Literatura Infantil e Ilustração – Imagens que falam - Página Pessoal ...
Literatura Infantil e Ilustração – Imagens que falam - Página Pessoal ...
Literatura Infantil e Ilustração – Imagens que falam - Página Pessoal ...
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong>:<br />
<strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> Falam<br />
Mestrado em Educação<br />
Área de Esp. Tecnologia Educativa<br />
Tecnologia da Imagem<br />
Docente: Prof. Doutor Henri<strong>que</strong> Chaves<br />
Trabalho realizado por:<br />
Elisa Castro<br />
Braga<br />
2004/2005
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Índice<br />
Introdução.................................................................................................................... 4<br />
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong>..................................................................................................... 5<br />
Génese e evolução ........................................................................................................ 5<br />
O livro para a criança.................................................................................................... 7<br />
Os primeiros impressos ................................................................................................ 9<br />
Classificação da literatura infantil .............................................................................. 13<br />
<strong>Ilustração</strong>.................................................................................................................... 17<br />
Técnicas Manuais ....................................................................................................... 19<br />
Lápis e tinta ................................................................................................................ 19<br />
O aerógrafo................................................................................................................. 20<br />
Manejo do aerógrafo................................................................................................... 22<br />
<strong>Ilustração</strong> <strong>Infantil</strong>.................................................................................................... 25<br />
Aspectos gráficos e visuais......................................................................................... 26<br />
Leitura de imagens...................................................................................................... 28<br />
Funções da ilustração.................................................................................................. 30<br />
Figuras de estilo.......................................................................................................... 31<br />
Alice no País das Maravilhas............................................................................... 34<br />
Lewis Carroll............................................................................................................. 34<br />
Contextualização do texto e do autor ......................................................................... 35<br />
Como surgiu a Alice? ................................................................................................. 37<br />
Lewis, o fotógrafo ...................................................................................................... 40<br />
John Tenniel, o ilustrador ........................................................................................... 46<br />
Outros ilustradores...................................................................................................... 47<br />
<strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong>...................................................................................................... 50<br />
“Conselhos de uma Lagarta”, por sete ilustradores.................................................... 59<br />
Matemática na obra?................................................................................................... 60<br />
Conclusão ................................................................................................................... 64<br />
Bibliografia ................................................................................................................ 65<br />
2
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
“Alice começava a sentir-se muito cansada por estar sentada no banco,<br />
ao lado da irmã, e por não ter nada <strong>que</strong> fazer. Mais do <strong>que</strong> uma vez<br />
espreitara para o livro <strong>que</strong> a irmã estava a ler, mas este não tinha<br />
gravuras nem conversas... “E para <strong>que</strong> serve um livro <strong>que</strong> não tem<br />
gravuras nem conversas?” pensou Alice.”<br />
3<br />
CARROLL, Lewis. “Alice no País das Maravilhas”
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Introdução<br />
O presente trabalho tem como título “<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong>: <strong>Imagens</strong><br />
<strong>que</strong> <strong>falam</strong>”. Partindo do conceito de “literatura infantil”, procedemos a uma breve<br />
resenha histórica em torno do mesmo. A partir de <strong>que</strong> momento surgiu a literatura<br />
infantil e se começaram a escrever histórias direccionadas para crianças? A par do texto<br />
quais as funções da imagem <strong>que</strong> o acompanham? Quais os autores/ilustradores mais<br />
representativos deste tipo de escrita destinado aos mais jovens? Tentamos responder a<br />
estas e outras <strong>que</strong>stões, pondo a tónica principal no papel das imagens e das ilustrações<br />
neste tipo de livros.<br />
Num segundo momento, passamos às técnicas da ilustração propriamente ditas.<br />
Que utensílios e <strong>que</strong> materiais um ilustrador utiliza para a concepção dos seus<br />
desenhos? Que cuidados deve ter um ilustrador ao conceber desenhos para livros de<br />
crianças? Até <strong>que</strong> ponto as imagens desenhadas são um reflexo das palavras, ou seja, do<br />
texto escrito? Será <strong>que</strong> todas as imagens representam e materializam o texto escrito, ou<br />
por outro lado, são apenas uma mera repetição ou redundância daquilo <strong>que</strong> está escrito?<br />
Partindo destas <strong>que</strong>stões, seleccionamos uma obra para a infância intitulada<br />
“Alice no País das Maravilhas” e analisamos as respectivas ilustrações. Tentamos ver<br />
em <strong>que</strong> medida elas convergem ou distanciam-se do texto. Fizemos ainda uma pesquisa<br />
em relação aos vários ilustradores da obra em <strong>que</strong>stão (mais de duzentos), sendo <strong>que</strong><br />
John Tenniel, o primeiro ilustrador da obra, é até hoje, o mais conhecido pelas suas<br />
ilustrações a preto e branco.<br />
Por último, passamos à parte prática do trabalho, no qual colaboraram quatro<br />
crianças. Estas fizeram a “análise” de uma série de ilustrações da “Alice no País das<br />
Maravilhas” e depois passaram à visualização do filme. Em relação a este trabalho,<br />
apresentamos as conclusões na parte final.<br />
4
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong><br />
Génese e evolução<br />
O impulso de contar histórias deve ter nascido no momento em <strong>que</strong> o Homem<br />
sentiu necessidade de comunicar aos outros alguma experiência sua.<br />
A primeira obra realmente direccionada ao público infantil foi uma colectânea<br />
de cantigas infantis publicada por Mary Cooper em 1744, cujo título era: “Para todos os<br />
pe<strong>que</strong>nos senhores e senhoritas, para ser cantada para eles pelas suas amas até <strong>que</strong><br />
possam cantar sozinhos”. Uma segunda colectânea intitulada “Melodia da Mamã<br />
Gansa” de 1760, provavelmente do livreiro John Newberg, considerado precursor na<br />
descoberta e exploração do mercado de livros para crianças.<br />
O aparecimento da literatura infantil decorre da ascensão da família burguesa e<br />
do novo estatuto concedido à infância na sociedade. É a partir do século XVIII <strong>que</strong> a<br />
criança passa a ser um ser diferente do adulto, pelo <strong>que</strong> devia distanciar-se dos mais<br />
velhos e receber uma educação especial.<br />
Em Portugal (1866), literatura para crianças era coisa <strong>que</strong> ninguém sabia ainda<br />
muito bem o <strong>que</strong> era. Liam-se traduções <strong>–</strong> e não muitas. A literatura infantil portuguesa<br />
começa a vislumbrar-se nos finais do século XIX com o “Tesouro Poético para a<br />
Infância” de Antero de Quental, “Os contos para a infância” de Guerra Jun<strong>que</strong>iro e<br />
ainda com a obra de João de Deus.<br />
5
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
A literatura infantil tem o seu ponto de partida sob o aspecto de consagração<br />
universal, na França do século XVII.<br />
Século XVII Século XVIII Século XIX<br />
Charles Perrault (1628-1703)<br />
“O Gato das botas”<br />
“A Gata Borralheira”<br />
“O Capuchinho Vermelho”<br />
“A Branca de Neve”<br />
Fénelon (1651-1715)<br />
“Telémaco”<br />
La Fontaine (1621-1695)<br />
Fábulas<br />
Mme. D’Aulnoy (Maria Catarina<br />
Jumel de Berneville)<br />
“O Delfim” “A ave azul”, “A bela<br />
dos cabelos de ouro”<br />
Jonathan Swift (1667-1745)<br />
“Viagens de Guliver”<br />
Daniel Defoe (1660-1731)<br />
“Robinson Crusoe”<br />
Mme. Leprince de Beaumont (1711-<br />
1780)<br />
“A fada das ameixas ”, “A bela e a fera”<br />
Mme. De Genlis (1749-1830)<br />
Influenciada por Rousseau, escreveu<br />
assuntos de natureza informativa e<br />
científica.<br />
Berquin (1749-1791)<br />
Considerado por muitos o verdadeiro<br />
fundador da literatura infantil.<br />
“<strong>Literatura</strong>s Escolhidas”<br />
6<br />
Hans Christian Andersen (1805-1875)<br />
“O patinho feio”, “O soldadinho de<br />
chumbo”, “A pe<strong>que</strong>na vendedora de<br />
fósforos”<br />
Irmãos Grimm: Luís Jacob (1785-<br />
1863) e Guilherme Carlos (1786-<br />
1859)<br />
“Contos populares”, “Lendas alemãs”<br />
Frances Hodon Burnet<br />
“O Pe<strong>que</strong>no Lord”<br />
Collodi (Carlos Lorenzini)<br />
“Pinocchio”<br />
Edmundo de Amicis<br />
“Cuore”<br />
Charles Dickens<br />
“David Copperfield”<br />
Mattew J. Barrie<br />
“Peter Pan”<br />
Condessa de Ségur<br />
“Memórias de um burro”<br />
“Que amor de criança!”<br />
Lewis Carroll<br />
“Alice no país das maravilhas”<br />
Mark Twain<br />
“Tom Sawyer”<br />
Fenimore Cooper<br />
“O ultimo dos moicanos”<br />
Lyman Frank Baum<br />
“O Feiticeiro de Oz”<br />
Rudyard Kipling<br />
“Jungle Books”<br />
Selma Lagerlof (rainha da fantasia<br />
sueca)<br />
Júlio Verne<br />
“A volta ao mundo em 80 dias”<br />
“Vinte mil léguas submarinas”<br />
Otávio Feuillet<br />
“Polichinelo”<br />
Maeterlink<br />
”Pássaro Azul”<br />
Tchekov<br />
“Álbuns de contos russos”<br />
Antoine de Saint-Éxupery<br />
“O Pe<strong>que</strong>no Príncipe”
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
O livro para a criança<br />
Nos cânones da literatura infantil de Harold Bloom e Maurice Sendak,<br />
encontramos diversos autores / ilustradores como William Blake, Wilhelm Bush, Beatrix<br />
Potter, Edward Lear.<br />
William Blake (1757-1827) foi pintor, gravador, poeta, místico visionário e uma<br />
das primeiras e maiores figuras do romantismo. “Songs of Innocence” (1789) é sua<br />
primeira obra-prima de "iluminura impressa."<br />
Blake imprimia ele próprio o seu trabalho. Ajudado pela sua mulher, muitas<br />
vezes aquarelava à mão cada página, ou imprimia os pratos de cor numa ordem<br />
diferente, de maneira <strong>que</strong> cada livro fosse uma obra única.<br />
Canções da Inocência de William Blake<br />
Wilhelm Bush é um excelente caricaturista. O traço é ágil e, como o texto, cheio<br />
de humor. Podemos acompanhar a história pelos desenhos. Influenciado por Topffer, o<br />
seu trabalho funciona como uma história em quadrinhos. “Juca e Chico - 7<br />
Travessuras”, escrito em 1865, é talvez o seu livro mais conhecido.<br />
7
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Juca e Chico de Wilhelm Bush<br />
O livro mais conhecido de Beatrix Potter, The Tale of Peter Rabbit, nasce numa<br />
carta escrita em 1893 para uma criança <strong>que</strong> estava doente.<br />
Na primeira edição de Peter Rabbit, 1902, paga pela autora, as ilustrações eram a<br />
preto e branco. Mas logo aparecerem as edições coloridas. Os livros adocicados de<br />
Beatrix eram pe<strong>que</strong>ninos, desenhados de maneira a <strong>que</strong> as crianças pudessem carregá-<br />
los confortavelmente. Até hoje são sucesso garantido.<br />
Edward Lear foi desenhador num zoológico, viajante, artista, escritor.<br />
Deprimido, epiléptico, solitário. Em 1845 escreveu e ilustrou “A Book of Nonsense”.<br />
Capaz de es<strong>que</strong>cer a sua destreza e optar por um gesto fluído e solto como o de uma<br />
criança, Lear dá-nos, no século XIX, uma lição de modernidade.<br />
A Book of Nonsense de Edward Lear<br />
8
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Os primeiros impressos<br />
Os primeiros impressos para crianças são cartilhas: “hornbooks”, "batledores" ou<br />
"catones". <strong>Página</strong> coladas num suporte, <strong>que</strong> à primeira vista podiam servir também de<br />
palmatória. Começam a ser usadas em 1440 e continuam a aparecer até 1850. Além do<br />
ABC incluíam orações, ensinamentos morais ou políticos.<br />
A criança descobre desde logo os “chapbooks”, “pliegos sueltos”, "fliegende<br />
blätter", "folhas volantes" ou "de cordel" com as baladas, xácaras, anedotas, contos<br />
maravilhosos, episódios de cavalaria., e apossam-se dessas narrativas populares, <strong>que</strong><br />
não foram escritas especialmente para elas.<br />
“Chapbooks” eram folhas ou folhetos vendidos nas ruas.<br />
“Valentine and Orson” .é um exemplo típico desses livros baratos <strong>que</strong> não eram feitos<br />
para crianças, mas <strong>que</strong> as conquistaram. As personagens são dois irmãos gémeos<br />
separados ainda pe<strong>que</strong>nos. Orson, criado por um urso, Valentine, pelo rei da França.<br />
Valentine captura o seu irmão e os dois, depois de muitas façanhas, casam-se com belas<br />
princesas.<br />
9
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Espécie de romance popular, em verso, <strong>que</strong> se cantava ao som da viola, ou<br />
xácara, coletado por Almeida Garrett, <strong>que</strong> acreditava <strong>que</strong> a viagem da nau portuguesa<br />
<strong>que</strong> em 1565 transportava Jorge de Albu<strong>que</strong>r<strong>que</strong> Coelho de Olinda para Lisboa deu<br />
origem a esta xácara: “A Nau Catrineta”.<br />
“Lá vem a nau Catrineta<br />
Que tem muito <strong>que</strong> contar!<br />
Ouvide, agora, senhores,<br />
Uma história de pasmar...”<br />
De entre os primeiros livros para crianças, não é possível es<strong>que</strong>cer a obra de<br />
Johann Amos Comenius. O bispo de Morávia é considerado um grande inovador da<br />
pedagogia.<br />
Comenius<br />
1592 - 1670<br />
”Orbis Sensualium Pictus” foi escrito em 1658. Nele temos um ABC com imagens de<br />
animais. O texto traz os ruídos característicos dos bichos, para ensinar o som de cada<br />
letra.<br />
10
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Comenius não foi o primeiro a fazer cartilhas ilustradas. Temos, no século XVI,<br />
a “Cartinha para aprender a ler” de João de Barros, com o "A" debaixo de uma árvore,<br />
e assim por diante.<br />
Humanista, historiador e gramático, deixou-nos ainda o curioso “Diálogo de<br />
Iom de Barros com dous Filhos seus sobre Preceptos Moraes em forma de Jogo”,<br />
publicado em 1563.<br />
O conceito de literatura para a infância tem sido problematizado ao longo do<br />
tempo por diversos autores <strong>que</strong> o definem de acordo com diferentes pressupostos:<br />
Citam-se alguns exemplos:<br />
“São as crianças, na verdade, <strong>que</strong> o delimitam, com a sua preferência. Costuma-se<br />
classificar como <strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> o <strong>que</strong> para elas se escreve. Seria mais acertado,<br />
talvez, assim classificar o <strong>que</strong> elas lêem com utilidade e prazer. Não haveria, pois, uma<br />
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> a priori mas a posteriori. Mais do <strong>que</strong> literatura infantil existem<br />
"livros para crianças".”<br />
11<br />
Cecília Meireles 1 (1951)<br />
1 Poetisa brasileira nascida no Rio de Janeiro. Professora universitária, Cecília Meireles interessou-se pelo<br />
estudo das línguas, música, cultura oriental e literatura infantil. Casou-se com o ilustrador português<br />
Fernando Correia Dias, artista <strong>que</strong> contribuiu imensamente para o desenvolvimento das artes gráficas no<br />
Brasil, autor de caricaturas e desenhos altamente requintados e modernos.
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
“A literatura para a juventude é uma comunicação histórica (<strong>que</strong>r dizer localizada no<br />
tempo e no espaço) entre um locutor ou um escritor adulto (emissor) e um destinatário<br />
criança (receptor) <strong>que</strong>, por definição, de algum modo, no decurso do período<br />
considerado, não dispõe senão de forma parcial da experiência do real e das estruturas<br />
linguísticas, intelectuais, afectivas e outras <strong>que</strong> caracterizam a idade adulta.”<br />
12<br />
Marc Soriano 2 (1975)<br />
“Sublinhemos: o livro infantil é o livro ilustrado; e esta situação já comporta a<br />
existência do livro de imagens...”<br />
Américo Lindeza Diogo 3 (1994)<br />
2 Estudioso de literatura infantil para a infância<br />
3 Doutorado em <strong>Literatura</strong> Portuguesa pela Universidade do Minho. É Professor Auxiliar no Instituto de<br />
Letras e Ciências Humanas da Universidade do Minho.
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Classificação da literatura infantil<br />
Fases normais no desenvolvimento da criança:<br />
O caminho para a redescoberta da <strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong>, no nosso século, foi aberto<br />
pela Psicologia Experimental <strong>que</strong>, revelando a Inteligência como um elemento<br />
estruturador do universo <strong>que</strong> cada indivíduo constrói dentro de si, chama a atenção para<br />
os diferentes estágios do seu desenvolvimento (da infância à adolescência) e a sua<br />
importância fundamental para a evolução e formação da personalidade do futuro adulto.<br />
A sucessão das fases evolutivas da inteligência (ou estruturas mentais) é constante e<br />
igual para todos. As idades correspondentes a cada uma delas podem mudar,<br />
dependendo da criança, ou do meio em <strong>que</strong> ela vive.<br />
Primeira Infância: Movimento vs Actividade (15/17 meses aos 3 anos)<br />
Maturação, início do desenvolvimento mental;<br />
Fase da invenção da mão - reconhecimento da realidade pelo tacto;<br />
Descoberta de si mesmo e dos outros;<br />
Necessidade grande de contactos afectivos;<br />
Explora o mundo dos sentidos;<br />
Descoberta das formas concretas e dos seres;<br />
Conquista da linguagem;<br />
Nomeação de objectos e coisas - atribui vida aos objectos;<br />
Começa a formar sua auto-imagem, de acordo com o <strong>que</strong> o adulto diz <strong>que</strong> ela é,<br />
assimilando, sem <strong>que</strong>stionamento, o <strong>que</strong> lhe é dito;<br />
Egocentrismo, jogo simbólico;<br />
Reconhece e nomeia partes do corpo;<br />
Forma frases completas;<br />
Nomeia o <strong>que</strong> desenha e constrói;<br />
Imita, principalmente, o adulto.<br />
Histórias para crianças (faixa etária/áreas de interesse/materiais/livros):<br />
1 a 2 anos:<br />
A criança, nesta faixa etária, prende-se ao movimento, ao tom de voz, e não ao conteúdo<br />
do <strong>que</strong> é contado. Ela presta atenção ao movimento de fantoches e a objectos <strong>que</strong><br />
13
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
conversam com ela. As histórias devem ser rápidas e curtas. O ideal é inventá-las na<br />
hora. Os livros de pano, madeira e plástico, também prendem a atenção. Devem ter,<br />
somente, uma gravura em cada página, mostrando coisas simples e atractivas<br />
visualmente. Nesta fase, há uma grande necessidade de pegar na história, segurar o<br />
fantoche, agarrar o livro, etc..<br />
2 a 3 anos:<br />
Nesta fase, as histórias ainda devem ser rápidas, com pouco texto de um enredo simples<br />
e vivo, poucos personagens, aproximando-se, ao máximo, das vivências da criança.<br />
Devem ser contadas com muito ritmo e entoação. Há um grande interesse por histórias<br />
de bichinhos, brin<strong>que</strong>dos e seres da natureza humanizados. Identifica-se, facilmente,<br />
com todos eles. Prendem-se a gravuras grandes e com poucos detalhes. Os fantoches<br />
continuam a ser o material mais adequado. A música exerce um grande fascínio sobre<br />
ela. A criança acredita <strong>que</strong> tudo ao seu redor tem vida e vivência, por isso, a história<br />
transforma-se em algo real, como se estivesse mesmo a acontecer.<br />
Segunda Infância: Fantasia e Imaginação (dos 3 aos 6 anos)<br />
Fase lúdica e predomínio do pensamento mágico;<br />
Aumenta, rapidamente, seu vocabulário;<br />
Faz muitas perguntas. Quer saber "como" e "porquê ?";<br />
Egocentrismo - narcisismo;<br />
Não diferenciação entre a realidade externa e os produtos da fantasia infantil;<br />
Desenvolvimento do sentido do "eu";<br />
Tem mais noção de limites (meu/teu/nosso/certo/errado);<br />
Tempo não tem significação - não há passado nem futuro, a vida é o momento presente;<br />
Muitas imagens ainda completando, ou sugerindo os textos;<br />
Textos curtos e elucidativos;<br />
Consolidação da linguagem, onde as palavras devem corresponder às figuras;<br />
Para Piaget, etapa animista, pois todas as coisas são dotadas de vida e vontade;<br />
O elemento maravilhoso começa a despertar interesse na criança.<br />
Dos 6 aos 6 anos e 11 meses, aproximadamente:<br />
Interesse por ler e escrever. A atenção da criança esta voltada para o significado das<br />
coisas;<br />
14
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
O egocentrismo diminui. Já inclui outras pessoas no seu universo;<br />
O seu pensamento torna-se estável e lógico, mas ainda não é capaz de compreender<br />
ideias totalmente abstractas;<br />
Só consegue raciocinar a partir do concreto;<br />
Começa a agir cooperativamente;<br />
Textos mais longos, mas as imagens ainda devem predominar sobre o texto;<br />
O elemento maravilhoso exerce um grande fascínio sobre a criança.<br />
Histórias para crianças (faixa etária/áreas de interesse/materiais/livros):<br />
3 a 6 anos:<br />
Os livros adequados nesta fase devem propor "vivências radicadas" no quotidiano<br />
familiar da criança e apresentar determinadas características estilísticas.<br />
Predomínio absoluto da imagem, (gravuras, ilustrações, desenhos, etc.), sem texto<br />
escrito, ou com textos brevíssimos, <strong>que</strong> podem ser lidos, ou dramatizados pelo adulto, a<br />
fim de <strong>que</strong> a criança perceba a inter-relação existente entre o "mundo real", <strong>que</strong> a cerca,<br />
e o "mundo da palavra", <strong>que</strong> nomeia o real. É a nomeação das coisas <strong>que</strong> leva a criança<br />
a um convívio inteligente, afectivo e profundo com a realidade circundante.<br />
As imagens devem sugerir uma situação <strong>que</strong> seja significativa para a criança, ou <strong>que</strong> lhe<br />
seja, de alguma forma, atraente.<br />
A graça, o humor, um certo clima de expectativa, ou mistério são factores essenciais nos<br />
livros para o pré-leitor.<br />
As crianças, nesta fase, gostam de ouvir a história várias vezes. É a fase de "conte outra<br />
vez".<br />
Histórias com dobraduras simples, <strong>que</strong> a criança possa acompanhar, também exercem<br />
grande fascínio. Outro recurso é a transformação do contador de histórias com roupas e<br />
objectos característicos. A criança acredita, realmente, <strong>que</strong> o contador de histórias se<br />
transformou no personagem ao colocar uma máscara, chapéu, capa, etc..<br />
Podemos enri<strong>que</strong>cer a base de experiências da criança, variando o material <strong>que</strong> lhe é<br />
oferecido. Materiais como massa de modelar e argila atraem a criança para novas<br />
experiências.<br />
Assim como as histórias infantis, os contos de fadas têm um determinado momento para<br />
serem introduzidos no desenvolvimento da criança, variando de acordo com o grau de<br />
complexidade de cada história.<br />
15
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Os contos de fadas, tais como os "Os Três Porquinhos" e "O Patinho Feio" apresentam<br />
uma estrutura bastante simples e têm poucas personagens, sendo adequados a crianças<br />
entre 3 e 4 anos. Por outro lado, "Capuchinho Vermelho", "O Soldadinho de Chumbo",<br />
"Pedro e o Lobo" e o "Pe<strong>que</strong>no Polegar" são adequados a crianças entre 4 e 6 anos.<br />
16
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
<strong>Ilustração</strong><br />
A palavra "ilustrar" vem do latim, “ilustrare”, e significa "lançar luz ou brilho,<br />
ou tornar algo mais evidente e claro".<br />
Dar luz ao entendimento, instruir, civilizar, acepções da palavra “ilustrar”, <strong>que</strong>,<br />
junto com a puramente ornamental, definem uma actividade <strong>que</strong> vincula a expressão<br />
plástica ao desenho, a arte aplicada a uma função concreta: a informação. A função <strong>que</strong><br />
cumpre a ilustração transcende, na maioria dos casos, o puramente ornamental para se<br />
converter em informação não escrita, um meio de expressão <strong>que</strong> prescinde de barreiras<br />
linguísticas, facilitando a compreensão de uma mensagem.<br />
O ilustrador, ao contrário de outros profissionais da arte, está sujeito a certas<br />
limitações no seu trabalho. O bom resultado da sua obra não depende exclusivamente de<br />
um estado de espírito ou inspiração, a sua criação deve cumprir uma função <strong>que</strong> lhe é<br />
imposta quando aceita o trabalho e, ao mesmo tempo, deve efectuá-lo tendo em conta o<br />
processo de reprodução a <strong>que</strong> vai ser submetido: sistema de impressão, limitações de<br />
cor, etc., o <strong>que</strong> não se deve interpretar como aspectos negativos, antes pelo contrário: é<br />
desafio profissional <strong>que</strong> não se tem ao pintar um quadro de inspiração livre e ao qual<br />
não se exige mais do <strong>que</strong> qualidade artística.<br />
A ilustração, foi, sem dúvida, o primeiro meio de expressão gráfica empregue<br />
pela Humanidade. Desde as pinturas rupestres até aos actuais infogramas, passando<br />
pelos ideogramas de culturas como a egípcia e as pré-colombianas, foi sempre o método<br />
mais directo de comunicação, já <strong>que</strong> não precisa de um código abstracto de leitura. Com<br />
a descoberta da imprensa, não só não decaiu como atingiu um auge notável, como<br />
suporte e ampliação da informação fornecida pelo texto com o qual compartilha as<br />
páginas impressas, ou como elemento descritivo <strong>que</strong> torne desnecessário o mesmo.<br />
17
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
<strong>Ilustração</strong> <strong>que</strong> adorna o artigo sobre a música numa<br />
enciclopédia de 1023 elaborada no Mosteiro de Montecasiano.<br />
Nas primeiras publicações periódicas, as ilustrações feitas chapas metálicas eram<br />
a única possibilidade de imprimir a imagem até ao aparecimento da fotografia e os<br />
processos de fotogravação, os quais não foram o fim da sua utilização, mas uma<br />
libertação, já <strong>que</strong>, a partir desse momento, se recorria ao ilustrador não como única<br />
fonte de imagem, mas sim como um profissional cuja criatividade ia dar a esta um to<strong>que</strong><br />
especial, diferente da pura captação da realidade, o <strong>que</strong> não resulta em detrimento do<br />
trabalho fotográfico, <strong>que</strong> pode constituir uma autêntica ilustração para lá da reportagem.<br />
Aubrey Beardsley (1872-98), apesar da sua curta vida, tornou-se num dos mais<br />
importantes ilustradores da história moderna.<br />
Aubrey Beardsley (1872-98)<br />
18<br />
<strong>Ilustração</strong> para a obra<br />
“Salomé” de O. Wilde
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Técnicas Manuais<br />
O processo de trabalho na ilustração difere do desenho e da pintura não só na<br />
escolha do tema a tratar, <strong>que</strong> neste caso é imposto ao profissional; também é de vital<br />
importância ter em conta o meio de reprodução <strong>que</strong> vai ser utilizado e a idiossincrasia<br />
do público a <strong>que</strong>m é dirigido: evidentemente, não podem ter o mesmo tratamento uma<br />
ilustração para imprensa diária e a destinada a um livro colorido, ou uma ilustração<br />
técnica e a dirigida a crianças.<br />
O conhecimento de algumas técnicas como algumas aplicações do lápis e da<br />
tinta e uma ferramenta de desenho quase exclusiva da ilustração, o aerógrafo, são<br />
fundamentais para o ilustrador manual.<br />
Lápis e tinta<br />
O lápis é uma das técnicas de desenho mais influenciadas pelo meio de<br />
reprodução e impressão final. Portanto, antes de escolher a sua utilização, o ilustrador<br />
deve conhecer o tratamento a <strong>que</strong> o seu trabalho vai ser submetido, evitando, mediante<br />
técnicas concretas, <strong>que</strong> a ilustração sofra alterações.<br />
Apesar da alta qualidade dos meios de reprodução actuais, um trabalho de<br />
graduações de cinzento realizadas com o lápis deverá ser tratado com maior ou menor<br />
dureza segundo a resolução (pontos por polegada ou por centímetro) da textura com <strong>que</strong><br />
vai ser reproduzido. Tons muito suaves de cinzento podem chegar a perder-se ou a fazer<br />
<strong>que</strong> as áreas brancas adjacentes não possam ser reproduzidas como tal, ou seja: corre-se<br />
o risco de <strong>que</strong> o desenho seja “suavizado” ou “endurecido” pela reprodução, impedindo<br />
<strong>que</strong> um cinzento muito claro se funda com o branco sem brusquidão.<br />
19
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
O aerógrafo<br />
O primeiro aerógrafo, o aerograph, foi desenhado pelo ilustrador britânico<br />
Charles Burdick em 1893, e desde então passou por aperfeiçoamentos técnicos e épocas<br />
de es<strong>que</strong>cimento produzidas por predominâncias de outros estilos, mas mantendo-se<br />
sempre como o instrumento-rei da ilustração de efeitos realistas.<br />
Charles Burdick Primeiro aerógrafo<br />
Uma vez dominada a sua técnica, o ilustrador conseguirá efeitos de luz, texturas<br />
e tons suaves insubstituíveis em muitos tipos de ilustrações.<br />
Há muitos tipos de aerógrafos, consoante a sua finalidade e preço, mas todos se<br />
baseiam no mesmo princípio: o ar, comprimido a 2-3 atmosferas, atravessa uma conduta<br />
chamada “Venturi” (em cujo princípio é baseado o aerógrafo), passando para outra mais<br />
larga, onde se expande, absorvendo a tinta <strong>que</strong> cai de um depósito à pressão normal,<br />
pulverizando-a, projectando o fluxo através de uma boquilha cónica até ao papel.<br />
O ar comprimido pode ser fornecido por meio de garrafas recarregáveis ou<br />
postas de lado, ou por meio de um compressor eléctrico, a melhor opção, já <strong>que</strong><br />
costumam ser munidos de manómetros para regular a pressão e de filtros de<br />
condensação de água.<br />
20
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Há dois tipos básicos de aerógrafos: de alavanca simples ou dupla. A alavanca<br />
simples produz um jacto uniforme, controlável apenas pela separação entre o<br />
instrumento e o plano de desenho. A alavanca de dupla acção permite controlar<br />
pressionando para baixo o fluxo de ar e para trás o da tinta, o <strong>que</strong> o torna mais útil para<br />
trabalhos delicados.<br />
Legenda:<br />
1. Boquilha de saída;<br />
2. Entrada de ar;<br />
3. Depósito de tinta;<br />
4. Agulha;<br />
5. Gatilho de dupla acção;<br />
6. Mordaça da agulha.<br />
Secção ou corte de um aerógrafo<br />
Há aerógrafos com boquilhas múltiplas <strong>que</strong> lhes permitem adaptar-se tanto a<br />
trabalhos de traço fino como a projecção de grandes fundos.<br />
Como norma básica de uso, a posição do aerógrafo em relação ao plano do<br />
desenho deverá ser a mais aproximada possível de um ângulo recto e a distância ao<br />
papel será inversamente proporcional à espessura do traço: muito perto quando se<br />
projecta pouca tinta e muito ar (traços finos); mais afastado para muita tinta (grandes<br />
21
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
superfícies). Nunca se deve incidir sobre o mesmo ponto sem <strong>que</strong> a projecção anterior<br />
esteja seca.<br />
Manejo do aerógrafo<br />
Para se familiarizar com o manejo do aerógrafo existem vários exercícios:<br />
1º Sobre uma quadrícula de uns 10 mm de lado, tentar desenhar um ponto no centro de<br />
cada rectângulo.<br />
2º Traçado de barras paralelas e círculos à mão: exercita o domínio do traço e posição<br />
do mesmo, aumentando o ar ao máximo e diminuindo a tinta ao mínimo, tentando <strong>que</strong> o<br />
traço seja o mais fino possível.<br />
22
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
3º Esbatimentos finos e picados. Deve ter-se presente <strong>que</strong> maior pressão e menor<br />
quantidade de tinta produzirão graduações suaves de cor. Pelo contrário, se se restringe<br />
a passagem do ar e se abre a da tinta, o resultado serão pontos mais ou menos grossos<br />
(efeito de “picado”).<br />
4º Superfícies em três dimensões e máscaras. As superfícies a tratar são delimitadas<br />
com máscaras de película auto adesiva fabricada para esse efeito, recortando e<br />
descobrindo a parte a tratar com uma lâmina ou bisturi. Para este exercício desenham-se<br />
figuras geométricas simples, como o cubo, o cilindro e a esfera, projectando a tinta em<br />
esbatimentos dando efeitos de luz, como se fossem superfícies polidas.<br />
23
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Exemplo:<br />
Desenhar um tigre com o aerógrafo<br />
Materiais necessários<br />
Lápis de cor preto Pincel fino humedecido<br />
para esbater o traçado<br />
Pinceladas na pelagem<br />
para dar o aspecto de<br />
pelos pretos<br />
Sombras acentuadas. A<br />
luz vem da direita.<br />
24<br />
1ª Camada de cor<br />
onde as sombras são<br />
mais marcadas<br />
Pincel para finalizar<br />
a face e uma camada<br />
de cor preta com o<br />
aerógrafo
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
<strong>Ilustração</strong> <strong>Infantil</strong><br />
A ilustração está a aumentar a sua importância num momento em <strong>que</strong> cada vez<br />
tem mais preponderância a imagem sobre o texto, num mundo em <strong>que</strong>, para a<br />
comunicação visual, dados os meios informáticos existentes, as possibilidades de<br />
criação, mistura e transformação de imagens são cada vez mais complexas e elaboradas.<br />
A ilustração apoia uma mensagem escrita, dentro do contexto da obra em <strong>que</strong> se<br />
encontra. A sua função é fundamentalmente estética: tornar mais agradável à vista a<br />
obra a <strong>que</strong> pertence.<br />
De todas as especialidades no campo da ilustração, a dedicada ao mundo da<br />
infância constitui uma área muito especial. Em qual<strong>que</strong>r tipo de trabalho, o profissional<br />
deve “entrar” na mentalidade do receptor, e isto torna-se especialmente difícil no caso<br />
das crianças. Não é fácil encontrar uma linguagem gráfica compreensível sem tentar<br />
desenhar como eles, o <strong>que</strong>, por outro lado, careceria de validade: a criança utiliza mais a<br />
fantasia do <strong>que</strong> o adulto, e não vêem os seus desenhos como os vêem os mais velhos.<br />
Esta capacidade de comunicação específica, e o <strong>que</strong> implica de conhecimento<br />
dos processos mentais infantis faz com <strong>que</strong> seja a especialidade de ilustração mais rara.<br />
<strong>Ilustração</strong> para conto infantil,<br />
de Enri<strong>que</strong> Santana<br />
25
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Aspectos gráficos e visuais<br />
A classificação de livro ilustrado está baseada, segundo Joan Cass, no seu<br />
formato: “Picture books tell a story through a uni<strong>que</strong> combination of text and<br />
illustration so that meaning conveyed in the text is extended by the illustrations. The<br />
content may be realistic, fanciful, or factual, but the format of text and illustration<br />
combined defines it as a picture book.”<br />
Desde Coménio até aos nossos dias <strong>que</strong> os pedagogos têm vindo a salientar a<br />
importância da imagem nos livros para crianças. Surgem os ilustradores, <strong>que</strong> são os<br />
primeiros intérpretes da história. Estes vão desenhá-la e recontá-la através da linguagem<br />
da arte. As ilustrações têm assim como objectivo principal comunicar significados,<br />
possibilitando à criança o prazer do jogo visual das formas e das cores. No entanto,<br />
muitas vezes cai-se no risco da paráfrase, ou seja, as imagens são uma mera repetição<br />
do texto, ou então, o próprio desenho nada tem a ver com o texto, tal como aponta<br />
Gérard Bertrand: “L’illustration y court le ris<strong>que</strong> d’affadir par la paraphrase ce <strong>que</strong> la<br />
recontre de <strong>que</strong>l<strong>que</strong>s mots a suffit à faire surgir dans l’esprit du lecteur”.<br />
Os livros ilustrados pretendem aliciar as crianças. Estas preferem livros com<br />
imagens realistas e coloridas, sendo a cor de grande importância neste tipo de livros. Os<br />
livros deverão ter mais imagens e menos texto quanto mais novas forem as crianças, já<br />
<strong>que</strong> estas têm uma atenção muito móvel. A dificuldade de concentração por parte das<br />
crianças será tanto mais reduzida quantas mais imagens tiver um livro.<br />
Os autores dos livros infantis não devem es<strong>que</strong>cer <strong>que</strong> os destinatários das suas<br />
histórias são as crianças, por isso, o estilo e os aspectos técnicos e materiais de um livro<br />
levam-no a ser aceite ou rejeitado pelas crianças. Assim, o formato, o tamanho das<br />
páginas e das letras, a qualidade do papel, a capa, o colorido das imagens são muito<br />
importantes. Capas vistosas são um elemento de persuasão <strong>que</strong> levam um leitor a<br />
comprar um livro. Além disso, os nomes das personagens devem ser divertidos e<br />
sonantes para captar a atenção das crianças.<br />
A fantasia cativa as crianças e desperta nelas a curiosidade e estimula a<br />
imaginação. Todos estes factores contribuíram para uma grande aceitação deste tipo de<br />
livros por parte das crianças, a partir do início do século. Eles são, ainda hoje, um bom<br />
entretenimento para os mais novos em horas de lazer e antes de deitar.<br />
26
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
A ilustração obedece a códigos próprios de significação:<br />
- o aliciamento do leitor virtual (em tempos de escolaridade mínima todas as<br />
crianças podem e devem ser leitores);<br />
- a necessidade intrínseca ou extrínseca de suportar a actividade do leitor <strong>que</strong><br />
começa face a um texto, <strong>que</strong> infantil ou não, é uma estrutura mais intencional <strong>que</strong> real.<br />
A ilustração acompanha assim, a faixa etária: quanto menor for a idade do leitor,<br />
tanto mais o livro <strong>que</strong> se lhe dirige tem “imagens” e tanto menos “letras” terá.<br />
Sendo a criança um leitor infantil a cativar, o livro infantil deverá ter uma<br />
“função lúdica”, no qual a imagem domina. É a ilustração <strong>que</strong>, sem dúvida, surge como<br />
“uma segunda natureza da obra infantil” (Lajolo & Zilberman, 1985:13)<br />
Ler uma imagem é também ter acesso a um conjunto de convenções gráficas<br />
próprias da nossa cultura e da nossa sociedade. As imagens devem corresponder ao<br />
núcleo do eu / mundo de forma a <strong>que</strong> a criança as identifi<strong>que</strong> e permitam uma<br />
progressão ajustada ao seu desenvolvimento.<br />
Folhear as páginas do livro é a metáfora do desenrolar do tempo <strong>que</strong> a própria<br />
sucessão das ilustrações realça; ao fazê-lo a criança brinca com o tempo, fazendo-o<br />
avançar ou recuar.<br />
27
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Verdade / Falsidade<br />
Leitura de imagens<br />
É a linguagem verbal <strong>que</strong> determina a impressão de “verdade” ou de falsidade<br />
<strong>que</strong> podemos ter de uma mensagem visual. Uma imagem é considerada “verdadeira” ou<br />
“falsa” não por causa daquilo <strong>que</strong> representa mas por causa daquilo <strong>que</strong> nos é dito ou<br />
escrito acerca do <strong>que</strong> ela representa. Tudo depende da expectativa do espectador. É a<br />
conformidade ou a não-conformidade entre o tipo de relação imagem/texto e a<br />
expectativa do receptor <strong>que</strong> dão à obra um carácter de verdade ou falsidade.<br />
“A mentira”<br />
Felix Valloton<br />
Quando o pintor Valloton, a uma pintura forte e comovente representando um<br />
homem e uma mulher <strong>que</strong> se beijam, abraçados, num recanto sombrio de um salão<br />
burguês, não dá o título de “O Beijo” mas sim “A mentira”, aceitamos a interpretação<br />
proposta, uma vez <strong>que</strong> se trata de uma pintura e, portanto, de expressão, mais do <strong>que</strong><br />
informação.<br />
28
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
A leitura das imagens implica processos de codificação-descodificação e actos<br />
de compreensão.<br />
da palavra:<br />
Em relação ao uso da palavra “leitura” (reading), Colin fala em duas acepções<br />
- Decifração (readability);<br />
- Compreensão (comprehensibility).<br />
Só a leitura compreensiva e não a mera decifração permitem a comunicação.<br />
Nem todas as imagens têm o mesmo nível de complexidade, sendo <strong>que</strong> imagens<br />
complexas têm leituras mais complexas.<br />
Sendo a semiologia a teoria dos signos, ela é uma referência fundamental a partir<br />
do momento em <strong>que</strong> passamos a encarar a imagem como um sistema de signos. Surge<br />
assim a “semiologia da imagem”:<br />
“A semiologia da imagem, melhor denominada ‘iconologia’, estuda uma<br />
imagem ou um objecto icónico (por exemplo, um filme) como um sistema, isto é, como<br />
um conjunto de elementos interdependentes e organizados de modo a <strong>que</strong> estes<br />
elementos e o todo <strong>que</strong> constituem só possam compreender-se uns em relação aos<br />
outros. Da mesma maneira <strong>que</strong> a ciência da linguagem procura descobrir os elementos<br />
constitutivos da significação linguística, a iconologia visa pôr em evidência as<br />
componentes da significação icónica e as suas leis de organização”. (Cazeneuve,<br />
pág.146)<br />
29
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Funções da ilustração<br />
A relação entre o texto e a imagem está na interpretação <strong>que</strong> o ilustrador cria<br />
para a história. A ilustração é uma linguagem <strong>que</strong> dialoga com a linguagem verbal e<br />
apresenta diferentes possibilidades de leitura de um mesmo texto. A ilustração tem as<br />
funções de ornar ou elucidar o texto. No entanto, ela pode ter ainda outras funções:<br />
• Função representativa:<br />
Quando a imagem imita a aparência do ser ao qual se refere.<br />
• Função descritiva:<br />
Quando a imagem detalha a aparência do ser ao qual se refere.<br />
• Função narrativa:<br />
Quando a imagem situa o ser representado em devir, através de transformações ou<br />
acções por ele realizadas.<br />
• Função simbólica:<br />
Quando a imagem sugere significados sobrepostos ao seu referente, como é o caso<br />
das bandeiras nacionais.<br />
• Função expressiva:<br />
Quando a imagem revela sentimentos e emoções do produtor da imagem.<br />
• Função estética:<br />
Quando a imagem enfatiza a forma da mensagem visual.<br />
• Função lúdica:<br />
Quando a imagem está orientada para o jogo.<br />
• Função conativa:<br />
Quando a imagem está orientada para o destinatário, visando influenciar o seu<br />
comportamento, através da persuasão.<br />
• Função metalinguística:<br />
Quando o referente da imagem é a linguagem visual ou a ela directamente<br />
relacionado.<br />
30
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
• Função fática:<br />
Quando a imagem enfatiza o papel do seu próprio suporte.<br />
• Função de pontuação:<br />
Quando a imagem está orientada para o texto junto ao qual está inserida.<br />
Figuras de estilo<br />
Na linguagem verbal, as figuras de estilo alteram ou enfatizam o sentido das<br />
palavras, e possuem correspondentes similares na linguagem visual, como a hipérbole, a<br />
metáfora, a metonímia e a personificação.<br />
Apresentamos de seguida exemplos para cada uma delas:<br />
Hipérbole:<br />
Processo de exagero <strong>que</strong> ocorre, por exemplo, na<br />
caricatura.<br />
Metáfora:<br />
Corresponde a transformações na imagem, através<br />
de relações de similaridade.<br />
Metonímia:<br />
Há uma relação objectiva entre a imagem e o ser<br />
representado, como por exemplo, a representação<br />
de parte de um determinado ser para referir-se ao<br />
ser inteiro.<br />
Personificação:<br />
Atribuição de características humanas a seres<br />
inanimados bem como a ideias abstractas como as<br />
figuras alegóricas <strong>que</strong> representam a justiça, a<br />
liberdade, etc.<br />
31
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
A Imagem <strong>–</strong> As Palavras<br />
A ilustração é uma imagem <strong>que</strong> acompanha o texto e <strong>que</strong> estabelece uma relação<br />
semântica com ele. Esta relação pode ser denominada de coerência inter semiótica, visto<br />
<strong>que</strong> articula dois sistemas semióticos: a linguagem verbal e a linguagem visual.<br />
Pode entender-se a coerência inter semiótica como a relação de convergência ou<br />
não-contradição entre os significados denotativos e conotativos da ilustração e do texto.<br />
Pode falar-se em três graus de coerência:<br />
1) a convergência;<br />
2) o desvio;<br />
3) a contradição.<br />
Assim, avaliar a coerência entre uma ilustração e um texto significa avaliar em<br />
<strong>que</strong> medida a ilustração converge, desvia-se ou contradiz os significados do texto.<br />
Denotação / Conotação<br />
Para analisar ou ler uma imagem devemos diferenciar claramente dois níveis<br />
fundamentais, a denotação e conotação. Uma imagem pode ter significados denotativos<br />
e conotativos:<br />
1) significados denotativos:<br />
- referem-se ao ser <strong>que</strong> a imagem representa;<br />
- decorrem da função representativa.<br />
2) significados conotativos:<br />
- referem-se a associações sugeridas pela imagem;<br />
- decorrem da função estética.<br />
O nível denotativo refere uma enumeração e descrição dos objectos num<br />
determinado contexto e espaço.<br />
O nível conotativo refere-se à análise das mensagens ocultas numa imagem, e na<br />
forma como a informação aparece escondida ou reforçada. É composta por todos os<br />
elementos observáveis: desde a mais pe<strong>que</strong>na unidade de análise, como o ponto ou a<br />
linha até aos objectos de volume variável e materiais diferentes.<br />
32
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Para Umberto Eco a conotação “ é a soma de todas as unidades culturais <strong>que</strong> o<br />
significante pode evocar institucionalmente na mente do destinatário”.<br />
O poder evocativo de uma imagem não é o mesmo para todos, em linha de conta<br />
estão experiências e contextos próprios a cada pessoa <strong>que</strong> receberá de forma diferente.<br />
<strong>Imagens</strong> monosémicas:<br />
São imagens <strong>que</strong> têm um significado óbvio e único, <strong>que</strong> não oferecem ao<br />
espectador outras possibilidades de leitura do <strong>que</strong> aparece representado.<br />
recebe.<br />
<strong>Imagens</strong> polissémicas:<br />
Proporcionam diferentes interpretações de acordo com o grupo social <strong>que</strong> as<br />
É importante para compreender os fenómenos perceptivos, es<strong>que</strong>matizar a<br />
sequência dos acontecimentos da visão. À interacção entre o conjunto das superfícies<br />
físicas e o seu comportamento na absorção ou reenvio da energia luminosa e a captação<br />
através do olho humano da luz a <strong>que</strong> chega dos objectos <strong>que</strong> se encontram no seu campo<br />
visual damos o nome de processo de visão. O olho humano constitui um canal<br />
fisiológico e é o meio natural de passagem entre a emissão de uma mensagem e sua<br />
sensação resultante (Moles e Zeltman: 1975). Esta perspectiva do conhecimento das<br />
partes essenciais do olho (córnea, cristalino, íris e pupila, humor aquoso e vítreo, retina)<br />
realça a importância <strong>que</strong> os mecanismos da visão têm como ponto de partida para a<br />
formação de imagens na retina.<br />
33
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Alice no País das Maravilhas<br />
Lewis Carroll<br />
34
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Contextualização do texto e do autor<br />
Lewis Carroll<br />
(1832-1898)<br />
Charles Lutwidge Dodgson, escritor e matemático britânico, mais conhecido<br />
pelo seu pseudónimo de Lewis Carroll, nasceu a 27 de Janeiro de 1832 e faleceu a 14 de<br />
Janeiro de 1898. O seu pai, Reverendo Charles Dodgson, era pastor protestante e deu ao<br />
filho uma educação religiosa, preparando-o para uma carreira também religiosa. No<br />
entanto, Charles Dodgson ingressou na Universidade de Oxford e, em 1855, foi<br />
convidado para permanecer como professor de Matemática, leccionando em Oxford até<br />
1881. Apesar dos seus primeiros livros abordarem temas de Geometria e Álgebra, foi<br />
como lógico <strong>que</strong> Dodgson se destacou. O seu interesse pela lógica matemática e pelos<br />
jogos capazes de testar a razão, levou-o a publicar diversos livros sobre lógica, entre os<br />
quais se destacam “The Game of Logic” (1887) e “Symbolic Logic” (1896). Dedicava-<br />
se também a criar adivinhações, silogismos e problemas lógicos divertidos <strong>que</strong> usava<br />
nas suas aulas como por exemplo o dos “Relógios Loucos”: “Qual dos relógios regista o<br />
tempo mais fielmente? Um <strong>que</strong> se atrasa um minuto por dia ou um <strong>que</strong> não funciona?” 4<br />
Enquanto professor em Oxford, conheceu a<strong>que</strong>le <strong>que</strong> viria a ser o seu grande<br />
amigo, Henry Liddell, pai de três meninas <strong>–</strong> Alice, Lorina e Edite, a primeira das quais<br />
viria a ser a sua fonte de inspiração para o seu primeiro grande romance publicado em<br />
1865: “Alice in Wonderland”.<br />
4 O relógio <strong>que</strong> se atrasa um minuto por dia dá a hora exacta de dois em dois anos, pois como se atrasa<br />
um minuto por dia só voltará a estar certo depois de se atrasar doze horas, o <strong>que</strong> só acontece ao fim de<br />
720 dias. O relógio <strong>que</strong> está parado está certo duas vezes em cada vinte e quatro horas. Por isso, o relógio<br />
<strong>que</strong> regista melhor o tempo é o <strong>que</strong> está parado.<br />
35
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
C. Dodgson adopta então o pseudónimo de Lewis Carroll para as obras literárias<br />
reservando o seu verdadeiro nome para as obras científicas. Após o sucesso de “Alice in<br />
Wonderland”, escreveu “Through the Looking Glass” (1871) <strong>que</strong> alcançou tanto<br />
sucesso como o primeiro. Seguiram-se “The Hunting of Snark (1876) uma poesia plena<br />
de “nonsense” <strong>que</strong> fascinou a crítica e “Sylvie and Bruno” (1889).<br />
A partir de 1850, Lewis Carroll destacou-se também como fotógrafo tendo-se<br />
especializado em dois tipos de fotografia: retratos de pessoas importantes da época<br />
(artistas, escritores, poetas, religiosos, cientistas, professores, etc) e crianças, em geral,<br />
raparigas com idades entre os 8 e os 12 anos, <strong>que</strong> lhe rendeu uma obscura e insólita<br />
fama de preferência por ninfetas...).<br />
Inglaterra.<br />
Charles L. Dodgson faleceu em 1899, no dia 14 de Janeiro em Guilford,<br />
“Alice no País das Maravilhas” é um conto de surpreendente originalidade. A<br />
pe<strong>que</strong>na Alice encontra-se um dia na floresta com um coelho branco <strong>que</strong> caminha a<br />
resmungar como quando se chega tarde a um encontro. Segue-o até à sua cova, onde a<br />
menina cai por um buraco profundíssimo. A partir dali acede a um estranho mundo<br />
habitado por criaturas surpreendentes. Alice, <strong>que</strong> encontra um bolo e uma bebida <strong>que</strong> a<br />
fazem crescer ou minguar à vontade, entra no país das maravilhas, onde a rainha,<br />
rodeada da sua corte de naipes, a convida para uma partida de cro<strong>que</strong>t. Toma de<br />
36
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
imediato o chá com o Chapéu Louco, a Lebre de Março e um rato do campo, e mantém<br />
uma conversação com o gato de Cheshire, <strong>que</strong> tem a virtude de aparecer e desaparecer à<br />
vontade. Assiste finalmente a um julgamento contra a Dama de Copas, mas antes de<br />
terminar Alice desperta bruscamente: tudo tinha sido um sonho. Carroll serve-se da<br />
capacidade infantil para observar a realidade com total ingenuidade, capacidade <strong>que</strong><br />
utiliza para evidenciar os aspectos absurdos e incoerentes do comportamento dos<br />
adultos e para animar jogos encantadores baseados nas regras da lógica.<br />
Como surgiu a Alice?<br />
Lewis Carroll era um homem tímido, introvertido e conservador. Gostava<br />
imenso de crianças e de lhes contar histórias.<br />
No dia 4 de Julho de 1862, convidou as três filhas do seu amigo Liddell - Alice,<br />
Lorina e Edite - para um passeio de barco no rio. Durante o passeio, como já era hábito<br />
sempre <strong>que</strong> estavam na companhia de Lewis, as três meninas pediram para <strong>que</strong> lhes<br />
contasse uma história muito divertida. Lewis começou a contar a história à medida <strong>que</strong><br />
ia remando ao longo do rio. Fez três tentativas para <strong>que</strong> a história terminasse mas as<br />
meninas não o permitiram e iam pedindo para <strong>que</strong> continuasse. Quando a história<br />
terminou já passava das oito da noite e com ela findou também o passeio de barco dos<br />
quatro amigos.<br />
37
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Da es<strong>que</strong>rda para a direita:<br />
Edith, Lorina e Alice Liddell, 1858<br />
Antes de se deitar, nessa mesma noite, Lewis escreveu toda a história tal como a<br />
tinha contado a Alice e às suas irmãs. Chamou-lhe Alice Debaixo da Terra. Só dois<br />
anos mais tarde, em 1864, é <strong>que</strong> a tornou a ler. Acrescentou-lhe então algumas<br />
personagens, acrescentou alguns capítulos (a história ficou com, sensivelmente, o dobro<br />
das páginas) e alterou o título para Alice no País das Maravilhas. O livro foi editado, no<br />
ano seguinte, em 1865. Seguiu-se-lhe, seis anos mais tarde, Alice do outro Lado do<br />
Espelho, em 1871.<br />
Muitas das personagens e situações dos livros foram inspirados em pessoas e<br />
factos reais pertencentes do quotidiano de Lewis e da comunidade onde viveu:<br />
Alice Liddell<br />
38
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Também a nogueira onde aparece o Gato de Cheshire, o gato <strong>que</strong> está sempre a<br />
rir, ainda hoje pode ser vista no jardim do Colégio de Deanery.<br />
E, na Catedral de Ripon, onde o pai de Lewis exercia funções de reverendo,<br />
existe talhada em madeira uma imagem de um grifo <strong>que</strong> serviu de inspiração para o<br />
Grifo amigo da Falsa Tartaruga, grifo <strong>que</strong> é também o símbolo do "Trinity College”.<br />
Os poemas e os versos <strong>que</strong> Alice recita, e <strong>que</strong> parecem não ter sentido nenhum,<br />
são sátiras aos poemas enfadonhos <strong>que</strong> as crianças inglesas da<strong>que</strong>la época tinham <strong>que</strong><br />
saber de cor. Quanto ao poema <strong>que</strong> Alice descobre no Livro do Espelho, e <strong>que</strong> só se<br />
consegue ler quando está reflectido no espelho por<strong>que</strong> está escrito ao contrário, foi na<br />
realidade escrito pelo sobrinho de Lewis, Stuart Dodgson Collingwood.<br />
“Um, dois! Um, dois! Zás, catrapás,<br />
A espada vorpal foi cortando.<br />
morto o deixou,<br />
E com a sua cabeça galufante voltou.”<br />
(...)<br />
Também o dia do Lanche Maluco não é uma data ao acaso mas sim o verdadeiro<br />
dia de aniversário de Alice Liddell, 4 de Maio.<br />
A história <strong>que</strong> o Chapeleiro e a Lebre de Março contam a Alice sobre as três<br />
irmãs <strong>que</strong> vivem num poço de mel - Elsie , Lacie e Tillie - refere-se às três irmãs<br />
Liddell, respectivamente, Lorina, Edite e, claro está, Alice.<br />
A Porta <strong>que</strong> Alice ordena ao criado Rã <strong>que</strong> abra, é a caricatura da porta Norman<br />
da sacristia da Igreja onde o pai de Lewis Carroll era Reverendo.<br />
O capítulo sobre o Leão e o Unicórnio é inspirado nos símbolos das bandeiras de<br />
Inglaterra e Escócia, respectivamente.<br />
Lewis aproveitou as características mais marcantes de alguns dos seus colegas<br />
na Universidade de Oxford e utilizou-as na caracterização de algumas das personagens<br />
dos seus livros:<br />
- professores <strong>que</strong> dão conselhos filosofais a Alice, tal a Lagarta;<br />
- o professor Bartholomew, apaixonado por morcegos:<br />
“Brilha, brilha, morceguinho!<br />
Como te invejo!<br />
Voa pelo céu<br />
Como um tabuleiro de chá. Brilha, brilha...<br />
Brilha, brilha...”<br />
- o seu colega Duckworth <strong>que</strong> inspira Lewis no desenho do Pato;<br />
39
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
- professores <strong>que</strong> tal como Humpty Dumpty seriam capazes de discutir, com<br />
Alice, <strong>que</strong>stões de semântica;<br />
- o próprio muro onde Humpty Dumpty se balançava é uma caricatura dos<br />
muros da Universidade Oxford;<br />
- na beira do Lago, onde Lewis e as três irmãs passeavam de barco, existiam<br />
de facto algumas cobras <strong>que</strong> inspiraram Lewis na história do Pai Guilherme<br />
<strong>que</strong> equilibrava uma cobra no nariz. As três crianças tinham também, dias<br />
antes, assistido a uma actuação de equilibristas e acrobatas <strong>que</strong> estavam de<br />
passagem por a<strong>que</strong>la região.<br />
Lewis, o fotógrafo<br />
Carroll referia-se à fotografia como um fascínio e uma devoção. Era um<br />
fotógrafo bastante apreciado, <strong>que</strong> fotografou muita gente da sociedade <strong>que</strong> fre<strong>que</strong>ntava<br />
e onde ocupava o lugar de excêntrico solitário: conhecidos, amigos e filhos de amigos,<br />
escritores, artistas eram objecto da sua arte fotográfica social. Mas a aplicação<br />
realmente simbólica da técnica fotográfica centrou-se nos seus retratos de meninas.<br />
Neles, muitas vezes Carroll não se satisfazia só com o aspecto natural da foto. Tinha de<br />
criar um artifício. O cume desse artifício está no retrato da menina Alice encarnando um<br />
pedinte, com a mão estendida. Nele, Alice Liddell está com um vestido rasgado,<br />
mostrando os braços e as pernas, com os pés descalços, uma das mãos fechada na<br />
cintura e a outra aberta como <strong>que</strong>m pede esmola, o corpo encostado a um muro. Além<br />
do erotismo explícito, há um fundo pervertido em contraste com o rosto infantil.<br />
Alice Liddell, 1859<br />
40
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Numa bela foto de Mary Ellis, ela está encostada num tronco rugoso com<br />
folhagens, mas aí o erotismo talvez fosse inconsciente.<br />
Mary Ellis<br />
Não será este, certamente, o caso de uma foto de Xie Kitchin, em <strong>que</strong> ela<br />
repousa, dormindo, reclinada sobre um sofá, com o vestido abaixado, mostrando os<br />
ombros nus, propositadamente descobertos (como também se vê na foto de Alice<br />
''mendiga'' (com a mão pousada sobre o regaço). Xie, aliás uma favorita, aparece em<br />
outras fotos sugestivas, uma reclinada num sofá com um livro no regaço, outra também<br />
dormindo na cama e finalmente de pé contra a parede, ou com um violino.<br />
Xie Kitchin, 1875<br />
41
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Uma foto de Irene Mac Donald parece bem inocente. Ela está de camisola,<br />
escova numa das mãos e um espelho noutra, <strong>que</strong> pousa sobre uma cadeira. Mas os<br />
cabelos estão significativamente soltos, os pés descalços. Viramos a página do álbum de<br />
fotos e defrontamo-nos com a mesma Irene reclinada num sofá. Não está descalça, nem<br />
dorme. Mas a expressão do seu olhar perdido está entre o sono e o êxtase. Não se pode<br />
negar a relação estreita entre o sono, o ato de se estar deitado sobre travesseiros ou<br />
inclinado sobre almofada num sofá e o erotismo.<br />
Irene MacDonald, 1863<br />
Mary Millais<br />
Mary Millais, por exemplo, está recostada num chão <strong>que</strong> parece de grama ou de<br />
tapete felpudo. Também os recantos, a posição inclinada e a expressão longínqua,<br />
próxima do êxtase, são visíveis obsessões eróticas. Nada disso se encontra nas fotos<br />
comuns de familiares, pessoas distintas ou de renome <strong>que</strong> também constituíam o alvo<br />
das fotos do ''reverendo'', <strong>que</strong> se dizia ''praticamente um leigo'' no final da sua vida.<br />
42
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Dymphna Ellis, 25 Julho 1865<br />
Tryphena Hughes com os filhos, 19 Julho 1864<br />
43
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Maria White, 11 Julho 1864<br />
Margaret Anne e Henrietta Mary Lutwidge, 1859<br />
44
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Mary e Charlotte Webster, e Margaret Gatey, 1857<br />
Seis irmãs de Carroll e o irmão Edwin, 1857<br />
45
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
John Tenniel, o ilustrador<br />
(1820-1914)<br />
Ilustrador e caricaturista inglês, nasceu a 28 de Fevereiro de 1820, em Londres, e<br />
morreu nesta cidade a 25 de Fevereiro de 1974.<br />
Estudou na Royal Academy e foi aluno do célebre Charles Keene, tendo<br />
estudado escultura no Museu Britânico. Em 1845, já cego de um olho, foi premiado no<br />
concurso aberto pelo Governo aberto pelo Governo para decorar o Parlamento, com o<br />
projecto O Espírito de Justiça. Uma das suas primeiras obras foi um fresco<br />
representando Santa Cecília e <strong>que</strong> lhe fora encomendado para decorar a capela da<br />
Câmara dos Lordes. Trabalhou na redacção do jornal Punch e, em 1893, foi armado<br />
cavaleiro.<br />
Ilustrou mais de trinta livros e produziu cerca de duas mil e quinhentas<br />
caricaturas para o Punch. A sua maior glória foram as ilustrações de Lalla Rookh de<br />
Thomas Moore, em 1861, mas aquilo <strong>que</strong> o tornou numa figura <strong>que</strong> se recorda<br />
afectuosamente foram as ilustrações <strong>que</strong> fez para Alice no País das Maravilhas e Alice<br />
do Outro Lado do Espelho.<br />
As ilustrações a preto e branco de Sir John Tenniel ainda hoje continuam a ser as<br />
mais famosas. Depois dele, surgiram muitos outros ilustradores diferentes do original.<br />
46
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Maria L. Kirke, 1904<br />
Arthur Rackham, 1907<br />
1837-1939<br />
Bessie Pease Gutmann, 1907<br />
1876<strong>–</strong>1960<br />
Outros ilustradores<br />
47
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Mabel Lucie Attwell, 1910<br />
A.E. Jackson, 1915<br />
Gwynedd M. Hudson, 1922<br />
48
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Jessie Willcox Smith, 1923<br />
Marshall Vandruff<br />
Walt Disney<br />
Arte contemporânea<br />
49
Imagem 1<br />
Imagem 2<br />
Imagem 3<br />
Imagem 4<br />
Imagem 5<br />
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
<strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
“Mas, no preciso momento em <strong>que</strong> o Coelho tirou um relógio do bolso<br />
do colete, olhou para ele e começo a correr mais depressa.”<br />
“No entanto, numa segunda volta, reparou numa cortina baixa <strong>que</strong> não<br />
vira antes, por detrás da qual havia uma pe<strong>que</strong>na porta com cerca de<br />
trinta centímetros de altura. Alice tentou enfiar a pe<strong>que</strong>na chave<br />
dourada e ficou deliciada ao ver <strong>que</strong> ela se abria ali!”<br />
“ (...) por isso, Alice voltou para a mesa, na esperança de encontrar ali<br />
outra chave ou um livro de instruções para ensinar as pessoas a<br />
fecharem-se como se fossem telescópios, mas desta vez o <strong>que</strong> achou<br />
foi uma pe<strong>que</strong>na garrafa (“<strong>que</strong> decerto não estava ali antes”, pensou)<br />
<strong>que</strong>, à roda do gargalo, tinha um rótulo de papel, onde podia ler-se em<br />
letras grandes e maravilhosamente impressas: “BEBE-ME”.”<br />
“”Agora estou a crescer como se fosse o maior dos telescópios! Adeus,<br />
pés! <strong>–</strong> (pois quando olhou para os pés mal os viu, de tão longe <strong>que</strong><br />
estavam). <strong>–</strong> Oh, meus pobres pezinhos! Quem irá agora calçar-vos as<br />
meias e os sapatos, meus <strong>que</strong>ridos? Tenho a certeza <strong>que</strong> não serei eu.”<br />
“Alice sentia-se tão desesperada <strong>que</strong> estava pronta a pedir ajuda a<br />
<strong>que</strong>m <strong>que</strong>r <strong>que</strong> fosse. Por isso, quando o coelho se aproximou dela,<br />
começou a dizer com uma voz tímida: - Por favor, senhor... O Coelho<br />
deu um salto violento, deixou cair as luvas brancas de pele e o le<strong>que</strong>, e<br />
desapareceu na escuridão, o mais depressa <strong>que</strong> pôde.”<br />
50
Imagem 6<br />
Imagem 7<br />
Imagem 8<br />
Imagem 9<br />
Imagem 10<br />
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
“Ao completar este pensamento, um dos pés escorregou-lhe e, de<br />
repente, ficou mergulhada na água salgada até ao <strong>que</strong>ixo.”<br />
“Foi precisamente nessa altura <strong>que</strong> ouviu qual<strong>que</strong>r coisa chapinhar<br />
na poça, não muito perto dela. Nadou até lá para ver do <strong>que</strong> se<br />
tratava. (...) Finalmente, descobriu <strong>que</strong> era apenas um rato <strong>que</strong><br />
escorregara para a água, tal como ela.”<br />
“Que mais tens dentro da algibeira? <strong>–</strong> perguntou, voltando-se para<br />
Alice.<br />
- Apenas um dedal <strong>–</strong> respondeu Alice tristemente.<br />
- Trá-lo aqui <strong>–</strong> disse o Dodó.<br />
Mais uma vez, todos os se reuniram à volta dela, enquanto Dodó<br />
exibia o dedal, dizendo com solenidade:<br />
- Pedimos-te <strong>que</strong> aceites este lindo dedal.”<br />
“Então sentaram-se de novo em círculo e pediram ao Rato <strong>que</strong><br />
lhes contasse mais alguma coisa.”<br />
“Mas já era tarde de mais! Alice continuou a crescer, cada vez<br />
mais, e em breve teve de ajoelhar-se no chão. Pouco depois, já<br />
nem isto foi suficiente e ela tentou deitar-se com o cotovelo<br />
encostado à porta e o outro braço enrolado à volta da cabeça”<br />
Mesmo assim, continuou a crescer.”<br />
51
Imagem 11<br />
Imagem 12<br />
Imagem 13<br />
Imagem 14<br />
Imagem 15<br />
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
“Pouco depois, o Coelho alcançou a porta e tentou abri-la, mas não<br />
conseguiu pois o cotovelo de Alice empurrava-a pelo lado de dentro.<br />
Alice ouviu-o dizer: - Nesse caso, vou dar a volta e entrar pela janela.<br />
“Isso é <strong>que</strong> tu não fazes!” pensou Alice, e depois de esperar até<br />
imaginar <strong>que</strong> ouvira o Coelho debaixo da janela, deitou o braço de<br />
fora e fez um gesto no ar. Não agarrou nada mas ouviu um gritinho, o<br />
ruído de uma <strong>que</strong>da e de vidros partidos.”<br />
“Enfiou um dos pés na chaminé, o melhor <strong>que</strong> pôde, e ficou à espera<br />
até ouvir um pe<strong>que</strong>no animal (não conseguiu adivinhar de <strong>que</strong> animal<br />
se tratava) a arrastar-se e a roçar no interior da chaminé, mesmo acima<br />
dela. Depois, disse com os seus botões: ‘Lá vem o Bill.’ Deu um<br />
pontapé rápido e ficou à espera do <strong>que</strong> iria passar-se”.<br />
“Mal sabendo o <strong>que</strong> fazia, apanhou um pauzinho e estendeu-o ao<br />
cachorro <strong>que</strong> deu imediatamente um salto no ar, soltando um latido de<br />
prazer, e correu para o pauzinho, fazendo crer <strong>que</strong> lhe dava<br />
importância. Então, Alice abrigou-se atrás de uma grande moita de<br />
silvas, para impedir <strong>que</strong> ele lhe passasse por cima.”<br />
“Durante algum tempo, a Lagarta e Alice olharam-se em silêncio. Por<br />
fim, a Lagarta tirou o cachimbo da boca e perguntou-lhe numa voz<br />
lânguida e sonolenta: - Quem és tu?”<br />
“’Estás velho, pai Guilherme’”, disse o jovem,<br />
‘E o teu cabelo está a enbran<strong>que</strong>cer<br />
Mas andas sempre de cabeça para baixo...<br />
Achas isso certo na tua idade?”<br />
52
Imagem 16<br />
Imagem 17<br />
Imagem 18<br />
Imagem 19<br />
Imagem 20<br />
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
‘Estás velho’, disse o jovem, ‘como eu já disse,<br />
E engordaste muito,<br />
Mas entraste em casa aos pulos...<br />
Diz-me, qual é a razão por <strong>que</strong> o fizeste?’<br />
“Estás velho’, disse o jovem, ‘e já tens os dentes fracos<br />
De tanto mastigar,<br />
Mas comes o pato com ossos e bico...<br />
Diz-me, como consegues?’<br />
‘Estás velho’, disse o jovem, ‘e ninguém diria<br />
Que tens a vista forte como nunca.<br />
Aguentas uma enguia na ponta do nariz...<br />
O <strong>que</strong> te faz assim tão esperto?’<br />
“De repente, um criado de libré pareceu a correr, vindo do bos<strong>que</strong><br />
(Alice considerou-o um criado por<strong>que</strong> ele vinha de libré, mas, a<br />
julgar pela cara, ter-lhe-ia chamado peixe) e bateu à porta<br />
ruidosamente, com os nós dos dedos. Esta foi aberta por um outro<br />
criado de libré, de cara redonda e olhos grandes, como uma rã.<br />
Eram ambos criados. (...) O criado começou por tirar debaixo do<br />
braço uma grande carta, quase do seu tamanho, <strong>que</strong> estendeu ao<br />
outro dizendo num tom solene: - É para a Du<strong>que</strong>sa. Um convite da<br />
Rainha para jogar cro<strong>que</strong>t.”<br />
“A porta dava directamente para uma cozinha enorme <strong>que</strong> estava<br />
cheia de fumo. A Du<strong>que</strong>sa estava sentada num banco de três pés a<br />
embalar um bebé; a cozinheira estava inclinada sobre o lume, a<br />
mexer um caldeirão <strong>que</strong> parecia estar repleto de sopa.”<br />
53
Imagem 21<br />
Imagem 22<br />
Imagem 23<br />
Imagem 24<br />
Imagem 25<br />
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
“O pobrezinho soltou um novo soluço (ou um novo ronco) e por<br />
instantes fez-se um silêncio. Alice estava precisamente a pensar:<br />
“Agora o <strong>que</strong> hei-de fazer com ele quando chegar a casa?”,<br />
quando o bebé voltou a roncar, desta vez com tal força <strong>que</strong> ela<br />
olhou-o, aterrorizada. Agora, era impossível enganar-se: o bebé<br />
não passava de um porco, e Alice achou <strong>que</strong> era um absurdo<br />
continuar a pegar-lhe ao colo.”<br />
“Nesse momento, ficou um pouco admirada ao avistar o Gato de<br />
Cheshire empoleirado no galho de uma árvore, alguns metros<br />
adiante. O Gato sorriu apenas quando viu Alice. Parecia bemdisposto,<br />
mas, mesmo assim, tinha umas grandes unhas e muitos<br />
dentes, por isso era melhor tratá-lo com respeito.”<br />
“E dessa vez desapareceu muito devagarinho, começando pela<br />
ponta da cauda e acabando no sorriso, <strong>que</strong> permaneceu ainda no ar<br />
por algum tempo, depois dele já se ter ido embora.”<br />
“A Lebre de Março e o Chapeleiro estavam a tomar chá numa<br />
mesa debaixo de uma árvore, em frente da casa. Apoiavam os<br />
cotovelos sobre um Arganaz, <strong>que</strong> estava sentado entre eles, meio<br />
adormecido, e <strong>que</strong> lhes servia de almofada. “Deve ser muito<br />
desconfortável para o Arganaz”, pensou Alice, “mas como está a<br />
dormir, é natural <strong>que</strong> não se importe”.”<br />
“O Chapeleiro abanou a cabeça tristemente e respondeu!<br />
- Eu, não! Em Março tivemos uma briga... Antes de ela<br />
enlou<strong>que</strong>cer, percebes? (e apontou para a Lebre de Março com a<br />
colher do chá). Foi durante o grande concerto dado pela Rainha de<br />
Copas, e eu tive de cantar:<br />
Brilha, brilha, morceguinho!<br />
Como te invejo!”<br />
54
Imagem 26<br />
Imagem 27<br />
Imagem 28<br />
Imagem 29<br />
Imagem 30<br />
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
“Esta indelicadeza era mais do <strong>que</strong> Alice podia suportar. Levantou-se,<br />
muito aborrecida, e afastou-se. O Arganaz adormeceu instantaneamente,<br />
e nenhum dos outros pareceu dar pela sua partida, embora ela olhasse<br />
para trás uma ou duas vezes, na esperança de <strong>que</strong> a chamassem. Quando<br />
olhou pela última vez, ambos tentavam enfiar o Arganaz dentro do bule<br />
do chá.”<br />
“Junto da entrada do jardim havia uma enorme roseira. As suas rosas<br />
eram brancas, mas três jardineiros estavam a pintá-las de vermelho,<br />
muito atarefados. Alice achou isto estranho e aproximou-se deles para<br />
os ver melhor.<br />
“E, voltando-se para Alice, prosseguiu: - Como te chamas, menina? <strong>–</strong> O<br />
meu nome é Alice, ao serviço de Sua Majestade <strong>–</strong> respondeu Alice com<br />
muita delicadeza. Mas acrescentou para com os seus botões:”Ora,<br />
afinal, não passam de um baralho de cartas. Não preciso de ter medo<br />
deles.”<br />
“A princípio, a principal dificuldade de Alice foi manejar o seu<br />
flamingo: conseguiu enfiá-lo debaixo do braço, de modo a sentir-se<br />
confortável, com as pernas penduradas; mas, em geral, precisamente<br />
quando conseguia esticar-lhe o pescoço e se preparava para dar uma<br />
estocada no ouriço, o flamingo começava a torcer-se para todos os lados<br />
e olhava-a com um ar tão confuso <strong>que</strong> ela não podia deixar de desatar a<br />
rir.”<br />
“Quando chegou junto do Gato de Cheshire, ficou admirada ao<br />
encontrar uma grande multidão à sua volta: travava-se uma discussão<br />
entre o carrasco, o Rei e a Rainha, <strong>que</strong> falavam todos ao mesmo tempo,<br />
enquanto os restantes os ouviam em silêncio e muito pouco à vontade.”<br />
55
Imagem 31<br />
Imagem 32<br />
Imagem 33<br />
Imagem 34<br />
Imagem 35<br />
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
“Não agradava a Alice estar assim tão perto dela: em primeiro lugar,<br />
por<strong>que</strong> a Du<strong>que</strong>sa era muito feia; em segundo, por<strong>que</strong>, devido à sua<br />
baixa estatura, apoiava o <strong>que</strong>ixo pontiagudo no seu ombro, o <strong>que</strong> se<br />
tornava bastante incómodo. No entanto, Alice não gostava de ser<br />
malcriada e suportou-a como pôde.”<br />
“Pouco depois, encontraram um Grifo deitado no sol,<br />
semiadormecido. (Se não sabem o <strong>que</strong> é um Grifo, olhem para o<br />
desenho.”<br />
“Dirigiram-se então para junto da Falsa Tartaruga, <strong>que</strong> os mirou com<br />
os seus olhos grandes, cheios de lágrimas, e não disse nada.<br />
- Trago-te aqui esta menina <strong>que</strong> <strong>que</strong>r conhecer a tua história- disse o<br />
Grifo.<br />
- Vou contar-lha <strong>–</strong> disse a Falsa Tartaruga. Sentem-se e não digam<br />
uma palavra antes de eu acabar de falar.”<br />
“Então começaram a dançar em volta de Alice, com grande<br />
solenidade, pisando-lhe os pés de vez em quando, sempre <strong>que</strong> se<br />
aproximavam demasiado. Agitavam as patas dianteiras para marcar o<br />
compasso, enquanto a Falsa Tartaruga cantava, muito lentamente e<br />
com um ar tristonho.”<br />
“No entanto, levantou-se e começou a recitar, mas tinha a cabeça<br />
ainda tão cheia da Dança das Lagostas <strong>que</strong> mal sabia o <strong>que</strong> estava a<br />
dizer e as palavras saíam muito esquisitas:<br />
‘Esta é a voz da lagosta, ouvi-a eu dizer:<br />
Cozeste-me de mais, tenho de adoçar o cabelo.<br />
Como um pato faz com os olhos, assim ela faz com o nariz<br />
Arranca o cinto e os botões, e volta os pés para fora’.”<br />
56
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Imagem 36<br />
Imagem 37<br />
Imagem 38<br />
Imagem 39<br />
Imagem 40<br />
Imagem 41<br />
“Ao ouvir isto, o Coelho Branco deu três to<strong>que</strong>s de clarim, desenrolou o<br />
pergaminho e leu o seguinte:”<br />
“Ao ouvir isto, o pobre Chapeleiro tremeu tanto <strong>que</strong> deixou cair os<br />
sapatos.”<br />
“E o Chapeleiro saiu do tribunal a correr, sem mesmo calçar os<br />
sapatos.”<br />
“Levantou-se com tal rapidez <strong>que</strong> deu um safanão na bancada dos<br />
jurados com a ponta da saia e estes caíram em cima da cabeça da<br />
multidão <strong>que</strong> se encontrava mais abaixo e espalharam-se.”<br />
“Se esse papel não tem qual<strong>que</strong>r significado, tanto melhor. Evita-nos<br />
preocupações pois escusamos de tentar procurá-lo <strong>–</strong> disse o Rei”.<br />
“Nesse momento, todo o baralho se espalhou pelo ar e veio cair em<br />
cima dela. Alice soltou um gritinho de medo e de fúria e tentou baterlhes.”<br />
57
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Depois da leitura da obra e de uma análise cuidada às imagens <strong>que</strong> ilustram a<br />
mesma, concluímos <strong>que</strong> John Tenniel teve a preocupação de, na maior parte das<br />
imagens, imprimir-lhes um carácter verdadeiro e de conformidade em relação ao texto<br />
de Lewis Carroll. A grande maioria das imagens, exceptuando algumas, é de fácil<br />
leitura (visual), sendo <strong>que</strong> grande parte delas acaba por ser uma redundância do <strong>que</strong> está<br />
escrito. Por outro lado, outras imagens revelam-se de difícil leitura e dão a sensação de<br />
não-conformidade em relação ao texto. Em alguns casos foi até difícil encontrar na<br />
escrita aquilo <strong>que</strong> a imagem pretendia representar. De notar a total ausência de cor,<br />
característica da época, mas <strong>que</strong> não invalida o facto de estas ilustrações serem, até<br />
hoje, as mais conhecidas e as mais famosas.<br />
Em relação ao formato do texto, salientamos o aspecto de ele constituir uma<br />
história longa (mais de cem páginas) e <strong>que</strong> as ilustrações não aparecem em todas as<br />
páginas, mas sim espaçadamente entre as páginas. John Tenniel desenhou, no total,<br />
quarenta e uma ilustrações.<br />
Atendendo ao facto de <strong>que</strong> “Alice no País das Maravilhas” está classificado<br />
como um livro para a infância, importa reflectir nas idades às quais estará mais<br />
direccionado.<br />
Pensamos <strong>que</strong> um livro deste género dificilmente captaria a atenção de crianças<br />
até aos 10/12 anos. Experimentamos dar o livro a quatro crianças e pedimo-lhes uma<br />
primeira impressão do mesmo. As crianças realçaram sobretudo a falta de cor, dizendo<br />
<strong>que</strong> tudo no livro era “preto”. Em relação ao tamanho do texto, concluímos <strong>que</strong> nunca<br />
poderíamos pedir às mesmas crianças <strong>que</strong> o lessem devido à sua extensão. Por este<br />
motivo, conclui-se <strong>que</strong> a cor, o tamanho do texto, e todos os aspectos gráficos do livro<br />
condicionam a curiosidade das crianças. Um livro deste género, dificilmente atrairá a<br />
atenção das crianças, quando muito dos adolescentes. Por outro lado, quando<br />
solicitamos às mesmas crianças <strong>que</strong> visualizassem o filme a cores, todas mostraram-se<br />
muito receptivas e entusiasmadas. Foi pedido às mesmas crianças <strong>que</strong> no final,<br />
contassem a história, cujo resultado consistiu em quatro vídeos visualizados no dia da<br />
apresentação do trabalho. Além desta actividade, mostramos às mesmas crianças<br />
algumas ilustrações de John Tenniel, desta vez coloridas, e pedimo-lhes <strong>que</strong> falassem<br />
acerca das mesmas (ver anexo 1).<br />
58
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
“Conselhos de uma Lagarta”, por sete ilustradores<br />
John Tenniel<br />
Ilustrações feitas por seis ilustradores do início do século XX<br />
Maria L Kirk<br />
(1904)<br />
A. E. Jackson<br />
(1914)<br />
Arthur Rackman<br />
(1907)<br />
Mabel L. Attwell<br />
(1910)<br />
59<br />
Bessie P. Gutmann<br />
(1907)<br />
G. M. Hudson<br />
(1922)
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Matemática na obra?<br />
Podemos dizer <strong>que</strong> o sucesso de Alice se deve também ao papel <strong>que</strong> a<br />
matemática aí desempenha, aos jogos lógicos, às charadas sem resposta aos jogos de<br />
linguagem <strong>que</strong> constantemente irrompem nas aventuras descritas.<br />
Ao <strong>que</strong> parece Dodgson sofria de insónias e durante as longas noites em <strong>que</strong> não<br />
conseguia dormir, entretinha-se a formular problemas lógicos divertidos, construir jogos<br />
de palavras e adivinhas.<br />
Aqui ficam alguns exemplos:<br />
Os relógios loucos de Carroll<br />
Qual dos relógios regista o tempo mais fielmente? Um <strong>que</strong> se atrasa um minuto por<br />
dia ou um <strong>que</strong> não funciona?<br />
Solução:<br />
O relógio <strong>que</strong> se atrasa um minuto por dia dá a hora exacta de dois em dois anos,<br />
pois como se atrasa um minuto por dia só voltará a estar certo depois de se atrasar<br />
doze horas, o <strong>que</strong> só acontece ao fim de 720 dias.<br />
O relógio <strong>que</strong> está parado está certo duas vezes em cada vinte e quatro horas.<br />
Por isso o relógio <strong>que</strong> melhor regista o tempo é o <strong>que</strong> está parado.<br />
GARDNER, Martin. “The Universe in a Handkercheif, Lewis Carroll's Mathematical Recreations,<br />
Games, Puzzles, and Word Plays.”<br />
Uma palavra<br />
Construa uma palavra com estas letras: NOR DO WE<br />
Solução:<br />
ONE WORD<br />
GARDNER, Martin. “The Universe in a Handkercheif, Lewis Carroll's Mathematical Recreations,<br />
Games, Puzzles, and Word Plays.”<br />
60
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
1. Todos os leões são ferozes.<br />
2. Alguns leões não bebem café.<br />
Qual é a conclusão correcta?<br />
a) Algumas criaturas <strong>que</strong> bebem café não são ferozes.<br />
b) Algumas criaturas ferozes não bebem café.<br />
1. Nenhum professor é ignorante.<br />
2. Todas as pessoas ignorantes bebem água com sabão.<br />
Qual é a conclusão correcta?<br />
c) Nenhum professor bebe água com sabão.<br />
61<br />
CARROLL, Lewis. “Lógica Simbólica”<br />
d) Algumas pessoas <strong>que</strong> bebem água com sabão não são professores.<br />
CARROLL, Lewis. “Lógica Simbólica”
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Anexo 1<br />
LEITURA DE IMAGENS<br />
Nome: __________________ Idade: _____ Ano escolar: __________<br />
Para cada uma das imagens a seguir apresentadas, escreve uma “legenda” para as<br />
mesmas, ou seja, aquilo <strong>que</strong> a imagem te sugere.<br />
Imagem 1 Imagem 2 Imagem 3<br />
Imagem 4 Imagem 5 Imagem 6<br />
62
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Imagem 7 Imagem 8 Imagem 9<br />
63<br />
Imagem 10<br />
Obrigada pela tua colaboração!
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Conclusão<br />
A ideia de fazer o trabalho de imagem na área da literatura, mais<br />
especificamente literatura infantil, surgiu do gosto e interesse pessoais por estes<br />
assuntos.<br />
A ideia inicial consistia em fazer uma pesquisa em torno do assunto ‘ilustração<br />
infantil’, mas depois de ler a obra de Lewis Carroll, surgiu a vontade de aprofundar o<br />
estudo da obra, nomeadamente nestas <strong>que</strong>stões da imagem e da ilustração. Durante a<br />
concepção do trabalho, foram inúmeras as fontes <strong>que</strong> encontramos disponibilizadas on-<br />
line, o <strong>que</strong> nos surpreendeu, já <strong>que</strong> desconhecíamos por completo a visibilidade do tema<br />
e dos assuntos tratados. Por outro lado, tivemos algumas dificuldades em encontrar<br />
referências escritas em português e em suporte papel. Existiam referências noutras<br />
línguas, mais concretamente o inglês e o francês, mas o problema foi encontrar os livros<br />
disponíveis nas bibliotecas e outros locais, o <strong>que</strong>, caso contrário, teria enri<strong>que</strong>cido em<br />
muito a nossa pesquisa. Por estes motivos, tentamos concretizar este trabalho com as<br />
fontes <strong>que</strong> encontramos, mas tendo sempre presente a ideia de <strong>que</strong> poderíamos ter feito<br />
mais e melhor noutras circunstâncias, sendo um tema tão abrangente e diversificado.<br />
Apesar destes factos, o produto final contribuiu para o alargar de conhecimentos<br />
nesta área, e pensamos <strong>que</strong> foi um prazer concretizá-lo, fazendo ele parte de um gosto<br />
pessoal.<br />
64
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Bibliografia<br />
CALADO, Isabel. A utilização educativa das imagens”. Porto Editora: 1994<br />
CARROLL, Lewis. “Alice no País das Maravilhas”. Publicações Dom Quixote: 2000<br />
CAZENEUVE, Jean (Direcção). “Guia Alfabético das Comunicações de Massa”,<br />
Edições 70, LISBOA: s/d<br />
DIOGO, Américo António Lindeza. “<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong>. História, Teoria,<br />
Interpretações”. Porto Editora: 1994<br />
GOMES, José António. “<strong>Literatura</strong> para Crianças e Jovens”, Caminho, Lisboa: 1991<br />
JOLY, Martine. “Introdução à análise da imagem”. Edições Setenta: s/d<br />
LAJOLO, Marisa, ZILBERMAN, Regina. “<strong>Literatura</strong> infantil brasileira: Histórias e<br />
Histórias”. Editora Ática. São Paulo: 1985<br />
MOLES, Abraham, ZELTMAN, Claude. “La comunicación y los mass media.<br />
Ediciones Mensajero. Bilbao: 1975<br />
PIRES, Maria Laura Bettencourt. “História da <strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> Portuguesa”, Vega,<br />
Lisboa: 1983<br />
SORIANO, Marc. “Guide de Littérature pour la Jeunesse”, Flammarion, Paris : 1975<br />
“Técnicas de pintura e desenho”. G & Z Edições Lda.<br />
TRAÇA, Maria Emília. “O Fio da Memória — Do Conto Popular ao Conto para<br />
Crianças”, Porto Editora, Porto: 1992<br />
65
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Sites consultados:<br />
Posters do filme “Alice no País das Maravilhas”:<br />
http://us.imdb.com/title/tt0043274/posters<br />
Exemplo de ilustração com aerógrafo:<br />
http://www.aamiot.com/tutorial_aerographie.htm<br />
Conhecendo o aerógrafo:<br />
http://aerografia.com/aerografo.html<br />
<strong>Página</strong> com vários links sobre a “Alice”:<br />
http://www.wolfiewocky.com/allw.htm<br />
Lenny’s Alice in Wonderland Site:<br />
http://www.alice-in-wonderland.net/?alice14.html<br />
A Lewis Carroll Centenary Exhibition:<br />
http://www.hrc.utexas.edu/exhibitions/online/carroll/<br />
The Background & History of Alice In Wonderland:<br />
http://www.bedtime-story.com/bedtime-story/alice-background.htm<br />
CRANE, Walter. “O livro ilustrado”:<br />
http://www.escritoriodolivro.org.br/oficios/crane.html<br />
Núcleo de <strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong>. Faculdade de Educação USP:<br />
http://www.nucleodeliteraturainfantil.com.br/<br />
Matemática na Alice?:<br />
http://www.educ.fc.ul.pt/docentes/opombo/seminario/alice/matematica.htm<br />
<strong>Literatura</strong> para crianças e desenvolvimento social:<br />
http://www.eselx.ipl.pt/curso_bibliotecas/infanto_juvenil/tema3.htm<br />
Lewis Carroll’s Puzzle Page:<br />
http://www.knowl.demon.co.uk/page36.html<br />
Lewis Carroll Logician and Mathematician:<br />
http://www.lewiscarroll.org/logic.html<br />
Lewis Carroll Wikipedia:<br />
http://pt.wikipedia.org/wiki/Lewis_Carroll<br />
Jogos de lógica inventados por Lewis Carroll:<br />
http://redescolar.ilce.edu.mx/redescolar/act_permanentes/mate/mate2f.htm<br />
Tenniel Illustrations for Alice in Wonderland:<br />
http://www.archive.org/details/etex<br />
66
<strong>Literatura</strong> <strong>Infantil</strong> e <strong>Ilustração</strong> <strong>–</strong> <strong>Imagens</strong> <strong>que</strong> <strong>falam</strong><br />
Doce de letra: Portal de literature infantil e juvenil:<br />
http://www.docedeletra.com.br/<br />
Contos Infantis:<br />
http://sitededicas.uol.com.br/cinf.htm<br />
Problemas de lógica inventados por Lewis Carroll:<br />
http://www.educ.fc.ul.pt/icm/icm99/icm45/conclua.htm<br />
Obra integral (em inglês) de “Alice no País das Maravilhas”:<br />
http://www-2.cs.cmu.edu/People/rgs/alice-table.html<br />
Illustrations of Lewis Carroll's Alice's Adventures in Wonderland:<br />
http://www.exit109.com/~dnn/alice/<br />
“Alice no País das Maravilhas”, Centro de Competência Nónio Séc. XXI ESE de<br />
Santarém:<br />
http://nonio.eses.pt/alice/<br />
67