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Foto Marcelo Uchôa / Livro “Que Chita Bacana”<br />
Acima, boi-bumbá em papier maché e chita. À direita,<br />
boneco pigmeu em chitão e papier maché utilizado<br />
em teatro mamulengo, do mercado de artesanato do<br />
Recife. No alto da página, estampa característica da<br />
chita: traço ingênuo, com flores e folhagens gigantes,<br />
inspiradas na natureza.<br />
Na página ao lado, participantes da festa do Ticumbi<br />
ou Baile dos Congos, realizada em louvor de São<br />
Benedito, em Itaúnas (ES)<br />
16<br />
<strong>ARC</strong> <strong>DE</strong>SIGN<br />
<strong>SABOR</strong> <strong>DE</strong> <strong>ENCANTO</strong><br />
Quantas expressões um simples pedaço de tecido pode englobar?<br />
Mesmo que seja um tecido barato, originário da Índia medieval?<br />
A diversidade de seus destinos – antigos e atuais – mostra o<br />
poder do design em duas visões distantes no tempo<br />
Maria Helena Estrada<br />
O fenômeno “chita 2005” é herdeiro direto da atual ênfase no artesanato,<br />
no natural-ecológico, no brasileiro. Embora a história da chita não<br />
seja bem essa...<br />
O tecido, ou melhor, a padronagem desse algodão tem origem na Índia –<br />
país que proíbe a reprodução em desenho de animais ou figuras humanas.<br />
A solução para a estamparia? Listras e geometrismos, ou seja, o famoso<br />
“madras”; e flores, que chegaram ao Brasil passando por Portugal. Em<br />
1498, Vasco da Gama chega a Calcutá e retorna à Europa trazendo na<br />
bagagem os tecidos estampados da Índia.<br />
Mas as flores dos tecidos indianos eram miudinhas, delicadas. Foi no Brasil<br />
que se deu a explosão de cores (mesmo<br />
usando só aquelas primárias), formatos e tamanhos;<br />
foi no Brasil que as grandes flores<br />
receberam o fio de contorno, negro, dramático,<br />
que as delineia.<br />
De acordo com o “Aurélio”, chita é “tecido ordinário<br />
de algodão, estampado em cores”. E<br />
a chita sempre foi sinônimo de “coisa barata”,<br />
do supra-sumo do kitsch. Mas sempre<br />
deixou, em nossa memória afetiva, um<br />
belo sabor brasileiro – agora recuperado,<br />
e declinado em mil objetos, adereços e roupas.<br />
Foto Lena Trindade / Livro “Que Chita Bacana”<br />
Foto Marcelo Uchôa / Livro “Que Chita Bacana”
Foto Lena Trindade / Livro “Que Chita Bacana”<br />
À esquerda, rua do Recife decorada para as festas juninas de 2003. Acima,<br />
relicário com moldura em chita, criação da artista plástica Vera Souto, de São Paulo.<br />
Na página ao lado, menina com sombrinha de chita em igarapé próximo ao<br />
Rio Tapajós (PA)<br />
Fenômeno coletivo, sussurrado aos poucos, o reaparecimento<br />
da chita revaloriza não apenas os artefatos folclóricos,<br />
o trabalho dos bonequeiros do Nordeste, o bumbameu-boi,<br />
as figuras dos mamulengos e as roupas caipiras<br />
das festas juninas. A chita entra com nobreza na<br />
casa contemporânea, faz parte da decoração, é tema e<br />
matéria-prima de estilistas famosos. Ela está em capas<br />
de caderno, reveste caixinhas, transforma-se em roupa<br />
íntima, bolsa, biquíni e vestidos. Uma loja “cool”, como a<br />
Conceito, em São Paulo, importa da China objetos em<br />
uma chita de vibrante brilho e colorido.<br />
Mas não é só isso.<br />
Renata Mellão e Renato Imbroisi aprofundaram pesquisas<br />
e lançam agora o livro “Que Chita Bacana”, com texto de<br />
Maria Emilia Kubrusly e fotos de Lena Trindade.<br />
Dois grandes eventos também acontecem em 2005, em<br />
São Paulo. O primeiro, uma exposição no Museu da Casa<br />
Brasileira – “A Chita na Moda” –, idealizada por Renata<br />
Mellão, com curadoria de moda de Dudu Bertholini e realização<br />
de A Casa, museu do objeto brasileiro. Foram<br />
convidados 11 estilistas famosos, como Reinaldo Lourenço,<br />
Gloria Coelho, Marcelo Sommer, entre outros, que falam<br />
a linguagem contemporânea da moda em chita.<br />
Foto Marcelo Uchôa / Livro “Que Chita Bacana”
Acima, à esquerda, modelo tradicional de bolsa revisitado em chitão, design Marisa Ribeiro. Na sequência, bolsa com babado de chita e sementes,<br />
design Alessa. “A Chita collection é a sofisticação do popular brasileiro: chita é chique. Todas as peças de chita são etiquetadas com as sementes de<br />
chitinha. Para usar e semear”, explica a designer no livro “Momentum”.<br />
Abaixo, à esquerda, criações do designer Renato Imbroisi: tecidos feitos em tear manual com fios de algodão e chitão cortado em tiras, enrolados em novelos, para<br />
serem utilizados no processo de tecelagem. Na sequência, colcha e almofadas de Guiomar Marinho, em algodão com inserções de chita, feita em tear manual<br />
Foto Lena Trindade / Livro “Que Chita Bacana”<br />
Foto Mary Azevedo / Livro “Momentum”<br />
Foto Divulgação Grupo Corpo / Livro “Que Chita Bacana”<br />
Ao lado, álbuns e cadernos da Portfoliobook. No alto, à esquerda, pasta<br />
sanfonada, criação do Ateliê Maria Ciça Pini e, à direita, bolsa em palha<br />
forrada internamente com chitão, encontrada na Conceito<br />
Ao lado, pano de fundo do cenário criado por Fernando Velloso para o<br />
espetáculo 21, estreado em 1992 pelo Grupo Corpo, de Belo Horizonte.<br />
Acima, bandeira do Brasil de patchwork com chita, criação de Cecília<br />
“Loira” Cerrotti para a exposição “Flávio Império em Cena”, realizada<br />
no Sesc Pompéia (São Paulo) em 1997<br />
21<br />
Foto Marcelo Uchôa / Livro “Que Chita Bacana”<br />
Foto Marcelo Uchôa / Livro “Que Chita Bacana”<br />
<strong>ARC</strong> <strong>DE</strong>SIGN
Foto Divulgação Santa Ephigênia / Livro “Que Chita Bacana”<br />
Foto Jacques Dequeker<br />
À esquerda, no alto, desfile da Santa Ephigênia no Fashion Rio (verão<br />
2003); na sequência, vestido criado pela Neon, de Dudu Bertholini e Rita<br />
Comparato, para a exposição “A Chita na Moda”. Na página ao lado, criação<br />
de Reinaldo Lourenço para a mesma exposição<br />
O segundo acontecimento, ainda no início deste ano,<br />
será uma enorme exposição no SESC Belenzinho, com<br />
curadoria de Renato Imbroisi e arquitetura de Janete<br />
Costa. Nos espaços externos do SESC serão instalados<br />
enormes bichos – uma cobra, que é o túnel de entrada;<br />
um bumba-meu-boi, em cujo interior haverá uma sala de<br />
espetáculos. No conjunto, a recriação de todo o universo<br />
do folclore brasileiro.<br />
O reaparecimento da chita faz parte de um fenômeno de<br />
dimensões muito maiores, que diz respeito a toda a criação<br />
brasileira. Priorize-se ou não a qualidade do produto<br />
final do novo artesanato, realiza-se hoje um verdadeiro<br />
mapeamento do patrimônio popular brasileiro, com a sucessiva<br />
apropriação das peculiaridades, dos materiais e<br />
dos elementos do fazer artesanal. ❉<br />
CRÉDITOS:<br />
Exposição “A Chita na Moda”<br />
Idealização: Renata Mellão<br />
Curadoria de Moda: Dudu Bertholini<br />
Realização: A CASA – casa museu do objeto brasileiro<br />
Local: Museu da Casa Brasileira (Av. Brig. Faria Lima, 2.705, São Paulo)<br />
Visitação até 20/02/2005, de terça a domingo, das 10h às 18h<br />
Exposição “Que Chita Bacana”<br />
Idealização: Renato Imbroisi<br />
Arquitetura: Janete Costa<br />
Assistente de curadoria: Liana Bloisi<br />
Local: SESC Belenzinho (Av. Álvaro Ramos, 915, São Paulo)<br />
Data a definir<br />
Livro “Que Chita Bacana”<br />
Idealização: Renata Mellão e Renato Imbroisi<br />
Texto: Maria Emilia Kubrusly<br />
Fotos: Lena Trindade<br />
Publicado por A CASA – casa museu do objeto brasileiro<br />
Foto Jacques Dequeker