revelam o peso que<br />

possu<strong>em</strong> 14 : fizeram a torre tr<strong>em</strong>er no dia <strong>em</strong> que foram suspensos. Durante 23 anos tiveram negada a<br />

sonorida<strong>de</strong> <strong>de</strong> suas badaladas, até que o reforço estrutural pu<strong>de</strong>sse ser realiza<strong>do</strong>. 15<br />

À medida que nos aproximamos da entrada, um primeiro lance <strong>de</strong> escada ao longo da fachada leva ao<br />

segun<strong>do</strong>, na direção perpendicular à portaria. Aqui, a introspecção é ainda mais evi<strong>de</strong>nte: o silêncio e a<br />

penumbra <strong>em</strong> contraste com a luz no exterior, convidam à reflexão. Que lugar é este, o que existe aqui?<br />

Nada nas pare<strong>de</strong>s, a não ser suas qualida<strong>de</strong>s materiais. Quatro bancos distribuí<strong>do</strong>s no perímetro da sala,<br />

<strong>de</strong> linhas suaves e <strong>de</strong>senho <strong>de</strong>lica<strong>do</strong>, são os únicos objetos presentes 16 . Recolhimento, aos poucos se<br />

transforma <strong>em</strong> acolhimento com a simplicida<strong>de</strong> da recepção. O <strong>de</strong>sconheci<strong>do</strong> se torna algo familiar, apesar<br />

<strong>de</strong> ainda in<strong>de</strong>finível.<br />

A Obra<br />

Or<strong>de</strong>nação Espacial <strong>do</strong> Conjunto:<br />

O edifício <strong>do</strong> <strong>Mosteiro</strong> é forma<strong>do</strong> por volumes adiciona<strong>do</strong>s, organiza<strong>do</strong>s por um eixo cartesiano principal e<br />

outro secundário. Os eixos principais – X e X’ – obe<strong>de</strong>c<strong>em</strong> à direção sugerida por aquele <strong>do</strong> terreno cria<strong>do</strong>,<br />

e o transversal – Y –os conecta. O eixo X organiza os diversos prismas da fachada frontal, enquanto o X’<br />

<strong>de</strong>fine o bloco linear e unitário que abriga as celas. Ao longo <strong>do</strong> eixo <strong>de</strong> conexão Y encontra-se a Igreja, que<br />

forma com o bloco posterior uma composição <strong>em</strong> forma <strong>de</strong> T on<strong>de</strong> serão justapostos <strong>de</strong> ambos os la<strong>do</strong>s,<br />

to<strong>do</strong>s os outros prismas. O eixo Z marca o ponto zero da composição, coinci<strong>de</strong>nte com a localização <strong>do</strong><br />

altar. Desloca<strong>do</strong> <strong>do</strong> conjunto cartesiano principal, mas paralelo a ele, está a torre <strong>do</strong> campanário, el<strong>em</strong>ento<br />

que marca verticalmente toda a composição, ao longo <strong>de</strong> Z’.<br />

Consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> a <strong>do</strong>minância da organização linear ditada pelo senti<strong>do</strong> longitudinal <strong>do</strong>s blocos ao longo <strong>de</strong> X<br />

e X', os vínculos formais entre as partes serão <strong>de</strong>fini<strong>do</strong>s pela introdução <strong>de</strong> <strong>do</strong>is prismas <strong>de</strong> conexão,<br />

paralelos ao volume da igreja e que, com ela, darão orig<strong>em</strong> aos claustros. Os volumes que se assentam ao<br />

longo <strong>de</strong> X, t<strong>em</strong> a sua linearida<strong>de</strong> interrompida pelo bloco da Igreja, o que vai fazer com que ela se<br />

<strong>de</strong>staque <strong>do</strong> conjunto, configuran<strong>do</strong>, com a torre sineira, a discreta hierarquia conferida à composição.


Composição das Fachadas:<br />

Fachada Principal (Nor<strong>de</strong>ste)<br />

Figura 4: Configuração genérica da composição.<br />

Na primeira fase <strong>do</strong> projeto, <strong>Francisco</strong> <strong>Bologna</strong> propõe um edifício cuja presença <strong>de</strong> el<strong>em</strong>entos <strong>do</strong><br />

vocabulário mo<strong>de</strong>rnista era mais contun<strong>de</strong>nte. Observamos o equilíbrio dinâmico consegui<strong>do</strong> na assimetria<br />

da composição volumétrica da fachada, a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> uma estrutura <strong>de</strong> modulação marcada para o<br />

segun<strong>do</strong> pavimento e a opção pelas formas puras <strong>do</strong>s volumes. Nesta versão <strong>de</strong> projeto, propõe maior<br />

contato com o exterior <strong>do</strong> que na segunda, <strong>de</strong>finin<strong>do</strong> gran<strong>de</strong>s aberturas voltadas para a rua, que ocupam<br />

to<strong>do</strong> o intervalo entre os módulos estruturais. Ao longo da galeria que liga a portaria à Igreja projeta os<br />

quebra-sóis. No volume da esquerda, localiza gran<strong>de</strong>s aberturas verticais, completan<strong>do</strong>, assim, a série <strong>de</strong><br />

citações da linguag<strong>em</strong> então <strong>em</strong> voga.<br />

Figura 5: Desenho sobre plantas cedidas pelo <strong>Mosteiro</strong>.<br />

Comparan<strong>do</strong> as duas opções, observamos modificações significativas no que diz respeito à composição <strong>do</strong>s<br />

volumes e superfícies. Na segunda versão, a proporção <strong>do</strong>s volumes da Igreja e da torre <strong>do</strong> campanário é<br />

alterada. A <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> substituir o telha<strong>do</strong> <strong>em</strong>buti<strong>do</strong> por outro, com beirais que protegess<strong>em</strong> a fachada, fez<br />

com que os blocos da hospedaria e ateliês (esquerda) ganhass<strong>em</strong> mais peso. O arquiteto, então, reequilibra<br />

a composição aumentan<strong>do</strong> a altura <strong>do</strong>s volumes à direita <strong>do</strong> eixo, sen<strong>do</strong> que à torre é dada maior


importância. Além <strong>de</strong> mais alta, torna-se mais esbelta e recebe uma cruz como coroamento. Em ambas as<br />

versões, ela é o el<strong>em</strong>ento <strong>do</strong>minante da composição, marcan<strong>do</strong> o acesso principal à Igreja <strong>do</strong>s Fiéis.<br />

Nos <strong>do</strong>is projetos, <strong>Bologna</strong> alinha to<strong>do</strong>s os volumes da fachada, fazen<strong>do</strong> com que os diferentes prismas<br />

compartilh<strong>em</strong> <strong>de</strong> uma superfície comum. Se na primeira versão as diferenças entre eles eram marcadas<br />

pela diversida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s vãos e esquadrias, na versão construída o arquiteto uniformiza o tratamento <strong>do</strong>s<br />

planos, agora com o mínimo <strong>de</strong> fenestrações, pela utilização <strong>do</strong> revestimento <strong>em</strong> lito-cerâmica. Com isso,<br />

<strong>de</strong>fine um conjunto unitário apesar da diversida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s volumes e assinala a horizontalida<strong>de</strong> <strong>do</strong> parti<strong>do</strong>,<br />

significativamente reforçada pela marcação da base <strong>de</strong> apoio <strong>do</strong> edifício <strong>em</strong> pedra. No projeto original<br />

<strong>Bologna</strong> havia especifica<strong>do</strong> o seixo rola<strong>do</strong> para esta superfície, revestimento <strong>de</strong>lica<strong>do</strong>, que já havia<br />

<strong>em</strong>prega<strong>do</strong> no muro <strong>do</strong> claustro da casa Accioly. Havia também <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> para a pare<strong>de</strong> da igreja na<br />

fachada, um acabamento axadreza<strong>do</strong> <strong>em</strong> azulejo azul e branco.<br />

Fachada Posterior (Su<strong>do</strong>este)<br />

O dinamismo da fachada nor<strong>de</strong>ste não será repeti<strong>do</strong> nesta. O prisma é unitário e regular e esten<strong>de</strong>-se, s<strong>em</strong><br />

interrupção ao longo <strong>de</strong> seu eixo <strong>de</strong> simetria. A fachada é composta a partir da modulação estrutural,<br />

<strong>de</strong>finida <strong>em</strong> planta baixa, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com o procedimento usual <strong>de</strong> <strong>Francisco</strong> <strong>Bologna</strong> <strong>de</strong> trabalhar a partir<br />

<strong>de</strong> “módulos <strong>de</strong> projeto”. Com exceção <strong>do</strong> recuo <strong>do</strong> pavimento térreo, <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> à mostra as colunas<br />

circulares da estrutura – recurso mo<strong>de</strong>rnista comum na época – os planos <strong>do</strong>s pavimentos superiores não<br />

apresentam nenhuma saliência ou reentrância.<br />

Na primeira versão <strong>do</strong> projeto, esta unida<strong>de</strong> era ainda mais fort<strong>em</strong>ente marcada pela repetição <strong>do</strong> mo<strong>de</strong>lo<br />

da esquadria <strong>em</strong> ambos os pavimentos. Limitavam-se pelas linhas verticais e horizontais da gra<strong>de</strong> estrutural<br />

<strong>de</strong>finin<strong>do</strong> um ritmo ca<strong>de</strong>ncia<strong>do</strong> e constante. A porosida<strong>de</strong> da superfície era acentuada pela maior proporção<br />

<strong>do</strong>s panos <strong>de</strong> vidro, o que aumentava o contato entre o interior e o exterior <strong>do</strong> edifício. Entretanto, <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> à<br />

clausura, <strong>Francisco</strong> <strong>Bologna</strong> viu-se obriga<strong>do</strong> a diminuir as aberturas, principalmente no segun<strong>do</strong> pavimento,<br />

on<strong>de</strong> se localizam as celas. No primeiro pavimento, a transparência ainda é mantida, apesar da colocação<br />

<strong>de</strong> venezianas móveis ao longo <strong>de</strong> toda a fachada, proven<strong>do</strong> não só iluminação, mas também uma boa<br />

ventilação nos espaços <strong>de</strong> uso.<br />

Como resulta<strong>do</strong>, a diferença entre o primeiro e o segun<strong>do</strong> pavimentos, <strong>de</strong>terminada pela quebra da<br />

padronização das esquadrias, provoca a perda da unida<strong>de</strong> compositiva anterior, pois coloca <strong>em</strong> relação, no<br />

mesmo plano, duas linguagens <strong>de</strong> épocas distintas. De um la<strong>do</strong>, pequenas aberturas centralizadas <strong>em</strong> um<br />

pano <strong>de</strong> alvenaria, à moda tradicional, e <strong>de</strong> outro, as amplas esquadrias permitidas pelo sist<strong>em</strong>a estrutural.<br />

Figura 6: Linguagens diferenciadas.


Igrejas e Claustros<br />

Des<strong>de</strong> o inicio da elaboração <strong>do</strong> projeto, <strong>Bologna</strong> recorre a uma solução espacial bastante interessante na<br />

Igreja, dada a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> separação entre o público leigo e a comunida<strong>de</strong>. Posiciona o altar na<br />

interseção das duas naves <strong>em</strong> L – uma <strong>de</strong>stinada às monjas e a outra, aos fiéis – um pouco <strong>de</strong>sloca<strong>do</strong> <strong>em</strong><br />

relação ao eixo direcional longitudinal da Igreja <strong>do</strong>s Fiéis, e <strong>de</strong> frente para a nave principal. À esquerda, na<br />

composição, ao longo <strong>do</strong> mesmo eixo, encontra-se a Capela <strong>do</strong> Santíssimo Sacramento.<br />

Praticamente não houve alteração nas plantas da Igreja ao longo <strong>do</strong> t<strong>em</strong>po. No Coro, algumas medidas<br />

verticais foram alteradas, assim como tipos diferentes <strong>de</strong> aberturas para os claustros. Na segunda versão,<br />

<strong>Bologna</strong> projeta para as seteiras, brises horizontais, d<strong>em</strong>onstran<strong>do</strong> preocupação com a insolação. Na<br />

versão construída, privilegia a entrada <strong>de</strong> luz e opta por seteiras verticais (<strong>do</strong> chão ao teto), trazen<strong>do</strong> maior<br />

permeabilida<strong>de</strong> entre o espaço interno <strong>do</strong> coro e os claustros. Esta solução foi usada posteriormente pelo<br />

arquiteto no Estu<strong>do</strong> Preliminar para o mosteiro f<strong>em</strong>inino da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Sebastião <strong>do</strong> Alto (MG) 17 . As<br />

seteiras <strong>de</strong>sta igreja são posicionadas na diagonal, a fim <strong>de</strong> direcionar<strong>em</strong> a luz para o altar.<br />

<strong>Bologna</strong> dispensa a ornamentação e traz a simplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sejada. Na Igreja, é gran<strong>de</strong> a noção <strong>de</strong><br />

estabilida<strong>de</strong> e soli<strong>de</strong>z, características imprescindíveis à preservação da vida religiosa. A firmeza da<br />

edificação evi<strong>de</strong>ncias-se também quan<strong>do</strong> pensamos nas colunas que se elevam soltas até o teto e marcam<br />

a verticalida<strong>de</strong> pela proporção <strong>de</strong> suas medidas. O elevar-se das colunas, que enquanto estrutura,<br />

funcionam como simples sustentação, dialoga com a espiritualida<strong>de</strong> transcen<strong>de</strong>nte e reforça a relação entre<br />

a concretu<strong>de</strong> da obra e a abstração <strong>de</strong> seu significa<strong>do</strong>.<br />

Os claustros <strong>em</strong> Belo Horizonte funcionam como jardins <strong>de</strong> meditação, ao re<strong>do</strong>r <strong>do</strong>s quais <strong>de</strong>senvolv<strong>em</strong>-se<br />

as d<strong>em</strong>ais <strong>de</strong>pendências <strong>do</strong> mosteiro 18 . Chamam-nos atenção, além <strong>do</strong> silêncio e da paz neles encontrada,<br />

a leveza e o <strong>de</strong>talhe <strong>do</strong>s pilares que sustentam o telha<strong>do</strong> cerâmico. A coluna <strong>em</strong> ma<strong>de</strong>ira t<strong>em</strong> a forma <strong>de</strong><br />

um cone inverti<strong>do</strong> – o diâmetro aumenta suav<strong>em</strong>ente <strong>em</strong> direção à cobertura – e parece flutuar. Para evitar<br />

o apodrecimento da ma<strong>de</strong>ira, <strong>Bologna</strong> faz com que as colunas não chegu<strong>em</strong> no chão, através <strong>do</strong> uso <strong>de</strong> um<br />

pino metálico, <strong>de</strong>talhe construtivo que também utilizou no alojamento para os monges <strong>do</strong> <strong>Mosteiro</strong> <strong>de</strong> São<br />

Bento no Alto da Boa Vista, mudan<strong>do</strong> a seção <strong>do</strong> pilar para quadrada 19 .<br />

A localização da igreja ao la<strong>do</strong> <strong>de</strong> um jardim representa também uma forma <strong>de</strong> organização espacial que o<br />

arquiteto optou por repetir inúmeras vezes ao longo da carreira. A entrada <strong>de</strong> luz na Capela Santa Maria<br />

(Petrópolis) através das venezianas <strong>em</strong> ma<strong>de</strong>ira já evi<strong>de</strong>ncia as intenções futuras <strong>em</strong> relação às seteiras<br />

verticais nas igrejas <strong>de</strong> <strong>Bologna</strong>.<br />

Conclusão<br />

O arquiteto nos conta que esta obra é aquela pela qual t<strong>em</strong> mais carinho. Prolongou-se por quase to<strong>do</strong> o<br />

t<strong>em</strong>po <strong>de</strong> sua carreira, e apesar <strong>de</strong> parada durante anos segui<strong>do</strong>s por falta <strong>de</strong> recursos, ocupou um lugar<br />

especial <strong>em</strong> sua vida profissional. Por conta <strong>de</strong>ssa longevida<strong>de</strong> foi adquirin<strong>do</strong> uma feição híbrida.<br />

Incorporou a mudança das necessida<strong>de</strong>s das beneditinas, proveniente da mo<strong>de</strong>rnização <strong>do</strong>s costumes e


<strong>de</strong>créscimo no número <strong>de</strong> vocações, b<strong>em</strong> como as interferências <strong>de</strong>terminadas pelas aba<strong>de</strong>ssas, muitas<br />

<strong>de</strong>las motivo <strong>do</strong> <strong>de</strong>sagra<strong>do</strong> <strong>do</strong> arquiteto pela quebra da modulação que provocaram. Por sua vez, ele foi se<br />

encaminhan<strong>do</strong> para uma extr<strong>em</strong>a racionalização <strong>do</strong> fazer arquitetônico, traduzi<strong>do</strong> na preocupação pela<br />

verda<strong>de</strong> construtiva que <strong>de</strong>tectamos na sua fase mais madura. Verda<strong>de</strong> circunspeta e exigente que<br />

d<strong>em</strong>an<strong>do</strong>u um rigoroso ascetismo formal.<br />

No mosteiro, esse comportamento se evi<strong>de</strong>ncia pela licenciosida<strong>de</strong> das modificações admitidas. Fica claro<br />

que, <strong>do</strong>s princípios coloca<strong>do</strong>s por Corbusier, sobrevive apenas o da ord<strong>em</strong> e mais ainda, da ord<strong>em</strong> <strong>do</strong><br />

necessário. <strong>Arquitetura</strong> é, para ele, cada vez menos "coisa <strong>de</strong> plástica" (LE CORBUSIER, 1973, p. 103) e<br />

mais a "or<strong>de</strong>nação e a hierarquia <strong>do</strong>s fins" (LE CORBUSIER, 1973, p. 123), fins esses que são também<br />

éticos e não apenas funcionais, daí que a precarieda<strong>de</strong> <strong>do</strong>s recursos e a necessida<strong>de</strong> <strong>do</strong> programa<br />

comandaram o resulta<strong>do</strong> da obra. De certa maneira, a consciência das razões se incumbia <strong>de</strong> <strong>do</strong>tar um<br />

valor estético ao edifício, mesmo apesar das contradições formais e conceituais que daí <strong>de</strong>corress<strong>em</strong>.<br />

Ex<strong>em</strong>plo disso as modificações feitas <strong>do</strong> primeiro para o segun<strong>do</strong> projeto. Na fachada su<strong>do</strong>este cada<br />

pavimento recebe um tipo distinto <strong>de</strong> fenestração. A clássica janela isolada <strong>do</strong> pavimento das celas, que se<br />

repete como nas fachadas <strong>de</strong> antigos conventos, é anacrônica <strong>em</strong> face à trama regular e neutra das<br />

esquadrias <strong>do</strong> primeiro pavimento, que são agrupadas entre os vãos da estrutura e subdivididas segun<strong>do</strong><br />

uma grelha – procedimento <strong>de</strong> fatura mo<strong>de</strong>rnista que visava tornar a fachada um painel abstrato.<br />

É preciso dizer que as fachadas, tanto <strong>em</strong> composição quanto <strong>em</strong> tratamento das superfícies, apresentamse<br />

distintas umas das outras, o que não se nota imediatamente, uma vez que a implantação <strong>do</strong> edifício e<br />

seu fechamento restring<strong>em</strong> a visão <strong>do</strong> conjunto. Particularmente relevante é a distinção entre os blocos<br />

longitudinais das fachadas nor<strong>de</strong>ste e su<strong>do</strong>este, colocada <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o primeiro projeto. O próprio arquiteto<br />

reconhece-lhes a diferença quan<strong>do</strong> comenta que não lhe agrada tanto a fachada da frente por ser ela<br />

"atormentada", enquanto a <strong>de</strong> trás é serena. Se essa diferenciação justificava-se, parcialmente, pelo <strong>de</strong>sejo<br />

<strong>de</strong> evi<strong>de</strong>nciar a função como matriz formal, no segun<strong>do</strong> projeto essa razão se <strong>de</strong>svanece, confundida pelos<br />

procedimentos <strong>de</strong> unificação <strong>em</strong>preendi<strong>do</strong>s na fachada nor<strong>de</strong>ste, pelo <strong>em</strong>prego <strong>de</strong> um mesmo material <strong>de</strong><br />

revestimento.<br />

Nota-se um conflito permanente entre procedimentos tradicionais e mo<strong>de</strong>rnos, que o arquiteto procurou<br />

agenciar <strong>em</strong> acor<strong>do</strong>s localiza<strong>do</strong>s. A estratégia espacial <strong>do</strong> mosteiro é tributária <strong>de</strong> uma arquitetura religiosa<br />

<strong>de</strong> antiga tradição. A configuração planimétrica r<strong>em</strong>ete, por ex<strong>em</strong>plo, ao S<strong>em</strong>inário <strong>de</strong> Belém da Cachoeira<br />

ou à Residência e Igreja <strong>de</strong> N.S. <strong>de</strong> Reritiba entre tantos outros edifícios conventuais, dada a permanência<br />

<strong>do</strong> programa <strong>de</strong> vida religiosa. Como nestes, os volumes da fachada se alinham e se uniformizam para<br />

obter um resulta<strong>do</strong> unitário, expressivo da filosofia monástica. No interior, preocupações <strong>de</strong> ord<strong>em</strong> <strong>em</strong>otiva<br />

permit<strong>em</strong> o tratamento diferencia<strong>do</strong> da igreja e <strong>do</strong> claustro.<br />

Com relação às <strong>de</strong>cisões <strong>de</strong> projeto, acreditamos que razões <strong>de</strong> ord<strong>em</strong> prática e simbólica acabaram por<br />

inibir muitas das <strong>de</strong>liberações tomadas anteriormente por <strong>Bologna</strong>. Mas apenas isso não explica porque os<br />

procedimentos tradicionais <strong>de</strong> composição são muitas vezes preferi<strong>do</strong>s pelo arquiteto. Em relação aos<br />

"Cinco pontos para uma nova arquitetura" <strong>de</strong> Le Corbusier, o piloti comparece pouco ao projeto, ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong><br />

coloca<strong>do</strong>, ausente <strong>de</strong> valor programático, como solução alternativa para o probl<strong>em</strong>a da topografia <strong>do</strong><br />

terreno. A separação clássica <strong>do</strong> edifício <strong>em</strong> relação ao plano <strong>do</strong> chão vai acontecer, na fachada principal,


não através <strong>do</strong> piloti corbusieriano, mas, sim, pelo <strong>em</strong>basamento <strong>de</strong> pedra que distingue a horizontalida<strong>de</strong><br />

<strong>do</strong> bloco longitudinal e o assenta firm<strong>em</strong>ente ao solo.<br />

A retomada, no segun<strong>do</strong> projeto, <strong>do</strong> telha<strong>do</strong> aparente, com beirais, é outro indício <strong>do</strong> questionamento <strong>do</strong>s<br />

cânones mo<strong>de</strong>rnistas. Quanto à grelha estrutural, evita os pilares soltos nos ambientes, dimensionan<strong>do</strong>-a <strong>de</strong><br />

maneira a acomodá-los nas alvenarias. No bloco das celas, a linha <strong>de</strong> pilares circulares <strong>do</strong> térreo encostase<br />

ao plano <strong>de</strong> vidro e <strong>de</strong>sloca-se para o plano das fachadas <strong>do</strong> primeiro e segun<strong>do</strong> pavimentos integran<strong>do</strong><br />

a composição da fachada, um procedimento recorrente na obra <strong>de</strong> Jorge Moreira, com qu<strong>em</strong> trabalhou.<br />

Como verificamos, o edifício abre uma série <strong>de</strong> caminhos para a compreensão da obra <strong>de</strong> <strong>Bologna</strong>, que um<br />

estu<strong>do</strong> mais aprofunda<strong>do</strong> tentará esclarecer. O mosteiro nos permite refletir criticamente sobre as escolhas<br />

<strong>do</strong> arquiteto e seu posicionamento frente às teorias que lhe serviram <strong>de</strong> referência. Pela peculiarida<strong>de</strong> da<br />

situação <strong>do</strong> projeto, consente perceber as transformações ocorridas ao longo <strong>do</strong> t<strong>em</strong>po e as idiossincrasias<br />

próprias <strong>de</strong> uma obra longa, cujas <strong>de</strong>cisões n<strong>em</strong> s<strong>em</strong>pre foram tomadas por seu autor. Muito ainda há que<br />

se analisar até que possamos compreen<strong>de</strong>r melhor a racionalida<strong>de</strong> da qual se diz arauto e, a singularida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> seu mo<strong>de</strong>rnismo.<br />

Notas<br />

1<br />

As datas citadas neste artigo foram fornecidas pela Ir. Hil<strong>de</strong>gardis, arquiteta e colega <strong>de</strong> <strong>Bologna</strong>, que acompanhou as obras <strong>do</strong><br />

mosteiro. O arquiteto não se recorda <strong>de</strong>las com exatidão e n<strong>em</strong> todas as plantas encontradas nos arquivos <strong>do</strong> mosteiro estão<br />

datadas. Até que possamos fazer uma pesquisa mais aprofundada nos <strong>do</strong>cumentos da obra, tomar<strong>em</strong>os essas datas como<br />

referência.<br />

2 Por ex<strong>em</strong>plo, a diminuição <strong>do</strong> número <strong>de</strong> monjas <strong>de</strong> 100 para 64, e posteriormente para 49.<br />

3 Segun<strong>do</strong> <strong>de</strong>poimentos das irmãs e <strong>do</strong> próprio arquiteto.<br />

4 Nas figuras das aba<strong>de</strong>ssas que governaram o mosteiro durante estes anos.<br />

5 Cf. Habitat n. 52, São Paulo, jan-fev 1959, p. 1-9; MACEDO, Oigres. <strong>Francisco</strong> Bolonha: ofício da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>. 2003. Dissertação<br />

(Mestra<strong>do</strong> <strong>em</strong> <strong>Arquitetura</strong>). Escola <strong>de</strong> Engenharia <strong>de</strong> São Carlos. Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo.<br />

6<br />

A Santa Regra Beneditina é assim chamada porque dirige os costumes daqueles que a ela obe<strong>de</strong>c<strong>em</strong>. É composta por 73 capítulos,<br />

e se encontra disponível para leitura <strong>em</strong> http://www.osb.org.br/ (site <strong>do</strong> <strong>Mosteiro</strong> <strong>de</strong> São Bento <strong>do</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro).<br />

7 Esta liturgia é um tipo <strong>de</strong> oração pública, realizada <strong>em</strong> comum, <strong>de</strong>stinada ao louvor e à petição. Também é chamada <strong>de</strong> Ofício Divino.<br />

8<br />

A hora <strong>de</strong> Vigílias, apesar <strong>de</strong> ser a primeira <strong>do</strong> dia, é consi<strong>de</strong>rada uma hora noturna. As horas <strong>de</strong> Lau<strong>de</strong>s e Vésperas, são<br />

consi<strong>de</strong>radas Horas Maiores, pois são mais extensas e mais solenes, celebran<strong>do</strong> a aurora <strong>do</strong> dia e o anoitecer, respectivamente. De<br />

acor<strong>do</strong> com o Sacrosanctum Concilium (<strong>do</strong>cumento elabora<strong>do</strong> pelo Papa João XXIII para o Concílio Ecumênico Vaticano II, <strong>em</strong><br />

1962), estas “são tidas como os <strong>do</strong>is pólos <strong>do</strong> ofício cotidiano, sen<strong>do</strong> consi<strong>de</strong>radas como as Horas principais” (Cf. SC, nn. 89a). As<br />

horas <strong>de</strong> Terça, Sexta e Noa são as Horas Menores, e <strong>de</strong>stinam-se a diversos momentos <strong>do</strong> dia, sen<strong>do</strong> celebradas durante os<br />

trabalhos diários, que são interrompi<strong>do</strong>s para este fim. A Completas, última oração <strong>do</strong> dia, é rezada antes <strong>do</strong> <strong>de</strong>scanso noturno.<br />

9 Ir. Maria Rita, junho <strong>de</strong> 2003, <strong>em</strong> <strong>de</strong>poimento sobre o mosteiro <strong>de</strong> Belo Horizonte.<br />

10<br />

No início <strong>do</strong> cristianismo, a divulgação da mensag<strong>em</strong> religiosa era repassada através <strong>do</strong> canto, haven<strong>do</strong> a assimilação <strong>de</strong> diferentes<br />

culturas já existentes (judaica e helênica). Consi<strong>de</strong>ra-se que o canto gregoriano teve seu apogeu durante o século VIII. É um canto<br />

exclusivamente vocal, e in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nt<strong>em</strong>ente da crença religiosa que se tenha, consegue atingir a espiritualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cada um.<br />

11 De alguma celebração festiva, como a Páscoa ou o Natal.<br />

12 O conjunto <strong>de</strong> parlatórios consiste <strong>em</strong> salas <strong>de</strong> tamanhos diferentes, e além <strong>de</strong> ser o lugar para o contato com a família, é on<strong>de</strong> as<br />

monjas oferec<strong>em</strong> atendimento àqueles que necessitam <strong>de</strong> algum tipo <strong>de</strong> aconselhamento.


13 As gra<strong>de</strong>s <strong>do</strong>s parlatórios possuíam uma gaveta, on<strong>de</strong> eram coloca<strong>do</strong>s papéis ou objetos que necessitass<strong>em</strong> ser troca<strong>do</strong>s.<br />

14 O maior <strong>de</strong>les – o Salvator Mundi – pesa 2,5 toneladas e os outros quatro juntos – São Bento, Santa Escolástica, Santa Maria e<br />

Santa Lúcia – outras 2,5 toneladas.<br />

15<br />

A torre havia si<strong>do</strong> projetada para um sino somente e tinha as laterais vazadas, com fechamento <strong>em</strong> treliças <strong>de</strong> peroba. Em 1961<br />

foram <strong>do</strong>a<strong>do</strong>s os 5 sinos, e hoje os quatro la<strong>do</strong>s são fecha<strong>do</strong>s por uma capa <strong>de</strong> concreto, até praticamente o topo, na base <strong>do</strong> sino<br />

maior. A obra durou três meses e também foi efetuada a instalação da fiação para o quadro elétrico <strong>do</strong>s sinos, o que dispensa<br />

qualquer esforço físico por parte das monjas.<br />

16 Foram projeta<strong>do</strong>s pelo arquiteto, assim como to<strong>do</strong> o mobiliário da Igreja.<br />

17<br />

<strong>Bologna</strong> ce<strong>de</strong>u-nos <strong>em</strong> janeiro <strong>de</strong> 2003 <strong>do</strong>is <strong>de</strong>senhos relativos ao estu<strong>do</strong> <strong>de</strong> um mosteiro f<strong>em</strong>inino para 20 monjas (plantas <strong>do</strong><br />

térreo e sub-Solo), que foram i<strong>de</strong>ntifica<strong>do</strong>s <strong>em</strong> Belo Horizonte como sen<strong>do</strong> para a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Sebastião <strong>do</strong> Alto. O projeto não foi<br />

adiante.<br />

18 Comparar com o esqu<strong>em</strong>a da planta <strong>do</strong> <strong>Mosteiro</strong> <strong>de</strong> San Gallen, na Suíça (Figura 2).<br />

19 Ele nos conta que <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> ter visto os pilares <strong>de</strong> eucalipto da galeria da Casa Accioly apodrecer<strong>em</strong> pelo contato com o solo,<br />

apren<strong>de</strong>u que <strong>de</strong>veria suspen<strong>de</strong>r a estrutura, para impedir a umida<strong>de</strong>.<br />

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SARTORE, Domenico e TRIACCA, Achille M. (org.) Dicionário <strong>de</strong> Liturgia. São Paulo: Edições Paulinas,<br />

1992.<br />

Fonte das Imagens:<br />

Desenhos 1, 3, 4, 5 e 6: as autoras<br />

Desenho 2:

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