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CONTEXTO - UFES - Universidade Federal do Espírito Santo

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DOSSIÊ MACHADO DE ASSIS<br />

redigi<strong>do</strong>s às dúzias para responder à demanda das empresas<br />

jornalísticas, a obra de Macha<strong>do</strong> explorou, quase à exaustão,<br />

o emblema <strong>do</strong> teatro. Servin<strong>do</strong>-se da popularidade dessa<br />

instituição, onde se concentrava a sociabilidade elegante, as<br />

intrigas – ou os resquícios de intriga – centram-se no teatro,<br />

mas a representação, que se desenrola no palco, está ausente<br />

<strong>do</strong> texto. Sua referência mantém-se, como um fantasma,<br />

assombran<strong>do</strong> o diálogo <strong>do</strong>s camarotes ou da ceia, após o<br />

espetáculo. É o espectro que desloca e subverte o significa<strong>do</strong><br />

das ações “reais”, desencadeadas nas casas e nas ruas. Na<br />

abertura de Dom Casmurro, um tenor, já velho e rouco, compara<br />

a vida a uma ópera e o narra<strong>do</strong>r considera que “há filósofos<br />

que são, em resumo, tenores desemprega<strong>do</strong>s” (Assis, 1962, p.<br />

817, v. 1). As memórias de Bento lêem-se, assim, como se cada<br />

protagonista tivesse seu papel predetermina<strong>do</strong>, pelo libreto<br />

da ordem social. Mas, ao contracenarem, um jamais consegue<br />

depreender as razões <strong>do</strong> texto <strong>do</strong> outro. E, como a ópera,<br />

descrita por Marcolini, o tenor aposenta<strong>do</strong>, tem co-autoria<br />

de Deus e <strong>do</strong> diabo, é bem possível que, na falta de sintonia<br />

entre música e versos, o senti<strong>do</strong> permaneça inalcançável. Para<br />

conhecer estágios desse percurso de decifração e ciframento de<br />

um saber sobre a sociedade <strong>do</strong>s homens, vale a pena examinar<br />

um par de contos, onde o emblema <strong>do</strong> teatro preside à trama<br />

e matiza o estilo.<br />

Nos anos de sua juventude e primeira maturidade, Macha<strong>do</strong><br />

de Assis pertenceu, simultânea ou sucessivamente, ao corpo<br />

de redatores de diversos jornais e revistas; nos primeiros,<br />

ocupava a coluna <strong>do</strong> folhetim-variedades; nestas, contribuía<br />

com contos e noveletas. Além dessas tarefas regulares, fazia<br />

poemas e era, às vezes, convida<strong>do</strong> para a empreitada mais<br />

longa de um romance em folhetins. Sua obra foi, assim, sen<strong>do</strong><br />

construída aos pedaços, guardan<strong>do</strong>, no entanto, a singularidade<br />

de certo humor sombrio mas conti<strong>do</strong>. Guardan<strong>do</strong>, também,<br />

insistente, o desejo de construir um pensamento inventivo<br />

e crítico. Como o espaço literário, que o fascinava e podia<br />

remunerá-lo, impedia-lhe a sistematicidade <strong>do</strong> discurso<br />

28 • Revista nº 15 e 16 - 2008/2009

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