download - José Eduardo Cardozo
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Essa reforma enfrenta muita resistência,<br />
visto que muitos parlamentares se<br />
beneficiam do próprio sistema político,<br />
que acaba criando certas distorções. Entra<br />
governo e sai governo e sempre há<br />
desejo grande de uma parcela de políticos<br />
de que seja realizada essa reforma.<br />
Porém, vontade política por si só não será<br />
capaz de fazer com que isso aconteça. É<br />
um processo complexo, custoso e que<br />
envolve muitos segmentos e interesses”,<br />
diz o deputado <strong>José</strong> <strong>Eduardo</strong> <strong>Cardozo</strong>,<br />
ferrenho defensor da Reforma Política.<br />
Para <strong>Cardozo</strong>, é muito comum as<br />
pessoas simplificarem algumas análises<br />
e acharem que certas realidades derivam<br />
só daquilo que se costuma chamar de<br />
‘vontade política’. “As pessoas dizem que<br />
‘basta ter vontade política para as coisas<br />
acontecerem’, mas isso é de uma ingenuidade<br />
atroz. Há uma questão que é<br />
própria das instituições humanas que dificilmente<br />
exercita uma reforma. Isso eu<br />
falo de tudo. Até reformar o estatuto de<br />
um condomínio é difícil. Numa empre-<br />
sa, por exemplo, se você pedir para uma<br />
diretoria reformar seu próprio poder de<br />
direção, dificilmente isso acontecerá.”<br />
No parlamento não é diferente. Aprovam-se<br />
leis altamente transformadoras,<br />
mas é muito difícil o parlamento transformar<br />
suas próprias regras que mexam<br />
com o poder dos parlamentares.<br />
<strong>Cardozo</strong> cita como maior exemplo<br />
a Constituição de 1988, considerada a<br />
mais democrática de todas as constituições<br />
brasileiras, mas que, apesar disso,<br />
mantém na parte relativa ao sistema<br />
político os mesmos alicerces do sistema<br />
político da ditadura. “Um deles é o caso<br />
da Câmara dos Deputados ter um limite<br />
máximo no número de deputados e um<br />
limite mínimo de presença de bancadas,<br />
o que gera uma distorção brutal, na qual<br />
A importância da<br />
Reforma Política<br />
A necessidade de uma Reforma Política<br />
tem estado cada vez mais presente nas<br />
rodas de discussões entre parlamentares,<br />
juízes e até a sociedade em geral<br />
cidadãos de certos estados mais populosos são subrrepresentados na Câmara<br />
dos Deputados em relação a outros estados. Por que uma Constituição<br />
tão inovadora, tão democrática, tão transformadora mantém um<br />
sistema tão arcaico, tão antidemocrático como esse?”, questiona.<br />
A resposta está no fato da Constituição de 1988 não ter sido feita<br />
por uma Assembléia Nacional Constituinte, em que as pessoas eram<br />
eleitas, faziam a Constituição e iam embora; ela foi feita pelo Congresso<br />
Nacional com os deputados e senadores sendo eleitos por aquele sistema<br />
político e reproduziram aquelas regras para o futuro. Não tiveram condições<br />
de reformar o sistema de poder que os colocou no poder.<br />
“A Reforma Política tem de passar pelo Congresso. Mas imaginar que<br />
o Congresso sozinho faça essas mudanças, sinceramente, eu não acho<br />
possível. Ou há uma energia social de fora para dentro que propulsione<br />
essa reforma – e aí vem a tese se deve haver uma Assembléia Constituinte<br />
só para fazer reforma e há questões jurídicas complicadas sobre<br />
isso. Ou, então, se pense em mecanismos em que a sociedade produza<br />
a melhor forma de se realizar a Reforma Política ou ela não terá êxito.<br />
Dificilmente uma instituição se autorreforma na sua sistemática de condução<br />
de poder se você não tiver uma cobrança para que isso ocorra.”<br />
Para <strong>Cardozo</strong>, ou a sociedade brasileira se conscientiza de que a<br />
Reforma Política é prioritária para o País ou ela não irá acontecer.<br />
Ficha Limpa: envolvimento da sociedade. Foi o envolvimento da sociedade<br />
e a pressão que levaram a Lei da Ficha Limpa ser aprovada, por exemplo.<br />
“A aprovação da lei foi um marco importante na história política do<br />
Brasil. Não apenas pelo resultado legislativo, mas pelo resultado pedagógico”,<br />
diz <strong>Cardozo</strong>, que foi relator da Lei da Ficha Limpa na CCJC (Comissão<br />
de Constituição Justiça e Cidadania) da Câmara dos Deputados.<br />
Porém, a Lei da Ficha Limpa foi de fácil compreensão para a sociedade, o<br />
que não ocorre com a Reforma Política. A sociedade brasileira não entende<br />
como funciona o sistema político brasileiro, altamente complexo. As eleições<br />
proporcionais são um exemplo claro. O eleitor vota numa pessoa e acaba elegendo<br />
outra. Não sabe que o voto é computado em uma legenda e não sabe<br />
que pode estar elegendo outra pessoa em que jamais votaria. Isso é da realidade<br />
brasileira e tem de haver esclarecimento. “É tão curioso que muitas vezes os<br />
eleitores fazem voto de protesto e acabam ajudando a eleger pessoas contra<br />
as quais protestam. É um sistema de uma irracionalidade profunda. Estamos<br />
muito longe de uma compreensão social de nosso sistema político”, argumenta.<br />
Entretanto, <strong>Cardozo</strong> é um entusiasta da vida pública. Segundo ele, o<br />
mais interessante de uma política transformadora é que ela possa, de fato,<br />
fazer transformações. “O dia que uma pessoa disser ‘vivo num sistema<br />
político ideal e numa comunidade ideal’, ela não tem mais porque fazer<br />
política transformadora, está numa política de acomodação. Eu até me envaideço<br />
de ser uma pessoa profundamente descontente com a realidade”.<br />
Militância em prol<br />
dos direitos dos idosos<br />
Durante os 16 anos de vida pública, o deputado <strong>José</strong> <strong>Eduardo</strong> <strong>Cardozo</strong><br />
foi um defensor dos direitos dos idosos. Para ele, existe no Brasil um<br />
apartheid etário, que segrega e exclui da sociedade, e muitas vezes da<br />
própria família, as pessoas mais velhas.<br />
O interesse do deputado em militar pela causa do idoso começou<br />
logo no início da carreira pública, quando avaliava uma série de temas<br />
e idéias para atuar na Câmara Municipal de São Paulo. “O trabalho<br />
parlamentar em relação ao idoso normalmente acontece às vésperas de<br />
eleição, quando se fazem festinhas para idosos. E nós desenvolvemos um<br />
trabalho voltado à qualidade de vida e a um envelhecimento saudável,<br />
realizado há 14 anos. Toda segunda semana do mês, às segundas-feiras,<br />
como parlamentar, eu promovi um seminário com especialistas para<br />
debater questões do idoso, de modo que me dessem subsídios e me formassem<br />
convicções para que desenvolvesse projetos de lei, propusesse<br />
políticas públicas”, conta o deputado.<br />
E os resultados concretos foram animadores. O mais expressivo e<br />
conhecido deles foi a lei que criou a vacinação do idoso contra gripe,<br />
pneumonia e tétano na cidade de São Paulo. “Na época o prefeito não<br />
queria sancionar, derrubamos o veto e a partir daí então conseguimos<br />
implantar. Mais tarde, o Governo Federal, ao ver o sucesso em São Paulo,<br />
adotou a medida, no Ministério da Saúde, e implantou a vacinação<br />
em âmbito nacional. Portanto, eu tenho a felicidade de estar na base da<br />
elaboração dessa política”, comemora.<br />
Dificuldade social e psíquica. Durante o trabalho, o deputado passou a<br />
ter a dimensão de que o idoso se autodestruía demais. E não apenas por<br />
uma questão social. Ele reproduz no seu interior ideologicamente uma<br />
“Vivemos num<br />
apartheid etário”<br />
discriminação. “Quando eu digo que<br />
vivemos num apartheid etário é real.<br />
As famílias não dão atenção aos seus<br />
idosos, deixam de ouvir seus ‘velhos’. A<br />
sociedade de consumo produziu a ideia<br />
de que o novo é sempre bom e o velho é<br />
um atraso, o que não é necessariamente<br />
correto. Ao contrário de outros povos<br />
que cultuavam seus velhos justamente<br />
por causa de sua sabedoria. Nossa sociedade<br />
despreza os velhos, justamente<br />
por uma característica ideológica da sociedade<br />
de consumo”, reitera.<br />
Esse processo gera no idoso uma cons-<br />
ciência perversa de autodiscriminação.<br />
“O idoso não se acha mais capaz de<br />
aprender, tem medo de computador, um<br />
controle remoto da televisão, pede pro<br />
filho ajudar, acaba se distanciando, se<br />
excluindo da família, se separando. Isso<br />
tudo forma uma sociedade altamente<br />
discriminatória, na hora de conseguir<br />
um emprego, ser ouvido. Isso me trouxe<br />
um aprendizado fantástico, do idoso e da<br />
necessidade de garantir sua cidadania”.<br />
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Foto: Penha Souza