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Estudo da Gramática a Partir da Análise do Discurso

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<strong>Estu<strong>do</strong></strong> <strong>da</strong> <strong>Gramática</strong> a<br />

<strong>Partir</strong> <strong>da</strong> <strong>Análise</strong> <strong>do</strong><br />

<strong>Discurso</strong><br />

Ursula Wiesemann<br />

Prefácio<br />

© 2007 by Ursula Wiesemann<br />

Este livro é especialmente para os que querem promover uma língua não-escrita<br />

ou escrita recentemente pela primeira vez. Muitas vezes um falante nativo tem o desejo<br />

de escrever a sua língua, até então oral. Foi educa<strong>do</strong> numa língua estrangeira e precisa<br />

entender a estrutura gramatical <strong>da</strong> língua materna para escrevê-la corretamente, produzir<br />

literatura escrita e promover uma versão padrão.<br />

Estamos propon<strong>do</strong> méto<strong>do</strong>s para que um falante possa por si mesmo descobrir a<br />

organização <strong>do</strong> conteú<strong>do</strong> semântico e a pragmática de textos. Assim a análise deve ser<br />

feita usan<strong>do</strong> textos naturais àquela língua. O conteú<strong>do</strong> semântico se encontra no tema<br />

central e também nas informações colaterais que fortalecem e completam o tema central.<br />

Por que se começou com um texto e aos poucos se fez um estu<strong>do</strong> paradigmático<br />

<strong>da</strong> gramática, em vez de iniciar com morfema e terminar com texto? A razão é que, tanto<br />

na África quanto no Brasil, para quem não tem uma longa tradição de análise gramatical,<br />

a noção a respeito <strong>da</strong> língua é aplica<strong>da</strong>, em primeiro lugar, a um texto. Ao trabalhar com<br />

um texto curto, arranjan<strong>do</strong>-o numa tabela segun<strong>do</strong> os constituintes (sujeito, objeto, verbo,<br />

circunstâncias e ligação), chega-se mais facilmente à compreensão de que um texto é<br />

constituí<strong>do</strong> de partes, essas, de outras partes menores, e que to<strong>da</strong>s elas combina<strong>da</strong>s


transmitem o senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> texto já adquiri<strong>do</strong> após a primeira leitura. Assim o estu<strong>do</strong><br />

paradigmático necessário para conhecer as pequenas partes <strong>da</strong> gramática, assume<br />

importância sem confundir o nativo, que tem em mente apenas o to<strong>do</strong> e não as partes de<br />

que sua língua é constituí<strong>da</strong>.<br />

O texto é composto de várias partes: seções e parágrafos. Estes são compostos por<br />

uni<strong>da</strong>des menores que também são complexos. Assim pode-se descobrir to<strong>da</strong> uma<br />

hierarquia de estruturas. A estrutura gramatical de um texto refere-se aos arranjos e inter-<br />

relações de to<strong>da</strong>s estas uni<strong>da</strong>des.<br />

O aspecto pragmático de um texto trata <strong>da</strong> motivação <strong>do</strong> autor e sua interação com<br />

a assistência, como também a situação e as pressuposições que influenciam a composição<br />

<strong>do</strong> texto, seu uso atual e programa<strong>do</strong> etc.<br />

De um la<strong>do</strong> as estruturas gramaticais são similares em muitas línguas – fato que<br />

no reescrever este texto em português se fez sentir em várias partes. De outro la<strong>do</strong> ca<strong>da</strong><br />

língua tem suas particulari<strong>da</strong>des que devem ser respeita<strong>da</strong>s para que a comunicação não<br />

sofra. Para descobrir a estrutura <strong>da</strong> sua própria língua, o lingüista nativo faz bem em não<br />

somente estu<strong>da</strong>r textos, mas também fazer uso <strong>do</strong> seu conhecimento intuitivo para<br />

descobrir os paradigmas existentes (o que é váli<strong>do</strong> para to<strong>da</strong>s as línguas). Assim haverá<br />

partes no livro onde os textos são negligencia<strong>do</strong>s em favor <strong>do</strong>s paradigmas, quan<strong>do</strong> se<br />

trata <strong>do</strong>s sistemas pronominais ou a estrutura <strong>do</strong>s verbos (veja especialmente partes III e<br />

IV).<br />

Numa língua onde a altura <strong>da</strong> voz faz parte <strong>do</strong> sistema <strong>do</strong>s sons, junto com as<br />

vogais e consoantes, um estu<strong>do</strong> sistemático <strong>do</strong> sistema tonal é primordial. Isto se faz<br />

sentir especialmente nos paradigmas <strong>do</strong>s verbos. A secção IV Eventos leva este fato em<br />

consideração.<br />

Os méto<strong>do</strong>s propostos neste livro foram desenvolvi<strong>do</strong>s nos Camarões, África, e<br />

publica<strong>do</strong>s em francês com o título Manuel d’Analyse du Discours (Wiesemann, Nsémé,<br />

e Vallette 1984, revisa<strong>do</strong> em 1992). Foram ensina<strong>do</strong>s a muitos estu<strong>da</strong>ntes em vários<br />

países <strong>da</strong> África, mesmo antes <strong>da</strong> primeira publicação em 1984 e também depois. Foram<br />

traduzi<strong>do</strong>s e o livro reescrito em alemão, publica<strong>do</strong> em 1999 com o título Textanalyse<br />

und Grammatik. Verlag für Kultur und Wissenschaft, Bonn. Foi utiliza<strong>do</strong> como livro<br />

texto no Seminar für Sprachmethodik desde a sua concepção na África.<br />

2


Não é possível simplesmente traduzir este tipo de livro, visto que a língua em que<br />

for escrito serve também para exemplificar os princípios e assim tem que ser analisa<strong>da</strong><br />

usan<strong>do</strong> os méto<strong>do</strong>s propostos. Assim, quan<strong>do</strong> foi reescrito em inglês e publica<strong>do</strong> em<br />

versão eletrônica em 2002, junto com o co-autor Kent Spielmann, os princípios foram<br />

também aplica<strong>do</strong>s ao inglês. Não é possível saber quantas pessoas aplicaram os<br />

princípios na análise <strong>da</strong> sua língua usan<strong>do</strong> os livro em francês, alemão e inglês.<br />

Agora foi reescrito em português <strong>do</strong> Brasil, onde também pode ser compra<strong>do</strong> em<br />

versão eletrônica e talvez um dia em forma de livro no papel. Já tinha si<strong>do</strong> usa<strong>do</strong> em<br />

cursos de Meto<strong>do</strong>logia lingüística ofereci<strong>do</strong>s pela Socie<strong>da</strong>de Internacional de Lingüística<br />

e <strong>da</strong> ALEM. A língua portuguesa nos obrigou a repensar to<strong>do</strong>s os méto<strong>do</strong>s. O resulta<strong>do</strong><br />

destas pesquisas e reflexões enriquece de novo a nossa compreensão <strong>do</strong>s princípios, não<br />

somente através <strong>da</strong>s pesquisas desta língua como também <strong>da</strong>s línguas indígenas fala<strong>da</strong>s<br />

no Brasil. Desde a primeira versão em francês a língua kaingang tinha contribuí<strong>do</strong> para o<br />

desenvolvimento <strong>do</strong> texto. Entretanto os princípios foram ensina<strong>do</strong>s a brasileiros<br />

indígenas e não-indígenas. A ca<strong>da</strong> curso os nossos conhecimentos aumentam.<br />

Para <strong>da</strong>r a forma final ao texto duas pessoas contribuíram de maneira especial.<br />

Odete Schmalz, membro <strong>da</strong> ALEM, corrigiu to<strong>do</strong> o livro <strong>do</strong> ponto de vista português,<br />

len<strong>do</strong> e relen<strong>do</strong> as passagens. Em conjunto nós reanalisamos o sistema verbal <strong>do</strong><br />

português como é apresenta<strong>do</strong> no capítulo 18 e usa<strong>do</strong> em outros capítulos. Lusineide<br />

Moura, membro <strong>da</strong> ALEM, escreveu os textos usa<strong>do</strong>s nos capítulos 34, 35, 36 e também<br />

redigiu a maior parte destes capítulos. Reginal<strong>do</strong> de Mattos, co-autor <strong>do</strong> livro publica<strong>do</strong><br />

em 1979, Meto<strong>do</strong>logia de análise gramatical, Coleção Perspectivas Lingüísticas 17,<br />

Petrópolis, Brasil, sugeriu o título. Sem estas pessoas e os alunos <strong>do</strong>s vários cursos o livro<br />

nunca teria si<strong>do</strong> escrito. Por outro la<strong>do</strong>, responsabilizo-me por to<strong>do</strong>s os erros.<br />

Dedicamos este livro para a glória de Deus, que depois de criar o homem, foi o<br />

primeiro a falar com ele e assim inventou a língua humana.<br />

Ursula Wiesemann<br />

Brasília D.F., Brasil<br />

03 avril, 2007<br />

ursula_wiesemann@sil.org<br />

3


Índice<br />

Prefácio........................................................................................................................... 1<br />

Índice.............................................................................................4<br />

Conceitos Básicos<br />

1. Gêneros de discurso ............................................................................................... 14<br />

1.1 Monólogo – diálogo – estu<strong>do</strong> paradigmático ................................................................... 14<br />

1.2 Os <strong>da</strong><strong>do</strong>s......................................................................................................................... 15<br />

1.3 Tipos de textos................................................................................................................ 15<br />

1.3.1 Narrativas ............................................................................................................... 16<br />

1.3.2 Instruções ............................................................................................................... 16<br />

1.3.3 Explicações ............................................................................................................ 17<br />

1.3.4 Exortações.............................................................................................................. 17<br />

1.3.5 Marcas <strong>do</strong>s tipos de textos ..................................................................................... 18<br />

2. Tabela de base ......................................................................................................... 19<br />

2.1 Escolha <strong>do</strong>s textos .......................................................................................................... 19<br />

2.2 Preparar o texto .............................................................................................................. 20<br />

2.3 A tabela........................................................................................................................... 21<br />

3. Partes de texto narrativo......................................................................................... 24<br />

3.1 O enre<strong>do</strong>......................................................................................................................... 24<br />

3.1.1. Introdução.............................................................................................................. 25<br />

3.1.2 Corpo...................................................................................................................... 25<br />

3.1.3 Conclusão .................................................................................................................... 26<br />

3.2 Particulari<strong>da</strong>des gramaticais ........................................................................................... 29<br />

3.2.1 Introdução............................................................................................................... 29<br />

3.2.2 Corpo...................................................................................................................... 29<br />

3.2.3 Conclusão .................................................................................................................... 30<br />

3.3 Ordem <strong>do</strong>s eventos......................................................................................................... 30<br />

3.3.1 Retrospecção.......................................................................................................... 30<br />

4


3.3.2 Projeção ................................................................................................................. 31<br />

3.3.3 Ciclo ....................................................................................................................... 32<br />

3.4 Um exemplo.................................................................................................................... 34<br />

Pragmática<br />

4 Autor, audiência e texto ........................................................................................... 35<br />

4.1 Autor ............................................................................................................................... 36<br />

4.1.1 Credenciais............................................................................................................. 36<br />

4.1.2 Intenção declara<strong>da</strong> ................................................................................................. 36<br />

4.1.3 Intenção Implícita.................................................................................................... 37<br />

4.2 Audiência ........................................................................................................................ 38<br />

4.2.1 I<strong>da</strong>de:...................................................................................................................... 38<br />

4.2.2 Escolari<strong>da</strong>de........................................................................................................... 38<br />

4.3 Contexto.......................................................................................................................... 39<br />

4.4 Gênero de textos (tipos).................................................................................................. 39<br />

4.5 Narrativas........................................................................................................................ 40<br />

4.6 Outros gêneros ............................................................................................................... 40<br />

4.7 Sumário........................................................................................................................... 40<br />

5. Literatura oral e escrita ........................................................................................... 40<br />

5.1 Orações .......................................................................................................................... 41<br />

5.2 Provérbios....................................................................................................................... 41<br />

5.3 Contos populares ............................................................................................................ 41<br />

5.4 Parábolas........................................................................................................................ 42<br />

5.5 Adivinhações................................................................................................................... 42<br />

5.6 Poesia............................................................................................................................. 42<br />

5.7 Cantos............................................................................................................................. 42<br />

5.8 Insultos rituais ................................................................................................................. 43<br />

5.9 Diálogos.......................................................................................................................... 43<br />

5.10 Linguagem corporal....................................................................................................... 44<br />

5.11 Recursos lingüísticos especiais..................................................................................... 44<br />

5.12 Liber<strong>da</strong>de <strong>do</strong> narra<strong>do</strong>r................................................................................................... 44<br />

5.13 Textos escritos .............................................................................................................. 45<br />

5.14 Limites <strong>do</strong> livro .............................................................................................................. 47<br />

5


Participantes<br />

6. Participantes de textos............................................................................................ 48<br />

6.1 Hierarquia ....................................................................................................................... 48<br />

6.2 Introdução e reintrodução................................................................................................ 49<br />

6.3 Referência....................................................................................................................... 50<br />

6.4 Tabela............................................................................................................................. 51<br />

7. Sistema de referência e oração nominal ............................................................... 52<br />

7.1 Tipos de referência.......................................................................................................... 53<br />

7.1.1 Como...................................................................................................................... 53<br />

7.1.2 O que ........................................................................................................................... 54<br />

7.1.3 Direção ................................................................................................................... 54<br />

7.1.4 Substitubili<strong>da</strong>de ...................................................................................................... 55<br />

7.1.5 Resumo .................................................................................................................. 56<br />

7.2 Oração nominal............................................................................................................... 56<br />

7.3. Funções semânticas ...................................................................................................... 57<br />

8. Locução nominal ..................................................................................................... 58<br />

8.1. Locução determinativa ................................................................................................... 58<br />

8.2 Locução associativa........................................................................................................ 59<br />

8.2.1 Possessiva ............................................................................................................. 59<br />

8.2.2 Origina<strong>do</strong>r............................................................................................................... 61<br />

8.2.3 Outros..................................................................................................................... 61<br />

8.3 Coordenativo................................................................................................................... 62<br />

8.4 Circunstancial.................................................................................................................. 63<br />

8.5 Aposicional...................................................................................................................... 64<br />

9. Classes de substantivos ......................................................................................... 64<br />

9.1 Gênero............................................................................................................................ 65<br />

9.2 Plurali<strong>da</strong>de ...................................................................................................................... 66<br />

9.3 Sistemas de concordância .............................................................................................. 67<br />

9.3.1 Concordância na locução........................................................................................ 68<br />

9.3.2 Concordância na oração......................................................................................... 69<br />

10. Pronomes ............................................................................................................... 72<br />

10.1 Distinções de pessoa .................................................................................................... 73<br />

10.2 Distinções de número................................................................................................. 74<br />

6


10.3 Distinções de gênero..................................................................................................... 78<br />

10.4 Honoríficos.................................................................................................................... 78<br />

10.5 Exclusão ....................................................................................................................... 79<br />

11. Distinções de caso ................................................................................................ 81<br />

11.1 Casos na oração ........................................................................................................... 82<br />

11.2 Ergativo......................................................................................................................... 86<br />

11.3 Possessão..................................................................................................................... 87<br />

12. Pronomes de Sujeito ............................................................................................. 90<br />

12.1. Mo<strong>do</strong> real ..................................................................................................................... 91<br />

12.2 Mo<strong>do</strong> irreal .................................................................................................................... 92<br />

12.3 Mo<strong>do</strong> necessi<strong>da</strong>de ........................................................................................................ 93<br />

13. Demonstrativos...................................................................................................... 94<br />

13.1 Defini<strong>do</strong>s ....................................................................................................................... 95<br />

13.2 Indefini<strong>do</strong>s..................................................................................................................... 96<br />

13.3 Negativos ...................................................................................................................... 97<br />

13.4 Advérbios ...................................................................................................................... 97<br />

13.5 Interrogativos ................................................................................................................ 98<br />

13.6 Relativos ....................................................................................................................... 98<br />

14. Não-substituíveis ................................................................................................... 99<br />

14.1 Reflexivo e recíproco..................................................................................................... 99<br />

14.2 Logofórico ................................................................................................................... 101<br />

14.3 Seqüencial .................................................................................................................. 102<br />

Eventos<br />

15 A voz <strong>do</strong> verbo ...................................................................................................... 104<br />

15.1 Os papéis semânticos (que determinam a voz)........................................................... 105<br />

15.2 Determinar a voz......................................................................................................... 105<br />

15.3 Voz inerente................................................................................................................ 106<br />

15.4 Voz deriva<strong>da</strong> ............................................................................................................... 107<br />

15.5 Voz direcional.............................................................................................................. 108<br />

16. Aspecto e mo<strong>do</strong>................................................................................................... 108<br />

16.1 Aspecto....................................................................................................................... 109<br />

16.1.1 Aspecto inerente................................................................................................. 109<br />

7


16.1.2 Aspecto deriva<strong>do</strong> ................................................................................................ 109<br />

16.1.3 Aspecto lexicaliza<strong>do</strong> ........................................................................................... 111<br />

16.2 Mo<strong>do</strong>........................................................................................................................... 112<br />

16.2.1 Mo<strong>do</strong>s deriva<strong>do</strong>s................................................................................................. 113<br />

16.2.2 Mo<strong>do</strong> lexicaliza<strong>do</strong> ............................................................................................... 114<br />

17. Tipos de tempo e de informação........................................................................ 115<br />

17.1 tempo.......................................................................................................................... 115<br />

17.2 Tipos de informação.................................................................................................... 116<br />

17.3 Conclusão ................................................................................................................... 118<br />

18. Méto<strong>do</strong>s de pesquisa .......................................................................................... 118<br />

18.1 Questionário................................................................................................................ 119<br />

18.2 <strong>Análise</strong> ........................................................................................................................ 121<br />

18.3 O esquema.................................................................................................................. 123<br />

19. Relações entre os predica<strong>do</strong>s -- tipos ............................................................... 127<br />

19.1 Tipos ........................................................................................................................... 128<br />

19.1.1 Adições............................................................................................................... 128<br />

19.1.2 Conteú<strong>do</strong> ............................................................................................................ 129<br />

19.1.3 Exemplo.............................................................................................................. 129<br />

19.1.4 Fase.................................................................................................................... 130<br />

19.1.5 Orações coordena<strong>da</strong>s e as relativas................................................................... 130<br />

19.2 Comparação................................................................................................................ 132<br />

19.2.1. Similari<strong>da</strong>de....................................................................................................... 132<br />

19.2.2 Grau.................................................................................................................... 132<br />

19.2.3 Contraste ............................................................................................................ 133<br />

19.2.4 Alternativa........................................................................................................... 133<br />

20. Relações de voz entre predica<strong>do</strong>s ..................................................................... 133<br />

20.1 Sujeitos idênticos/diferentes........................................................................................ 133<br />

20.2 Verbos em série .......................................................................................................... 134<br />

20.3 Logofóricos.................................................................................................................. 134<br />

20.4 Seqüenciais................................................................................................................. 135<br />

20.5 Ordem relativa <strong>da</strong>s orações ........................................................................................ 135<br />

20.6 Correferência entre outros participantes...................................................................... 136<br />

21. Relações de mo<strong>do</strong> entre predica<strong>do</strong>s ................................................................. 137<br />

21.1 Real............................................................................................................................. 137<br />

8


21.1.1 causa-resulta<strong>do</strong> .................................................................................................. 137<br />

21.1.2 Intenção-méto<strong>do</strong>................................................................................................. 137<br />

21.1.3 Meios-conseqüência ........................................................................................... 137<br />

21.1.4 Premissa-resulta<strong>do</strong>............................................................................................. 137<br />

21.2 Irreal ou condicional .................................................................................................... 138<br />

21.2.1 Condição simples................................................................................................ 138<br />

21.2.2 Condição hipotética ............................................................................................ 138<br />

21.2.3 Condição distributiva........................................................................................... 138<br />

21.2.4 Condição proporcional ........................................................................................ 138<br />

21.2.5 condição contrária aos fatos ............................................................................... 139<br />

21.3 Interrogativas .............................................................................................................. 139<br />

21.3.1 tipos de perguntas: ............................................................................................. 139<br />

21.3.2 Perguntas e suas respostas................................................................................ 140<br />

22 Relações temporais ou parafrásticas entre predica<strong>do</strong>s.................................... 141<br />

22.1 Temporais ................................................................................................................... 141<br />

22.1.1 Simultanei<strong>da</strong>de ................................................................................................... 142<br />

22.1.2 Anteriori<strong>da</strong>de ...................................................................................................... 142<br />

22.1.3 Seqüência........................................................................................................... 143<br />

22.2 Paráfrase .................................................................................................................... 143<br />

23 Locução Verbal ..................................................................................................... 145<br />

23.1 Verbos com argumentos idênticos .............................................................................. 145<br />

23.2 Verbos que podem mu<strong>da</strong>r de lugar ............................................................................. 146<br />

23.3 Conjunções ................................................................................................................. 147<br />

23.4 Outras partículas......................................................................................................... 147<br />

23.5 Substituição por um pronome ou pró-verbo................................................................. 148<br />

23.6 Gramaticalização......................................................................................................... 148<br />

Enre<strong>do</strong><br />

24. Organização <strong>da</strong>s partes de textos...................................................................... 150<br />

24.1 Tempo......................................................................................................................... 150<br />

24.2. Lugar.......................................................................................................................... 151<br />

24.3 Participantes ............................................................................................................... 152<br />

24.4 Textos não-narrativos.................................................................................................. 152<br />

25. Tipos de informação............................................................................................ 153<br />

9


25.1 A linha <strong>do</strong> tema ........................................................................................................... 153<br />

25.2 Informação paralela..................................................................................................... 154<br />

25.2.1 Retrospecção...................................................................................................... 154<br />

25.2.2 Projeção ............................................................................................................. 155<br />

25.2.3 Descrição............................................................................................................ 155<br />

25.2.4 Citações.............................................................................................................. 156<br />

25.2.5 Informação colateral ........................................................................................... 156<br />

25.2.6 Cenário............................................................................................................... 156<br />

25.2.7 Informação pragmática ....................................................................................... 156<br />

25.2.8 Foco.................................................................................................................... 157<br />

25.3 Tabela de informações................................................................................................ 157<br />

26. Citação.................................................................................................................. 157<br />

26.1 As partes..................................................................................................................... 157<br />

26.2 <strong>Discurso</strong> direto ............................................................................................................ 158<br />

26.3 <strong>Discurso</strong> indireto ......................................................................................................... 159<br />

26.4 <strong>Discurso</strong> implícito ........................................................................................................ 160<br />

26.5 Diferenças................................................................................................................... 160<br />

26.6 <strong>Discurso</strong> semi-direto.................................................................................................... 161<br />

26.7 <strong>Discurso</strong> encaixa<strong>do</strong>..................................................................................................... 162<br />

26.8 Introduzir os discursos ................................................................................................ 162<br />

26.9 Testemunhas .............................................................................................................. 163<br />

26.10 Funções .................................................................................................................... 164<br />

27. Tópico ................................................................................................................... 165<br />

27.1 Extensão ..................................................................................................................... 165<br />

27.2 Tópico ......................................................................................................................... 166<br />

27.3 Tópico marca<strong>do</strong> .......................................................................................................... 167<br />

28. Focalização........................................................................................................... 169<br />

28.1 Não-foco ..................................................................................................................... 169<br />

28.2 Foco inerente .............................................................................................................. 169<br />

28.3 Foco marca<strong>do</strong> ............................................................................................................. 170<br />

28.3.1 Foco assertivo .................................................................................................... 170<br />

28.3.2 Foco seletivo....................................................................................................... 170<br />

28.4 Desfocalização............................................................................................................ 171<br />

28.4.1 Orações subordina<strong>da</strong>s........................................................................................ 171<br />

10


28.4.2 Deslocamento à direita ....................................................................................... 172<br />

28.4.3 Informação genérica ........................................................................................... 172<br />

28.4.4 Substantivos abstratos........................................................................................ 173<br />

28.4.5 Desfocalização marca<strong>da</strong>..................................................................................... 173<br />

28.5 Resumo: Tópico e focalização..................................................................................... 174<br />

29. Reação e outras estratégias de focalização...................................................... 175<br />

29.1 Confirmação e recusa ................................................................................................. 175<br />

29.2 Emen<strong>da</strong>....................................................................................................................... 175<br />

29.3 Graus de reação ......................................................................................................... 176<br />

29.4 Combinar tópico, foco e reação................................................................................... 177<br />

29.5 Foco no enre<strong>do</strong> <strong>do</strong> texto.............................................................................................. 178<br />

29.5.1 O tema................................................................................................................ 178<br />

29.5.2 O ponto culminante............................................................................................. 178<br />

29.5.3 Outros focos ....................................................................................................... 178<br />

30 Os meios de focalizar ........................................................................................... 178<br />

30.1 Meios prosódicos ........................................................................................................ 179<br />

30.2 Meios morfológicos ..................................................................................................... 179<br />

30.3 Meios sintáticos........................................................................................................... 179<br />

30.4 Meios estilísticos ......................................................................................................... 180<br />

30.4.1 Referência catafórica .......................................................................................... 180<br />

30.4.2 Pergunta retórica ................................................................................................ 180<br />

30.4.3 Repetições.......................................................................................................... 180<br />

30.4.4 Mu<strong>da</strong>nça............................................................................................................. 181<br />

30.4.5 Onomatopéia ...................................................................................................... 183<br />

30.4.6 Concentração de participantes............................................................................ 183<br />

31 Méto<strong>do</strong> de Pesquisa ............................................................................................. 183<br />

31.1 Transformação por substituição .................................................................................. 184<br />

31.2 Focalização por entonação ......................................................................................... 185<br />

31.3 Transformação por deslocamento à esquer<strong>da</strong> ............................................................ 185<br />

31.4 Transformação por deslocamento à direita.................................................................. 186<br />

31.5 Focalização usan<strong>do</strong> palavras adicionais ..................................................................... 187<br />

31.6 Focalização <strong>da</strong> ação ................................................................................................... 187<br />

31.7 Combinação destas estratégias .................................................................................. 188<br />

32. Coesão.................................................................................................................. 188<br />

11


32.1 Na locução .................................................................................................................. 188<br />

32.2 Na oração ................................................................................................................... 189<br />

32.3 Na frase ...................................................................................................................... 190<br />

32.4 Em uni<strong>da</strong>des maiores.................................................................................................. 191<br />

32.5 Coesão lexical............................................................................................................. 191<br />

32.5.1 Sistemas de referência ....................................................................................... 192<br />

32.5.2 Domínios lexicais................................................................................................ 192<br />

32.6 Coesão e coerência .................................................................................................... 193<br />

33 Um exemplo........................................................................................................... 194<br />

33.1 Enre<strong>do</strong> ........................................................................................................................ 194<br />

33.1.1 Introdução (1-2) .................................................................................................. 194<br />

33.1.2. Corpo (3-14) ...................................................................................................... 195<br />

33.1.3 Conclusão........................................................................................................... 197<br />

33.2 Participantes ativos, adereços..................................................................................... 197<br />

33.3 Enfoque....................................................................................................................... 198<br />

33.4 Coesão........................................................................................................................ 199<br />

Outros gêneros<br />

34 Textos de procedimentos .................................................................................... 200<br />

34.1 Tipos de texto de procedimentos................................................................................. 200<br />

34.2 Pragmatica.................................................................................................................. 200<br />

34.3 Orientação................................................................................................................... 201<br />

34.4 Estrutura interna.......................................................................................................... 201<br />

34.5 Participantes ............................................................................................................... 202<br />

34.6 Formas verbais ........................................................................................................... 203<br />

34.7 Ênfase......................................................................................................................... 205<br />

34.8 Coesão........................................................................................................................ 205<br />

34.9 Um exemplo................................................................................................................ 205<br />

34.9.1 Tabela de base ................................................................................................... 206<br />

34.9.2 Enre<strong>do</strong>................................................................................................................ 208<br />

34.9.3 Participantes....................................................................................................... 209<br />

34.9.4 Formas verbais ................................................................................................... 209<br />

34.9.5 Ênfase ................................................................................................................ 212<br />

34.9.6 Coesão ............................................................................................................... 212<br />

12


35. Textos Explicativos ............................................................................................. 212<br />

35.1 Texto e tabela de base................................................................................................ 213<br />

35.2 Pragmática.................................................................................................................. 215<br />

35.3 Orientação................................................................................................................... 216<br />

35.4 Enre<strong>do</strong> ........................................................................................................................ 216<br />

35.5 Participantes ............................................................................................................... 217<br />

35.6 Formas verbais ........................................................................................................... 217<br />

35.7 Ênfase......................................................................................................................... 218<br />

35.8 Coesão........................................................................................................................ 219<br />

36 Textos exortativos ................................................................................................ 219<br />

36.1 Tabela de base ........................................................................................................... 220<br />

36.2 Pragmática.................................................................................................................. 222<br />

36.3 Orientação e enre<strong>do</strong>.................................................................................................... 223<br />

36.4 Participantes ............................................................................................................... 224<br />

36.5 Formas verbais ........................................................................................................... 224<br />

36.5.1 Necessi<strong>da</strong>de e irreal ........................................................................................... 224<br />

36.5.2 Real .................................................................................................................... 224<br />

36.5.3 Lexicalizações .................................................................................................... 225<br />

36.6 Ênfase......................................................................................................................... 225<br />

36.7 Coesão........................................................................................................................ 225<br />

Apêndice<br />

Fontes <strong>do</strong>s exemplos <strong>da</strong>s linguas............................................................................ 226<br />

Bibliografia selectiva ................................................................................................. 228<br />

13


1. Gêneros de discurso<br />

Conceitos Básicos<br />

Neste livro definimos o discurso como uma uni<strong>da</strong>de composta <strong>do</strong> que foi dito (ou<br />

escrito) em qualquer oportuni<strong>da</strong>de sobre qualquer tema único. As fronteiras são tanto<br />

semânticas quanto pragmáticas. No plano <strong>da</strong> semântica precisa ter coesão. Esta pode se<br />

achar, por exemplo, no fato de que o vocabulário usa<strong>do</strong> seja de um só campo lexical. No<br />

plano <strong>da</strong> pragmática há interação entre o autor e o seu público (real ou imaginário) que<br />

faz parte <strong>do</strong> acontecimento em que o texto está sen<strong>do</strong> realiza<strong>do</strong>. A duração <strong>do</strong> discurso<br />

não entra em consideração.<br />

O Novo Dicionário Aurélio (sem <strong>da</strong>ta) define o discurso como: 1. Peça oratória<br />

proferi<strong>da</strong> em público ou escrita como se tivesse de o ser. 2. Exposição metódica sobre<br />

certo assunto; arrazoa<strong>do</strong>. 3. Oração, fala .... Muitas vezes também é simplesmente<br />

chama<strong>do</strong> de texto.<br />

Nós usamos o termo para designar textos orais ou escritos. Textos orais podem ser<br />

transcritos, outros escritos diretamente. Os princípios de análise apresenta<strong>do</strong>s neste livro<br />

se aplicam a qualquer um <strong>do</strong>s tipos de discurso como defini<strong>do</strong>s acima.<br />

1.1 Monólogo – diálogo – estu<strong>do</strong> paradigmático<br />

O monólogo em geral é mais formal que o diálogo que de forma geral é mais<br />

espontâneo. Talvez o diálogo ofereça <strong>da</strong><strong>do</strong>s ain<strong>da</strong> mais autênticos para representar a<br />

língua. A interação entre <strong>do</strong>is ou mais falantes tem uma dinâmica bem diferente que o<br />

monólogo apresenta<strong>do</strong> a ouvintes que podem de vez em quan<strong>do</strong> reagir verbalmente<br />

àquele que está discursan<strong>do</strong>.<br />

14


Para nossos fins nós decidimos escolher o monólogo visto que ele nos apresenta o<br />

tipo de <strong>da</strong><strong>do</strong>s que serve muito bem para fazer a análise <strong>da</strong>s estruturas gramaticais <strong>da</strong><br />

língua. A análise <strong>do</strong> discurso pode ser complementa<strong>da</strong> por estu<strong>do</strong>s paradigmáticos, na<br />

gramática que o falante nativo usa, geralmente, sem se <strong>da</strong>r conta <strong>do</strong> sistema. Por outro<br />

la<strong>do</strong>, desde que ele começou a estu<strong>da</strong>r a estrutura de um texto que o alerta às funções<br />

sintáticas na sua língua, ele é bem capaz de investigar sua própria língua<br />

paradigmaticamente, quer dizer, construin<strong>do</strong> para si paradigmas como <strong>do</strong>s pronomes,<br />

nomes, verbos e conjuntos de partículas e afixos que fazem parte <strong>da</strong> morfologia ou <strong>da</strong><br />

sintaxe.<br />

1.2 Os <strong>da</strong><strong>do</strong>s<br />

Para fazer uma análise completa é necessário examinar um grande número de<br />

textos de ca<strong>da</strong> gênero. Por outro la<strong>do</strong>, se a análise for feita por um falante nativo, fazen<strong>do</strong><br />

uma auto-investigação <strong>da</strong> sua própria língua, ele pode tirar conclusões váli<strong>da</strong>s de um ou<br />

<strong>do</strong>is exemplos de ca<strong>da</strong> tipo, especialmente se ele consegue descobrir os paradigmas <strong>da</strong><br />

sua língua. Fazer um estu<strong>do</strong> comparativo entre línguas diferentes também é instrutivo,<br />

especialmente, se o investiga<strong>do</strong>r quer se tornar bilingüe. Por outro la<strong>do</strong>, não é de se<br />

esperar que as estruturas <strong>da</strong>s duas sejam iguais.<br />

Neste livro vamos apresentar em detalhes somente um exemplo de ca<strong>da</strong><br />

um <strong>do</strong>s quatro tipos aqui considera<strong>do</strong>s. Esperamos que os méto<strong>do</strong>s preparem o curioso<br />

para fazer uma análise de qualquer texto que ele deseja estu<strong>da</strong>r em qualquer língua. Visto<br />

que o livro está escrito em português, muitos <strong>do</strong>s exemplos foram tira<strong>do</strong>s desta língua,<br />

enriqueci<strong>do</strong>s por <strong>da</strong><strong>do</strong>s de línguas indígenas e de imigrantes.<br />

1.3 Tipos de textos<br />

Para analisar textos é util distinguir quatro tipos:<br />

narrações – histórias<br />

instruções -- receitas<br />

explicações – explican<strong>do</strong> o porquê <strong>da</strong>s coisas<br />

exortações – passan<strong>do</strong> instruções sobre comportamento<br />

15


1.3.1 Narrativas<br />

São histórias sobre acontecimentos e experiências, geralmente no passa<strong>do</strong>, mas<br />

também no presente e até previstas para o futuro. Podem ser autênticas ou imaginárias,<br />

por oral ou escrito, com poucos ou muitos detalhes. Podem ser acontecimentos diários,<br />

pessoais, ou <strong>da</strong> história, romances, autobiografias, legen<strong>da</strong>s, contos e outros. A narrativa<br />

responde a perguntas como: o que aconteceu? Como foi? Quem foi? Onde aconteceu?<br />

Quan<strong>do</strong>?<br />

Narrativas tratam de experiências que aconteceram em algum lugar, durante certo<br />

tempo. Normalmente são conta<strong>da</strong>s em ordem cronológica. Os que fazem as ações são<br />

agentes, os que recebem a ação são pacientes, e outros recebem os benefícios ou os <strong>da</strong>nos<br />

e são os recipientes. Participantes podem ser pessoas, animais personifica<strong>do</strong>s e até<br />

objetos personifica<strong>do</strong>s.<br />

O autor pode ter várias razões por que ele faz o texto. Ele pode querer passar<br />

tempo, ensinar um ponto, ilustrar um tipo de comportamento, etc. Pode fazer o texto de<br />

perspectivas diferentes: como observa<strong>do</strong>r ou participante, escrever somente na terceira<br />

pessoa ou na primeira ou segun<strong>da</strong>. Perspectiva, razão, tempo, lugar, participantes, to<strong>da</strong>s<br />

estas dimensões podem ser usa<strong>da</strong>s para <strong>da</strong>r subcategorias de tipos de narrativas.<br />

1.3.2 Instruções<br />

Respondem à pergunta: como é que se faz isto? Elas são orienta<strong>da</strong>s para alcançar<br />

um fim concreto, uma coisa feita. O processo tem várias partes sucessivas. O texto pode<br />

conter avisos sobre o que evitar e estratégias alternativas para alcançar o mesmo fim.<br />

Geralmente os participantes não têm grande importância e muitas vezes são indefini<strong>do</strong>s,<br />

quan<strong>do</strong> não se trata de um texto que descreve o que fazem vários grupos em determina<strong>da</strong><br />

cerimônia ou em outra ativi<strong>da</strong>de coordena<strong>da</strong>. É o mesmo caso com o lugar e o tempo;<br />

somente entram nos casos em que as ações dependem deles. Normalmente as partes <strong>do</strong><br />

processo são incluí<strong>da</strong>s na ordem cronológica. São receitas.<br />

Pode-se falar de textos descritivos como subgrupo de textos de instruções.<br />

São textos que descrevem o que se fazia antigamente, tradições, comportamento na<br />

16


socie<strong>da</strong>de, visto <strong>da</strong> perspectiva legal, parlamentar, ou pessoal. A diferença entre textos de<br />

instruções e descritivos se vê na forma, na função e na pragmática. Geralmente textos de<br />

instruções não dependem <strong>do</strong> aviso de pessoas, mesmo que o ouvinte ou o leitor possa<br />

aceitar, ignorar, rejeitar ou alterar o processo descrito. Esta informação pode <strong>da</strong>r-se em<br />

formas reduzi<strong>da</strong>s, por exemplo, usan<strong>do</strong> o estilo <strong>da</strong>s receitas com o verbo no infinitivo.<br />

(1) tomar três vezes ao dia<br />

Descrições de costumes antigos podem conter argumentos para persuadir os<br />

ouvintes, por exemplo, <strong>da</strong> veraci<strong>da</strong>de <strong>do</strong>s acontecimentos, ou de continuar fazen<strong>do</strong> os<br />

ritos descritos.<br />

1.3.3 Explicações<br />

Este tipo de texto é orienta<strong>do</strong> por um tema e é usa<strong>do</strong> para analisar, explicar, expor.<br />

Ele responde às perguntas: por quê? Para quê? As explicações são genéricas, sem ligação<br />

a pessoas, que podem ou não ser parte <strong>do</strong> problema ou <strong>da</strong> solução.<br />

Geralmente elas têm duas partes: a exposição <strong>do</strong> problema e a solução ou as<br />

conseqüências deste.<br />

Este tipo contém muitas construções nominais, mesmo em línguas que não as<br />

usam com muita freqüência e que quase não conhecem abstratos. As descrições e os<br />

argumentos geralmente são apresenta<strong>do</strong>s em seqüências lógicas em vez de cronológicas.<br />

Tempo não é uma consideração neste tipo de texto.<br />

1.3.4 Exortações<br />

São textos em que o autor tenta influenciar o comportamento <strong>do</strong> ouvinte. Ele<br />

aconselha, admoesta, dá palpite e ordens, critica, pede desculpas, oferece complementos,<br />

ora, etc. Ele responde à pergunta: que é que fulano deve fazer? Ele visa o ouvinte e o<br />

comportamento dele.<br />

São usa<strong>da</strong>s muitas injunções, mas também explicações de causas, condições e<br />

razões porque certas maneiras de agir são boas ou nocíveis. Geralmente são <strong>da</strong><strong>da</strong>s no<br />

17


contexto de ordens e normas conheci<strong>da</strong>s e aceitas. Estas podem ser menciona<strong>da</strong>s no<br />

texto.<br />

1.3.5 Marcas <strong>do</strong>s tipos de textos<br />

Até agora explicamos as diferenças entre os tipos à base <strong>da</strong> semântica e <strong>da</strong><br />

pragmática. Também existem diferenças formais. Veja o diagrama seguinte:<br />

Tabela 1: Diferenças entre tipos de discursos<br />

Narração Procedimento Explicação Exortação<br />

ligação cronológica cronológica lógica lógica<br />

participante 1./3. pessoa indefini<strong>do</strong><br />

indefini<strong>do</strong> 2. pessoa<br />

central<br />

geral<br />

orientação agente/paciente paciente/resulta<strong>do</strong> tema ouvinte<br />

tempo termina<strong>do</strong>/ antecipan<strong>do</strong>/ indefini<strong>do</strong> antecipan<strong>do</strong><br />

antecipan<strong>do</strong> termina<strong>do</strong><br />

tensão + ponto + resulta<strong>do</strong> + argumento + argumento<br />

culminante<br />

- tensão +/- tensão<br />

(leitores).<br />

Definições<br />

ligação – tipo de ligações entre as partes <strong>do</strong> texto, seja cronológico ou lógico,<br />

pessoa central – pronome usa<strong>do</strong> para identificar a pessoa central <strong>do</strong> texto,<br />

orientação – os elementos (pessoas ou eventos) centrais <strong>do</strong> texto,<br />

tempo – a orienteção temporal <strong>do</strong>s verbos na linha <strong>do</strong> tema <strong>do</strong> texto,<br />

tensão – o suspense que o autor usou para guar<strong>da</strong>r o interesse <strong>do</strong>s ouvintes<br />

Esta tabela não é absoluta, ou seja, nem to<strong>da</strong>s as diferenças estarão sempre<br />

presentes num texto de determina<strong>do</strong> tipo. São diferenças que podem ser encontra<strong>da</strong>s em<br />

muitas línguas. Narrativas geralmente vão ser conta<strong>da</strong>s com os verbos no passa<strong>do</strong> ou no<br />

presente histórico, mas podem também ser conta<strong>da</strong>s no futuro como profecias. Um texto<br />

18


de instruções que é ver<strong>da</strong>de em qualquer época pode ser conta<strong>do</strong> no passa<strong>do</strong>,<br />

especialmente, se ele descreve hábitos <strong>do</strong>s velhos tempos. Uma explicação pode ser<br />

enriqueci<strong>da</strong> por exemplos conta<strong>do</strong>s no passa<strong>do</strong>; uma exortação, por exemplos no passa<strong>do</strong><br />

ou no futuro que mostram o resulta<strong>do</strong> <strong>do</strong> comportamento deseja<strong>do</strong>.<br />

Muitos textos são mistos pelo fato de serem compostos por partes de vários tipos.<br />

Isto é muito comum nas narrativas que podem ter descrições (tipo explicação), ordens<br />

(tipo exortação), instruções (tipo procedimento). Assim pode ser difícil classificar certo<br />

texto. O autor pode criar o texto com certa intenção declara<strong>da</strong>, mas com características<br />

que não lhe correspondem. É através <strong>da</strong> análise que o tipo vai aparecer.<br />

2. Tabela de base<br />

Para fins de análise o instrumento mais importante é a tabela de base feita <strong>do</strong> texto<br />

escolhi<strong>do</strong>. Esta tabela serve para to<strong>da</strong>s as outras que serão feitas, por isso é bom fazê-la<br />

com to<strong>do</strong> cui<strong>da</strong><strong>do</strong>, incluin<strong>do</strong> o texto completo a ser estu<strong>da</strong><strong>do</strong>.<br />

2.1 Escolha <strong>do</strong>s textos<br />

critérios:<br />

Para escolher um texto bom para a análise convém considerar os seguintes<br />

− o autor deverá ser um falante nativo <strong>da</strong> língua, de preferência alguém conheci<strong>do</strong><br />

como bom conta<strong>do</strong>r de histórias<br />

− o(s) texto(s) deve(m) ser li<strong>do</strong>(s) por um outro falante nativo e declara<strong>do</strong> ser bom<br />

− deve ser um texto curto (1-3 páginas)<br />

− de preferência com três participantes (que podem ser analisa<strong>do</strong>s primeiro)<br />

− de preferência de vários autores para ter à disposição textos com estilos varia<strong>do</strong>s<br />

19


Um exemplo segue:<br />

(2): As Abelhas Assassinas<br />

Antigamente não tinha abelhas assassinas no Rio Urucauá. De<br />

repente elas apareceram. Um dia duas crianças foram pescar. Elas viram<br />

um enxame de abelhas e mexeram com elas. Então as abelhas picaram-nas<br />

por to<strong>da</strong> parte <strong>do</strong> corpo. Aí elas se jogaram na água. Quan<strong>do</strong> vieram à tona<br />

as abelhas picaram suas cabeças. Então elas disseram:<br />

-- O que vamos fazer agora? Vamos nos esconder debaixo <strong>da</strong> canoa!<br />

Aí emborcaram a canoa e se esconderam <strong>da</strong>s abelhas até que elas<br />

as deixaram. Foi bom elas terem aquela idéia. Por isso não morreram.<br />

Então elas voltaram para casa e disseram para as pessoas:<br />

-- Se vocês virem aquele tipo de abelha, não mexam com elas, pois<br />

elas são horríveis! Se elas lhes perseguirem, elas não vão desistir e se<br />

vocês não conseguirem se esconder podem até matar vocês.<br />

2.2 Preparar o texto<br />

É bom <strong>da</strong>r um número a ca<strong>da</strong> frase (i.e. a uni<strong>da</strong>de que termina com ponto final).<br />

Dentro <strong>da</strong> frase muitas vezes se encontra mais <strong>do</strong> que um verbo, então ca<strong>da</strong> parte que<br />

contém um verbo, recebe uma letra que subdivide as frases em orações.<br />

Na tabela ca<strong>da</strong> verbo será escrito em uma linha nova, acompanha<strong>do</strong> pelas partes<br />

<strong>da</strong> oração que permanecem juntas. Veja a tabela <strong>do</strong> texto As Abelhas Assassinas.<br />

O texto também contém citações quan<strong>do</strong> os participantes falam entre si. Estas são<br />

marca<strong>da</strong>s na tabela. Segue o texto As Abelhas Assassinas subdividi<strong>do</strong> em frases e<br />

orações:<br />

(3) 1 Antigamente não tinha abelhas assassinas no Rio Urucauá. 2 De<br />

repente elas apareceram. 3a Um dia duas crianças foram 3b pescar. 4a<br />

Elas viram um enxame de abelhas 4b e mexeram com elas. 5 Então as<br />

abelhas picaram-nas por to<strong>da</strong> parte <strong>do</strong> corpo. 6 Aí elas se jogaram na água.<br />

20


7a Quan<strong>do</strong> vieram à tona 7b as abelhas picaram suas cabeças. 8a Então<br />

elas disseram:<br />

8b -- O que vamos 8c fazer agora? 9a Vamos 9b nos esconder<br />

debaixo <strong>da</strong> canoa!<br />

10a Aí emborcaram a canoa 10b e se esconderam <strong>da</strong>s abelhas 10c<br />

até que elas as deixaram. 11 Foi bom elas terem aquela idéia. 12 Por isso<br />

não morreram.<br />

13a Então elas voltaram para casa 13b e disseram para as pessoas:<br />

13c -- Se vocês virem aquele tipo de abelha, 13d não mexam com<br />

elas, 13e pois elas são horríveis! 14a Se elas lhes perseguirem, 14b elas<br />

não vão 14c desistir 14d e se vocês não conseguirem 14e se esconder 14f<br />

podem 14g até matar vocês.<br />

2.3 A tabela<br />

Pode-se construir a tabela de base usan<strong>do</strong> os conceitos de ligação (o primero<br />

elemento de uma frase), sujeito (aquele que faz a ação), objeto (aquele que recebe a<br />

ação), verbo (a ação) e circunstâncias (que acompanham os outros constituintes). Estas<br />

últimas podem ocorrer várias vezes em qualquer oração e recebem tantos espaços na<br />

tabela quantos necessários no texto.<br />

Tabela 2: Tabela de Base<br />

Nr. ligação sujeito objeto Verbo objeto circunstância<br />

1 Antiga-<br />

não tinha abelhas no Rio Urucauá.<br />

mente<br />

assassinas<br />

2 De<br />

repente<br />

elas apareceram.<br />

3a Um dia 2 crianças foram<br />

3b pescar.<br />

4a Elas viram um enxame de abelhas<br />

4b e # mexeram com elas.<br />

5 Então as abelhas picaram- nas por to<strong>da</strong> parte <strong>do</strong> corpo.<br />

6 Aí elas se jogaram na água.<br />

7a Quan<strong>do</strong> # vieram à tona<br />

7b as abelhas picaram suas cabeças.<br />

8a Então elas disseram:<br />

21


8b >> o que vamos<br />

8c fazer agora?<br />

9a Vamos<br />

9b nos esconder debaixo <strong>da</strong> canoa!>se vocês virem aquele tipo de abelhas,<br />

13d não mexam com elas<br />

13e pois elas são (horríveis!)<br />

14a Se elas lhes perseguirem,<br />

14b elas não vão<br />

14c desistir,<br />

14d e se vocês não conseguirem<br />

14e se esconder,<br />

14f elas podem<br />

14g até matar vocês.> ....


Para construir a tabela de base em língua diferente <strong>do</strong> português, o esquema deve<br />

ser mu<strong>da</strong><strong>do</strong> de acor<strong>do</strong> com a estrutura <strong>da</strong>quela língua. Assim pode ser necessário<br />

começar várias tabelas antes de achar uma boa forma. É um trabalho que vale à pena<br />

visto que a tabela de base é o instrumento mais importante para descobrir a estrutura <strong>da</strong><br />

língua a ser analisa<strong>da</strong>. Também é útil para comparar com as tabelas de base de outra<br />

língua que se deseja aprender.<br />

Se a tabela é para servir alguém que não conhece a língua, é bom ter uma tradução<br />

literal embaixo de ca<strong>da</strong> palavra e uma tradução frase por frase separa<strong>da</strong> <strong>da</strong> tabela. Para<br />

um exemplo de tal tabela veja o capítulo 34<br />

Num texto podem encontrar-se frases intercala<strong>da</strong>s, onde uma oração é intercala<strong>da</strong><br />

dentro de partes de uma outra oração.<br />

Ex. Um dia, enquanto to<strong>do</strong>s estavam fazen<strong>do</strong> uma sesta, uma cobra entrou na casa<br />

e foi no quarto <strong>da</strong> menina.<br />

Tal frase pode entrar na tabela de base <strong>da</strong> seguinte forma:<br />

23


Tabela 3<br />

Nr. ligação Sujeito objeto Verbo objeto circunstância<br />

3a Um dia,<br />

3b enquanto to<strong>do</strong>s estavam<br />

3c fazen<strong>do</strong> uma sesta,<br />

3(a) uma cobra entrou na casa<br />

3d e foi ao quarto <strong>da</strong><br />

menina.<br />

A tabela é construí<strong>da</strong> para acomo<strong>da</strong>r de maneira sistemática o texto to<strong>do</strong>.<br />

3. Partes de texto narrativo<br />

Não somente as frases têm a sua estrutura, mas também o texto to<strong>do</strong>. A<br />

compreensão <strong>da</strong> gramática somente é completa quan<strong>do</strong> se conhece o uso de to<strong>da</strong>s as<br />

classes de palavras dentro de textos bem forma<strong>do</strong>s, estu<strong>da</strong>n<strong>do</strong> to<strong>do</strong>s os tipos de base de<br />

textos. Um texto narrativo é construí<strong>do</strong> de forma bem diferente de um texto de instruções<br />

ou de receita, por exemplo.<br />

O ponto de parti<strong>da</strong> mais fácil são textos narrativos, que vão ser trata<strong>do</strong>s em<br />

detalhe nas partes III – V. Uma <strong>da</strong>s razões é que muito já é conheci<strong>do</strong> sobre a sua<br />

estrutura e são considera<strong>do</strong>s fun<strong>da</strong>mentais por muitos lingüistas. Os outros tipos podem<br />

ocorrer como partes de narrativas, mas precisam de um estu<strong>do</strong> separa<strong>do</strong> apresenta<strong>do</strong> na<br />

parte VI.<br />

Neste capítulo vamos desenvolver a maneira de conhecer e descrever os<br />

princípios <strong>do</strong> enre<strong>do</strong> de textos narrativos.<br />

3.1 O enre<strong>do</strong><br />

Desde o tempo <strong>do</strong>s gregos <strong>da</strong> antigüi<strong>da</strong>de, conhecem-se as três partes de textos<br />

narrativos: a introdução, a parte principal/corpo e a conclusão.<br />

24


3.1.1. Introdução<br />

A introdução pode ter duas partes: um título e uma abertura. O título é a<br />

situação em que os eventos <strong>da</strong> narração aconteceram, é comum em textos escritos e alerta<br />

o leitor sobre o conteú<strong>do</strong> e o tipo <strong>do</strong> texto. Por outro la<strong>do</strong>, textos de tradição oral podem<br />

também não ter título. O título pode ser o nome pelo qual a história ou parte <strong>da</strong> história<br />

fica conheci<strong>da</strong>. Ao mesmo tempo ele o situa num contexto maior, seja na cultura ou no<br />

conhecimento geral <strong>do</strong> povo. Ou pode ser incorpora<strong>do</strong> numa frase de abertura, como:<br />

(4) "Vou lhe contar como apareceu um tipo de abelhas bem<br />

perigosas".<br />

Um texto pode ser inicia<strong>do</strong> por uma expressão formular: Era uma vez... Ou por<br />

uma indicação a quem o texto é destina<strong>do</strong>: hoje vamos falar de..., e fica claro que certas<br />

pessoas podem assistir, mas sem falar, outros podem tomar a palavra para fazer<br />

perguntas, ou introduzir correções, ou outras versões <strong>da</strong> mesma história.<br />

Na introdução o narra<strong>do</strong>r pode mostrar o cenário, contan<strong>do</strong> certas condições que<br />

são a causa <strong>do</strong> acontecimento que ele vai narrar, pode indicar o lugar, o tempo, os<br />

participantes, o que eles faziam.<br />

3.1.2 Corpo<br />

O corpo de um texto narrativo geralmente é composto por episódios. Se o texto<br />

for curto pode, às vezes, ter somente um episódio. Podem ser compara<strong>do</strong>s com cenas<br />

numa peça de teatro. A mu<strong>da</strong>nça de episódio pode ser sinala<strong>da</strong> por mu<strong>da</strong>nça de tempo, de<br />

lugar, de participantes, enfim de qualquer circunstância. Podem ser dividi<strong>do</strong>s em<br />

parágrafos cujos limites são similares aos <strong>do</strong> corpo <strong>da</strong> narração. Num texto curto pode<br />

não haver diferença. Eis algumas diferenças entre parágrafos e episódios:<br />

Tabela 4:<br />

limites de parágrafos limites de episódios<br />

tempo não há mu<strong>da</strong>nça há mu<strong>da</strong>nça de tempo<br />

lugar a atenção fica num determina<strong>do</strong> local o lugar mu<strong>da</strong> completamente<br />

participantes só um participante ativo mu<strong>da</strong> os participantes ativos mu<strong>da</strong>m<br />

acontecimentos os eventos seguem sem surpresa há elementos de surpresa<br />

25


Para iniciar a narrativa há uma parte <strong>do</strong> cenário que mu<strong>da</strong> significativamente. É o<br />

momento de ver as primeiras ações <strong>do</strong>s participantes.<br />

Quan<strong>do</strong> as ações são intensifica<strong>da</strong>s chegam perto <strong>do</strong> ponto culminante que é<br />

aquele onde a tensão é a mais quente. Depois deste ponto ela diminui sensivelmente. Em<br />

textos mais longos pode haver vários pontos com tensão intensifica<strong>da</strong> e depois diminuí<strong>da</strong>.<br />

O ponto culminante é aquele com mais tensão que os outros.<br />

Certos textos podem conter outros textos encaixa<strong>do</strong>s, por exemplo, um discurso<br />

de um participante que é menciona<strong>do</strong>. Tais textos podem ter cenários próprios, corpos e<br />

conclusões.<br />

Em geral um texto narrativo contém um ponto culminante, mas é possível<br />

imaginar um que não o tenha. Por isso não deixa de ser um texto narrativo.<br />

3.1.3 Conclusão<br />

Para concluir o texto o autor pode apresentar um resumo. Pelo conteú<strong>do</strong> deste<br />

pode-se apreender o que ele queria fazer: ensinar? advertir? passar tempo? Ele pode<br />

ressaltar a lição que ele queria ilustrar, ou então deixar os ouvintes (o leitor) pensarem em<br />

outra coisa que no fun<strong>do</strong> ele tencionava. Podem ser perguntas como:<br />

− O que aconteceu?<br />

− Por que isto aconteceu?<br />

− Como aconteceu?<br />

− Por que isto é importante? e responder:<br />

− É porque X acredita em Y<br />

− É assim que vocês devem agir<br />

− É assim que ninguém pode agir...<br />

Uma análise bastante global <strong>da</strong>s circunstâncias, <strong>da</strong> cultura, <strong>do</strong>s hábitos pode ser<br />

necessária antes de descobrir o porquê de certos textos.<br />

26


A conclusão pode terminar em um fecho que encerra o texto. Assim os contos em<br />

português podem terminar: "e assim viveram felizes para sempre". Em kaingang<br />

(Brasil) muitos textos terminam em: hã vẽ: “é isso, termina<strong>do</strong>”.<br />

27


Título<br />

Palavra<br />

ou frase<br />

Nome <strong>da</strong><br />

narrativa<br />

Introdução<br />

Abetura<br />

Palavra, frase,<br />

sentença ou<br />

parágrafo<br />

• Fórmula de<br />

abertura<br />

• Falante<br />

/relação<br />

com o<br />

ouvinte<br />

• Explicação<br />

ou<br />

• Exortação<br />

Cenário<br />

Parágrafo(s)<br />

Introdução de<br />

• Tempo<br />

• Local<br />

• Participantes<br />

• Circunstâncias<br />

T<br />

• Verbos estativos<br />

• Ação durativa<br />

• Aspecto habitual<br />

Parágrafo(s) Parágrafo(s)<br />

Inciting moment<br />

Ponto Pré-culminante<br />

Episódio 1<br />

Episódio 2<br />

Parágrafo(s)<br />

Episódio 3<br />

• Desenvolvimento <strong>da</strong>s circunstâncias<br />

Característic<br />

Linha de eventos<br />

• Verbos dinâmicos<br />

• Ação pontual<br />

• Mo<strong>do</strong> realis<br />

*Tempo, local e/ou<br />

Corpo<br />

Ponto<br />

culminant<br />

e<br />

Parágrafo(s)<br />

Episódio 4<br />

• Ponto<br />

culminant<br />

e<br />

Pico<br />

Ponto<br />

Pós-culminante<br />

Parágrafo(s)<br />

Episódio 5<br />

Parágrafo(s)<br />

Episódio 6<br />

• Ponto descendente<br />

Pico′<br />

Zonas de turbulência<br />

• Particulari<strong>da</strong>des<br />

gramaticais<br />

• Focalisação<br />

• Mu<strong>da</strong>nça de roteiro <strong>da</strong><br />

linha de eventos<br />

• Concentração de<br />

† Marcas de<br />

Conclusão<br />

Encerramento<br />

Frase, sentença ou<br />

parágrafo<br />

• Sumário<br />

• Avaliação<br />

• Lição<br />

• Moral<br />

• Advertência<br />

• Narrativa,<br />

• Explicação, ou<br />

• Exortação<br />

Fecho<br />

Palavra,<br />

frase ou<br />

sentença<br />

Fómula de<br />

encerrame<br />

nto<br />

Tabela 5<br />

28


3.2 Particulari<strong>da</strong>des gramaticais<br />

explicar aqui.<br />

Ca<strong>da</strong> parte <strong>do</strong> texto tem sua particulari<strong>da</strong>de gramatical. Embora estas sejam<br />

diferentes em ca<strong>da</strong> língua, podem-se esperar certas estruturas típicas que vamos<br />

3.2.1 Introdução<br />

O título, sen<strong>do</strong> o nome <strong>do</strong> texto, provavelmente vai ser expresso por um<br />

substantivo ou uma locução nominal.<br />

A abertura pode ser expressa de várias maneiras. Se existe uma expressão<br />

tradicional <strong>do</strong> tipo "era uma vez..." pode ser usa<strong>do</strong> para um conto. A abertura pode<br />

formar um parágrafo por si. Neste caso a estrutura pode ser não-narrativa, talvez uma<br />

frase nominal, ou um pequeno texto de exposição ou de exortação (veja capítulos 35 e<br />

36).<br />

No cenário, que é uma descrição <strong>do</strong> tempo, lugar, participantes, circunstâncias,<br />

provavelmente, acham-se verbos como viver que são durativos, ou estáticos como ser,<br />

existir. Também existem verbos dinâmicos como aparecer. Se hábitos de participantes<br />

são menciona<strong>do</strong>s, são numa forma que exprime hábitos.<br />

3.2.2 Corpo<br />

O corpo de uma narrativa sempre representa o gênero narrativo. Assim os verbos<br />

são dinâmicos e no mo<strong>do</strong> real, mesmo que outras formas possam ser usa<strong>da</strong>s para fins<br />

específicos.<br />

O começo <strong>da</strong> história propriamente dito pode ser marca<strong>do</strong> com uma expressão<br />

"um dia..." que inicia uma série de acontecimentos. Os verbos não são mais descritivos,<br />

mas ativos, no mo<strong>do</strong> indicativo (real) e no aspecto perfectivo ou imperfectivo, talvez até<br />

neutro (veja capítulo).<br />

29


O ponto culminante, onde há muita tensão, pode ser caracteriza<strong>do</strong> por formas<br />

verbais que são contrárias às usa<strong>da</strong>s no resto <strong>do</strong> texto. Podem ser negações, podem ser<br />

particípios ou gerúndios em vez de ativos, podem ser formas enfáticas (ver 29),<br />

mu<strong>da</strong>nças de formas <strong>da</strong> linha <strong>do</strong>s eventos normais (ver 30.4.4), pode ser concentração de<br />

participantes (ver 30.4.6).<br />

Estas mesmas formas podem também ser usa<strong>da</strong>s na parte que segue o ponto<br />

culminante, antes <strong>do</strong> fim <strong>da</strong> história, onde a tensão se desfaz aos poucos. Ou podem ser<br />

usa<strong>da</strong>s no começo <strong>da</strong> parte narrativa <strong>da</strong> história, mesmo que lá ocorram com menos<br />

freqüência.<br />

3.2.3 Conclusão<br />

As estratégias para terminar um texto variam bastante. O narra<strong>do</strong>r pode resumir<br />

os eventos com uma frase não muito diferente <strong>do</strong> resto <strong>do</strong> texto. Outros textos podem ter<br />

to<strong>do</strong> um parágrafo para este fim. Uma avaliação pode ser uma frase ou um parágrafo,<br />

usan<strong>do</strong> o texto explicativo. Uma lição de moral ou uma advertência pode usar as<br />

estruturas de um texto exortativo. O fecho geralmente seria uma palavra ou expressão<br />

cria<strong>da</strong> na língua especialmente para terminar um texto.<br />

3.3 Ordem <strong>do</strong>s eventos<br />

O narra<strong>do</strong>r tem muitas possibili<strong>da</strong>des de apresentar os eventos numa ordem que<br />

ele acha conveniente. Freqüentemente vão ser apresenta<strong>do</strong>s na ordem de ocorrência. Mas<br />

existem estratégias como a retrospecção, a projeção, ou o ciclo.<br />

3.3.1 Retrospecção<br />

Na retrospecção o narra<strong>do</strong>r retorna a um acontecimento já ocorri<strong>do</strong> para decidir<br />

sua ação atual. Esta retrospecção serve para <strong>da</strong>r importância (focalização) ao evento.<br />

30


Tabela 6<br />

Hoje Pedro vai ao riacho.<br />

Ele an<strong>da</strong> rapi<strong>da</strong>mente.<br />

porque ele se lembra<br />

<strong>do</strong> que aconteceu um mês atrás.<br />

Naquele dia ele tinha encontra<strong>do</strong> uma onça.<br />

“Aonde vai tão ce<strong>do</strong>, homenzinho?”<br />

“e…e…eu…” ele tinha gagueja<strong>do</strong><br />

antes de fugir em pânico.<br />

Assim hoje ele prefere<br />

evitar este tipo de encontro..<br />

3.3.2 Projeção<br />

O contrário <strong>da</strong> retrospecção é a projeção sobre o que vai ou pode acontecer.<br />

Eventos <strong>do</strong> futuro ou o resulta<strong>do</strong> de tais eventos são narra<strong>do</strong>s antes que eles aconteçam.<br />

Isto serve para <strong>da</strong>r importância aos eventos e ao mesmo tempo aumentar a tensão, visto<br />

que os ouvintes (leitores) não sabem como o conto vai continuar.<br />

(5) Pedro não estava com pressa. Ele gostava de an<strong>da</strong>r ao rio, parava aqui<br />

para examinar uma planta e acolá para apreciar aquela pedra. De repente<br />

ele sentiu uma presença – e lá estava aquela onça <strong>da</strong> qual seu pai tinha<br />

fala<strong>do</strong>. Ele sobreviveu, mas imagine sua surpresa quan<strong>do</strong> ela falou para<br />

ele... .<br />

Distinguem-se vários níveis de projeções: confiança total, provável, possível, e,<br />

no la<strong>do</strong> contrário projeções não-prováveis ou impossíveis (Grimes 1975:69). Uma<br />

projeção não-provável seria:<br />

(6) O pequeno Carlos olhou as frutas com desejo intenso. Mas, ele não<br />

tinha na<strong>da</strong> para comprar ao menos uma. "Por que me queixar?" ele pensou.<br />

31


"Amanhã meu tio vai me <strong>da</strong>r dinheiro. Vou comprar uma, duas, talvez até<br />

cinco destas mangas! Que maravilha!"<br />

3.3.3 Ciclo<br />

Ao contrário de contar os eventos em seqüência linear, o narra<strong>do</strong>r pode apresentá-<br />

los como uma seqüência de ciclos. A ordem cronológica não é viola<strong>da</strong> como na<br />

retrospecção ou na projeção. Quan<strong>do</strong> a história chega a certo ponto, o narra<strong>do</strong>r precisa<br />

um detalhe de um evento menciona<strong>do</strong> antes e volta lá no texto já conta<strong>do</strong> para fazer<br />

alusão a este pormenor, às vezes, ao mesmo tempo mencionan<strong>do</strong> outros detalhes não<br />

explica<strong>do</strong>s antes. Assim o texto continua até que um outro detalhe não menciona<strong>do</strong> é<br />

importante, e um outro ciclo começa.<br />

O méto<strong>do</strong> de ciclo não é um erro, mas é um meio eficaz de <strong>da</strong>r ênfase a certas<br />

partes <strong>da</strong> história. Ca<strong>da</strong> ciclo aumenta a tensão, a repetição dá ênfase às partes<br />

importantes. Observe o texto seguinte <strong>da</strong> língua bororo (de Grimes 1972 e 1995). A<br />

ordem atual <strong>do</strong>s eventos está incluí<strong>da</strong> entre parênteses, usan<strong>do</strong> as letras na ordem<br />

alfabética:<br />

(7) Cheguei (B). Naquele momento então uns brasileiros me disseram:<br />

"uma onça machucou sua vaca." Os bororo também mo disseram (D).<br />

Então, ce<strong>do</strong> de manhã, eu a vi (G).<br />

Eles me pediram para ir vê-la (D). Então fui (F). Eu a vi deita<strong>da</strong> ao<br />

la<strong>do</strong> <strong>do</strong> descasca<strong>do</strong>r de arroz (G).<br />

Os que tinham me acompanha<strong>do</strong> para buscá-la correram para mim<br />

(C). Me disseram: "vem ver, sua vaca chegou, mas não está boa." (D). Fui<br />

depressa. Eu a vi (F). Ela tinha caí<strong>do</strong>. Tinha caí<strong>do</strong> ao la<strong>do</strong> <strong>do</strong> descasca<strong>do</strong>r.<br />

Vi as marcas <strong>da</strong> pata no tornozelo, na perna, no peito e no pescoço. A onça<br />

realmente tinha machuca<strong>do</strong> ela muito. A mãe dela estava em pé ao la<strong>do</strong><br />

dela. Esta vaca sempre <strong>da</strong>va bezerros grandes. Esta mãe, a onça tinha<br />

pega<strong>do</strong> ela no ombro. É lá que a onça a pegou. Então ela tinha ataca<strong>do</strong> a<br />

mãe depois de deixar a bezerra (G). Ce<strong>do</strong> no dia seguinte a bezerra morreu<br />

(H).<br />

Durou um tempinho antes que eu podia ir ver o trabalho <strong>da</strong> onça. No<br />

mesmo dia em que eu cheguei a bezerra também tinha chega<strong>do</strong> (A). Por<br />

32


isso, eu achava que de certo ela não ia morrer (E). Mas, não foi assim.<br />

Porque ela realmente morreu (H). Era ruim para mim. Era ruim para mim.<br />

A ordem cronológica é a seguinte:<br />

A Uma bezerra junto com a mãe chega para mim (em Colônia).<br />

B Eu chego (em Colônia).<br />

C Meus companheiros vem corren<strong>do</strong>.<br />

D Os brasileiros, os índios Bororo e meus companheiros dizem que:<br />

a bezerra foi ataca<strong>da</strong> por uma onça e que eu tenho que ir vê-la.<br />

E Eu acho que a bezerra não vai morrer.<br />

F Vou para vê-la.<br />

G Acho a bezerra deita<strong>da</strong> ao la<strong>do</strong> <strong>do</strong> descasca<strong>do</strong>r de arroz e a mãe,<br />

também machuca<strong>da</strong>, em pé ao la<strong>do</strong> dela.<br />

H A bezerra morre.<br />

A ordem em que este incidente foi conta<strong>do</strong> é a seguinte:<br />

ciclo 1 B D G<br />

ciclo 2 D F G<br />

ciclo 3 C D F G H<br />

ciclo 4 A E H<br />

Note que a ordem cronológica foi respeita<strong>da</strong> em ca<strong>da</strong> ciclo, mas a escolha <strong>da</strong>s<br />

partes para compor um ciclo é varia<strong>da</strong>. Note também a reduplicação <strong>da</strong> última frase que<br />

mostra a reação <strong>do</strong> falante ao acontecimento.<br />

Por enquanto ain<strong>da</strong> não existem muitos estu<strong>do</strong>s sobre textos cíclicos. Em Gênesis<br />

1 e 2 as narrações sobre a criação <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> podem cair nesta categoria, como também<br />

outros textos <strong>da</strong> Bíblia.<br />

33


3.4 Um exemplo<br />

O enre<strong>do</strong> <strong>do</strong> texto As Abelhas Assassinas é apresenta<strong>do</strong> na tabela abaixo.<br />

Tabela 7:<br />

Nr. enre<strong>do</strong> <strong>do</strong> texto<br />

1-2 Cenário<br />

3-10<br />

Episódio 1: o conflito com o<br />

ponto culminante (8-9)<br />

11-12 Comentário <strong>do</strong> narra<strong>do</strong>r<br />

13-14 Episódio 2: a reportagem<br />

Conclusão: não tem<br />

Uma análise alternativa poderia dizer que o episódio 2 é a conclusão, visto ser<br />

uma projeção que alerta a família ao novo perigo até então desconheci<strong>do</strong>.<br />

34


4 Autor, audiência e texto<br />

Pragmática<br />

A íntima relação entre autor e audiência influencia, inevitavelmente, a<br />

composição <strong>do</strong> texto. Normalmente o autor tem um público em mente quan<strong>do</strong> ele prepara<br />

e expõe uma palestra, seja na forma oral ou escrita. Isto não somente determina o<br />

conteú<strong>do</strong> <strong>da</strong> palestra, mas também a forma – por exemplo, a informação que está<br />

explícita ou implícita. A circunstância sob a qual a palestra está sen<strong>do</strong> exposta pode<br />

causar menor ou maior impacto. Há uma grande diferença entre o texto oral e escrito; a<br />

distinção será trata<strong>da</strong> com mais detalhes no próximo capítulo. Nosso principal foco aqui é<br />

o texto que é exposto de forma oral e, depois escrito, para fins de análise.<br />

O autor tem muitos objetivos e intenções durante a exposição <strong>da</strong> palestra:<br />

− A possível necessi<strong>da</strong>de de comprovar suas credenciais.<br />

− O desejo de comunicar clara e atrativamente.<br />

− A intenção de comunicar de forma direta ou indireta.<br />

Este capítulo inclui alguns fatores que enfocam estes assuntos.<br />

Meu uso <strong>do</strong> termo pragmático é limita<strong>do</strong> a estas relações. To<strong>do</strong> o capítulo V<br />

poderia ser discuti<strong>do</strong> sob o mesmo título, mas eu decidi considerá-lo separa<strong>da</strong>mente, em<br />

uma outra seção deste livro.<br />

35


4.1 Autor<br />

Ca<strong>da</strong> texto, escrito ou oral tem, no mínimo, um autor. É sempre destina<strong>do</strong> a um<br />

público presente ou não. Há, naturalmente, um monólogo no qual o falante e o ouvinte se<br />

encontram. Este fato confirma a existência de ambos, falante e ouvinte em ca<strong>da</strong> contexto<br />

de comunicação. O autor tem seu público em mente, no seu consciente ou no seu<br />

subconsciente e a<strong>da</strong>pta sua comunicação, de acor<strong>do</strong> com o que ele entende que seja sua<br />

melhor maneira de expressar a si mesmo e o assunto de sua palestra.<br />

Há uma grande variação na forma em que diferentes autores fazem isto. O tipo de<br />

texto também influencia as possibili<strong>da</strong>des. Sem tentar ser exaustivo, eu irei primeiro<br />

focalizar nas possíveis intenções declara<strong>da</strong>s ou implícitas e em como elas saltam no texto.<br />

Contu<strong>do</strong>, a discussão não é limita<strong>da</strong> a este capítulo. Ao longo deste livro nós vamos<br />

perceber estratégias alternativas que o autor pode manipular de acor<strong>do</strong> com os seus<br />

propósitos.<br />

4.1.1 Credenciais<br />

Pode ser necessário para o autor comprovar suas credenciais ao expor certos<br />

textos formais, como monólogos, por exemplo. Isto se aplica a to<strong>do</strong>s os quatro tipos de<br />

textos, provavelmente, menos para narrativas que para os outros. Textos como instruções,<br />

explicações e exortações requerem muitas vezes, certas qualificações por parte <strong>do</strong> autor e<br />

um relacionamento especial com seu público. Pode ser prerrogativa <strong>do</strong> chefe ou cacique<br />

ou de um ancião certos textos exortativos, ou de pajés que falam sobre costumes antigos,<br />

ou dão explicações.<br />

4.1.2 Intenção declara<strong>da</strong><br />

As razões para se criar um texto podem ser varia<strong>da</strong>s: para informar, ensinar,<br />

influenciar, agra<strong>da</strong>r e entreter, apenas para citar algumas. A intenção pode ser dita<br />

claramente pelo autor; neste caso, estamos falan<strong>do</strong> sobre intenção declara<strong>da</strong>. A intenção<br />

declara<strong>da</strong> <strong>do</strong> autor é muitas vezes, encontra<strong>da</strong> na introdução ou na conclusão. Mas pode<br />

também ser encontra<strong>da</strong> em comentários dispersos no texto.<br />

O autor tem várias formas de declarar a intenção <strong>do</strong> texto:<br />

36


− Frases prontas na introdução pode indicar a intenção <strong>do</strong> autor (veja discussão na<br />

seção 3.1)<br />

− Verbos performativos, ou seja, verbos de falar, pensar ou sentir podem ser<br />

usa<strong>do</strong>s pelo falante para indicar seu relacionamento e suas intenções para com o<br />

público.<br />

− Dirigir-se diretamente aos ouvintes, até mesmo chaman<strong>do</strong>-os pelos nomes, é<br />

freqüentemente encontra<strong>do</strong> em textos exortativos, mas não restrito a estes.<br />

Avaliações, lições, conselhos morais ou advertências na conclusão de uma<br />

narrativa (veja seção 3.1.3) muitas vezes indicam a intenção <strong>do</strong> autor. Por exemplo, (13c<br />

até 14g) que é a conclusão <strong>da</strong> história As Abelhas Assassinas.<br />

4.1.3 Intenção Implícita<br />

Freqüentemente, o autor não expressa claramente sua intenção, mas tenta<br />

influenciar seu público indiretamente. Isto é o que nós chamamos de intenção implícita<br />

(ou intenções) <strong>do</strong> autor. Esta intenção é, muitas vezes, mais real <strong>do</strong> que a intenção<br />

revela<strong>da</strong>. Várias estratégias podem ser usa<strong>da</strong>s:<br />

− Digressão: Usan<strong>do</strong> a digressão o autor pode interferir diretamente no texto e se<br />

dirigir ao público. Isto pode ser feito de forma mais fácil com um texto em<br />

terceira pessoa, onde a digressão é reconheci<strong>da</strong> pelo uso <strong>do</strong> pronome de primeira<br />

pessoa. Na maioria <strong>da</strong>s vezes isto é acompanha<strong>do</strong> de um verbo performativo e é<br />

identifica<strong>do</strong> como uma citação.<br />

− Auto-identificação: Num texto em primeira pessoa, a opinião <strong>do</strong> participante<br />

principal e a <strong>do</strong> autor se mesclam. Num texto em terceira pessoa, o autor pode se<br />

identificar com o participante principal (ou qualquer outro) e assim, <strong>da</strong>r a sua<br />

opinião.<br />

− Avaliação: o autor expressa seu ponto de vista indiretamente pela escolha de um<br />

adjetivo ou de um advérbio.<br />

− Cantos: Um canto cria uma atmosfera alegre e introduz um elemento poético.<br />

Numa apresentação oral, ele é canta<strong>do</strong> primeiro pelo narra<strong>do</strong>r, mas também é<br />

37


canta<strong>do</strong> pelo público. O público lembra facilmente <strong>da</strong> mensagem transmiti<strong>da</strong> em<br />

um canto. O autor, muitas vezes, codifica sua intenção principal num canto.<br />

− Explicação: explicações inseri<strong>da</strong>s no texto servem para enfatizar ou “trair” as<br />

reais intenções <strong>do</strong> autor.<br />

− Perguntas retóricas: o autor faz perguntas retóricas à audiência, mesmo saben<strong>do</strong><br />

a resposta e poden<strong>do</strong> fazê-lo. É um estilo, um mo<strong>do</strong> de atrair a atenção, muito<br />

usa<strong>do</strong> para enfatizar o tema principal – intenção implícita.<br />

− Sumário: se a conclusão de uma história contém um sumário, os eventos<br />

realça<strong>do</strong>s, muitas vezes, são o centro <strong>da</strong>s reais intenções <strong>do</strong> autor.<br />

4.2 Audiência<br />

Levan<strong>do</strong> em conta a audiência, o autor faz muitas escolhas, de acor<strong>do</strong> com o<br />

conteú<strong>do</strong> de sua mensagem e quanta informação de pano de fun<strong>do</strong> está ou não incluí<strong>da</strong>.<br />

Por exemplo, ele pode fazer uma alusão ao que ele considera conheci<strong>do</strong> pelos ouvintes,<br />

mas não fala sobre o assunto. Há muitas maneiras pelas quais o público-alvo afeta a<br />

forma de sua apresentação.<br />

Há vários mo<strong>do</strong>s pelos quais podemos classificar um público. Veremos apenas<br />

<strong>do</strong>is desses mo<strong>do</strong>s: i<strong>da</strong>de e escolari<strong>da</strong>de.<br />

4.2.1 I<strong>da</strong>de:<br />

Para uma audiência jovem, o narra<strong>do</strong>r usará alguns cantos por causa de sua alegria<br />

e a facili<strong>da</strong>de com a qual eles transmitem a mensagem principal. Por outro la<strong>do</strong>, para<br />

pessoas i<strong>do</strong>sas, o texto pode ser centraliza<strong>do</strong> em um provérbio e conter outros veículos<br />

apropria<strong>do</strong>s para transmitir ver<strong>da</strong>des profun<strong>da</strong>s.<br />

4.2.2 Escolari<strong>da</strong>de<br />

O nível de escolari<strong>da</strong>de pode fazer uma grande diferença na escolha <strong>do</strong> texto a ser<br />

apresenta<strong>do</strong> e no tipo de informação incluí<strong>da</strong>. O que é dito para especialistas em certos<br />

campos, é ininteligível para outros que não têm a necessária informação de pano de<br />

fun<strong>do</strong>. O mesmo é ver<strong>da</strong>de, naturalmente, sobre pessoas que pertencem a certo tipo de<br />

38


cultura ou subcultura e, por isso, compartilham a informação interna que falta aos de fora.<br />

A maneira <strong>da</strong> argumentação também será afeta<strong>da</strong> neste caso.<br />

4.3 Contexto<br />

O contexto externo: lugar, tempo e outras circunstâncias em que o texto é cria<strong>do</strong><br />

também pode influenciar a forma.<br />

No contexto africano, textos de contos populares são cria<strong>do</strong>s, na maioria <strong>da</strong>s<br />

vezes, à noite. O público está senta<strong>do</strong>, nunca deita<strong>do</strong>, e o autor fica em pé enquanto está<br />

falan<strong>do</strong>. Fora de seu contexto normal, um conto popular facilmente se torna estático e<br />

perde seu sabor. O uso de rádio é relativamente recente e é mais ou menos efetivo. O<br />

público não é visto pelo(s) narra<strong>do</strong>r(es) e a relação direta não é mais possível. Por isso, a<br />

forma é mu<strong>da</strong><strong>da</strong>.<br />

Uma sala de aula com um professor em frente e os alunos senta<strong>do</strong>s em suas<br />

carteiras é um tipo muito diferente de contexto, no qual varia<strong>do</strong>s tipos de texto são<br />

cria<strong>do</strong>s. Um outro contexto é o culto religioso, seja cristão, muçulmano ou animista. A<br />

vi<strong>da</strong> em sua varie<strong>da</strong>de, dá motivos para muitos tipos de contextos informais, ca<strong>da</strong> um<br />

crian<strong>do</strong> seus constrangimentos peculiares, exercen<strong>do</strong> influência na forma <strong>do</strong> texto.<br />

Textos escritos também estão sujeitos a sofrerem influência <strong>do</strong> ambiente físico,<br />

por exemplo, quer sejam escritos na confusão de uma sala de re<strong>da</strong>ção de um jornal ou no<br />

silêncio de um escritório particular; contu<strong>do</strong>, a disposição psicológica <strong>do</strong> autor é mais<br />

importante que o ambiente.<br />

O texto também pode ser coloca<strong>do</strong> num contexto comunicativo maior,<br />

abrangen<strong>do</strong> vários eventos. Pode ser o primeiro evento comunicativo entre este autor e<br />

sua audiência, em particular, sobre um determina<strong>do</strong> assunto; ou pode ser parte de uma<br />

série de palestras. Mais uma vez, isto influencia a forma e o conteú<strong>do</strong>.<br />

4.4 Gênero de textos (tipos)<br />

A principal diferença entre os textos indica<strong>do</strong>s no capítulo 1 é determina<strong>da</strong> pelo<br />

tipo de texto a ser analisa<strong>do</strong>. O tipo de texto também determina, de certa forma, o<br />

relacionamento entre o falante e o ouvinte.<br />

39


4.5 Narrativas<br />

Numa narrativa em primeira pessoa, é mais difícil separar a relação falante -<br />

ouvinte <strong>do</strong> texto em si, uma vez que o narra<strong>do</strong>r é o participante principal. Numa<br />

narrativa em terceira pessoa, to<strong>do</strong>s os meios discuti<strong>do</strong>s em 4.1.1 e 4.1.2 podem ser<br />

utiliza<strong>do</strong>s. O narra<strong>do</strong>r por ele mesmo, é um observa<strong>do</strong>r, como o ouvinte, que permite um<br />

diálogo relativamente diferente <strong>da</strong> reali<strong>da</strong>de que está sen<strong>do</strong> cria<strong>da</strong> no texto, com a<br />

possibili<strong>da</strong>de <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is se misturarem.<br />

4.6 Outros gêneros<br />

Um texto de instruções é similar a uma narrativa em terceira pessoa, exceto que a<br />

intenção <strong>do</strong> autor pode ser menos varia<strong>da</strong> <strong>do</strong> que em uma narrativa. Num discurso<br />

explicativo, um diálogo separa<strong>do</strong> entre o falante e o ouvinte é mais fácil ser encontra<strong>do</strong><br />

numa narrativa em primeira pessoa <strong>do</strong> que em uma narrativa em terceira pessoa. Textos<br />

exortativos, por si mesmos, têm uma constante interação entre as duas pessoas, na<br />

maioria <strong>da</strong>s vezes, como um diálogo unilateral (Longacre 1976:200) com uma resposta<br />

opcional <strong>do</strong> ouvinte.<br />

4.7 Sumário<br />

Usan<strong>do</strong> o texto “As Abelhas Assassinas”, outra vez podemos citar os meios pelos<br />

quais o narra<strong>do</strong>r age como observa<strong>do</strong>r:<br />

1<br />

5. Literatura oral e escrita<br />

Na literatura oral africana, o autor geralmente deseja educar seu público.<br />

Queren<strong>do</strong> fazer isto de um mo<strong>do</strong> agradável, ele emprega certa quanti<strong>da</strong>de de estilos, os<br />

quais serão descritos, neste capítulo, sem seguir nenhuma ordem prévia.<br />

40


5.1 Orações<br />

O autor se dirige aos deuses (ou Deus) para implorar sua aju<strong>da</strong> e proteção. Ele<br />

apresenta para eles (ou Ele) suas credenciais, proclaman<strong>do</strong> sua inocência e submissão,<br />

esperan<strong>do</strong> ganhar seu favor. Tais discursos geralmente pertencem ao gênero exortativo<br />

(por ex. pedi<strong>do</strong>s, agradecimentos...).<br />

5.2 Provérbios<br />

Os provérbios ocupam um papel especial no sistema educacional tradicional.<br />

Ca<strong>da</strong> membro <strong>da</strong> comuni<strong>da</strong>de compreende, no mínimo, alguns deles, embora o<br />

significa<strong>do</strong> de muitos deva ser aprendi<strong>do</strong> através de uma longa observação. Somente os<br />

anciãos usam-nos com facili<strong>da</strong>de. O pai, freqüentemente os pronuncia na frente de seus<br />

filhos, mas estes só os compreendem mais tarde, à medi<strong>da</strong> em que vão adquirin<strong>do</strong><br />

maturi<strong>da</strong>de. Uma <strong>da</strong>s suas principais funções é olhar profun<strong>da</strong>mente em ca<strong>da</strong> situação,<br />

não deixan<strong>do</strong> enganar-se pelas aparências. Os provérbios, provavelmente, pertencem ao<br />

tipo explicativo. Em certas culturas os provérbios são apresenta<strong>do</strong>s indiretamente através<br />

de uma história, ou explicação conclusiva que pode terminar como em Waurá (Brasil): “É<br />

por isso que as coisas são assim”.<br />

5.3 Contos populares<br />

Contos populares também contêm muitas lições, mas têm a intenção de serem<br />

mais facilmente compreendi<strong>do</strong>s que provérbios e são fala<strong>do</strong>s livremente. Os principais<br />

temas são inveja, roubo, conspiração, feitiçaria e preguiça que devem ser evita<strong>do</strong>s.<br />

Quali<strong>da</strong>des que devem ser imita<strong>da</strong>s são obediência, paciência, sabe<strong>do</strong>ria, amor sacrificial<br />

e generosi<strong>da</strong>de. O caráter pode ser humano ou personifica<strong>do</strong> em um animal e ilustra<br />

virtudes ou vícios, de acor<strong>do</strong> com as ações demonstra<strong>da</strong>s na história em questão. Certos<br />

animais têm adquiri<strong>do</strong> características conheci<strong>da</strong>s, que variam, em certo grau, de uma<br />

cultura para outra. Muitas vezes, a raposa e o vea<strong>do</strong> são relaciona<strong>do</strong>s à armadilha. Onças<br />

e antas representam pessoas de autori<strong>da</strong>de, mas que são venci<strong>da</strong>s pelos mais simples.<br />

To<strong>do</strong>s eles entretêm, mas costumam ter algum ensino moral. A razão declara<strong>da</strong> para a<br />

41


história ser conta<strong>da</strong> pode não ter na<strong>da</strong> a ver com o ponto principal. Histórias conheci<strong>da</strong>s<br />

podem ser reconta<strong>da</strong>s por algum propósito especifico; a lição nem sempre é intenciona<strong>da</strong><br />

para a audiência a qual está sen<strong>do</strong> dirigi<strong>da</strong>, mas pode ser para aqueles que, por acaso,<br />

estejam ouvin<strong>do</strong>. Contos populares pertencem ao gênero narrativo.<br />

5.4 Parábolas<br />

Provérbios são ver<strong>da</strong>des codifica<strong>da</strong>s e os contos populares os ilustram. A parábola<br />

pode se situar entre esses <strong>do</strong>is tipos de textos; uma história muito curta com um ponto<br />

educativo, menos codifica<strong>da</strong> que um provérbio, menos ilustrativa que um conto popular,<br />

como pode ser visto no seguinte exemplo:<br />

(8) Um homem falou para seu vizinho: “Eu matei uma vaca. Ela me<br />

supriu com comi<strong>da</strong> por dez anos”. O outro, desejan<strong>do</strong> imitá-lo, matou sua<br />

vaca. No terceiro dia começou a apodrecer. Então ele foi para seu vizinho<br />

falar sobre isto. “Eu nunca tentei guardá-la”. É a resposta. “Eu a dividi<br />

entre meus amigos”.<br />

Como o conto popular, a parábola pertence ao gênero narrativo.<br />

5.5 Adivinhações<br />

Uma forma popular de entretenimento é <strong>da</strong>r uma descrição codifica<strong>da</strong> de um<br />

objeto, ação ou idéia, que o público, então, tenta descobrir. Se falhar, o narra<strong>do</strong>r dá a<br />

resposta. A maioria <strong>da</strong>s adivinhações representam o discurso explicativo e de instruções.<br />

5.6 Poesia<br />

5.7 Cantos<br />

A poesia tem ritmo e rima.<br />

Na maioria <strong>da</strong>s culturas, existe uma varie<strong>da</strong>de de cantos, alguns <strong>do</strong>s quais são<br />

parte de contos, outros cantos de louvor ou orações, outros, bala<strong>da</strong>s. Eles são especiais<br />

em sua combinação com a música; as palavras, muitas vezes, obedecem a regras<br />

42


especiais de poesia, as quais, em sua maioria, desafiam a análise. Num conto popular, o<br />

canto pode conter partes <strong>da</strong> mensagem principal, a qual é facilmente lembra<strong>da</strong>. Podemos<br />

incluir aqui a literatura de cordel.<br />

5.8 Insultos rituais<br />

Algumas pessoas podem concor<strong>da</strong>r em ter um relacionamento especial chama<strong>do</strong><br />

amizade <strong>do</strong>s insultos. Isto lhes dá o direito de desafiarem um ao outro e, até mesmo aos<br />

membros de suas famílias de lançarem “insultos rituais” (as regras podem ser diferentes<br />

<strong>da</strong>quelas descritas sobre as comuni<strong>da</strong>des lingüísticas de Negros Americanos por Labov<br />

1972 e Coulthard 1977). Isto é conduzi<strong>do</strong> como uma competição, onde eles tentam<br />

ultrapassar um ao outro. A maioria desses insultos pertence ao gênero explicativo e<br />

exortativo.<br />

No contexto de insultos rituais podemos mencionar nomes, que as pessoas podem<br />

receber depois de determina<strong>do</strong>s eventos em suas vi<strong>da</strong>s, que os caracterizam ou um<br />

apeli<strong>do</strong> que podem receber como uma expressão de seu caráter.<br />

5.9 Diálogos<br />

As formas literárias previamente menciona<strong>da</strong>s são encontra<strong>da</strong>s na África,<br />

principalmente na literatura oral. Há também um número crescente de literatura africana,<br />

não somente em inglês, francês e português, mas também em várias línguas africanas.<br />

Nas seguintes seções deste capítulo, serão explora<strong>da</strong>s as peculiari<strong>da</strong>des <strong>da</strong> literatura oral<br />

e então, <strong>da</strong><strong>da</strong>s algumas indicações de como a literatura escrita difere, começan<strong>do</strong> com<br />

diálogo.<br />

A apresentação oral de um texto é, de fato, um constante diálogo entre o narra<strong>do</strong>r<br />

e seu público. Ele pode apresentar-se a si mesmo e citar um <strong>da</strong>queles de quem ele<br />

aprendeu o que estará sen<strong>do</strong> apresenta<strong>do</strong>; aqueles que o ouvirem podem citá-lo mais<br />

tarde. Ele não pára aí. O público tem a oportuni<strong>da</strong>de de entrar no diálogo com ele,<br />

florean<strong>do</strong>-o, corrigin<strong>do</strong>-o e, em caso extremo, calá-lo pela sua incompetência. Os<br />

repentes no Nordeste se encaixam neste tipo de texto.<br />

43


A apresentação pode terminar em um debate entre o narra<strong>do</strong>r e o público. Eles<br />

podem elogiá-lo ou contestar sua informação e, até mesmo, silenciá-lo; ou eles podem<br />

recontar parte <strong>do</strong> texto.<br />

5.10 Linguagem corporal<br />

Grandes conta<strong>do</strong>res de história usam bastante a linguagem corporal. Gestos,<br />

caretas e inflecção na voz dão um sabor peculiar às narrativas. Se o texto exige, o<br />

conta<strong>do</strong>r de histórias pode apresentar uma <strong>da</strong>nça curta, intimi<strong>da</strong>r com um gesto de mão,<br />

ou tornar-se delica<strong>do</strong> como uma criança, ou infeliz como um órfão. Mímicas e linguagem<br />

corporal têm um papel importante na literatura oral. Isto substitui muitas descrições<br />

necessárias no texto escrito e intensifica a relação entre falante e ouvinte.<br />

5.11 Recursos lingüísticos especiais<br />

(ideofones, onomatopaicos, descrições, abstratos, ritmos, repetições)<br />

A literatura oral é grandemente enriqueci<strong>da</strong> pelo uso de ideofones e onomatopéias<br />

(sons simbólicos), que são expressões que pintam um quadro pelos seus sons. Apesar de<br />

não ser usa<strong>do</strong> exclusivamente na literatura oral, eles se ajustam mais facilmente a este<br />

tipo que à literatura escrita, particularmente, se seus sons não se encaixam com o sistema<br />

de sons <strong>da</strong> língua.<br />

Já se mencionou a importância <strong>do</strong>s cantos nos contos populares na África.<br />

Descrições e abstrações são usa<strong>da</strong>s muito raramente; são facilmente encontra<strong>da</strong>s na<br />

forma escrita. Em apresentações orais, ações simples, mas vívi<strong>da</strong>s são mais importantes,<br />

culminan<strong>do</strong> em um clímax. Ritmo faz parte <strong>da</strong> apresentação oral e repetições são usa<strong>da</strong>s<br />

para fins os mais varia<strong>do</strong>s.<br />

5.12 Liber<strong>da</strong>de <strong>do</strong> narra<strong>do</strong>r<br />

Uma história nunca é conta<strong>da</strong> <strong>do</strong> mesmo jeito duas vezes. Ca<strong>da</strong> narra<strong>do</strong>r dá o seu<br />

próprio tom, enfatizan<strong>do</strong> o que ele deseja. Quan<strong>do</strong> o público participa ativamente, a<br />

apresentação ao vivo favorece a varie<strong>da</strong>de e a a<strong>da</strong>ptação às mu<strong>da</strong>nças de situações. O<br />

44


narra<strong>do</strong>r não tem permissão para mu<strong>da</strong>r o conteú<strong>do</strong> <strong>da</strong> história. Por outro la<strong>do</strong>, estilo e<br />

detalhe são variáveis e pessoais.<br />

Criar um texto no contexto oral em que ele é conta<strong>do</strong>, o narra<strong>do</strong>r poderia, ao<br />

longo de sua interação com a audiência:<br />

− Agra<strong>da</strong>r ou desagra<strong>da</strong>r o público pelo tom de voz, usan<strong>do</strong> uma voz agradável,<br />

rouca, cadencia<strong>da</strong>, fala rápi<strong>da</strong> ou vagarosa.<br />

− Estimular seu público a interagir com ele, inician<strong>do</strong> um diálogo, cantan<strong>do</strong>,<br />

fazen<strong>do</strong> perguntas retóricas, pedin<strong>do</strong> explicações ou completan<strong>do</strong> detalhes <strong>da</strong><br />

história, inician<strong>do</strong> debates ou pedin<strong>do</strong> que façam comentários.<br />

− Comunicar usan<strong>do</strong> a linguagem corporal: baten<strong>do</strong> palmas, fazen<strong>do</strong> caretas,<br />

balançan<strong>do</strong> a cabeça ou levantan<strong>do</strong> os ombros.<br />

Compor texto interagin<strong>do</strong> com o público, faz com que o narra<strong>do</strong>r se torne quase<br />

um em criativi<strong>da</strong>de com ela. A comunicação acontece no nível <strong>da</strong>s identi<strong>da</strong>des pessoais,<br />

em seu intercâmbio entre codifica<strong>do</strong>r e decodifica<strong>do</strong>r.<br />

5.13 Textos escritos<br />

A maioria destes traços orais não pode ser reproduzi<strong>da</strong> no texto escrito. A<br />

transcrição de textos produzi<strong>do</strong>s oralmente, resulta num texto empobreci<strong>do</strong> porque o<br />

“clima” completo é totalmente perdi<strong>do</strong>. No entanto, um texto bem escrito tem sua própria<br />

beleza, que é diferente de um texto produzi<strong>do</strong> oralmente. Os meios lingüísticos se tornam<br />

mais refina<strong>do</strong>s, particularmente nas seguintes áreas:<br />

1. O esboço <strong>da</strong> estrutura se torna mais complexo porque o leitor tem mais tempo<br />

para assimilá-lo. Pode conter lembranças <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> ou projeções, mas não<br />

necessariamente sobrepor, o que parece ser uma forma muito normal de<br />

apresentar eventos oralmente, em certas culturas. A seqüência de eventos pode<br />

ser apresenta<strong>da</strong> de tal forma, que se torna necessário certa reflexão para ser<br />

bem compreendi<strong>da</strong> porque o autor não é obriga<strong>do</strong> a aban<strong>do</strong>nar seu esboço<br />

rapi<strong>da</strong>mente. Ele poderia gastar muito mais tempo na descrição <strong>do</strong>s detalhes<br />

45


ou qualquer coisa <strong>da</strong> sua imaginação: participantes, lugar, tempo,<br />

circunstância ou mesmo acessórios. Ele pode suprir muitas informações de<br />

pano de fun<strong>do</strong> em motivações, sentimentos, acompanhan<strong>do</strong> eventos e o que<br />

quer que ele deseje. Ele leva em conta que seus leitores podem interrromper a<br />

leitura em qualquer momento e voltar nela mais tarde. O esboço de sua<br />

estrutura permite isto ou ele pode tentar evitar isto, convi<strong>da</strong>n<strong>do</strong> o autor a ler o<br />

<strong>do</strong>cumento completo em uma só vez.<br />

2. O “clima” de uma seção de contar histórias ou apresentação de outros<br />

materiais de testos orais tem seu próprio charme; usualmente é uma situação<br />

grupal. Leitura, por outro la<strong>do</strong> é, quase sempre, uma ativi<strong>da</strong>de que se faz<br />

sozinho e o calor humano tem que ser cria<strong>do</strong> pelo autor, ou ele deve usar<br />

outras formas para tornar seu assunto interessante para o leitor.<br />

3. O estilo é bastante diferente nos <strong>do</strong>is meios de comunicação. A interação<br />

falante-ouvinte é reduzi<strong>da</strong> a quase na<strong>da</strong> no texto escrito. De fato, o autor<br />

desaparece completamente e a história, por si mesma, envolve o leitor. O<br />

estilo escrito é mais refina<strong>do</strong>, as sentenças são mais pensa<strong>da</strong>s para mexer com<br />

as emoções e as reações que o autor pretende provocar. O texto escrito não é<br />

passageiro como as apresentações orais (ain<strong>da</strong> que as tradições orais subsistam<br />

por muito tempo), que convi<strong>da</strong>m o autor a gastar tempo em expor seu<br />

pensamento <strong>da</strong> melhor forma possível. Normas gramaticais e ortográficas são<br />

mais respeita<strong>da</strong>s, exceto onde elas são intencionalmente ignora<strong>da</strong>s por<br />

questões de estilo. Artifícios retóricos, tais como figuras de linguagem, são<br />

freqüentemente usa<strong>do</strong>s e devaneios são permiti<strong>do</strong>s. A combinação de gêneros<br />

enriquece e subgêneros são cria<strong>do</strong>s.<br />

4. A extensão <strong>do</strong> texto escrito é muito varia<strong>da</strong>, mas é muito mais fácil escrever<br />

livros coerentemente <strong>do</strong> que apresentá-los oralmente em várias sessões. Como<br />

seu uso se estende ao longo <strong>do</strong> tempo, textos escritos podem ser li<strong>do</strong>s – ain<strong>da</strong><br />

que não compreendi<strong>do</strong>s completamente – de uma geração a outra. Isto é<br />

ver<strong>da</strong>de também para gravações de texto em áudio.<br />

46


Textos escritos servem muito bem para guar<strong>da</strong>r os pensamentos, idéias e ideais<br />

<strong>da</strong>s pessoas; preservar e transmitir opiniões, experiência e informação. No texto<br />

escrito há uma preocupação com a grafia, irrelevante para o texto oral. Ambos<br />

estão preocupa<strong>do</strong>s com uma boa gramática e com expressões vívi<strong>da</strong>s. Textos orais<br />

criam uma ocasião para o encontro humano, com seu “clima” especial e seu<br />

intercâmbio. Poderíamos dizer que um texto é resulta<strong>do</strong> <strong>do</strong> encontro humano.<br />

5.14 Limites <strong>do</strong> livro<br />

Neste livro, não serão mais menciona<strong>do</strong>s a maioria <strong>do</strong>s estilos de comunicação já<br />

referi<strong>do</strong>s neste capítulo. Ain<strong>da</strong> que a maioria deles se encaixe em um ou outro <strong>do</strong>s<br />

gêneros. Depois que forem considera<strong>do</strong>s exemplos mais comuns de línguas que já<br />

tenham si<strong>do</strong> analisa<strong>da</strong>s, as peculiari<strong>da</strong>des lingüísticas conti<strong>da</strong>s naquele tipo de texto<br />

poderão ser melhor estu<strong>da</strong><strong>da</strong>s. Estilos de comunicação especiais fornecem material<br />

bastante interessante para o lingüista. Um bom autor tende a pressionar a gramática ao<br />

máximo e introduzir mu<strong>da</strong>nças gramaticais que podem ser aceitas pela língua e tornar-se<br />

uma nova norma. O objetivo aqui é iniciar você nos procedimentos analíticos que<br />

aju<strong>da</strong>m a reconhecer as normas que agora existem.<br />

47


6. Participantes de textos<br />

Participantes<br />

Ca<strong>da</strong> narrativa consiste em eventos feitos por, para, em cima de ou em outra<br />

relação com os participantes. Estes não são força<strong>da</strong>mente idênticos aos participantes no<br />

ato <strong>da</strong> fala que são: falante (1. pessoa eu, nós), ouvinte (2. pessoa, você, vocês) e 3.<br />

pessoa (ele, ela, eles, elas). Os participantes em narrativas são os que agem nos eventos<br />

<strong>da</strong> narrativa.<br />

Nem to<strong>do</strong>s os participantes têm a mesma importância. Existe uma hierarquia.<br />

6.1 Hierarquia<br />

A hierarquia <strong>do</strong>s participantes se estabelece à base de critérios semânticos. Assim<br />

podem distinguir-se participantes primários, secundários, e talvez até terciários de um<br />

la<strong>do</strong>, e os adereços de outro.<br />

− Participantes primários estão no centro <strong>da</strong> narrativa. São eles que agem. A<br />

narrativa não existiria sem eles. Em contos muitas vezes existem os malfeitores,<br />

as vítimas e o salva<strong>do</strong>r.<br />

− Participantes secundários aju<strong>da</strong>m os primários, mas não ficam no centro <strong>da</strong>s<br />

ações. Entre eles podem existir alguns com menos importância ain<strong>da</strong>, seriam os<br />

terciários.<br />

48


− Adereços são os que não são ativos, ou objetos sem os quais o conto ou a história<br />

não existiria. Se por outro la<strong>do</strong> uma coisa se torna ativa, então será participante.<br />

A importância de um participante pode mu<strong>da</strong>r de um episódio para outro; a vítima<br />

pode tonar-se malfeitor ou salva<strong>do</strong>r, uma outra personagem pode ficar no centro <strong>da</strong>s<br />

ações, um <strong>do</strong>s participantes pode desaparecer completamente.<br />

Se, por exemplo, há conflito entre Coruja e Pomba e o conflito deve ser resolvi<strong>do</strong><br />

pelos <strong>do</strong>is atravessan<strong>do</strong> um rio, an<strong>da</strong>n<strong>do</strong> sobre um fio precário, se o fio se rompe e assim<br />

castiga o malfeitor, ele se torna participante ativo, não é adereço.<br />

A hierarquia <strong>do</strong>s participantes na narração pode estar em conflito com a estrutura<br />

<strong>da</strong>s autori<strong>da</strong>des <strong>da</strong> comuni<strong>da</strong>de. Em muitas etnias o ser maior seria um sobrenatural,<br />

depois vem o ser humano. Mas lá há diferenças. O cacique e seus conselheiros são mais<br />

importantes que os outros homens, os homens mais <strong>do</strong> que as mulheres e estas mais <strong>do</strong><br />

que as crianças e moços mais <strong>do</strong> que moças. Animais que representam os homens têm a<br />

importância atribuí<strong>da</strong> àqueles que eles representam. Fora disto animais são menos<br />

importantes que seres humanos, mas também há diferenças entre animais grandes e<br />

ferozes que são mais importantes que moscas ou mosquitos ou pulgas. Mas, ca<strong>da</strong> cultura<br />

pode atribuir importância de maneira particular a eles.<br />

Quan<strong>do</strong> há conflito entre os participantes <strong>do</strong> texto e os <strong>da</strong> comuni<strong>da</strong>de, o sistema<br />

referencial (ver 7) pode ter marca<strong>do</strong>res especiais para indicar uma tal situação. Muitas<br />

vezes participantes primários são marca<strong>do</strong>s diferentemente que secundários e<br />

especialmente diferentes de adereços. A análise de textos é um começo mais acessível <strong>do</strong><br />

que um estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> paradigma <strong>do</strong>s pronomes que também é útil (ver 10).<br />

6.2 Introdução e reintrodução<br />

Os participantes são introduzi<strong>do</strong>s, muitas vezes, no começo <strong>do</strong> texto, ou se um<br />

deles entra depois, ele é introduzi<strong>do</strong> naquele momento. As formas gramaticais incluem<br />

um substantivo ou uma locução nominal indefini<strong>da</strong>, muitas vezes usan<strong>do</strong>:<br />

− a forma indefini<strong>da</strong> <strong>do</strong> artigo (um, uma)<br />

(9) Era uma vez um garoto ...<br />

49


− nome ou título:<br />

(10) Pedro e João eram amigos.<br />

Participantes podem ser introduzi<strong>do</strong>s como indivíduos ou grupos. Mesmo num<br />

grupo um indivíduo pode agir sozinho e assim ser separa<strong>do</strong> dele; outros podem entrar e o<br />

grupo to<strong>do</strong> pode ser reestabeleci<strong>do</strong>, etc.<br />

No decorrer <strong>do</strong> texto o autor pode referir-se a ele usan<strong>do</strong> um pronome pessoal ou<br />

um demonstrativo, e mais tarde ain<strong>da</strong>, pode reintroduzi-lo. Os meios lingüísticos de<br />

reintrodução são similares aos <strong>da</strong> introdução. Contu<strong>do</strong>, na locução nominal a referência<br />

não é mais indefini<strong>da</strong>, mas defini<strong>da</strong>.<br />

(11) aquela menina valente reintrodução defini<strong>da</strong><br />

(12) um homem tão forte reintrodução defini<strong>da</strong><br />

A necessi<strong>da</strong>de de reintroduzir um participante depende <strong>do</strong> enre<strong>do</strong> <strong>do</strong> texto e pode<br />

ocorrer no começo de um segun<strong>do</strong> episódio ou parágrafo. Um segun<strong>do</strong> participante pode<br />

ser introduzi<strong>do</strong>, referin<strong>do</strong>-se a um primeiro que naquele momento precisa ser<br />

reintroduzi<strong>do</strong>. Ou a reintrodução pode ser necessária quan<strong>do</strong> mu<strong>da</strong> o agente principal.<br />

6.3 Referência<br />

A referência a participantes já introduzi<strong>do</strong>s geralmnte se faz usan<strong>do</strong>:<br />

− um pronome<br />

(13) João voltou no dia seguinte. Ele queria falar com Pedro que ain<strong>da</strong><br />

não lhe pagou.<br />

Ele e lhe referem-se a João, que a Pedro. Os <strong>do</strong>is foram introduzi<strong>do</strong>s por nome.<br />

− demonstrativo<br />

(14) João e Paulo são amigos. Aquele é o irmão de Pedro.<br />

− zero<br />

Aquele refere-se a João que foi introduzi<strong>do</strong> por nome.<br />

(15) Hoje João não vai sair. Precisa ficar em casa descansan<strong>do</strong>.<br />

50


6.4 Tabela<br />

Em português é comum o pronome não ser repeti<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> o agente não mu<strong>da</strong>.<br />

Para analisar a maneira como os participantes aparecem numa seqüência de frases,<br />

é bom fazer uma tabela separa<strong>da</strong> somente para isto. Ca<strong>da</strong> participante recebe sua própria<br />

coluna, somente os adereços podem aparecer na mesma. Se tiver muitos participantes<br />

pode-se também usar números segun<strong>do</strong> a ordem em que são introduzi<strong>do</strong>s.<br />

Na tabela indica-se por (i) o participante que toma iniciativa. Usa-se # para indicar<br />

a referência ao participante sem pronome ou outra partícula (exceto o afixo <strong>do</strong> verbo).<br />

Os adereços neste texto são a canoa e a família <strong>da</strong>s crianças que nunca entra em<br />

ação, mas é simplesmente ouvinte <strong>do</strong> que as crianças contam.<br />

Tabela 8: Tabela de Participantes<br />

Nr. abelhas (1) crianças (2) adereços<br />

1 abelhas assassinas<br />

2 Elas (i), -ram<br />

3a-b duas crianças (i), -ram<br />

4a Um enxame de abelhas elas, -ram<br />

4b com elas # (i), -ram<br />

5 As abelhas (i), -ram<br />

-nas por to<strong>da</strong>s as partes<br />

<strong>do</strong> corpo<br />

6 Elas se (i), -ram<br />

7a # -ram<br />

7b as abelhas (i), -ram suas cabeças,<br />

8a Elas (i), -ram<br />

8b-c >> >> -mos<br />

9a -mos<br />

9b nos debaixo <strong>da</strong> canoa>aquele tipo de<br />

abelhas<br />

vocês, -em<br />

51


13d com elas -am<br />

13e elas, -ão horríveis<br />

14a Elas (i), -em lhes<br />

14b-c elas, não –ão<br />

14d vocês, não -em<br />

14e se<br />

14f #, -em<br />

14g (#) vocês


(17) *O caça<strong>do</strong>r estava com pressa de voltar. Assim, o caça<strong>do</strong>r pegou<br />

a caça <strong>do</strong> caça<strong>do</strong>r e correu para casa.<br />

Seria difícil achar uma língua onde 16 fosse "normal".<br />

7.1 Tipos de referência<br />

Existem várias maneiras de como um pronome, um nome ou uma locução<br />

nominal se referem a um substantivo. Podemos falar como eles se referem, a que se<br />

referem e em que direção a referência acontece.<br />

7.1.1 Como<br />

Referência negativa dá a entender que não há representação <strong>da</strong>quela categoria. É<br />

diferente de negar o evento.<br />

(18) Ninguém veio (é diferente de: alguém não veio)<br />

(19) Não vi na<strong>da</strong> (é diferente de: não vi alguma coisa)<br />

Em algumas línguas somente o predica<strong>do</strong> pode ser nega<strong>do</strong>.<br />

Referência indefini<strong>da</strong> dá a entender que to<strong>da</strong> a categoria é vista ou que uma parte<br />

não é conheci<strong>da</strong>.<br />

(20) (To<strong>do</strong>s os) gatos têm quatro patas.<br />

(21) Uma mãe tinha três filhos.<br />

(22) Uma senhora (qualquer) quer falar com você.<br />

Referência defini<strong>da</strong> dá a entender que pessoa ou coisa sejam conheci<strong>do</strong>s <strong>do</strong> ouvinte.<br />

(23) O homem (aquele homem) voltou.<br />

(24) Esse garoto ama o seu trabalho.<br />

(25) Ele já veio.<br />

(26) João ficou contente.<br />

Há línguas em que a referência defini<strong>da</strong> é usa<strong>da</strong> para designar categoria:<br />

(27) O gato tem quatro patas.<br />

53


7.1.2 O que<br />

Referência existe dentro <strong>do</strong> discruso ou fora dele. Ela ou designa uma enti<strong>da</strong>de,<br />

ou seja, um ser que já foi menciona<strong>do</strong>, ou diretamente algo de fora, desconheci<strong>do</strong>. Assim<br />

podemos distinguir:<br />

− referência en<strong>do</strong>fórica (<strong>do</strong> grego en<strong>do</strong> 'dentro' e phora 'carrega<strong>do</strong>r') indica<br />

uma enti<strong>da</strong>de dentro <strong>do</strong> discurso. Sempre é defini<strong>da</strong>.<br />

(28) Tenho uma árvore maravilhosa. Ca<strong>da</strong> ano esta árvore (ela) está<br />

cheia de frutas.<br />

− referência exofórica (<strong>do</strong> grego exo 'fora') indica uma enti<strong>da</strong>de fora <strong>do</strong><br />

discurso. A enti<strong>da</strong>de pode ser um substantivo, uma locução nominal ou um<br />

pronome. Pode ser defini<strong>da</strong> ou indefini<strong>da</strong>.<br />

(29) Aquilo (lá) é uma banana (é visível)<br />

Aquilo é um demonstrativo defini<strong>do</strong>, uma banana é uma locução nominal. Os <strong>do</strong>is<br />

são exofóricos.<br />

− Algumas referências indefini<strong>da</strong>s e to<strong>da</strong>s as negativas são de inexistência.<br />

Referem-se a algo que não existe.<br />

(30) Ninguém veio.<br />

(31) Estou procuran<strong>do</strong> uma casa.<br />

A casa que estou procuran<strong>do</strong> talvez nem exista, mas estou pensan<strong>do</strong> que vou<br />

encontrar uma.<br />

7.1.3 Direção<br />

A referência en<strong>do</strong>fórica pode acontecer em uma de duas direções:<br />

− referência anafórica (<strong>do</strong> grego ana 'para cima') se refere a uma coisa já dita.<br />

(32) Carlos foi embora, ele estava com pressa.<br />

Carlos é antecedente de ele, os <strong>do</strong>is são correferentes, ele é a referência anafórica.<br />

− referência catafórica (<strong>do</strong> grego cata 'para baixo') se refere a uma coisa a ser dita<br />

54


(33) É isto que vamos fazer, vamos...<br />

(34) Quan<strong>do</strong> ele era menino, o príncipe William...<br />

O isto de 32 é o que vai ser explica<strong>do</strong>; o ele de 33. refere-se ao príncipe William<br />

que segue a referência.<br />

Não conhecemos nenhuma língua (ain<strong>da</strong>) que tenha uma partícula especial para<br />

indicar a referência catafórica. Parece sempre ser uma função especial <strong>da</strong>s partículas que<br />

indicam referência anafórica.<br />

7.1.4 Substitubili<strong>da</strong>de<br />

Os pronomes reflexivos não podem ser substituí<strong>do</strong>s pelo nome, neste senti<strong>do</strong> não<br />

têm antecedente. Existem outros pronomes com esta particulari<strong>da</strong>de que serão<br />

apresenta<strong>do</strong>s no capítulo 14.<br />

(35) João se machucou.<br />

(36) Ele se machucou.<br />

(37) *João (ele) machucou João.<br />

Se há uma maneira de entender 36 seria a existência de duas pessoas com o<br />

mesmo nome. Fora de tal situação 36 não é correto gramaticalmente.<br />

55


7.1.5 Resumo<br />

To<strong>do</strong>s estes tipos de referência podem ser vistos no seguinte diagrama:<br />

como<br />

negativo indefini<strong>do</strong> defini<strong>do</strong><br />

7.2 Oração nominal<br />

o que<br />

inexistência exofórico en<strong>do</strong>fórico<br />

direção<br />

anafórico catafórico<br />

substitubili<strong>da</strong>de<br />

substituíveis não-substituíveis<br />

56


A oração nominal é defini<strong>da</strong> por ser uma oração sem verbo de ação, ou com<br />

uma cópula (ser, estar), ou sem verbo, mas com outras partes <strong>da</strong> expressão verbal. Uma<br />

tal construção geralmente difere na estrutura <strong>da</strong> oração com verbo de ação, quer seja de<br />

construção ergativa ou nominativa que serão descritas no capítulo 11. Na oração nominal<br />

o sujeito é caracteriza<strong>do</strong> por um outro substantivo, por uma locução nominal ou por um<br />

adjetivo que funcionam como predicativo <strong>do</strong> sujeito. Pode ter uma cópula, que é um<br />

verbo com pouco conteú<strong>do</strong> semântico como o verbo ser.<br />

(38) João é grande<br />

(39) João é um bom pai.<br />

Em muitas línguas a cópula pode ser facultativa ou até ausente.<br />

Parakanã (Brasil):<br />

(40) akoma'e ikatoete<br />

homem bom<br />

o homem é bom<br />

7.3. Funções semânticas<br />

A oração nominal transmite uma relação em vez de uma ação ou um evento.<br />

Existem várias funções semânticas para tal construção, por exemplo:<br />

Pedro é cacique. classificação<br />

Deus é lá (existe). existência<br />

Está quente. atribuição<br />

Ela á minha filha. possessão / identificação<br />

Rute é nome de mulher. identificação<br />

Ele está com dinheiro/gripe. acompanhamento<br />

Está senta<strong>do</strong>. posição<br />

Deus é bom. avaliação<br />

57


Ele é igual ao irmão. comparação<br />

O carro está na garagem. localização<br />

Ele não tem dinheiro. possessão<br />

Etc.<br />

8. Locução nominal<br />

A locução nominal contém um substantivo (ou pronome), mais outras palavras<br />

que a definam e que não são verbos.<br />

(41) Estou ven<strong>do</strong> uma casa grande de palha<br />

Casa é um substantivo feminino, singular, indefini<strong>do</strong> por ser determina<strong>do</strong> por<br />

uma. Outra determinação é grande e de palha. Esta última é outra locução nominal. To<strong>da</strong><br />

a expressão descreve uma casa específica, usan<strong>do</strong> um nome específico. Casa é o núcleo<br />

<strong>da</strong> locução que é o objeto <strong>da</strong> construção verbal estou ven<strong>do</strong>.<br />

Locuções nominais são usa<strong>da</strong>s para introduzir informação nova ou reintroduzir<br />

informação conheci<strong>da</strong>. Esta, geralmente, refere-se a um <strong>do</strong>s participantes, ao tempo, ao<br />

lugar, às circunstâncias <strong>do</strong> acontecimento, ou à argumentação.<br />

freqüência.<br />

Existem vários tipos. Aqui vamos descrever os que se encontram com mais<br />

8.1. Locução determinativa<br />

Na locução determinativa o substantivo principal pode ser determina<strong>do</strong> por um<br />

artigo, demonstrativo, possessivo, número, adjetivo.<br />

(42) um homen forte<br />

(43) neste cachorro pequeno<br />

(44) livros tão grandes<br />

(45) <strong>do</strong>is irmãos<br />

(46) minha primeira viagem<br />

Em português há concordância de gênero e de número.<br />

58


(47) casa - casas<br />

(48) caso - casos<br />

Muitas línguas indígenas não têm adjetivos, mas em vez destes podem ter verbos<br />

descritivos. Nesta situação a construção não é uma locução, mas uma oração.<br />

Em kaingang (Brasil) pode ser um substantivo dependente.<br />

(49) ĩn mág vẽ<br />

casa grande é<br />

mág `grande`é substantivo dependente<br />

8.2 Locução associativa<br />

Dois ou mais substantivos ou locuções nominais podem compor uma locução<br />

associativa. Pode ser uma construção possessiva ou qualificativa. Podem existir outras<br />

relações também, especialmente, quan<strong>do</strong> uma parte <strong>da</strong> construção é enfatiza<strong>da</strong>.<br />

qualificativas.<br />

Freqüentemente as construções possessivas são mais marca<strong>da</strong>s que as<br />

8.2.1 Possessiva<br />

Um <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is substantivos pode ser o <strong>do</strong>no <strong>do</strong> outro, pode haver uma relação de<br />

possessão. As mesmas construções podem também ter o significa<strong>do</strong> de identificação, ou<br />

de locação no tempo, ou no espaço e outros.<br />

(50) a mãe de João – sua mãe<br />

(51) o livro de João – seu livro;<br />

Designa tanto o livro que João comprou quanto aquele que ele escreveu.<br />

(52) o arroz de João – seu arroz;<br />

vendeu.<br />

Pode ser tanto o arroz que ele comprou quanto aquele que ele plantou e/ou<br />

Outras línguas distinguem possessão alienável e inalienável. Esta última são as<br />

partes <strong>do</strong> corpo, membros <strong>da</strong> família etc.<br />

59


Em kaingang a possessão alienável é facultativa, ou seja, o objeto pode ou não<br />

ocorrer com o possui<strong>do</strong>r expresso. A possessão inalienável é obrigatória, ou seja, o<br />

objeto, a parte <strong>do</strong> corpo, o membro <strong>da</strong> família nunca ocorrem sem que o possui<strong>do</strong>r seja<br />

menciona<strong>do</strong>.<br />

Kaingang<br />

Possessão alienável<br />

(53) ĩn vẽ -- ijóg ĩn vẽ<br />

casa é –- (de) meu-pai casa é - é uma casa<br />

é a casa <strong>do</strong> meu pai<br />

(54) ẽpỹ vẽ -- ijóg japỹ vẽ<br />

roça é -- (de) meu pai roça é - é uma roça<br />

é a roça <strong>do</strong> meu pai<br />

Note as duas formas <strong>da</strong> palavra roça<br />

Possessão inalienável<br />

(55) vẽnh krĩ vẽ -- ijóg krĩ vẽ<br />

de alguém cabeça é -- meu-pai cabeça é<br />

é a cabeça <strong>do</strong> meu pai<br />

(56) inh má fi vẽ<br />

minha tia ela é<br />

é minha tia<br />

Para os membros <strong>da</strong> família existem também formas especiais que podem ser<br />

usa<strong>da</strong>s como vocativos; estes não ocorrem com possui<strong>do</strong>r.<br />

(57) Pá! Tia!<br />

60


Partes <strong>do</strong> corpo nunca ocorrem sem que o possui<strong>do</strong>r seja expresso; se não for<br />

conheci<strong>do</strong> usa-se vẽnh 'de alguém'.<br />

Os substantivos em kaingang são dividi<strong>do</strong>s na classe <strong>do</strong>s dependentes, que<br />

precisam de possui<strong>do</strong>r, e nos livres.<br />

8.2.2 Origina<strong>do</strong>r<br />

Em kaingang existe mais uma estratégia de possessão que pode ser chama<strong>da</strong> de<br />

origina<strong>do</strong>r. Ela é construí<strong>da</strong> usan<strong>do</strong> a partícula tỹ que tem muitos usos e pode ser<br />

traduzi<strong>da</strong> como "por", mas também indica – em outras construções – o sujeito <strong>da</strong> oração<br />

ergativa (veja capítulo 11)<br />

(58) kanhgág tỹ gãr vẽ<br />

Kaingang por milho é<br />

é o milho <strong>do</strong> Kaingang (que o Kaingang plantou)<br />

(59) ijóg tỹ vyj vẽ<br />

meu-pai por arco é<br />

é o arco <strong>do</strong> meu pai (que meu pai fez)<br />

Existe um pequeno grupo de substantivos que pode entrar em relação possessiva<br />

somente usan<strong>do</strong> esta estratégia.<br />

Um outro grupo de substantivos em kaingang nunca pode entrar em construção<br />

possessiva; são as partes <strong>do</strong> universo: sol, lua, estrela, pedra e, entre estes, também terra.<br />

Nunca podem pertencer a alguém, estão lá para to<strong>do</strong>s. Por outro la<strong>do</strong>, a língua mu<strong>da</strong> e<br />

hoje pode falar-se de terra de alguém.<br />

8.2.3 Outros<br />

alemão:<br />

Muitas línguas distinguem outros tipos de locução associativa. Entre estas está o<br />

61


(60) die Mutterhand 'a mão de mãe' -- inalienável<br />

enfatizan<strong>do</strong> 'mão'<br />

(61) die Hand einer Mutter 'a mão de uma mãe' inalienável<br />

enfatizan<strong>do</strong> 'uma mãe'<br />

(62) die Hand von einer Mutter 'a mão de uma mãe' como b., mais<br />

coloquial<br />

(63) Mutters Hand 'mão <strong>da</strong> mãe' possessivo, enfatizan<strong>do</strong><br />

'mão' que é de uma mãe defini<strong>da</strong><br />

(64) die Hand der Mutter 'a mão <strong>da</strong> mãe' possessivo,<br />

enfatizan<strong>do</strong> 'a mãe defini<strong>da</strong>'<br />

(65) die Hand von der Mutter 'a mão <strong>da</strong> mãe' como e., mais coloquial<br />

(66) die Hand meiner Mutter 'a mão <strong>da</strong> minha mãe'<br />

(67) die Hand von meiner Mutter como 65, mais coloquial<br />

As formas diferentes são indicativos de ênfase ou de estilo.<br />

8.3 Coordenativo<br />

Vários substantivos ou locuções nominais podem ser coordenativos, usan<strong>do</strong> a<br />

conjunção e. Se a lista for composta de mais <strong>do</strong> que <strong>do</strong>is membros, usa-se uma<br />

enumeração simples; os <strong>do</strong>is últimos membros são liga<strong>do</strong>s por e que se aplica à lista to<strong>da</strong>:<br />

(68) João e Pedro foram juntos.<br />

(69) João, Pedro, Roberto e Daniel foram.<br />

Em outras línguas usa-se o indica<strong>do</strong>r de circunstância 'com' que não é<br />

coordenativo, embora seja uma tradução correta.<br />

Kaingang<br />

(70) João mré tóg vyr, Petor ti.<br />

João com ele foi, Pedro o<br />

Pedro foi com João, ou: Pedro e João foram juntos.<br />

(71) João mré ag tóg kagáv, Petor ti, Roberto ti, Daniel ti ke<br />

gé.<br />

62


coordenativa.<br />

'João com eles S foram, Pedro o, Roberto o, Daniel o<br />

também<br />

Pedro, Roberto e Daniel foram com João.'<br />

S é o indica<strong>do</strong>r de sujeito.<br />

Esta construção não é coordenativa. Ela não existe em kaingang.<br />

Em português uma alternativa é indica<strong>da</strong> por ou que também é uma construção<br />

(72) Ou João vai, ou Pedro.<br />

(73) Um deles vai, seja João, Pedro, Daniel ou Roberto.<br />

8.4 Circunstancial<br />

Um substantivo ou uma locução nominal podem ser acompanha<strong>do</strong>s por uma<br />

preposição que precede o substantivo, como em português, ou por uma posposição que<br />

segue o substantivo, como em muitas línguas indígenas. Pode também ser uma<br />

combinação de duas partículas:<br />

(74) na casa<br />

(75) atrás <strong>do</strong> pinheiro<br />

(76) com uma faca<br />

Kaingang:<br />

(77) ĩn kãtá 'casa dentro'<br />

(78) fág pãte 'pinheiro além de'<br />

(79) kyfé tỹ 'faca por – com uma faca'<br />

Terena (arawacan) é uma <strong>da</strong>s raras línguas indígenas <strong>do</strong> Brasil com preposições:<br />

(80) ya ovoku<br />

para casa<br />

63


Existem seis preposições:<br />

ihyai 'de'<br />

vo'oku 'concernente'<br />

sanena 'com'<br />

sapa/xaka 'dentro, para'<br />

soko/xoko 'dentro, para, com'<br />

ya 'a, dentro, lá'<br />

Existe também uma posposição:<br />

-ke 'dentro de, vin<strong>do</strong> de, para'<br />

e uma partícula que pode ser ou preposição ou posposição:<br />

8.5 Aposicional<br />

yaa 'lá'<br />

Duas locuções nominais podem completar uma a outra. Existem duas<br />

possibili<strong>da</strong>des. Se a primeira locução é indefini<strong>da</strong>, a segun<strong>da</strong> pode defini-la e a relação é<br />

chama<strong>da</strong> de restritivo. Se a primeira já é defini<strong>da</strong>, a segun<strong>da</strong> lhe dá uma importância<br />

especial ou adiciona um detalhe. Veja também capítulo 19.1.5<br />

(81) Um homem <strong>da</strong> vizinhança restritivo<br />

(82) Pedro, primo de João adiciona um detalhe<br />

(83) Pai, mãe, filhos, to<strong>do</strong>s morreram adiciona detalhes<br />

Construções nominais são usa<strong>da</strong>s para <strong>da</strong>r informação sobre participantes,<br />

lugares, tempos, circunstâncias, descrições e argumentos.<br />

9. Classes de substantivos<br />

Em muitas línguas existem classes nominais que se distinguem em gênero e<br />

número; em outras, há outros critérios que determinam as subdivisões.<br />

64


9.1 Gênero<br />

Em português distinguem-se os substantivos masculinos <strong>do</strong>s femininos. Em<br />

muitos casos esta distinção se vê na vogal final e há concordância com o artigo:<br />

(84) o caso – a casa<br />

(85) o caso – a casa<br />

(86) o homem – a mulher<br />

Em alemão distinguem-se três formas:<br />

(87) masculino – feminino – neutro:<br />

der Mann – die Frau – <strong>da</strong>s Kind<br />

o homen – a mulher – a criança<br />

Nas duas línguas existe concordância entre o substantivo e o adjetivo.<br />

(88) Português:<br />

(89) Alemão:<br />

um caso complica<strong>do</strong> – uma casa bonita<br />

ein grosser Mann – eine grosse Frau – ein grosses Kind<br />

um grande homem – uma grande mulher – uma grande criança<br />

Nas línguas indígenas também existem diferenças entre os substantivos: Em<br />

kaingang esta diferença especialmente se faz sentir em relação à possibili<strong>da</strong>de <strong>da</strong><br />

possessão:<br />

Substantivos que sempre são possuí<strong>do</strong>s – os que podem ser possuí<strong>do</strong>s – os que<br />

nunca o são – os que o são com uma partícula.<br />

Substantivos que ocorrem sem possui<strong>do</strong>r, somente em construções especiais, são<br />

chama<strong>do</strong>s de dependentes. To<strong>do</strong>s os outros são independentes ou livres. Entre esses há os<br />

que podem ou não ser possuí<strong>do</strong>s, e os que nunca podem ser possuí<strong>do</strong>s.<br />

65


Existe um quarto grupo que pode ser possuí<strong>do</strong> somente com a partícula tỹ 'por'<br />

(que também é o marca<strong>do</strong>r <strong>do</strong> caso ergativo, (veja capítulo 11).<br />

Substantivos dependentes são os termos de parentesco, partes <strong>do</strong> corpo, e o que<br />

em português seriam adjetivos como "grande, pequeno" e outros.<br />

Substantivos livres que podem ser possuí<strong>do</strong>s são: ĩn 'casa', kur 'roupa' e outros.<br />

Nesta categoria acha-se um grupo que tem duas formas, uma não possuí<strong>da</strong>: ẽpỹ 'roça' e a<br />

outra possuí<strong>da</strong>: japỹ 'roça de alguém'<br />

Substantivos livres que não podem ser possuí<strong>do</strong>s são: kanhkã 'céu', krĩg 'estrela',<br />

ga 'terra', pó 'pedra' e outros (especialmente termos <strong>da</strong> natureza).<br />

Substantivos livres que podem ser possuí<strong>do</strong>s somente com a partícula tỹ 'por' são<br />

gãr 'milho' e outros.<br />

9.2 Plurali<strong>da</strong>de<br />

no plural:<br />

Em português a maior parte <strong>do</strong>s substantivos tem uma forma no singular e outra<br />

(90) caso – casos; homem -- homens<br />

(91) caso – casos; homem -- homens<br />

(92) casa – casas, mulher -- mulheres<br />

8)<br />

Existe geralmente concordância entre substantivo, artigo e adjetivo (veja capítulo<br />

Em alemão a situação é similar:<br />

singular – plural<br />

(93) Mann – Männer<br />

homem – homens<br />

(94) Frau – Frauen<br />

mulher – mulheres<br />

(95) Kind – Kinder<br />

criança – crianças<br />

66


Nas línguas indígenas também existem tais diferenças, mas são expressas de<br />

forma diferente. Em kaingang to<strong>do</strong>s os seres humanos podem ser distingui<strong>do</strong>s sen<strong>do</strong><br />

masculino – feminino e singular – plural. Isto se faz usan<strong>do</strong> os pronomes <strong>da</strong> terceira<br />

pessoa que neste caso funcionam como artigo. Este é acrescenta<strong>do</strong> seguin<strong>do</strong> o<br />

substantivo:<br />

(96) kanhgág ti kanhgág fi<br />

kaingang<br />

Kaingang ele – um homem kaingang Kaingang ela – uma mulher<br />

(97) kanhgág ag kanhgág fag<br />

kaingang<br />

Kaingang eles – homens kaingang kaingang elas – mulheres<br />

Estes artigos acrescenta<strong>do</strong>s a nomes pessoais indicam vários tipos de grupos:<br />

(98) Pedro ti – Pedro ag Pedro fag<br />

o Pedro – Pedro e seus companheiros Pedro e sua esposa<br />

(99) Maria fi – Maria fag<br />

a Maria – Maria e suas amigas<br />

A plurali<strong>da</strong>de em kaingang exprime-se também no verbo. Neste caso considera-<br />

se a plurali<strong>da</strong>de <strong>da</strong> ação.<br />

9.3 Sistemas de concordância<br />

O sistema de concordância faz de várias palavras uma uni<strong>da</strong>de estrutural e aju<strong>da</strong><br />

na identificação <strong>do</strong>s participantes. O português conhece a concordância dentro <strong>da</strong> locução<br />

nominal como também na relação entre o sujeito e o verbo. Existem outras línguas onde<br />

67


há concordância entre o objeto e o verbo, como no Swahili, Tansânia. Também existe<br />

concordância entre o sujeito de uma oração dependente com a oração principal.<br />

9.3.1 Concordância na locução<br />

O português conhece a concordância entre o substantivo que determina a forma <strong>do</strong><br />

artigo e <strong>do</strong> adjetivo. A concordância é de gênero e de número.<br />

(100) um jardim lin<strong>do</strong> – uns jardins lin<strong>do</strong>s<br />

(101) uma rosa lin<strong>da</strong> – umas rosas lin<strong>da</strong>s<br />

Existem adjetivos que são invariáveis quanto ao gênero, mas variáveis quanto ao<br />

número. São os que terminam em -e ou em consoante:<br />

(102) o homem importante – os homens importantes<br />

(103) a mulher importante – as mulheres importantes<br />

Enfim, existem adjetivos totalmente invariáveis:<br />

(104) um aparelho simples – uns aparelhos simples<br />

(105) uma casa simples -- umas casas simples<br />

Em alemão há quatro gêneros: masculino, feminino, neutro e plural, que aqui é<br />

trata<strong>do</strong> como outro gênero, porque é o mesmo para to<strong>do</strong>s os substantivos:<br />

singular: plural<br />

(106) ein kleiner Mann – masculino die kleinen Männer<br />

um pequeno homem os pequenos homens<br />

(107) eine kleine Katze – feminino die kleinen Katzen<br />

uma pequena gata/o os pequenos gatos/as<br />

(108) ein kleines Kind – neutro die kleinen Kinder<br />

68


uma pequena criança as pequenas crianças<br />

9.3.2 Concordância na oração<br />

Ao nível <strong>da</strong> oração é comum encontrar concordância entre o verbo e o sujeito.<br />

Em outras línguas também ocorre entre verbos transitivos e o objeto.<br />

Em português a flexão <strong>do</strong> verbo inclui pessoa e número, mas não gênero (ver<br />

capítulo 15). Há concordância entre a forma <strong>do</strong> verbo e a primeira (eu), segun<strong>da</strong> (você) e<br />

terceira pessoa (ele, ela) com um conjunto diferente nas formas <strong>do</strong> plural (nós, vocês,<br />

eles, elas). As formas <strong>do</strong> verbo são mais simples que <strong>do</strong>s pronomes, assim, no português<br />

atual não há diferença entre a forma verbal <strong>da</strong> segun<strong>da</strong> e <strong>da</strong> terceira pessoa ou, conforme<br />

a forma <strong>do</strong> verbo ain<strong>da</strong> menos:<br />

(109) eu vou ia<br />

tu vais ias<br />

você /ele/ ela vai ia<br />

nós vamos íamos<br />

vocês/eles/elas vão iam<br />

Existe uma forma antiga <strong>da</strong> segun<strong>da</strong> pessoa no singular que hoje caracteriza a fala<br />

de pessoas <strong>da</strong> região sul <strong>do</strong> país e de partes <strong>da</strong> região norte e nordeste que foi incluí<strong>da</strong><br />

entre parênteses.<br />

Em alemão as formas <strong>do</strong> verbo são mais varia<strong>da</strong>s. Abaixo são apresenta<strong>da</strong>s as<br />

mesmas formas em alemão. Note que, similar ao português, há certa regulari<strong>da</strong>de para<br />

mostrar a concordância entre a pessoa e a forma <strong>do</strong> verbo, independente <strong>da</strong> conjugação:<br />

(110) ich gehe ging<br />

du gehst gingst<br />

er/sie/es geht ging<br />

wir gehen gingen<br />

ihr geht gingt<br />

sie gehen gingen<br />

69


Em kaingang também existe esta concordância nos verbos intransitivos entre<br />

sujeito e verbo, nos verbos transitivos entre objeto e verbo. Isto se mostra, não na<br />

flexão, mas na plurali<strong>da</strong>de. É raro o plural ser expresso no substantivo, é mais comum ter<br />

duas formas de verbos, uma no singular e outra no plural. Existem mesmo alguns verbos<br />

com <strong>do</strong>is tipos de plural. O conceito é diferente: o importante é que a ação seja feita só<br />

uma vez ou várias vezes. A diferença entre singular e plural é expressa nos pronomes,<br />

mas as combinações com um verbo no plural são muitas.<br />

(111) inh/ã/ti/fi tĩ vẽ<br />

eu/você/ele/ela an<strong>da</strong>r (singular) é<br />

(112) ẽg/ãjag/ag/fag mũ vẽ<br />

nós/vocês/eles/elas an<strong>da</strong>r (plural) é<br />

(113) ti tỹ inh/ã/ti/fi ve vẽ<br />

ele (por) mim/você/o/a ver (singular) é<br />

(114) ti tỹ ẽg/ãjag/ag/fag vigve vẽ<br />

ele (por) nos/vocês/os/as ver (plural) é<br />

(115) ag tỹinh/ã/ti/fi ve vẽ<br />

eles (por) mim/você/o/a ver (singular) são<br />

(116) ag tỹ ẽg/ãjag/ag/fag vigve vẽ<br />

eles (por) nos/vocês/os/as ver (plural) são<br />

Mas também ocorrem:<br />

(117) ti tỹ ag ve vẽ ele os viu (singular)<br />

(118) ag tỹ ag ve vẽ eles os viram (singular)<br />

Para indicar que a ação ocorreu somente uma vez, quer dizer que ele viu o grupo<br />

como uma uni<strong>da</strong>de, como um to<strong>do</strong> em vez de ver os indivíduos.<br />

70


Tabela 9: Concordância nos verbos com sujeito e objeto em Ikpeng<br />

Pessoa Sujeito-<br />

pronome<br />

livre<br />

Objeto-<br />

pronome<br />

livre<br />

Verbo – bater<br />

sujeito<br />

-pre-<br />

fixo <br />

objetoprefixo<br />

verbo sufixo<br />

plural<br />

71<br />

objeto-<br />

pronome<br />

livre<br />

1 para 1 uro (nole) X k- oren- mïlï X X<br />

1 para 2 uro X k- w- awïlï X omro<br />

1 para 3 uro X y- # awïlï X oren/ugun<br />

1 para 2 (pl) uro X k- w- awïlï -ngmo X<br />

1 para 3 (pl) uro X y- # awïlï -ngmo wam/ugyam<br />

2 para 2<br />

(refl.)<br />

omro (nole) X m- oren- mïlï X X<br />

2 para 1 omro X ugw- eren- mïlï X X<br />

2 para 3 omro X m- eren- mïlï X oren/ugun<br />

2 para 1+3<br />

(excl.)<br />

omro tximna m- # awïlï X X<br />

2 para 3 (pl.) omro X m- # awïlï -ngmo X<br />

3 para 3 tïmo (nole) X # oren- mïlï X ugun<br />

3 para 1 oren/ugun X g- # awïlï X X<br />

3 para 2 oren/ugun X w- # awïlï X X<br />

3 para 1+2 oren/ugun X ugw- # awïlï X X<br />

3 para<br />

1+2+3<br />

oren/ugun X ugw- # awïlï -ngmo X<br />

3 para 1+3 oren/ugun tximna # # awïlï X X<br />

1+3 para tximna tximna # oren- mïtkelï X X<br />

1+3 (nole)<br />

1+3 para 2 tximna X w- # awïlï X X<br />

1+3 para 2<br />

(pl.)<br />

tximna X w- # awïlï -ngmo X<br />

1+3 para 3 tximna X # # awïlï X oren/ugun<br />

1+3 para 3<br />

(pl.)<br />

tximna X # # awïlï -ngmo wam/ugyam<br />

1+2 para<br />

1+2<br />

ugwo (nole) X kur- oren- mïtkelï X X<br />

1+2 para 3 ugwo X kur- # awïlï X oren/ugun<br />

1+2 para 3<br />

(pl.)<br />

ugwo X kur- # awïlï -ngmo wam/ugyam<br />

1+2+3 para ugwongmo X kur- oren- mïtkelï -ngmo X<br />

1+2+3 (nole)<br />

1+2+3 para<br />

3<br />

ugwongmo X kur- # awïlï X oren/ugun<br />

1+2+3 para<br />

3 (pl.)<br />

ugwongmo X kur- # awïlï -ngmo wam/ugyam


2 (pl.) para 2 omrongmo X m- oren- mïtkelï -ngmo X<br />

(pl.) (nole)<br />

2 (pl.) para<br />

1+3<br />

omrongmo tximna m- # awïlï -ngmo X<br />

2 (pl.) para 3 omrongmo X m- # awïlï -ngmo oren/ugun<br />

2 (pl.) para 3<br />

(pl.)<br />

omrongmo X m- # awïlï -ngmo wam/ugyam<br />

10. Pronomes<br />

Os pronomes podem ser defini<strong>do</strong>s como partículas que representam os<br />

participantes de um texto. 'Livro' designa um objeto, 'ele' é correferente com qualquer<br />

antecedente <strong>do</strong> gênero masculino ou talvez não-feminino. Isto implica que os pronomes<br />

adquirem seus conteú<strong>do</strong>s somente através de um contexto lingüístico. A referência ao<br />

mun<strong>do</strong> real é feita por substantivos.<br />

Na maior parte <strong>do</strong>s casos o pronome pode ser substituí<strong>do</strong> à vontade pelo<br />

substantivo que ele representa. Formas dêiticas como demonstrativos ou artigos podem<br />

referir-se diretamente a objetos de fora, mas geralmente acompanha<strong>do</strong>s por gestos <strong>do</strong><br />

falante que aponta o objeto: isto aqui, isso aí, aquilo lá.<br />

Os pronomes <strong>da</strong> terceira pessoa geralmente referem-se a participantes (ou<br />

argumentos) já conheci<strong>do</strong>s. Contu<strong>do</strong>, podem também ser usa<strong>do</strong>s exoforicamente. Muitas<br />

vezes são usa<strong>do</strong>s para diminuir a atenção sobre o participante em questão (ver capítulo<br />

28.4).<br />

As distinções entre demonstrativos, locativos, interrogativos, relativos,<br />

indefini<strong>do</strong>s, negativos aqui são to<strong>do</strong>s incluí<strong>do</strong>s como subdivisões <strong>do</strong>s pronomes. Alguns<br />

têm funções especiais como o uso exofórico diferente <strong>do</strong> en<strong>do</strong>fórico, ou o uso como<br />

honoríficos.<br />

Os sistemas de pronomes variam muito de uma língua para outra. Podem ser<br />

estu<strong>da</strong><strong>do</strong>s, usan<strong>do</strong> parâmetros de pessoa, número e gênero com funções diferentes nas<br />

locuções ou orações (ver capítulo 11). Os pronomes de sujeito podem ser amalgama<strong>do</strong>s<br />

72


com os marca<strong>do</strong>res de aspecto ou mo<strong>do</strong> que são categorias verbais. Existem formas para<br />

diferentes níveis de ênfase.<br />

Um outro aspecto <strong>do</strong> estu<strong>do</strong> consiste em verificar se o pronome substitui ou<br />

modifica o substantivo ou se podem ocorrer os <strong>do</strong>is. Em português os pronomes pessoais<br />

substituem os substantivos, os artigos modificam os substantivos e os demonstrativos<br />

podem fazer os <strong>do</strong>is.<br />

Os reflexivos são diferentes de to<strong>do</strong>s. São correfentes com os substantivos. Os<br />

pronomes logofóricos representam o falante numa citação. Os reflexivos representam o<br />

sujeito (veja capítulo 14).<br />

10.1 Distinções de pessoa<br />

Existem distinções entre (Exemplos de Ikpeng/Brasil):<br />

(119) K-aran-txi eu vou<br />

primeira pessoa ou falante<br />

(120) M-aran-txi tu vais/você vai<br />

segun<strong>da</strong> pessoa ou ouvinte<br />

(121) #-Ero-t ele/ela vai<br />

terceira pessoa ou de quem se fala, não presente no ato de falar<br />

Note a diferença entre as formas verbais que distinguem a primeira pessoa <strong>da</strong>s<br />

outras. A primeira e a segun<strong>da</strong> pessoa sempre são exofóricas, a terceira normalmente é<br />

en<strong>do</strong>fórica, mas pode ser exofórica em certas línguas, especialmente se são usa<strong>da</strong>s para<br />

exprimir respeito.<br />

A única língua que não conhece a diferença entre singuar e plural aparentemente é<br />

o Mura Pirahã (Amazonas/Brasil). Ela somente distinge primeira, segun<strong>da</strong> e terceira<br />

pessoa.<br />

O balanta fala<strong>do</strong> na Guiné Bissau (África) somente distingue entre primeira e<br />

outra pessoa no singular e qualquer pessoa no plural, quer dizer que ela distingue, nos<br />

prefixos verbais, três pessoas:<br />

73


N- (nasal homorgânica) sujeito primeira pessoa singular<br />

ha- sujeito segun<strong>da</strong> ou terceira pessoa singular<br />

be- sujeito plural<br />

As categorias de base podem também ser combina<strong>da</strong>s. Muitas línguas conhecem<br />

as categorias 1+2 que são falante + ouvinte(s), muitas vezes chama<strong>da</strong>s de primeira<br />

pessoa inclusiva, diferente <strong>da</strong> primeira pessoa exclusiva que seria o falante e seu grupo<br />

com exclusão <strong>do</strong>(s) ouvinte(s).<br />

Quan<strong>do</strong> duas categorias são combina<strong>da</strong>s, o grupo mínimo consiste em duas<br />

pessoas que seria un tipo de singular ou mínimo.<br />

Existem outras combinações de categorias. Um grande grupo de línguas fala<strong>da</strong>s<br />

nos Camarões (África) tem formas especiais para 1+3 que seria um grupo forma<strong>do</strong> pelo<br />

falante junto com uma pessoa não presente, ou 2+3 que seria um ouvinte junto com um<br />

ausente, ou 3+3 que seriam <strong>do</strong>is grupos ausentes. Naquela região existe também uma<br />

categoria de 1+2+3 que explicitamente inclui to<strong>da</strong>s as pessoas presentes ou não (veja o<br />

diagrama abaixo). Em português há duas formas para a segun<strong>da</strong> pessoa tu e<br />

você. As duas se usam paralelamente em algumas regiões <strong>do</strong> Brasil. A forma tu<br />

corresponde a uma forma especial <strong>do</strong> verbo e a forma você usa a mesma forma verbal que<br />

a 3 a pessoa. Então reservemos 2 para representar tu e 2/3 para representar você/ele/ela.<br />

No plural a situação é diferente. O antigo plural que era vós caiu em desuso no país, por<br />

isso não está sen<strong>do</strong> menciona<strong>do</strong> nesse livro.<br />

10.2 Distinções de número<br />

Outra distinção que se combina com a <strong>da</strong> pessoa é a de número, que geralmente é<br />

a diferença entre singular e plural. Em português o paradigma inclui:<br />

Tabela 10:<br />

1 2 3m 3f<br />

singular eu tu/você ele ela<br />

plural nós vocês eles elas<br />

74


Tabela 11: Ikpeng/Brasil<br />

1 2 3<br />

singular uro omro ugun<br />

plural tximna/ omrongmo wam/ugyam<br />

ugro/ugrongmo<br />

Mas existem sistemas com muito mais distinções. As categorias de falante,<br />

ouvinte, ausente podem ser reuni<strong>da</strong>s de muitas maneiras.<br />

O sistema mais complexo encontra<strong>do</strong> se fala nas línguas bamileque <strong>do</strong>s<br />

Camarões, especialmente na língua ghomala' cujos pronomes são os seguintes:<br />

Tabela 12: Ghomala′ pronomes de sujeito<br />

Pessoa Mínimo 1PL 2PL 3PL<br />

1 g py<br />

Singular 2 O po<br />

3 E wap<br />

1+2 Pu p<br />

Dual<br />

1+3 Py pyayú pyapu<br />

2+3 poé poayú poapu<br />

3+3 pué wap<br />

Tríplice 1+2+3 papu payú † payú † wkpampu<br />

† forma rara, mas freqüente são papu ou wkpampu<br />

75


Tabela 13: Ikpeng Pronomes/sujeito e objeto<br />

Pessoa singular dual plural<br />

1 uro<br />

2 omro ngmo<br />

3 oren/ugun wam/ugyam<br />

1+2 ugwo<br />

1+3 tximna tximna<br />

1+2+3 ugwongmo<br />

Ikpeng tem distinções de gênero nas referências de parentesco. Estas são sempre<br />

associa<strong>da</strong>s com o sexo <strong>do</strong> referente. Por exemplo, se esteja referin<strong>do</strong> <strong>do</strong> filho ou filho<br />

dela, você (homen ou mulher) fala "imren" (filho/filha dela). Mas se esteja referin<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

filho dele, você, (mesmo homen ou mulher) fala "imun" (filho dele). Se esteja referin<strong>do</strong><br />

<strong>da</strong> filha dele você fala "emtxin" (filha dele). Funciona para 1, 2, 3 pessoas com uma fala<br />

de referência para os homens e outra para as mulheres. Tem para outros ligações de<br />

parentes também.<br />

Tabela (14) de referências de parentesco (Ikpeng/Brasil): (minha, de você, dela)<br />

mulher é ego homen é ego<br />

filho imren imun<br />

filha imren emtxin<br />

mari<strong>do</strong> emreyum X<br />

esposa X emuye<br />

irmão/ tio (irmão <strong>da</strong> mãe) ebin X<br />

irmão mais novo X imano<br />

irmão mais velho X iru<br />

irmã mais nova ebit X<br />

irmã mais velha ibarï X<br />

irmã X inarut<br />

tio (irmão <strong>do</strong> pai) imï imï<br />

tia (irmã <strong>do</strong> pai) inut inut<br />

tia (irmã <strong>da</strong> mãe) ye ye<br />

pai imï imï<br />

mãe ye ye<br />

avô iramru iramru<br />

76


Guiné:<br />

avó inut inut<br />

genro iwarum iwarum<br />

nora ibae ibae<br />

primo ebin X<br />

primo mais novo X imano<br />

primo mais velho X iru<br />

prima mais nova ebit X<br />

prima mais velha ibarï X<br />

prima X inarut<br />

sogra awtpïn awtpïn<br />

sogro awtpïn awtpïn<br />

A língua com mais distinções de número é o susurunga que se fala na Papua Nova<br />

Tabela 15: Distinções de número em Susurunga<br />

Pessoa Sim-<br />

ples<br />

Dual Tri-<br />

plo<br />

Quádru-<br />

Plo<br />

1 x x x x x<br />

1+2 x x x x x<br />

2 x x x x x<br />

3 x x x x x<br />

Pl (=muitos)<br />

Distinções de gênero em línguas européias muitas vezes se encontram somente na<br />

3a. pessoa <strong>do</strong> singular e são três: masculino (m), feminino (f), neutro (n).<br />

Tabela 16:<br />

Inglês: 1 2 3m 3f 3n<br />

Singular I you he she it<br />

Plural we you they they they<br />

77


É possível que a distinção entre falante – ouvinte – ausente, no ato de falar, refira-<br />

se mais facilmente às formas no singular. Quan<strong>do</strong> os pronomes se referem a mais <strong>do</strong> que<br />

uma pessoa é possível ser necessário o reconhecimento de grupos:<br />

1+1 seria o falante e o grupo com quem ele se associa (presente ou não)<br />

2+2 seria o ouvinte e o grupo com quem o falante o associa (presente ou não)<br />

3+3 seriam os ausentes não associa<strong>do</strong>s, nem com o falante, nem com o ouvinte<br />

10.3 Distinções de gênero<br />

As distinções de gênero são muito comuns, especialmente <strong>do</strong> gênero natural,<br />

masculino e feminino. Algumas línguas como o karajá (Ilha <strong>do</strong> Bananal) tem to<strong>da</strong> uma<br />

maneira de falar para os homens e outra para as mulheres.<br />

Normalmente a distinção é restrita à terceira pessoa. Em árabe há formas<br />

diferentes na segun<strong>da</strong> e na terceira pessoa:<br />

10.4 Honoríficos<br />

Tabela 17: Árabe – Sujeito pronome<br />

Pessoa Masculino Feminino<br />

1 ana ana<br />

2 anta anti<br />

3 huwa hiya<br />

Em português (e outras línguas) existem pronomes especiais para indicar<br />

reverência a certas pessoas em posições especiais. Distinguem-se vários níveis de<br />

respeito:<br />

português<br />

(122) você vai? familiar<br />

(123) você vai? familiar<br />

(124) o senhor vai? respeito (masculino)<br />

(125) a senhora vai? respeito (feminino)<br />

78


(126) sua excelência vai? muito respeito (masculino ou<br />

feminino)<br />

(127) a gente vai. familiar<br />

(128) a gente vai. familiar<br />

(129) nós vamos familiar<br />

O alemão usa a forma <strong>da</strong> terceira pessoa <strong>do</strong> plural para indicar respeito; a forma<br />

familiar é a <strong>da</strong> segun<strong>da</strong> pessoa <strong>do</strong> singular:<br />

(130) Gehst du mit? – Você vai? familiar<br />

vai você com?<br />

(131) Gehen Sie mit? - O senhor/a senhora/sua excelência vai? respeito<br />

10.5 Exclusão<br />

vai o senhor com?<br />

Algumas línguas usam os pronomes de maneira inespera<strong>da</strong>. No kaingang existem<br />

as seguintes diferenças entre as formas:<br />

Tabela 18: Pronomes <strong>do</strong> Kaingang:<br />

Pessoa Singular Plural<br />

1 inh ẽg<br />

2 ã ãjag<br />

3m ti ag<br />

3f fi fag<br />

O sistema não contém formas específicas de inclusão ou exclusão. Mas no uso <strong>da</strong>s<br />

partículas a exclusão é muito importante. To<strong>da</strong>s as formas são usa<strong>da</strong>s somente para a<br />

pessoa referi<strong>da</strong>. Assim "vocês" (ãjag) quer dizer: "vocês (aqui presentes) sem mim ou<br />

outros". "Eles" (ag) quer dizer "somente os homens", "elas" (fag) "somente as mulheres".<br />

O único pronome que inclui to<strong>do</strong>s os ouvintes é "nós" ẽg). Assim, se numa exortação se<br />

diz: "vocês (ãjag) não podem fazer na<strong>da</strong> de erra<strong>do</strong>," quer dizer que "vocês não podem,<br />

mas eu, o falante, posso, sou excluí<strong>do</strong>". Mas, dizen<strong>do</strong>-se: "nós (ẽg) não podemos fazer<br />

79


na<strong>da</strong> de erra<strong>do</strong>" to<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> está incluí<strong>do</strong>. E se o falante declara: "Deus me (inh) ama",<br />

quer dizer que ele ama o falante, mas não o(s) ouvinte(s).<br />

Para incluir a dimensão <strong>da</strong> exclusão pode-se refazer a tabela assim:<br />

Tabelas 19: Pronomes <strong>do</strong> Kaingang:<br />

Forma Inclusa Exclusa<br />

inh 1 2, 3m, 3f<br />

ã 2 1, 3m, 3f<br />

ti 3m 1, 2, 3f<br />

fi 3f 1,2,3m<br />

ẽg 1+2+3m+3f #<br />

ãjag 2+2 1,3m,3f<br />

ag 3m+3m 1,2,3f<br />

fag 3f+3f 1,2,3m<br />

Precisa-se somente mais uma explicação: os pronomes <strong>da</strong> terceira pessoa <strong>do</strong><br />

singular e <strong>do</strong> plural, quan<strong>do</strong> determinam um substantivo têm a função de artigo. Neste<br />

caso ag indica os amigos de um homem, fag indica as amigas de uma mulher ou a família<br />

de um homem.<br />

O senti<strong>do</strong> exclusivo intrínseco de to<strong>do</strong>s os pronomes exceto <strong>da</strong> primeira pessoa <strong>do</strong><br />

plural foi descrito em línguas fala<strong>da</strong>s no México, Guatemala, Peru, e Papua Nova Guine.<br />

É talvez esta particulari<strong>da</strong>de que deu ocasião para desenvolver formas<br />

especiais para os pronomes <strong>da</strong> primeira pessoa exclusiva de um la<strong>do</strong> e inclusiva de outro<br />

que se encontram no mun<strong>do</strong> inteiro.<br />

Para um estu<strong>do</strong> completo <strong>do</strong> sistema pronominal de uma língua é<br />

importante pesquisar não somente as categorias inclusas num pronome particular, mas<br />

também as formas exclusas.<br />

80


11. Distinções de caso<br />

Tabela 20: Pronomes <strong>do</strong> Parakanã (Pará)<br />

Forma Inclusa exclusa<br />

ixe 1 -2-3<br />

ene 2 -1-3<br />

a'e 3±3 -1-2<br />

ore 1+3 -2<br />

pehe 2+2/3 -1<br />

xane 1+2+3 -#<br />

Tabela 21: Pronomes <strong>do</strong> Ikpeng/Brasil<br />

Forma Inclusa exclusa<br />

uro 1 -2-3<br />

omro 2 -1-3<br />

oren/ugun 3 -1-2<br />

ugro 1+2 -3<br />

omrongmo 2+2 -1-3<br />

wam/ugyam 3+3 -1-2<br />

tximna 1+3 -2<br />

ugrongmo 1+2+3 #<br />

Sujeito, objeto, circunstância são termos <strong>da</strong> oração. Os pronomes e os nomes que<br />

manifestam tais termos podem ter formas diferentes que os indicam. Fazem conjuntos de<br />

formas que são chama<strong>do</strong>s de casos.<br />

Outras formas <strong>do</strong>s substantivos mostram possessivo – um caso que funciona a<br />

nível <strong>da</strong> locução e pode ser sujeito, objeto ou circunstância.<br />

81


11.1 Casos na oração<br />

Em muitas línguas os pronomes de sujeito e de objeto têm formas diferentes. Nas<br />

circunstâncias os pronomes ou os substantivos são acompanha<strong>do</strong>s por uma preposição<br />

que, naturalmente, os precedem como em português: com o homem; ou são segui<strong>do</strong>s por<br />

uma posposição, como em kaingang: ti mré "ele com".<br />

Os casos de sujeito (aquele que faz a ação) e de objeto (aquele que recebe a ação)<br />

podem ser liga<strong>do</strong>s ao pronome ou ao substantivo. Em português existem os:<br />

Tabela 22<br />

Pronomes/ pronomes/ pronomes/ circunstância<br />

sujeito objeto<br />

1sg eu me a mim comigo<br />

1pl nós nos a nós conosco<br />

2sg tu te a ti contigo<br />

2sg você o, a a você com você<br />

2pl vocês os,as a vocês com vocês<br />

3sg-m ele o a ele com ele<br />

3pl-m eles os a eles com eles<br />

3sg-f ela a a ela com ela<br />

3pl-f elas as a elas com elas<br />

Tabela 23: Pronomes livres em Ikpeng/Brasil<br />

Pessoa Sujeito/Objeto Para Com um Com um<br />

objeto/inanima<strong>do</strong> anima<strong>do</strong><br />

1a sg. uro ïna ïmapo ïwak<br />

2a sg. omro ongna amapo awak<br />

3a sg. oren (prox.)<br />

/ugun (dist.)<br />

engna imapo iwak<br />

1+2 (dual) ugro ugro na wïmapo ukpak<br />

1+2+3<br />

(Inclusivo)<br />

ugrongmo ugrongmo na wïmapongne ukpakongne<br />

1+3<br />

(Exclusivo)<br />

tximna tximna na tximna mapo tximna wak<br />

2a pl. omrongmo ongnangne amapongne awakongne<br />

3a pl. wam (dist.)<br />

ugyam (prox.)<br />

engnangne imapongne iwakongne<br />

82


Em kaingang no sujeito os pronomes podem ser segui<strong>do</strong>s por uma partícula que<br />

indica sujeito: tóg 'S normal' vỹ 'S enfático' jé "que S faça a ação'<br />

Tabela 24<br />

tóg vỹ jé<br />

1sg sóg inh vỹ ijé<br />

1pl ẽg tóg ẽg vỹ ẽg jé<br />

2sg ã tóg ã vỹ ã jé<br />

2pl ãjag tóg ãjag vỹ ãjag jé<br />

3m-sg tóg ti vỹ ti jé<br />

3m-pl ag tóg ag vỹ ag jé<br />

3f-sg fi tóg fi vỹ fi jé<br />

3f-pl fag tóg fag vỹ fag jé<br />

Note que algumas formas são amalgama<strong>da</strong>s, outras não. A língua kaingang<br />

conhece dez partículas que funcionam como sujeito e se distinguem uma <strong>da</strong> outra. Veja a<br />

lista:<br />

jé 'sujeito antecipa a ação, ação deseja<strong>da</strong> pelo<br />

falante'<br />

mi 'sujeito na pergunta que pede resposta 'sim' ou<br />

'não'<br />

ne 'sujeito é origina<strong>do</strong>r <strong>da</strong> ação'<br />

né 'agente tem sentimento' (somente na terceira<br />

pessoa)<br />

nÿ 'sujeito é tópico e contrasta<strong>do</strong> com vÿ, mu<strong>da</strong>nça de<br />

sujeito'<br />

pijé 'sujeito não faz a ação'<br />

tóg 'sujeito é agente'<br />

ti 'agente é ergativo; indica<strong>do</strong>r de tópico'<br />

vê 'este sujeito faz coisas ruins'<br />

vi 'sujeito é tópico'<br />

Às vezes é dificil explicar exatamente a diferença de senti<strong>do</strong> entre ca<strong>da</strong> partícula.<br />

Segue um texto em kaingang que usa to<strong>da</strong>s elas, escrito por autores kaingang. Mesmo<br />

para o falante nativo pode ser difícil explicar a diferença, mas não, de fazer exemplos <strong>do</strong><br />

seu uso. Os sujeitos ficam em negrito.<br />

83


(132)<br />

Ũ vãfor kãme<br />

Alguém perdi<strong>do</strong> conto – um conto sobre alguém que se perdeu<br />

1. Ũ tóg nĩ ja nĩgtĩ.<br />

alguém S existe passa<strong>do</strong> era.<br />

Existia alguém.<br />

2a. Hã ra kejẽn ti kósin tóg kaga jagy han mũ,<br />

mas um-dia seu filho S <strong>do</strong>ente muito fez mũ,<br />

Um dia seu filho ficou muito <strong>do</strong>ente,<br />

2b kỹ tóg nẽn kã ra tĩ mũ, vẽnh kagta kanẽ jé.<br />

então S mato dentro vai mũ, remédio procurar para.<br />

3a Rãké ra tóg tĩ mũ,<br />

de tarde S ir mũ<br />

então foi ao mato buscar remédio.<br />

Foi de tarde,<br />

3b ti t tá tĩ ra tóg vãhã kuty' he mũ.<br />

ele por lá ir quan<strong>do</strong> S enfim noite foi.<br />

4a Kÿ tóg vỹn ke sór mũ,<br />

Então S voltar quer mũ,<br />

enquanto ele aí an<strong>da</strong>va ficou noite.<br />

Então pensou em voltar,<br />

4b hã ra tóg ti kãtĩg ja ve mãn tũ nĩ sir.<br />

mas S seu caminho de i<strong>da</strong> ver de novo não é então.<br />

mas não achou mais seu caminho de volta.<br />

5 Kỹ tóg vẽnh hã mỹ: "inh pijé vãfor ja nĩ vẽ'!<br />

Daí S para si: "eu nunca perdi<strong>do</strong> passa<strong>do</strong> foi!<br />

Então ele pensou: "eu nunca me perdi!<br />

6 Kỹ ijé n tag ki nũr ha!<br />

Então eu-futuro iniciativa aqui <strong>do</strong>rmir agora!<br />

Então vou decidir de <strong>do</strong>rmir aqui.<br />

7 Top hã ne inh ki rĩr nĩ," he mũ.<br />

Deus mesmo inicitiva me em cui<strong>da</strong>r está," disse.<br />

8 Vãhã tóg nũr mũ sir.<br />

Enfim S <strong>do</strong>rmir mũ então.<br />

Deus cui<strong>da</strong>rá de mim", disse.<br />

A final ele <strong>do</strong>rmiu.<br />

Sebastião Krãprág Paulista<br />

84


9a Tỹ vaj kỹ tóg ti kãtĩg ja kanẽ mãn mũ,<br />

9b hã ra tóg vég mũ.<br />

10 Kỹ tóg tĩ mũ sir, ti ĩn ra.<br />

O dia seguinte ele o procurou de novo o caminho<br />

e esta vez o achou.<br />

Então voltou para casa.<br />

11a Ti jun kỹ ti prũ fi tóg fi kósin nũr nỹ ra ti rĩn kỹ ti mỹ:<br />

disse:<br />

11b "ã panh v jun huri," he mũ.<br />

Quan<strong>do</strong> ele chegou, a sua esposa despertou o menino e<br />

"seu pai já voltou (o que nós já não esperávamos mais)."<br />

12 Hã ra tóg fi mỹ: "hã ran né vãnh kãtá nũr' he mũ," he mũ.<br />

mato!"<br />

Mas, este respondeu (acusan<strong>do</strong>): "mas, ele <strong>do</strong>rmiu no<br />

13 Kỹ ti panh tóg ti mỹ: "jũ tũg nĩ, inh hã ne vãfor, vãnh kã tá," he mũ.<br />

Então o pai disse: "não se zangue, eu pela primeira vez<br />

me perdi no mato."<br />

14 Kỹ ti kósin tóg ti mỹ: "kỹ ã m vẽnh kagta ũ vé'?" he mũ.<br />

Então o filho respondeu: "e você achou o remédio?"<br />

15 Kỹ ti panh tóg ti mỹ: "hỹ, ve inh #, ha kron, ã t há' he jé," he mũ.<br />

O pai respondeu: sim, achei, toma para sarar."<br />

16 Ti kósin t kron kar kỹ tóg há' he mũ sir.<br />

17 Hã vẽ.<br />

Depois que o filho o tomou, ele sarou.<br />

É isso.<br />

Note que a partícula tóg é a mais freqüente, e as outras são usa<strong>da</strong>s para exprimir o<br />

drama <strong>da</strong> situação: o pai que para o seu espanto se perde no mato e faz seu plano de<br />

<strong>do</strong>rmir lá, confian<strong>do</strong> em Deus (não somente pela proteção no mato, mas mais ain<strong>da</strong> pela<br />

reação <strong>da</strong> família) e volta no dia seguinte. A mãe que tenta ficar neutra, desperta o<br />

menino perguntan<strong>do</strong>-se: o que vai acontecer (certamente houve discussão antes; o filho já<br />

acusan<strong>do</strong> o pai or não voltar de propósito, talvez, de deixá-los de uma vez). O pai,<br />

saben<strong>do</strong> que tipo de coisas se fala numa situação dessas, explica que se perdeu e <strong>do</strong>rmiu<br />

no mato mesmo. O filho aceitan<strong>do</strong> a explicação, pede o remédio. Note que naquele<br />

85


momento (15) para o pai não se usa nenhum indica<strong>do</strong>r de sujeito. Ele pede ao filho para<br />

tomar o remédio. O narra<strong>do</strong>r volta ao tóg para narrar o fim feliz.<br />

11.2 Ergativo<br />

Em muitas línguas o sujeito <strong>do</strong> verbo transitivo é marca<strong>do</strong> de maneira idêntica ao<br />

sujeito <strong>do</strong> verbo intransitivo. Na mesma língua podem existir <strong>do</strong>is sistemas para marcar o<br />

sujeito: um, em que o sujeito transitivo e o intransitvo são marca<strong>do</strong>s iguais e um outro em<br />

que estes são marca<strong>do</strong>s diferentemente. O sujeito intransitivo pode ser marca<strong>do</strong> igual ao<br />

objeto, ou pode o objeto ter uma maneira diferente de ser marca<strong>do</strong>. Este segun<strong>do</strong> sistema<br />

encontra-se em várias línguas indígenas no Brasil, especialmente <strong>da</strong>s famílias Jê, Proto-Jê<br />

e Pano. Os <strong>do</strong>is sistemas de marcar o sujeito geralmente existem la<strong>do</strong> a la<strong>do</strong>. Até agora<br />

não se encontrou nenhuma língua que, em to<strong>do</strong>s os casos, trate o sujeito transitivo<br />

diferentemente <strong>do</strong> sujeito intransitivo.<br />

Fala-se de sistemas acusativos e ergativos.<br />

Sistema acusativo:<br />

Sujeito (agente) de qualquer verbo = caso nominativo (NOM)<br />

Objeto direto (paciente) <strong>do</strong>s verbos transitivos = caso acusativo (ACC)<br />

Sistema ergativo:<br />

Sujeito (agente) de verbos transitivos = caso ergativo (ERG)<br />

Sujeito (agente) de verbos intransitivos = caso absolutivo (ABS)<br />

Objeto (paciente) igual ao S intransitivo = caso absolutivo (ABS)<br />

Objeto (paciente) diferente de qualquer sujeito = caso acusativo (ACC)<br />

Existem (ao menos) <strong>do</strong>is sistemas de ergativi<strong>da</strong>de. Um sistema encontra-se nas<br />

línguas Jê e Proto-Jê e outro, nas línguas Pano e Karibe.<br />

O sistema Jê tem <strong>do</strong>is tipos de orações coexistentes: um <strong>do</strong> sistema nominativo e<br />

outro <strong>do</strong> sistema ergativo. To<strong>do</strong>s os verbos e to<strong>da</strong>s as pessoas de sujeito podem ocorrer<br />

em estruturas nominativas. Nestes o sujeito é marca<strong>do</strong> com qualquer indica<strong>do</strong>r de sujeito<br />

e pode ocorrer no início <strong>da</strong> frase ou depois de uma ou duas circunstâncias, mas<br />

normalmente preceden<strong>do</strong> o verbo. O objeto ocorre diretamente preceden<strong>do</strong> o verbo e não<br />

pode ser desliga<strong>do</strong> dele por nenhuma circunstância. Nas construções ergativas<br />

intransitivas o agente (que seria o sujeito) ocorre diretamente preceden<strong>do</strong> o verbo, o lugar<br />

86


ocupa<strong>do</strong> pelo objeto nas orações transitivas. Ele não é indica<strong>do</strong> por nenhum indica<strong>do</strong>r<br />

especial. O agente transitivo<br />

Kaingang (Jê) (as abreviações são: N – nominativo, A absolutivo, E ergativo)<br />

(133) nominativo intransitivo: João v tĩ mũ . 'João N ir mũ – João vai'<br />

(134) ergativo intransitivo: João # tĩ vẽ. 'João A ir é – João vai'<br />

(135) nominativo transitivo: João v fi venh tĩ mũ. 'João N ela ver ir mũ – João vai vê-la.'<br />

(136) ergativo transitivo: João t fi venh tĩ vẽ. 'João E ela ver ir é – João vai vê-la.'<br />

As construções nominativas são usa<strong>da</strong>s em textos narrativos, as ergativas são<br />

usa<strong>da</strong>s em explicações ou exposições. To<strong>do</strong>s os imperativos são nominativos.<br />

Nas línguas Pano o sistema é diferente. Em yaminawa existe essencialmente um<br />

tipo de orações, mas são intransitivos ou transitivos. A ergativi<strong>da</strong>de é usa<strong>da</strong> somente nas<br />

orações transitivas, visto que nesta é importante distinguir o objeto <strong>do</strong> sujeito. O sujeito<br />

<strong>da</strong> oração transitiva na primeira ou segun<strong>da</strong> pessoa é idêntico ao sujeito <strong>da</strong> oração<br />

intransitiva. O sujeito <strong>da</strong> terceira pessoa recebe um marca<strong>do</strong>r especial que é interpreta<strong>do</strong><br />

como ergativo.<br />

11.3 Possessão<br />

Uma <strong>da</strong>s locuções nominais pode indicar possessão. Em português o possessor<br />

pode ser indica<strong>do</strong> pela preposição de ou por um pronome possessivo. Também pode ser<br />

nominaliza<strong>do</strong> para substituir to<strong>da</strong> uma locução nominal <strong>do</strong> tipo:<br />

O livro de/<strong>do</strong> Pedro – o livro dele – seu livro – o seu<br />

O livro de/<strong>da</strong> Maria – o livro dela – seu livro – o seu<br />

a caixa de/<strong>do</strong> Pedro – a caixa dele – sua caixa – a sua<br />

a caixa de/<strong>da</strong> Maria – a caixa dela – sua caixa – a sua<br />

87


Tabela 25:<br />

De O msg O mpl O fsg O fpl<br />

subst.<br />

m.sg<br />

subs.m.pl subs.f.s subs.f.pl.<br />

1sg de mim meu meus minha minhas o meu os meus a minha as minhas<br />

1pl de nós nosso nossos nossa nossas o nosso os nossos a nossa as nossas<br />

2sg de ti teu teus tua tuas o teu os teus a tua as tuas<br />

2sg de você seu seus sua suas o seu os seus a sua as suas<br />

2pl de vocês seu seus sua suas o seu os seus a sua as suas<br />

3msg dele seu seus sua suas o seu os seus a sua as sua<br />

3mpl deles seu seus sua suas o seu os seus a sua as suas<br />

3fsg dela seu seus sua suas o seu os seus a sua as suas<br />

3fpl delas seu seus sua suas o seu os seus a sua as suas<br />

A forma <strong>do</strong> pronome de possessão (meu, teu, seu) em português concor<strong>da</strong> em<br />

gênero e número com o elemento possuí<strong>do</strong> enquanto (dele) concor<strong>da</strong> com o possui<strong>do</strong>r.<br />

Note que nas formas o meu/o teu/o seu/o nosso e suas variações (to<strong>da</strong> a locução<br />

possessiva) foi substituí<strong>da</strong> por um pronome substantiva<strong>do</strong> cujo artigo concor<strong>da</strong> com.<br />

Em kaingang o substantivo que indica o possui<strong>do</strong>r precede aquele que indica a<br />

possessão. Há concordância com o possui<strong>do</strong>r:<br />

(137) kanhgág kósin – ti kósin – ti kósin fi – fi kósin – fi kósin fi<br />

<strong>do</strong> índio filho – dele filho – dele filha – dela filho – dela filha<br />

Nem em to<strong>da</strong> língua o objeto é possuí<strong>do</strong> por um pronome, mas às vezes tem um<br />

nome muito geral, como em kaingang:<br />

(138) Vẽnhkág japỹ -- ti japỹ -- ti tũ<br />

De Vẽnhkág a roça – dele a roça – dele a coisa<br />

Em Ikpeng tem duas classes de nomes: os possuí<strong>do</strong>s e os não-possuí<strong>do</strong>s. Tem<br />

nomes que pode ser possui<strong>do</strong> pela pessoa indica<strong>da</strong> com marca<strong>do</strong>r de pessoa no prefixo e<br />

com marca<strong>do</strong>r de posse no afixo <strong>do</strong> nome. A maioria são partes <strong>do</strong> corpo, termos de<br />

parentesco, objetos pessoais.<br />

88


Tabela 26: Ikpeng/Brasil marca<strong>do</strong>res de pessoa nos nomes possuí<strong>do</strong>s<br />

Pessoa<br />

Marca<strong>do</strong>res de pessoa<br />

Antes de consoantes Antes de vogais<br />

1 ï- g-<br />

2 o-/a- o-/w-<br />

3 i-/e- y-/#<br />

1+2/1+2+3 wï- ugw-<br />

1+3 (exclusivo)* tximna tximna<br />

antes <strong>do</strong> radical.<br />

*Esta forma realmente não é prefixa<strong>do</strong> no nome mas funciona igual. Tem que sempre ocorrer<br />

Tabela 27: Exemplos <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is paradigmas<br />

Radicais C-Iniciais Radicais V-Iniciais<br />

ï-mta-n 'minha língua' g-eng-ru 'meus olhos'<br />

a-mta-n 'sua língua' o-eng-ru 'seus olhos'<br />

i-mta-n 'língua dele/dela' #-eng-ru 'olhos dele/dela'<br />

wï-mta-n 'nossa língua' ugw-eng-ru 'nossos olhos'<br />

tximna mïra-n 'nossa língua' tximna eng-ru 'nossos olhos'<br />

Sufixo de posse Exemplos<br />

-n ï-boy-n<br />

g-emri-n<br />

-ru ï-ram-ru<br />

g-eng-ru<br />

-rï ï-b-rï<br />

g-arok-rï<br />

-txi ï-mpa-txi<br />

Tabela 28: Formas <strong>do</strong> sufixo de posse em Ikpeng<br />

g-erem-txi<br />

-# ï-nut-#<br />

g-egï-#<br />

'minha camisa'<br />

'meu banco'<br />

'meu avô'<br />

'meus olhos<br />

'minha flecha'<br />

'meu cocar'<br />

'meu braço'<br />

'meu pescoso'<br />

'minha avó'<br />

'meu animal de estimação<br />

A língua Ikpeng tem como possuir nomes usan<strong>do</strong> uma outra esquema. Neste caso<br />

o nome não está marca<strong>do</strong> mais está segui<strong>do</strong> por 'keni' ('de) com a marca<strong>do</strong>r de pessoa no<br />

prefixo.<br />

89


(139) Ïrïnkeni mun ï-keni. 'Aquele avião é meu.<br />

avião aquele 1-GEN<br />

(140) e-keni mun togo. 'A faca é dele.<br />

3-GEN aquela faca<br />

A segun<strong>da</strong> classe de nomes é aquela que tem nomes que não pode ser possuí<strong>do</strong>s.<br />

Aqueles que pertencem desse grupo são elementos <strong>da</strong> natureza e os que referem de<br />

lugares e nomes próprios como:<br />

(141) yay 'árvore'<br />

(142) ga 'água'<br />

(143) txitxi 'sol'<br />

(144) nuno 'lua'<br />

(145) amtenu 'vento'<br />

(146) wonkin 'espírito'<br />

(147) ïwï 'pedra'<br />

(148) tïrin 'estrela'<br />

(149) kongpo 'chuva'<br />

(150) Maktampo 'nome próprio de um homen'<br />

12. Pronomes de Sujeito<br />

Além <strong>do</strong>s pronomes de sujeito trata<strong>do</strong>s no capítulo 11 vamos explorar aqui as<br />

formas que são liga<strong>da</strong>s ao verbo e se combinam com as categorias de mo<strong>do</strong> e de aspecto.<br />

A forma <strong>do</strong>s verbos na categoria de mo<strong>do</strong> exprimem a atitude <strong>do</strong> falante (ou <strong>do</strong><br />

agente) em relação aos fatos reais: se são reais (indicativo) irreais (subjuntivo,<br />

condicionais) ou de necessi<strong>da</strong>de (imperativos). Estes se combinam com os aspectos<br />

90


imperfectivos, perfectivos e neutros. Para a análise <strong>da</strong>s formas completas veja o<br />

capítulo 18; aqui o interessante está na maneira de indicar o sujeito.<br />

12.1. Mo<strong>do</strong> real<br />

Em português as formas reais são:<br />

indicativo presente cant-o vend-o part-o<br />

pretérito perfeito cant-e-i vend-i part-i<br />

pretérito imperfeito cant-a-va vend-i-a part-i-a<br />

infinitivo pessoal cant-a-r vend-e-r part-i-r<br />

pretérito mais que perfeito cant-a-ra vend-e-ra part-i-ra<br />

futuro <strong>do</strong> presente cant-a-r-ei vend-e-r-ei part-i-r-ei<br />

Ca<strong>da</strong> uma destas formas é parte de um paradigma que se distingue pela pessoa <strong>do</strong><br />

sujeito. Citamos estes paradigmas, usan<strong>do</strong> o verbo cantar:<br />

Tabela 29:<br />

Sujeito presente <strong>do</strong> pretérito pretérito<br />

indicativo imperfeito perfeito<br />

eu cant-o cant-a-va-# cant-ei<br />

tu cant-a-s cant-a-va-s cant-a-ste<br />

você/ele/ela cant-a-# cant-a-va-# cant-ou<br />

nós cant-a-mos cant-á-va-mos cant-a-mos<br />

vocês/eles/elas cant-a-m cant-a-va-m cant-a-ram<br />

Sujeito Infinitivo pret. mais<br />

Pessoal que perfeito<br />

eu cant-a-r-# cant-a-ra-#<br />

tu cant-a-r-es cant-a-ra-s<br />

você/ele/ela cant-a-r-# cant-a-ra-#<br />

nós cant-a-r-mos cant-á-ra-mos<br />

vocês/eles/elas cant-a-r-em cant-a-ra-m<br />

Note que o, pretérito imperfeito, mais que perfeito e o infinitivo pessoal <strong>do</strong> verbo<br />

tem quatro formas; o presente <strong>do</strong> indicativo e o pretérito perfeito têm cinco formas.<br />

91


Examinan<strong>do</strong> as formas que indicam o sujeito <strong>do</strong> verbo cantar, nota-se que as pessoas têm<br />

formas varia<strong>da</strong>s nos paradigmas. Vamos resumir:<br />

Tabela 30:<br />

1 sing. -o -# -ei -# -#<br />

2/3 sing -# -# -ou -# -#<br />

2sg (tu) -s -s -ste -es -s<br />

1 pl. -mos -mos -mos -mos -mos<br />

2/3 pl. -m -m -ram -em -m<br />

diferenças.<br />

Examinan<strong>do</strong> os verbos vender e partir notam-se similari<strong>da</strong>des, mas também<br />

12.2 Mo<strong>do</strong> irreal<br />

As formas irreais são:<br />

Tabela 31:<br />

sujeito presente <strong>do</strong><br />

futuro <strong>do</strong> pretérito pretérito <strong>do</strong><br />

subjuntivo<br />

subjuntivo<br />

2sg (tu) cant-e-s cant-a-ria-s cant-a-sse-s<br />

1/2/3 sg. cant-e-# cant-a-ria-# cant-a-sse-#<br />

1. pl. cant-e-mos cant-a-ría-mos cant-á-sse-mos<br />

2/3 pl. cant-e-m cant-a-ria-m cant-a-sse-m<br />

Note que to<strong>do</strong>s os tempos têm quatro formas e não há diferença nos três paradigmas.<br />

Tabela 32:<br />

2sg (tu) -s -s -s<br />

1/2/3 sing; -# -# -#<br />

1 pl.; -mos -mos -mos<br />

2/3 pl.; -m -m -m<br />

As marcas <strong>do</strong>s sujeitos são quatro: -s para a 2sg/tu, # (ausência de marca) para<br />

1/2/3sg, -mos indican<strong>do</strong> 1. pl. e –m indican<strong>do</strong> 2/3 plural.<br />

92


12.3 Mo<strong>do</strong> necessi<strong>da</strong>de<br />

Na categoria <strong>da</strong> necessi<strong>da</strong>de existem apenas duas formas: o imperativo e o futuro<br />

<strong>do</strong> subjuntivo. Os sujeitos são os mesmos que no mo<strong>do</strong> irreal.<br />

Tabela 33:<br />

sujeito imperativo futuro <strong>do</strong> presente futuro <strong>do</strong> subjuntivo<br />

1 sg # cant-a-r-ei cant-a-r-#<br />

2/3sg # cant-a-r-á cant-a-r -#<br />

2sg (tu) cant-a-# cant-a-r-ás cant-a-r-es<br />

1 pl. # cant-a-r-emos cant-a-r-mos<br />

2/3pl. # cant-a-r-ão cant-a-r-em<br />

subjuntivo.<br />

Para as demais pessoas <strong>do</strong> imperativo usam-se as formas <strong>do</strong> presente <strong>do</strong><br />

Tabela 34:<br />

1 sing. -ei -#<br />

2/3 sing -á -#<br />

2sg (tu) -# -ás -es<br />

1 pl. -emos -mos<br />

2/3 pl. -ão -em<br />

As marcas <strong>do</strong>s sujeitos <strong>do</strong> futuro <strong>do</strong> presente e <strong>do</strong> futuro <strong>do</strong> subjuntivo são cinco,<br />

sen<strong>do</strong> que as <strong>do</strong> futuro <strong>do</strong> presente são totalmente diferentes <strong>do</strong>s demais paradigmas e as<br />

<strong>do</strong> futuro <strong>do</strong> subjuntivo são idênticas às <strong>do</strong> infinitivo pessoal.<br />

93


Pess<br />

Tabela Geral <strong>do</strong>s marca<strong>do</strong>res de pessoa (Nr. 35):<br />

Real Irreal Necessi<strong>da</strong>de<br />

Pres Pr<br />

Im<br />

Pret<br />

Perf<br />

Inf<br />

Pess<br />

Pret<br />

+ q<br />

Perf<br />

Pres<br />

Subj<br />

Fut<br />

Pret<br />

Pret<br />

Subj<br />

Imperat Fut<br />

Pres<br />

Fut<br />

Subj<br />

1sg -o -# -ei -# -# -# -# -# -ei -#<br />

2/3sg -# -# -ou -# -# -# -# -# -á -#<br />

2sg/tu -s -s -ste -es -s -s -s -s -# -ás -es<br />

1pl - - - - - -mos - -mos -mos - -mos<br />

mos mos mos mos mos mos<br />

emos<br />

2/3pl -m -m -ram -em -m -m -m -m -aõ -em<br />

Resumo: Os sujeitos marca<strong>do</strong>s nos verbos, na maior parte <strong>do</strong>s casos, conhecem<br />

uma única forma para os <strong>do</strong> singular – exceto os <strong>do</strong> presente <strong>do</strong> indicativo, <strong>do</strong> pretérito<br />

perfeito e o futuro <strong>do</strong> presente. Nestes três paradigmas a primeira pessoa <strong>do</strong> singualar<br />

mu<strong>da</strong> a vogal temática em –o ou –ei. Em to<strong>do</strong>s os outros casos é zero -# com exceção <strong>da</strong><br />

2sg (tu).<br />

A primeira pessoa <strong>do</strong> plural sempre é marca<strong>da</strong> pelo sufixo –mos.<br />

A segun<strong>da</strong> e a terceira pessoa <strong>do</strong> plural são marca<strong>da</strong>s por –m, significan<strong>do</strong> a<br />

nazalização <strong>da</strong> vogal final. Os outros afixos identifica<strong>do</strong>s nas formas verbais indicam<br />

mo<strong>do</strong> e tempo (veja capítulo 18).<br />

Para as línguas indígenas esta combinação de mo<strong>do</strong> e aspecto junto com o sujeito<br />

não parece significativo, mas veja o caso <strong>da</strong> construção ergativa em yaminawa (capítulo<br />

11) que é liga<strong>da</strong> à terceira pessoa <strong>do</strong> sujeito em orações transitivas.<br />

13. Demonstrativos<br />

Os demonstrativos são usa<strong>do</strong>s somente na terceira pessoa. Podem ter formas<br />

diferentes de gênero e número como os pronomes, mas diferem deles, pois os<br />

94


demonstrativos modificam, enquanto os pronomes determinam. São defini<strong>do</strong>s,<br />

indefini<strong>do</strong>s, negativos, locativos, temporais e interrogativos. To<strong>da</strong>s essas categorias estão<br />

sen<strong>do</strong> trata<strong>da</strong>s como demonstrativos.<br />

13.1 Defini<strong>do</strong>s<br />

Em português existem quatro tipos:<br />

Tabela 36:<br />

artigo perto <strong>do</strong> falante perto <strong>do</strong> ouvinte longe <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is<br />

o este esse aquele<br />

os estes esses aqueles<br />

a esta essa aquela<br />

as estas essas aquelas<br />

o (neutro) isto isso aquilo<br />

Outras "palavrinhas" com esta distinção:<br />

lugar aqui aí lá<br />

substantivo fulano ciclano beltrano<br />

são usa<strong>da</strong>s acompanhan<strong>do</strong> os substantivos ou substituin<strong>do</strong>-os.<br />

(151) Vi um livro, comprei-o e dei-o para esse meu primo (já<br />

menciona<strong>do</strong>).<br />

usa-se aquele.<br />

Note que o uso deste demonstrativo também corresponde ao participante.<br />

Na introdução <strong>do</strong> novo participante usa-se este/esse, quan<strong>do</strong> já foi menciona<strong>do</strong><br />

Esta diferença também existe em kaingang. Como demonstrativos, substituin<strong>do</strong><br />

os substantivos ou então seguin<strong>do</strong>-os para modificá-los, funcionam os pronomes <strong>da</strong><br />

terceira pessoa <strong>do</strong> singular e <strong>do</strong> plural: ti 'ele', fi 'ela', ag 'eles', fag 'elas'. Também existem<br />

tag 'isto' e ẽn 'aquilo'.<br />

95


Tabela 37:<br />

tag 'isto aqui'<br />

ti 'o, isso lá, esse lá' ag 'os, esses lá'<br />

fi 'a, essa lá' fag 'as, essas lá, o casal lá'<br />

ẽn 'aquilo lá'<br />

Existem também as combinações:<br />

Tabela 38:<br />

tag ti 'isto aqui, este aqui' tag ag 'estes aqui'<br />

tag fi 'esta aqui' tag fag 'estas aqui, este casal aqui'<br />

ẽn ti 'aquilo lá, aquele lá' ẽn ag 'aquilos lá'<br />

ẽn fi 'aquela lá' ẽn fag 'aquelas lá, aquele casal lá'<br />

Em combinação com indica<strong>do</strong>res de circunstância pode também usar:<br />

tã 'lá longe'<br />

tag ki -- ẽn ki -- tã ki 'aqui perto -- lá longe -- acolá bem longe'<br />

(152) Tag ti vỹ inh mré nĩ nĩ, tag ki, jãvo ẽn ti tĩg sór mũ, tã ra.<br />

isto o S eu com é é, mas aquele o ir quer mũ, lá longe para<br />

'Este fica comigo, aqui, mas aquele outro está queren<strong>do</strong> ir para<br />

bem longe.'<br />

13.2 Indefini<strong>do</strong>s<br />

Em português os indefini<strong>do</strong>s são muitos e incluem: um, algum, alguém, to<strong>do</strong>,<br />

to<strong>do</strong>s, outros, eles, a gente e outros. Uns são variáveis, outros não:<br />

Tabela 39:<br />

Variáveis: não variáveis:<br />

um – uma – uns – umas tu<strong>do</strong><br />

algum – alguma – alguns, – algumas alguém<br />

No kaingang encontra-se um pequeno número:<br />

96


ũ 'alguém' kanhgág ũ 'um outro Kaingang' kanhgág ũ ag 'outros Kaingang'<br />

ne 'algo'<br />

e 'muitos'<br />

13.3 Negativos<br />

Os negativos podem ser conta<strong>do</strong>s entre os indefini<strong>do</strong>s. Em português existem:<br />

ninguém, nenhum, na<strong>da</strong><br />

Em kaingang existe somente um negativo: tũm 'na<strong>da</strong>'. Normalmente usa-se a<br />

negação tũ para qualquer situação negativa:<br />

ũ tóg kãtĩ tũ nĩ – alguém não veio, para exiprimir que nimguém veio.<br />

13.4 Advérbios<br />

Existem indica<strong>do</strong>res de lugar e de tempo que podem ser agrupa<strong>do</strong>s entre os<br />

demonstrativos, por exemplo:<br />

locativos – dentro, por fora, em cima, debaixo<br />

tempos – ontem, hoje, amanhã, agora, depois<br />

Em kaingang estas relações são demonstra<strong>da</strong>s por expressões de circunstância;<br />

mas existem algumas palavras<br />

vaj kỹ 'amanhecer quan<strong>do</strong>' – ce<strong>do</strong> de manhã (circunstância)<br />

ũri 'hoje'<br />

kãnhmar 'logo'<br />

kuri 'rapi<strong>da</strong>mente'<br />

huri 'já'<br />

e outras que podem ser classifica<strong>da</strong>s nesta categoria.<br />

97


13.5 Interrogativos<br />

Os pronomes interrogativos e advérbios emprega<strong>do</strong>s interrogativamente podem<br />

ser agrupa<strong>do</strong>s aqui:<br />

Quem? Que? Qual? Quanto? Onde? Por quê? Quan<strong>do</strong>?<br />

Estes também existem em qualquer língua. O kaingang conhece:<br />

ũ 'quem?' (homófono com ũ 'alguém', ou talvez seja o mesmo<br />

demonstrativo)<br />

ne 'o que?'<br />

hẽ 'o qual?'<br />

Estes podem entrar em combinação um com o outro, por exemplo<br />

ũ tỹ hẽ nẽ?<br />

um ergativo qual é --- é quem?<br />

13.6 Relativos<br />

Em muitas, mas não em to<strong>da</strong>s as línguas, conhecem-se pronomes (ou<br />

demonstrativos) relativos que introduzem uma oração relativa (ver capítulo 19). Em<br />

português existem as formas:<br />

cujo a senhora cujo gato desapareceu<br />

onde o lugar onde o gato se escondeu<br />

o qual no dia seguinte o homem, o qual eu vi no ônibus, morreu.<br />

quanto tu<strong>do</strong> quanto eu vi, foi isso.<br />

que a porta que ficou aberta<br />

quem a pessoa por quem fui introduzi<strong>do</strong><br />

Em kaingang não existe uma estrutura correspondente. O mais similar seria uma<br />

nominalização:<br />

ũ tỹ ã ĩn ra tĩ mũ ẽn 'aquele que foi na sua casa'<br />

alguém por tua casa para ir mũ aquele<br />

98


To<strong>da</strong> esta expressão é uma nominalização que termina em ẽn 'aquele' que<br />

funciona como artigo e mostra que to<strong>da</strong> esta estrutura é um tipo de pessoa.<br />

14. Não-substituíveis<br />

Existem – provavelmente em to<strong>da</strong>s as línguas – certos pronomes que não podem<br />

ser substituí<strong>do</strong>s por substantivos, ou seja, estes têm funções que um substantivo não pode<br />

ter. Em português existem os reflexivos e recíprocos, em outras línguas também os<br />

logofóricos que se encontram especialmente em línguas <strong>da</strong> Africa. Os seqüenciais<br />

existem em línguas Jê e também foram descritos em línguas fala<strong>da</strong>s na Papua Nova<br />

Guiné, onde o sistema é um tanto diferente. Foram incluí<strong>do</strong>s aqui porque é possível que<br />

existam estruturas similares em línguas <strong>da</strong> América Latina.<br />

14.1 Reflexivo e recíproco<br />

Quan<strong>do</strong> há correferência entre o sujeito de um la<strong>do</strong> e o possui<strong>do</strong>r, o objeto ou<br />

circunstância <strong>do</strong> outro, usam-se pronomes reflexivos ou recíprocos nestas funções. Não<br />

há diferença entre singular e plural. As formas são: se, si, consigo que servem para 2 a e 3 a<br />

pessoas; te para a 2 a sg/tu ; me, nos para a primeira pessoa -- forma idêntica ao objeto e<br />

não especificamente reflexivo. O recíproco se faz usan<strong>do</strong> os mesmos pronomes no plural.<br />

Para reforçar o senti<strong>do</strong> reflexivo ou recíproco podem-se acrescentar outras palavras como<br />

mesmo 'reflexivo' ou uns aos outros 'recíproco'.<br />

(153) ele se disse reflexivo<br />

eles se encontraram (uns aos outros) recíproco<br />

ele teve raiva de si (mesmo) reflexivo<br />

ele estava falan<strong>do</strong> consigo reflexivo<br />

É impossível dizer: “*João disse a João”<br />

Numa tal expressão se pensaria em duas pessoas com o mesmo nome.<br />

99


Em kaingang existem <strong>do</strong>is pronomes que funcionam como objeto ou possessivo,<br />

mas não como sujeito ou ergativo:<br />

jagnẽ pronome de objeto e possessivo: recíproco 'um ao outro'<br />

vẽnh pronome de objeto: reflexivo 'de si mesmo' (é<br />

(154) jagnẽ vóg ẽg/ãjag /ag /fag tóg<br />

'um ao outro lutaram nós/vocês/eles/elas S<br />

'nós/vocês/eles/elas brigaram entre nós/si'<br />

(155) vẽnh fẽg sóg mũ, pã'i mỹ<br />

reflx. <strong>da</strong>r eu-S mũ, chefe a<br />

'eu me <strong>do</strong>u ao chefe, eu me entrego ao chefe'<br />

(156) vẽnh fẽg tóg mũ, pa'i mỹ<br />

reflx. <strong>da</strong>r ele-S mũ, chefe a<br />

'ele se dá ao chefe, ele se entrega ao chefe'<br />

homófono com o<br />

pronome<br />

possessivo com o<br />

senti<strong>do</strong> 'de<br />

alguém')<br />

No dialeto paraná existem duas formas <strong>do</strong> reflexivo que funcionam como<br />

possessivo e, no caso, como sujeito ergativo e absolutivo. A referência reflexiva recai<br />

sobre o sujeito <strong>da</strong> oração principal <strong>da</strong> frase. São independentes <strong>da</strong> pessoa. As formas são:<br />

(157) Kaingang:<br />

ã 'dele/dela mesmo' (homófono com 'de você')<br />

ãjag 'deles/delas mesmo' (homófono com de vocês)<br />

Pedro tóg ã kósin fi mỹ vẽnh kagta nĩm.<br />

Pedro S sua (própria) filha ela para remédio deu.<br />

Então Pedro deu remédio para sua (própria) filha.<br />

Kỹ tòg fi mrè ã ĩn ra vyr.<br />

Daí ele ela com sua (própria) casa para foi.<br />

Daí ele foi com ela para sua (própria) casa.<br />

Kỹ fag tóg fi mré ãjag ĩn ra kagáv.<br />

Daí elas S ela com deles casa para foram.<br />

100


Daí elas foram com ela para sua (delas) casa.<br />

Fag tỹ ãjag ĩn ra mũ vẽ.<br />

elas por delas casa para ir é<br />

elas estão in<strong>do</strong> para a própria casa.<br />

Os reflexivos em kaingang, como em português, são correferentes com o sujeito<br />

(ou com o ergativo).<br />

14.2 Logofórico<br />

Partículas logofóricas usam-se na citação indireta, e se encontra muitas vezes na<br />

África. Quan<strong>do</strong> o sujeito na citação é correferencial com o falante, esta relação é marca<strong>da</strong><br />

com uma partícula logofórica. Em caso contrário usa-se o pronome normal:<br />

(158) Tupuri (Camarões)<br />

a. Pl i ri Ja k gá s i l′<br />

Paulo i disse para João k que LOG i caiú<br />

Paulo falou para João que ele (Paulo) caiu.<br />

b. Pl i ri Ja k gá a k,l l′<br />

Paulo i disse para João k que ele k,l caiu<br />

Paulo falou para João que ele (João ou alguém outro) caiu.<br />

Para exprimir esta relação em kaingang, usam-se as mesmas partículas reflexivas<br />

descritas acima:<br />

ã 'de si'<br />

ãjag 'deles, delas mesmo'<br />

(159) Kỹ tóg fi mỹ ã tĩg ke tó mũ sir.<br />

então ele-S ela para sua i<strong>da</strong> futuro diz mũ então<br />

'Então lhe contou que ia partir em breve.'<br />

Em geral em kaingang cita-se em estilo direto (veja capítulo 26), mas o estilo<br />

indireto é possível e neste caso o uso logofórico <strong>do</strong>s pronomes reflexivos é atesta<strong>do</strong>.<br />

101


14.3 Seqüencial<br />

Os não-substituíveis também se usam na combinação de orações na frase. Em<br />

kaingang, se na oração subordina<strong>da</strong> o sujeito é correferente com o <strong>da</strong> oração principal,<br />

usa-se o reflexivo.<br />

(160) Ãjag t ãjag jóg tén kar kỹ ag ne vãnh kãmĩ mũn kỹ tá<br />

mũg tĩ sir.<br />

se por seu pai matar depois quan<strong>do</strong> eles S mato dentro an<strong>da</strong>m<br />

quan<strong>do</strong> lá an<strong>da</strong>m tĩ <strong>da</strong>í.<br />

Depois de matar seu pai eles foram dentro <strong>do</strong> mato e ficaram muito<br />

tempo lá.<br />

ag ne é o sujeito <strong>da</strong> oração principal; ajag tỹ refere-se aos mesmos filhos <strong>do</strong> velho<br />

que an<strong>da</strong>ram por muito tempo no mato choran<strong>do</strong> o pai (que man<strong>da</strong>ra eles lhe colocarem<br />

uma cor<strong>da</strong> no pescoço e arrastá-lo em cima <strong>da</strong> terra prepara<strong>da</strong> para plantar - conto <strong>da</strong><br />

origem <strong>da</strong>s plantas úteis, feijão e milho).<br />

No kobom (Papua Nova Guiné) esta correferência entre sujeitos de várias frases<br />

funciona de maneira diferente.<br />

(161) Kobom (Papua Nova-Guiné)<br />

a. kabö mijanu lau-ö in-a<br />

pedra que esquentar-SnãoI-3SG quente-3SG<br />

Ele esquentou as pedras, e elas estavam quentes.<br />

b. yad kaj pak-em ram ud ar-nab-in<br />

1sg Porco matou-SI-1sg casa levar it-FUT-1sg<br />

Vou matar um porco e levá-lo para casa.<br />

102


O sufixo –ö indica que o sujeito <strong>do</strong> verbo seguinte é correferencial com o<br />

primeiro. O sufixo –em indica que o sujeito <strong>do</strong> primeiro verbo é o mesmo que aquele <strong>do</strong><br />

segun<strong>do</strong>.<br />

103


15 A voz <strong>do</strong> verbo<br />

Eventos<br />

O verbo é o centro <strong>da</strong> comunicação e contém como uni<strong>da</strong>des de informação:<br />

A voz que governa a relação entre o evento e os participantes principais, os<br />

argumentos.<br />

O aspecto que transmite informação sobre a transmissão <strong>do</strong> desenvolvimento <strong>do</strong><br />

evento.<br />

O mo<strong>do</strong> que transmite informação sobre a atitude <strong>do</strong> falante em relação à<br />

mensagem.<br />

O tempo que transmite informação sobre o momento em que a ação de<br />

desenvolve e sua relação com outros eventos.<br />

O tipo que governa a relação entre o evento e o tema central <strong>do</strong> texto.<br />

Tais informações pertencem a só um verbo ou a vários verbos dentro <strong>da</strong><br />

construção, <strong>do</strong>s quais um pode ser o verbo principal. Pode ser inerente ao verbo ou pode<br />

ser uma partícula gramatical (ou gramaticaliza<strong>da</strong>).<br />

É bom conhecer to<strong>da</strong>s as formas de um verbo antes de tentar estu<strong>da</strong>r o sistema.<br />

Nossa convicção é que ca<strong>da</strong> forma (dentro <strong>do</strong> sistema) tem uma função diferente <strong>da</strong>s<br />

outras, um senti<strong>do</strong> especial, para não identificar funções que, aparentemente, são<br />

104


homófonas com outras funções (o que seria um caso de sobrepor um sistema alheio à<br />

língua).<br />

15.1 Os papéis semânticos (que determinam a voz)<br />

agente (AG) – inicia a ação<br />

paciente (P) – agüenta a ação<br />

recipiente (R) (beneficiário, campo) recebe o resulta<strong>do</strong> <strong>da</strong> ação (muitas vezes é<br />

circunstância)<br />

circunstância (C) qualquer indicação adicional<br />

15.2 Determinar a voz<br />

− voz ativa: o agente (AG) é o sujeito (S); o paciente (PA) é o objeto (O), o<br />

recipiente (RE) é uma circunstância (C)<br />

− voz passiva: o paciente (PA) é o sujeito (S), o agente (AG) é o instrumento (C) e<br />

o recipiente (RE) uma circunstância (C)<br />

− [voz reflexiva: o agente (AG) e o recipiente (RE) são a mesma pessoa, ou o<br />

paciente (PA) é o objeto (O)]<br />

− voz <strong>do</strong> meio: o recipiente (RE) é o sujeito (S), o paciente (PA) é o objeto (O), o<br />

agente [(AG) é a circunstância (C)].<br />

Exemplos:<br />

(162) Eles ofereceram um livro a Pedro<br />

AG é S V PA é O RE é C<br />

105


(163) O livro foi ofereci<strong>do</strong> a Pedro por amigos<br />

PA é S V RE é C AG é C<br />

(164) *Pedro se deu uma casa]<br />

AG é S RE = AG V PA é O<br />

(165) Pedro recebeu o livro]<br />

RE é S V PA é O<br />

Os verbos se distinguem também pelo número de papéis semânticos que os<br />

acompanham para completar o senti<strong>do</strong>.<br />

(166) Pedro comprou este livro para um amigo.<br />

S V O C=Recipiente bitransitivo<br />

(167) Pedro feriu seu inimigo<br />

S V O transitivo<br />

(168) Pedro viajou para a ci<strong>da</strong>de<br />

S V C=locali<strong>da</strong>de<br />

semitransitivo/direcional<br />

(169) Pedro <strong>do</strong>rmiu bem<br />

15.3 Voz inerente<br />

S V intransitivo<br />

Refere-se aos papéis que são obrigatórios para completar o senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> verbo.<br />

106


Tabela 40:<br />

AG-P-R AG-P AG-R AG<br />

+ Agente botar amar viajar <strong>da</strong>nçar<br />

man<strong>da</strong>r queimar morar cair<br />

P-R P R Ø<br />

- Agente receber queimar chover<br />

Verbos sem agente:<br />

(170) (eu) recebi sua carta<br />

R V P<br />

(171) a casa queimou completamente<br />

P V<br />

(172) choveu<br />

V<br />

15.4 Voz deriva<strong>da</strong><br />

A diferença entre voz ativa e voz passiva em português pode ser feita por<br />

derivação. Os papéis mu<strong>da</strong>m, e o agente pode entrar "pela porta <strong>do</strong>s fun<strong>do</strong>s" como<br />

instrumento:<br />

(173) Pedro me deu este livro – este livro me foi <strong>da</strong><strong>do</strong> (por Pedro)<br />

(174) Kaingang: nĩm '<strong>da</strong>r' – nĩv '<strong>da</strong><strong>do</strong>'<br />

Outros papéis podem ser adiciona<strong>do</strong>s:<br />

(175) Pedro me obrigou a comer – comi (relação que pode ser expressa<br />

por afixo verbal que seria uma derivação)<br />

107


Gerúndios (len<strong>do</strong>) e particípios (li<strong>do</strong>) têm uma estrutura de participantes<br />

diferentes <strong>do</strong>s verbos: são como adjetivos ou verbos descritivos, isto é, o agente torna-se<br />

um item a ser descrito (gerúndio), ou o paciente é item (particípio). Ou então o gerúndio<br />

indica que duas ações se fazem ao mesmo tempo pelo mesmo agente:<br />

(176) O moço, len<strong>do</strong> o jornal, nem notou.<br />

(177) Um jornal velho e li<strong>do</strong>....<br />

15.5 Voz direcional<br />

Os verbos de movimento muitas vezes implicam em direção especial:<br />

(178) Ir (para lá) – vir (para cá)<br />

Para conhecer e estabelecer-se um ponto de referência. Se, p.ex., o ponto de<br />

referência é o centro <strong>da</strong> aldeia, ca<strong>da</strong> casa vai usar os verbos de maneira diferente; se é a<br />

casa <strong>do</strong> cacique, também vai haver diferença de uso para os habitantes <strong>da</strong>s várias casas.<br />

Aonde é "antes <strong>da</strong> ponte" e "depois <strong>da</strong> ponte" etc.<br />

Nós falaremos de direção egressiva (para longe <strong>do</strong> falante) e ingressiva (na<br />

direção <strong>do</strong> falante)<br />

(179) Exemplos: chegar de, chegar a, ir de, ir a<br />

16. Aspecto e mo<strong>do</strong><br />

Tanto aspecto quanto mo<strong>do</strong> são liga<strong>do</strong>s às formas verbais e muitas vezes fazem<br />

com ele paradigma. Em muitas línguas as formas negativas podem existir em to<strong>do</strong>s os<br />

aspectos, mas também pode haver restrições.<br />

108


16.1 Aspecto<br />

Dá informação sobre a maneira como o evento é apresenta<strong>do</strong> enquanto está em<br />

an<strong>da</strong>mento. Alguns aspectos são inerentes ao verbo individual, outros são combina<strong>do</strong>s<br />

com o verbo por derivação, ain<strong>da</strong> outros são expressos na oração pelo processo de<br />

lexicalização, usan<strong>do</strong> um segun<strong>do</strong> verbo ou um advérbio.<br />

16.1.1 Aspecto inerente<br />

Alguns aspectos são inerentes ao vocábulo:<br />

− Durativos -- eventos que levam tempo para se desenvolver (<strong>do</strong>rmir, educar,<br />

cozinhar, escrever).<br />

− Momentâneos ou pontuais -- se passam rapi<strong>da</strong>mente (pular, tossir).<br />

− Processos -- passam por fases (amadurecer, formar-se em).<br />

Esses verbos podem ser dinâmicos (escrever, construir) ou estáticos como o<br />

resulta<strong>do</strong> de um processo (grande, maduro).<br />

Os dinâmicos também podem ser télicos ou atélicos.<br />

Os télicos têm um resulta<strong>do</strong> tangível, visível como (construir, escrever, cozinhar)<br />

quan<strong>do</strong> interrompi<strong>do</strong>s não atingem o resulta<strong>do</strong>, ficam incompletos. Ex. A construção de<br />

uma casa que é interrompi<strong>da</strong>.<br />

Os atélicos representam ações que não tem um ponto final, quan<strong>do</strong><br />

interrompi<strong>do</strong>s simplesmente param e podem recomeçar (chover, cantar).<br />

16.1.2 Aspecto deriva<strong>do</strong><br />

Uma ação pode ser vista como uma uni<strong>da</strong>de ou como um processo. Qualquer<br />

parte <strong>do</strong> processo pode ser focaliza<strong>da</strong>: o começo, o meio, o fim próximo, o fim. Quan<strong>do</strong><br />

109


se mostra a ação como um processo, o aspecto é imperfectivo. Quan<strong>do</strong> se mostra a ação<br />

como um to<strong>do</strong>, sem considerar as partes, o aspecto é perfectivo ou aoristo.<br />

Este sistema, em combinação com os mo<strong>do</strong>s, é mais básico <strong>do</strong> que a noção de<br />

tempo (ver capítulo 17).<br />

O aspecto perfectivo olha a situação de fora como um to<strong>do</strong>, sem distinguir a<br />

estrutura interna <strong>da</strong> situação, ou seja, sem se importar com as fases <strong>do</strong> processo. Pode ser<br />

retrata<strong>do</strong> por uma linha que naturalmente tem início e fim (estrutura interna <strong>da</strong> ação),<br />

representan<strong>do</strong> a ação dentro de uma figura geométrica oval que é vista de fora pelo<br />

falante como um to<strong>do</strong>. Esta perspectiva é a <strong>do</strong> perfectivo.<br />

O perfectivo é geralmente usa<strong>do</strong> para fazer uma ou várias distinções de passa<strong>do</strong>,<br />

um <strong>do</strong>s quais é a forma usa<strong>da</strong> para contar histórias. Entretanto, em português usa-se o<br />

imperfectivo.<br />

Ex.: Ela escreveu uma carta.<br />

O imperfectivo olha a situação de dentro, e assim tem muito com o enre<strong>do</strong> <strong>da</strong><br />

história. Distinguem-se o começo <strong>da</strong> ação <strong>do</strong> fim <strong>da</strong> ação, mas também é usa<strong>do</strong> para<br />

situações que duram to<strong>do</strong> o tempo, sem começo e sem fim. Pode ser o tempo <strong>do</strong> presente,<br />

certos <strong>do</strong> futuro, outros <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> e até as formas que indicam ação habitual.<br />

Ex.: Quan<strong>do</strong> eu cheguei ela escrevia uma carta.<br />

falante<br />

110


Quase come-<br />

çan<strong>do</strong><br />

progredin<strong>do</strong> Quase<br />

terminan<strong>do</strong><br />

termina<strong>do</strong><br />

Existe uma terceira forma <strong>do</strong> verbo que não é perfectivo nem imperfectivo e é<br />

aqui chama<strong>da</strong> de neutro. Ele é a forma de base <strong>da</strong> qual esses são deriva<strong>do</strong>s. O neutro<br />

geralmente não é marca<strong>do</strong>, mas as pessoas e mo<strong>do</strong>s que lhe são correspondentes podem<br />

ser assinala<strong>do</strong>s. Muitas vezes ele é usa<strong>do</strong> na locução verbal (vamos cantar) e talvez em<br />

orações consecutivas (ele canta e <strong>da</strong>nça). As formas usa<strong>da</strong>s são normalmente as <strong>do</strong><br />

presente e <strong>do</strong> imperativo. Existem línguas que têm um tipo de imperativo com o senti<strong>do</strong><br />

de "faça agora!" que seria neutro em oposição a "faça em qualquer tempo!" que seria<br />

imperfectivo.<br />

16.1.3 Aspecto lexicaliza<strong>do</strong><br />

escrever.<br />

escrever.<br />

Alemão:<br />

Especialmente o imperfectivo pode ser lexicaliza<strong>do</strong>. Existem vários tipos:<br />

incoativo – o começo <strong>da</strong> ação. (180) Ela começou a<br />

progressivo – a ação está se desenvolven<strong>do</strong>. (181) Ela está escreven<strong>do</strong>.<br />

completivo – a ação termina. (182) Ela terminou de<br />

iterativo – a ação é repeti<strong>da</strong>. (183) Ela vive escreven<strong>do</strong>.<br />

habitual – a ação caracteriza o agente. (184) Ela sempre escreve.<br />

Estas distinções podem ser marca<strong>da</strong>s de diferentes formas:<br />

− por partículas que modificam o verbo como, por exemplo:<br />

111


(185) essen 'comer' – aufessen 'comer tu<strong>do</strong>'<br />

(186) hungern 'ficar com fome' – verhungern 'morrer de fome'<br />

Denya (Camarões):<br />

(187) a wá ‘ele matou’<br />

(188) a ma wá ‘ele matou de novo’<br />

(189) a la wá ‘ele sempre mata, tem o hábito de matar’<br />

Inglês:<br />

(190) <strong>do</strong> – un<strong>do</strong> – re<strong>do</strong> (fazer – desfazer -- refazer)<br />

− por verbos auxiliares:<br />

(191) Eu vou escrever aquela carta<br />

(192) Tenho escrito a carta<br />

− por advérbios: já, freqüentemente, completamente, repeti<strong>da</strong>mente<br />

− por verbos aspectuais como começar, terminar, continuar<br />

− por uma expressão mais complexa, ou seja, combinan<strong>do</strong> diferentes formas de<br />

lexicalização:<br />

− :<br />

(193) Ele tinha acaba<strong>do</strong> de tomar banho quan<strong>do</strong>...<br />

(194) Ele só tinha começa<strong>do</strong> quan<strong>do</strong>...<br />

16.2 Mo<strong>do</strong><br />

Aparentemente mo<strong>do</strong>s não são inerentes. Então são deriva<strong>do</strong>s ou lexicaliza<strong>do</strong>s. Os<br />

deriva<strong>do</strong>s são três: real (indicativo), irreal (subjuntivo e condicionais), necessi<strong>da</strong>de<br />

(imperativos). Os lexicaliza<strong>do</strong>s são muitos, uma classificação geral é difícil.<br />

112


16.2.1 Mo<strong>do</strong>s deriva<strong>do</strong>s<br />

O mo<strong>do</strong> real é usa<strong>do</strong> para fatos reais, no presente ou no passa<strong>do</strong>. Ele combina<br />

com o perfectivo para falar <strong>da</strong> ação de maneira global; com o aspecto imperfectivo para<br />

marcar progressivo, iterativo, habitual. Também pode ser incoativo. Pode ser positivo ou<br />

negativo e pode ser combina<strong>do</strong> com a forma neutra.<br />

(195) Elas escrevem - Elas não escrevem (presente <strong>do</strong> indicativo -<br />

neutro real).<br />

(196) É bom elas escreverem - É bom elas não escreverem (infinitivo<br />

pessoal -<br />

neutro real).<br />

(197) Ele an<strong>do</strong>u - Ele não an<strong>do</strong>u (pretérito perfeito -<br />

perfectivo real).<br />

(198) Ele an<strong>da</strong>ra – Ele não an<strong>da</strong>ra (pretérito mais que<br />

perfeito - perfectivo real).<br />

(199) Ele an<strong>da</strong>va – Ele não an<strong>da</strong>va (pretérito imperfeito -<br />

imperfectivo real).<br />

Mo<strong>do</strong> irreal representa ações potenciais, mas não (ain<strong>da</strong>) realiza<strong>da</strong>s, como<br />

desejos, aspirações, esperanças, contra-expectativas.<br />

(200) Ele quer que eu cante – Ele não quer que eu cante (presente <strong>do</strong><br />

subjuntivo - neutro irreal). (Também usa<strong>do</strong> como<br />

imperativo).<br />

(201) Se eu cantasse ele também cantaria – Se eu não cantasse ele<br />

também não cantaria (pretérito <strong>do</strong> subjuntivo-<br />

perfectivo irreal).<br />

(202) Ele disse que cantaria – Ele disse que não cantaria<br />

imperfectivo irreal).<br />

(futuro <strong>do</strong> pretérito -<br />

113


Mo<strong>do</strong> necessi<strong>da</strong>de representa formas <strong>do</strong> imperativo ou <strong>do</strong> quase imperativo como<br />

o futuro <strong>do</strong> presente que pode ser usa<strong>do</strong> como imperativo ou <strong>do</strong> futuro <strong>do</strong> subjuntivo que<br />

pode marcar hipótese.<br />

(203) canta (imperativo - neutro necessi<strong>da</strong>de)<br />

(204) Cantarás - Não cantarás (futuro <strong>do</strong> presente - imperfectivo<br />

necessi<strong>da</strong>de). (Também usa<strong>do</strong> como imperativo)<br />

(205) Se tirar <strong>do</strong> jardim as flores as borboletas fugirão - Se não tirar...<br />

(futuro <strong>do</strong> subjuntivo - perfectivo necessi<strong>da</strong>de). (Usa<strong>do</strong> para<br />

sugerir uma hipótese como também o imperativo pode fazê-lo –<br />

Tira <strong>do</strong> jardim as flores e as borboletas fugirão).<br />

16.2.2 Mo<strong>do</strong> lexicaliza<strong>do</strong><br />

Os mo<strong>do</strong>s também podem ser lexicaliza<strong>do</strong>s e para isso usam-se os verbos mo<strong>da</strong>is<br />

como querer, poder, precisar ou advérbios mo<strong>da</strong>is que exprimem a atitude <strong>do</strong> falante<br />

ou <strong>do</strong> agente. Muitos tipos de informação podem-se achar nos mo<strong>do</strong>s, por exemplo:<br />

Informação vista – ouvi<strong>da</strong> – deduzi<strong>da</strong>, informação certa – pressuposta – duvi<strong>do</strong>sa<br />

– surpreendente – revoltante.<br />

Em português:<br />

(206) ele quer an<strong>da</strong>r ele pode an<strong>da</strong>r ele precisa an<strong>da</strong>r<br />

Mofu (Camarões):<br />

(207) lá ‘o agente quer fazer (por ex.: trançar)’<br />

(208) cáy ‘o agente queria fazer (ele trançou porque ele queria)<br />

(209) sém ‘evento com resulta<strong>do</strong> não-reversível (ele morreu)’<br />

(210) sát ‘evento com resulta<strong>do</strong> reversível (ele quebrou os<br />

óculos)’<br />

114


Podem achar-se muitos tipos de informação nos mo<strong>do</strong>s, por exemplo:<br />

Informação vista – ouvi<strong>da</strong> – deduzi<strong>da</strong>;<br />

informação certa – pressuposta – duvi<strong>do</strong>sa – surpreendente – revoltante.<br />

17. Tipos de tempo e de informação<br />

Outras categorias que distinguem formas <strong>do</strong> verbo são os tempos em que as ações<br />

ocorrem. Em outras línguas são mais tipos de informação <strong>do</strong> que tempo. Serão<br />

examina<strong>do</strong>s os <strong>do</strong>is.<br />

17.1 tempo<br />

To<strong>do</strong>s os eventos se passam em algum tempo. Para poder identificá-los tem de<br />

haver um ponto de referência. Assim podem-se distinguir:<br />

Tempo absoluto é o que se passa agora, neste minuto em que esta lição está sen<strong>do</strong><br />

estu<strong>da</strong><strong>da</strong>. É o tempo <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> real.<br />

Tempo relativo é aquele dentro <strong>do</strong> discurso cujo ponto de referência precisa ser<br />

defini<strong>do</strong>. Pode mu<strong>da</strong>r no decorrer <strong>do</strong>s eventos narra<strong>do</strong>s. O presente <strong>do</strong> tempo relativo<br />

pode durar somente até que um novo ponto de referência for estabeleci<strong>do</strong>.<br />

O ponto de referência é o presente, o que passou antes pertence ao passa<strong>do</strong>, e o<br />

que ocorrerá depois é futuro. Pode haver eventos simultâneos (veja 22.1.1).<br />

(211) Voltou para casa. Chegan<strong>do</strong> lá, eis o seu filho nasci<strong>do</strong>! E a mãe<br />

descansa com o menino nos braços. É bom que ele trouxe peixe<br />

para alimentá-la.<br />

A diferença de quanto tempo se passou/a entre o presente e o passa<strong>do</strong> ou futuro<br />

pode <strong>da</strong>r formas verbais diferentes: passa<strong>do</strong>/futuro próximo, mais distante, muito<br />

distante. Normalmente em qualquer língua existem mais distinções no passa<strong>do</strong> que no<br />

115


futuro. Em Ngyemboon (Camarões) existem diferenças nas formas verbais (talvez um<br />

<strong>do</strong>s sistemas mais complexos). P0-4 representa passa<strong>do</strong>s diferentes segun<strong>do</strong> o tempo que<br />

passou entre o presente (relativo) e a ação; F1-4 representa quatro distâncias de futuro. O<br />

ponto de referência pode ser o tempo absoluto ou o relativo. Note que as diferenças <strong>do</strong><br />

passa<strong>do</strong> são mais <strong>do</strong> que as <strong>do</strong> futuro. Numa escala pode-se mostrar esta relação entre os<br />

tempos numa linha:<br />

P4 P3 P2 P1 P0 PRES F1 F2 F3 F4<br />

Distinções de tempo geralmente são inflexionais, é difícil imaginá-las como sen<strong>do</strong><br />

inerentes ou deriva<strong>da</strong>s. Mas existem tempos lexicaliza<strong>do</strong>s (os advérbios de tempo e os<br />

verbos auxiliares). Indicações como ontem, amanhã, logo tem que combinar com a forma<br />

correta <strong>do</strong> verbo e dão uma indicação de tempo mais precisa. Por outro la<strong>do</strong>, muitas<br />

línguas <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> exibem maneiras diferentes <strong>da</strong>s línguas européias para indicar tempo e<br />

nem sempre esta diferença se exprime no sistema verbal.<br />

17.2 Tipos de informação<br />

Ca<strong>da</strong> texto é organiza<strong>do</strong> levan<strong>do</strong> em consideração vários tipos de informação. No<br />

texto narrativo existe uma linha <strong>do</strong>s eventos com cenário, explicações, descrições,<br />

informação colateral (veja cap. 3, 25, 26). Outros gêneros de discurso contêm outras<br />

partes. Estas partes podem ser o fator decisivo para determinar a organização <strong>do</strong> sistema<br />

<strong>do</strong>s verbos.<br />

Nas línguas Jê (Brasil) ca<strong>da</strong> gênero de discurso é organiza<strong>do</strong> assim: ca<strong>da</strong> gênero,<br />

ca<strong>da</strong> parágrafo é marca<strong>do</strong> de maneira diferente:<br />

Kaingang (Brasil):<br />

(212) mũ ‘evento narrativo’<br />

(213) nĩ ‘evento descritivo’<br />

(214) tĩ ‘evento habitual’<br />

116


(215) vẽ ‘evento explicativo’<br />

(216) rỹ, -m nĩ ‘evento exortativo’<br />

(217) Ø (sem partícula) ‘fim <strong>do</strong> parágrafo’<br />

Usan<strong>do</strong> tĩ ‘an<strong>da</strong>r’ e ti ‘ele’ o paradigma seguinte pode ser construí<strong>do</strong>:<br />

(218) tĩ ti mũ ‘an<strong>da</strong> ele narrativo—ele an<strong>da</strong> (an<strong>do</strong>u/an<strong>da</strong>rá)’<br />

(219) tĩ ti nĩ ‘an<strong>da</strong> ele descritivo—ele an<strong>da</strong> (an<strong>do</strong>u/an<strong>da</strong>rá)’<br />

(220) tĩ ti tĩ ‘an<strong>da</strong> ele habitual—ele an<strong>da</strong> (an<strong>do</strong>u/an<strong>da</strong>rá)’<br />

(221) ti tĩ vẽ ‘ele (dele) an<strong>da</strong>(r) explicação—ele an<strong>da</strong><br />

(an<strong>do</strong>u/an<strong>da</strong>rá)’<br />

(222) tĩ rỹ! ‘an<strong>da</strong> exortação—an<strong>da</strong>!’<br />

(223) tĩ ti ‘an<strong>da</strong> ele—ele foi.’<br />

A utilização destas formas depende <strong>do</strong> gênero <strong>do</strong> discurso (ou <strong>do</strong> parágrafo) –<br />

informação nem sempre expressa numa outra língua.<br />

Chiquitano (Bolívia):<br />

(224) -conomo ‘escrever’<br />

(225) ma-conomo-no ‘ela escreve’ (perfectivo ou<br />

absoluto)<br />

(226) a-conomo ‘ela escreve' (imperfectivo ou<br />

relativo)<br />

(227) ña-conomo-corrü ‘escrita dela’ (particípio)<br />

(228) ña-conomo-na ‘que ela escreva’ (imperativo)<br />

(229) ña-conomo-raca ‘ela escreve, mas não deveria’<br />

(avaliação)<br />

O relativo é usa<strong>do</strong> na linha <strong>do</strong>s eventos de narrativas para indicar que outros<br />

eventos seguem. O absolutivo marca um evento final ou uma descrição ou uma<br />

preparação <strong>do</strong>s eventos. O particípio é usa<strong>do</strong> no ponto culminante <strong>do</strong> texto, as formas<br />

117


imperativas e avaliativas são usa<strong>da</strong>s para exortações. O Chiquitano não conhece outras<br />

formas <strong>do</strong> verbo.<br />

Em português o imperativo, o presente <strong>do</strong> subjuntivo ou o infinitivo podem ser<br />

usa<strong>do</strong>s em textos de instruções:<br />

(230) Agita bem antes de usar!<br />

(231) Lave depois de usar!<br />

(232) Tomar 3 vezes ao dia<br />

17.3 Conclusão<br />

Parece que to<strong>da</strong>s as línguas usam partículas para exprimir voz, aspecto, mo<strong>do</strong>,<br />

tempo e tipo. Mas, nem to<strong>da</strong>s as mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong>des são marca<strong>da</strong>s por partículas e nem sempre<br />

esta informação é lexicaliza<strong>da</strong>. Mas pode ser e geralmente é indica<strong>da</strong> em construções<br />

complexas.<br />

Parece que tempo e tipo não ocorrem juntos na mesma língua. O sistema de tipos<br />

é usa<strong>do</strong> nas línguas chádicas (Chad e Camarões) e em línguas ameríndias.<br />

18. Méto<strong>do</strong>s de pesquisa<br />

Para se pesquisar o sistema verbal de uma língua, é necessário estar pronto para<br />

fazer um inventário de to<strong>da</strong>s as formas gramaticaliza<strong>da</strong>s. Podem ser classifica<strong>do</strong>s pelo<br />

significa<strong>do</strong> e função no texto. Tais distinções como a voz, o aspecto, o mo<strong>do</strong> e talvez<br />

tempo ou tipo provavelmente serão encontra<strong>do</strong>s.<br />

Na pesquisa prática, a classificação precisa ser feita de acor<strong>do</strong> com as formas<br />

encontra<strong>da</strong>s. Ca<strong>da</strong> mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong>de é consistentemente marca<strong>da</strong> por uma ou duas partículas<br />

(algumas vezes mais). Não acreditamos que a mesma partícula marque algumas vezes<br />

esta, e outras vezes uma outra distinção de mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong>de. Deve haver restrições de co-<br />

ocorrência entre mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong>des e seus marca<strong>do</strong>res.<br />

118


Talvez o melhor meio de estu<strong>da</strong>r o sistema verbal seja tentar descobrir primeiro os<br />

aspectos deriva<strong>do</strong>s (neutro, imperfectivo e perfectivo), e então descobrir como outras<br />

mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong>des agem em comparação com estas. Os aspectos deriva<strong>do</strong>s, muitas vezes são<br />

intimamente relaciona<strong>do</strong>s ao verbo até se fundin<strong>do</strong> com ele, <strong>da</strong>n<strong>do</strong> origem a mu<strong>da</strong>nças<br />

tonais, diferentes formas de raízes e radicais, que podem parecer alomorfes ou afixos<br />

identificáveis.<br />

18.1 Questionário<br />

Para aju<strong>da</strong>r a encontrar as várias formas <strong>do</strong> sistema verbal, pode ser útil explorar o<br />

sistema pelo uso de um questionário. Tal informação, encontra<strong>da</strong> através <strong>da</strong> tradução, não<br />

é tão confiável como os <strong>da</strong><strong>do</strong>s encontra<strong>do</strong>s em textos naturais. Contu<strong>do</strong>, tem seu valor<br />

uma vez que seu assessor lingüístico, raramente lhe <strong>da</strong>rá formas verbais que não existem<br />

na língua. Estes <strong>da</strong><strong>do</strong>s podem ser considera<strong>do</strong>s como uma lista de formas existentes com,<br />

no mínimo, um possível significa<strong>do</strong>, o significa<strong>do</strong> <strong>do</strong> questionário. O uso de textos<br />

naturais é necessário para complementar estas informações, com o objetivo de descobrir a<br />

gama completa de ca<strong>da</strong> significa<strong>do</strong> para ca<strong>da</strong> forma.<br />

1. ele comeu (come) carne (P0)<br />

2. agorinha mesmo ele comeu carne (P1)<br />

3. ele comeu carne há poucas horas atrás (P1/2)<br />

4. ele comeu carne ontem (P2)<br />

5. ele comeu carne na semana passa<strong>da</strong> (P3)<br />

6. ele comeu carne há muito tempo atrás (P4)<br />

7. ele está comen<strong>do</strong> carne (progressivo)<br />

8. ele estava comen<strong>do</strong> carne (progressivo passa<strong>do</strong>)<br />

9. ele vai estar comen<strong>do</strong> carne (progressivo futuro)<br />

10. ele usualmente come carne (habitual)<br />

11. ele certamente vai comer carne (certeza futuro)<br />

12. ele provavelmente vai comer carne (incerteza futuro)<br />

13. ele tem to<strong>da</strong> a intenção de comer carne (intencional)<br />

14. ele vai comer carne (futuro)<br />

119


15. ele veio e comeu carne (consecutivo e ação <strong>do</strong> mesmo sujeito)<br />

16. ele veio e outro comeu carne (consecutivo e ações de sujeitos diferentes)<br />

17. ele veio comen<strong>do</strong> carne (ação simultânea <strong>do</strong> mesmo sujeito)<br />

18. ele veio, enquanto alguém comia carne (ações simultâneas de sujeitos diferentes)<br />

19. ele veio, ten<strong>do</strong> comi<strong>do</strong> carne (anterior <strong>do</strong> mesmo sujeito)<br />

20. ele veio depois que alguém tinha comi<strong>do</strong> carne (anterior de sujeitos diferentes)<br />

21. ele veio comer carne (intencional <strong>do</strong> mesmo sujeito)<br />

22. ele veio, só então alguém podia comer carne (intencional de sujeitos diferentes )<br />

23. ele vem (está vin<strong>do</strong>) e come carne (consecutivo)<br />

24. ele vai vir e comer carne (consecutivo)<br />

25. diga-me se ele come carne (condição realizável)<br />

26. diga-me se ele tem comi<strong>do</strong> carne (intenção realiza<strong>da</strong>)<br />

27. diga-me se ele for comer carne (intenção realizável)<br />

28. se ele comesse carne, isto poderia ser bom (mas ele não come) (condição não<br />

realiza<strong>da</strong>)<br />

29. se ele comesse carne, isto poderia ter si<strong>do</strong> bom (mas ele não come) condição não<br />

realiza<strong>da</strong>)<br />

30. se ele pudesse comer carne, isto poderia ser bom (mas ele não vai comer)<br />

(condição não realiza<strong>da</strong>)<br />

31. se ele tivesse vin<strong>do</strong>, ele poderia ter comi<strong>do</strong> carne (mas ele não veio) (condição<br />

não realiza<strong>da</strong>)<br />

32. se ele vier poderá comer carne (condição realizável)<br />

33. se ele viesse, ele poderia comer carne (condição improvável)<br />

34. que ele coma carne! (desejo realizável)<br />

35. que ele tenha comi<strong>do</strong> carne! (desejo realizável)<br />

36. ah! se ele tivesse comi<strong>do</strong> carne!! (desejo não realiza<strong>do</strong>)<br />

37. coma carne agora! (IMP direto)<br />

38. vamos comer carne agora! (IMP direto)<br />

39. continue a comer carne! Ou: de agora em diante, coma carne! Ou: esteja comen<strong>do</strong><br />

carne! (IMP indireto)<br />

120


40. vamos continuar a comer carne! Ou: vamos começar a comer carne de agora em<br />

diante! Ou: Vamos estar comen<strong>do</strong> carne!! (IMP indireto)<br />

41. venha e coma carne! (IMP consecutivo)<br />

42. venha comen<strong>do</strong> carne! (IMP simultâneo)<br />

43. venha, ten<strong>do</strong> comi<strong>do</strong> carne! (IMP anterior)<br />

44. venha para comer carne! (IMP intencional)<br />

45. é ele que comeu carne (passa<strong>do</strong> relativo)<br />

46. é ele que está comen<strong>do</strong> carne!(relativo progressivo)<br />

47. é ele que vai comer carne! (relativo futuro)<br />

48. somente ele comeu carne! (foco-passa<strong>do</strong>)<br />

49. somente ele está comen<strong>do</strong> carne! (foco-progressivo)<br />

50. somente ele vai comer carne (foco-futuro)<br />

51. é carne o que ele comeu (ênfase-passa<strong>do</strong>)<br />

52. é carne o que ele está comen<strong>do</strong>! (ênfase-progressivo)<br />

53. é carne que ele vai comer (ênfase-futuro)<br />

54. ele costumava comer carne (mas não come mais) (habitual-concluí<strong>do</strong>)<br />

55. quanto a ele comer carne, isto é bom (topicaliza<strong>do</strong>)<br />

Na lista de expressões acima, o verbo a ser pesquisa<strong>do</strong> é o verbo comer (carne),<br />

to<strong>da</strong>s as outras formas constituem o contexto. No caso de algumas expressões não<br />

poderem ser traduzi<strong>da</strong>s, elas devem ser ignora<strong>da</strong>s.<br />

Para encontrar to<strong>da</strong>s as mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong>des, as expressões acima devem ser pesquisa<strong>da</strong>s<br />

na forma positiva e negativa. Assim, para o paradigma ser completo, a pesquisa dever ser<br />

feita para descobrir a existência de verbos transitivos e intransitivos. Se houver diferentes<br />

classes de verbos – por exemplo, verbos com diferentes padrões tonais ou radicais – pelo<br />

menos um membro de ca<strong>da</strong> classe precisa ser pesquisa<strong>do</strong>.<br />

18.2 <strong>Análise</strong><br />

Formas idênticas que se distinguem apenas pelos advérbios podem ser elimina<strong>da</strong>s<br />

<strong>do</strong> paradigma. A maioria <strong>da</strong>s línguas tem menos formas <strong>do</strong> que o questionário sugere.<br />

121


Também é uma melhor idéia começar uma análise com as formas simples <strong>do</strong>s verbos <strong>do</strong><br />

que com aquelas que podem conter um verbo auxiliar (veja cap. 23).<br />

Os verbos e alguns afixos ou partículas intimamente relaciona<strong>do</strong>s, devem ser<br />

analisa<strong>do</strong>s juntos. Para agrupá-los, as ocorrências <strong>da</strong> mesma forma deveriam ser copia<strong>da</strong>s<br />

(ou identifica<strong>da</strong>s com o número) numa folha separa<strong>da</strong>. É provável que os aspectos<br />

deriva<strong>do</strong>s sejam encontra<strong>do</strong>s desta forma, em suas diferentes combinações.<br />

Continuan<strong>do</strong>, os pronomes sujeitos, alguns afixos ou partículas intimamente<br />

relaciona<strong>da</strong>s poderiam ser investiga<strong>do</strong>s. Pode ser bom agrupá-los em diferentes folhas<br />

também. Pode ser que a forma (ele) <strong>do</strong> questionário não seja suficiente para descobrir<br />

diferentes paradigmas de pronomes sujeito; outras pessoas verbais também precisam ser<br />

pesquisa<strong>da</strong>s. Os mo<strong>do</strong>s são, quase sempre, marca<strong>do</strong>s por diferentes paradigmas ou<br />

construções de pronomes sujeito.<br />

Diferenças podem ser observa<strong>da</strong>s na forma ou lugar <strong>do</strong> objeto. Em línguas tonais,<br />

o nome ou pronome objeto pode ser afeta<strong>do</strong> por uma mu<strong>da</strong>nça de tom (o tom baixo se<br />

torna alto) que pode ser sinal <strong>da</strong> presença de um morfema ou uma regra tonal dentro de<br />

uma uni<strong>da</strong>de inseparável. Também diferentes localizações podem ser observa<strong>da</strong>s; em<br />

algumas formas verbais, a ordem sujeito-objeto-verbo (SOV) pode ser a regra; em outros,<br />

na mesma língua, a regra pode ser sujeito-verbo-objeto (SVO).<br />

As diferenças nas construções verbais podem simplesmente ser marca<strong>da</strong>s pela<br />

presença ou ausência de certas partículas, as quais devem ser identifica<strong>da</strong>s e suas várias<br />

funções, estu<strong>da</strong><strong>da</strong>s.<br />

Ten<strong>do</strong> examina<strong>do</strong> as formas verbais simples conti<strong>da</strong>s em um único verbo apenas,<br />

as formas complexas deveriam ser estu<strong>da</strong><strong>da</strong>s. Elas podem ser compostas de um verbo<br />

auxiliar e um verbo principal ou de um verbo principal e um verbo mo<strong>da</strong>l, por exemplo.<br />

Para mais discussões, veja cap. 23.<br />

Estu<strong>da</strong>r as formas verbais pelos questionários não garante que to<strong>da</strong>s as formas<br />

tenham si<strong>do</strong> encontra<strong>da</strong>s, contu<strong>do</strong>, a maioria delas deverá se tornar conheci<strong>da</strong>. É bom<br />

estar constantemente à procura de outras formas.<br />

122


18.3 O esquema<br />

Fazer-se um esquema usan<strong>do</strong> os parâmetros de aspecto e mo<strong>do</strong> dá um esquema de<br />

3x3 casas, representan<strong>do</strong> os parâmetros de aspecto (horizontal) e mo<strong>do</strong> (vertical). Terá<br />

casas vazias e outras que contêm mais <strong>do</strong> que uma só forma. Às vezes vai ser preciso<br />

uma outra diferença no senti<strong>do</strong> vertical, mas geralmente as nove casas são suficientes<br />

para acomo<strong>da</strong>r to<strong>da</strong>s as formas <strong>do</strong> verbo identifica<strong>da</strong>s. Seguem alguns exemplos:<br />

123


− Verbos dinâmicos<br />

Aspectos<br />

Tabela 41: Aspectos e mo<strong>do</strong>s em inglês<br />

Mo<strong>do</strong>s Neutro Imperfectivo Perfectivo<br />

Real<br />

Irreal<br />

Necessi<strong>da</strong>de<br />

Walks was walking has walked<br />

<strong>do</strong>es walk<br />

did walk<br />

has been walking had walked<br />

will walk will be walking will have walked<br />

may walk will have been walking may have walked<br />

must walk must be/have been<br />

walking<br />

must have walked<br />

shall walk shall be/have been<br />

walking<br />

shall have walked<br />

can walk can be/have been<br />

walking<br />

can have walked<br />

<strong>do</strong> walk! be walking!<br />

<strong>do</strong> be walking!<br />

<strong>do</strong> have walked!<br />

− Verbos estáticos (adjetivo como predica<strong>do</strong>)<br />

Aspectos<br />

Mo<strong>do</strong>s Neutro Imperfectivo Perfectivo<br />

Real<br />

Irreal can be<br />

good/liked<br />

is good/liked is being good/liked was good/liked<br />

has been good/liked<br />

Necessi<strong>da</strong>de be good/liked! keep on being<br />

good/liked!<br />

could be good/liked<br />

could have been good/liked<br />

124


Tabela 42: Aspectos e Mo<strong>do</strong>s em Português*<br />

Usan<strong>do</strong> os verbos cantar, vender, partir, completan<strong>do</strong> com os irregulares estar,<br />

Aspectos<br />

ser, ir<br />

Mo<strong>do</strong> Neutro Imperfectivo |-----| Perfectivo<br />

Real (indicativo presente)<br />

cant-o/est-ou<br />

vend-o/s-ou<br />

part-o/v-ou<br />

Irreal (presente <strong>do</strong> subjuntivo)<br />

Necessi-<br />

<strong>da</strong>de<br />

cant-e/est-e-ja<br />

vend-a/s-e-ja<br />

part-a/v-á<br />

(imperativo)<br />

cant-a!/est-á!<br />

vend-e!/s-ê!<br />

part-e!/v-ai!<br />

Veja também:<br />

(pretérito imperfeito)<br />

cant-a-va/est-a-va<br />

vend-i-a/er-a<br />

part-i-a/i-a<br />

(infinitivo pessoal)<br />

cant-a-r/est-a-r<br />

vend-e-r/s-e-r<br />

part-i-r/i-r<br />

(futuro <strong>do</strong> pretérito)<br />

cant-a-ria/est-a-ria<br />

vend-e-ria/s-e-ria<br />

part-i-ria/i-ria<br />

(futuro <strong>do</strong> presente)<br />

cant-a-rei/est-a-rei<br />

vend-e-rei/s-e-rei<br />

part-i-rei/i-rei<br />

(pretérito perfeito)<br />

cant-e-i/estiv-e<br />

vend-i/fu-i<br />

part-i/fu-i<br />

125<br />

(pretérito-mais-que perf.)<br />

cant-a-ra/estiv-e-ra<br />

vend-e-ra/fo-ra<br />

part-i-ra/fo-ra<br />

(pretérito <strong>do</strong><br />

subjuntivo)<br />

cant-a-sse/estiv-e-sse<br />

vend-e-sse/fo-sse<br />

part-i-sse/fo-sse<br />

(futuro <strong>do</strong> subjuntivo)<br />

cant-a-r/estiv-e-r<br />

vend-e-r/fo-r<br />

part-i-r/fo-r


Tabela 43 1 :<br />

infinitivo gerúndio particípio<br />

cant-a-r cant-an-<strong>do</strong> cant-a-<strong>do</strong><br />

est-a-r est-a-n<strong>do</strong> est-a-<strong>do</strong><br />

vend-e-r vend-e-n<strong>do</strong> vend-i-<strong>do</strong><br />

s-e-r se-n<strong>do</strong> si-<strong>do</strong><br />

part-i-r part-i-n<strong>do</strong> part-i-<strong>do</strong><br />

i-r i-n<strong>do</strong> i-<strong>do</strong><br />

Examinan<strong>do</strong> os verbos regulares, nota-se que o neutro são as formas sem sufixo<br />

que terminam na vogal temática ou numa modificação desta vogal (-o para primeira<br />

pessoa <strong>do</strong> real, diferente <strong>da</strong> vogal temática no irreal e <strong>da</strong> vogal temática na necessi<strong>da</strong>de).<br />

O acento cai na raiz <strong>do</strong> verbo, exceto na 1pl.<br />

As formas imperfectivas terminam em –va ou -a 'pretérito imperfeito' (as vogais<br />

temáticas são acentua<strong>da</strong>s); -r 'infinitivo pessoal' cuja vogal temática á acentua<strong>da</strong>; -rei<br />

'futuro <strong>do</strong> presente' (que leva o acento); -ria 'futuro <strong>do</strong> pretérito' (que leva o acento).<br />

As formas perfectivas tem os sufixos –i 'pretérito perfeito' (que assimila a vogal<br />

temática –a tornan<strong>do</strong>-a em e, recain<strong>do</strong> o acento na penúltima vogal), enquanto as vogais<br />

temáticas –e e –i desaparecem, recain<strong>do</strong> o acento tônico na última vogal); -ra 'pretérito<br />

mais-que-perfeito' (que obriga a vogal temática a ser acentua<strong>da</strong>); –sse 'pretérito <strong>do</strong><br />

subjuntivo' (que também leva o acento na vogal temática); –r 'futuro <strong>do</strong> subjuntivo' ( leva<br />

o acento).<br />

Sem fazer uma análise exaustiva de to<strong>do</strong>s os verbos irregulares, incluímos<br />

algumas observações sobre os verbos <strong>da</strong> tabela. Nota-se que as raízes <strong>do</strong> neutro em to<strong>do</strong>s<br />

os aspectos são est- s- v-. As raízes <strong>do</strong> imperfectivo são est- s- i- com exceção <strong>do</strong><br />

pretérito imperfeito onde é est- er- i-. No mo<strong>do</strong> perfectivo são estiv- fu-/fo- fu-/fo-. Como<br />

1 Da<strong>do</strong>s e nomenclatura tira<strong>do</strong>s de Celso Ferreira <strong>da</strong> Cunha, 1985) 11a edição, <strong>Gramática</strong> <strong>da</strong><br />

Língua Portuguesa, FAE, Ministério <strong>da</strong> Educação, pp. 367ff.<br />

126


se vê os três aspectos são marca<strong>do</strong>s de maneira diferente, mas em si ca<strong>da</strong> aspecto é<br />

uniforme com exceção <strong>do</strong> pretérito imperfeito.<br />

Se se consideram as formas <strong>do</strong> infinitivo, particípio e gerúndio, elas parecem se<br />

distinguir segun<strong>do</strong> os mesmos critérios de voz: o infinitivo é neutro, o gerúndio é<br />

imperfectivo, e o particípio é perfectivo. Poderiam ser considera<strong>do</strong>s como sen<strong>do</strong> <strong>do</strong> mo<strong>do</strong><br />

real; ou se inventa um novo mo<strong>do</strong> que seria o neutro.<br />

19. Relações entre os predica<strong>do</strong>s -- tipos<br />

Ca<strong>da</strong> vez que há mais <strong>do</strong> que um verbo numa construção, ca<strong>da</strong> verbo pode<br />

representar um predica<strong>do</strong> diferente, ou seja, ca<strong>da</strong> verbo representa uma oração. Por outro<br />

la<strong>do</strong>, é possível que exista uma locução com vários verbos. A relação entre vários<br />

predica<strong>do</strong>s na frase não é força<strong>da</strong>mente igual a esta numa locução.<br />

Vamos explorar em primeiro lugar as relações entre locuções na frase. Podem ser<br />

agrupa<strong>da</strong>s de várias maneiras, vamos escolher a nossa:<br />

− tipos como agrupamentos (acoplamentos e conteú<strong>do</strong>, 19.1), comparações (19.2)<br />

− voz é a combinação de um verbo conjuga<strong>do</strong> com um infinitivo, particípio ou<br />

gerúndio (20)<br />

− mo<strong>do</strong> onde algumas relações são entre reais como causa e efeito, outras não-reais<br />

como condições, outras de contra-expectativa e outras ain<strong>da</strong> de interrogativas que<br />

são to<strong>do</strong>s os tipos de perguntas com suas respostas.<br />

− tempo como ações em seqüência, simultâneas ou anteriores (22.1)<br />

− paráfrase (22.2)<br />

127


19.1 Tipos<br />

Olhan<strong>do</strong> as formas de tais relações, podem ser expressas por conjunções ou<br />

justaposição de orações, muitas vezes com características específicas para ca<strong>da</strong> tipo de<br />

relação. Em algumas línguas a ordem <strong>da</strong>s locuções pode ser significativa.<br />

Vamos apresentar cinco tipos de agrupamentos.<br />

19.1.1 Adições<br />

Podem ser agrupa<strong>da</strong>s por e, uma pausa, ou justaposição simples:<br />

(233) ele comeu e bebeu<br />

(234) ele comeu, bebeu e foi embora.<br />

inversa.<br />

Não há informação sobre o tempo; comeu primeiro e bebeu depois ou de ordem<br />

Quan<strong>do</strong> o sujeito é idêntico para os <strong>do</strong>is verbos, a estrutura pode ser como a <strong>do</strong>s<br />

verbos em série (ver 20.1+2); quan<strong>do</strong> os verbos se referem a sujeitos diferentes a<br />

estrutura é similar às seqüenciais (20.1, 20.4).<br />

Ewe (Togo)<br />

(235) e u nu No tsi<br />

ele Come coisa Toma água<br />

Ele come algo (e) toma água (um participante faz as duas ações)<br />

(236) Kodzo u nu, Kofi ya le no tsi<br />

Kodzo come algo Kofi toma água<br />

Kozo come algo e Kofi toma água (ca<strong>da</strong> participante faz uma ação<br />

diferente)<br />

Note a construção mais longa em ex. 200.<br />

128


19.1.2 Conteú<strong>do</strong><br />

Nas construções que chamamos de citações implícitas (veja 26.4) os verbos<br />

dizer, pensar, sentir têm uma relação de citação ao conteú<strong>do</strong> de que se pensa, sente... O<br />

sujeito (falante) pode ser o mesmo por to<strong>da</strong>s as ações indica<strong>da</strong>s, ou/e os verbos podem ter<br />

outros participantes em comum (argumentos).<br />

(237) Ele pensou em chegar<br />

(238) Ele queria chegar<br />

(239) Ele man<strong>do</strong>u chamá-lo<br />

(240) Ele lhe informou que seu irmão ia chegar<br />

Quan<strong>do</strong> um <strong>do</strong>s participantes <strong>da</strong> citação é o mesmo que o participante <strong>do</strong><br />

conteú<strong>do</strong>, a construção pode ser mais simples. Para introduzir um participante novo, a<br />

citação já é mais complexa.<br />

Em português podem-se usar muitos verbos para exprimir tal citação. Na África<br />

como também nas línguas Jê usa-se somente o verbo <strong>da</strong> citação 'dizer', o que torna uma<br />

citação direta:<br />

Kaingang<br />

(241) Ti mỹ: kunĩg, henh tĩ!<br />

19.1.3 Exemplo<br />

Ele para: chega! dizer vai – vai chamar ele!<br />

Pode ser ilustra<strong>do</strong> por:<br />

Escolham um nome bonito, chamem-no de Miguel!<br />

De to<strong>do</strong>s os nomes bonitos Miguel é ofereci<strong>do</strong> como exemplo. Este tipo de<br />

informação pode ser marca<strong>do</strong> por uma partícula ou uma construção especial:<br />

(242) Tikar (Camarões):<br />

129


19.1.4 Fase<br />

à kpe-â nun k kn sh kn-na Yaunde<br />

3SG.S Aju<strong>do</strong>u 3SG.O LOC an<strong>da</strong>n<strong>do</strong> REL foi Yaounde<br />

Ele o aju<strong>do</strong>u, (por exemplo) durante sua viagem para Yaounde.<br />

Algumas combinações de verbos são usa<strong>da</strong>s especialmente para indicar a fase <strong>do</strong><br />

desenvolvimento de ação como começo, continuação, repetição, fim.<br />

(243) ele começou a chorar<br />

(244) ele parou de chorar<br />

19.1.5 Orações coordena<strong>da</strong>s e as relativas<br />

Servem para introduzir, identificar, focalizar.<br />

(245) Havia lá um homem de nome Pedro, que era padeiro.<br />

(246) Busca aquele livro, está no armário!<br />

(247) Buca aquele livro, eu gosto muito dele.<br />

To<strong>da</strong>s estas relações podem ser expressas com uma construção relativa (ou oração<br />

adjetiva) introduzi<strong>da</strong>s com que:<br />

(248) Havia lá um homen com o nome de Pedro que era padeiro.<br />

(249) Busca aquele livro que está no armário!<br />

(250) Busca aquele livro que eu gosto muito.<br />

Em ca<strong>da</strong> exemplo a oração introduzi<strong>da</strong> por que qualifica um participante <strong>da</strong><br />

oração anterior.<br />

130


Várias línguas têm marca<strong>do</strong>res diferentes que indicam, por exemplo, uma<br />

diferença na maneira de qualificar. Pode ser uma identificação <strong>da</strong> pessoa ou objeto <strong>da</strong><br />

oração principal, ou pode simplesmente mencionar mais um detalhe sobre a pessoa ou<br />

objeto já identifica<strong>do</strong>. Por exemplo, se o pesca<strong>do</strong>r chega com a canoa cheia de peixes e<br />

leva alguns para casa, ele pode dizer para a esposa:<br />

"Vamos assar os peixes que estão na canoa!" – em construção que identifica que<br />

ele tem o plano de <strong>da</strong>r os peixes que está carregan<strong>do</strong> para algum outro. Se a construção é<br />

aquela que adiciona um detalhe, ele esteja talvez pedin<strong>do</strong> que ela os busque na canoa<br />

também, mas to<strong>do</strong>s são destina<strong>do</strong>s para a família.<br />

(251) Babungo (Camarões)<br />

bú fá ny lùu nyáa yíbw nd m<br />

<strong>do</strong>g which it be animal bad bit me<br />

Um cachorro, sen<strong>do</strong> um animal perigoso, me mordeu (= to<strong>do</strong>s os<br />

cachorros são perigosos)<br />

bú njy fá ny lùu nyáa yíbw nd m<br />

<strong>do</strong>g that which it be animal bad bit me<br />

Aquele cachorro que é perigoso me mordeu (somente este um cachorro<br />

é perigoso - restritivo).<br />

Geralmente qualquer função na oração pode ser assim modifica<strong>da</strong>:<br />

(252) Um homem que estava na rua viu o acidente (sujeito).<br />

(253) Estou ouvin<strong>do</strong> uma criança que está choran<strong>do</strong> (objeto).<br />

(254) Eu o dei para aquela pessoa que estava lá (circunstância).<br />

A ordem <strong>da</strong>s duas orações pode ser inverti<strong>da</strong>:<br />

(255) Quem <strong>do</strong>rme, come.<br />

131


Os mesmos pronomes podem ser usa<strong>do</strong>s na pergunta:<br />

(256) Quem <strong>do</strong>rme? Que é que ele fez?<br />

quem<br />

Nota que em português há os pronomes relativos<br />

Quem – S, O, C (pessoa): o homem a quem fui, em quem eu vi, para quem, com<br />

Que – S, O C (animal, objeto): o cachorro que foi, que eu vi, de que eu preciso<br />

19.2 Comparação<br />

Pode ser similari<strong>da</strong>de, grau, contraste, alternativa.<br />

19.2.1. Similari<strong>da</strong>de<br />

(257) Ela é lin<strong>da</strong> como uma flor.<br />

comparáveis.<br />

19.2.2 Grau<br />

Pode ser explica<strong>do</strong> assim: ela é lin<strong>da</strong> – as flores são lin<strong>da</strong>s – neste ponto são<br />

São metáforas.<br />

(258) Pedro é inteligente como uma raposa (quali<strong>da</strong>de).<br />

(259) Pedro é mais/menos inteligente que uma raposa (grau).<br />

(260) Pedro não é tão inteligente quanto uma raposa (menos inteligente<br />

que).<br />

132


19.2.3 Contraste<br />

Fala <strong>da</strong> diferença entre as partes compara<strong>da</strong>s. Podem-se usar antônimos<br />

(maior/menor) ou negações (não), pode-se usar a conjunção mas.<br />

(261) Pedro é alto, mas o pai dele é baixo.<br />

(262) Ele come, mas não bebe.<br />

(263) Paulo come olivas, mas Pedro não.<br />

(264) João trabalha no escritório de dia e como guar<strong>da</strong> de noite.<br />

19.2.4 Alternativa<br />

Pressupõe uma escolha entre várias possibili<strong>da</strong>des:<br />

(265) ou ele come ou não.<br />

(266) tem que comer ou beber, ou os <strong>do</strong>is<br />

(267) ele vive ou morreu?<br />

20. Relações de voz entre predica<strong>do</strong>s<br />

Definimos a voz como informação sobre os participantes ou a estrutura <strong>do</strong>s<br />

argumentos <strong>do</strong> verbo. Também se aplica para a diferença entre as vozes <strong>do</strong> verbo que são<br />

seis: sujeito idêntico ou diferente, verbos em série, logofóricos, seqüenciais, ordem<br />

relativa <strong>da</strong>s orações, correferência entre outros participantes.<br />

20.1 Sujeitos idênticos/diferentes<br />

Muitas línguas têm uma maneira ou outra de marcar se o sujeito de <strong>do</strong>is ou mais<br />

verbos dentro <strong>da</strong> mesma frase são idênticos ou não. Em português o infinitivo pode ser<br />

usa<strong>do</strong>:<br />

133


(268) ele queria viajar<br />

(269) as crianças foram pescar<br />

Em certas combinações usa-se uma preposição:<br />

(270) ele se recusa a aprender<br />

(271) ele gosta de trabalhar<br />

(272) ao <strong>da</strong>nçar ele quebrou o pé<br />

Ou o gerúndio pode ser utiliza<strong>do</strong>:<br />

(273) <strong>da</strong>nçan<strong>do</strong> ele quebrou o pé<br />

A identi<strong>da</strong>de pode ser entre o sujeito e o objeto de um outro verbo (transitivo):<br />

(274) ele te viu <strong>da</strong>nçar – viu que você <strong>da</strong>nçou<br />

(275) ele queria que você fosse<br />

20.2 Verbos em série<br />

É uma série de verbos com os mesmos marca<strong>do</strong>res de tempo/aspecto, mo<strong>do</strong>,<br />

polari<strong>da</strong>de, que tem S e O em comum com o verbo inicial (ou principal). Foram atesta<strong>do</strong>s<br />

em muitas línguas <strong>da</strong> África, mas também em chinês (Man<strong>da</strong>rim).<br />

Vamos retornar a este assunto (cap.23).<br />

20.3 Logofóricos<br />

Usam-se com verbos de falar. Marcam correferência entre o sujeito <strong>do</strong> verbo<br />

logofórico (o falante) e um <strong>do</strong>s argumentos expressos no conteú<strong>do</strong>. Pode ter uma<br />

partícula que indica logoforici<strong>da</strong>de.<br />

134


Gokana (Nigéria)<br />

(276) Lébàreè k aè d-<br />

Lebare que ele Caiu-LOG<br />

Lebare disse que ele (mesmo) caiu.<br />

(277) Lébàreè k aè d<br />

Lebare disse que ele (um outro) caiu.<br />

20.4 Seqüenciais<br />

Indicam que o S <strong>da</strong> oração que segue é o mesmo que o <strong>da</strong> oração anterior. Estas<br />

partículas foram encontra<strong>da</strong>s na África e na Nova Guiné, e em kashaya que é uma língua<br />

indígena nos EUA:<br />

Kashaya (EUA):<br />

(278) cabícba cadu′<br />

ele i se levantou e ele i voou<br />

(o mesmo pássaro) se levantou e foi embora voan<strong>do</strong><br />

(279) cabí′li cadu′<br />

ele i se levantou e ele k voou<br />

ele (um pássaro) se levantou e (um outro pássaro) voou<br />

Na língua kashaya to<strong>da</strong> uma série de marca<strong>do</strong>res indicam este tipo de diferença.<br />

20.5 Ordem relativa <strong>da</strong>s orações<br />

Na África geralmente a primeira oração <strong>da</strong> série é marca<strong>da</strong> para indicar se o S que<br />

segue é idêntico ou diferente. Na Nova Guiné é o contrário, a marca é na última oração:<br />

Managalasi (Nova Guiné):<br />

135


(280) ape-na ro-a va-′e; ′osanana-ma hij-uta<br />

Peguei e i cheguei e i fui e i (SS) arapuca-e i (1S) ficar-<br />

passa<strong>do</strong><br />

Peguei (a faca), cheguei, e fui; o ? ficou lá para pegar (pássaros).<br />

??<br />

Os primeiros três verbos são marca<strong>do</strong>s SS no último verbo; o tempo é indica<strong>do</strong> no<br />

último verbo <strong>da</strong> frase.<br />

Kaingang (Brasil):<br />

(281) ã tỹ ĩn ẽn tá Jun kỹ tóg kasĩn tén<br />

ele i por casa aquela lá chegou quan<strong>do</strong> ele i rato matou<br />

Quan<strong>do</strong> ele chegou em casa, matou um rato.<br />

(282) kasĩn tén tóg, ã tỹ Ĩn ẽn tá jun kỹ<br />

Rato matou ele i , dele i por casa aquela lá chegou<br />

quan<strong>do</strong><br />

Ele matou um rato quan<strong>do</strong> chegou naquela casa.<br />

A relação entre a oração principal e a subordina<strong>da</strong> não se vê na marcação <strong>do</strong> S <strong>da</strong><br />

principal. A reflexivi<strong>da</strong>de é marca<strong>da</strong> no agente <strong>da</strong> segun<strong>da</strong> oração que pelo pronome ã<br />

que indica S idêntico ao S <strong>da</strong> principal, e pela partícula kỹ no fim <strong>da</strong> segun<strong>da</strong>.<br />

20.6 Correferência entre outros participantes<br />

(283) ele gosta de carne<br />

(284) ele gosta de verduras<br />

(285) ele gosta de carne e de verduras<br />

(286) ele gosta de carne<br />

(287) ela gosta de carne<br />

136


(288) ele e ela, os <strong>do</strong>is gostam de carne<br />

(289) ele gosta de carne<br />

(290) ela não gosta de carne<br />

(291) ele gosta de carne, mas ela não (gosta)<br />

Em algumas línguas não é possível combinar orações que têm em comum outros<br />

participantes fora de S.<br />

21. Relações de mo<strong>do</strong> entre predica<strong>do</strong>s<br />

Numa frase composta de oração principal e subordina<strong>da</strong> a proposição principal<br />

pode exprimir possibili<strong>da</strong>de, incerteza. Quan<strong>do</strong> exprime incerteza o mo<strong>do</strong> é irreal.<br />

Quan<strong>do</strong> exprime certeza o mo<strong>do</strong> é real.<br />

21.1 Real<br />

No mo<strong>do</strong> real existem pelo menos quatro casos:<br />

21.1.1 causa-resulta<strong>do</strong><br />

(292) lavei a roupa porque estava suja<br />

21.1.2 Intenção-méto<strong>do</strong><br />

(293) peguei um táxi para chegar bem em casa<br />

21.1.3 Meios-conseqüência<br />

(294) esforçan<strong>do</strong>-me muito/esforcei-me muito e -- escrevi este livro<br />

21.1.4 Premissa-resulta<strong>do</strong><br />

(295) fiquei tão <strong>do</strong>ente que não podia chegar<br />

137


21.2 Irreal ou condicional<br />

Uma condição tem que ser cumpri<strong>da</strong> para obter o resulta<strong>do</strong>.<br />

21.2.1 Condição simples<br />

(296) se você me aju<strong>da</strong>r vou lhe <strong>da</strong>r alguma coisa<br />

Podem-se classificar avisos aqui, mas a razão de <strong>da</strong>r um aviso é o desejo de evitar<br />

uma conseqüência infeliz:<br />

Ex. se você chora vai acor<strong>da</strong>r o nenê!<br />

21.2.2 Condição hipotética<br />

Não tem pressuposição:<br />

(297) se ela fosse eu iria<br />

(298) se amanhã não chover vamos fazer aquele passeio<br />

(299) Kaingang:<br />

fi kãtĩg mũ ra, sóg tĩg mũ<br />

ela chegar (no caso) eu ir cont.<br />

se ela chegar (aqui) eu vou embora.<br />

21.2.3 Condição distributiva<br />

O falante oferece várias condições. Se só uma acontece o resulta<strong>do</strong> vai ocorrer.<br />

(300) se ele fala só uma palavra ou parece que vai recusar-me, eu vou<br />

mandá-lo embora.<br />

(301) mesmo sen<strong>do</strong> rápi<strong>da</strong> ela não conseguiu alcançá-lo<br />

21.2.4 Condição proporcional<br />

O grau em que a condição acontece.<br />

(302) quanto mais eles trabalham, mais ce<strong>do</strong> terminam<br />

(303) quanto mais trabalham menos eles conseguem<br />

138


21.2.5 condição contrária aos fatos<br />

Até agora apresentamos condições que devem acontecer para a ação ser<br />

executa<strong>da</strong>. Há, porém casos diferentes que são condições não realizáveis. Geralmente são<br />

expressos no tempo passa<strong>do</strong>.<br />

(304) se ele tivesse fugi<strong>do</strong>, eu teria i<strong>do</strong> atrás (mas ele não fugiu)<br />

(305) Kaingang:<br />

fi kãtĩg mũ ra, sóg tĩg mũ vẽ<br />

Ela chegar (no caso) eu ir cont. irreal<br />

se ela chegasse eu iria (mas não chegou)<br />

Por to<strong>da</strong>s estas situações há línguas que usam marca<strong>do</strong>res específicos.<br />

21.3 Interrogativas<br />

Em algumas culturas, fazer perguntas pode denotar falta de educação. Porém,<br />

to<strong>da</strong>s conhecem perguntas e respostas. Nem to<strong>da</strong>s as respostas são verbais. Há perguntas<br />

que pedem ação e são imperativas na sua intenção. Outras perguntas são retóricas e<br />

pedem atenção. E outras podem ser respondi<strong>da</strong>s mediante simples gestos.<br />

21.3.1 tipos de perguntas:<br />

− de informação: o falante pede uma informação que o ouvinte supostamente<br />

conhece. Ele, por sua vez, pode não responder, responder negativamente ou<br />

responder com outra pergunta.<br />

(306) Quem abriu a porta? -- Não fui eu.<br />

(307) Será que ele já veio? -- Você precisa dele?<br />

− de ação: pedem uma ação acompanha<strong>da</strong> ou não por uma resposta verbal. Pode ser<br />

uma maneira educa<strong>da</strong> de <strong>da</strong>r uma ordem. A resposta pode ser verbal: pode ser<br />

aceita, recusa<strong>da</strong> ou respondi<strong>da</strong> com uma outra pergunta.<br />

(308) Você poderia fechar esta porta, por favor?<br />

(309) Será que alguém tem uma caneta para me emprestar?<br />

139


− perguntas que chamam a atenção, chama<strong>da</strong>s de retóricas. Não se atende a uma<br />

resposta, mas quer-se influenciar a atitude <strong>do</strong> ouvinte.<br />

(310) Quer ver a casa? Um minutinho, por favor.<br />

(311) Por que ter me<strong>do</strong>? Não precisa!<br />

21.3.2 Perguntas e suas respostas<br />

Formalmente podem ser distingui<strong>do</strong>s quatro tipos: pergunta polar, de informação,<br />

de escolha, de confirmação.<br />

− perguntas polares recebem a resposta sim/não/não sei, normalmente segui<strong>da</strong> por<br />

uma explicação, uma outra pergunta, ou um gesto. Pode-se diferenciar entre uma<br />

pergunta neutra e uma que introduz um outro discurso e que atende a uma<br />

pergunta positiva ou negativa.<br />

(312) Já comeu? Comi/não/ain<strong>da</strong> não/hoje não... pergunta neutra<br />

(313) Não comeu ain<strong>da</strong>? Não/já (pergunta a que se espera uma<br />

resposta negativa)<br />

− pergunta de informação, usan<strong>do</strong> pronomes interrogativos designan<strong>do</strong> a<br />

informação deseja<strong>da</strong>. Muitas vezes recebem resposta de uma só palavra, <strong>da</strong>n<strong>do</strong> a<br />

informação.<br />

(314) a. Quem vai a ci<strong>da</strong>de esta vez? Maria.<br />

b. Que é que ela vai comprar? Bananas.<br />

c. Aonde ela vai? Ao supermerca<strong>do</strong> Big.<br />

d. Por que ela foi designa<strong>da</strong>? Porque tem tempo.<br />

e. Que carro ela vai usar? O meu.<br />

f. Quan<strong>do</strong> ela vai sair? Daí a pouco.<br />

g. Como ela conhece o caminho? Seguin<strong>do</strong> as indicações.<br />

140


− A pergunta de escolha oferece uma escolha à pessoa questiona<strong>da</strong>:<br />

(315) Gosta de café ou de chá?<br />

− a pergunta de confirmação, 'tag question' ou pergunta eco pode receber uma<br />

resposta positiva, negativa, ou 'não sei'. A resposta é similar àquela <strong>da</strong>s perguntas<br />

polares.<br />

(316) Você queria minha caneta, não é (isso)?<br />

(317) Ele gosta de você, né? Gosta, sim/não gosta não!<br />

Kaingang (Brasil):<br />

(318) ti ĩn m′? hỹ/vó/ha′<br />

dele casa Q-enfático Sim/não/não sei<br />

É a sua casa? (pergunta de confirmação)<br />

(319) ti ĩn mỹ vó? hỹ<br />

Esta é a sua casa, não é? (pergunta de confirmação, espera-se<br />

(320) ti ĩn mỹ v? vó<br />

resposta afirmativa)<br />

Esta não é a sua casa, é? (pergunta de confirmação, espera-se resposta<br />

negativa, também usa<strong>da</strong> para exprimir dúvi<strong>da</strong>)<br />

22 Relações temporais ou parafrásticas entre predica<strong>do</strong>s<br />

22.1 Temporais<br />

Neste estu<strong>do</strong> examinam-se três situações:<br />

141


22.1.1 Simultanei<strong>da</strong>de<br />

As ações se fazem simultaneamente. A segun<strong>da</strong> ação pode se fazer durante to<strong>do</strong> o<br />

tempo que se faz a primeira, ou somente durante parte deste tempo:<br />

evento A –– –– ––– ––– –––––<br />

evento B – – –<br />

– ––– –– – ––<br />

(321) Enquanto João estava trabalhan<strong>do</strong>, Pedro estava <strong>do</strong>rmin<strong>do</strong><br />

(totalmente simultâneo).<br />

(322) João foi para casa enquanto Pedro continuou a trabalhar<br />

(começaram juntos, terminaram em tempos diferentes).<br />

(323) Ele a encontrou no caminho e foi para casa para alertar sua<br />

esposa enquanto que ela voltou para a casa dela (as ações nem<br />

começam nem terminam juntas, mas coincidem no meio).<br />

(324) Ele estava trabalhan<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> ela lhe fez uma visita rápi<strong>da</strong> (as<br />

ações começam e terminam em tempos diferentes, mas coincidem<br />

numa parte, a ação de trabalhar dura mais <strong>do</strong> que a visita).<br />

(325) Ele quebrou a perna enquanto estava corren<strong>do</strong> (as ações<br />

começaram em tempo diferente, terminaram juntas).<br />

(326) Kaingang (Brasil):<br />

ā tĩg kỹ tóg fi vé<br />

dele ir quan<strong>do</strong> ele a viu<br />

Quan<strong>do</strong>/enquanto estava an<strong>da</strong>n<strong>do</strong> ele a viu.<br />

Em kaingang esta relação exprime-se com a posposição kỹ (que também indica<br />

que a primeira oração é subordina<strong>da</strong>); a primeira ação aconteceu durante a ação principal.<br />

22.1.2 Anteriori<strong>da</strong>de<br />

Uma ação se faz primeiro, a outra no fim dela ou depois.<br />

142


(327) ela foi antes deles começarem<br />

(328) ela tinha i<strong>do</strong> antes que eles começassem<br />

(329) ele tinha comi<strong>do</strong> antes <strong>da</strong> sua vin<strong>da</strong><br />

Kaingang:<br />

(330) ā tĩg kar kỹ tóg fi vé<br />

dele ir depois quan<strong>do</strong> ele a viu<br />

Ele a viu depois de partir.<br />

(331) ā tĩg to hā tóg fi vé<br />

22.1.3 Seqüência<br />

dele ir antes mesmo ele a viu<br />

Antes de partir ele a viu.<br />

As ações simplesmente seguem uma a outra.<br />

(332) ele terminou de comer e caiu na cama exausto<br />

(333) ela correu para casa, o mari<strong>do</strong> lhe contou os detalhes e os <strong>do</strong>is<br />

(334) Kaingang:<br />

se apressaram para chegar no hospital<br />

fi ve kỹ tóg tĩ mũ<br />

a ver quan<strong>do</strong>/porque ele ir narrativo<br />

Quan<strong>do</strong>/visto que ele a viu, ele foi embora.<br />

Em kaingang kỹ é usa<strong>do</strong> para exprimir tantas relações diferentes que só o contexto<br />

pode indicar o senti<strong>do</strong>.<br />

22.2 Paráfrase<br />

Na paráfrase o predica<strong>do</strong> junto com os argumentos são repeti<strong>do</strong>s de maneira<br />

idêntica ou por sinônimos:<br />

143


(335) Ele foi; depois de partir.....<br />

− a repetição pode ser por antônimo nega<strong>do</strong>:<br />

(336) ele resolveu partir, não queren<strong>do</strong> ficar mais<br />

− repetição por amplificação:<br />

(337) ele foi, desapareceu sem dizer uma palavra<br />

− a repetição pode ser um resumo <strong>da</strong>s ativi<strong>da</strong>des menciona<strong>da</strong>s:<br />

(338) eles cavavam por muito tempo, peneiravam a terra com to<strong>do</strong><br />

cui<strong>da</strong><strong>do</strong>, examinavam, <strong>da</strong>vam <strong>da</strong>tas, classificavam ca<strong>da</strong> objeto<br />

que eles encontravam, fazen<strong>do</strong> seu trabalho de arqueólogos<br />

22.3 Relações entre os predica<strong>do</strong>s<br />

Para examinar as relações enumera<strong>da</strong>s num texto será apresenta<strong>da</strong> uma tabela<br />

usan<strong>do</strong> o texto “As Abelhas Assassinas”. Essa tabela se orienta na tabela de base.<br />

por Ø.<br />

Se não existe uma conjunção, ligan<strong>do</strong> as orações ou frases, essa relação é indica<strong>da</strong><br />

Tabela 44<br />

Nr. Relações entre orações relações entre frases<br />

2 De repente: seqüência de 1<br />

3a Um dia: começo <strong>do</strong>s eventos<br />

3b Conteú<strong>do</strong> de 3a<br />

4a Ø: simultâneo com 3<br />

4b E: conseqüência de 4a<br />

5 Então: resulta<strong>do</strong> de 4<br />

6 Aí: resulta<strong>do</strong> de 5 indica nova fase<br />

7a Quan<strong>do</strong>: tempo de 7b 7a-b: seqüência de 6<br />

7b Ø: resulta<strong>do</strong> de 7a<br />

8a Introdução à citação 8b-9b Então: seqüência de 7<br />

8b Citação (b+c)<br />

8c Conteú<strong>do</strong> de 8b a+b: pergunta de informação<br />

9a Ø: 9a-b ação: planejamento<br />

9b conteú<strong>do</strong> de 9a<br />

10a Aí: nova fase de ações 10a+b<br />

10b E: seqüência de 10a<br />

144


10c até que: tempo de 10a-c<br />

11a Avaliação de 11b Avaliação de10<br />

11b Conteú<strong>do</strong> de 11a<br />

12 Por isso: resulta<strong>do</strong> de 10+11<br />

13a Introdução <strong>do</strong> novo episódio Então: seqüência de 10<br />

13b E: conseqüência de 13a, introdução de<br />

13c-14g<br />

13c Se: Condição de 13d-14g<br />

13d Não: proibição de 4b<br />

13e Pois: razão de 13d mu<strong>da</strong>nça de S<br />

14a Se: condição de 14b-c<br />

14b Não: negação de 14c<br />

14c Correferência com 14b<br />

14d se: condição de 14d-e mu<strong>da</strong>nça de S E: condição de 14a-c<br />

não: negação de 14e<br />

14e Correferência com 14d<br />

14f Mu<strong>da</strong>nça de S<br />

14g Até: agrupamento com 14ª-c<br />

Tais quadros permitem fazer generalizações sobre o uso (senti<strong>do</strong>) <strong>da</strong>s partículas<br />

usa<strong>da</strong>s para haver coesão de textos.<br />

23 Locução Verbal<br />

Até agora estu<strong>da</strong>ram-se as relações entre verbos sem discutir como tal construção<br />

pode ser interpreta<strong>da</strong> gramaticalmente. Será que há diferença entre um predica<strong>do</strong><br />

composto por mais de um verbo e uma seqüência de verbos onde ca<strong>da</strong> um constitui um<br />

predica<strong>do</strong>?<br />

23.1 Verbos com argumentos idênticos<br />

Quan<strong>do</strong> os argumentos são os mesmos esta série de verbos pode ser interpreta<strong>da</strong><br />

como um só predica<strong>do</strong>, especialmente quan<strong>do</strong> o argumento é o sujeito (ver 19-22).<br />

(339) seqüência ‘ele chegou e comeu’<br />

145


(340) simultanei<strong>da</strong>de ‘ele chegou comen<strong>do</strong>’<br />

(341) intenção ‘ele chegou para comer’<br />

(342) anteriori<strong>da</strong>de ‘ele tinha comi<strong>do</strong>’<br />

(343) conteú<strong>do</strong> ‘ele promete comer’<br />

(344) aspecto ‘ele começou a comer’<br />

(345) mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong>de ‘ele quer comer’<br />

(346) série veja exemplo <strong>do</strong> Yoruba<br />

(347) verbo auxiliar ‘ele vai comer’, ‘ele deveria comer’, ‘ele<br />

Podem ser identifica<strong>da</strong>s as seguintes combinações:<br />

− combinação de verbos flexiona<strong>do</strong>s: veio e gostou;<br />

está comen<strong>do</strong>’, ‘ele tem comi<strong>do</strong>’<br />

− verbo flexiona<strong>do</strong> + infinitivo: conseguiu comer, ia comer;<br />

− verbo flexiona<strong>do</strong> + gerúndio: saiu cantan<strong>do</strong>, estava cantan<strong>do</strong>;<br />

− verbo flexiona<strong>do</strong> + particípio: morreu afoga<strong>do</strong>, tinha afoga<strong>do</strong>;<br />

− verbo flexiona<strong>do</strong> + preposição + infinitivo: gosta de cantar, tem de cantar.<br />

Se um marca<strong>do</strong>r é repeti<strong>do</strong>, a relação é menos próxima <strong>do</strong> que se ele serve <strong>do</strong>is ou<br />

mais verbos sem repetição:<br />

Ele cantou e desapareceu (SI) – ele cantou e ele (um outro) desapareceu (SD).<br />

23.2 Verbos que podem mu<strong>da</strong>r de lugar<br />

Pergunta (21.3), tópico (27) e foco (28) muitas vezes são caracteriza<strong>do</strong>s por<br />

inversão <strong>da</strong> ordem de certos constituintes, seja por deslocamento à direita ou à esquer<strong>da</strong>.<br />

Para que <strong>do</strong>is verbos constituam uma locução os <strong>do</strong>is vão ter que ser desloca<strong>do</strong>s numa tal<br />

transformação.<br />

(348) Você tem que olhar e escutar bem – olhar e escutar bem é que<br />

você deve fazer.<br />

146


Kaingang (Brasil):<br />

(349) ti tỹ ti venh Tĩg vẽ<br />

ele por ele ver ir é<br />

Ele vai (para) vê-lo (explicação).<br />

Pode ser transforma<strong>do</strong> em:<br />

(350) ti tỹ ti venh tĩg mỹ Ha?<br />

ele por ele ver ir Q agora?<br />

Será que é agora que ele vai vê-lo?<br />

To<strong>da</strong>s as funções que precedem a partícula de pergunta mỹ são o tópico, o que<br />

segue é o comentário. To<strong>da</strong> a oração foi "desloca<strong>da</strong> à esquer<strong>da</strong>" nesta construção.<br />

23.3 Conjunções<br />

Quan<strong>do</strong> uma conjunção pode ser introduzi<strong>da</strong> entre <strong>do</strong>is verbos sem que a relação<br />

entre elas mude, a probabili<strong>da</strong>de é grande de que ca<strong>da</strong> verbo desta construção seja um<br />

predica<strong>do</strong>.<br />

(351) ele só come, bebe, vive como um animal<br />

(352) ele só come, bebe e vive como um animal<br />

(353) ele só come e bebe e vive como um animal<br />

(354) ele so come e bebe; vive como um animal<br />

23.4 Outras partículas<br />

A possibili<strong>da</strong>de de introduzir ou não uma partícula pode indicar se os verbos<br />

representam locuções diferentes ou uma só.<br />

147


(355) ele quer ir mas não: *ele quer que ir<br />

(356) ele tem que ir mas não: *ele tem ir<br />

23.5 Substituição por um pronome ou pró-verbo<br />

Certas combinações podem ser substituí<strong>da</strong>s, outras não.<br />

(357) Francês<br />

il veut aller —il le veut<br />

ele quer ir —ele o (a ação) quer<br />

Ele quer ir – ele quer fazê-lo.<br />

Em português precisa-se usar um pró-verbo para substituir o específico, em<br />

francês pode usar o artigo. A construção em francês provavelmente não contém uma<br />

locução verbal.<br />

23.6 Gramaticalização<br />

Alguns verbos ou combinações de verbos podem ser defectivos, o que pode ser<br />

sinal de um processo de gramaticalização. Provavelmente indica que esta seqüência é<br />

uma locução e não uma oração. Isto pode acontecer com verbos auxiliares.<br />

(358) ele admira orquídeas orquídeas são admira<strong>da</strong>s orquídeas<br />

são para<br />

serem<br />

admira<strong>da</strong>s<br />

(359) ele tem orquídeas *orquídeas são ti<strong>da</strong>s *orquídeas<br />

são para<br />

serem ti<strong>da</strong>s<br />

148


É comum encontrar verbos defectivos que mostram um processo de<br />

gramaticalização, isto pode significar que eles estão perden<strong>do</strong> sua “verbali<strong>da</strong>de” e a<br />

caminho de se tornarem partículas. Em português são os verbos auxiliares, especialmente<br />

estar, haver, ser, ter.<br />

149


Enre<strong>do</strong><br />

24. Organização <strong>da</strong>s partes de textos<br />

Na introdução falamos de textos narrativos e como diferem de textos de outros<br />

gêneros, as partes típicas <strong>do</strong> enre<strong>do</strong> e como estudá-las arranja<strong>da</strong>s numa tabela de base.<br />

Nas partes III e IV explicamos as estruturas verbais. Agora apresentamos o arranjo típico<br />

<strong>da</strong> informação nos textos narrativos.<br />

Um texto pode ser composto de vários episódios, dividi<strong>do</strong>s pelo tempo em que<br />

ocorrem, o lugar onde os eventos se fazem, os participantes que os fazem, ou uma<br />

combinação destes três. Isso depende <strong>do</strong> que é preeminente no texto.<br />

Nem to<strong>da</strong>s as partes têm a mesma preeminência. Na introdução tipicamente<br />

encontram-se informações sobre o tempo, o lugar, os participantes principais e<br />

circunstâncias iniciais <strong>da</strong> narrativa. No desenvolvimento encontram-se as ações <strong>do</strong>s<br />

participantes e as circunstâncias que mu<strong>da</strong>m.<br />

24.1 Tempo<br />

Um texto orienta<strong>do</strong> pelo tempo mostra como as ações se desenvolvem no decorrer<br />

<strong>do</strong> tempo. Começa em um tempo defini<strong>do</strong> e ca<strong>da</strong> parte ocorre em um tempo específico.<br />

Podia começar assim:<br />

(360) "Vai fazer <strong>do</strong>is anos que fiquei muito <strong>do</strong>ente."<br />

Um texto que começa assim, provavelmente, continua <strong>da</strong>n<strong>do</strong> detalhes sobre a<br />

<strong>do</strong>ença, mas também sobre o que aconteceu em outras épocas, sen<strong>do</strong> orienta<strong>do</strong><br />

principalmente pelo tempo.<br />

150


Tabela 45: Exemplo As Abelhas Assassinas:<br />

Nr. Tempo: geral Tempo: específico<br />

1 antigamente<br />

2 de repente<br />

3-4 um dia<br />

5-6 Então<br />

7 quan<strong>do</strong> vieram à tona<br />

8-9 Então<br />

10a-b Aí<br />

10c até que elas as deixaram<br />

13-14 Então<br />

Na introdução o texto é situa<strong>do</strong> numa época geral: "antigamente", o começo é<br />

assinala<strong>do</strong> por "de repente". Em 3 uma série de ações é situa<strong>da</strong> pela indicação de "um<br />

dia". Os eventos seguem naquele mesmo dia de maneira geral por "então" e "aí". Um<br />

momento específico é "quan<strong>do</strong> vieram à tona" e um outro "até que elas (as abelhas) as<br />

deixaram". O episódio final é seqüência <strong>do</strong>s momentos anteriores, indica<strong>do</strong> por "então".<br />

24.2. Lugar<br />

Os acontecimentos se desenrolam em certos lugares, como se vê na tabela <strong>do</strong><br />

texto As Abelhas Assassinas:<br />

Tabela 46:<br />

Nr. Lugar: 1 Lugar: 2<br />

1-5 no rio Urucauá<br />

6-10 na água<br />

7-8 à tona<br />

9-10 debaixo <strong>da</strong> canoa<br />

13-14 para casa<br />

Esse texto menciona um lugar geral: no primeiro episódio tu<strong>do</strong> se passa no rio<br />

Urucauá, e especificamente "na água, à tona, debaixo <strong>da</strong> canoa". No segun<strong>do</strong> episódio as<br />

151


crianças voltam para casa, provavelmente perto <strong>do</strong> rio, mas certamente não na água. Nos<br />

<strong>do</strong>is lugares os eventos são bem diferentes, de acor<strong>do</strong> com a localização.<br />

Em maxacali (Minas Gerais) to<strong>do</strong> o sistema referencial mu<strong>da</strong>: na locali<strong>da</strong>de<br />

principal os marca<strong>do</strong>res são diferentes <strong>do</strong> <strong>da</strong>s locali<strong>da</strong>des periféricas e ain<strong>da</strong> diferentes no<br />

caminho de um lugar para outro.<br />

24.3 Participantes<br />

Os textos que são orienta<strong>do</strong>s segun<strong>do</strong> os participantes mu<strong>da</strong>m dependen<strong>do</strong> <strong>da</strong><br />

presença ou ausência de participantes (ver a tabela de participantes 6.4). O narra<strong>do</strong>r pode<br />

enfocar um <strong>do</strong> grupo mais <strong>do</strong> que outros; as dimensões de tempo e lugar podem ser de<br />

menos importância. Por exemplo, o narra<strong>do</strong>r pode se concentrar num participante, depois<br />

enfocar um outro que está num lugar diferente. Assim a orientação de um texto pode ser<br />

de tempo, de lugar, (ou uma outra parte, se o texto for longo) ou de participantes.<br />

Os participantes podem ser introduzi<strong>do</strong>s formalmente, como no texto As Abelhas<br />

Assassinas, onde a vin<strong>da</strong> surpreendente <strong>da</strong>s abelhas que antigamente não existiam é<br />

claramente expressa. As crianças, por outro la<strong>do</strong>, são apenas menciona<strong>da</strong>s, mesmo sen<strong>do</strong><br />

elas as vence<strong>do</strong>ras <strong>da</strong> batalha entre elas e as abelhas. Quanto aos membros <strong>da</strong> família,<br />

eles nem são participantes ativos, mas são adereços.<br />

24.4 Textos não-narrativos<br />

Não-narrativos geralmente são orienta<strong>do</strong>s pelo tema (ver 1.3.5). A orientação<br />

depende <strong>do</strong> tipo <strong>do</strong> texto e a intenção <strong>do</strong> autor. Segue uma lista de uni<strong>da</strong>des muitas vezes<br />

encontra<strong>da</strong>s em textos de instruções, explicações e de comportamento, trata<strong>do</strong>s nos<br />

capítulos 34-36.<br />

Instruções prescritivas<br />

− passos ou estágios para alcançar o alvo<br />

− problemas e soluções no processo de alcançá-lo<br />

Instruções descritivas<br />

152


− experiências e reações<br />

− situações e resulta<strong>do</strong>s<br />

− problemas e soluções (geralmente)<br />

Exposição de explicação<br />

− problemas e soluções<br />

− princípios e aplicações<br />

− evidências e inferências<br />

− justificações e alegações<br />

Exposição de descrição<br />

− problemas e situações<br />

− crenças ou emoções<br />

Comportamento<br />

− problemas<br />

− conselhos<br />

− motivações<br />

25. Tipos de informação<br />

Na introdução muitas vezes podem achar-se informações sobre a orientação geral<br />

<strong>do</strong> texto. Outras partes <strong>do</strong> texto orientam-se no desenvolvimento <strong>do</strong> tema, ou numa<br />

narração no desenvolvimento <strong>do</strong>s eventos. Um outro tipo de informação pode ser<br />

denomina<strong>do</strong> de informações paralelas que apresentam o texto na sua situação particular<br />

e aju<strong>da</strong>m a compreendê-lo. Podem identificar-se as distinções seguintes:<br />

25.1 A linha <strong>do</strong> tema<br />

São to<strong>do</strong>s os predica<strong>do</strong>s que levam adiante o tema central <strong>do</strong> texto. As outras<br />

informações se agrupam ao re<strong>do</strong>r dele. Nas narrativas são os eventos que levam a história<br />

adiante. A situação é similar para textos de instruções. Nem to<strong>do</strong>s os eventos fazem parte<br />

<strong>do</strong> tema. Alguns contêm informações paralelas.<br />

153


Tabela 47:<br />

1a No dia <strong>da</strong> feira Coelho levantou ce<strong>do</strong><br />

1b e pegou sua foice.<br />

2a Sain<strong>do</strong> <strong>da</strong> casa,<br />

2b ele seguiu o trilho para o morro,<br />

2c onde ele achou seu lugar<br />

2d e começou a roçar.<br />

Os verbos levam a história adiante, talvez com exceção de sain<strong>do</strong> que pode ser<br />

conti<strong>do</strong> no verbo pegou e neste caso seria colateral.<br />

Nos textos explicativos e hortativos a linha <strong>do</strong> tema é constituí<strong>da</strong> por<br />

argumentos. Narrativas podem ser usa<strong>da</strong>s para ilustração, mas são informação paralela.<br />

Nos textos de gênero descritivo, as descrições, informação paralela num texto narrativo,<br />

constituem a linha <strong>do</strong> tema.<br />

Os verbos na linha <strong>do</strong> tema muitas vezes são marca<strong>do</strong>s com afixos de tempo ou<br />

outra informação que difere <strong>do</strong>s que contêm informação paralela.<br />

25.2 Informação paralela<br />

To<strong>do</strong>s os predica<strong>do</strong>s fora <strong>da</strong> linha <strong>do</strong> tema são informação paralela. Distinguimos<br />

oito tipos: retrospecção, projeção, descrição, citação, informação colateral, cenário,<br />

informação pragmática e foco.<br />

25.2.1 Retrospecção<br />

To<strong>do</strong>s os eventos anteriores à linha <strong>do</strong> tema.<br />

Tabela 48:<br />

Hoje Pedro vai ao riacho.<br />

Ele an<strong>da</strong> rapi<strong>da</strong>mente,<br />

porque ele se lembra<br />

o que aconteceu um mês atrás.<br />

Naquele dia ele tinha encontra<strong>do</strong> uma onça.<br />

“Aonde vai tão ce<strong>do</strong>, homenzinho?”<br />

154


“E…e…eu…” ele tinha gagueja<strong>do</strong><br />

antes de começar a fugir em pânico.<br />

Assim hoje ele prefere<br />

evitar este tipo de encontro.<br />

Este episódio é parte de uma narrativa, é seu pano de fun<strong>do</strong>. Conta o que tinha<br />

aconteci<strong>do</strong> antes. Note as formas <strong>do</strong> verbo.<br />

25.2.2 Projeção<br />

É o contrário <strong>do</strong> "pano de fun<strong>do</strong>" (flashback), olha para o futuro:<br />

Tabela 49:<br />

O pequeno olhou a fruta com inveja.<br />

Mas ele não podia comprá- la<br />

porque Ø era pobre.<br />

Mas ele não se desesperou.<br />

“Por que me queixar?”<br />

ele pensou.<br />

“Amanhã meu tio vai me <strong>da</strong>r dinheiro.<br />

Vou comprar um, talvez <strong>do</strong>is, até mesmo cinco.<br />

Hurra!”<br />

O menino olha para o futuro. Tal projeção não é parte <strong>da</strong> linha <strong>do</strong>s eventos, mas<br />

aqui de fato ela faz a história.<br />

25.2.3 Descrição<br />

Certos predica<strong>do</strong>s descrevem uma ação. Podem ser os hábitos <strong>do</strong>s participantes, a<br />

situação, um lugar. Assim, a narrativa pode ser aprecia<strong>da</strong>. Os marca<strong>do</strong>res de aspecto<br />

muitas vezes são diferentes <strong>do</strong>s que desenvolvem a linha <strong>do</strong>s eventos visto que a situação<br />

geralmente dura um tempo maior.<br />

Na história As Abelhas Assassinas, elas são introduzi<strong>da</strong>s com um verbo no<br />

pretérito imperfeito nega<strong>do</strong>: antigamente não tinha abelhas assassinas. É o único<br />

predica<strong>do</strong> no imperfeito.<br />

155


25.2.4 Citações<br />

Elas geralmente são textos encaixa<strong>do</strong>s dentro <strong>do</strong> texto principal. Existem vários<br />

estilos (ver 26). O conteú<strong>do</strong> muitas vezes é no presente, forma bem diferente <strong>do</strong>, <strong>da</strong> linha<br />

de eventos. Os participantes tornam-se falantes e ouvintes em vez de agentes.<br />

narrativas.<br />

As citações podem ser monólogos ou diálogos cujas estruturas diferem <strong>da</strong>s<br />

Os verbos, que introduzem as citações, fazem parte <strong>da</strong> linha <strong>do</strong>s eventos.<br />

Em muitas línguas os verbos dizer, pensar, sentir são um grupo especial com<br />

características diferentes <strong>do</strong>s outros verbos.<br />

As citações devem ser marca<strong>da</strong>s nas tabelas de base para poder estudá-las<br />

separa<strong>da</strong>mente <strong>do</strong> texto.<br />

25.2.5 Informação colateral<br />

É o que não aconteceu, como nos negativos. No texto As Abelhas Assassinas<br />

ocorre cinco vezes. Já na introdução há o contraste entre o tempo em que este tipo não<br />

exitia e hoje. O negativo também faz parte <strong>da</strong> opinião que o falante exprime sobre a ação<br />

<strong>da</strong>s crianças. E faz parte integral <strong>do</strong> conselho que elas dão aos membros <strong>da</strong> família.<br />

Nenhum deles faz parte <strong>da</strong> linha <strong>do</strong>s eventos.<br />

25.2.6 Cenário<br />

Contém informações sobre o tempo, o lugar, e os participantes. Ca<strong>da</strong> episódio,<br />

ca<strong>da</strong> parágrafo pode ter um cenário próprio. To<strong>da</strong> uma descrição pode ser cenário. Em<br />

outros textos o cenário pode ser bem simples. No texto As Abelhas Assassinas o cenário<br />

é extenso. As abelhas são introduzi<strong>da</strong>s com duas frases: Antigamente não existiam, de<br />

repente apareceram. As crianças são introduzi<strong>da</strong>s como cenário separa<strong>do</strong> <strong>do</strong> primeiro<br />

episódio: um dia duas crianças...<br />

25.2.7 Informação pragmática<br />

A interação entre o narra<strong>do</strong>r e seus ouvintes/leitores, explicações sobre a razão <strong>do</strong><br />

texto, avaliações sobre os participantes ou suas ações, perguntas retóricas, cantos etc. No<br />

texto <strong>da</strong>s abelhas o narra<strong>do</strong>r dá sua opinião sobre o plano de defesa <strong>da</strong>s crianças – que é<br />

informação pragmática.<br />

156


25.2.8 Foco<br />

situações.<br />

O narra<strong>do</strong>r pode comentar ou enfocar certas informações para <strong>da</strong>r ênfase a certas<br />

(361) Desde ontem chove. Que chuva! Um dilúvio!<br />

A repetição e a reformulação enfatizam a chuva extraordinária. Outros meios<br />

serão apresenta<strong>do</strong>s no capítulo 30.<br />

25.3 Tabela de informações<br />

To<strong>da</strong>s estas informações se encontram na tabela de base. Para melhor ver o<br />

desenvolvimento, pode-se construir uma tabela de informações. Vamos apresentar um<br />

modelo à base <strong>do</strong> texto As Abelhas Assassinas/narrativa. Os participantes são abrevia<strong>do</strong>s:<br />

A – abelhas<br />

C – crianças<br />

CA – canoa<br />

F – família (em casa)<br />

26. Citação<br />

Nos textos, especialmente nos narrativos ou explicativos, o autor cita as palavras<br />

de um <strong>do</strong>s participantes. Para esse fim, muitas línguas oferecem vários estilos de citação.<br />

Sempre são textos dentro <strong>do</strong> texto, mas seguem as suas próprias regras.<br />

26.1 As partes<br />

Sempre é preciso considerar três partes:<br />

− a fala atual (A) em que a citação se faz<br />

− a fala original (O) que está sen<strong>do</strong> cita<strong>da</strong><br />

− o conteú<strong>do</strong> <strong>da</strong> fala (C) – o que foi dito e está sen<strong>do</strong> cita<strong>do</strong><br />

157


Ca<strong>da</strong> situação destas tem os seus participantes: um é o falante (F), outro o<br />

ouvinte (V), e outro o paciente (P) de quem se trata. Tratamos os participantes <strong>da</strong> fala<br />

atual de FA, VA, PA, e os participantes <strong>da</strong> fala cita<strong>da</strong> de FC, VC, PC. Estes ocorrem no<br />

conteú<strong>do</strong>.<br />

Quan<strong>do</strong> a orientação é para a situação atual, o falante é eu ou 1 para indicar a<br />

primeira pessoa, o ouvinte é você /tu ou 2 para indicar a segun<strong>da</strong> pessoa, e o sujeito <strong>da</strong><br />

fala é ele ou ela ou 3 para a terceira pessoa.<br />

A identi<strong>da</strong>de destas pessoas pode ser a mesma de uma situação <strong>do</strong> falar para uma<br />

outra, ou podem ser pessoas diferentes, ou podem ser parcialmente idênticas. O falante<br />

atual pode citar as suas próprias palavras, ou as palavras de um outro (presente ou<br />

ausente). Estas diferenças regem o uso <strong>do</strong>s pronomes e fazem a diferença entre discurso<br />

direto e indireto.<br />

A situação atual sempre é a presente e geralmente nem ocorre na fala. Mas, deve<br />

ser considera<strong>da</strong> na análise.<br />

Falante e ouvinte(s) são geralmente identifica<strong>do</strong>s antes de exprimir o conteú<strong>do</strong> <strong>da</strong><br />

fala. Nem sempre to<strong>do</strong>s ocorrem na mesma citação, mas em outro lugar <strong>do</strong> texto. Se nem<br />

o falante nem o ouvinte são identifica<strong>do</strong>s e as citações são diretas, <strong>da</strong>í é drama. Se a<br />

citação é indireta, é chama<strong>da</strong> de discurso indireto livre. Se o falante e talvez também o<br />

ouvinte são identifica<strong>do</strong>s e a citação é direta, é discurso direto; se a citação é indireta, o<br />

discurso é indireto. No ponto culminante de um texto a citação direta sem identificação<br />

<strong>do</strong> falante pode indicar o ponto com a maior tensão.<br />

26.2 <strong>Discurso</strong> direto<br />

O falante atual (FA) repete as palavras exatas <strong>do</strong> falante original (FO). O<br />

conteú<strong>do</strong> está orienta<strong>do</strong> para a situação original, assim a situação e o conteú<strong>do</strong> original<br />

são menciona<strong>do</strong>s, a situação atual não está sen<strong>do</strong> considera<strong>da</strong>. É a introdução que indica<br />

que é citação.<br />

(362) João falan<strong>do</strong> com o filho Pedro.<br />

__ Ontem eu encontrei o pai de Alberto e falei ao pai dele: “Vou<br />

visitá-lo amanhã com meu filho Pedro”.<br />

158


__ Eu sei, pai. Você me disse: “Vamos ver o pai de Alberto”. Eu<br />

encontrei Alberto e sei também que ele já falou ao seu pai: “Fique<br />

em casa amanhã e nos espere”.<br />

(363) Falei (FA=FO) ao pai dele: (PA=VO) "vou (FO=FA) visitá-lo (VO)<br />

amanhã com meu filho Pedro (PO) .<br />

(364) Você (VA=FO) me (FA=VO) disse: "vamos (VO+FO) ver o pai de<br />

Alberto (PO) ."<br />

(365) ...ele (PA=FO) já falou ao seu pai (PA=VO): "Fique (PA=VO) em casa<br />

amanhã e<br />

nos (FO+PO=FA+VA) espere."<br />

26.3 <strong>Discurso</strong> indireto<br />

O falante não repete as palavras atuais <strong>do</strong> falante original. O conteú<strong>do</strong> está<br />

orienta<strong>do</strong> para a situação atual, não para a original. Assim, os pronomes se orientam no<br />

texto atual.<br />

(366) João falan<strong>do</strong> com o filho Pedro.<br />

__ Ontem eu encontrei o pai de Alberto e falei para ele que irei<br />

visitá-lo amanhã com você.<br />

__ Eu sei, pai. Você já me disse que nós iremos vê-lo. Eu encontrei<br />

Alberto e sei também que ele já falou para seu pai que fique em<br />

casa amanhã e nos espere.<br />

(367) Ontem eu (FA) encontrei o pai (PA) de Alberto e falei (FA=FO) para<br />

ele (PA=VO) que irei (FA=FO) visitá-lo (PA=VO) amanhã com<br />

você (VA=PO) .<br />

(368) Você (VA) já me (FA) disse que nós (FA+VA) iremos vê-lo (VO=PA) .<br />

159


(369) Eu (FA) encontrei Alberto (PA) e sei (FA) também que ele (PA=FO) já<br />

indireto.<br />

falou para seu pai (PA=VO) que fique (VO=PA) em casa amanhã e<br />

nos (FA+VA) espere.<br />

Em português a partícula que se usa freqüentemente, mas nem sempre no discurso<br />

Em línguas com partículas logofóricas as identi<strong>da</strong>des <strong>do</strong>s participantes <strong>do</strong><br />

discurso original, que normalmente não são importantes nos discursos indiretos, são<br />

claramente referencia<strong>do</strong>s junto com os participantes atuais. Esta é a situação em muitas<br />

línguas na África.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, existem línguas sem discurso indireto, usan<strong>do</strong> unicamente o direto<br />

(há alguns casos de implícito). O kaingang (Brasil) é uma dessas.<br />

26.4 <strong>Discurso</strong> implícito<br />

O discurso implícito ocorre quan<strong>do</strong> parte <strong>do</strong> texto atual permanece subentendi<strong>do</strong>.<br />

O conteú<strong>do</strong> em si é pouco perceptível. Em português o conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> predica<strong>do</strong> quase<br />

desaparece no texto numa combinação de um verbo com outro no infinitivo.<br />

(370) Eu lhe prometi chegar ce<strong>do</strong>.<br />

(371) Ele queria muito vê-lo.<br />

Ou pode ser uma combinação de um verbo com um substantivo na função de<br />

objeto:<br />

(372) Ele pediu comi<strong>da</strong>.<br />

(373) Ele esperou a sua chega<strong>da</strong>.<br />

26.5 Diferenças<br />

As diferenças entre discursos diretos, indiretos e implícitos se vêem no uso <strong>do</strong>s<br />

pronomes e nas formas <strong>do</strong>s verbos:<br />

160


(374) Ele disse: "venho amanhã." (direto)<br />

(375) Ele disse que viria amanhã. (indireto)<br />

(376) Ele decidiu vir amanhã. (implícito)<br />

A orientação <strong>do</strong> tempo pode mu<strong>da</strong>r:<br />

(377) Ele disse: "venho amanhã." (direto)<br />

(378) Ele disse que viria no dia seguinte. (indireto)<br />

(379) Ele prometeu vir no dia seguinte. (implícito)<br />

Pode ser necessário introduzir certas conjunções. A partícula que serve para<br />

introduzir discurso indireto, não se usa no direto em português.O se pode ser usa<strong>do</strong> para<br />

perguntas indiretas:<br />

(380) Ele perguntou: "você também vem?" (direto)<br />

(381) Ele perguntou se ela também viria. (indireto)<br />

Em certas línguas <strong>da</strong> África – como também no grego koiné – o equivalente de<br />

que se usa tanto no discurso direto como no indireto e não serve para distingui-los. De<br />

fato esta partícula pode-se usar em vez <strong>do</strong> verbo.<br />

26.6 <strong>Discurso</strong> semi-direto<br />

Forma encontra<strong>da</strong> na África, mas é muito estranha para europeus:<br />

(382) Roberto i falou para ela k que ele i vai ver você k amanhã<br />

Observação:<br />

− a marca i em Roberto e ele significa que eles são a mesma pessoa<br />

− a marca k em ela e você também indicam a mesma pessoa<br />

161


Parece ser uma combinação de estilos, mas lá não é erra<strong>do</strong>. Começa com indireto<br />

e termina em direto. Uma outra explicação seria que tu<strong>do</strong> é direto, mas o falante se refere<br />

na 3a. pessoa, coisa comum na África.<br />

26.7 <strong>Discurso</strong> encaixa<strong>do</strong><br />

Um falante pode citar um outro falante que cita um outro:<br />

(383) O pai dela lhe disse para dizer ao seu amigo: "pode vir sem<br />

problema." (direto dentro de implícito).<br />

(384) O pai dela lhe disse para convidá-lo a fazer uma visita. (implícito<br />

dentro de indireto).<br />

26.8 Introduzir os discursos<br />

A introdução às citações não pode ser feita com qualquer verbo. Geralmente<br />

pertence à classe de verbos coo a <strong>do</strong> verbo falar, pensar, sentir (ver capítulo 23). Em<br />

kaingang somente um verbo se usa para introduzir citações, o verbo he 'dizer'. Muitas<br />

emoções se exprimem com a aju<strong>da</strong> deste verbo.<br />

(385) "hỹ mỹ vỹ?" he tóg.<br />

sim pergunta ver<strong>da</strong>de? diz ele<br />

ele duvi<strong>da</strong><br />

Em outras línguas certos verbos usa<strong>do</strong>s para discurso implícito não podem ser<br />

usa<strong>do</strong>s para introduzir discurso direto:<br />

(386) Ela sentia que não deveria ir -- *ela sentia: "não vai!" -- *ela<br />

é obrigatória.<br />

sentia de não ir<br />

Há línguas (na África) onde a presença de um verbo de introdução ao discurso não<br />

162


(387) Tupuri (Camarões):<br />

Pl ri gá s l′→ Pl gá s l′→ Pl ri s l<br />

Paulo disse que LOG caiu Paulo que LOG caiu Paulo disse LOG Caiu<br />

Paulo disse que ele (Paulo) caiu.<br />

<strong>Discurso</strong> implícito sempre é introduzi<strong>do</strong>. <strong>Discurso</strong> direto não introduzi<strong>do</strong> é drama.<br />

<strong>Discurso</strong> indireto pode ser usa<strong>do</strong> sem introdução como reflexões.<br />

(388) Será que ele acharia o lugar? Fazia tanto tempo que ele não tinha<br />

i<strong>do</strong> lá!<br />

Observação: Em português a expressão será que nos leva a refletir.<br />

26.9 Testemunhas<br />

Um participante <strong>do</strong> discurso indireto pode ter esta<strong>do</strong> presente no discurso original.<br />

Neste caso ele é testemunha ocular <strong>do</strong> acontecimento. Este fato pode ser transmiti<strong>do</strong> por<br />

uma partícula.<br />

Kaingang (Brasil):<br />

(389) kỹ ti nẽji: “ha tĩg!” hé.<br />

então ele ouvi falar “vai!” disse<br />

(390) kỹ ti: “ha tĩg!” he Hỹn.<br />

então ele “vai!” disse parece que<br />

(391) kỹ ti: “ha tĩg!” he mỹr.<br />

então ele “vai!” disse com certeza<br />

163


26.10 Funções<br />

O discurso indireto pode ter várias funções diferentes para ca<strong>da</strong> língua. Muitas<br />

vezes o discurso direto é usa<strong>do</strong> para reportagem objetiva, informação de primeiro plano.<br />

O discurso indireto é usa<strong>do</strong> mais para uma reportagem sumária. <strong>Discurso</strong> direto não<br />

identifica<strong>do</strong> se usa para obter um efeito dramático. O discurso indireto livre usa-se na<br />

literatura para reflexão.<br />

Muitas línguas ameríndias quase não usam outro estilo fora <strong>do</strong> discurso direto.<br />

Este por sua vez pode ser encaixa<strong>do</strong> em muitas caixas dentro de caixas, dentro de outras<br />

caixas. A maior parte <strong>do</strong>s verbos como falar, pensar e sentir são <strong>do</strong> discurso direto.<br />

Kaingang (Brasil)<br />

(392) “hỹ mỹ vỹ?” he tóg<br />

“sim Q ver<strong>da</strong>de?” diz ele<br />

“Será que é ver<strong>da</strong>de?” ele disse—ele duvi<strong>do</strong>u.<br />

(393) “hã vẽ,” he tóg<br />

“assim é,” disse ele<br />

“É assim,” ele falou—ele acreditou.<br />

Como são usa<strong>do</strong>s vários tipos de discurso, eles devem ser estu<strong>da</strong><strong>do</strong>s com muitos<br />

textos bem construí<strong>do</strong>s. Histórias e literatura fictícia pode ser um tipo; ver<strong>da</strong>des e<br />

reportagens outro. <strong>Discurso</strong> direto pode ser um para a linha <strong>do</strong>s eventos, outro para<br />

cenários, outro para pontos culminantes.<br />

164


27. Tópico<br />

As informações que fazem o texto não têm to<strong>da</strong>s a mesma importância. Certas<br />

partes enfoca<strong>da</strong>s são como pontos de referência em re<strong>do</strong>r <strong>do</strong>s quais outras informações se<br />

agrupam.<br />

A enfocação pode se estender a um constituinte <strong>da</strong> oração, to<strong>da</strong> a oração, to<strong>da</strong><br />

uma frase e até a um parágrafo inteiro. Para a análise de textos, uma informação está em<br />

foco quan<strong>do</strong> um <strong>do</strong>s eventos é de maior importância nesse texto.<br />

Existem quatro estratégias para enfocar:<br />

− focalizan<strong>do</strong> uma informação nova<br />

− desfocalizan<strong>do</strong> um constituinte <strong>da</strong> oração, assim <strong>da</strong>n<strong>do</strong> mais ênfase aos<br />

outros constituintes.<br />

− topicalizan<strong>do</strong> uma informação já conheci<strong>da</strong><br />

− parcialmente ou totalmente afirman<strong>do</strong>, negan<strong>do</strong> ou mu<strong>da</strong>n<strong>do</strong> informação que é<br />

27.1 Extensão<br />

uma reação à informação <strong>da</strong><strong>da</strong>.<br />

Uma ou duas informações podem estar em foco. Alguns constituintes<br />

naturalmente têm mais importância que outros, por exemplo, o sujeito. A importância<br />

natural pode ser modifica<strong>da</strong> por meios lingüísticos. A importância pode ser aumenta<strong>da</strong> ou<br />

diminuí<strong>da</strong>, assim mu<strong>da</strong>n<strong>do</strong> a estrutura inerente. To<strong>do</strong>s esses meios têm um efeito gradual,<br />

efetuan<strong>do</strong> graus de importância em relação de um ao outro.<br />

(394) O júri decidiu <strong>da</strong>r o primeiro prêmio para João.<br />

(395) Foi para João que o júri decidiu <strong>da</strong>r o primeiro prêmio.<br />

(396) Foi para João que eles decidiram <strong>da</strong>r o primeiro prêmio.<br />

(397) João recebeu o primeiro prêmio.<br />

(398) O primeiro prêmio foi para João.<br />

(399) O primeiro prêmio, este foi para João.<br />

165


Em to<strong>do</strong>s estes exemplos a parte enfoca<strong>da</strong> é o primeiro constituinte <strong>da</strong> frase que<br />

geralmente é o tópico. Em a. o júri é sujeito e assim enfoca<strong>do</strong>, João é informação nova<br />

que também é enfoca<strong>da</strong>. Em b. a nova informação foi desloca<strong>da</strong> à esquer<strong>da</strong>, tornou-se<br />

tópico e assim passou a ser a informação mais importante <strong>da</strong> frase. Em c. o sujeito foi<br />

desfocaliza<strong>do</strong> mais ain<strong>da</strong> pela referência pronominal. Em d. to<strong>da</strong> a estrutura <strong>da</strong> frase é<br />

mu<strong>da</strong><strong>da</strong>: João é sujeito e assim em foco, e talvez o primeiro prêmio por ser informação<br />

nova. Em e. a estrutura é idêntica a a. e talvez d., mas os constituintes foram<br />

transforma<strong>do</strong>s mu<strong>da</strong>n<strong>do</strong> o foco. O objeto de a.-d. agora é sujeito num passivo<br />

transforma<strong>do</strong>: o prêmio foi <strong>da</strong><strong>do</strong> a João ---> foi para João. Em f. o objeto transforma<strong>do</strong><br />

em sujeito é preposto e assim mais em foco <strong>do</strong> que em e. Também é repeti<strong>do</strong> por aquele.<br />

Outros constituintes <strong>da</strong> oração podem ser enfoca<strong>do</strong>s, mu<strong>da</strong>n<strong>do</strong> o mo<strong>do</strong> <strong>do</strong> verbo,<br />

usan<strong>do</strong> advérbios, adjetivos, números etc.<br />

(400) Fredi ain<strong>da</strong> não comeu, mas ele o fará.<br />

(401) Ele não (somente) foi rápi<strong>do</strong>, foi rápi<strong>do</strong> demais.<br />

(402) Isto não é (só) ruim, é abominável!<br />

(403) Ele tomou só um.<br />

27.2 Tópico<br />

Para nossos fins chamamos de tópico aquele constituinte que inicia a frase. Quer<br />

dizer que o deslocamento à esquer<strong>da</strong> é uma estratégia de topicalização.<br />

A frase (simples ou complexa) normalmente é potencialmente composta por três<br />

partes: tópico, comentário e co<strong>da</strong>.<br />

O tópico é o primeiro constituinte <strong>da</strong> frase, seja sujeito, objeto ou circunstância.<br />

Talvez este último é o constituinte mais freqüente como tópico. Certas ligações podem<br />

ser tópico. O predica<strong>do</strong> normalmente não é tópico.<br />

166


O comentário é a predicação. Ele pode, dependen<strong>do</strong> <strong>da</strong> construção, igualmente<br />

ser composto de sujeito, objeto e/ou circunstâncias junto com a predicação, mas fora <strong>do</strong><br />

primeiro constituinte. Por outro la<strong>do</strong> também existem frases sem tópico.<br />

A co<strong>da</strong> é uma adição de detalhes sobre a predicação, sujeito, objeto ou<br />

circunstância que são informações já conheci<strong>da</strong>s, subentendi<strong>da</strong>s, deduzíveis. Ela<br />

normalmente segue a predicação (ver 28.4.2).<br />

(404) Ontem, João foi visitar sua mãe, levan<strong>do</strong> o carro.<br />

carro é co<strong>da</strong>.<br />

tópico | comentário | co<strong>da</strong><br />

Nesta frase ontem é tópico, João foi visitar sua mãe é comentário, e levan<strong>do</strong> o<br />

Tu<strong>do</strong> que ocorre normalmente como primeiro constituinte de uma frase é o tópico<br />

inerente; este não é necessariamente enfatiza<strong>do</strong>. Pode ser enfoca<strong>do</strong>:<br />

(405) O primeiro prêmio, este foi decidi<strong>do</strong> <strong>da</strong>r para João<br />

Algumas construções não têm tópico, por exemplo, os imperativos. É possível<br />

que a construção sem tópico seja a preferi<strong>da</strong> nas línguas cuja ordem de base é objeto-<br />

verbo-sujeito OVS. No kaingang (Jê) usam-se tais construções, não no início de um<br />

texto, mas no meio. O sujeito de uma oração OVS somente pode ser um pronome, nunca<br />

um nome. São frases sem tópico.<br />

27.3 Tópico marca<strong>do</strong><br />

É aquele que é desloca<strong>do</strong> à esquer<strong>da</strong>, ou então um tópico indica<strong>do</strong> por certas<br />

marcas especiais de tópico, ou uma combinação <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is. Também pode fazer <strong>da</strong>quele<br />

constituinte uma oração inteira.<br />

Deslocamento para a esquer<strong>da</strong>:<br />

167


(406) Ele foi para casa hoje – hoje ele foi para casa.<br />

(407) Copa <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>: Brasil ganhou hoje contra a Alemanha.<br />

(408) Falan<strong>do</strong> <strong>da</strong> Alemanha, eles ganharam a copa em 1990.<br />

Marca especial:<br />

Man<strong>da</strong>ra (Camarões):<br />

(409) áhuwa má, dúkku aha tá fágusa<br />

lá TOP músico PL eles celebram<br />

É lá que os músicos celebram.<br />

(410) Nuram wá, banába: a beliyá Nááli<br />

Nuram TOP lhe diga: ele me man<strong>do</strong>u Naali<br />

Quanto a Nuram, diga-lhe: “fui man<strong>da</strong><strong>do</strong> por Naali!”<br />

Em Man<strong>da</strong>ra existem quatro indica<strong>do</strong>res de tópico:<br />

má indica informação normal<br />

wá indica informação importante<br />

ní indica informação extraordinária<br />

mú indica informação que surpreende<br />

To<strong>da</strong> uma oração pode ser tópico marca<strong>do</strong>:<br />

(411) É ver<strong>da</strong>de, Brasil ganhou a copa <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> em 2002.<br />

(412) Foi ontem que eles jogaram tão bem.<br />

168


28. Focalização<br />

O tópico sen<strong>do</strong> informação conheci<strong>da</strong>, a focalização é informação nova se é<br />

assertiva, mas pode ser conheci<strong>da</strong> se é seletiva. Focalização dá ênfase que pode ser<br />

diferencia<strong>da</strong> por grau: focalização inerente é menos forte que focalização marca<strong>da</strong>.<br />

Existem também meios de desfocalização.<br />

28.1 Não-foco<br />

Uma frase "normal" não tem foco especial, mesmo que tenha informação nova.<br />

(413) João ficou em primeiro lugar.<br />

"João" é sujeito e tópico inerente, "primeiro lugar" é informação nova, mas<br />

somente com o foco "normal" desta, sem ser especialmente focaliza<strong>do</strong>.<br />

28.2 Foco inerente<br />

São os negativos e perguntas; eles têm mais foco <strong>do</strong> que afirmações simples.<br />

(414) Quero ir. asserto simples sem<br />

focalização<br />

(415) Realmente quero ir. "quero" enfatiza<strong>do</strong><br />

(416) Não quero ir. "quero" nega<strong>do</strong><br />

(417) Você quer ir? "quer" duvi<strong>da</strong>n<strong>do</strong><br />

Ordens e proibições são focaliza<strong>da</strong>s:<br />

(418) Vai lá!<br />

(419) Não vou lá.<br />

(420) Você vai lá?<br />

169


O mo<strong>do</strong> irreal é mais focaliza<strong>do</strong> que o mo<strong>do</strong> real:<br />

(421) Vou.<br />

(422) Eu iria, mas...<br />

28.3 Foco marca<strong>do</strong><br />

Existem <strong>do</strong>is tipos: foco assertivo e foco seletivo. Há muitos marca<strong>do</strong>res de foco,<br />

e vários podem existir na mesma frase, <strong>da</strong>n<strong>do</strong> várias cama<strong>da</strong>s de foco (como uma<br />

cebola).<br />

28.3.1 Foco assertivo<br />

(Watters 1979:177) dá a resposta a perguntas de informação explícitas ou<br />

pressupostas. A marca pode ser a melodia <strong>da</strong> frase, uma partícula, ou um conjunto de<br />

partículas, deslocamento, um advérbio focalizante, ou uma combinação de to<strong>da</strong>s essas<br />

marcas. Note que no exemplo abaixo o negrito indica entonação de ênfase:<br />

(423) até eu vou – talvez eu vá – talvez eu vá – talvez até eu vá<br />

(424) Kaingang:<br />

tĩg jé-nh ke mũ – inh hã vỹ tĩg mũ – tĩg p han jé-nh<br />

ke mũ<br />

ir para.eu fut cont. – eu mesmo S ir cont. – ir real fazer para.eu<br />

fut cont.<br />

vou partir -- eu mesmo vou partir -- eu realmente vou<br />

partir<br />

28.3.2 Foco seletivo<br />

Responde a uma questão de informação que pressupõe uma escolha. Pressupõe<br />

que há várias possibili<strong>da</strong>des <strong>da</strong>s quais uma é seleciona<strong>da</strong>. A seleção é completa,<br />

exaustiva. A única informação nova é o resulta<strong>do</strong> <strong>da</strong> escolha.<br />

170


(425) João só gosta de passear (pressuposição: ele nunca trabalha)<br />

(426) Kaingang:<br />

gãr tãvĩ krãn ti tĩ<br />

milho somente, planta ele habitualmente (e não planta outra<br />

coisa)<br />

28.4 Desfocalização<br />

Pode ser informação conheci<strong>da</strong> ou nova. É apresenta<strong>da</strong> de tal forma que não atrai<br />

a atenção, assim o ouvinte pode se concentrar em outra informação. Incluímos aqui<br />

qualquer estratégia que diminui a atenção. Não há nenhuma pressuposição envolvi<strong>da</strong><br />

nesta estratégia.<br />

Pode-se desfocalizar usan<strong>do</strong> as seguintes estratégias:<br />

− usar orações subordina<strong>da</strong>s<br />

− deslocar à direita<br />

− apresentar informação genérica ou não-específica<br />

− usar substantivos abstratos<br />

− usar desfocalização marca<strong>da</strong><br />

28.4.1 Orações subordina<strong>da</strong>s<br />

Orações subordina<strong>da</strong>s são desfocaliza<strong>da</strong>s. A oração independente recebe a<br />

atenção, a subordina<strong>da</strong> contribui para melhor entendimento <strong>da</strong>quela. Isto pode ser<br />

ver<strong>da</strong>de até quanto à oração relativa, mesmo que esta possa ser usa<strong>da</strong> para enfatizar um<br />

participante.<br />

Ex. Quan<strong>do</strong> Paulo apareceu, os judeus que tinham chega<strong>do</strong> de Jerusalém se<br />

aglomeraram ao seu re<strong>do</strong>r, fazen<strong>do</strong> contra ele muitas e graves acusações que não podiam<br />

provar. Atos 25.7NVI.<br />

171


28.4.2 Deslocamento à direita<br />

Certos detalhes podem ser menciona<strong>do</strong>s no fim <strong>da</strong> frase, por deslocamento à<br />

direita, crian<strong>do</strong>-se assim uma co<strong>da</strong>. Geralmente é informação conheci<strong>da</strong> ou implícita (ou<br />

pressuposta), mas explicita<strong>da</strong> para desfazer qualquer ambigüi<strong>da</strong>de.<br />

(427) Cheguei ontem aqui, de tardezinha.<br />

Em kaingang (Brasil) a oração principal geralmente é SOV, usa<strong>da</strong> para transmitir<br />

a informação principal. No fim dela to<strong>da</strong> uma série de informações podem ser<br />

menciona<strong>da</strong>s, to<strong>da</strong>s deduzíveis <strong>da</strong> situação, mas explicita<strong>da</strong>s para ter certeza de que não<br />

há confusão:<br />

(428) Kaingang (Brasil)<br />

ci<strong>da</strong>de ra sóg vyr, rãkétá, Fár mré, compra han jé<br />

ci<strong>da</strong>de para eu fui, ontem, Fár com, compra fazer para<br />

Fui para a ci<strong>da</strong>de ontem com o Fár para fazer compras<br />

28.4.3 Informação genérica<br />

Uma outra estratégia de desfocalizar é usar um pronome ou uma locução genérica:<br />

(429) eles me bateram pronome<br />

(430) o povo lá me bateu locução genérica<br />

(431) João e Pedro me bateram Nomes próprios<br />

focaliza<strong>da</strong>.<br />

Quan<strong>do</strong> uma parte <strong>da</strong> informação é diminuí<strong>da</strong>, o resto <strong>da</strong> informação é mais<br />

172


28.4.4 Substantivos abstratos<br />

Contêm menos informação que os concretos. No verbo nominaliza<strong>do</strong> os<br />

argumentos desaparecem, assim a ação está mais em foco. A informação pode entrar na<br />

frase de outra maneira, assim essa também está em foco.<br />

(432) Deus nos ama –> o amor –> o amor de Deus (por nós)<br />

28.4.5 Desfocalização marca<strong>da</strong><br />

Achou-se um caso de desfocalização marca<strong>da</strong> que parece ser uma contradição em<br />

si (P1 indica uma forma <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> <strong>do</strong> verbo):<br />

Aghem (Camarões):<br />

(433) m m zì kí-b n<br />

eu P1 comi cuscuz hoje<br />

Comi cuscuz hoje – cuscuz é a informação mais importante e é<br />

focaliza<strong>do</strong>.<br />

(434) kâ zì b-′k n<br />

eu NEG comi cuscuz hoje<br />

Eu não comi cuscuz hoje — a negação é a informação mais<br />

importante, cuscuz é desfocaliza<strong>do</strong>.<br />

(435) m m zì nô b-′k n<br />

eu P1 como FOC cuscuz hoje<br />

Comi cuscuz hoje—a informação é o comer, cuscuz é informação<br />

de fun<strong>do</strong>.<br />

(436) ò lìghà ñí′á wò zí b-′k<br />

ele quer que você coma cuscuz<br />

Ele quer que você coma cuscuz —o centro <strong>da</strong> atenção é no fato que<br />

ele o quer<br />

173


28.5 Resumo: Tópico e focalização<br />

Tópico<br />

Foco<br />

Sem foco<br />

A tabela seguinte dá um resumo <strong>da</strong> relação entre os <strong>do</strong>is:<br />

Tabela 50: Comparação entre Tópico e Focalização<br />

Função Forma<br />

Sujeito<br />

Inerente Tema, não em foco Primeiro constituinte <strong>da</strong><br />

oração<br />

Deslocamento à esquer<strong>da</strong><br />

Marca<strong>do</strong> Tema, em foco<br />

Marca<strong>do</strong>res<br />

Oração especial<br />

Inerente Focalização leve<br />

Marca<strong>do</strong><br />

Assertivo<br />

Seletivo<br />

Focaliza<strong>do</strong><br />

Respostas a perguntas de<br />

informação<br />

Focaliz<strong>do</strong><br />

Respostas a perguntas de<br />

escolha<br />

Negações<br />

Perguntas<br />

Ordens<br />

Proibições<br />

Mo<strong>do</strong> irreal<br />

Entonação<br />

Partículas<br />

Deslocamento<br />

Advérbios<br />

Inerente Sem foco Construção normal<br />

Desfocalização<br />

Informação conheci<strong>da</strong><br />

Informação desfocaliza<strong>da</strong><br />

Informação genérica<br />

Substantivos abstratos<br />

Oração subordina<strong>da</strong><br />

Deslocamento à direita<br />

Partículas<br />

174


29. Reação e outras estratégias de focalização<br />

A reação trata <strong>do</strong> valor verídico de uma asserção que pode ser explícita ou<br />

pressuposta. Nova informação pode ser ofereci<strong>da</strong>, mas tu<strong>do</strong> em relação a um fato ou uma<br />

idéia já conheci<strong>da</strong>. Na reação podem distinguir-se vários graus: dependente se é ofereci<strong>do</strong><br />

pela primeira vez, ou repeti<strong>do</strong>, por exemplo, numa discussão.<br />

Pode-se considerar a reação como um foco. As marcas <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is são similares, mas<br />

há diferenças. Foco não depende de uma pressuposição enquanto a reação depende dela.<br />

Também certas marcas são diferentes.<br />

29.1 Confirmação e recusa<br />

Uma proposição pode ser aceita, rejeita<strong>da</strong>, duvi<strong>da</strong><strong>da</strong>, deseja<strong>da</strong> etc.<br />

(437) João comeu peixe. (suposição)<br />

(438) Comeu sim. (confirmação)<br />

(439) Não, não comeu. (falsificação, rejeição)<br />

(440) Duvi<strong>do</strong>. (dúvi<strong>da</strong> com rejeição)<br />

(441) Não sei. (dúvi<strong>da</strong>)<br />

(442) É bom escrever esta carta! (proposição) -- Não quero. (rejeição)<br />

(443) Me parece que você vai escrever uma tal carta. (idéia) -- Não a<br />

29.2 Emen<strong>da</strong><br />

escreva! (proibição)<br />

Uma proposição pode ser aceitável em parte, mas só com uma emen<strong>da</strong>. Ou ela é<br />

rejeita<strong>da</strong> completamente, ou usan<strong>do</strong> uma emen<strong>da</strong> que é uma outra solução ofereci<strong>da</strong>. Ou,<br />

ain<strong>da</strong>, podem-se propor outros detalhes usan<strong>do</strong> a emen<strong>da</strong>.<br />

(444) Ele comeu peixe. (idéia)<br />

175


-- Bem, ele comeu peixe e carne também. (emen<strong>da</strong> por<br />

amplificação)<br />

(445) Ele comeu peixe, e carne também. (idéia)<br />

-- Não, ele comeu somente peixe. (emen<strong>da</strong> por restrição)<br />

(446) Ele comeu carne. (idéia)<br />

-- Hoje não. Ele ficou em jejum. (emen<strong>da</strong> por substituição que é<br />

uma nova proposta)<br />

Pode também ter um elemento de surpresa:<br />

(447) Pedro comeu peixe.<br />

(surpresa)<br />

-- É mesmo? Pedro que não gosta de peixe de jeito nenhum?<br />

29.3 Graus de reação<br />

Pode haver vários graus, dependen<strong>do</strong> <strong>da</strong> disposição <strong>do</strong> falante. Ele pode mostrar<br />

isto pela voz: a entonação e o volume <strong>da</strong> voz -- mais "quente" a reação, mais alta a voz.<br />

Pode ter reduplicação, advérbios, partículas. O uso <strong>do</strong>s demonstrativos pode caber nesta<br />

categoria.<br />

Tabela 51: Demonstrativos em Bafut<br />

perto <strong>do</strong> falante perto <strong>do</strong> ouvinte longe <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is<br />

Idéia Nû nî nyá<br />

Emen<strong>da</strong> Núà níà nyáã<br />

1° grau núlà nílì nyálã<br />

2° grau núànù níìnì nyáãná<br />

São usa<strong>do</strong>s como nestes exemplos:<br />

(448) lhe dei isto (nû)<br />

(449) não, foi isso! (núà)<br />

(450) não, foi aquilo! (núlà)<br />

176


(451) de jeito nenhum, foi aquilo lá (núànù), somente usa<strong>do</strong> gritan<strong>do</strong>.<br />

29.4 Combinar tópico, foco e reação<br />

Tópico, foco e reação podem ser usa<strong>do</strong>s em combinação. Certas combinações são<br />

preferíveis. Foco seletivo pode se combinar muito facilmente com tópico.<br />

Kaingang (Brasil):<br />

(452) ti Ve inh (oração desfocaliza<strong>da</strong>)<br />

ele vi eu<br />

(453) inh Hã vy ti vé (foco seletivo no sujeito=tópico)<br />

eu realmente o vi<br />

(454) ti hã ve inh (foco seletivo no objeto=tópico)<br />

o realmente vi eu<br />

Foco seletivo em Kaingang se faz usan<strong>do</strong> a partícula hã ou outras partículas em<br />

combinação com hã. Tal construção pede deslocamento à esquer<strong>da</strong>. Sempre é tópico.<br />

To<strong>da</strong>s as estratégias focalizantes se combinam com os constituintes <strong>da</strong> oração ou<br />

com parte de tal constituinte. Podem-se combinar com mais <strong>do</strong> que um ao mesmo tempo.<br />

Podem também combinar com um constituinte desfocaliza<strong>do</strong>. Tais combinações<br />

aparecem bem com o sujeito:<br />

(455) João escreveu esta carta.<br />

(456) João escreveu esta carta sozinho.<br />

(457) Foi João que escreveu esta carta, e completamente sozinho.<br />

177


29.5 Foco no enre<strong>do</strong> <strong>do</strong> texto<br />

Foco não funciona somente na frase ou oração, mas também em uni<strong>da</strong>des maiores<br />

como parágrafos e episódios. Em geral o cenário e as informações de pano de fun<strong>do</strong> de<br />

um texto são menos em foco que a informação <strong>do</strong> primeiro ponto culminante.<br />

29.5.1 O tema<br />

O tema <strong>do</strong> texto certamente está em foco em algum lugar no texto. Ca<strong>da</strong> parte <strong>do</strong><br />

texto, episódio, parágrafo e frase contêm uma parte dela que está em foco. Se o texto for<br />

muito complexo ele pode ter mais <strong>do</strong> que um só tema, e ca<strong>da</strong> um terá seus marca<strong>do</strong>res<br />

diagnósticos separa<strong>do</strong>s de marca<strong>do</strong>res de foco. Os marca<strong>do</strong>res temáticos são importantes<br />

para a coesão <strong>do</strong> texto.<br />

29.5.2 O ponto culminante<br />

To<strong>da</strong>s as estratégias para indicar tensão dramática são usa<strong>da</strong>s para aos poucos<br />

preparar o ponto culminante <strong>da</strong> história. Também podem ser usa<strong>da</strong>s nas partes<br />

preparatórias. Antes e depois <strong>do</strong> ponto culminante podem existir pontos menores que<br />

preparam o centro e que depois também o desfazem aos poucos. Tu<strong>do</strong> isto contribui para<br />

o texto ter uma intensi<strong>da</strong>de dramática.<br />

29.5.3 Outros focos<br />

Os textos de instruções muitas vezes terminam um procedimento com uma<br />

conclusão que dá ênfase àquela parte <strong>do</strong> procedimento. O tema central pode ser marca<strong>do</strong><br />

de uma maneira especial para distingui-lo <strong>da</strong>s outras partes. As partículas que indicam<br />

tópico podem servir a tal função.<br />

30 Os meios de focalizar<br />

Sem poder fazer uma lista exaustiva serão apresenta<strong>do</strong>s meios prosódicos,<br />

morfológicos, sintáticos e estilísticos.<br />

178


30.1 Meios prosódicos<br />

Especialmente nas línguas não-tonais, o foco é marca<strong>do</strong> por intensi<strong>da</strong>de crescente,<br />

tom mais alto, ritmo mais rápi<strong>do</strong> ou mais lento, mais volume. Certas línguas tonais<br />

exibem as mesmas características.<br />

Meios prosódicos também podem indicar desfocalização. Muitas vezes serão o<br />

contrário <strong>do</strong>s enumera<strong>do</strong>s: intensi<strong>da</strong>de decrescente, tom mais baixo, ritmo mais lento (ou<br />

mais rápi<strong>do</strong>), menos volume.<br />

Meios prosódicos podem ser combina<strong>do</strong>s com outros meios.<br />

30.2 Meios morfológicos<br />

Podem ser vocábulos ou partículas gramaticais.<br />

Kaingang (Brasil):<br />

(458) tĩ tóg mũ ele vai<br />

(459) tĩ sór tóg mũ ele quer ir<br />

(460) tĩ pẽ han tóg mũ ele vai embora uma vez por to<strong>da</strong>s (ir<br />

30.3 Meios sintáticos<br />

completamente faz)<br />

Deslocamento de constituinte pode ser topicalizante (no começo <strong>da</strong> construção) e<br />

ao mesmo tempo focalizante. Deslocamento à esquer<strong>da</strong> se for co<strong>da</strong> seria desfocalizante.<br />

Se não for co<strong>da</strong> pode até ser focalizante. Deslocamento pode ser combina<strong>do</strong> com outras<br />

estratégias sintáticas como o uso de uma oração predica<strong>do</strong>-comentário (ele é professor)<br />

ou uma construção relativa (o professor que estava lá...). Em kaingang to<strong>da</strong> uma oração<br />

pode ser sujeito ou objeto (ou circunstância).<br />

Kaingang (Brasil):<br />

(461) kỹ ũ tỹ tá jun mũ ẽn-------- tóg ti vé<br />

então um por lá chegar narrativo aquele --- SUJ o viu<br />

179


então aquele que chegou naquele momento o viu (oração é sujeito)<br />

(462) kỹ sóg ũ tỹ tá jun mũ ẽn<br />

vé<br />

então eu-suj. o por lá chegou narrativo aquele<br />

vi<br />

então eu vi aquele que estava chegan<strong>do</strong> (naquele momento)<br />

(oração é objeto)<br />

30.4 Meios estilísticos<br />

Existem muitos. Segue uma lista incompleta, mas sugestiva. Estes meios servem<br />

especialmente para identificar o ponto culminante, o declínio <strong>da</strong> tensão, as conclusões e<br />

outros.<br />

30.4.1 Referência catafórica<br />

É uma introdução ao que segue:<br />

(463) Eis o que ele me disse: "Jesus salva!"<br />

30.4.2 Pergunta retórica<br />

Não pede uma resposta, mas pede atenção ao que vai ser dito.<br />

(464) Como que posso explicar? Vou contar uma história, <strong>da</strong>í vai<br />

entender.<br />

30.4.3 Repetições<br />

Os vários tipos (22.2) servem para <strong>da</strong>r ênfase. Podem-se citar estratégias usa<strong>da</strong>s<br />

muitas vezes na Bíblia como expressões re<strong>do</strong>bra<strong>da</strong>s.<br />

180


(465) Salmo 77:12 (NVI): Meditarei em to<strong>da</strong>s as tuas obras e<br />

considerarei to<strong>do</strong>s os teus feitos.<br />

(466) Colossenses 1,16 (NVI): pois nele foram cria<strong>da</strong>s to<strong>da</strong>s as coisas<br />

nos céus e na terra,<br />

as visíveis e as invisíveis<br />

sejam tronos ou soberanias,<br />

poderes ou autori<strong>da</strong>des;<br />

(467) A criança estava <strong>do</strong>rmin<strong>do</strong>. No sonho estava num avião que a<br />

30.4.4 Mu<strong>da</strong>nça<br />

levava para uma ci<strong>da</strong>de fantástica. Que casas, que ruas<br />

maravilhosas! A criança <strong>do</strong>rmia em paz.<br />

No ponto culminante de uma história muita coisa mu<strong>da</strong>. A ordem normal de uma<br />

oração pode ser inverti<strong>da</strong> ou mu<strong>da</strong><strong>da</strong>, construções alternativas podem ser usa<strong>da</strong>s, até<br />

outros tipos de texto. Em Mat.14:19, na narração contan<strong>do</strong> a multiplicação de cinco<br />

pãezinhos para cinco mil homens sem contar mulheres e crianças, existe em grego uma<br />

série de particípios para enumerar as ações que resultam na multiplicação:<br />

(468) Ordenan<strong>do</strong> que a multidão se assentasse na grama,<br />

(469) toman<strong>do</strong> os cinco pães e os <strong>do</strong>is peixes,<br />

(470) olhan<strong>do</strong> para o céu deu graças,<br />

(471) partin<strong>do</strong> ele deu os pães aos discípulos e os discípulos à<br />

multidão.<br />

É o ponto culminante <strong>da</strong> história, as ações principais (em português) na forma de<br />

gerúndio, e as duas ações de <strong>da</strong>r são os únicos verbos ativos na seqüência.<br />

Em kaingang, na história <strong>da</strong> origem <strong>da</strong> plantação de feijão e milho, no começo<br />

conta que não havia milho, usan<strong>do</strong> a partícula ja. O pai de to<strong>do</strong> o grupo ordena aos filhos<br />

o corte <strong>da</strong>s árvores para preparar uma roça, botar uma cor<strong>da</strong> no seu pescoço e arrastá-lo<br />

por to<strong>da</strong> a roça. Eles deixam o corpo lá e perambulam no mato. Quan<strong>do</strong> afinal eles<br />

voltam ao lugar: "numa casa dentro (<strong>da</strong> roça) ele estava senta<strong>do</strong> ja, vivo ja – o pai, o pai<br />

181


deles. Depois ele explica os nomes <strong>da</strong>s plantas para os filhos, e de que parte <strong>do</strong> seu corpo<br />

elas tinham saí<strong>do</strong>.<br />

A partícula ja "ação termina<strong>da</strong>" é usa<strong>da</strong> na introdução. Ela é usa<strong>da</strong> duas vezes no<br />

ponto culminante. Também tem reduplicação <strong>da</strong> palavra pai, e tem mu<strong>da</strong>nça de<br />

construções, os verbos denotam ações em vez de descrições.<br />

Esta mu<strong>da</strong>nça de construções indica as várias partes <strong>do</strong> texto. Até outros gêneros<br />

de textos podem ser usa<strong>do</strong>s para indicar o ponto culminante.<br />

30.4.4.2 O uso <strong>do</strong> discurso direto ou indireto<br />

pode indicar o ponto culminante. Pode mu<strong>da</strong>r <strong>do</strong> direto para o indireto ou o<br />

contrário. A identificação <strong>do</strong>s falantes pode ser usa<strong>da</strong> ou não, sempre mu<strong>da</strong>n<strong>do</strong> no ponto<br />

culminante.<br />

30.4.4.3 Mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong>de <strong>do</strong> verbo<br />

Pode mu<strong>da</strong>r <strong>do</strong> "presente histórico" para o presente atual, por exemplo. Em<br />

Chiquitano (Bolívia), o que foi identifica<strong>do</strong> como sen<strong>do</strong> um evento relativo não-final,<br />

usa-se no texto, e a forma absoluta final, no ponto culminante, ou pode usar-se um<br />

particípio.<br />

Esta maneira de usar particípios no ponto culminante parece ser bastante<br />

freqüente. Já foi menciona<strong>do</strong> para o grego, também foi encontra<strong>do</strong> em Nova Guiné e no<br />

Tamacheq, Níger, África.<br />

30.4.4.4 Ponto de observação<br />

Os personagens podem ser vistos de vários pontos de observação. Os inicia<strong>do</strong>res<br />

no texto e as vítimas podem mu<strong>da</strong>r de papel: as vítimas tornam-se heróis, os heróis<br />

tornam-se malfeitores. Ca<strong>da</strong> texto é apresenta<strong>do</strong> <strong>do</strong> ponto de vista de alguém: <strong>do</strong> narra<strong>do</strong>r<br />

ou de outro. As situações são descritas segun<strong>do</strong> a percepção desta pessoa, como se o<br />

autor estivesse dentro dela. Quan<strong>do</strong> a perspectiva mu<strong>da</strong>, o texto está entran<strong>do</strong> em outra<br />

fase.<br />

30.4.4.5 Pessoa<br />

Um texto narrativo na 3a pessoa pode mu<strong>da</strong>r para a 1a, como se o narra<strong>do</strong>r fosse<br />

parte <strong>da</strong> história. Assim, no texto <strong>da</strong> origem <strong>da</strong>s plantações em kaingang, depois que o pai<br />

182


ordena aos filhos que o arrastem com uma cor<strong>da</strong> no pescoço, o narra<strong>do</strong>r diz: "<strong>da</strong>í eles me<br />

arrastaram na roça". A história – e a sorte <strong>da</strong> família – mu<strong>da</strong> neste momento, em que os<br />

filhos mataram o pai, o que não é normal naquela cultura. Talvez também indique que ele<br />

vai viver novamente antes <strong>da</strong> história terminar.<br />

30.4.5 Onomatopéia<br />

São palavras que pelo som delas associam-se a um senti<strong>do</strong> específico, muito<br />

comum na África. Lá são usa<strong>do</strong>s até para fazer poesias. Entre os kaingang (Brasil) pode-<br />

se observar uma maneira de falar que alonga certos sons, por exemplo, um õ aberto que<br />

não existe na língua, normalmente, usa-se para indicar que os fatos a relatar são<br />

extremamente tristes. Mu<strong>da</strong>m-se to<strong>da</strong>s as vogais para mais baixo e usa-se em forma de<br />

queixas. Quem não é acostuma<strong>do</strong> a essa maneira de falar, não entende na<strong>da</strong>. Pode usar-se<br />

nos textos para indicar o sentimento <strong>da</strong>quelas pessoas que são cita<strong>da</strong>s e talvez até no<br />

ponto culminante.<br />

30.4.6 Concentração de participantes<br />

Em certos textos a concentração de participantes é um sinal <strong>do</strong> ponto culminante.<br />

No texto sobre As Abelhas Assassinas, no segun<strong>do</strong> episódio, a família está presente e está<br />

sen<strong>do</strong> alerta<strong>da</strong> sobre o perigo. É o episódio final <strong>da</strong>quele curto texto, talvez o mais<br />

importante porque as crianças estão aju<strong>da</strong>n<strong>do</strong> a família a evitar o problema que elas<br />

encontraram.<br />

31 Méto<strong>do</strong> de Pesquisa<br />

Como é que se podem pesquisar as estratégias de focalização? Os meios<br />

estilísticos podem ser descobertos somente examinan<strong>do</strong> muitos textos. O falante nativo<br />

pode tentar praticar vários estilos, usan<strong>do</strong> sua competência na língua e sua experiência<br />

como membro <strong>do</strong> seu grupo.<br />

Existe uma maneira de manipular frases, transfoman<strong>do</strong>-as para efetuar mu<strong>da</strong>nça<br />

de foco, mu<strong>da</strong>n<strong>do</strong> um constituinte após outro. Mu<strong>da</strong>n<strong>do</strong> o lugar de acentuação,<br />

183


substituin<strong>do</strong> substantivos por pronomes, deslocações e adições podem mostrar a estrutura<br />

<strong>da</strong> língua. Uma frase sem foco específico ou até desfocaliza<strong>da</strong> pode ser o ponto de parti<strong>da</strong><br />

para uma série de manipulações. Vamos apresentar uma série de transformações que<br />

indicam as possibili<strong>da</strong>des, em português, como modelo para explorar sua própria língua.<br />

Após ca<strong>da</strong> transformação é bom retornar à primeria frase antes de fazer outra<br />

transformação. É bom fazer o trabalho tanto nas orações independentes quanto nas<br />

dependentes.<br />

31.1 Transformação por substituição<br />

É um paradigma no qual ca<strong>da</strong> parte <strong>da</strong> oração é substituí<strong>da</strong> por informação<br />

específica ou focaliza<strong>da</strong>. Assim as restrições <strong>da</strong> língua devem aparecer. Também é bom<br />

explorar restrições possíveis quan<strong>do</strong> to<strong>do</strong>s os argumentos são informação específica. No<br />

exemplo que segue, as palavras em itálico indicam informação específica que substitui a<br />

informação genérica.<br />

(472) e ela lhe comprou aquele livro com alegria<br />

(473) e ela lho comprou com alegria<br />

(474) e ela lhe comprou aquele livro com alegria<br />

(475) e ela o comprou para seu filho com alegria.<br />

(476) e ela o comprou para ele naquela<br />

loja.<br />

(477) e Maria comprou aquele livro naquela loja para seu<br />

filho.<br />

(478) quan<strong>do</strong> Maria comprou aquele livro naquela<br />

loja,...<br />

O sujeito pode ser substituí<strong>do</strong> por informação específica sem outras alterações. O<br />

objeto direto, quan<strong>do</strong> é pronome e assim desfocaliza<strong>do</strong>, precede o verbo, quan<strong>do</strong> é nome<br />

ou locução que pode ser focaliza<strong>da</strong>, ele o segue. A substituição segue este padrão. O<br />

objeto pronominal, quan<strong>do</strong> é substituí<strong>do</strong> por informação específica, deve ser desloca<strong>do</strong> à<br />

direita. O objeto indireto pronominal precede o objeto direto pronominal. Quan<strong>do</strong> são<br />

184


substituí<strong>do</strong>s por locuções nominais o direto precede o indireto que se tornou uma<br />

circunstância. As circunstâncias podem trocar de lugar sem problema, talvez com uma<br />

ligeira diferença de importância.<br />

Podem existir restrições sobre quantas informações específicas uma oração ou<br />

frase pode conter. Em kaingang (Brasil), em geral, não devem ser mais <strong>do</strong> que duas numa<br />

oração específica, ou seja, preceden<strong>do</strong> o verbo. Na co<strong>da</strong> que segue o verbo, pode ter<br />

muitas informações, mas devem ser conheci<strong>da</strong>s ou deduzíveis pelo conhecimento <strong>da</strong><br />

situação.<br />

31.2 Focalização por entonação<br />

Em português ca<strong>da</strong> constituinte, seja genérico ou específico, pode ser focaliza<strong>do</strong><br />

por entonação. No exemplo seguinte as palavras em itálico mostram esta focalização.<br />

(479) e ela lho comprou com alegria<br />

(480) e ela lho comprou<br />

(481) e para ele ela o comprou com alegria<br />

A entonação também pode distinguir foco assertivo <strong>do</strong> foco seletivo:<br />

(482) é uma flor bonita! – foco assertivo<br />

(483) esta flor é bonita! – foco seletivo<br />

31.3 Transformação por deslocamento à esquer<strong>da</strong><br />

Um <strong>do</strong>s constituintes pode ser desloca<strong>do</strong> à esquer<strong>da</strong> e assim ser o tópico <strong>da</strong> frase.<br />

Deslocamento em si traz foco, desde que ele não seja co<strong>da</strong>. Distinguem-se vários graus.<br />

(484) com alegria | ela o comprou para ele tópico + foco seletivo<br />

(485) aquele livro | ela comprou para ele tópico + foco seletivo<br />

(486) para ele | ela o comprou tópico + foco seletivo<br />

185


(487) aquele livro, | ela o comprou para ele tópico marca<strong>do</strong> + foco<br />

seletivo (note a<br />

repetição <strong>do</strong> objeto)<br />

Muitas vezes o constituinte, ao ser desloca<strong>do</strong> à esquer<strong>da</strong>, é transforma<strong>do</strong> em<br />

oração nominal.<br />

(488) foi lá | que ela o comprou para ele<br />

(489) foi aquele livro | que ela lhe comprou<br />

(490) foi para ele | que ela o comprou<br />

(491) foi ela | que o comprou para ele<br />

(492) visto que foi ela | que o comprou para ele,...<br />

Nestes deslocamentos o constituinte desloca<strong>do</strong> também recebe acentuação de<br />

entonação e é focaliza<strong>do</strong>.<br />

31.4 Transformação por deslocamento à direita<br />

Também, podem-se pesquisar as possíveis transformações à direita. Se a<br />

transformação não produz uma co<strong>da</strong>, pode ter foco quan<strong>do</strong> é informação nova:<br />

(493) e com prazer ela lhe comprou | um livro<br />

(494) e com prazer ela o comprou | para ele<br />

(495) e ela lho comprou | com prazer<br />

(496) e ela lho comprou com prazer, | a Maria<br />

(497) visto que ela tinha compra<strong>do</strong> | aquele livro,...<br />

A transformação <strong>do</strong> item d. é a única que produz a co<strong>da</strong> que não pode ser<br />

enfatiza<strong>da</strong>; o sujeito repeti<strong>do</strong> é informação já conheci<strong>da</strong> e repeti<strong>da</strong> sem ênfase. Nos<br />

outros exemplos talvez nem tenha deslocamento, mas simplesmente a posição normal <strong>do</strong><br />

último constituinte <strong>da</strong> oração.<br />

186


31.5 Focalização usan<strong>do</strong> palavras adicionais<br />

Partículas e advérbios podem ser usa<strong>do</strong>s para foco assertivo e seletivo.<br />

(498) e ela pessoalmente o comprou para ele<br />

(499) e ela mesma lhe comprou um<br />

(500) e ela o comprou somente para ele<br />

(501) e ela não lhe comprou mais <strong>do</strong> que um<br />

(502) e ela lhe comprou o único livro, tratan<strong>do</strong> <strong>do</strong> assunto<br />

(503) e quan<strong>do</strong> ela mesma o comprou para ele,...<br />

Construções apositivas podem <strong>da</strong>r ênfase ao constituinte<br />

(504) e ela, a coita<strong>da</strong>, lho comprou<br />

(505) e ela o comprou para ele, alguém que já tem tu<strong>do</strong>!<br />

(506) e ela lhe comprou aquele livro tão caro!<br />

Outro exemplo:<br />

(507) -- Ele roubou! -- Não, foi este aqui. -- Provavelmente trabalharam<br />

juntos. – Mas, o outro foi visto.-- Você o viu? -- Não, vi os <strong>do</strong>is,<br />

ele junto com o amigo dele, quan<strong>do</strong> saíram.<br />

31.6 Focalização <strong>da</strong> ação<br />

Pode-se fazer por entonação ou material adicional:<br />

(508) ela o comprou para ele (ela não o fabricou) reação—emen<strong>da</strong><br />

(509) ela não o comprou, (ela o fabricou) reação—recusa<br />

187


(510) ela realmente o comprou para ele reação—afirmação<br />

O verbo pode ser transforma<strong>do</strong> em abstrato que pode ser focaliza<strong>do</strong> com to<strong>da</strong>s as<br />

estratégias apresenta<strong>da</strong>s.<br />

(511) esta compra <strong>da</strong> camisa – ela nem pensou duas vezes!<br />

topicalização<br />

(512) foi uma compra excelente<br />

foco assertivo<br />

(513) esta "compra excelente" transformou-se em <strong>do</strong>r de cabeça<br />

foco seletivo<br />

31.7 Combinação destas estratégias<br />

To<strong>da</strong>s estas estratégias podem ser combina<strong>da</strong>s, não somente em frases, mas<br />

também em uni<strong>da</strong>des maiores, parágrafos e textos. Foco seletivo combina-se mais<br />

facilmente com tópico, não somente em línguas européias. Outras tendências podem ser<br />

pesquisa<strong>da</strong>s em ca<strong>da</strong> língua. Fazer isto em uni<strong>da</strong>des curtas como a frase, é mais fácil, mas<br />

não é suficiente. Assim é ce<strong>do</strong> para poder identificar tendências que se aplicam à língua<br />

humana.<br />

32. Coesão<br />

A coesão é uma força que produz uma associação íntima. Ela opera no texto em<br />

to<strong>do</strong>s os níveis, <strong>do</strong> vocabulário ao texto inteiro.<br />

32.1 Na locução<br />

Pode haver concordância entre os constituintes de pessoa, número, gênero (ou<br />

classe), caso. Geralmente é verbaliza<strong>do</strong> por partículas, muitas vezes por afixos. Em<br />

188


português existem <strong>do</strong>is gêneros e coesão de gênero e número (os casos se fazem por<br />

preposições):<br />

(514) o homem bonito -- <strong>do</strong> homem bonito<br />

a mulher bonita – <strong>da</strong> mulher bonita<br />

(515) os homens bonitos -- <strong>do</strong>s homens bonitos<br />

32.2 Na oração<br />

Português<br />

as mulheres bonitas -- <strong>da</strong>s mulheres bonitas<br />

A concordância também existe entre constituintes <strong>da</strong> oração como sujeito-verbo.<br />

(516) o homem, ele veio – os homens, eles vieram<br />

(517) a mulher, ela veio – as mulheres, elas vieram<br />

Kaingang<br />

(518) tĩ tóg mũ `ele vai'<br />

ir sg. ele S narrativo<br />

(519) mũ ag tóg mũ 'eles vão'<br />

ir pl. eles S narrativo<br />

Concordância também pode existir entre objeto e verbo, e não somente entre<br />

singular e plural. Em kaingang existem vários verbos para certas ações como <strong>da</strong>r um<br />

objeto ou <strong>da</strong>r um animal:<br />

(520) inh mỹ tóg garĩnh fẽg 'me deu uma galinha que<br />

estava em pé (viva)'<br />

me para ele galinha deu<br />

(521) inh mỹ tóg garĩnh nĩm 'me deu uma galinha que<br />

estava senta<strong>da</strong> (chocan<strong>do</strong>)'<br />

189


me para ele galinha deu<br />

(522) inh mỹ tóg garĩnh fi 'me deu uma galinha<br />

deita<strong>da</strong> (morta)'<br />

me para ele galinha deu<br />

(523) inh mỹ tóg garĩnh vin 'me deu várias galinhas<br />

(provavelmente vivas)'<br />

me para ele galinhas deu<br />

Outra concordância existe entre o verbo e a direção <strong>do</strong> movimento <strong>da</strong> ação:<br />

(524) ele veio (na direção <strong>do</strong> falante) – ele foi (na direção oposta)<br />

tempo:<br />

Outra concordância existe entre o verbo e certos advérbios, por exemplo, de<br />

(525) ele vai chegar amanhã<br />

(526) ele chegou ontem<br />

(527) ele chega às 3 horas<br />

(528) ele está chegan<strong>do</strong> já<br />

mas impossível: *ele vai chegar ontem / *ele chegou amanhã<br />

32.3 Na frase<br />

Há concordância na combinação de verbos:<br />

(529) Se ele tivesse chega<strong>do</strong>, eu poderia ter lhe avisa<strong>do</strong> (mas ele não<br />

chegou).<br />

(530) Se ele chegasse, eu lhe avisaria (mas sei que não vai chegar).<br />

(531) Se ele chegar, vou lhe avisar (é possível que vá chegar).<br />

(532) Quan<strong>do</strong> ele chegar, vou lhe avisar (é provável que vá chegar).<br />

190


<strong>do</strong>s verbos:<br />

Pode haver conjunções para combinar verbos (e orações) que governam a forma<br />

(533) ele chegou, mas eu não o vi<br />

(534) ele chegou e <strong>do</strong>rmiu<br />

(535) ele chegou enquanto eu estava <strong>do</strong>rmin<strong>do</strong><br />

Há línguas em que to<strong>da</strong>s estas relações se exprimem por simples aglomeração <strong>do</strong>s<br />

verbos, provavelmente com restrições semânticas. O português usa muitas combinações<br />

de verbos, ten<strong>do</strong> um segun<strong>do</strong> verbo na forma infinitiva, no gerúndio, ou no particípio:<br />

(536) vai esgotar minha paciência – está esgotan<strong>do</strong> – tem esgota<strong>do</strong><br />

(537) espera não esgotar – vive esgotan<strong>do</strong> – <strong>do</strong>rmiu<br />

esgota<strong>do</strong><br />

32.4 Em uni<strong>da</strong>des maiores<br />

Parágrafos e episódios são partes de textos, ca<strong>da</strong> um com sua estrutura e com<br />

coesão interna e externa. É raro achar partículas especiais para estas uni<strong>da</strong>des, mas<br />

existem e é bom reconhecer sua função especial. Em português "um dia" é usa<strong>do</strong> para<br />

introduzir novo parágrafo ou episódio. Em fulfulde (Burkina Faso, África) existe uma<br />

conjunção especial para introduzir ou ligar estas uni<strong>da</strong>des maiores.<br />

32.5 Coesão lexical<br />

O maior fato na coesão são as considerações de coesão lexical. Vamos examinar<br />

<strong>do</strong>is tipos: sistemas de referência e <strong>do</strong>mínios de vocabulário.<br />

191


32.5.1 Sistemas de referência<br />

To<strong>do</strong> o sistema de referência não somente é usa<strong>do</strong> para identificar ca<strong>da</strong><br />

participante, mas também para <strong>da</strong>r coesão ao texto. Os pronomes têm referência<br />

anafórica, em casos raros, catafórica. Seu uso é um meio importantíssimo para <strong>da</strong>r coesão<br />

ao texto. To<strong>da</strong>s as estratégias de referência aos participantes dão coesão, como também<br />

a diferença entre defini<strong>do</strong> e indefini<strong>do</strong> (ver 7).<br />

32.5.2 Domínios lexicais<br />

O vocabulário inteiro pode ser agrupa<strong>do</strong> em re<strong>do</strong>r de certos critérios e idéias. O<br />

<strong>do</strong>mínio <strong>da</strong> agricultura inclui uma vi<strong>da</strong> regi<strong>da</strong> pela natureza (hoje em dia, pela química) e<br />

to<strong>da</strong>s as ações, acontecimentos, instrumentos e conhecimentos específicos a este<br />

<strong>do</strong>mínio. Inclui o tempo, a geografia, o tipo de solo, de água... As repetições,<br />

focalizações, e outras estratégias, se apresenta<strong>da</strong>s no <strong>do</strong>mínio <strong>da</strong> agricultura, acham seu<br />

lugar certo na construção de um texto coerente.<br />

(538) Saímos <strong>da</strong> reunião e procuramos um táxi. De repente, ao sair <strong>do</strong><br />

táxi, eu me dei conta de que estava sem dinheiro. E agora?<br />

Para um texto ser coerente é importante que as partes sejam conecta<strong>da</strong>s de um<br />

parágrafo para o outro, para que o leitor possa seguir os passos ou pensamentos <strong>do</strong> autor.<br />

A conexão entre os parágrafos pode ser entre a última frase de um parágrafo e a primeira<br />

frase <strong>do</strong> parágrafo seguinte, chama<strong>do</strong> de "cau<strong>da</strong>-cabeça"; ou pode ser de "cabeça-<br />

cabeça", <strong>do</strong> começo de um parágrafo para o começo <strong>do</strong> outro.<br />

(539) Fomos embora.<br />

Depois <strong>da</strong> viagem... cau<strong>da</strong>-cabeça<br />

(540) Fomos embora. Viajamos muitos dias até chegarmos lá.<br />

Depois <strong>da</strong>quela viagem... cabeça-cabeça<br />

192


A idéia <strong>do</strong> "campo lexical" é importante para a coesão. Ca<strong>da</strong> vocábulo tem vários<br />

senti<strong>do</strong>s, às vezes, nota-se a conexão entre elas, às vezes não. O contexto deve ser<br />

bastante claro para que o leitor enten<strong>da</strong> o senti<strong>do</strong> em que a palavra está sen<strong>do</strong> usa<strong>da</strong>.<br />

Considere o caso de <strong>do</strong>is homens falan<strong>do</strong> na frente de uma sauna. Um pergunta:<br />

Você já pegou uma sauna? Responde o outro: Por quê? Ficou faltan<strong>do</strong> uma?<br />

A pia<strong>da</strong> reside no fato de que 'pegar' tem muitos senti<strong>do</strong>s; o ouvinte deve escolher<br />

um de to<strong>da</strong>s as possibili<strong>da</strong>des -- o dicionário de Francisco <strong>da</strong> Silveira Bueno contém uma<br />

lista de mais de 30 sinônimos, entre eles: colar, segurar, unir, comunicar, aceitar,<br />

começar... Na pia<strong>da</strong>, o ouvinte tratou a "sauna" como se fosse um objeto que se pode<br />

"pegar," carregar e como se pudesse tirar o objeto "sauna" <strong>do</strong> lugar. Ilustra a necessi<strong>da</strong>de<br />

de oferecer ao leitor (ouvinte) um rico contexto a fim de entender em que senti<strong>do</strong> a<br />

palavra foi usa<strong>da</strong> para que o texto seja coerente.<br />

32.6 Coesão e coerência<br />

As estratégias gramaticais, o campo lexical <strong>do</strong>s vocábulos usa<strong>do</strong>s, e a coesão<br />

correta ain<strong>da</strong> não garantem que o texto seja coerente ou bem construí<strong>do</strong>. Considere o<br />

texto seguinte:<br />

Estou em Porto Velho, capital de Rondônia. Hoje está quase frio, e ca<strong>da</strong> família<br />

aqui fala sua própria língua. Como eu gosto de bananas, mas não sei falar Paumarí. Daí<br />

minha irmã me chama ao telefone e meu assistente saiu. Estamos na época <strong>da</strong>s chuvas. O<br />

nenê começa a chorar. Que alegria por terminar o livro!<br />

Este texto está correto gramaticalmente, tem certa coerência de vocábulos, mas as<br />

idéias não são coerentes. Não é evidente porque alguém teria feito tal texto (a não ser<br />

como exemplo para um livro sobre análise <strong>do</strong> discurso).<br />

As estratégias estu<strong>da</strong><strong>da</strong>s aju<strong>da</strong>m a saber como <strong>da</strong>r coesão a um texto. To<strong>da</strong>s as<br />

línguas têm suas próprias marcas e estratégias, assim é bom estu<strong>da</strong>r to<strong>da</strong>s separa<strong>da</strong>mente.<br />

A coesão muitas vezes é uma função adicional a outras funções de estratégias<br />

apresenta<strong>da</strong>s sob um outro ponto de vista.<br />

193


33 Um exemplo<br />

Ten<strong>do</strong> termina<strong>do</strong> a análise de to<strong>da</strong>s as partes <strong>do</strong> texto As Abelhas Assassinas,<br />

vamos agora interpretar as partes: o enre<strong>do</strong> e como é marca<strong>do</strong>, os participantes,<br />

focalização, ponto culminante e coesão. Para fazê-lo é bom examinar to<strong>da</strong>s as tabelas: de<br />

base (2.2), <strong>do</strong> enre<strong>do</strong> (3.4), <strong>do</strong>s participantes (6.4), relações entre os predica<strong>do</strong>s (22.3),<br />

tempo (24.1), lugar (24.2) e tipos de informação (25.3).<br />

To<strong>da</strong>s as observações são certas em relação a este texto e certamente vão ser<br />

corretos para o português, mas visto que são basea<strong>do</strong>s em apenas um curto texto não<br />

podem representar a estrutura <strong>da</strong> língua to<strong>da</strong>. Para isto seria necessária a análise de<br />

muitos textos.<br />

33.1 Enre<strong>do</strong><br />

O texto tem quatro partes: o cenário – que é a introdução, episódio 1 com o ponto<br />

culminante, o comentário <strong>do</strong> narra<strong>do</strong>r que separa os episódios (ou serve de introdução ao<br />

segun<strong>do</strong> episódio) e o episódio 2 que também serve de conclusão. Num texto tão curto as<br />

mesmas partes podem ter várias funções ao mesmo tempo.<br />

33.1.1 Introdução (1-2)<br />

A introdução <strong>da</strong>s abelhas, um <strong>do</strong>s participantes essenciais, serve para abrir o<br />

texto. Não diz na<strong>da</strong> sobre o falante ou o ouvinte desta narração. Serve de cenário: o nome<br />

<strong>do</strong> rio que é um lugar conheci<strong>do</strong> aos ouvintes e a existência de um novo tipo de abelhas<br />

diferentes de to<strong>do</strong>s os tipos conheci<strong>do</strong>s até então.<br />

O primeiro verbo tinha é no pretérito imperfeito (imperfectivo real) que mostra a<br />

condição geral antes <strong>do</strong> aparecimento <strong>da</strong>s abelhas; o segun<strong>do</strong> verbo apareceram é<br />

pretérito perfeito (perfectivo real), forma prevalecente neste texto que denota ações<br />

194


individuais dentro de uma série de acontecimentos narra<strong>do</strong>s, ações que realmente<br />

aconteceram.<br />

33.1.2. Corpo (3-14)<br />

O corpo é apresenta<strong>do</strong> em três partes:<br />

O episódio 1 (3-10) que tem sua própria introdução (3) e um ponto culminante (8-<br />

9) com um declive de tensão quan<strong>do</strong> o plano de salvação é executa<strong>do</strong> com sucesso (10).<br />

Começa pela expressão um dia que anuncia o segun<strong>do</strong> participante (as crianças) e uma<br />

série de ações neste conflito entre elas e as abelhas.<br />

O conflito começa pela ação <strong>da</strong>s crianças que viram e mexeram com o enxame<br />

(para achar mel?) e inespera<strong>da</strong>mente foram ataca<strong>da</strong>s. Os verbos estão no pretérito<br />

perfeito (perfectivo real).<br />

O enxame age como uni<strong>da</strong>de: to<strong>da</strong>s atacam de uma vez, assim há perigo mortal<br />

porque são muitas abelhas para <strong>do</strong>is corpos pequenos. E atacam ca<strong>da</strong> parte exposta <strong>do</strong><br />

corpo. Único lugar que elas não alcançam é a parte submersa <strong>do</strong>s corpos. Note que a<br />

forma <strong>do</strong>s verbos sempre é a <strong>do</strong> pretérito perfeito (perfectivo real): foram, viram,<br />

picaram, jogaram para narrar estes fatos que realmente aconteceram.<br />

A forma <strong>do</strong> verbo mu<strong>da</strong> em infinitivo quan<strong>do</strong> um segun<strong>do</strong> verbo depende de um<br />

primeiro: foram pescar (3).<br />

Dentro <strong>da</strong> citação, o verbo principal está no presente <strong>do</strong> indicativo (neutro real) e<br />

na primeira pessoa <strong>do</strong> plural: vamos fazer, vamos emborcar (8-9), as combinações<br />

denotam a ação planeja<strong>da</strong>. A tensão é alta: o perigo é real – certamente estão sen<strong>do</strong><br />

pica<strong>da</strong>s enquanto estão pensan<strong>do</strong> nesta saí<strong>da</strong>. Talvez nem tenham fala<strong>do</strong>, talvez se<br />

entenderam por gestos. O narra<strong>do</strong>r conta o fato com uma primeira citação, e assim a<br />

forma desta parte <strong>do</strong> texto mu<strong>da</strong> completamente. É aqui o ponto culminante.<br />

A idéia enuncia<strong>da</strong> em 9 é implanta<strong>da</strong> em 10 onde a forma <strong>do</strong> verbo de novo é o<br />

pretérito perfeito (perfectivo real). As crianças acham o esconderijo perfeito e as abelhas<br />

afinal desistem. Não há fatali<strong>da</strong>de neste conflito, os <strong>do</strong>is parti<strong>do</strong>s sobrevivem. É o declive<br />

de tensão que se desfaz gra<strong>da</strong>tivamente. No momento de pensar nesta solução não se<br />

sabia ain<strong>da</strong> se ia <strong>da</strong>r certo, mas deu.<br />

195


No fim <strong>do</strong> primeiro episódio o narra<strong>do</strong>r intervém no texto e dá a sua opinião<br />

sobre esta ação sábia <strong>da</strong>s crianças (11-12). É um texto instrutivo-descritivo. Também<br />

serve de introdução ao segun<strong>do</strong> episódio onde as crianças continuam mostran<strong>do</strong> sua<br />

sabe<strong>do</strong>ria ao avisar a família. Note a forma <strong>do</strong> verbo: foi (bom) (11a) que é pretérito<br />

perfeito (perfectivo real), singular, sem antecedente, pois não se refere a um participante,<br />

mas ao acontecimento <strong>da</strong>s crianças terem aquela idéia (11b) que foi sua salvação.<br />

O espisódio 2 (13-14) consiste inteiramente no aviso <strong>do</strong> novo perigo.<br />

Os verbos introdutórios (13a-b) estão novamente no pretérito perfeito (perfectivo<br />

real). Em ca<strong>da</strong> uma destas orações encontra-se a precisão <strong>do</strong> alvo <strong>da</strong> ação em forma de<br />

circunstância: voltaram para casa, falaram para as pessoas.<br />

A citação (13c-14g) consiste em um texto em parte instrutivo, em parte exortativo.<br />

As crianças explicam o perigo à família e sugerem um comportamento adequa<strong>do</strong>.<br />

Propõem três situações perigosas, ca<strong>da</strong> uma delas introduzi<strong>da</strong> por se:<br />

13c. se vocês virem...<br />

14a. se elas lhes perseguirem...<br />

14d-e. se vocês não conseguirem se esconder...<br />

Os verbos estão no presente <strong>do</strong> subjuntivo (irreal neutro).<br />

Ca<strong>da</strong> condição tem sua conseqüência, seja boa ou ruim:<br />

13d. não mexam! (proibição, texto exortativo)<br />

14b-c. elas não vão desistir, (projeção, texto instrutivo-prescritivo)<br />

14f-g. elas podem até matar vocês, (projeção, texto instrutivo-prescritivo).<br />

A proibição (13d) é motiva<strong>da</strong> pelo tamanho <strong>do</strong> perigo, indica<strong>do</strong> por uma<br />

descrição (texto instrutivo-descritivo) cujo predica<strong>do</strong> é o verbo ser acompanha<strong>do</strong> de um<br />

adjetivo; o verbo está no presente <strong>do</strong> indicativo (real neutro).<br />

13e. pois elas são horríveis.<br />

Esta proibição, a única no texto, é expressa pelo verbo no presente <strong>do</strong> subjuntivo,<br />

mas sem verbalizar o sujeito, portanto está sen<strong>do</strong> usa<strong>do</strong> como um tipo de imperativo onde<br />

o sujeito muitas vezes fica implícito. Se este episódio tem um ponto culminante, é aqui na<br />

combinação <strong>do</strong> imperativo com a descrição que exprime a motivação duma ação tão<br />

violenta, a de crianças <strong>da</strong>n<strong>do</strong> uma ordem a adultos.<br />

196


Interpretan<strong>do</strong> 13d-e como ponto culminante, o declive seria 14a-g, que também<br />

serve para a conclusão <strong>do</strong> texto.<br />

33.1.3 Conclusão<br />

Neste texto, o episódio 2 serve de conclusão – ou somente o 14. A tensão<br />

desaparece completamente durante a exortação que resolve o problema <strong>do</strong> novo perigo.<br />

Se fosse um conto poderia terminar em: <strong>da</strong>í viveram felizes para sempre – uma afirmação<br />

tão fora <strong>da</strong> reali<strong>da</strong>de que destruiria o texto.<br />

33.2 Participantes ativos, adereços<br />

O primeiro participante introduzi<strong>do</strong> é um enxame de abelhas (1) – até então<br />

desconheci<strong>da</strong>s. Estas têm a iniciativa no começo <strong>do</strong> texto: elas aparecem (por vontade<br />

própria? ou trazi<strong>da</strong>s por algum homem?). Depois de falar <strong>da</strong> sua prévia inexistência o<br />

autor refere-se a elas com o pronome <strong>da</strong> terceira pessoa, contan<strong>do</strong> sobre sua existência<br />

atual.<br />

O segun<strong>do</strong> parti<strong>do</strong> neste conflito são duas crianças. Note a sua introdução: de um<br />

la<strong>do</strong> sabe-se o número exato, de outro não se sabe, nem se eram meninos ou meninas ou<br />

um de ca<strong>da</strong>. Aquele que conhece a cultura talvez soubesse. Elas tomam a iniciativa: vão<br />

pescar, vêem e mexem com o enxame.<br />

Em 4a as abelhas são reintroduzi<strong>da</strong>s de forma indefini<strong>da</strong>: um enxame de abelhas.<br />

O conflito começa. Elas se sentem ataca<strong>da</strong>s e se defendem contra-atacan<strong>do</strong>, usan<strong>do</strong> a<br />

única arma que possuem, pican<strong>do</strong> as crianças. Na primeira batalha elas vencem. As<br />

crianças procuram um abrigo na água, mas pouco tempo depois, são obriga<strong>da</strong>s a achar<br />

um ambiente mais adequa<strong>do</strong>. A duração <strong>do</strong> ataque obriga-as a achar um lugar que lhes<br />

permita tomar fôlego.<br />

A iniciativa passa de um la<strong>do</strong> <strong>do</strong>s guerreiros ao outro, como é comum numa<br />

batalha. O autor recria um pouco a confusão <strong>da</strong> batalha, usan<strong>do</strong> o pronome 'elas' para os<br />

<strong>do</strong>is protagonistas sem indicação de quem se trata. Somente as ações indicam se é o<br />

enxame ou se são as crianças. Ele usa a referência implícita (ou #) somente para as<br />

197


crianças (4b, 7a, 10a-b), nunca para as abelhas. Estas enfim desistem e a batalha termina.<br />

Não há vence<strong>do</strong>r.<br />

No seu comentário (11-12) o narra<strong>do</strong>r somente se refere às crianças, primeiro com<br />

o pronome (11b) e depois com # (12). Sua preocupação é com elas. Do seu ponto de vista<br />

elas venceram quan<strong>do</strong> acharam um meio de sobreviver a este novo perigo.<br />

No segun<strong>do</strong> episódio há somente um grupo ativo: as crianças que alertam a<br />

família (13-14). Em 13c a 14e o sujeito sempre é expresso – mesmo fican<strong>do</strong> implícito na<br />

ordem quan<strong>do</strong> o segun<strong>do</strong> verbo está no infinitivo e duas construções sem sujeito.<br />

Os ouvintes <strong>da</strong> citação estão lá sem dizer na<strong>da</strong>. A única ação deles é ouvir<br />

atentamente – o que fica implícito. Por isso não são trata<strong>do</strong>s como participantes deste<br />

texto, mas sim como adereços. Sem eles o segun<strong>do</strong> episódio não existiria, mas não são<br />

mais ativos que a canoa que virou lugar de salvação para as crianças. (13-14)<br />

Nestas exortações os ouvintes são trata<strong>do</strong>s de participantes potencialmente ativos<br />

<strong>da</strong>s ações projeta<strong>da</strong>s.<br />

33.3 Enfoque<br />

O enfoque cria<strong>do</strong> pela negação é o mais usa<strong>do</strong> neste texto, começan<strong>do</strong> pela<br />

introdução e ain<strong>da</strong> mais 4 vezes. Outro enfoque na introdução é a expressão de repente<br />

(2) que sublinha a gravi<strong>da</strong>de <strong>do</strong> perigo.<br />

No primeiro episódio este perigo logo se mostra porque o ataque é estendi<strong>do</strong> a<br />

to<strong>da</strong> parte <strong>do</strong> corpo (5) e suas cabeças (7).<br />

No ponto culminante, a citação direta é usa<strong>da</strong>, e as crianças se fazem duas<br />

perguntas para achar um abrigo <strong>do</strong> ataque <strong>da</strong>s abelhas, o grande perigo inespera<strong>do</strong>.<br />

A observação <strong>do</strong> narra<strong>do</strong>r (11-12) termina numa nova negação: as crianças não<br />

morreram (contrário à expectação).<br />

No segun<strong>do</strong> episódio, o encontro com a família, a advertência é introduzi<strong>da</strong> por<br />

uma condição (13c): se vocês virem, no futuro <strong>do</strong> subjuntivo (necessi<strong>da</strong>de irreal), uma<br />

forma menos usa<strong>da</strong> e assim enfoca<strong>da</strong>. A proibição, composta <strong>do</strong> negativo com o<br />

imperativo, é fortemente enfoca<strong>da</strong>, como também a descrição <strong>da</strong>s abelhas com o adjetivo<br />

horríveis. 14a começa com uma segun<strong>da</strong> condição, continuan<strong>do</strong> com outro negativo<br />

198


(14b-c) falan<strong>do</strong> <strong>da</strong> impossibili<strong>da</strong>de de poder escapar. 14d-e é mais uma condição nega<strong>da</strong>,<br />

negan<strong>do</strong> o verbo salva<strong>do</strong>r de escapar, segui<strong>do</strong> pela predição <strong>da</strong> morte. Tu<strong>do</strong> isto é<br />

fortemente enfoca<strong>do</strong>. Certamente o corpo <strong>da</strong>s crianças (não menciona<strong>do</strong>) mostrava o<br />

sinal <strong>da</strong>s pica<strong>da</strong>s.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, a vin<strong>da</strong> delas para contar o fato em si contribui para o declive <strong>da</strong><br />

tensão. Elas são testemunhas vivas de que existe uma maneira de salvar-se de tal perigo.<br />

E mais <strong>do</strong> que isso: já podem falar de um meio de evitar tal ataque e, por outro la<strong>do</strong>, <strong>da</strong><br />

necessi<strong>da</strong>de de providenciar um abrigo seguro no caso de ser ataca<strong>do</strong>.<br />

33.4 Coesão<br />

A coesão neste texto é <strong>da</strong><strong>da</strong> pelo vocabulário usa<strong>do</strong>, e por detalhes não<br />

menciona<strong>do</strong>s. Fala-se <strong>do</strong> ambiente - o rio, citan<strong>do</strong> o nome. Pescar, canoa, saber remar e<br />

na<strong>da</strong>r (implícitos) são úteis e ativi<strong>da</strong>des comuns para os que moram à beira de um grande<br />

rio. Abelhas também são conheci<strong>da</strong>s neste ambiente.<br />

Os participantes também indicam que eles são <strong>da</strong>quele ambiente e agem de<br />

acor<strong>do</strong>. As abelhas tinham chega<strong>do</strong> lá havia pouco tempo (vin<strong>do</strong> <strong>do</strong> sul onde elas foram<br />

cria<strong>da</strong>s por cruzamento entre abelhas <strong>da</strong> África com abelhas mais mansas <strong>do</strong> Brasil para<br />

obter uma varie<strong>da</strong>de que produz grande quanti<strong>da</strong>de de mel de quali<strong>da</strong>de). Eram muito<br />

valentes e atacavam homens e animais, matan<strong>do</strong> pessoas e até cavalos.<br />

Para as crianças <strong>da</strong> região é normal elas tomarem uma canoa, pescarem, e ten<strong>do</strong><br />

família em casa, que elas queiram avisar sobre um novo perigo.<br />

A ordem <strong>do</strong>s eventos apresenta<strong>do</strong>s também contribui para a coesão. Em primeiro<br />

lugar, fala-se de um tipo de abelhas que aparecem e ninguém sabe de onde. O incidente<br />

<strong>do</strong> encontro entre estas e as crianças na canoa queren<strong>do</strong> pescar – e se interessan<strong>do</strong> por<br />

abelhas para enriquecer sua dieta com o mel delicioso produzi<strong>do</strong> por elas – são coisas<br />

normais apresenta<strong>da</strong>s nessa ordem. A surpresa é o caráter <strong>da</strong>s abelhas: agressivas até<br />

matar as vítimas, coisa até então desconheci<strong>da</strong>. Surpreendente também é a maneira<br />

sensata <strong>da</strong>s crianças reagirem: achar um lugar de abrigo dentro <strong>da</strong> água, usan<strong>do</strong> a canoa,<br />

e avisan<strong>do</strong> a família. É bem isto que fez o texto.<br />

199


34 Textos de procedimentos<br />

Outros gêneros<br />

Iremos apresentar os mesmos pontos de pesquisa que discutimos nos textos<br />

narrativos, mas aplica<strong>do</strong> a outros tipos de gêneros, começan<strong>do</strong> com o texto de<br />

procedimentos. Na literatura é raro achar alguém analizan<strong>do</strong> textos não narrativos, assim<br />

nossas observações baseiam-se na análise de um número de textos bem menor que as<br />

outras partes <strong>do</strong> livro.<br />

Já mostramos que os textos de procedimentos são similares no formato, mas não<br />

idênticos às narrativas (seção 1.3.2). Ambos têm desenvolvimento cronológico, papel<br />

passivo em sua orientação e projeção, ain<strong>da</strong> que muitas vezes esteja situa<strong>do</strong> no passa<strong>do</strong>.<br />

Nos concentramos em mostrar as diferenças.<br />

34.1 Tipos de texto de procedimentos<br />

Há <strong>do</strong>is tipos principais de textos de procedimento: o prescritivo e o descritivo.<br />

Textos prescritivos apontam os passos que alguém precisa para alcançar o resulta<strong>do</strong><br />

deseja<strong>do</strong>, tais como assar um bolo, construir uma casa ou fazer uma roça. Eles são textos<br />

de “como fazer”. Eles são feitos, principalmente, para quem deseja aprender fazer uma<br />

coisa nova. Textos descritivos descrevem costumes e tradições que podem ou não ser<br />

usa<strong>do</strong>s hoje. Eles são <strong>do</strong> tipo “como eles costumavam fazer”. Em segui<strong>da</strong>, nos<br />

apresentaremos um texto prescritivo “Como fazer tapioca de coco.”<br />

34.2 Pragmatica<br />

Narrativas no contexto africano são fala<strong>da</strong>s, normalmente, à noite. Textos de<br />

procedimento tem seu lugar apropria<strong>do</strong>. Na América <strong>do</strong> Sul, entre certos grupos<br />

indígenas, pode ser necessário que o narra<strong>do</strong>r apresente suas credenciais antes de expor<br />

qualquer tipo de instrução de um procedimento a seguir, uma vez que isto é prerrogativa<br />

<strong>do</strong> chefe. Em outras culturas, uma sala de aula pode ser uma situação bem natural. Há<br />

muitos livros de instrução no merca<strong>do</strong> que explicam o que fazer apara obter determina<strong>do</strong>s<br />

200


esulta<strong>do</strong>s, enquanto descrições etnológica falam sobre costumes. Ca<strong>da</strong> medicamento tem<br />

junto as instruções de uso e ca<strong>da</strong> acessório que é vendi<strong>do</strong> em qualquer lugar.<br />

34.3 Orientação<br />

Textos de procedimentos têm orienta<strong>do</strong>s a obter objetivos. As ações são toma<strong>da</strong>s<br />

com um objetivo em mente. Em geral, muitos estágios seguem um ao outro no decorrer<br />

<strong>do</strong> tempo. As ações também podem ser determina<strong>da</strong>s pelos participantes: homens fazem<br />

isto, mulheres fazem aquilo...” ou eles podem ser determina<strong>do</strong>s pelo lugar: neste lugar,<br />

você coloca isto, lá em cima aquilo...<br />

Pode ou não ter uma conclusão que pode ser o resulta<strong>do</strong> em si ou talvez o uso <strong>do</strong><br />

objeto fabrica<strong>do</strong>.<br />

34.4 Estrutura interna<br />

O tema principal normalmente é declara<strong>do</strong>, de alguma forma, na introdução. Se<br />

bem que um título, introdução e o cenário estejam lá, em muitos casos, um ou mais estão<br />

faltan<strong>do</strong>. Não raro, o corpo é dividi<strong>do</strong> em muitos estágios de eventos. Talvez haja<br />

subtemas. O uso <strong>do</strong> resulta<strong>do</strong> pode ser explica<strong>do</strong> como um tipo de desfecho.<br />

Pode ou não ter uma conclusão, ou pode ser junto com a declaração <strong>do</strong> resulta<strong>do</strong>.<br />

Estas divisões de um texto podem ou não ser marca<strong>da</strong>s por algum meio<br />

lingüístico, em particular, através <strong>do</strong> seu significa<strong>do</strong>. Por exemplo, o que poderia ser<br />

semanticamente o ponto culminante, o resulta<strong>do</strong> <strong>do</strong>s eventos precedentes, talvez não haja<br />

um marca<strong>do</strong>r, mas algo sobre o qual não se pensou anteriormente.<br />

Também pode ser dito que os textos instrutivos, como as narrativas, podem ter<br />

neles, textos incorpora<strong>do</strong>s <strong>do</strong> mesmo tipo ou de outros gêneros como por exemplo<br />

citações.<br />

(541) 1. Como costurar um vesti<strong>do</strong>. 2a. Se eu quero costurar uma<br />

roupa, 2b. preciso <strong>do</strong> teci<strong>do</strong> primeiro.....<br />

A primeira sentença funciona como um título. Costurar um vesti<strong>do</strong> é, então,<br />

repeti<strong>do</strong> na primeira instrução que segue o objetivo imediato. Assim, um conjunto de<br />

instruções segue, entre as quais providenciar uma roupa é apenas o primeiro.<br />

201


Num texto instrutivo, certas condições precisam estar completas. Assim no texto<br />

"como fazer tapioca" (ver 34. a primeira instrução é:<br />

(542) A massa precisa estar úmi<strong>da</strong>.<br />

Tal construção indica que há muitos eventos a serem segui<strong>do</strong>s antes <strong>do</strong> trabalho<br />

ser concluí<strong>do</strong>. Também há uma função de destaque. Como as narrativas, os textos<br />

instrutivos podem conter lembranças passa<strong>da</strong>s, projeções e textos incorpora<strong>do</strong>s, incluin<strong>do</strong><br />

fala reportativa.<br />

O final de um texto instrutivo pode ser indica<strong>do</strong>, explican<strong>do</strong> a utili<strong>da</strong>de <strong>do</strong><br />

resulta<strong>do</strong>. Assim um caça<strong>do</strong>r pode terminar sua instrução de como caçar macaco com:<br />

(543) Quan<strong>do</strong> ele (o macaco) cair, você o carregue até a vila, corte-o,<br />

narrativa.<br />

cozinhe e coma-o (com to<strong>da</strong> a comuni<strong>da</strong>de).<br />

Um tal fim que ocorre no parágrafo final tem uma estrutura que lembra a<br />

O tema <strong>do</strong> titulo também pode ser repeti<strong>do</strong> na conclusão. Os Tem (Togo) iniciam<br />

um texto sobre o trabalho <strong>da</strong> mulher pela frase:<br />

A mulher nunca tem tempo para descansar.<br />

Enumeram uma longa série de ativi<strong>da</strong>des delas para cui<strong>da</strong>r <strong>do</strong> mari<strong>do</strong>, <strong>da</strong>s crianças e <strong>da</strong><br />

comuni<strong>da</strong>de e terminam:<br />

À Mulher falta tempo para descansar.<br />

34.5 Participantes<br />

Participantes não têm a mesma importância nos textos instrutivos, como têm nas<br />

narrativas. Uma vez que não se espera que alguém haja ativamente, o agente pode ser<br />

camufla<strong>do</strong> em um pronome genérico como alguém, você, eles, nós ou eu, ou até mesmo<br />

usan<strong>do</strong> apenas o infinitivo. Pacientes podem ter um papel mais diferencia<strong>do</strong>, desde que o<br />

texto seja orienta<strong>do</strong> pela meta ou pelo paciente. Em to<strong>do</strong> caso, os pacientes não estão<br />

realmente em foco, mas a ação por si mesma, mesmo quan<strong>do</strong> certas ações são feitas por<br />

homens e outras por mulheres ou outros grupos.<br />

Beavon (1984) relata <strong>do</strong> Konzime o seguinte uso <strong>do</strong>s pronomes sujeitos em textos<br />

instrutivos. Ca<strong>da</strong> estágio <strong>do</strong> processo tem sua própria regra para sua referência de agente.<br />

202


Ten<strong>do</strong> examina<strong>do</strong> quatro textos que, certamente, não são conclusivos, mas podem servir<br />

como um bom começo de análise, ele apresenta a seguinte tabela.<br />

Tabela (52): Agentes em quatro textos Konzime (Camarões)<br />

Textos Abertura Introdução Estágios Intermediários Estágio Final Conclusão<br />

1 1SG não enfático 1SG enfático<br />

2 1PL exclusivo (1+1) 2SG enfático<br />

3 3PL 2SG 1SG<br />

4 3PL 3SG 1SG 3PL<br />

Um exame detalha<strong>do</strong> de tais codificações podem trazer à luz, a hierarquia de<br />

dinamici<strong>da</strong>de <strong>do</strong> uso <strong>do</strong> pronome: certamente a primeira pessoa é mais dinâmica que a<br />

terceira pessoa! Em to<strong>do</strong> caso, há uma mu<strong>da</strong>nça de pronomes em to<strong>do</strong>s os quatro textos<br />

examina<strong>do</strong>s nos estágios final e intermediário, e o quarto texto coloca à parte a abertura<br />

de um la<strong>do</strong> e a conclusão de outro, sem distinguir entre a introdução e os estágios<br />

intermediários.<br />

34.6 Formas verbais<br />

As formas <strong>do</strong> verbo encontra<strong>da</strong>s em textos instrutivos variam de língua para<br />

língua. Espera-se que as formas <strong>do</strong> mo<strong>do</strong> irreal e o infinitivo ocorram com muita<br />

freqüência. Em textos prescritivos, as ações podem ser executa<strong>da</strong>s em qualquer tempo,<br />

assim elas não são orienta<strong>da</strong>s pelo tempo. Em textos descritivos, as formas <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> ou<br />

<strong>do</strong> presente são as mais usa<strong>da</strong>s.<br />

Em textos prescritivos podem- se encontrar condições e conseqüências, como<br />

estágios <strong>do</strong> processo. Desta forma, o mo<strong>do</strong> condicional será encontra<strong>do</strong>. Os imperativos,<br />

como pedi<strong>do</strong>s, podem ser incluí<strong>do</strong>s. As instruções são para serem segui<strong>da</strong>s <strong>do</strong> jeito que<br />

forem <strong>da</strong><strong>da</strong>s.<br />

(544) Como arranjar esposa entre os Malinké<br />

1a-c Se um homem deseja casar, ele precisa primeiro uma noiva.<br />

203


Em Kozime, o presente progressivo é usa<strong>do</strong> para indicar uma ação habitual<br />

enfática. O presente progressivo é encontra<strong>do</strong> na abertura e nos primeiros <strong>do</strong>is estágios.<br />

Beavon também fala sobre um futuro especial usa<strong>do</strong> para indicar que a realização de uma<br />

ação depende de que algo outro também esteja acontecen<strong>do</strong>, parece ser um futuro<br />

condicional. Nota que no exemplo abaixo os acentos indicam altura de voz:<br />

Konzime (Camarão):<br />

(545) [mé-ò-tô] eu-então FUT ir-<br />

(546) [mè-ó-tô] eu irei<br />

Ambas as formas são <strong>do</strong> futuro condicional, ò- é usa<strong>do</strong> somente quan<strong>do</strong> uma ação<br />

é dependente <strong>da</strong> realização de outra.<br />

Beavon também fala sobre uma forma persuasiva que é usa<strong>da</strong> em seus <strong>da</strong><strong>do</strong>s<br />

como um convite para o ouvinte colocar em prática o que ele explicou e é usa<strong>do</strong><br />

principalmente no estágio final de um texto:<br />

(547) Konzime:<br />

Nó ó, gúa gó ká duho kwár, nze naa...<br />

Então FOC tu- EMF tu-EXORT FOC(EXORT) sair vila, INGR visitar<br />

"Então, você tem que deixar a vila para chegar ,visitar....<br />

A forma habitual é muito usa<strong>da</strong> em textos instrutivos para explicar o uso de um<br />

determina<strong>do</strong> produto.<br />

Em Tem (Togo), quatro formas de verbos são usa<strong>da</strong>s:<br />

− Imperfectivo (real) é usa<strong>do</strong> na introdução e no ponto culminante, mas sempre<br />

antecedi<strong>do</strong> por eventos simultâneos. Também é usa<strong>do</strong> nos estágios preliminares.<br />

− Perfectivo (real) é usa<strong>do</strong> nos estágios preliminares quan<strong>do</strong> antecedi<strong>do</strong> por eventos<br />

anteriores.<br />

− Infinitivo é usa<strong>do</strong> no fim <strong>do</strong>s estágios individuais e <strong>do</strong> sumário para mostrar os<br />

eventos pretendi<strong>do</strong>s <strong>da</strong> principal ação.<br />

− Neutro é usa<strong>do</strong> para to<strong>do</strong>s os outros verbos que constituem a linha <strong>do</strong> evento; o<br />

fluxo <strong>do</strong> neutro é interrompi<strong>do</strong> pelo imperfectivo, pelo perfectivo, ou pelo<br />

infinitivo.<br />

204


34.7 Ênfase<br />

O tema e o objetivo costumam ser os mesmos em textos instrutivos. Eles têm uma<br />

forma verbal especial. Topicalização e várias formas de focalização e desfocalização<br />

podem ser encontra<strong>da</strong>s em tais textos.<br />

Em Konzime, ká ‘finalmente’ é o focaliza<strong>do</strong>r usa<strong>do</strong> com textos instrutivos. Ca<strong>da</strong><br />

vez que a pessoa de referência é mu<strong>da</strong><strong>da</strong>, serve como ênfase. Uma outra mu<strong>da</strong>nça é<br />

encontra<strong>da</strong> no ritmo <strong>da</strong>s ações: em vez de nomeá-las uma após a outra, alternativas e<br />

incertezas são introduzi<strong>da</strong>s. O habitual pode ser usa<strong>do</strong> para aju<strong>da</strong>r a atrasar o<br />

acontecimento/a que<strong>da</strong>(?) de coisas, uma marca <strong>da</strong> aproximação <strong>do</strong> ponto culminante.<br />

34.8 Coesão<br />

Marca<strong>do</strong>res de coesão formal também são encontra<strong>do</strong>s. O mais digno de nota é a<br />

função <strong>do</strong> sumário de cau<strong>da</strong>-cabeça.<br />

(548) Texto Tem (Togo):<br />

Depois de cozinhar ela chama as crianças e dá comi<strong>da</strong> para elas. Ela<br />

também prepara a mesa para o seu mari<strong>do</strong>. Depois <strong>da</strong> refeição, ela lava as<br />

louças.<br />

Depois de cozinhar e depois <strong>da</strong> refeição sintetizam to<strong>da</strong>s as ações<br />

anteriores. Também introduzem uma nova seqüência de ações.<br />

Os estágios são interconecta<strong>do</strong>s com várias partículas e conjunções tais como,<br />

então, depois, neste momento, enquanto isso, etc. O último estágio pode ser introduzi<strong>do</strong><br />

por finalmente.<br />

34.9 Um exemplo<br />

Iremos agora apresentar um texto instrutivo em português <strong>do</strong> Brasil, escrito para<br />

este livro por Lusineide Moura.<br />

205


Como fazer tapioca de coco<br />

1a A massa <strong>da</strong> tapioca precisa 1b estar úmi<strong>da</strong>. 2 Peneire a massa numa<br />

peneira fina. 3a Depois de peneirar a massa, 3b você tempera com um<br />

pouco de sal. 4a O coco já deve 4b estar 4c rala<strong>do</strong>. 5 Mas preste atençãoǃ<br />

6a O coco bom para fazer a tapioca 6b é o coco natural, 6c não o coco<br />

compra<strong>do</strong> em saquinho no supermerca<strong>do</strong>ǃ 7a Depois de peneira<strong>da</strong> a massa,<br />

7b você já pode 7c começar 7d a fazer a tapioca. 8a Escolha uma frigideira<br />

com teflon 8b ou uma que não grude. 9a Deixe no fogo 9b até esquentar o<br />

suficiente para 9c assar a massa. 10a Pegue um punha<strong>do</strong> de massa e 10b<br />

espalhe uniformemente no fun<strong>do</strong> <strong>da</strong> frigideira. 11 Logo depois espalhe um<br />

punha<strong>do</strong> de coco rala<strong>do</strong> em cima <strong>da</strong> massa. 12a Assim que as bor<strong>da</strong>s<br />

começarem a 12b se soltar, 12c você pode 12d enrolar a massa 12e como<br />

se fosse 12f fazer um canelone 12g ou <strong>do</strong>brar no meio. 13a Junte as<br />

pontas, 13b vire um pouco de um la<strong>do</strong> para outro 13c e a tapioca já está<br />

13d pronta 13e para ser 13f comi<strong>da</strong>. 14a Se preferir, 14b acrescente leite<br />

condensa<strong>do</strong> ou queijo 14c para <strong>da</strong>r um novo sabor. 15a É 15b<br />

recomen<strong>da</strong><strong>do</strong> 15c que seja 15d comi<strong>da</strong> com café.<br />

34.9.1 Tabela de base<br />

A tabela de base é arranja<strong>da</strong> segun<strong>do</strong> os mesmos princípios <strong>da</strong> tabela de um texto<br />

narrativo. Por conveniência introduzimos três possibili<strong>da</strong>des de circunstância depois <strong>do</strong><br />

objeto porque há <strong>do</strong>is em 3b, 10b, 13b e três em 11.<br />

206


Tabela 53: Tabela de base/básica de “Como fazer tapioca de coco”<br />

Nr. ligação sujeito temp obj Verbo maneira objeto cir. cir. cir.<br />

1a A massa precisa<br />

1b estar úmi<strong>da</strong>.<br />

2 Peneire a massa numa peneira.<br />

3a Depois de peneirar a massa,<br />

3b você tempera com um pouco<br />

de sal.<br />

4a O coco já deve<br />

4b estar<br />

4c rala<strong>do</strong><br />

5 Mas preste atenção!<br />

6a+c O coco<br />

bom<br />

(6c)<br />

(6c)<br />

6b para fazer tapioca<br />

6c (6a) é (o coco<br />

natural)<br />

tapioca<br />

6d não (é)<br />

6e o coco compra<strong>do</strong> em no<br />

saquinhos supermerca<strong>do</strong>.<br />

7a Depois de peneira<strong>da</strong> a massa,<br />

7b você já pode<br />

7c começar<br />

7d a fazer a tapioca.<br />

8a Escolha uma<br />

frigideira<br />

de teflon<br />

8b ou uma (8c)<br />

8c que não grude.<br />

9a Deixe no fogo<br />

9b até esquentar o suficiciente<br />

9c para assar a massa..<br />

10a Pegue um punha<strong>do</strong> de massa<br />

10b espalhe uniforme-<br />

no fun<strong>do</strong><br />

emente<br />

<strong>da</strong> frigideira.<br />

11 logo depois, espalhe um pouco (de coco rala<strong>do</strong>)<br />

de coco em cima<br />

rala<strong>do</strong> <strong>da</strong> massa.<br />

12a assim que as bor<strong>da</strong>s começarem<br />

12b a se soltar<br />

207


12c você pode<br />

12d enrolar a massa<br />

12e como se fosse<br />

12f fazer um canelone<br />

12g ou <strong>do</strong>brar ao meio.<br />

13a Junte as pontas<br />

13b vire um pouco de um la<strong>do</strong><br />

para outro<br />

13c e a tapioca já está<br />

13d (pronta)<br />

13e para ser<br />

13f comi<strong>da</strong>.<br />

14a Se preferir,<br />

14b acrescente leite condensa<strong>do</strong><br />

ou<br />

queijo<br />

14c para <strong>da</strong>r um novo<br />

sabor.<br />

15a É<br />

15b recomen-<br />

<strong>da</strong><strong>do</strong><br />

15c que seja<br />

15d comi<strong>da</strong> com café.<br />

Observações sobre a sintaxe: O objeto pode preceder o verbo se for pronome, caso<br />

contrário ele o segue. Entre o sujeto e o objeto de pronome a língua permite a indicação<br />

de tempo pela partícula já. O objeto de substantivo segue o verbo, entre os <strong>do</strong>is pode<br />

haver uma indicação de maneira. A oração pode terminar com até três circunstâncias.<br />

34.9.2 Enre<strong>do</strong><br />

A introdução é feita em duas partes: uma declaração <strong>do</strong> mo<strong>do</strong> como a massa deve<br />

estar e o passo inicial a ser <strong>da</strong><strong>do</strong>. O restante é composto pelo corpo <strong>do</strong> texto, também<br />

dividi<strong>do</strong> em várias partes que vão <strong>do</strong> processo de preparar a massa até o ato propriamente<br />

dito, de fazer a tapioca. A conclusão é composta de sugestões de como incrementar o<br />

acompanhamento para a tapioca.<br />

208


Tabela 54:<br />

Introdução: 1 característica <strong>da</strong> massa<br />

Parte 1: 2a - 3b preparo <strong>da</strong> massa<br />

Parte 2: (4a-4c) retrospecção<br />

Parte 3: (5-6d) advertência<br />

Parte 4: (7a-d) critério exigi<strong>do</strong> para se iniciar a parte principal<br />

Parte 5: : (8a (8a –b) b)<br />

escolha <strong>da</strong> panela<br />

Parte 6: (9a-9c) como usar a panela<br />

Parte 7: (10a-13f) parte principal <strong>do</strong> ato de fazer a tapioca<br />

Conclusão: (14a-15d) como incrementar acompanhamento<br />

34.9.3 Participantes<br />

O participante principal é o narra<strong>do</strong>r <strong>do</strong> texto. Na mente <strong>do</strong> narra<strong>do</strong>r, a platéia<br />

para este discurso pode ser uma única pessoa, assim como podem ser várias pessoas. Ele<br />

tem um público em mente, com certeza. Alem destas pessoas, temos os ingredientes e os<br />

utensílios que são usa<strong>do</strong>s: a massa e o sal; a panela e o pano de prato. Também está<br />

implícito o uso <strong>da</strong> peneira e <strong>do</strong> ralo para ralar o coco.<br />

34.9.4 Formas verbais<br />

Para analisar mais facilmenteas as formas verbais, pode-se fazer uma lista<br />

exaustiva deles, escreven<strong>do</strong> ao la<strong>do</strong> a designação <strong>da</strong> forma. Incluímos esta lista, usan<strong>do</strong> a<br />

terminologia <strong>da</strong> gramática tradicional junto com a nova proposta deste livro.<br />

1a precisa presente <strong>do</strong> indicativo real neutro<br />

1b estar infinitivo neutro<br />

2 peneire presente <strong>do</strong> subjuntivo (!) irreal neutro<br />

3a peneirar infinitivo neutro<br />

3b tempera presente <strong>do</strong> indicativo (!) real neutro<br />

4a deve presente <strong>do</strong> indicativo (!) real neutro<br />

4b estar infinitivo neutro<br />

209


4c rala<strong>do</strong> particípio perfectivo<br />

5 preste presente <strong>do</strong> subjuntivo (!) irreal neutro<br />

6a bom (adjetivo) (i)<br />

6b fazer infinitivo neutro<br />

6c é presente <strong>do</strong> indicativo real neutro<br />

6d não (é)<br />

6e compra<strong>do</strong> particípio perfectivo<br />

7a peneira<strong>da</strong> particípio perfectivo<br />

7b pode presente <strong>do</strong> indicativo (!) real neutro<br />

7c começar infinitivo neutro<br />

7d fazer infinitivo neutro<br />

8a escolha presente <strong>do</strong> subjuntivo (!) irreal neutro<br />

8b (escolha)<br />

8c não grude presente <strong>do</strong> subjuntivo irreal neutro<br />

9a deixe presente <strong>do</strong> subjuntivo (!) irreal neutro<br />

9b esquentar infinitivo neutro<br />

9c assar infinitivo neutro<br />

10a pegue presente <strong>do</strong> subjuntivo (!) irreal neutro<br />

10b espalhe presente <strong>do</strong> subjuntivo (!) irreal neutro<br />

rala<strong>do</strong> particípio (como adjetivo) perfectivo<br />

11 espalhe presente <strong>do</strong> subjuntivo (!) irreal neutro<br />

rala<strong>do</strong> particípio (como adjetivo) perfectivo<br />

12a começarem futuro <strong>do</strong> subjuntivo necec. perfectivo<br />

12b soltar infinitivo neutro<br />

12c pode presente <strong>do</strong> indicativo real neutro<br />

12d enrolar infinitivo neutro<br />

12e fosse pretérito imperf. <strong>do</strong> subjuntivo irreal perfectivo<br />

12f fazer infinitivo neutro<br />

12g <strong>do</strong>brar infinitivo neutro<br />

13a junte resente <strong>do</strong> subjuntivo (!) irreal neutro<br />

13b vire presente <strong>do</strong> subjuntivo (!) irreal perfectivo<br />

210


13c está presente <strong>do</strong> indicativo real neutro<br />

13d pronta particípio (adjetivo) perfectivo<br />

13e ser infinitivo neutro<br />

13f comi<strong>da</strong> particípio perfectivo<br />

14a preferir futuro <strong>do</strong> subjuntivo necec. perfectivo<br />

14b acrescente presente <strong>do</strong> subjuntivo (!) irreal perfectivo<br />

condensa<strong>do</strong> particípio (adjetivo) perfectivo<br />

14c <strong>da</strong>r infinitivo neutro<br />

15a é presente <strong>do</strong> indicativo real neutro<br />

15b recomen<strong>da</strong><strong>do</strong> particípio (adjetivo) perfectivo<br />

15c seja presente <strong>do</strong> subjuntivo (!) irreal perfectivo<br />

A maior parte <strong>da</strong>s ações neste texto são injunções, passos necessários para obter o<br />

resulta<strong>do</strong> intenciona<strong>do</strong>. A forma mais freqüentemente usa<strong>da</strong> é a <strong>do</strong> presente <strong>do</strong><br />

subjuntivo. Quan<strong>do</strong> é usa<strong>do</strong> como injunção vem marca<strong>do</strong> com (!) e aparecem 11 vezes.<br />

Uma vez é usa<strong>do</strong> para exprimir uma característica, 8c uma panela que não grude.<br />

O presente <strong>do</strong> indicativo também é usa<strong>do</strong> para injunções, e parece marcar partes<br />

<strong>do</strong> enre<strong>do</strong>:, 3b no fim <strong>da</strong> primeira e 4 a no começo <strong>da</strong> segun<strong>da</strong> parte, 7b no início <strong>da</strong> parte<br />

4 que fala <strong>da</strong> condição para a ativi<strong>da</strong>de principal. Também é usa<strong>do</strong> para indicar<br />

condições: em 1b na introdução, em 6 para designar o ingrediente bom, e, 15 a no fim para<br />

indicar o uso <strong>do</strong> produto.<br />

O pretérito imperfeito <strong>do</strong> subjuntivo ocorre uma vez no meio <strong>da</strong>s ações principais.<br />

Indica o ponto em que o processo já está termina<strong>do</strong> e prepara-se a maneira de servir o<br />

produto. São apresenta<strong>da</strong>s duas opções: enrolar como se fosse um canelone ou <strong>do</strong>brar.<br />

O futuro <strong>do</strong> subjuntivo é usa<strong>do</strong> duas vezes. Uma vez é usa<strong>do</strong> para indicar que o<br />

produto está pronto, 12 a assim que as bor<strong>da</strong>s começarem a gru<strong>da</strong>r. E em 14ª se preferir é<br />

usa<strong>do</strong> para falar <strong>da</strong> maneira como se pode usar o produto.<br />

211


34.9.5 Ênfase<br />

A primeira ênfase ocorre em 5: preste atenção! O falante está interessa<strong>do</strong> em que<br />

o produto saia bem, assim ele dedica duas frases à advertência (5-6). A primeira parte é<br />

uma ordem abruta, a segun<strong>da</strong> uma qualificação <strong>do</strong> ingrediente de primeira quali<strong>da</strong>de.<br />

Para emfatizar ele usa o negativo: não é aquele compra<strong>do</strong> no supermerca<strong>do</strong>.<br />

este serviço.<br />

O negativo é usa<strong>do</strong> outra vez em 8c para indicar que tipo de panela presta para<br />

Os adjetivos e os advérbios mostram o cui<strong>da</strong><strong>do</strong> para com as ações e a alegria <strong>do</strong><br />

falante em ver uma coisa gostosa se desenvolver: a massa úmi<strong>da</strong>, a peneira fina, um<br />

pouco de sal, a quali<strong>da</strong>de <strong>do</strong> coco, a panela certa, o tempo suficiente, espalhar a massa<br />

uniformemente, a possibili<strong>da</strong>de de novos sabores.<br />

34.9.6 Coesão<br />

O vocabulário assegura a coesão lexical. As construções são paralelas, a ordem<br />

<strong>do</strong>s eventos na ordem cronológica. O texto vai <strong>do</strong>s ingredientes, passan<strong>do</strong> pelo preparo<br />

até ao consumo. As formas <strong>do</strong>s verbos mostram de um la<strong>do</strong> paralelismo e de outro um<br />

progresso com etapas identificáveis até um fim télico: uma comi<strong>da</strong> boa.<br />

35. Textos Explicativos<br />

O texto explicativo, em sua estrutura interna, é muito diferente <strong>da</strong> narrativa e <strong>do</strong>s<br />

textos instrutivos. É mais como o diálogo normal com perguntas e respostas, mas com<br />

monólogos mais longos. Uma vez que o texto explicativo é usa<strong>do</strong> para ensino, coloca o<br />

falante no papel de professor e os ouvintes no papel de estu<strong>da</strong>ntes. Os ouvintes podem<br />

não responder na<strong>da</strong>, o resulta<strong>do</strong> seria um texto <strong>da</strong><strong>do</strong> unicamente pelo professor.<br />

Como explicamos em 1.3.3 no gênero explicativo existem <strong>do</strong>is sub-gêneros, os<br />

explicativos es os descritivos. No gênero explicativo nota-se uma tensão pelo uso <strong>da</strong><br />

argumentação lógica nem sempre presente num texto descritivo. Exprime pontos de vista,<br />

conceitos, a lógica <strong>do</strong> tema, costumes, maneiras de produção. Pode ser genérico quan<strong>do</strong><br />

se fala em grupos de pessoas, ou personaliza<strong>do</strong>, descreven<strong>do</strong> hábitos de pessoas.<br />

212


Neste livro nos limitaremos a um exemplo de um texto descritivo.<br />

35.1 Texto e tabela de base<br />

Um texto descritivo pode ser introduzi<strong>do</strong> por um pedi<strong>do</strong> como por exemplo:<br />

Mãe, explica-me (mais uma vez) como o vô fazia açúcar!<br />

Tal pedi<strong>do</strong> pode ser trata<strong>do</strong> como parte <strong>do</strong> texto.<br />

Será apresenta<strong>do</strong> um texto de Lusineide Moura que fala <strong>do</strong> trabalho profissional<br />

de seu pai, administra<strong>do</strong>r de engenho de cana de açúcar, chama<strong>do</strong> abaixo de texto<br />

“Açúcar”.<br />

(549) 1 Meu pai era um homem muito trabalha<strong>do</strong>r. 2 Ele era administra<strong>do</strong>r<br />

de engenho de cana de açúcar. 3a O trabalho dele consistia 3b em cui<strong>da</strong>r<br />

de to<strong>do</strong> o processo <strong>da</strong> plantação de cana de açúcar 3c que ia <strong>da</strong><br />

preparação <strong>do</strong> terreno até o corte <strong>da</strong> cana e o transporte para as usinas de<br />

moagem.<br />

4a O tempo era 4b dividi<strong>do</strong> em duas etapas: safra e entre-safra. 5a A safra<br />

era a época em que a cana 5b já estava no ponto 5c de ser 5d corta<strong>da</strong> 5e e<br />

transporta<strong>da</strong> para a usina. 6a Muita gente 6b era contrata<strong>da</strong> 6c para fazer<br />

este serviço porque to<strong>da</strong> a cana 6d tinha 6e de ser 6f corta<strong>da</strong> num perío<strong>do</strong><br />

determina<strong>do</strong> de tempo. 7a Depois disso, as usinas fechariam 7b e não<br />

receberiam mais cana de açúcar. 8a A entre-safra 8b era o perío<strong>do</strong> em que<br />

as usinas 8c fechavam 8d e ia-se preparar o terreno para a nova plantação<br />

para que 8e quan<strong>do</strong> começassem as chuvas, to<strong>do</strong> o terreno já 8f estivesse<br />

pronto para o plantio. 9a Esse também era o perío<strong>do</strong> em que meu pai 9b<br />

colhia a mandioca 9c que ele plantava 9d e vendia para as casas de<br />

farinha. 10 A vi<strong>da</strong> no engenho era uma vi<strong>da</strong> muito dinâmica e alegre. 11<br />

Meu pai marcou a vi<strong>da</strong> de muita gente por lá.<br />

213


Tabela 55: Tabela de base<br />

N ligação sujeito temp verbo pred. <strong>do</strong><br />

r<br />

o<br />

sujeito<br />

1 Meu<br />

era um homem<br />

pai<br />

muito<br />

trabalha<strong>do</strong>r<br />

2 Ele era administra<strong>do</strong><br />

r<br />

3a O<br />

trabalh<br />

o dele<br />

consistia<br />

objeto circunstânci<br />

a<br />

de engenho<br />

de cana-deaçúcar<br />

3b em cui<strong>da</strong>r de to<strong>do</strong><br />

3c (o<br />

processo)<br />

3d de (a<br />

plantação)<br />

3e que ia<br />

3f de (a<br />

preparação)<br />

de cana-deaçúcar<br />

<strong>do</strong> terreno<br />

3g até (o corte) <strong>da</strong> cana<br />

3h e (o<br />

transporte)<br />

para as<br />

usinas de<br />

moagem<br />

4a O<br />

tempo<br />

era<br />

4b dividi<strong>do</strong> em duas<br />

etapas safra e<br />

entre-safra<br />

5a A safra era a época<br />

5b em que a cana já estava no ponto de<br />

5c ser<br />

5d corta<strong>da</strong><br />

5e e transporta<strong>da</strong><br />

para a usina<br />

6a Muita<br />

gente<br />

era<br />

6b contrata<strong>da</strong><br />

6c para fazer este<br />

servic<br />

o<br />

6d porque to<strong>da</strong> a tinha<br />

214


6e de<br />

cana<br />

ser<br />

6f corta<strong>da</strong> num perío<strong>do</strong><br />

determina<strong>do</strong><br />

de tempo<br />

7a depois as<br />

fechariam<br />

disso, usinas<br />

7b e<br />

receberiam cana<br />

não…mai<br />

de<br />

s<br />

açúcar<br />

8a a entresafra<br />

era o perío<strong>do</strong><br />

8b em que as<br />

usinas<br />

fechavam<br />

8c e ia (se)<br />

8d preparar o para a nova<br />

terren<br />

o<br />

plantação<br />

8e para que<br />

começasse (as chuvas)<br />

quan<strong>do</strong><br />

m<br />

8f to<strong>do</strong> o<br />

terreno<br />

já estivesse<br />

8g pronto para o plantio<br />

9a Esse<br />

também<br />

era o perio<strong>do</strong><br />

9b em que meu pai colhia a<br />

mandi<br />

-oca<br />

9c que ele plantava<br />

9d e vendia para as casas<br />

de farinha<br />

10 A vi<strong>da</strong> era uma vi<strong>da</strong><br />

no<br />

muito<br />

engenh<br />

dinâmica e<br />

o<br />

alegre<br />

11 Meu<br />

marcou a vi<strong>da</strong> de muita<br />

pai<br />

gente lá.<br />

35.2 Pragmática<br />

Neste texto, a primeira frase é a “dica" para chamar a atenção <strong>do</strong> leitor e<br />

introduzir o assunto <strong>do</strong> texto. É usa<strong>da</strong> para prender a atenção <strong>do</strong> leitor.<br />

215


Ao mesmo tempo dá credibili<strong>da</strong>de ao texto, explican<strong>do</strong> a profissionali<strong>da</strong>de <strong>da</strong><br />

pessoa cujo trabalho está sen<strong>do</strong> apresenta<strong>do</strong>. Isto pode ter muita importância em uma<br />

situação onde o falante explica processos que só ele conhece e está queren<strong>do</strong> ensinar.<br />

35.3 Orientação<br />

Textos explicativos expõem pontos de vista, conceitos, a lógica <strong>do</strong> tema,<br />

costumes, etc. O papel <strong>do</strong>s participantes <strong>do</strong> texto explicativo é diferente <strong>do</strong> texto<br />

narrativo. O tempo não é importante aqui, mas os argumentos e as conseqüências.<br />

35.4 Enre<strong>do</strong><br />

Aqui é manti<strong>da</strong> a divisão básica de introdução, corpo e conclusão, mas o corpo<br />

não é dividi<strong>do</strong> em episódios, mas em argumentos, teses e antíteses. Algumas vezes o<br />

texto pode conter outros gêneros incorpora<strong>do</strong>s. Por exemplo, textos narrativos podem ser<br />

usa<strong>do</strong>s como ilustrações, textos instrutivos como conclusão para argumentos.<br />

Olhar a estrutura interna <strong>da</strong>s frases também é importante; dentro <strong>da</strong> frase algumas<br />

orações são nucleares, ou seja, elas contêm verbos completamente flexiona<strong>do</strong>s e podem,<br />

sozinhos, formar orações ou frases independentes. Outras orações podem se agrupar em<br />

posições pré- ou pós-nucleares. Elas são subordina<strong>da</strong>s a orações nucleares e não podem<br />

ocorrer como independentes. Geralmente há palavras ou partículas introdutórias para as<br />

posições pré- e pós-nucleares que indicam que elas são subordina<strong>da</strong>s e formam uma<br />

uni<strong>da</strong>de firme com o núcleo.<br />

Para mais facilmente ver a relação entre frases ou orações no núcleo <strong>do</strong><br />

argumento e frases ou orações pré-nucleares e pós-nucleares, uma outra tabela de base<br />

pode ser útil, conten<strong>do</strong> três partes: pré-nuclear, nuclear e pós-nuclear. Se o texto não for<br />

muito complica<strong>do</strong> pode escrever to<strong>da</strong>s a frases como na tabela de base ou pode fazer um<br />

extrato desta para ver as relações entre as partes.<br />

Vamos examinar o texto “Açúcar” para identificar as partes.<br />

1-2 Introdução com duas partes: <strong>do</strong> personagem principal<br />

216


<strong>do</strong> seu trabalho em geral<br />

3 A envergadura <strong>do</strong> trabalho: <strong>do</strong> plantio até o transporte <strong>do</strong> produto<br />

4 As duas grandes partes <strong>do</strong> trabalho: safra e entre-safra<br />

5-7 Safra: contratar trabalha<strong>do</strong>res, orientá-los, supervisioná-los, vigiar o tempo<br />

8-9 Entre-safra. cui<strong>da</strong>r <strong>da</strong> plantação <strong>da</strong> cana, cui<strong>da</strong>r <strong>da</strong> plantação pessoal de<br />

mandioca, trabalhar e vender os produtos <strong>da</strong> mandioca<br />

10-11 Avaliação <strong>do</strong> trabalho e <strong>do</strong> personagem principal como pessoa<br />

35.5 Participantes<br />

Os participantes <strong>do</strong>s textos deste tipo seguem a mesma estrutura <strong>do</strong>s textos<br />

instrutitvos. No texto Açúcar a pessoa central é o homem que organiza tu<strong>do</strong> e que é<br />

também a fonte de to<strong>da</strong>s as informações. Outros trabalha<strong>do</strong>res estão lá somente por<br />

implicação. Existe ain<strong>da</strong> a população menciona<strong>da</strong> no fim <strong>do</strong> texto que respeita o trabalho<br />

<strong>da</strong>quele que é a fonte <strong>da</strong> informação.<br />

35.6 Formas verbais<br />

Em línguas que marcam tempo, normalmente, o tempo presente é usa<strong>do</strong> para as<br />

explicações. Línguas que não marcam tempo têm formas verbais especiais que dão<br />

explicações e revelam condições e o pano de fun<strong>do</strong>. Aproxima-se ao uso <strong>da</strong>s formas<br />

verbais <strong>da</strong> conversação normal. Quan<strong>do</strong> a explicação se refere a fatos <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> e que já<br />

não acontecem mais, usa-se a forma verbal <strong>do</strong> pretérito imperfeito – aqui chama<strong>do</strong> de<br />

imperfectivo real – que é a forma mais usa<strong>da</strong> no texto <strong>do</strong> exemplo, às vezes combina<strong>do</strong><br />

com o infinitivo (neutro) para ações planeja<strong>da</strong>s.<br />

Para mais facilmente ver as formas <strong>do</strong>s verbos usa<strong>do</strong>s neste texto, vamos repetir<br />

aqui a lista sem incluir as formas simples <strong>do</strong> pretérito imperfeito (imperfectivo real,<br />

abrevia<strong>do</strong> IR):<br />

3ª-d consistia em cui<strong>da</strong>r <strong>do</strong> processo <strong>da</strong> plantação (IR + infinitivo + verbos<br />

substantiva<strong>do</strong>s) – ação contínua de to<strong>do</strong>s os trabalhos a serem enumera<strong>do</strong>s.<br />

3e-h ia de preparação até o corte e o transporte – (IR +verbos substantiva<strong>do</strong>s)<br />

resumem uma série de ações essenciais para o processo.<br />

4 era dividi<strong>do</strong> -- (IR + particípio) a divisão <strong>do</strong> tempo<br />

217


5 estava a ser corta<strong>do</strong> e transporta<strong>do</strong> (IR + infinitivo + particípios) – o infinitivo<br />

marca as ações como contínuas, os particípios como ações essencias <strong>do</strong><br />

processo<br />

6a-c era contrata<strong>do</strong> para fazer (IR + particípio + preposição + infinitivo) o<br />

particípio denota uma única ação, o infinitivo ações por algum tempo<br />

6d-f tinha de ser corta<strong>do</strong> = (IR + infinitivo + particípio), veja 6a-c<br />

7a-b fechariam, receberiam (Imperfectivo irreal) hipótese que determina a maior<br />

parte <strong>da</strong>s ações<br />

8c-d ia se preparar (IR + infinitivo) veja 3ab<br />

8eg começassem, estivesse pronto (Perfectivo irreal + particípio) – uma <strong>da</strong>s raras<br />

combinações cuja primeira parte não é IR. É usa<strong>do</strong> para mostrar os eventos<br />

naturais para as quais precisa preparar-se para aproveitá-las.<br />

11 marcou (Perfectivo real) – observação final sobre a influência <strong>do</strong> personagem<br />

35.7 Ênfase<br />

que fazia as ações enumera<strong>da</strong>s.<br />

Há vários meios de enfatizar informação em textos explicativos, especialmente:<br />

negações e respostas a perguntas<br />

O tema que pode ser subdividi<strong>do</strong> em tema principal e subsidiários, ou pode ser<br />

encaixa<strong>do</strong> dentro de outros temas.<br />

Em um texto curto é difícil demonstrar to<strong>do</strong>s estes meios. Não temos nenhum<br />

exemplo no texto “Açúcar”. Podemos presentar um exemplo <strong>da</strong> língua Konzime fala<strong>da</strong><br />

nos Camarões.<br />

Konzime (Camarões):<br />

(550) Pêb, yé wáǎ mbi nun?<br />

Peb ele que tipo pássaro?<br />

‘Que tipo de pássaro é o Peb?’<br />

(551) Pêb, yé ó, nun dwi’. Yé abe lí edi kwar.<br />

Peb ele FOC pássaro mato Ele não para ficar aldeia<br />

‘Peb é um pássaro <strong>do</strong> mato. Não fica na aldeia.’<br />

218


(552) Yé lí epuma ε ?<br />

ele para voar pergunta<br />

‘Será que sabe voar?’<br />

(553) εε, yé ntémé, yé ó nun kú.<br />

Sim ele também ele FOC pássaro céu<br />

‘É, ele é um pássaro que voa.’<br />

Neste texto são usa<strong>da</strong>s perguntas e respostas, como em qualquer conversação. A<br />

negação sempre é mais enfática que o contrário.<br />

35.8 Coesão<br />

A coesão se faz por repetição <strong>do</strong> tema. O texto “Açúcar” mostra isto. É claro em<br />

ca<strong>da</strong> frase que os eventos se seguem logicamente sem ser uma simples enumeração. Após<br />

a leitura <strong>do</strong> texto sente-se a satisfação de conhecer um pouco <strong>do</strong> trabalho deste homem e<br />

também sobre o assunto de como o açúcar antigamente era produzi<strong>do</strong>, especialmente<br />

depois de ver aqueles antigos engenhos de cana. Sente-se também um pouco <strong>da</strong> satisfação<br />

<strong>do</strong> homem em fazer bem seu trabalho e em servir a comuni<strong>da</strong>de.<br />

36 Textos exortativos<br />

Textos exortativos têm a intenção de persuadir e mostrar estruturas um pouco<br />

diferentes <strong>da</strong>quelas que temos visto até agora. É difícil encontrar textos que sejam<br />

puramente persuasivos, sejam eles de exortação, conselho, encorajamento, críticas,<br />

cumprimentos ou defesa. A maioria <strong>do</strong>s textos exortativos são incorpora<strong>do</strong>s em outros<br />

tipos de texto. É necessário falar sobre textos exortativos porque eles são diferentes <strong>do</strong>s<br />

outros gêneros por causa de suas diferenças estruturais em relação aos demais.<br />

219


36.1 Tabela de base<br />

Nosso texto para ilustrar e explicar o gênero exortativo foi escrito por Lusineide<br />

Moura e fala sobre as exortações que ela ouvia <strong>da</strong> sua mãe. A tabela de base é muito<br />

similar à <strong>do</strong>s textos narrativos.<br />

(554) 1a Deixe 1b me lhe dizer uma coisa: 2a você precisa 2b ouvir mais<br />

2c e falar menos. 3a Quan<strong>do</strong> a gente fala muito, 3b a gente pode 3c errar<br />

muito também. 4a Veja bem: 4b Deus nos deu <strong>do</strong>is ouvi<strong>do</strong>s, <strong>do</strong>is olhos e<br />

uma boca apenas. 5a Ou seja, devemos 5b ouvir mais, 5c ver mais 5d e<br />

falar menos. 6a Não respon<strong>da</strong> 6b sem antes pensar 6c no que você vai 6d<br />

dizer 6e para não se arrepender depois 6f de ter dito. 7a Depois que você<br />

fala, 7b não tem mais 7c como pegar a palavra de volta. 8a Ela já saiu. 9a<br />

Dependen<strong>do</strong> 9b <strong>do</strong> que você disse, 9c pode 9d aju<strong>da</strong>r 9e ou estragar tu<strong>do</strong>.<br />

10ª Por isso, preste bem atenção 10b no que estou 10c lhe dizen<strong>do</strong>. 11ª<br />

Observe bem as coisas, 11b escute melhor ain<strong>da</strong> 11c e fale muito menos.<br />

12ª Assim você vai 12b viver bem com to<strong>da</strong>s as pessoas.<br />

Tabela 56: Tabela de base<br />

No. ligação sujeito circ. objeto Verbo adv obj circ.<br />

1a Deixe me<br />

1b lhe dizer uma coisa<br />

2a Você precisa<br />

2b ouvir mais<br />

2c e falar menos<br />

3a quan<strong>do</strong> a<br />

gente<br />

fala muito<br />

3b a<br />

pode<br />

gente<br />

3c errar muito também<br />

4a Veja bem<br />

4b Deus nos deu <strong>do</strong>is ouvi-<br />

<strong>do</strong>s, <strong>do</strong>is<br />

olhos e uma<br />

boca apenas.<br />

5a Ou seja,<br />

devemos<br />

5b ouvir mais<br />

220


5c ver mais<br />

5d e falar menos<br />

6a Não respon<strong>da</strong><br />

6b sem<br />

antes<br />

pensar<br />

6c no que você vai<br />

6d dizer<br />

6e para<br />

se arrepennão<br />

der<br />

6f depois de ter<br />

6g dito.<br />

7a Depois<br />

que<br />

você fala,<br />

7b não tem mais<br />

7c como pegar a palavra de volta<br />

8a Ela saiu.<br />

9a Dependen<strong>do</strong><br />

9b <strong>do</strong> que você disse,<br />

9c pode<br />

9d aju<strong>da</strong>r<br />

9e ou estragar tu<strong>do</strong>.<br />

10a por<br />

isso,<br />

preste atenção<br />

10b no<br />

que<br />

estou<br />

10c lhe dizen<strong>do</strong>.<br />

11a observe bem as coisas<br />

11b escute melhor<br />

ain<strong>da</strong><br />

11c e fale muito<br />

menos<br />

12a assim, você vai<br />

12b viver bem com<br />

to<strong>da</strong>s as<br />

pessoas<br />

Para ver a relação entre os verbos usa<strong>do</strong>s e os conselhos pode-se, também,<br />

construir uma tabela que resume as funções na oração, distinguin<strong>do</strong> somente entre a<br />

ligação e uma posição pré-verbal, outra pós-verbal, também escreven<strong>do</strong> os infinitivos,<br />

gerúndios e particípios na mesma linha com o verbo flexiona<strong>do</strong>, especialmente quan<strong>do</strong><br />

não há sujeito, objeto ou circunstância entre os <strong>do</strong>is, como segue:<br />

221


Tabela 57: Tabela de base<br />

No. Ligação Pré-verbal Verbo Pós-verbal<br />

1ª<br />

Deixe<br />

me<br />

a<br />

lhe<br />

dizer<br />

uma coisa.<br />

2ª<br />

você<br />

precisa ouvir mais<br />

bc e<br />

falar menos<br />

3ª<br />

quan<strong>do</strong> a gente fala<br />

muito<br />

bc<br />

a gente pode errar muito também<br />

4ª<br />

Veja<br />

bem:<br />

b<br />

Deus nos deu<br />

<strong>do</strong>is ouvi<strong>do</strong>s, <strong>do</strong>is olhos e<br />

uma boca.<br />

5ª<br />

b<br />

c<br />

ou<br />

seja,<br />

devemos ouvir<br />

ver<br />

mais<br />

mais<br />

menos<br />

d e<br />

falar<br />

6ª Não<br />

respon<strong>da</strong><br />

b sem antes<br />

pensar<br />

(no que)<br />

cd<br />

no que você vai dizer<br />

e para não se<br />

arrepender<br />

f depois de<br />

ter dito<br />

7ª Depois que você fala<br />

7b não<br />

tem<br />

mais<br />

7c como<br />

pegar<br />

a palavra de volta<br />

8ª Ela saiu.<br />

9ª<br />

Dependen<strong>do</strong> (<strong>do</strong> que)<br />

b<br />

<strong>do</strong> que você disse,<br />

cd<br />

#<br />

pode aju<strong>da</strong>r<br />

e ou<br />

estragar.<br />

10ª por isso,<br />

preste<br />

atenção<br />

bc<br />

no que estou lhe dizen<strong>do</strong>.<br />

11a<br />

observe bem as coisas,<br />

b<br />

escute melhor ain<strong>da</strong><br />

c e<br />

fale muito menos<br />

12 a b assim você vai viver bem com to<strong>da</strong>s as pessoas<br />

36.2 Pragmática<br />

Se para textos explicativos e instrutivos, o autor precisa de certa qualificação,<br />

muito mais necessi<strong>da</strong>de se faz desta qualificação, se é um texto exortativo. As<br />

qualificações dependem <strong>da</strong> intenção <strong>do</strong> texto. Se é para exortar, repreender, uma certa<br />

222


autori<strong>da</strong>de é requeri<strong>da</strong>. Se, por outro la<strong>do</strong>, é para complementar, o destinatário precisa ter<br />

mais autori<strong>da</strong>de que o autor. Um utiliza um relacionamento de confiança e outro tenta<br />

estabelecer este relacionamento.<br />

Uma característica que to<strong>do</strong>s os textos exortativos têm em comum é a intenção de<br />

mu<strong>da</strong>nça de comportamento. O autor tenta influenciar a atitude <strong>do</strong> ouvinte. Para ser mais<br />

convincente ele se inclui na platéia. Por exemplo, ele pode usar conselhos, coman<strong>do</strong>s,<br />

proibições, advertências, exemplos a seguir, pedi<strong>do</strong>s, alusões, desculpas ou lisonjas.<br />

Qualquer que seja a audiência, as estratégias que o autor usa dependerá,<br />

largamente <strong>do</strong> relacionamento estabeleci<strong>do</strong> (ou a ser estabeleci<strong>do</strong>) entre o autor e seu<br />

público, o que depende em parte, <strong>da</strong> posição social de ambos.<br />

Neste texto, <strong>da</strong><strong>do</strong> como exemplo, o autor tenta influenciar uma pessoa para que<br />

ela seja mais sábia e apren<strong>da</strong> a ouvir e avaliar o que ouviu e o que vai dizer, como uma<br />

prática para o bom relacionamento com as pessoas.<br />

36.3 Orientação e enre<strong>do</strong><br />

Uma exortação é <strong>da</strong><strong>da</strong> pelo falante para influenciar o comportamento <strong>do</strong> ouvinte.<br />

A orientação é na direção <strong>do</strong> ouvinte.<br />

Muitas vezes encontram-se três partes:<br />

Na introdução o falante pode mencionar suas credenciais para que os conselhos possam<br />

ser aceitos. Certamente ele vai mencionar o problema ou outra razão porque ele faz o<br />

texto.<br />

No corpo ele apresenta os conselhos e muitas vezes também as razões, os porquês <strong>do</strong>s<br />

conselhos.<br />

Na conclusão ele faz apelo às motivações que podem levar a audiência a seguir os<br />

conselhos e as conseqüências positivas ou negativas de certos comportamentos.<br />

No texto apresenta<strong>do</strong> o enre<strong>do</strong> poder ser analisa<strong>do</strong> assim:<br />

223


Tabela 58:<br />

Preliminares : 1a-b O autor chama a atenção <strong>do</strong> outro para o que vai<br />

dizer<br />

Introdução e conselho: 2 a -b aqui é um resumo <strong>do</strong> que vai ser o conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

texto<br />

Conselho 3-8 o problema, o conselho, as razões; o problema<br />

resumi<strong>do</strong><br />

Conseqüência: 9 conseqüências positivas ou negativas<br />

Conclusão: conselho repeti<strong>do</strong>: 10-<br />

12<br />

36.4 Participantes<br />

o conselho repeti<strong>do</strong> com conseqüência boa se for<br />

observa<strong>do</strong><br />

Os participantes são a mãe que fala e a filha que ouve. O conselho visa o resto <strong>do</strong><br />

mun<strong>do</strong> que vai reagir ao comportamento <strong>da</strong> filha.<br />

36.5 Formas verbais<br />

Nos textos exortativos podem-se usar muitas formas verbais. As razões podem ser<br />

<strong>da</strong><strong>da</strong>s como experiências, usan<strong>do</strong> o mo<strong>do</strong> real. Para os conselhos, principalmente, os<br />

mo<strong>do</strong>s irreal e necessi<strong>da</strong>de serão usa<strong>do</strong>s.<br />

36.5.1 Necessi<strong>da</strong>de e irreal<br />

No texto exemplo não se acha nenhuma vez o imperativo ou outra forma <strong>do</strong> mo<strong>do</strong><br />

necessi<strong>da</strong>de. Usa-se o presente <strong>do</strong> subjuntivo (neutro irreal) em 1, 4, 5, 6, 10, 11, 12. É<br />

uma forma mais suave de <strong>da</strong>r ordens que o imperativo seria.<br />

36.5.2 Real<br />

As formas <strong>do</strong> real são usa<strong>da</strong>s no resto <strong>do</strong> texto. O presente (neutro real) para<br />

explicar o porquê <strong>da</strong>s injunções em 2, 3, 5b, 6cd, 7, 9c, 10, 12; e o pretérito perfeito<br />

224


(perfectivo real) em 4b, 8, 9b para mostrar conseqüências negativas no caso de agir<br />

contrariamente aos conselhos.<br />

36.5.3 Lexicalizações<br />

O português <strong>do</strong> Brasil usa muitas lexicalizações, especialmente em textos<br />

exortativos. É na combinação <strong>do</strong>s verbos com infinitivo e gerúndio que as injunções<br />

mostram ser conselhos, não ordens:<br />

1. deixe dizer – pedin<strong>do</strong> liçença<br />

2. precisa ouvir (antes de) falar<br />

3. pode errar – alternativas de perigo<br />

4. devemos ouvir, ver, falar – comportamento bom<br />

6. vai dizer, arrepender-se de ter dito -- perigo<br />

7. não tem mais como pegar de volta -- perigo<br />

9. dependen<strong>do</strong> .. disse -- perigo<br />

pode aju<strong>da</strong>r ou estragar -- alternativas<br />

10. estou dizen<strong>do</strong> -- conselhos<br />

12. vai viver – resulta<strong>do</strong> positivo<br />

36.6 Ênfase<br />

Fora <strong>do</strong> uso <strong>da</strong>s formas lexicaliza<strong>da</strong>s que trazem certa ênfase, o negativo se usa<br />

várias vezes no texto: em 6 e 7 para mostrar o perigo de palavra não bem pensa<strong>da</strong>, 7 para<br />

mostrar a finali<strong>da</strong>de <strong>da</strong> ação não sensata. 6-8 parece quase uma preparação para um ponto<br />

culminante: a finali<strong>da</strong>de de uma palavra dita que não se deixa desfazer.<br />

O fato <strong>do</strong> texto ser composto de tantas injunções dá uma urgência a to<strong>do</strong> o texto,<br />

como se pode sentir em comparação aos outros textos usa<strong>do</strong>s.<br />

36.7 Coesão<br />

To<strong>do</strong> o texto foi construí<strong>do</strong> em re<strong>do</strong>r de um só tema: <strong>da</strong>r muita atenção ao que se<br />

diz. A coesão se faz sentir na repetição <strong>da</strong> mesma injunção explora<strong>da</strong> em<br />

vários contextos, na predição de resulta<strong>do</strong>s tanto positivos como negativos.<br />

225


Apêndice<br />

Fontes <strong>do</strong>s exemplos <strong>da</strong>s linguas<br />

Língua Familia País Fonte Capítulo<br />

Aghem Grassfields-<br />

Alemão<br />

Árabe<br />

Babungo<br />

(Vengo)<br />

Bantu<br />

Germânica<br />

Grassfields-<br />

Bantu<br />

Bafut Grassfields-<br />

Bantu<br />

Balante Atlantic Guinea-<br />

Cameroon Hyman 1979 28<br />

Alemanha Wiesemann 8, 9,10,<br />

10<br />

Cameroon Schaub 1985 19<br />

Cameroon Mfonyam 29<br />

Bissau<br />

Wiesemann 1986 10<br />

Bororo Macro-Ge Brazil Crowell 3<br />

Chiquitano Macro-Ge Bolivia Krüsi 1978 17<br />

Ewe Kwa Togo,<br />

Ghomala′ Grassfields-<br />

Bantu<br />

Ghana<br />

Wiesemann 19<br />

Cameroon Fossouo 10<br />

Gokana Cross River Nigeria Hyman and Comrie<br />

1981<br />

Ikpeng Karibe Brasil Smith 9, 10, 11, 18<br />

Inglês Inglaterra Wiesemann<br />

20<br />

226


Língua Familia País Fonte Capítulo<br />

Kaingang Macro-Ge Brazil Wiesemann 8, 9, 10, 11, 13, 14,<br />

Kashaya Pomo USA Oswalt 1976 20<br />

Kobon Trans-New-<br />

Guinea<br />

Managalasi Trans-New-<br />

Guinea<br />

Papua Nova<br />

Guinea<br />

Papua New<br />

Guinea<br />

Man<strong>da</strong>ra Afro-Asian Nigeria,<br />

Cameroon<br />

Davies 1981 14<br />

Longacre 1972 20<br />

Fluckiger and<br />

Whaley 1982<br />

Maxacali Macro-Ge Brazil Popovich 24<br />

Mura Pirahã Mura Brazil Everett 10<br />

15,17,19, 20, 21,<br />

22, 23, 26, 28, 29,<br />

30, 32<br />

Paracanã Pano Brasil Silva 7, 10<br />

Sursurunga Austronesian Papua New<br />

Guinea<br />

27<br />

Hutchisson 1986 10<br />

Terena Arawakan Brasil Ek<strong>da</strong>hl e Butler<br />

1979<br />

Tikar Benue-Congo Cameroon Stanley 19<br />

Tupuri A<strong>da</strong>mawa Camarões Taore 14, 26<br />

8.4<br />

227


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