15.04.2013 Views

Eça e o Dandismo / Maria de Fátima Marinho. Estudos

Eça e o Dandismo / Maria de Fátima Marinho. Estudos

Eça e o Dandismo / Maria de Fátima Marinho. Estudos

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

<strong>Maria</strong> <strong>de</strong> <strong>Fátima</strong> <strong>Marinho</strong><br />

Não é assim difícil encontrar referências mais ou menos explícitas à importância<br />

das marcas britânicas que uma personagem exibe como garantia <strong>de</strong><br />

elegância e bom gosto. O exótico <strong>de</strong>s Esseintes sente-se irresistivelmente atraído<br />

por esse país <strong>de</strong> requinte e brumas: «Il jeta un regard ravi sur ses habits dont la<br />

couleur et la coupe ne différaient pas sensiblement <strong>de</strong> celles <strong>de</strong>s autres, et il<br />

éprouva le contentement <strong>de</strong> ne point détonner dans ce milieu, d’être, en quelque<br />

sorte et superficiellement, naturalisé citoyen <strong>de</strong> Londres» (Huysmans: p. 245); e<br />

Dorian Gray verbaliza ironicamente, e do ponto <strong>de</strong> vista inglês, tal atitu<strong>de</strong>:<br />

«Anglomanie is very fashionable over there now, I hear. It seems silly of the<br />

french, doesn’t it?» (Wil<strong>de</strong>: p. 171).<br />

Em romances como O Primo Basílio, Os Maias, A Cida<strong>de</strong> e as Serras ou A<br />

Tragédia da Rua das Flores, encontramos também referências explícitas a esse<br />

predomínio que se transforma numa quase atracção fatal: O Primo Basílio –<br />

«Basílio tinha chegado então <strong>de</strong> Inglaterra: vinha muito bife, usava gravatas<br />

escarlates passadas num anel <strong>de</strong> ouro, fatos <strong>de</strong> flanela branca, espantava Sintra!»<br />

(Queirós: s/d, vol. 1, p. 873); A Cida<strong>de</strong> e as Serras – «Todo o seu fato [<strong>de</strong><br />

Jacinto], as espessas gravatas <strong>de</strong> cetim escuro que uma pérola prendia, as luvas<br />

<strong>de</strong> anta branca, o verniz das botas, vinham <strong>de</strong> Londres em caixotes <strong>de</strong> cedro»<br />

(Queirós, s/d, vol.1, p. 380); A Tragédia da Rua das Flores – «A sua [<strong>de</strong> tio<br />

Timóteo] afeição real era Vítor; a sua admiração a Inglaterra; assinava o Times<br />

e lia-o todo <strong>de</strong>votamente.» (Queirós: 1980, p. 62); «Ao mesmo tempo educava-<br />

-o [Genoveva a Vítor]: dava-lhe conselhos <strong>de</strong> toilette: aconselhava-lhe cores <strong>de</strong><br />

gravatas, e <strong>de</strong> meias <strong>de</strong> seda; iniciava-o no estilo sóbrio do dandismo inglês.»<br />

(Queirós: 1980, p. 296); em Os Maias não se <strong>de</strong>vem esquecer as reiteradas afirmações<br />

da superiorida<strong>de</strong> da educação inglesa sobre a portuguesa.<br />

A anglomania não po<strong>de</strong> dissociar-se do culto do belo, muitas das vezes,<br />

gratuito, mas fundamental para o estabelecimento <strong>de</strong> uma elegância sóbria e<br />

metódica, que se traduz regularmente pelo luxo, pela ociosida<strong>de</strong> e pelo <strong>de</strong>sprezo<br />

dos valores burgueses, sejam eles os do trabalho ou outros. Um dos pontos<br />

máximos <strong>de</strong>ssa <strong>de</strong>sesperada procura parece ser a ansieda<strong>de</strong> subjacente ao <strong>de</strong>sejo<br />

<strong>de</strong> Dorian Gray em permanecer sempre belo e jovem:<br />

If it where only the other way! If it where I who was to be always young, and the picture<br />

that was to grow old! For that – for that – I would give everything! Yes, there is nothing in the<br />

whole world I would not give! I would give my soul for that! (…)When I find that I am<br />

growing old, I shall kill myself. (…) I am jealous of everything whose beauty does not die. I am<br />

jealous of the portrait you have painted of me (Wil<strong>de</strong>: pp. 34-35).<br />

A obsessão pelo luxo e pelo elegante actualiza-se na ostentação gratuita do<br />

consultório <strong>de</strong> Carlos, cuja funcionalida<strong>de</strong> é duvidosa e cujos doentes são praticamente<br />

inexistentes; o seu projecto <strong>de</strong> escrever um livro, assim como o <strong>de</strong> Ega,<br />

é também algo <strong>de</strong> vago, con<strong>de</strong>nado <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início ao fracasso, dadas as carac-<br />

354

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!