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pernambuco, você é meu - Jota Alcides

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PERNAMBUCO,<br />

VOCÊ É MEU<br />

<strong>Jota</strong> <strong>Alcides</strong><br />

1


<strong>Jota</strong> <strong>Alcides</strong><br />

PERNAMBUCO,<br />

VOCÊ É MEU<br />

Prefácio de Marcos Vilaça<br />

da Academia Brasileira de Letras<br />

3


Copyright by <strong>Jota</strong> <strong>Alcides</strong> – 2005<br />

J85p ALCIDES, <strong>Jota</strong><br />

Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu.Brasília:<br />

Fatorama, 2005.<br />

96 p.: il.<br />

1. Radiodifusão 2. Programa de Rádio 3. História<br />

da Radiodifusão, Brasil I. Título<br />

Capa:<br />

Ivanilde Bruno<br />

Fotografias:<br />

Arcevo Aldemar Paiva<br />

CDU 654,195(81)<br />

CDD 621.384.16<br />

Todos os direitos reservados ao autor<br />

Impresso no Brasil<br />

Printed in Brazil<br />

4


Multimídia Aldemar Paiva, 25 anos de sucesso no rádio brasileiro<br />

5


Dedicatória<br />

Ao multimídia oitentão, criador, produtor e âncora do<br />

fenomenal “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu”, show de sucesso durante<br />

25 anos no rádio brasileiro, Aldemar Paiva, sua querida esposa,<br />

artista plástica Angelita, seus filhos Mônica, m<strong>é</strong>dica, Carla,<br />

arquiteta, Dema, engenheiro, e sua ciranda de netos: Flávia,<br />

Conrado, Duda, Drancinho, Deminha, Artur e Adriano. Pernambuco<br />

<strong>é</strong> de Vocês. Vocês são de Pernambuco. Com a raça genuína, a garra<br />

combativa, o espírito de liberdade e o frevo impetuoso que inspiram<br />

e fazem a efeverscente e gloriosa história pernambucana<br />

incomparável na história do Brasil.<br />

7


Com sua<br />

esposa e<br />

a animada<br />

ciranda<br />

de netos<br />

8<br />

Ademar<br />

com sua<br />

Angelita<br />

e filhos:<br />

Dema,<br />

Carla e<br />

Mônica<br />

Com família<br />

e amigos<br />

em noite de<br />

autógrafos<br />

do livro<br />

“O causo<br />

eu conto”


Sumário<br />

Apresentação ..............................................................................11<br />

Prefácio de Marcos Vilaça .........................................................17<br />

01. Fren<strong>é</strong>tico Mundo Novo ........................................................21<br />

02. Falando para o Mundo .........................................................27<br />

03. Entre Dois Mundos ..............................................................35<br />

04. Brava Terra do Frevo............................................................43<br />

05. Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu......................................................53<br />

06. Arteexpressão Cultural .........................................................63<br />

07. Amor, Humor e Sabor ..........................................................73<br />

08. Adeus às Ilusões Perdidas ....................................................79<br />

09. Eterno Obelisco ao Frevo.....................................................85<br />

Posfácio ......................................................................................91<br />

Cronologia ..................................................................................94<br />

Bibliografia.................................................................................95<br />

9


APRESENTAÇÃO<br />

Maior e mais democrática festa do Brasil, o<br />

carnaval proporciona em Pernambuco, todos os anos, um<br />

espetáculo que <strong>é</strong> admirado internacionalmente. Mais de dois<br />

milhões de pessoas, multicoloridamente fantasiadas e<br />

explodindo em alegria contagiante, superlotam o centro do<br />

Recife, seguindo o Galo da Madrugada, o maior bloco<br />

carnavalesco do mundo, com direito ao “Livro dos<br />

Recordes”.<br />

De câmeras em helicópteros sobrevoando a<br />

cenográfica e histórica capital pernambucana, televisões<br />

mostram a multidão eufórica e fren<strong>é</strong>tica, dançando o frevo<br />

e fazendo o mais animado carnaval de rua do planeta. Como<br />

está registrado em outro livro deste autor – “Comunicação<br />

& Linguagem das Massas” – publicado em 1992, <strong>é</strong> assim<br />

que o Recife mostra, exuberantemente, sua linguagem<br />

recifreval.<br />

“Quando começa o carnaval e o frevo rompe<br />

furiosamente o ar, o Recife <strong>é</strong> uma massa expressiva e<br />

explosiva, cheia de energia transformadora e renovadora<br />

fluindo com intensidade. Sente-se nelsonferreiramente feliz<br />

por ser brasileira pernambucanamente. Mexe-se toda.<br />

“Deixa o frevo rolar”. Solta-se, levinamente, com<br />

sentimento e fogosidade em profusão. De cabeça feita,<br />

braços abertos e pernas pro ar, comunica-se marcando<br />

11


passo, parafusando, dobradiçando, tesourando e gingando<br />

voluptuosamente. Evo<strong>é</strong> Momo!.<br />

Com seus encantos de Namorada do Brasil, o<br />

Recife ferve, recifrevilha, efervescente, recifrevando.<br />

Maliciosa, irreverente e espirituosamente fantasiada. De<br />

plumas e paetês. Ou simplesmente de minissaia, short ou<br />

biquíni, ou audaciosamente de tanga e topless. Ou qualquer<br />

roupa. Sem preconceitos. Descobrindo as partes encobertas<br />

e cobrindo as partes descobertas. Dando asas à imaginação.<br />

Esquece da vida a amargura e entrega-se aos sonhos<br />

e às cores da festarola com fantastiquice. Com toneladas<br />

de confetes, quilômetros de serpentinas. Muita água e muito<br />

talco. Uma recifelicidade no reinado da ilusão!”.<br />

É assim o carnaval em Pernambuco. Vem crescendo,<br />

gradativamente, desde a chegada do frevo aos<br />

diversos segmentos da sociedade industrial e urbanizada,<br />

deixando de ser música e dança apenas de grupos negros<br />

da sociedade escravocrata. Principalmente depois da<br />

Abolição da Escravatura em 1888, vem atraindo e<br />

envolvendo, em seqüência, operários industriais, trabalhadores<br />

no com<strong>é</strong>rcio, funcionários públicos, profissionais<br />

liberais, classe m<strong>é</strong>dia e, finalmente, as elites e os intelectuais.<br />

Vem crescendo, mais ainda, desde do início da d<strong>é</strong>cada de<br />

50 do s<strong>é</strong>culo XX, quando Pernambuco experimenta<br />

acelerado desenvolvimento do rádio e o rádio passa a dar<br />

ampla difusão ao frevo, ritmo e dança de Pernambuco.<br />

Expressão histórica e emblemática dessa<br />

evolução <strong>é</strong> o programa radiofônico “Pernambuco Você <strong>é</strong><br />

12


Meu”, campeão nacional de audiência durante 25 anos.<br />

Líder absoluto no Nordeste brasileiro, de 1952 a 1977, sob<br />

o comando do versátil e engenhoso animador e produtor<br />

artístico Aldemar Paiva, jornalista, radialista, publicitário,<br />

escritor, cronista, dramaturgo, ator, poeta e cordelista,<br />

precursor da homem multimídia.<br />

Sua primeira fase, de 1952 a 1968, <strong>é</strong> nas ondas<br />

da emissora pioneira da Am<strong>é</strong>rica Latina, Rádio Clube de<br />

Pernambuco, no horário das 7h30 às 9h. Depois, de 1968<br />

a 1977, sempre no mesmo horário, agitando as manhãs<br />

brasileiras, ganha o País nas ondas do Rádio Jornal do<br />

Comm<strong>é</strong>rcio, emissora mais potente do Brasil que coloca,<br />

orgulhosamente, “Pernambuco falando para o Mundo”.<br />

Metade da existência do “Pernambuco Você <strong>é</strong><br />

Meu”, de 1964 a 1977, transcorre em plena ditadura militar<br />

no Brasil, tempo de autoritarismo político, perseguições<br />

policiais, prisões ilegais, tortura de opositores e ampla<br />

escuridão para a liberdade de expressão. Nesses chamados<br />

anos de chumbo, os comunicadores em geral praticam<br />

verdadeiro malabarismo verbal e literário, por metáforas,<br />

fábulas, alegorias, utopias e poesias, como artifício para<br />

sobrevivência diante da censura implacável.<br />

Prudente e moderado, consciente dos limites da<br />

realidade, ainda mais aos sobreviventes de ideais, Aldemar<br />

Paiva adota como política de seu programa a arte po<strong>é</strong>tica,<br />

espantando os maus e baixos sentimentos. Concentra seu<br />

programa na valorização da cultura popular, pois <strong>é</strong> tamb<strong>é</strong>m<br />

uma <strong>é</strong>poca de renovação cultural e artística, com<br />

13


movimentos que fazem história, como Beatlomania,<br />

Tropicália, Festivais da Canção e Jovem-Guarda.<br />

Produzido e apresentado com expressiva<br />

qualidade artística e aparelhado tão somente para o<br />

entretenimento sadio de seus milhares de ouvintes,<br />

Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu atravessa esse período escapando<br />

das imposições discri-cionárias vigentes e at<strong>é</strong> mesmo do<br />

abominável patrulhamento ideológico, de todas as cores e<br />

tendências, que se espalha perigosamente.<br />

Primeiro porque tem um formato textual e<br />

musical comprometido, quase exclusivamente, com a<br />

cultura popular nordestina e de Pernambuco, especialmente<br />

o frevo, criação genuinamente pernambucana. E, segundo,<br />

porque <strong>é</strong> comandando por um prosador arguto e criativo,<br />

capaz de gerar e pegar atalhos de linguagem para<br />

desenvolver suas narrativas, sem comprometer o entendimento<br />

pelo público.<br />

Muitos dos maravilhosos e divertidíssimos<br />

“causos” e “cord<strong>é</strong>is”, que fazem parte do acervo desse<br />

vitorioso e inesquecível programa da radiofonia brasileira,<br />

agora estão nas páginas de Fatorama, o primeiro jornal<br />

fast-news do Brasil, editado em Brasília desde 2001. Nele<br />

escreve Aldemar Paiva, semanalmente, contando velhas e<br />

novas estórias, verdadeiras p<strong>é</strong>rolas de humorismo,<br />

espirituosidade e criatividade do rico folclore e da cultura<br />

popular que tanto caracterizam, inspiram e animam o povo<br />

brasileiro. Agora, ao festejar seus 80 anos, merece todas as<br />

homenagens, sobretudo dos pernambucanos.<br />

14


Este trabalho abrange variados aspectos da<br />

história do rádio no Brasil e no Mundo, do pioneirismo de<br />

Pernambuco na radiodifusão das Am<strong>é</strong>ricas e da evolução<br />

do rádio no Recife, mas seu foco central <strong>é</strong> a fenomenal<br />

trajetória do programa “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu”, com<br />

Aldemar Paiva. Mostra, avalia e explica sua vitalidade e<br />

sua influência nos relacionamentos sociais, artísticos e<br />

culturais do Recife. É um tributo ao âncora de uma das<br />

maiores audiência do rádio brasileiro em sua longa história<br />

já próxima de completar 100 anos.<br />

Como retrospectativa assumidamente saudosista<br />

de uma <strong>é</strong>poca de ouro do rádio, al<strong>é</strong>m de contar com indispensáveis<br />

registros históricos, vale-se o autor do esforço<br />

de memória para reconstituição de sua percepção auditiva<br />

e imaginativa, permitindo-se transitar entre a fantasia e a<br />

realidade e at<strong>é</strong> adotar o imagismo. Ressalta a forte<br />

contribuição do “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu” para maior<br />

valorização e popularização do frevo, marca pernambucana<br />

inconfundível. Embora não seja biografia, traz essenciais<br />

traços biográficos de Aldemar Paiva, uma das glórias da<br />

radiodifusão nacional. Orgulho de Pernambuco para o<br />

Brasil.<br />

Meus mais sinceros agradecimentos ao ministro<br />

e acadêmico pernam bucaníssimo Marcos Vilaça, defensor<br />

apaixonado dos valores culturais e das mais belas tradições<br />

populares de Pernambuco, pelo prefácio, que enriquece e<br />

engrandece este trabalho voltado para o resgate da memória<br />

artística de uma <strong>é</strong>poca de ouro do rádio de Pernambuco,<br />

pioneiro e líder no Nordeste brasileiro. Agora, em flashback<br />

15


desse tempo que não deve ser jamais esquecido, sintonize<br />

imaginariamente o rádio no “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu” e<br />

sinta o mundo fervendo e frevando com Aldemar Paiva.<br />

Freneticamente! Maravilhosamente!<br />

16<br />

<strong>Jota</strong> <strong>Alcides</strong><br />

Brasília, junho de 2005


PREFÁCIO<br />

McLuhan deixou-nos, entre outras obras primorosas<br />

sobre a Era Eletrônica, Os meios de comunicação como<br />

extensões do homem. Nesse estudo, destaca o envolvimento<br />

emocional e sentimental provocado pela imagem auditiva do<br />

rádio. Esse poder faz do rádio uma extensão do sistema nervoso<br />

central do homem. O rádio tem papel primordial como mediador<br />

de cada indivíduo entre a vida familiar e a vida social.<br />

Nesse mundo fantástico, Pernambuco tamb<strong>é</strong>m tem<br />

uma história de vanguarda marcante, aliás, sua inquestionável<br />

vocação na formação histórica e no desenvolvimento do País.<br />

Não apenas em pioneirismo, mas tamb<strong>é</strong>m em evolução, como<br />

durante as d<strong>é</strong>cadas de 50, 60 e 70, do s<strong>é</strong>culo passado, quando a<br />

televisão surgiu e se expandiu nacionalmente. Pernambuco se<br />

antecipou com produções de rádio criativas e brilhantes que<br />

depois inspiraram os caminhos de sucesso da televisão brasileira.<br />

Uma das grandes produções desse período <strong>é</strong> o programa<br />

“Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu”, apresentado pelo extraordinário<br />

Aldemar Paiva, um comunicador nato, com toda a potencialidade<br />

necessária à eficiente e dinâmica comu-nicação humana.<br />

É verdade que toda produção intelectual e artística<br />

deve ser julgada considerando-se, naturalmente, a caracterização<br />

sociológica e tecnológica de sua <strong>é</strong>poca. “Pernambuco<br />

Você <strong>é</strong> Meu” fez história justamente nas d<strong>é</strong>cadas<br />

em que o rádio era o principal meio de comunicação com as<br />

massas e a televisão estava apenas iniciando no Brasil.<br />

17


Durante 25 anos, com entusiasmo e criatividade,<br />

Aldemar Paiva construiu pelas ondas do rádio, diariamente,<br />

uma forte relação afetiva e interativa com a sociedade do<br />

Recife e de Pernambuco. Como está expresso no título de<br />

sua maior obra artística, “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu” traduz<br />

uma inspiração. De sentimento telúrico, de zelo cívico, de<br />

compromisso carinhoso, de afeição assumida, de emoção<br />

aberta e de paixão explícita.<br />

Dos <strong>meu</strong>s tempos do Recife, morando no Recife,<br />

que permanece sendo minha cidade amada mesmo depois de<br />

tantos anos com residência em Brasília, mant<strong>é</strong>m-se<br />

inalteráveis em minha memória algumas das principais<br />

atrações de então do rádio de Pernambuco. Entre elas,<br />

“Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu”. Jamais esquecerei esse programa<br />

de narrativa envolvente e exibidor do frevo contagiante, de<br />

Nelson Ferreira, de Capiba e de Levino Ferreira.<br />

Com este ensaio “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu”,<br />

al<strong>é</strong>m de homenagear seu e nosso amigo e multimídia<br />

Aldemar Paiva, merecidamente, resgatando e documentando<br />

uma <strong>é</strong>poca importante e inesquecível do rádio<br />

nordestino e brasileiro, o jornalista <strong>Jota</strong> <strong>Alcides</strong>, cuja<br />

formação humana, acadêmica, cultural e política tem raízes<br />

profundas no Recife de tantas inspirações, volta a expressar,<br />

tamb<strong>é</strong>m, seu arraigado sentimento de bem-querer a<br />

Pernambuco, sempre ressaltando seus maiores valores e suas<br />

mais notáveis tradições.<br />

Tenho honra e prazer ao apresentar este nono livro<br />

de <strong>Jota</strong> <strong>Alcides</strong>, depois de ter feito o prelúdio do seu primeiro<br />

trabalho literário lançado há 15 anos, em 1990, sobre o poder<br />

18


de comunicação do Padre Cícero, sacerdote mais punido e mais<br />

venerado na Am<strong>é</strong>rica Latina, agora sob estudo do Vaticano para<br />

sua reabilitação, esperança da maioria do povo do Nordeste.<br />

Como em três estudos anteriores, nos quais revela formidável<br />

capacidade de pesquisador, PRA-8-O Rádio no Brasil, Recife<br />

Berço Brasílico e Marquês do Recife, neste reafirma e consagra<br />

a vitalidade histórica e cultural de nossa terra.<br />

Se o Brasil tem hoje o segundo maior e mais<br />

moderno sistema de rádio do mundo, depois dos Estados<br />

Unidos, <strong>é</strong> valioso o renovado lembrete de <strong>Jota</strong> <strong>Alcides</strong><br />

indicando que tudo começou no Recife, em 1919, pelo<br />

engenho, talento e ousadia de Augusto Pereira, fundador do<br />

Rádio Clube de Pernambuco e pioneiro da radiodifusão<br />

brasileira, antecipando-se, inclusive, às transmissões<br />

experimentais norte-americanas. Foi assim que “conquistamos<br />

um meio de unir e sensibilizar o Brasil”, no dizer<br />

do nosso saudoso poeta Carlos Drummond de Andrade.<br />

De acordo com o que está na Teoria do Rádio, de<br />

Brecht, “um homem que tem algo a dizer e não encontra<br />

ouvintes está em má situação. Por<strong>é</strong>m, pior os ouvintes que<br />

não encontram quem tenha algo a dizer”.<br />

Nessa jornada de quase um s<strong>é</strong>culo do rádio no<br />

Brasil, Pernambuco sempre teve o que dizer e o que ouvir.<br />

Marcos Vilaça<br />

da Academia Brasileira de Letras<br />

19<br />

Brasília, junho de 2005


Aldemar ao<br />

microfone<br />

do Rádio<br />

Clube de<br />

Pernambuco<br />

em 1951<br />

Como<br />

animador<br />

da “Festa<br />

no Varandão”,<br />

seu primeiro<br />

programa<br />

no Rádio<br />

Clube<br />

20<br />

Na festa de<br />

inauaguração<br />

do Palácio<br />

do Rádio<br />

Oscar<br />

Moreira<br />

Pinto


I<br />

FRENÉTICO MUNDO NOVO<br />

(Escrito ao som da Orquestra de Jos<strong>é</strong> Menezes e o frevo Mexe<br />

com Tudo, de Levino Ferreira)<br />

“Enquanto o menino dormia, de repente, o<br />

aparelho começou a transmitir um programa de rádio<br />

de Londres. E, no dia seguinte, para espanto de seu<br />

hum...e de sua hum...(os meninos mais ousados<br />

aventuraram trocar um risinho), o pequeno Reuben<br />

acordou repetindo, palavra por palavra , uma palestra<br />

daquele escritor antigo (um dos raros cujas obras foram<br />

autorizadas a chegar at<strong>é</strong> nós), George Bernard Shaw,<br />

falando do seu próprio gênio”.<br />

Depois dessa futurologia do brilhante escritor<br />

inglês Aldous Huxley, anunciada em 1932, tudo parece<br />

possível. De tal forma que suposta comunicação com seres<br />

de outros mundos deixa Nova Iorque em pânico em 30 de<br />

outubro de 1938, domingo à noite. Milhares de norteamericanos<br />

correndo de suas casas para as ruas. Outros<br />

milhares correndo das ruas para suas casas. Seis milhões<br />

de ouvintes estão sintonizados na Rádio CBS atentos à trupe<br />

de Orson Welles, do programa Mercure Theatre. Dedicam<br />

todos atenção máxima à transmissão de uma adaptação<br />

radiofônica da peça Guerra dos Mundos, criada em 1898<br />

pelo romancista inglês futurista George Wells.<br />

21


De repente, entre rangidos e nervosos efeitos<br />

especiais próprios de narrativa cinematográfica, anunciase<br />

uma assustadora invasão de marcianos à Terra. Quase<br />

hiper-realismo. Forte impacto, grande apreensão e muito<br />

medo, algo aterrorizante. Produz-se, imediatamente, um<br />

tumulto generalizado, conforme consta em outro livro deste<br />

autor sobre a história do rádio:<br />

“Chocados e horrorizados com o fato, em<br />

verdade uma ficção com realismo explícito, imediatamente<br />

dois milhões de norte-amercianos foram tomados por<br />

fren<strong>é</strong>tica inquietude, seguida de incontrolável pânico,<br />

espalhando o terror para outros milhões. Welles entrou para<br />

a história sob o protesto de Wells que viu sua obra scientificromance<br />

envolvida num evento de transe coletivo sem<br />

precedentes”.<br />

Sempre relembrado como lendário, extraordinário<br />

e antológico, esse episódio, que faz parte da<br />

história como “A noite que aterrorizou a Am<strong>é</strong>rica”, mostra<br />

e prova ao mundo, pela primeira vez, a magia e o poder do<br />

rádio. Mas a história do rádio vem de muito antes,<br />

exatamente um s<strong>é</strong>culo. Caracterizada por seqüência de<br />

descobridores persistentes e descobertas consistentes. Desde<br />

1838, quando o físico norte-americano de Massachussets,<br />

Samuel Morse, apresenta, soberbamente, um aparelho<br />

chamado tel<strong>é</strong>grafo, o primeiro a garantir a comunicação<br />

entre duas pessoas à distância.<br />

Depois disso, tudo acontece e, rapidamente, com<br />

um avanço aprimorando outro, at<strong>é</strong> o mundo ser envolvido<br />

22


pela deslumbrante Era do Rádio: em 1844, Morse inaugura<br />

a primeira linha telegráfica pública, entre Washington e<br />

Baltimore; em 1850, surge o primeiro cabo submarino entre<br />

França e Inglaterra; em 1865, o m<strong>é</strong>dico norte-americano<br />

Mahion Loomis faz transmissão de mensagens atrav<strong>é</strong>s de<br />

efeitos eletromagn<strong>é</strong>ticos; em 1873, o físico inglês James<br />

Maxwell descobre as ondas eletromagn<strong>é</strong>ticas;<br />

Em 1876, Graham Bell, físico norte-americano<br />

de origem inglesa, inventa e anuncia o telefone; em 1887,<br />

na Alemanha, o físico Henrich Hertz descobre as ondas de<br />

rádio; em 1890, Edouard Branly, físico francês, apresenta à<br />

Academia de Ciências de Paris, sua experiência com<br />

radiocondutores; em 1892, o físico iugoslavo Nikola Tesla<br />

inventa o transformador de alta freqüência e monta uma<br />

produtora de ondas el<strong>é</strong>tricas; em 1894, o brasileiro Landell<br />

de Moura realiza, em São Paulo, a primeira transmissão de<br />

mensagens atrav<strong>é</strong>s de ondas hertzianas; em 1895,<br />

Guglielmo Marconi, em Bolonha, Itália, faz sua primeira<br />

experiência em radiocomunicação; em 1896, Marconi<br />

consegue, na Inglaterra, patentear sua aplicação das ondas<br />

hertzianas tornando-se o “pai do rádio”;<br />

Em 1904, Landell de Moura obt<strong>é</strong>m, nos<br />

Estados Unidos, a patente do seu transmissor por ondas<br />

hertzianas; em 1906, Lee De Forest descobre a válvula<br />

de vácuo, essencial ao desenvolvimento da radiodifusão;<br />

em 1914, instalam-se na Am<strong>é</strong>rica e na Europa, os<br />

primeiros clubes de rádio com objetivo de aprimorar e<br />

expandir atividades radiofônicas; em 1919, surgem as<br />

primeiras emissoras de radio do mundo: Radio Clube de<br />

23


Pernambuco, primeira do Brasil e da Am<strong>é</strong>rica Latina; e<br />

Radio PCGG de Rotterdan, pioneira na Holanda e na<br />

Europa; e em 1920, entra no ar a Rádio KDKA de<br />

Pittsburgh, a primeira dos Estados Unidos.<br />

É tão acelerado o desenvolvimento inicial do<br />

rádio que em 1926 já existem 995 emissoras em todo o<br />

mundo, conforme o escritor e pesquisador francês Arno<br />

Huth, em sua obra La Radiodiffusion, publicada em 1937,<br />

em Paris. Somente na Am<strong>é</strong>rica do Sul somam-se 40<br />

estações. Apenas quatro anos mais tarde, em 1930, 1.105<br />

transmissoras operam nos diversos continentes. Em 1938,<br />

quando da façanha de Orson Welles, assombrando os<br />

Estados Unidos, o mundo todo já tem mais de duas mil<br />

emissoras de rádio, sendo 917 norte-americanas. Com o<br />

surgimento dos primeiros receptores transístores em 1948,<br />

o radio ganha expansão em alta velocidade. Que<br />

surpreende at<strong>é</strong> os futuristas.<br />

Entretanto, mesmo com todo o seu amplo<br />

exercício de futurologia para a nova civilização científica<br />

e tecnológica, Aldous Huxley, em seu Admirável Mundo<br />

Novo, publicado em 1932, não consegue antecipar<br />

progresso tão veloz para o rádio. Ele at<strong>é</strong> especula sobre<br />

o rádio como instrumento para a hipnop<strong>é</strong>dia, sugerindo<br />

que uma criança pode aprender enquanto dorme ouvindo<br />

o rádio. Mas não chega a imaginar sua capacidade de<br />

alcance e impacto enquanto meio de comunicação ao vivo<br />

com as massas, nem sua fenomenal importância na<br />

geração de novas tecnologias e no desenvolvimento dos<br />

povos e das Nações.<br />

24


Afinal, al<strong>é</strong>m do impulso à descoberta da<br />

fotoeletricidade e da televisão, o rádio proporciona o<br />

aparecimento e a evolução dos telefones celulares, hoje o<br />

meio de comunicação que mais cresce no mundo, e o<br />

fantástico progresso dos computadores, apresentando<br />

surpreendentes e avançadíssimas tecnologias, como a<br />

conexão wireless, revolucionárias e globalizantes.<br />

Deve a humanidade ao rádio, portanto, muito de<br />

suas conquistas t<strong>é</strong>cnico-científicas, desde as primeiras<br />

estações transmissoras, em 1919, ao início deste Terceiro<br />

Milênio, pelas sucessivas aplicações das ondas hertzianas<br />

permitindo o advento de um fascinante e fren<strong>é</strong>tico mundo<br />

novo. Sem limites geográficos. Sem fronteiras. Sem fio.<br />

Admiravelmente!<br />

25


Com maestro<br />

Nolson<br />

Ferreira<br />

em programa<br />

nos estúdios<br />

da TV<br />

Brasília<br />

26<br />

Aldemar com<br />

historiador<br />

Leonardo<br />

Dantas,<br />

compositor<br />

Capiba e<br />

carnavalescos<br />

do Clube<br />

Galo da<br />

Madrugada<br />

Como animador<br />

e convidado<br />

especial<br />

em festa de<br />

aniversário da<br />

TV Itacolomy,<br />

em Belo<br />

Horizonte


2<br />

FALANDO PARA O MUNDO<br />

(Escrito ao som da Orquestra de Nelson Ferreira com o frevo dele e<br />

de Ziul Matos, Veneza Americana, Canção Oficial do Recife)<br />

Durante 40 anos, desde o surgimento da pioneira<br />

PRA-8-Rádio Clube de Pernambuco, em 06 de abril de<br />

1919, no Recife, o rádio exerce domínio absoluto na<br />

comunicação com as massas no Brasil. Esse domínio tornase<br />

mais forte a partir da inauguração da PRE-8-Radio<br />

Nacional do Rio, em 12 de setembro de 1936. Com suas<br />

poderosas ondas, a Rádio Nacional alcança, efetivamente,<br />

todo o território brasileiro. E o rádio sai da improvisação<br />

total, passa a ter organização em sua administração e<br />

qualificação em sua programação. Pernambuco permanece<br />

dando orgulho ao Brasil pelo seu pioneirismo com o Rádio<br />

Clube de Pernambuco que, em 1952, <strong>é</strong> incorporada aos<br />

Diários Associados.<br />

Depois de 30 anos reinando absoluto sobre as massas<br />

de ouvintes brasileiros, o rádio sofre forte impacto, no Sul,<br />

com a inauguração da TV Tupi de São Paulo, primeira<br />

televisão do Brasil e da Am<strong>é</strong>rica Latina, em 18 de setembro<br />

de 1950, pelo jornalista e empresário Assis Chateaubriand.<br />

É dele, tamb<strong>é</strong>m, a TV Tupi do Rio de Janeiro, colocada no<br />

ar em 20 de janeiro de 1951. No Nordeste, semelhante<br />

27


impacto ocorre um pouco mais tarde, dez anos depois,<br />

precisamente em 04 de junho de 1960, com a inauguração<br />

da TV Rádio Clube de Pernambuco, seguida da TV Jornal<br />

do Comm<strong>é</strong>rcio, em 18 de junho de 1960. Pernambuco<br />

ganha, assim, de uma só vez, duas televisões, as primeiras<br />

em todo o Nordeste brasileiro.<br />

Dessa forma, o domínio absoluto do rádio no<br />

Nordeste estende-se por 40 anos, de 1919 a 1959. Nesse<br />

período, o Recife concentra o maior número de emissoras<br />

e as mais potentes da região: Rádio Clube (1919), Rádio<br />

Jornal do Comm<strong>é</strong>rcio (1948), Rádio Tamandar<strong>é</strong> (1951),<br />

Rádio Olinda (1952), Rádio Mundial (1958) e Rádio<br />

Continental (1958). Em apenas uma d<strong>é</strong>cada, de 1949 a<br />

1959, Pernambuco torna-se o mais desenvolvido centro<br />

de radiodifusão do Nordeste, com seis emissoras<br />

operando na capital e oito no interior do Estado: Rádio<br />

Difusora de Caruaru (1951), Rádio Difusora de<br />

Garanhuns (1951), Rádio Difusora de Limoeiro (1952),<br />

Rádio Difusora de Pesqueira (1952), Rádio Cultura de<br />

Caruaru (1958), Rádio Planalto do Carpina (1958),<br />

Rádio Bitury de Belo Jardim (1958) e Rádio Pajeú de<br />

Afogados da Ingazeiras (1959).<br />

Enquanto a exploração do rádio ainda está começando<br />

na maioria dos Estados da região, seu progresso em<br />

Pernambuco reflete, estimula, acelera e promove o<br />

desenvolvimento geral de Pernambuco. Como sustenta<br />

Nelly de Camargo, pesquisadora da Universidade de São<br />

Paulo, “os meios de comunicação representam importante<br />

agência de desenvolvimento de vez que introduzem padrões<br />

28


de comportamento, desenvolvem motivações e criam<br />

expectativas ideais de atuação e de modos de vida”. No<br />

caso de Pernambuco, o progresso do rádio, em suas<br />

primeiras d<strong>é</strong>cadas de evolução e massificação, tem ligação<br />

direta com o desenvolvimento social, econômico e cultural,<br />

promovendo os valores do Estado no cenário do Nordeste<br />

e do País.<br />

Marco histórico dessa estrat<strong>é</strong>gia desenvolvimentista<br />

adotada por Pernambuco, com muito sucesso, fixa-se em<br />

03 de julho de 1948, com a presença do presidente da<br />

República, Eurico Gaspar Dutra. É o dia da inauguração<br />

do possante Rádio Jornal do Comm<strong>é</strong>rcio-PRL-6, fundado<br />

pelo empresário F. Pessoa de Queiroz, dono do Jornal do<br />

Comm<strong>é</strong>rcio, um dos mais importantes do Brasil, em<br />

circulação no Recife desde 03 de abril de 1919.<br />

Embora nascido na Paraíba, Pessoa de Queiroz,<br />

empresário ousado, austero e exigente, considera-se<br />

pernambucano, pensa e age como pernambucano, tem<br />

sentimento e vibração de pernambucano, parece mais<br />

pernambucano do que muitos pernambucanos e, como<br />

senador, torna-se líder político pernambucano no cenário<br />

nacional. Suas vibrantes realizações são, na própria<br />

definição dele, “uma obra pernambucana, uma esforço<br />

pernambucano, uma glória pernambucana”.<br />

Desse seu sentimento, nasce o portentoso e<br />

consagrado slogan criado especialmente para o Rádio Jornal<br />

do Comm<strong>é</strong>rcio, justificando o alcance internacional de suas<br />

poderosas ondas curtas: “Pernambuco falando para o<br />

29


Mundo”. Exibe alta qualidade t<strong>é</strong>cnica e direcionamento<br />

transnacional. Apresenta-se identificando-se com seus<br />

prefixos em várias línguas, transmitindo programas<br />

destinados aos povos de várias Nações e levando as<br />

tradições de Pernambuco para diversas partes do mundo.<br />

Mais do que apenas marketing, <strong>é</strong> uma verdade explícita na<br />

publicação oficial de inauguração da segunda emissora de<br />

Pernambuco:<br />

“O Rádio Jornal do Comm<strong>é</strong>rcio, de Pernambuco,<br />

<strong>é</strong>, no seu conjunto, a mais potente, a mais<br />

aperfeiçoada, a mais luxuosa e mais completa<br />

estação de broadcasting das Am<strong>é</strong>ricas do Sul e<br />

Central. É a única estação que dispôe de oito<br />

transmissores com os dispositivos mencionados: 1<br />

de Ondas Curtas, de 10 kilowatts; 1 transmissor<br />

auxiliar de 5 kilowatts; e 2 de Ondas Curtas, de 25<br />

kilowatts, quando operam em radiotelegrafia, e de<br />

16 kilowatts, quando operam em radiofonia. Esses<br />

dois transmissores possuem antenas dirigidas para<br />

o Norte e para o Sul, atuando no <strong>é</strong>ter com uma<br />

potência real de 100 kilowatts em radiotelegrafia e<br />

de 64 kilowatts em radiofonia. Cobre, portanto,<br />

integralmente o Brasil, de preferência em ondas<br />

curtas e m<strong>é</strong>dias, propagando-se pelos outros<br />

continentes”.<br />

É a única emissora das Am<strong>é</strong>ricas do Sul e Central<br />

com oito torres todas iluminadas automaticamente por meio<br />

de c<strong>é</strong>lulas fotoel<strong>é</strong>tricas e a única com oito freqüências,<br />

usadas de acordo com as estações climáticas a fim de evitar<br />

30


prejuízos em suas transmissões. Sem dúvida, <strong>é</strong> mesmo<br />

“Pernambuco falando para o Mundo”.<br />

Al<strong>é</strong>m de refletir a forte personalidade do seu criador<br />

F. Pessoa de Queiroz, empreendedor infatigável e idealista<br />

imperturbável, sem nunca temer obstáculos, sempre<br />

pensando grande, confiante no êxito dos seus projetos, o<br />

forte slogan do Rádio Jornal do Comm<strong>é</strong>rcio passa a<br />

expressar a altivez de Pernambuco. Causa curiosidade,<br />

espanto e at<strong>é</strong> certas ironias entre críticos do Sul, mas, na<br />

verdade, traduz o elevado grau de auto-estima do povo<br />

pernambucano, orgulhoso de sua força histórica, do seu<br />

potencial político, de sua capacidade criadora, de sua<br />

influência cultural no País e de sua credibilidade no cenário<br />

internacional: “Pernambuco falando para o Mundo”.<br />

Coincidentemente, os principais empresários<br />

responsáveis por esse desenvolvimento do rádio em<br />

Pernambuco e pelo histórico pioneirismo da televisão no<br />

Nordeste, a partir do Recife, são dois paraibanos e da mesma<br />

cidade, Umbuzeiro: Assis Chateaubriand e F. Pessoa de<br />

Queiroz. Criativos, competitivos, destemidos, perseverantes,<br />

determinados, obstinados, sonhadores, realizadores<br />

e vibrantes pernambucanizados, seus empreendimentos<br />

passam a prestar inestimáveis serviços ao progresso social,<br />

artístico, cultural, político e econômico de Pernambuco.<br />

Ao lado da briosa gente de Pernambuco, natural de<br />

Pernambuco, dotada de incomparável capacidade criativa<br />

e produtiva, especialmente revolucionária e transformadora,<br />

Assis Chateaubriand e F. Pessoa de Queiroz firmam-se como<br />

31


expressões de grandeza nacional da valorosa gente de outros<br />

Estados do Nordeste acolhida, preparada, estimulada e<br />

lançada em Pernambuco com o mesmo insuperável<br />

sentimento pernambucano de servir ao progresso abrangente<br />

da Pátria. Como lembra Gilberto Freyre, desde o início de<br />

sua rica e palpitante história, o Recife tem-se extremado<br />

em dar grandes valores, sobretudo intelectuais, ao Brasil:<br />

“Aliado a Sergipe, o Recife dá ao Brasil Tobias<br />

Barreto, Sílvio Romero, Gilberto Amado, Aníbal<br />

Freire; aliado ao Ceará, dá ao Brasil Jos<strong>é</strong> de Alencar,<br />

Franklim Távora, Clóvis Beviláqua, Delmiro<br />

Gouveia; aliado a Alagoas, dá ao Brasil, al<strong>é</strong>m de<br />

Jorge Lima, de Essa Nega Fulô, Pontes de Miranda,<br />

o maior jurista-sociólogo brasileiro desde Teixeira<br />

de Freitas, o genial baiano; aliado ao Pará, dá ao<br />

Brasil, Inglês de Souza; aliado ao Maranhão, dá ao<br />

Brasil Graça Aranha; aliado à Paraíba, dá ao Brasil,<br />

primeiro Augusto dos Anjos, depois Odilon Nestor,<br />

Jos<strong>é</strong> Am<strong>é</strong>rico de Almeida, Assis Chateaubriand e<br />

Jos<strong>é</strong> Lins do Rego; aliado à Bahia, dá ao Brasil<br />

Castro Alves, como já dera Nabuco de Araújo; aliado<br />

ao Rio Grande do Norte, produz, al<strong>é</strong>m da internacional<br />

Nísia Floresta, o mestre de estudos<br />

folclóricos e antropológicos Luis da Câmara<br />

Cascudo e tamb<strong>é</strong>m, em dias mais recentes, Nilo<br />

Pereira e Sileno Ribeiro; aliado à Paraiba dá ao<br />

Brasil, al<strong>é</strong>m do admirável Ariano Suassuna, tão<br />

renovador da arte de teatro quanto de ficção, o<br />

tamb<strong>é</strong>m admirável Celso Furtado, renovador dos<br />

estudos de economia do Brasil”.<br />

32


Diante de tão formidável estoque intelectual, Gilberto<br />

Freyre ressalta que, “o Recife <strong>é</strong> a cidade de homens e de<br />

instituições dos quais ningu<strong>é</strong>m consegue separar a história,<br />

a vivência, a constância, o futuro da cultura brasileira”.<br />

Como isso <strong>é</strong> verdade insofismável, por fidelidade histórica,<br />

justiça cívica, reconhecimento público e merecimento<br />

conquistado, deve-se acrescentar ao elenco nobre de<br />

Gilberto Freyre, de renomados valores brasileiros formados<br />

e lapidados em Pernambuco e projetados a partir de<br />

Pernambuco, portanto pernambucanizados, um nome de<br />

grandeza, valor, prestígio e aplauso, porquanto talentoso,<br />

inovador e arrojado, dado pelo Recife ao Brasil: Aldemar<br />

Buarque de Paiva. Ou, mais sonoramente, como consagrado<br />

popularmente, em Pernambuco e at<strong>é</strong> al<strong>é</strong>m-fronteiras do<br />

Brasil, Aldemar Paiva.<br />

33


Aldemar Paiva<br />

com o<br />

Governador<br />

de Pernambuco<br />

e seu amigo<br />

Jarbas<br />

Vasconcelos<br />

Com veteranos<br />

do rádio<br />

pernambucano:<br />

Expedito<br />

Baracho,<br />

Henrique Annes,<br />

Claudionor<br />

Gernamo e<br />

Lelino Manzela<br />

34<br />

Ao ser<br />

homenageado<br />

com o M<strong>é</strong>rito<br />

da Fundação<br />

Joaquim<br />

Nabuco


3<br />

DOIS MUNDOS PARALELOS<br />

(Escrito ao som da Banda do 20º Batalhão de Caçadores do Ex<strong>é</strong>rcito,<br />

em Alagoas, com Pajuçara, de Aldemar Paiva, hino sentimental de Maceió)<br />

Um <strong>é</strong> consagrado entre os maiores conhecedores da<br />

Língua Portuguesa. O outro está entre os melhores ensaístas<br />

do Brasil. São dois festejados expoentes de um clã<br />

importantíssimo da cultura brasileira: Aur<strong>é</strong>lio Buarque de<br />

Holanda, crítico, ensaísta, filólogo, professor e lexicógrafo,<br />

autor de Dois Mundos (1942), Mar de Histórias (1945)<br />

Território Lírico(1958) e do Novo Dicionário da Língua<br />

Portuguesa (1975), tradutor de Baudelaire e Oscar Wilde,<br />

membro da Academia Brasileira de Letras; e S<strong>é</strong>rgio Buarque<br />

de Holanda, sociólogo, historiador, jornalista, professor da<br />

antiga Universidade do Distrito Federal (Rio), da<br />

Universidade de São Paulo, da Universidade de Roma,<br />

adido cultural na Itália, crítico literário, autor de Raízes do<br />

Brasil (1936), Cobra de Vidro (1944), Caminhos e<br />

Fronteiras (1957) e Visão do Paraíso (1959). São dois<br />

referenciais de afirmação e projeção da inteligência,<br />

criatividade e luminosidade da cultura brasileira.<br />

Descendente desse clã, aplaudido no Brasil inteiro e<br />

no exterior, <strong>é</strong> Chico Buarque de Holanda, cantor,<br />

compositor, teatrólogo, dramaturgo, escritor, astro da maior<br />

grandeza na constelação artística musical brasileira, o<br />

35


criador de A Banda. Filho de S<strong>é</strong>rgio Buarque de Holanda.<br />

Do mesmo clã, igualmente, e famoso sobretudo no Nordeste<br />

brasileiro, mas tamb<strong>é</strong>m conhecido no Sul do Brasil, <strong>é</strong><br />

Aldemar Buarque de Paiva, compositor, radialista,<br />

jornalista, apresentador de rádio e televisão, folclorista e<br />

cordelista. Filho de Mário Fortunato de Paiva e Maria Luiza<br />

Buarque de Holanda Paiva, prima legítima de S<strong>é</strong>rgio e<br />

Aur<strong>é</strong>lio Buarque de Holanda.<br />

Como Aur<strong>é</strong>lio Buarque de Holanda, Aldemar<br />

Paiva <strong>é</strong> natural das Alagoas. Nascido em 20 de julho de<br />

1925. Nas Alagoas dos grandes marechais Deodoro da<br />

Fonseca e Floriano Peixoto. Da heroína contra os<br />

holandeses, Clara Camarão. Do jurista que honra o<br />

Direito brasileiro, Pontes de Miranda. Do poeta lírico<br />

Jorge de Lima, autor de Invenção de Orfeu (1952). Do<br />

neo-realista do modernismo, Graciliano Ramos, mestre<br />

Graça, de Vidas Secas (1938), da cachorra Baleia.<br />

Alagoas das lagoas Manguaba e Mundaú. Da bela<br />

Maceió de lindas praias e águas mornas em piscinas<br />

naturais: Pajuçara, Jatiúca, Ponta Verde, Sete Coqueiros,<br />

Garça Torta, Gogó da Ema.<br />

Em Maceió, Aldemar Paiva vive infância e adolescência<br />

discretas. Cursa o primário e o ginasial no Col<strong>é</strong>gio<br />

Diocesano, dirigido pelos Irmãos Maristas. F<strong>é</strong>rias e<br />

feriados, passa nos engenhos e fazendas da família em<br />

Porto Calvo, Matriz do Camaragibe, São Miguel dos<br />

Milagres, Porto de Pedras e Porto da Rua. E aproveita,<br />

tamb<strong>é</strong>m, quando pode, o paraíso das águas que <strong>é</strong> o litoral<br />

alagoano.<br />

36


Jovem estudante, tem despertada sua vocação para<br />

a poesia e para o teatro. Começa a escrever peças que<br />

são representadas pelos alunos do col<strong>é</strong>gio. Fica logo<br />

conhecido por suas emboladas, que ele define como<br />

gênero po<strong>é</strong>tico-cantado e gaiato do Nordeste, mexendo<br />

com os próprios colegas. Dessa fase, Aldemar Paiva<br />

nunca esquece o primeiro momento emocionante<br />

revelador do seu espírito patriótico ao desfilar com a<br />

farda de gala do Col<strong>é</strong>gio Diocesano na parada festiva do<br />

Dia da Independência do Brasil.<br />

Com vibração juvenil, ao lado do jornalista L.<br />

Lavenère, da educadora Linda Mascarenhas e do inseparável<br />

colega e amigo Nelson Porto, Aldemar Paiva funda o<br />

Teatro de Amadores de Maceió. Estr<strong>é</strong>ia com a com<strong>é</strong>dia de<br />

Paulo Magalhães – A Cigana me enganou – por sugestão<br />

de Waldemar de Oliveira, diretor do Teatro de Amadores<br />

de Pernambuco. “No elenco de nossa estr<strong>é</strong>ia figuram<br />

Nelson Porto, Norma Cabral, Eunice Pontes, Eva Bezerra,<br />

D<strong>é</strong>cio Barbosa e eu, ganhando popularidade como galã e<br />

comediante. Cenário de Lourenço Peixoto e montagem de<br />

Amadeu Barso”. Sob a direção de Lima Filho, o TAM<br />

apresenta peças originais do Brasil e do exterior bastante<br />

aplaudidas no Teatro Deodoro. Seus espetáculos animam,<br />

agitam e elevam a vida cultural de Maceió.<br />

É uma <strong>é</strong>poca de grande envolvimento de Aldemar<br />

Paiva com grupos teatrais e musicais, sob a influência dos<br />

conjuntos vocais de sucesso Brasil afora, como Anjos do<br />

Inferno, Bando da Lua, Garotos da Lua, Namorados da<br />

Lua, Trio Nagô, Demônios da Garôa, Vocalistas Tropicais,<br />

37


Os Cariocas, Trio de Ouro, etc. Enquanto estuda e trabalha<br />

como desenhista no DVOP-Departamento de Viação e<br />

Obras Públicas do Estado, escreve uma peça teatral<br />

intitulada “Obrigado, Dr.!”. Amplia-se sua popularidade<br />

ao ser representada no Teatro Deodoro por conceituado<br />

grupo de atores da Cia. de Com<strong>é</strong>dias Mesquitinha e Evilásio<br />

Marçal. Uma verdadeira consagração, para ele, inesquecível.<br />

E o rádio, como aparece na vida de Aldemar Paiva?<br />

Ele sintoniza, mais freqüentemente, a PRI-4 Rádio Tabajara<br />

de João Pessoa, por causa das audições espetaculares da<br />

orquestra do pernambucano Severino Araújo. Somente<br />

durante o carnaval prefere a Rádio Clube de Pernambuco e<br />

se entusiasma com os frevos dos magistrais Nelson Ferreira<br />

e Lourenço Capiba aos quais, mais adiante, se agrega como<br />

parceiro compositor.<br />

Dedica atenção, tamb<strong>é</strong>m, aos programas de maior<br />

sucesso, transmitidos para todo o Brasil pela Rádio Nacional<br />

do Rio de Janeiro. Dessa <strong>é</strong>poca, os cantores prediletos do<br />

público – Orlando Silva, Sílvio Caldas, Vicente Celestino,<br />

Emilinha Borba e Carlos Galhardo – são todos exclusivos<br />

da Rádio Nacional. Outros famosos do rádio são aplaudidos<br />

no País inteiro: Francisco Alves, Lamartine Babo, Noel<br />

Rosa, Alzirinha Camargo, Augusto Calheiros, Noel Rosa,<br />

Pixinguinha, Odete Amaral, Ciro Monteiro, Celso<br />

Guimarães, Araci de Almeida, Linda e Dircinha Batista,<br />

Aurora e Carmem Miranda, entre tantos outros. Grandes<br />

valores do rádio viram celebridades, como Renato Murce,<br />

Ademar Cas<strong>é</strong> e C<strong>é</strong>sar Ladeira.<br />

38


Quase isolado em Maceió, pela falta de uma<br />

estação de rádio nas Alagoas, Aldemar Paiva acompanha<br />

impaciente e ansioso a evolução do rádio no Recife, no<br />

Rio e São Paulo. Sua maior atenção está voltada para os<br />

programas musicais e humorísticos. Delicia-se com<br />

programas de duplas caipiras, como o de Jararaca &<br />

Ratinho, “sempre às quartas-feiras às 21 horas, sob o<br />

patrocínio dos produtos Eucalol”. Depois, de fã incondicional,<br />

torna-se amigo da dupla mais festejada do<br />

Brasil.<br />

Com vocação e talento naturais despertados para artes<br />

cênicas, sua grande frustração, por<strong>é</strong>m, <strong>é</strong> a inexistência de<br />

uma emissora de rádio na capital alagoana. “Aos anos 30/<br />

40, alguns sonhadores em botar Alagoas nas ondas<br />

hertzianas, fazem experiências inválidas e at<strong>é</strong> investem em<br />

projetos de serviços de alto-falantes...Tudo tristemente<br />

concluído em fracasso. Único Estado sem emissora de<br />

rádio, Alagoas ganha um slogan pejorativo: A Zona Muda<br />

do Brasil”, lembra.<br />

Conforme seus registros, uma visita do Presidente<br />

da República estimula dois amantes da radiofonia em<br />

Alagoas: Luiz Gonzaga e Jaques Mesquita. Eles obt<strong>é</strong>m<br />

permissão para transferir o Serviço de Rádio da Polícia<br />

Militar para o Palácio do Governo. E, assim, irradiam,<br />

pela primeira vez, uma solenidade em Maceió. Mas,<br />

conta Aldemar Paiva, na ausência de um locutor<br />

tarimbado, o narrador de então comete duas grandes<br />

gafes que passam a fazer parte do anedotário radiofônico.<br />

39


“Primeiro, quando o presidente da República,<br />

acompanhado dos ministros da Justiça e da<br />

Educação, adentraram pelos jardins do Palácio dos<br />

Martírios, ele anuncia: - Senhoras e Senhores...Sua<br />

Excelência, o Senhor Presidente da República está se<br />

dirigindo para as escadarias do Palácio...com dois<br />

membros de fora! Em seguida, ao t<strong>é</strong>rmino do almoço,<br />

oferecido pelas autoridades da Capital e do Estado,<br />

outra barbaridade: - Senhoras e Senhoras...Acabaram<br />

de comer agora mesmo a mulher do Prefeito e a<br />

mulher do Delegado...”<br />

Finalmente, em 16 de setembro de 1948, data<br />

comemorativa da emancipação política de Alagoas, realizase<br />

o seu primeiro grande sonho: inaugura-se, festivamente,<br />

a ZYO-4, Rádio Difusora de Alagoas, uma obra importante<br />

do Governo Silvestre P<strong>é</strong>ricles de Góis Monteiro. Pioneira<br />

emissora alagoana começa a funcionar sob a direção geral<br />

do musicista e em<strong>é</strong>rito educador Mário Marroquim e direção<br />

t<strong>é</strong>cnica de Luiz Gonzaga. Seu diretor administrativo <strong>é</strong><br />

Francisco Marroquim, irmão do correspondente de guerra<br />

Murilo Marroquim e do Secretário de Redação do Jornal<br />

do Comm<strong>é</strong>rcio, no Recife, Esmaragdo Marroquim.<br />

Diretor artístico e de programação da novíssima<br />

estação das Alagoas, Aldemar Paiva, orgulhosamente, cria,<br />

para marcar a inauguração da nova emissora, a música<br />

Pajuçara, cantada por Leurenir, com a Banda do 20º<br />

Batallhão de Caçadores do Ex<strong>é</strong>rcito, em Alagoas, sob a<br />

regência do maestro Manoel Passinha, e transformada em<br />

hino sentimental de Maceió. “Guardo at<strong>é</strong> hoje a felicidade<br />

40


me dada por Deus de ter sido a primeira pessoa a falar ao<br />

microfone da Rádio Difusora, acabando, a partir daí, com<br />

a frustração de Alagoas como Zona Muda do Brasil”.<br />

Com criatividade, dedicação e arrebatamento, Aldemar<br />

Paiva coordena uma equipe interessada e vibrante fazendo a<br />

ZYO-4 brilhar e crescer no conceito dos alagoanos:<br />

“Conquistamos o sucesso com uma programação<br />

ecl<strong>é</strong>tica: novelas, humorísticos, shows, programas de<br />

auditório, radiojornalismo, entrevistas, trasmissões<br />

externas, tudo dentro do nosso condicionamento de<br />

emissora do Governo. Entre nossas principais<br />

atrações: “Dona Pinóia e seus Brotinhos”, uma<br />

escolinha da pá virada, Crônica do Poeta Armando<br />

Wucherer e outra minha intitulada “Palavras para<br />

Você”. Contamos com o apoio dos músicos da Banda<br />

da Polícia Militar de Alagoas, sob a regência do<br />

maestro Nicácio e criamos o famoso “Regional dos<br />

Professores”, com a participação de dois mestres do<br />

violão, Reynaldo Costa e Juracy Alves”.<br />

Desse tempo, estão nas recordações de Aldemar Paiva<br />

alguns nomes do cast pioneiro da radiofonia alagoana: “Zez<strong>é</strong><br />

de Almeida, Cláudius Jucá, Otávio Braga, Setton Neto,<br />

Marlene Silva, Odete Pacheco, Haroldo Miranda, Ezequias<br />

Alves, Alberico Bruno, Renan e Rainou Carvalho, Luzinete<br />

Rios, Nilda Neves, Sinay Mesquita, Jair Amaral, Lima Filho,<br />

Jesualdo Ribeiro, Meira Bastos, Sandoval Caju, Hercílio<br />

Marques, Ivo Braga, Ascendino Santos, Altair Costa, Eunice<br />

Pontes, Florêncio Teixeira, Rosalvo Costa, <strong>Alcides</strong> Teixeira,<br />

41


Homero Malta, Antonio Paurílio, Jos<strong>é</strong> Renato, Luiz Torjal,<br />

<strong>Jota</strong> Prezado, Clemente Aleluia, Cláudio Alencar, Ed<strong>é</strong>cio<br />

Lopes, um senhor cast”.<br />

Com esses valores artísticos, em pouco tempo, a<br />

Radio Difusora de Alagoas, funcionando em sua fase inicial,<br />

em uma escola pública infantil na Avenida Pedro Góis<br />

Monteiro, “transforma-se num monumento de alegria e<br />

cultura”, apesar das precárias instalações e das enormes<br />

dificuldades que exigiam de todos, algo mais al<strong>é</strong>m do<br />

diletantismo, segundo Aldemar Paiva: “Pelo amor à arte e<br />

ao rádio convertem aquela pequena oficina de criação num<br />

legado de crença na fibra do povo alagoano”.<br />

Assim permanece Aldemar Paiva, criando e produzindo<br />

na Rádio Difusora de Alagoas, aprimorando-se<br />

profissionalmente, ganhando popularidade e acumulando<br />

prestígio, at<strong>é</strong> 1951, quando deixa Maceió e parte para novos<br />

e fascinantes desafios no desenvolvido rádio do Recife,<br />

Capital do Nordeste. Confiante na conquista do sucesso em<br />

Pernambuco, deixa sua querida Alagoas, historicamente at<strong>é</strong><br />

1817 terra pernambucana.<br />

Provavelmente por isso, desde a origem, ele se revela<br />

tão pernambucano. Vivente e sobrevivente entre dois mundos<br />

que atraem, consomem e encerram sua afeição. Sem perder<br />

nem abandonar suas raízes alagoanas da infância e juventude,<br />

cultivadas carinhosamente ao longo do tempo, sempre parece<br />

sentir-se mais forte e seguro em suas profundas e robustas<br />

raízes pernambucanas de mais de meio s<strong>é</strong>culo. Faz parte de<br />

suas vidas paralelas, como na obra de Plutarco.<br />

42


4<br />

BRAVA TERRA DO FREVO<br />

(Escrito ao som da Orquestra de Nelson Ferreira com seu frevo<br />

Gostosinho)<br />

Quando desembarca em Pernambuco, em 29 de junho<br />

de 1951, Aldemar Paiva fica encantado com a beleza do<br />

Recife, cortado pelo rio Capibaribe e interligado por<br />

majestosas pontes, algumas ainda do tempo holandês de<br />

Mauricío de Nassau. Metrópole do Nordeste, já com 500<br />

mil habitantes, o Recife <strong>é</strong>, como at<strong>é</strong> hoje, o pulsante centro<br />

cultural e econômico da região.<br />

Então, em 1951, o mundo está de olho na guerra da<br />

Cor<strong>é</strong>ia. Papa <strong>é</strong> Pio XII (Eugênio Pacelli). Presidente dos<br />

Estados Unidos <strong>é</strong> Harry Truman. Presidente da União<br />

Sovi<strong>é</strong>tica <strong>é</strong> Joseph Stalin. Entre as duas maiores potências<br />

do mundo, começa a “guerra fria”. Presidente do Brasil <strong>é</strong><br />

Getúlio Vargas. Governador de Pernambuco <strong>é</strong> Agamenon<br />

Magalhães. Tempo de forte nacionalismo. Do “petróleo <strong>é</strong><br />

nosso”. Da criação da Petrobrás. Ano de lançamento do<br />

antológico frevo Ultimo Dia, de Levino Ferreira, um dos<br />

maiores compositores de todos os tempos do carnaval do<br />

Recife.<br />

De todos os tempos, desde a segunda metade do<br />

s<strong>é</strong>culo XIX, quando grupos de capoeiristas começam a<br />

43


demonstrar sua complicada coreografia e seu gingado<br />

estonteante nos desfiles das bandas de música militares<br />

rivais O Quarto, do 4º Batalhão de Infantaria, e Espanha,<br />

da Guarda Nacional, e surgem as primeiras fanfarras, como<br />

consta da Pequena História da Música Popular, de Jos<strong>é</strong><br />

Ramos Tinhorão:<br />

“Assim, quando a partir da d<strong>é</strong>cada de 1880 a música<br />

de rua do Recife passou a ser fornecida não mais exclusivamente<br />

por bandas militares, mas por fanfarras a serviço de<br />

grupos de humildes trabalhadores urbanos(caiadores,<br />

carvoeiros, ferreiros, vasculhadores, espanadores, talhadores,<br />

ciscadores, abanadores), o espírito de criação espontânea de<br />

figuras sempre renovadas, na dança, estendeu-se tamb<strong>é</strong>m aos<br />

músicos, que não mais precisavam prender-se as dobrados e<br />

hinos marciais”.<br />

Deslumbrado com o espírito cosmopolita e festeiro<br />

do Recife, Aldemar Paiva entrega-se de corpo, alma e<br />

mente ao ritmo da Capital do Frevo, onde se faz o maior<br />

carnaval de rua do mundo. Fora de Pernambuco, ningu<strong>é</strong>m<br />

faz id<strong>é</strong>ia do que <strong>é</strong> “o povo solto nas ruas do Recife, após<br />

a declaração irreversível do carnaval” como afirma,<br />

saudosa-mente, recordando seus tempos de adolescência<br />

e juventude, o formidável e irônico cronista pernambucano<br />

Antonio Maria, autor da paródia “Ningu<strong>é</strong>m me<br />

ama, ningu<strong>é</strong>m me quer, ningu<strong>é</strong>m me chama de Baudelaire”.<br />

Já famoso no Rio, Antonio Maria não esquece o<br />

carnaval do seu tempo no Recife, agora um deslumbramento<br />

para Aldemar Paiva:<br />

44


“Faziam parte da corte imperial mulheres<br />

morenas que suavam, em bolinhas, na boca e no nariz.<br />

Mulheres de olhos ansiosos, presas de todos os<br />

atavismos de religião e de dor, a dançar a mais<br />

verdadeira de todas as danças - o frevo. Ah, de nada<br />

serviam suas heranças de submissão porque o<br />

despontar do carnaval era um grito de alforria. E seus<br />

corpos, seus braços, seus p<strong>é</strong>s, teriam sido repentinamente<br />

descobertos assim que os clarins do “Batutas<br />

de São Jos<strong>é</strong>” romperam o silêncio a que os humildes<br />

eram obrigados. Tão louca e tão bela aquela dança!<br />

Uma verdade maior que as verdades ditas ou escritas<br />

saia dos seus quadris, at<strong>é</strong> então bem comportados”.<br />

Igualmente ao extraordinário Antonio Maria, com sua<br />

aguda sensibilidade artística, voltada especialmente para o<br />

rádio, para a poesia e para a música, Aldemar Paiva apaixonase<br />

pelo frevo. Verdadeiramente. Intensamente. Torna-se um<br />

dos seus maiores defensores e propagandistas. E como<br />

apologista do frevo, tem sua história pessoal enriquecida:<br />

“O frevo passa a existir em minha vida como o sangue que<br />

corre em minhas veias. Dá novas palpitações ao <strong>meu</strong> coração<br />

e se transforma em inspiração de minha alma po<strong>é</strong>tica. Minha<br />

vida ganha outro ritmo, o ritmo do frevo”.<br />

Sem dúvida, Aldemar Paiva tem o frevo incorporado<br />

ao seu sutil magnetismo pessoal. Com biotipo<br />

francamente inadequado para a impetuosidade fervente<br />

do frevo, seu físico avantajado parece mais apropriado<br />

ao ritmo musical lento e romântico de Ray Conniff, Glenn<br />

Miller, Billy Vaugn ou Paul Mauriat. De espírito sereno,<br />

45


fleumático, quase contemplativo, embora sempre<br />

descontraído e animado, e, finalmente, assumido folião<br />

preferencial de camarote, Aldemar Paiva, de temperamento<br />

expansivo e afável, supera todas as idiossincrasias<br />

e se inicia como animador cultural de Pernambuco,<br />

como Cidadão do Frevo.<br />

De acordo com seu conterrâneo e parente Aur<strong>é</strong>lio<br />

Buarque de Holanda, o maior dicionarista brasileiro, frevo <strong>é</strong><br />

“dança carnavalesca de rua e de salão, essencialmente rítmica,<br />

em compasso binário e andamento mais rápido que o da<br />

marchinha carioca e no qual os dançarinos(passistas) executam<br />

coreografia individual, improvisada e fren<strong>é</strong>tica”. É música do<br />

carnaval do Recife, de ritmo agitado e impetuoso, envolvendo<br />

milhares de participantes vestidos com fantasias típicas e agitando<br />

no ar pequenos guarda-chuvas coloridos, em bela e originalíssima<br />

coreografia com ágil movimento de braços e de pernas que se<br />

agitam, dobram e se estiram freneticamente.<br />

“Frevo <strong>é</strong> Carnaval. Carnaval <strong>é</strong> participação”.<br />

Palavras do maestro Nelson Ferreira, respeitado catedrático<br />

do frevo. “Frevo <strong>é</strong> euforia popular”, expressão do magistral<br />

compositor Lourenço Capiba. Definições desses dois ícones<br />

históricos do carnaval de Pernambuco caracterizam o frevo<br />

como dança e música populares entre os pernambucanos.<br />

Mas sua popularização somente acontece depois que a<br />

sociedade urbana brasileira começa a assimilar, aceitar e<br />

assumir costumes e hábitos de raízes negras. Sim, porque,<br />

como o samba, marca musical do Rio de Janeiro, e o ax<strong>é</strong>,<br />

marca da Bahia, o frevo, marca de Pernambuco, tamb<strong>é</strong>m <strong>é</strong><br />

originário da cultura negra.<br />

46


É nessa terra brava de história e de frevo que<br />

Aldemar Paiva começa sua nova e trepidante vida artística.<br />

Chega ao Recife convidado pelo diretor do Rádio Clube<br />

de Pernambuco, Arnaldo Moreira Pinto, por meio do<br />

radialista e publicitário alagoano Jos<strong>é</strong> Renato, fundador<br />

da Agência Norte, primeira agência publicitária do Recife.<br />

Sua chegada faz parte do esforço do Rádio Clube na<br />

competição com o novo e forte Rádio Jornal do<br />

Comm<strong>é</strong>rcio. Sua primeira missão <strong>é</strong> substituir o humorista<br />

Chico Anysio, então deixando o Recife para tentar o<br />

sucesso no Rio, como consta de Memória do Rádio, de<br />

Luiz Maranhão Filho.<br />

“Das Alagoas, a emissora recebeu um dos valores<br />

que haveria de se destacar no seu prefixo e aí permanecer<br />

por longo tempo a batalhar como o entusiasmo de um<br />

apaixonado. O locutor Aldemar Paiva vinha de uma direção<br />

artística na Rádio Difusora de Alagoas, emissora oficial.<br />

Trazia consigo uma boa atriz, Vilma Campos, algumas<br />

id<strong>é</strong>ias razoáveis e muita vontade de vencer. Ele e Chico<br />

Anysio se entenderam muito bem”.<br />

Já considerado talentoso humorista, Chico Anysio<br />

está indo para o Rio em busca de espaço na Rádio<br />

Nacional e ou na Rádio Mayrink Veiga, onde atuam os<br />

principais ídolos do rádio no País. Uma das maiores<br />

audiências <strong>é</strong> o Programa C<strong>é</strong>sar de Alencar, cuja abertura<br />

musical <strong>é</strong> um convite aos ouvintes: “Esta canção nasceu<br />

pra quem quiser cantar. Canta <strong>você</strong>, cantamos nós, at<strong>é</strong><br />

cansar...”. Outra grande atração <strong>é</strong> o Programa PRK-30,<br />

humorístico.<br />

47


Fazem sucesso no Rio e no País os programas<br />

Curiosidades Musicais, Um Milhão de Melodias, Cavalgada<br />

da Alegria, Fantasias Sonoras, Romance Musical...É<br />

tempo das duplas caipiras Jararaca & Ratinho, Alvarenga<br />

& Ranchinho. É tempo do Rei da Voz, Chico Alves, o mais<br />

popular cantor brasileiro at<strong>é</strong> os anos 50. É tempo de<br />

Marlene, de Emilinha Borba, de Isaurinha Garcia, das<br />

cantoras do rádio:<br />

“Nós somos as cantoras do rádio,<br />

Levamos a vida a cantar.<br />

De noite embalamos teus sonhos,<br />

De manhã nós vamos te acordar.<br />

Nós somos as cantoras do rádio.<br />

Nossas canções cruzando o espaço azul<br />

Vão reunindo num grande abraço<br />

Corações de Norte a Sul”.<br />

Para profissionais de rádio do Nordeste <strong>é</strong> a glória<br />

máxima trabalhar no Palácio do Rádio Oscar Moreira<br />

Pinto, na avenida Cruz Cabugá, centro do Recife, então o<br />

templo de “monstros sagrados” da radiofonia de<br />

Pernambuco, com prestígio nacional. Eis alguns deles<br />

dessa <strong>é</strong>poca memorável: Nelson Ferreira, compositor,<br />

maestro, orquestrador e produtor de programas de sucesso,<br />

como Hora Azul das Senhorinhas, e grandes musicais;<br />

Waldemar de Oliveira, autor da Crônica Meio-Dia; Abílio<br />

Leôncio de Castro, professor de português e primeiro<br />

locutor de rádio da Am<strong>é</strong>rica Latina; Mário Libânio, autor<br />

e diretor da c<strong>é</strong>lebre Oração da Ave Maria, apresentada<br />

48


diariamente às 18 horas; Jos<strong>é</strong> Uchoa, primeiro locutor<br />

eclesiástico do Brasil; e Luiz de Albuquerque Maranhão,<br />

diretor de rádio-teatro.<br />

É grande a constelação de astros e estrelas do radio<br />

pernambucano, entre numerosos músicos, cantores,<br />

compositores, produtores, redatores, locutores, apresentadores,<br />

noticiaristas, novelistas e humoristas: maestro<br />

Felipe Caparrós e sua mulher, soprano, Júlia Caparrós,<br />

Ziul Matos, Levino Ferreira, James de Morais, Auci<br />

Medeiros, Z<strong>é</strong> do Carmo, Benedito Santos, Mário Reis,<br />

Torres Filho, Rossini Ferreira, Irmãs Parísio (Alaíde,<br />

Salom<strong>é</strong> e Maria), Vicente Cunha, Moura Júnior, Clóvis<br />

Neves, <strong>Jota</strong> Austreg<strong>é</strong>silo, Fernando Silveira, Nilo Pereira,<br />

Chico Anysio, Telga de Araújo, Luiza Bandeira, Antonio<br />

Maria, Almir Távora, Severino Revorêdo, Laudenor e<br />

Itamar Pereira, Maria Celeste, Sônia Maria, Uchoa<br />

Cavalcanti, Luiz de França, Tavares Maciel (Programa<br />

Quem Manda <strong>é</strong> o Freguês), Walter Lins (Programa<br />

Caixinha de Pedidos), Mercedes Del Prado, Sebastião<br />

Estanislau, Glauce Bandeira, Dantas de Mesquita,<br />

Claudionor Germano, Djalma Torres, Luiz Queiroga,<br />

Aguinaldo Batista, Meves Gama, Inaldo Vilarim, Gilson<br />

Ribeiro, Edvaldo Pessoa, Jorge Jos<strong>é</strong>, Jomir Rodrigues,<br />

Rosa Maria, Ada Neusa, Genival Lacerda, Ted Jones, João<br />

Moreno, Cláudio Almeida, Míria Nunes, Jos<strong>é</strong> Diniz<br />

Madruga, Tânia Maria, Lourival Oliveira, Jos<strong>é</strong> Santa Cruz,<br />

Jos<strong>é</strong> Menezes, Otávio Augusto Vampr<strong>é</strong>, Ren<strong>é</strong> de Almeida,<br />

Nerize Paiva, Milton Rodrigues, Emanuel Silva, Mário<br />

Teixeira, Bety Kate e muitos outros de consagração<br />

popular.<br />

49


Com a experiência de sucesso na Rádio Difusora de<br />

Alagoas, o programa “Dona Pinóia e seus Brotinhos” <strong>é</strong><br />

lançado por Aldemar Paiva na emissora pioneira de<br />

Pernambuco. Apresentado no palco-auditório do Palácio<br />

do Rádio, sempre aos domingos, conta, inicialmente, com<br />

a participação de Chico Anysio, antes da transferência dele<br />

para o Rio. Muitos acreditam ter sido essa a inspiração do<br />

c<strong>é</strong>lebre humorista para o lançamento, d<strong>é</strong>cadas depois, de<br />

sua “Escolinha do Professor Raimundo”, na Rede Globo<br />

de Televisão. Aldemar Paiva esclarece:<br />

“Ao me transferir para o Recife, em 1951, resolvi<br />

apresentar Dona Pinóia, como atração da Era de Ouro do<br />

rádio pernambucano, valorizada com Chico Anysio, Jos<strong>é</strong><br />

Santa Cruz, Ren<strong>é</strong> de Almeida, <strong>Jota</strong> Austreg<strong>é</strong>silo, Altair Costa<br />

e o próprio criador. Depois, por sugestão do senador João<br />

Calmon, adaptei Dona Pinóia para a Ceará Rádio Clube,<br />

onde tamb<strong>é</strong>m brilhou. Mais tarde, surgiram comentários de<br />

que a famosa Escolinha do Professor Raimundo, na Rede<br />

Globo, havia se inspirado nos alunos gaiatos de Dona Pinóia.<br />

Na verdade, aos anos 70, a Globo mostrou interesse em<br />

adquirir os scripts desse humorístico, guardados por mim<br />

na bagunçoteca de nossa casa do bairro de Rio Doce. Foi<br />

uma tristeza. Os cupins desceram dos cajueiros e deram uma<br />

de MST: acamparam e destruíram tudo”.<br />

Outra grande atração produzida por Aldemar Paiva<br />

no início de sua jornada na emissora pioneira do Recife <strong>é</strong><br />

Festa no Varandão, uma antecipação dos programas de<br />

auditório do pernambucano Abelardo Barbosa Chacrinha,<br />

de sucesso na televisão brasileira:<br />

50


“Al<strong>é</strong>m da presença de muitos ouvintes do Recife,<br />

vinham caminhões cheios de gente do interior de<br />

Pernambuco, da Paraíba, das Alagoas e de outros Estados.<br />

Festa no Varandão era show com apresentação de cantores<br />

populares e prêmios para a plat<strong>é</strong>ia. Só que os prêmios eram<br />

uma surpresa. Muitos voltavam para casa levando banana,<br />

jerimum, mamão, abacaxi, galinha, ovos, carne de sol. Eu<br />

anunciava como prêmio uma lambreta, uma motoneta da<br />

moda, e quando o sujeito ia receber era um cabrito”.<br />

Em seu primeiro ano no Recife, Aldemar Paiva<br />

dedica-se 24 horas por dia, com satisfação e vibração às<br />

atividades artísticas na PRA-8, movido pelo combustível<br />

de muitos sonhos. Mostra sua versa-tilidade e desenvolve<br />

sua capacidade como criador, produtor, ator, apresentador<br />

e humorista. Antecipa sua condição futura de multimídia.<br />

Já no segundo ano na PRA-8, completamente identificado<br />

com a agitação social, musical e cultural do Recife, lança o<br />

programa que vai ser a marca de sua vida pessoal e<br />

profissional – “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu” – maravilhoso<br />

show de rádio de grande sucesso nacional.<br />

Em 1952, quando entra no ar “Pernambuco Você <strong>é</strong><br />

Meu”, o Brasil tem 52 milhões de habitantes, 36% morando<br />

nas cidades e 64% nos campos. Nordeste tem 18 milhões,<br />

Pernambuco 3,5 milhões e Recife 500 mil habitantes.<br />

Existem no País apenas três estações de televisão, TV Tupi<br />

e TV Paulista, em São Paulo, e TV Tupi do Rio, que chegam<br />

à população por meio de sete mil televisores nas duas<br />

capitais. Quanto ao rádio, são cerca de 400 emissoras no<br />

Brasil e aproximadamente 3,5 milhões de aparelhos<br />

51


eceptores. Faltam surgir as emissoras FM. Em plano<br />

nacional, o rádio det<strong>é</strong>m 40% do bolo publicitário e a<br />

televisão, iniciante, apenas 10%.<br />

No Nordeste ainda sem televisão e, espe-cialmente,<br />

em Pernambuco, o rádio <strong>é</strong> o grande meio de comunicação<br />

com as massas. Vive sua <strong>é</strong>poca de ouro com grandes<br />

produções, magníficos elencos de rádio-teatro, excelentes<br />

orquestras e muitos programas de auditório. É nesse<br />

ambiente que “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu” surge para fazer<br />

história e conquistar glória no rádio do Brasil.<br />

52


5<br />

PERNAMBUCO VOCÊ É MEU<br />

(Escrito ao som da Orquestra de Nelson Ferreira com Vassourinhas,<br />

de Matias da Rocha, hino do carnaval de Pernambuco)<br />

“...Estas são as ondas mais quentes e mais vibrantes<br />

do Brasil. Estamos nas ondas do frevo. Do frevo de<br />

Pernambuco, terra de gente agitada, de gente<br />

honrada, de gente iluminada. É manhã bonita no<br />

Recife. C<strong>é</strong>u azul claro, limpo, lindo. Sol aberto,<br />

chamando para as praias. Mar azul-esverdeado<br />

como nunca. Boa Viagem para os que chegam. Nossa<br />

Copacabana do Nordeste está irresistível. Comece<br />

bem o dia com uma preciosa e gostosa água de côco.<br />

Desses maravilhosos coqueiros que embelezam a<br />

tropicalíssima paisagem pernambucana. Aos que<br />

estão indo mergulhar, bom dia! Olha a morena cor<br />

de canela, desfilando sua beleza mais do que<br />

escultural. Que natureza! E lá vai passando a<br />

lourinha bronzeada. Pura sensualidade. Aos que já<br />

estão trabalhando, bom dia!”.<br />

Semelhantemente assim, cada audição do “Pernambuco<br />

Você <strong>é</strong> Meu” proporciona aos seus milhares de<br />

ouvintes, por todo o Brasil, um passeio romântico, po<strong>é</strong>tico,<br />

sentimental e entusiástico pela paisagem urbana, humana,<br />

histórica, cultural e artística de Pernambuco. Em estilo<br />

53


coloquializado, fabulesco e sensorial, fazendo renovação<br />

sem esconder nostalgia, revolucionando o rádio brasileiro.<br />

Em ritmo de frevo, puxado pelo inconfundível Vassourinhas<br />

e permeado por Veneza Americana.<br />

“É Veneza Americana,<br />

do mais lindo c<strong>é</strong>u de anil,<br />

minha terra hospitaleira,<br />

Namorada do Brasil...<br />

Teus coqueiros junto ao mar<br />

No seu doce farfalhar<br />

A trazer tranqüilidade,<br />

Crescem, crescendo a beleza<br />

Desta cidade Veneza,<br />

Ninho de Felicidade.<br />

E o Capibaribe a rir<br />

É no seu curso a seguir<br />

Da cidade a própria vida,<br />

A poesia imorredoura,<br />

A mensagem sedutora<br />

Da Veneza tão querida do Brasil”.<br />

Pois, <strong>é</strong>! Como o samba está para o Brasil, o frevo <strong>é</strong><br />

um elemento forte, fortíssimo, na etogenia pernambucana.<br />

Como está para o País a emocionante Aquarela do Brasil,<br />

de Ary Barroso, verdadeiro hino nacional, assim está<br />

Vassourinhas, de Matias da Rocha, para Pernambuco. Como<br />

<strong>é</strong> Cidade Maravilhosa, de Andr<strong>é</strong> Filho, para o Rio de<br />

Janeiro, assim <strong>é</strong> Veneza Americana, de Nelson Ferreira e<br />

54


Ziul Matos, para o Recife. É Pernambuco frevando e<br />

fervendo.<br />

“...Vamos saudando Pernambuco com muito frevo.<br />

De Capiba, de Nelson Ferreira, de todos os<br />

carnavais. Em ritmo de gostosão, gostosinho,<br />

gostosamente. Vamos abraçando o Recife antigo e o<br />

Recife novo. Alô, Boa Viagem, Boa Vista, Espinheiro,<br />

Rosarinho, Encruzilhada, Casa Forte, Apipucos,<br />

Cordeiro, Caxangá, Casa Amarela. Abraçando o<br />

Recife das feiras, cheias de mangas rosa, cheirosas<br />

e apetitosas. O dia já não <strong>é</strong> mais criança na floresta<br />

de Dois Irmãos. Lá, os crocodilos fingem que<br />

dormem, de olho em cada macaco frevando no seu<br />

galho. Mas o dia vai raiando no Solar de Apipucos.<br />

Bom dia, mestre Gilberto Freyre! Bom dia, Olinda.<br />

Ah se Duarte Coelho soubesse como estás cada vez<br />

mais linda. É bom ver Jaboatão. Quem sabe, não<br />

perde a festa da pitomba. Jaboatão dos Guararapes,<br />

das batalhas memoráveis e das vitórias mais ainda.<br />

Passando lá, faça um ato de devoção no altar da<br />

Pátria: visita a igrejinha de Nossa Senhora dos<br />

Prazeres. Contemple a imagem da santa. É um<br />

primor de arte”.<br />

Em 25 anos, “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu” consagrase<br />

como a maior vitrine do frevo para o Brasil, sob o<br />

comando mágico de Aldemar Paiva, al<strong>é</strong>m de tudo, um<br />

melômano, principalmente compositor de frevo. Sua voz<br />

de timbre agradável torna-se mais prazeirosa e familiar à<br />

medida que se vai ouvindo. Mesmo em ritmo naturalmente<br />

55


lento, conversando pausadamente, Aldemar Paiva pode falar<br />

assim at<strong>é</strong> muito mais de cinco minutos no ar, o que no rádio<br />

<strong>é</strong> uma eternidade, sem causar monotonia. Causa prazer.<br />

“...Bom Dia, Gravatá e Garanhuns, as duas suíças<br />

pernambucanas. Somos assim mesmo, meio exagerados:<br />

enquanto os europeus têm apenas uma, nós<br />

temos logo duas. Alô, Catende! Qualquer dia desses,<br />

vou danado pra Catende, como o genial Ascenço<br />

Ferreira. Viva Limoeiro, terra do valente Chico<br />

Heráclio e dos valorosos Vilaças. Bom dia, Nazar<strong>é</strong><br />

da Mata, do poeta Mauro Mota e do frevo rasgado.<br />

Que <strong>é</strong> o frevo que agita Surubim, terra do nosso velho<br />

e ilustre guerreiro Abelardo Barbosa. Alô, seu<br />

Chacrinha! Alô, Carpina! A torre de fumaça da usina<br />

Petribú está subindo, subindo. Espalhando na Zona<br />

da Mata o cheiro forte de melaço”.<br />

Seu programa, dinâmico e variado em expressões e<br />

impressões, com o impetuoso frevo ao fundo e freqüentes<br />

subidas de som, jamais <strong>é</strong> enfadonho. Pelo contrário, <strong>é</strong><br />

contagiante. Um programa intimista, com a harmonia<br />

modulada da voz do seu apresentador e o diapasão musical<br />

marcado por repetição incessante de frevos, os mais<br />

tradicionais e bem ao gosto popular, incluindo muitas<br />

evocações:<br />

“Felinto...Pedro Salgado...Guillherme...<br />

Fenelon...Cadê teus blocos famosos?<br />

Bloco das Flores,.. Andaluzas,<br />

Pirilampos...Apôis Fum...<br />

56


dos carnavais saudosos?!<br />

Na alta madrugada, o coro entoava<br />

do bloco a Marcha-Regresso,<br />

que era o sucesso<br />

dos tempos ideais<br />

do velho Raul Morais:<br />

Adeus, adeus, minha gente,<br />

que já cantamos bastante...<br />

E o Recife adormecia,<br />

ficava a sonhar<br />

ao som da triste melodia...”<br />

Frevo <strong>é</strong> o leitmotiv de “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu”.<br />

Por sua irradiação atraente, Aldemar Paiva, exuberante fisica<br />

e mentalmente, quase transforma seus ouvintes em<br />

espectadores ativos da coreografia estonteante dos passistas<br />

em fantasias supercoloridas e dos vibrantes trompetes das<br />

melhores orquestras, lançando no ar os mais quentes e os<br />

melhores frevos de rua e de canção que sempre sacodem o<br />

Recife, cidade lendária. Sobretudo frevos de Nelson<br />

Ferreira, de Lourenço Capiba e de Levino Ferreira.<br />

Carnaval da Vitória, Mexe com tudo, Lágrima de<br />

Folião, Comendo Fogo, Diabo Solto, Alegria de Pomp<strong>é</strong>ia,<br />

Retalhos de Saudade, Amália no Frevo, Não adianta<br />

Chorar, Vem Fervendo, Come e Dorme, Isquenta Mui<strong>é</strong>,<br />

Gostosão, Porta-Bandeira, Casa-Casá, Borboleta Não <strong>é</strong><br />

Ave, Óia a Virada, Boca de Forno, Bem-Te-Vi, O Passo<br />

do Caroá, Eu Quero <strong>é</strong> Ver, Casinha Pequenina, Que Bom<br />

Vai Ser, Quando a Noite <strong>é</strong> de Lua, Linda Flor da<br />

Madrugada, Deixa o Homem se Virar, Que <strong>é</strong> que vou<br />

57


dizer, Juventude Dourada, Quando se vai o Amor, Cheguei<br />

na Hora, Perna de Pau, Pilão Deitado, Corisco, Levanta<br />

Poeira, Alô Recife.<br />

É uma onda só tomando conta do Recife. Ningu<strong>é</strong>m<br />

desliga o rádio, ningu<strong>é</strong>m fica parado, ningu<strong>é</strong>m fica triste.<br />

Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu” faz eco no centro do Recife.<br />

Principalmente nos bares, restaurantes e lojas de eletrodom<strong>é</strong>sticos<br />

das avenidas Guararapes, Dantas Barreto e<br />

Conde da Boa Vista, e nas ruas Duque de Caxias, Imperatriz,<br />

Nova, Concórdia e outras de movimentado e variado<br />

com<strong>é</strong>rcio. É só vibraçao! É só emoção! É só alegria! Na<br />

Capítal e no interior.<br />

“...Bom dia para a querida Princesa do Agreste, Alô<br />

pessoal da Feira de Caruaru, a mais famosa do<br />

Brasil. No meio de tudo, tem rapadura, batida,<br />

quebra-queixo, alfinim e doce que não acaba mais.<br />

Tem de tudo que há no mundo, n<strong>é</strong> Luiz Gonzaga?<br />

Viva o nosso venerável Rei do Baião! E olhem os<br />

bonecos do mestre Vitalino! Quase falam. Magistral<br />

Vitalino! No Sertão Central, tem Arcoverde. De dom<br />

Joaquim Arcoverde, o primeiro cardeal brasileiro,<br />

sabiam? Que goiabada gostosa tem Pesqueira!<br />

Depois <strong>é</strong> Salgueiro. Não <strong>é</strong> escola de samba. É cidade<br />

que ao frevo ama. Bom dia, Petrolina! Terra dos<br />

Coelho. Em progresso, rápida como coelho.<br />

Petrolina não <strong>é</strong> a foz mas <strong>é</strong> a voz do São Francisco,<br />

o velho e resistente Chico, o rio da integração<br />

nacional. É o que fazemos agora nas ondas do frevo,<br />

envolvendo o Brasil com a alma fervente e o coração<br />

58


frevante de Pernambuco. Bom dia, Pernambuco!<br />

Pernambuco, <strong>você</strong> <strong>é</strong> <strong>meu</strong>!”<br />

Sensacionais causos, contados maravilhosamente,<br />

sem leituras dramatizadas, mas, improvisadamente,<br />

constituem-se uma atração especial enriquecendo<br />

“Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu”. Um programa sempre alegre,<br />

leve e divertido, variado e copioso em conteúdo, com poesias,<br />

histórias de cordel, quadrinhas, crônicas, informações,<br />

utilidade pública, atualidades, curiosidades, banalidades do<br />

cotidiano, saberes e sabores da riquíssima culinária<br />

pernambucana. É um mix de tradição e contemporaneidade.<br />

Tudo animado com bordões criativos que se tornam muito<br />

populares:<br />

“De onde quer que esteja, escreva<br />

para este programa que <strong>é</strong> seu<br />

cicerone ou criado às ordens<br />

na terceira cidade do Brasil”<br />

“Não sei se <strong>é</strong> fato ou se <strong>é</strong> fita,<br />

não sei se <strong>é</strong> fita ou se <strong>é</strong> fato...<br />

O fato <strong>é</strong> que ela me fita,<br />

me fita mesmo de fato!”<br />

Em contra-ponto ao ritmo agitado e fervilhante do<br />

frevo, tudo <strong>é</strong> apresentado no padrão Aldemar Paiva, fluindo<br />

naturalmente, desfilando calmamente, sem esforço e sem<br />

ansiedade, com fraseado inteligente, adequada sonoridade,<br />

muita espontaneidade, interatividade e surpreendente timing<br />

cômico:<br />

59


“E <strong>você</strong>, que está aí em seu carro, vá devagar, dirija<br />

com atenção. É preferível chegar tarde em casa do<br />

que cedo no cemit<strong>é</strong>rio...”<br />

“Olhe a hora certa para não se atrasar. São 7h45m<br />

na capital pernambucana. Não perca sua condução<br />

de jeito nenhum”.<br />

Al<strong>é</strong>m de uma janela para a alma, “Pernambuco Você<br />

<strong>é</strong> Meu” abre, tamb<strong>é</strong>m, “uma janela para o mundo”, na<br />

expressão do próprio âncora. É o momento diário do Repórter<br />

Esso das 8h da manhã. Durante muitos anos apresentado no<br />

Rádio Clube de Pernambuco, por Mário Teixeira. Depois, o<br />

informativo da Esso e seu apresentador transferem-se para<br />

o Rádio Jornal do Comm<strong>é</strong>rcio. Mais tarde, com Mário<br />

Teixeira indo para o Rio, fica como seu substituto o locutor<br />

Edson de Almeida. Mant<strong>é</strong>m o Reporter Esso, no entanto,<br />

seu mesmo padrão editorial de qualidade e sua grande<br />

audiência dentro do “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu”. Ao anunciar<br />

cada edição, uma vinheta prende os ouvintes:<br />

“Emissoras brasileiras do Rádio Jornal do Comm<strong>é</strong>rcio,<br />

a voz mais potente do Brasil, Pernambuco<br />

falando para o Mundo. Na capital pernambucana,<br />

são 8 horas...”<br />

Rompe o ar a inconfundível fanfarra criada pelo maestro<br />

Carioca, seguida do locutor com o noticioso:<br />

“Muito bom dia, senhoras e senhores. Aqui fala o<br />

seu Repórter Esso, porta-voz dos seus Revendedores<br />

60


Esso, com as últimas notícias do Brasil e do Mundo,<br />

fornecidas pela UPI e por estas emissoras. Neste<br />

momento, na Avenida Guararapes, no centro do<br />

Recife, a temperatura marca...Eis as últimas notícias<br />

da noite que passou...E agora, as primeiras notícias<br />

do dia...O seu Reporter Esso e as Esportivas... Ponha<br />

um tigre da Esso no seu carro...E atenção para a<br />

última notícia...<br />

Durante todo o programa, Aldemar Paiva mant<strong>é</strong>m<br />

seus ouvintes atualizados com o noticiário do dia,<br />

destacando as manchetes e comentando as informações dos<br />

jornais. Transforma em eletrônica a coluna impressa diária<br />

do seu querido amigo Aldo Paes e Amor Barreto, uma das<br />

mais movimentadas e prestigiadas do Jornal do Comm<strong>é</strong>rcio.<br />

Abre espaço tamb<strong>é</strong>m para a crônica diária de Medeiros<br />

Cavalcanti, sempre abordando, com objetividade, um tema<br />

palpitante de interesse da comunidade. Segue o modelo<br />

anterior, no Rádio Clube de Pernambuco, com a crônica<br />

diária Caf<strong>é</strong> da Manhã, de Mário Libânio.<br />

Líder de audiência das manhãs brasileiras no<br />

Nordeste, o programa de Aldemar Paiva, sempre com<br />

performance animada por pernambucanismo visceral e<br />

inspirada na valorização de Pernambuco aos ouvidos do<br />

Brasil e at<strong>é</strong> do Mundo, <strong>é</strong> atraente, inteligente, descontraído,<br />

interessante, saudável e cativante. Do princípio ao fim.<br />

Nas ondas do frevo, vai divertindo as elites com<br />

satirizações do cotidiano. Promovendo a cultura do povo<br />

marginalizado. Aproximando a veracidade da linguagem<br />

61


de situações reais. Estimulando a fantasia e o humor em<br />

busca do prazer do bem-viver diante de caprichos do destino<br />

ou de adversidades. Pondo frevo na vida de todo mundo.<br />

Em ritmo de frevo, “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu” enche<br />

o rádio como uma onda gigante do bem, uma onda tsunami<br />

de frevo, arrastando, diariamente, milhares de ouvintes para<br />

o mar da alegria de viver. Proporcionando, efetivamente,<br />

elevação da auto-estima de Pernambuco. Projetando e<br />

difundindo, por dinâmica própria, um Pernambuco<br />

en<strong>é</strong>rgico, vibrante, festeiro, altaneiro, combativo e vencedor.<br />

Propositalmente, muito frevo. Só frevo, que <strong>é</strong> a cara<br />

musical de Pernambuco, fortalecendo a identidade<br />

pernambucana junto ao Brasil. Com seu sucesso carimbado<br />

pela aprovação popular, “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu” vira,<br />

tamb<strong>é</strong>m, coqueluche de repercussão e prestígio em<br />

comentários e conversas nos circuitos sociais, nas rodas de<br />

intelectuais e nos salões aristocráticos do Recife. Conquista<br />

os corações de Pernambuco. E conquista o sêlo de grande<br />

sucesso!<br />

62


6<br />

ARTEXPRESSÃO CULTURAL<br />

(Escrito ao som da Orquestra do Maestro Nelson Ferreira com seu<br />

frevo Gostosão)<br />

“...Daqui do centro do Recife, das ondas altas e fortes do<br />

Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu, vejo o Nordeste inteiro. Do<br />

Maranhão à Bahia, muito bom dia. Bom dia para o<br />

Nordeste de longe e para o Nordeste de perto. Em síntese,<br />

como está no verso de João Cabral de Melo Neto:<br />

Nordeste de Pernambuco,<br />

Onde todas as manhãs são limpas,<br />

Pernambuco do Recife,<br />

De Piedade e Olinda”.<br />

Esteticamente, “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu” cumpre seu<br />

objetivo de promover a cultura nordestina e de potencializar o<br />

frevo como elemento central da cultura popular pernambucana.<br />

Como sua obra de arte diária, Aldemar Paiva prova, no rádio,<br />

que produção literária não se limita à escrita. Pode ser tamb<strong>é</strong>m<br />

falada, como demonstra, em seu programa radiofônico,<br />

apresentando modalidades de linguagem, elementos de obra<br />

literária, gênero literário, estilo de expressão, arte da<br />

versificação e elementos de ficção. São adornos literários que<br />

valorizam ainda mais o seu conteúdo cheio de momentos s<strong>é</strong>rios,<br />

descontraídos, emocionantes e cômicos, intercalados por muito<br />

frevo, o ritmo quente e fervente de Pernambuco.<br />

63


Em quase 25 anos no ar, “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu”<br />

constrói uma história que se confunde com a própria história<br />

da arte musical e do carnaval de Pernambuco. Em suas<br />

ondas surfam, com regularidade e brilhantismo, os mais<br />

ilustres maestros, musicistas, compositores e int<strong>é</strong>rpretes<br />

pernambucanos do frevo, muitos aplaudidos e festejados<br />

em todo o Brasil:<br />

...Nelson Ferreira, Lourenço Capiba, Levino Ferreira,<br />

Guerra Peixe, Antonio Maria, Jos<strong>é</strong> Zumba, Clóvis Pereira,<br />

Jos<strong>é</strong> Duda, Guedes Peixoto, Fernando Lobo, Edgar Ferreira,<br />

Luiz Ferreira, Jos<strong>é</strong> Menezes, Samuel Valente, Nestor de<br />

Holanda, Raul Morais, Reinaldo Oliveira, Edgar Morais,<br />

Ziul Matos, Miro de Oliveira, Luiz Caetano, Valdemar de<br />

Oliveira, Severino Araújo, Lourival Oliveira, João Santiago,<br />

Sebastião Rosendo, Fernando de Oliveira, Sebastião Lopes,<br />

Getúlio Cavalcanti, Manoel Gilberto, Ademir Formiga,<br />

Luciano Pimentel, F<strong>é</strong>lix Felinho, Gildo Moreno, Gildo<br />

Branco, Dimas Sedícias, Raul Valença, João Valença, David<br />

Vasconcelos, Édson Rodrigues, Agnaldo Batista, Diná de<br />

Oliveira, Alex Caldas, Baltazar de Carvalho, João<br />

Pernambuco...Todos pernambucanos, criadores e produtores<br />

de frevança, definitivamente, incorporados à história<br />

da Música Popular Brasileira como símbolos da<br />

artexpressão cultural de Pernambuco.<br />

Com habilidade, conhecimento e competência,<br />

Aldemar Paiva usa e abusa, sem equívocos e sem excessos,<br />

mas com sabedoria e persuasão, de todas as possibilidades<br />

da língua, como ferramenta básica e privilegiada de<br />

comunicação. Faz isso com muita naturalidade, origi-<br />

64


nalidade, espontaneidade e espirituosidade, características<br />

que marcam seu perfil de membro efetivo do excêntrico do<br />

44º Espada D’Água, regimento de boêmios intelectuais de<br />

Maceió, desde o s<strong>é</strong>culo XIX, com filial de agregados no<br />

Recife Antigo. E, com sua sensibilidade e emocionalidade,<br />

confere ao Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu encanto emotivo e<br />

elevado prazer de audição.<br />

“Mantenha-se firme conosco nas ondas do Pernambuco<br />

Você <strong>é</strong> <strong>meu</strong>, que tamb<strong>é</strong>m <strong>é</strong> seu. Aos que<br />

estão nas praças, em cada praça do Recife, muito<br />

bom dia.<br />

A Praça, a praça <strong>é</strong> do povo,<br />

como o c<strong>é</strong>u <strong>é</strong> do condor.<br />

É o que garante o genial Castro Alves, que criou<br />

essa beleza po<strong>é</strong>tica ao ver dissolvido um encontro<br />

republicano em plena Praça da República, aqui na<br />

capital pernambucana. Dele tamb<strong>é</strong>m <strong>é</strong> o formidável<br />

improviso que fez indignado como estudante da<br />

Faculdade de Direito do Recife num protesto contra<br />

a polícia na rua do Imperador:<br />

A lei sustenta o popular direito,<br />

nós sustentamos o direito em p<strong>é</strong>”.<br />

Em verdade, Aldemar Paiva representa, então, uma<br />

nova onda banhando o rádio de Pernambuco com as águas<br />

da renovação est<strong>é</strong>tica, assumindo em estúdio o culto da<br />

forma como uma concepção de vida. Segue o conceito do<br />

65


escritor russo Aleksei Tolstoi, o grande Tolstoi, de vários<br />

romances históricos, sobre o estilo. Mas absorve tamb<strong>é</strong>m a<br />

definição eloqüente do nosso luso-brasileiro eloqüentíssimo<br />

padre Antonio Vieira, de Os Sermões (1679), em tom quase<br />

po<strong>é</strong>tico:<br />

“Como hão de ser as palavras? Como as estrelas.<br />

As estrelas são muito distintas e muito claras...o estilo pode<br />

ser muito claro e muito alto; tão claro que o entendam os<br />

que não sabem, e tão alto que tenham muito o que entender<br />

nele os que sabem”.<br />

Com certeza, entre outras razões fundamentais, o<br />

sucesso de “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu”, durante 25 anos,<br />

tem relação direta com o estilo próprio do seu apresentador,<br />

Aldemar Paiva. Em meio a uma profusão de<br />

programas diferenciados do rádio de Pernambuco e do<br />

Brasil nesse período, “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu” impôese<br />

exatamente como show de variedades, inovador na<br />

forma e na riqueza de conteúdo e pela personalidade do<br />

seu âncora. Isso mesmo. Al<strong>é</strong>m de inovar no formato e na<br />

essência, Aldemar Paiva estabelece no rádio pernambucano<br />

um estilo pessoal que marca <strong>é</strong>poca.<br />

Sua capacidade de criar e fantasiar, envolvendo<br />

personagens fabulosos e pretendendo a atenção dos ouvintes<br />

parece inspirada na capacidade de criar e fantasiar de certos<br />

renomados romancistas. Vai nas pegadas do magistral<br />

Gabriel Garcia Márquez, no seu clássico hispano-americano<br />

Cem Anos de Solidão(1967). Quase faz os ouvintes<br />

imaginarem que o estúdio de “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu”<br />

66


está sempre povoado de criaturas singulares e caricaturais,<br />

como o cigano Mequíades, da fictícia Macondo.<br />

Ou ainda como os personagens dos folhetins do<br />

visconde Ponson du Terrail em aventuras e tramas<br />

rocambolescas. Aldemar Paiva transforma seu programa<br />

em território livre à criação e à imaginação onde brilham<br />

figuras de cordel e do romanceiro popular em perip<strong>é</strong>cias e<br />

façanhas inverossímeis. É onde ele tamb<strong>é</strong>m nada de braçada,<br />

talentosamente, tanto no cordel de poesia improvisada,<br />

cantada nas cantorias, quanto no cordel da poesia<br />

tradicional, de composição literária. Assim, Pernambuco<br />

Você <strong>é</strong> Meu exibe uma agradável fusão de realidade e ficção<br />

sob a trilha sonora do frevo. E haja causos:<br />

“Um casal fazia bodas de prata celebrando, simultaneamente,<br />

60 anos de idade. Em dado momento<br />

da festa, apareceu uma Fada dizendo: Como prêmio<br />

pelos 25 anos de muito amor, concedo um desejo a<br />

cada um de <strong>você</strong>s.Primeiro foi ela, toda animada e<br />

esperançosa: Quero fazer uma viagem ao redor do<br />

mundo com <strong>meu</strong> querido esposo. Então, a fada moveu<br />

a varinha e, zás, apareceram as passagens nas mãos<br />

da senhora. Em seguida, foi a vez do marido, falando<br />

maroto: Desculpe, querida, mas <strong>meu</strong> desejo <strong>é</strong> ter uma<br />

mulher 30 anos mais jovem do que eu. Então, a fada<br />

girou a varinha e, zás. A mulher permaneceu com<br />

60 anos enquanto o marido passou a ter 90!”<br />

Embora adotando no seu programa a modalidade da<br />

língua geral, da língua-padrão do Português usado no Brasil,<br />

67


Aldemar Paiva não dispensa o linguajar regional, quando<br />

mais insinuante, nem o linguajar popular, quando<br />

necessário, nem a linguagem culta, quando exigida. Em<br />

qualquer dessas modalidades, o apresentador de Pernambuco<br />

Você <strong>é</strong> Meu revela incrível capacidade de se<br />

expressar com inflexão de voz compatível para cada<br />

situação, sem artificialismo e sem exibicionismo.<br />

“...Vamos com Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu cantando<br />

as belezas de nossa terra. Ouçam e sintam a<br />

maravilha que <strong>é</strong> a poesia popular. Tem um cantador<br />

pernambucano, negro, famoso pelo seu jeito<br />

agressivo de repentista. É Sebastião Cândido dos<br />

Santos. Mas seu nome de guerra <strong>é</strong> Azulão. Ora, vejam<br />

só, mesmo cantando sozinho, sem desafiante, ele<br />

aproveita para mostrar sua bravura:<br />

Eu sou cabôco de guerra,<br />

C’uma viola na mão!<br />

Não quero guerra <strong>é</strong> de briga,<br />

Mas de língua eu sou o cão...<br />

Eu fico mesmo esturrando,<br />

Fico mostrando o brasão...<br />

Pra brigá de ferro frio<br />

Não sirvo, não presto não.<br />

Inda que tu fosse<br />

Um Guilherme da Alemanha,<br />

Um imperador da França,<br />

Cantando com Azulão<br />

Pode vir certo que apanha”.<br />

68


Quanto aos seus conceitos, id<strong>é</strong>ias, sentimentos, apelos<br />

e imagens, que expressam o conteúdo de qualidade do<br />

“Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu”, Aldemar Paiva procura<br />

exprimí-los nas formas mais atraentes para os ouvintes: em<br />

prosa e em verso. Em prosa, proporcionando narrativa com<br />

linguagem direta e objetiva; e em verso, com narrativa em<br />

linguagem po<strong>é</strong>tica, que toca mais a sensibilidade dos<br />

ouvintes. Como poeta, o apresentador ainda agrega ao<br />

programa a arte da versificação, recheando-o, freqüentemente,<br />

com alguns versos próprios ou de consagrados<br />

autores brasileiros. Em resumo: visão lúcida, apelo cultural,<br />

linguagem coloquial, prosa saborosa, muita sagacidade,<br />

bastante poesia, dose certa de humor e muito frevo.<br />

Al<strong>é</strong>m dessas inovações, “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu”<br />

trabalha, eficientemente, com o ficcionismo, gênero que<br />

agrada imensamente por estimular a fantasia dos ouvintes.<br />

Mais uma vez, Aldemar Paiva se apresenta com maestria<br />

dominando no ar esse gênero narrativo que envolve o<br />

romance, o conto, a novela, a fábula, a lenda, a história e as<br />

estórias. Estórias, então, são com ele mesmo. Estórias<br />

superdivertidas, com enredos despertadores de curiosidade<br />

e atenção, revelando o seu invejável talento criativo e<br />

inventivo. E haja causos:<br />

“Admirável artista que produz e interpreta coisas<br />

maravilhosas inspiradas no dia-a-dia do Nordeste,<br />

Jessier conta-nos um caso delicioso. Um sujeito<br />

estava no bar e o garçon chegava de dez em dez<br />

minutos, dava um sopapo no bêbado que dormia num<br />

mesa. Um rapaz ali perto interferiu: Meu irmão, por<br />

69


que <strong>você</strong> acorda esse coitado de instante e instante<br />

se depois ele vai dormir novamente? O garçon<br />

respondeu: Nada pessoal, <strong>meu</strong> chapa...É que toda<br />

vez eu que lhe acordo, ele paga a conta. E lasca, na<br />

base do repente:<br />

Tem gente metida a besta,<br />

que bebe socialmente,<br />

só de segunda a segunda,<br />

pelos chá beneficente.<br />

Enche o rabo de uísque,<br />

no meio dos magnatas,<br />

vomita meia e gravata,<br />

dana bofete em parente,<br />

leva um chifre caceteiro,<br />

mas só quem <strong>é</strong> cachaceiro<br />

<strong>é</strong> quem bafeja aguardente!”<br />

Com todos esses elementos de linguagem e de arte, Aldemar<br />

Paiva consolida seu “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu” como um show<br />

de estilo próprio, inimitável. Forma e conteúdo do programa trazem,<br />

marcantemente, a bagagem cultural, a experiência acumulada, os<br />

impulsos emotivos, a sensibilidade aguçada, a linha po<strong>é</strong>tica e o<br />

perfil psicológico do apresentador, refletindo sua alma e sua<br />

personalidade. É total o sincronismo entre “Pernambuco Você <strong>é</strong><br />

Meu” e Aldemar Paiva. Mais afeito ao gênero narrativo da prosa e<br />

ao gênero lírico e satírico do verso, o âncora desenvolve um estilo<br />

romântico, de forma primorosa e brilhante, causando uma revolução<br />

e se consagrando ícone do rádio nordestino e brasileiro.<br />

“... Al<strong>é</strong>m do ritmo gostoso do frevo, aqui <strong>você</strong> tem a nossa<br />

rica literatura popular. Como nos orienta o grande Sílvio<br />

Romero, nosso notável filósofo e sociólogo de vasta<br />

produção de contos populares do Brasil, se <strong>você</strong>s querem<br />

70


poesia, poesia de verdade, cheguem, ao povo, metam-se<br />

nos rincões, passem a noite num rancho, à beira do fogo,<br />

entre violeitos e repentistas, ouvindo trovas e desafios. É o<br />

que <strong>você</strong>s têm aqui no nosso Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu. É o<br />

cantador sertanejo com a poesia do povo.É o cego<br />

pernambucano Elias Ferreira num encontro com o cego<br />

cearense Sinfrônio Martins:<br />

Sinfrone, vai me contando<br />

Que <strong>é</strong> tu anda fazendo<br />

Se anda dando ou apanhando<br />

Se anda comprando ou vendendo<br />

Se anda bebendo ou jogando<br />

Se anda ganhando ou perdendo.<br />

Elias, eu lhe declaro<br />

E a todos que estão olhando:<br />

Nem bebendo nem jogando,<br />

Nem ganhando nem perdendo<br />

Ando mas <strong>é</strong> vadiando”<br />

71


Com o<br />

cantor<br />

popular<br />

Waldick<br />

Soriano,<br />

em programa<br />

de auditório<br />

72<br />

Aldemar Paiva<br />

com a<br />

Miss Brasil,<br />

Vera Fisher,<br />

em 1970<br />

Com o<br />

humorista<br />

Chico<br />

Anysio no<br />

lançamento<br />

do seu livro<br />

“Monólogos”


7<br />

AMOR, SABOR E HUMOR<br />

(Escrito ao som da Orquestra de Nelson Ferreira com o frevo Morena<br />

Cor de Canela, de Lourenço Capiba)<br />

Pode-ser dizer que um resumo da feliz vida conjugal<br />

de Aldemar Paiva com sua amada Angelita está em título<br />

de livro dela lançado em 2004, dentro das comemorações<br />

de suas Bodas de Ouro, 50 anos de casamento: “Amor, Sabor<br />

e Humor”. Uma seleção gastronômica ilustrada de deliciosas<br />

receitas doces e salgadas com poderes para satisfazer o mais<br />

exigente paladar. Caprichadas receitas de boa lembrança,<br />

socialmente aprovadas como culinária da melhor qualidade<br />

e psicologicamente adotadas como poderosos ingredientes<br />

de saudável envolvimento familiar, para uma vida alegre,<br />

harmoniosa, lúdica e compartilhada sob o tempero agradável<br />

e irresistível de indispensáveis aromas, sabores e humores.<br />

Seu encontro com Angelita, artista plástica de forte<br />

sensibilidade aplicada ao gênero impressionista, <strong>é</strong> assim<br />

lembrado:<br />

“Ela era estudante, produzindo peças de teatro e<br />

realizando espetáculos para a Federação Alagoana<br />

pelo Progresso Feminino. Fazia parte do elenco.<br />

Cantava, representava. Muito bonita (tipo manequim<br />

de cintura fina), chamava-a, amorosamente, de<br />

“Morena da Rua do Sol”. Depois, dei-lhe o apelido<br />

73


de Borlotinha, numa referência ao mimoso adereço<br />

usado nas cortinas das salas de antigamente. Esse<br />

apelido permanece at<strong>é</strong> hoje, entre familiares e amigos<br />

íntimos”.<br />

Com atenção, dedicação, carinho e “muita conversa<br />

ingênua para ela domir”, Aldemar Paiva sustenta com<br />

Angelita um namoro de dez longos anos, provocando uma<br />

desconfiança generalizada. Entre parentes e grupos interfamílias,<br />

muitos chegam a duvidar e a fazer apostas sobre o<br />

futuro do romance dos dois. Há quem não aposte um tostão.<br />

Sempre brincalhão, quando a desconfiança causa alguns<br />

fortuitos arrufos, ele sugere a Borlotinha:<br />

“Pode procurar seus direitos na Justiça. Você já tem<br />

estabilidade”.<br />

Finalmente, com Aldemar Paiva já fazendo sucesso<br />

em Pernambuco e alcançando razoável estabilidade<br />

financeira, acontece o sonhado casamento. Cerimônia<br />

religiosa, no dia 17 de junho de 1954, <strong>é</strong> celebrada pelo cônego<br />

Antonio Alves, capelão da Polícia Militar de Pernambuco e<br />

pároco da matriz de Nossa Senhora da Paz, no bairro de<br />

Afogados, centro do Recife. Em plena cerimônia, um dos<br />

padrinhos do casamento, publicitário e radialista Fernando<br />

Castelão aproxima-se e dá-lhe o seguinte ultimato:<br />

“Dema, ainda está em tempo de desistir!”<br />

Consumado o casório, comemoração dupla. Primeiro,<br />

na própria casa paroquial, anexa à igreja. Por sua<br />

74


popularidade crescente no rádio, há uma invasão de amigos<br />

e admiradores. Depois, na rua Nicarágua, bairro do<br />

Espinheiro, residência de Caio de Souza Leão e sua esposa<br />

Lenir, amigos e benfeitores do novo casal. Verdadeiro<br />

banquete, seguido de uma partida de futebol envolvendo o<br />

noivo, padrinhos, convidados e at<strong>é</strong> o padre Humberto<br />

Cavalcanti, vindo de Maceió, com o radialista Jair Amaral,<br />

carinhosamente recebidos como “dois penetras”.<br />

Surpreendentemente, após bela e agradável manhã<br />

de sol, uma chuva fina de fim de tarde acaba a festa ao ar<br />

livre na residência dos Souza Leão. E <strong>é</strong> sob chuva forte que<br />

o motorista conduz os nubentes para a residência em Olinda,<br />

na rua Luiz de Carvalho. Lá surge mais uma surpresa,<br />

segundo o próprio Aldemar Paiva:<br />

“Já instalados em nossa modesta primeira casa, por<br />

volta das 19 horas, estávamos ansiosos no jantar à<br />

luz de velas antes da chegada emocionante ao leito<br />

nupcial. Tudo nos trinques, conforme o figurino. Só<br />

que um pouco antes das 21 horas, algu<strong>é</strong>m bate à<br />

porta. Imaginem quem veio para a nossa lua de mel!<br />

Meu irmão Alberto (um ano mais novo do que eu).<br />

Como não conseguira acomodação em parte alguma,<br />

decidiu nos fazer companhia naquela noite. Logo<br />

naquela noite, a primeira nossa como rec<strong>é</strong>mcasados.<br />

Assim, nossa primeira noite de núpcias<br />

aconteceu com 24 horas de atraso”.<br />

Desse casamento, “sem programação m<strong>é</strong>dica, nem<br />

recursos folclóricos”, como faz questão de registrar<br />

75


Aldemar Paiva, nascem três filhos, curiosamente de quatro<br />

em quatro anos: Mônica (1955), m<strong>é</strong>dica; Carla (1959),<br />

arquiteta; e Dema (1963), engenheiro. Aleatoriamente, são<br />

pais bissextos com uma ciranda de netos: Flávia, Conrado,<br />

Maria Eduarda(Duda), Drancinho, Aldemar Buarque de<br />

Paiva Neto(Deminha), Artur e Adriano.<br />

Fazem parte da antologia familiar muitas estórias e<br />

histórias tendo Aldemar Paiva como protagonista e que<br />

todos contam e recontam com indisfarçável prazer. Mesmo<br />

Borlotinha, quando, aparentemente, <strong>é</strong> vítima:<br />

“Um dia, ele saiu à tarde para comprar alguma coisa<br />

no mercado e voltar logo. Encontrou um amigo, foi<br />

para o bar e acabou varando a madrugada. Já perto<br />

do amanhecer, entrou no quarto ainda escuro e eu<br />

toda coberta tive que ouvir isso: “Minha querida<br />

Borlotinha, desculpe-me o atraso. Desde ontem à<br />

noite estou vindo para casa com uma corda de<br />

guaiamuns que comprei para <strong>você</strong>. Mas, no caminho,<br />

eles se desgarraram e fui obrigado a vir tangendo<br />

os bichos at<strong>é</strong> em casa. Infelizmente, não consegui<br />

chegar com nenhum. Escaparam todos. Me perdõe!”.<br />

E eu, debaixo do cobertor, morrendo de raiva, mas<br />

me acabando de rir”.<br />

Filhos criados em ambiente de permanente alegria e<br />

confraternização, marcas registradas de Aldemar Paiva e<br />

Angelita, sempre de casa aberta para os numerosos amigos.<br />

Freqüentemente, com presença certa de artistas famosos.<br />

Como em janeiro de 1963:<br />

76


“No cachimbo do <strong>meu</strong> filho Dema, Jos<strong>é</strong> Luiza<br />

Calazans, o famoso Jararaca, da Radio Nacional,<br />

do Rio de Janeiro, alagoano de Pilar, passou o dia<br />

em nossa casa em Casa Caiada, Olinda, consumindo<br />

uma caixa de vinho presenteada por Dr. Tom<strong>é</strong> Dias<br />

Sobrinho, outro grande e querido amigo. Guardo<br />

uma carta de Jararaca, de próprio punho, falando<br />

da amizade e das preferências que nos aproximam.<br />

Nela, tem um apelo comovente para que eu<br />

conseguisse trazê-lo de volta para perto de sua terra<br />

(Maceió ou Recife). Queria morrer junto aos seus<br />

conterrâneos, fazendo músicas, humor e participando<br />

das rinhas de briga de galo, seu esporte<br />

favorito. Dois meses depois dessa carta, tão íntima<br />

e tão sentimental, faleceu no Rio, vítima de<br />

atropelamento. Deixou comigo muita coisa do seu<br />

acervo, de suas produções humorísticas e dos seus<br />

sonhos. Passei tudo para seu filho, funcionário da<br />

IBM no Rio”.<br />

Felizes e realizados com o sucesso profissional dos<br />

filhos, Aldemar Paiva e Angelita mantêm a família no<br />

mesmo clima de harmonia e de alegria que inspira os dois<br />

desde o namoro ainda quando estudantes em Maceió. Em<br />

resumo, com muito amor, sabor e humor. Agora, vivendo,<br />

naturalmente, o conforto e o desconforto da Terceira Idade,<br />

seguem a jornada do tempo com sabedoria e dignidade<br />

cultivando o ensinamento, que apreciam muito, do general<br />

norte-americano Douglas MacArthur, derrotado nas<br />

Filipinas (1942), vencedor contra os japoneses (1945) e<br />

comandante das forças da ONU na Cor<strong>é</strong>ia (1950):<br />

77


“Ningu<strong>é</strong>m <strong>é</strong> velho simplesmente porque viveu mais<br />

alguns anos. A pessoa só envelhece quando abandona seus<br />

ideais. Somos tão jovens quanto nossa autoconfiança, tão<br />

idosos quanto nosso medo e tão velhos quando nosso<br />

desespero. Enquanto nosso coração receber mensagens de<br />

beleza, coragem, alegria e esperança, nós permaneceremos<br />

jovens!”.<br />

78


8<br />

ADEUS ÀS ILUSÕES PERDIDAS<br />

(Escrito ao som da Orquestra de Jos<strong>é</strong> Menezes com o frevo Ultimo<br />

Dia, de Levino Ferreira)<br />

“...Nas ondas do Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu vamos<br />

cantando as belezas de nossa terra. Vivendo e<br />

revivendo os cantares dos peotas pernambucanos.<br />

Como em todas as manhãs e todas as tardes,<br />

multidões atravessam o centro do Recife. Fervilham<br />

na Avenida Guararapes. Alegrias, sonhos e frustrações,<br />

na visão do poetíssimo Carlos Pena Filho:<br />

Na Avenida Guararapes,<br />

O Recife vai marchando.<br />

O Bairro de Santo Antonio,<br />

Tanto se foi transformando<br />

Que agora ás cinco da tarde<br />

Mais se assemelha a um festim.<br />

Nas mesas do Bar Savoy,<br />

O refrão tem sido assim:<br />

São trinta copos de chope,<br />

São trinta homens sentados.<br />

Trezentos desejos presos,<br />

Trinta mil sonhos frustrados”<br />

79


Diretor artístico do Rádio Clube de Pernambuco,<br />

desde 1951, e produtor e apresentador de “Pernambuco<br />

Você <strong>é</strong> Meu”, desde 1952, Aldemar Paiva tem uma visão<br />

larga e aguda para os horizontes da comunicação. Como<br />

está em PRA-8 O Rádio Brasil, deste autor, seu programa<br />

abre uma fantástica janela para o mundo, comentando<br />

atualidades de interesse público, desperta atenção para<br />

eventos culturais, pontua o dia na história, relata causos,<br />

interpreta relíquias da literatura de cordel, ressalta a riqueza<br />

e a beleza da paisagem humana no cenário cosmopolitano<br />

do Recife, promove a culinária regional e vende, com<br />

eficiência, os irresistíveis sabores tropicais de Pernambuco.<br />

Diretor artístico, Aldemar Paiva incrementa o rádio<br />

de Pernambuco em todos os setores, inclusive nos esportes.<br />

Pelas mãos dele, o vibrante e jovem locutor baiano Ivan<br />

Lima ingressa no cast da emissora pioneira do Brasil. Surge,<br />

então, o eletrizante “escrete de ouro do rádio”. Com ele,<br />

Ivan Lima se torna “o mais premiado narrador esportivo<br />

do Norte e Nordeste” e ganha fama nacional com uma<br />

equipe de profissionais craques, entre os quais, Jos<strong>é</strong> Santana,<br />

Barbosa Filho, Rubens Souza, Audir Dúdiman, Edvaldo<br />

Moraes, Ivo Sútter, Haroldo Rômulo, Robson Sampaio e<br />

outros nomes que entram para a galeria de astros da crônica<br />

esportiva radiofônica do Nordeste.<br />

Mas <strong>é</strong> Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu o carro-chefe das<br />

grandes atrações do Rádio Clube de Pernambuco. Com<br />

música de Nelson Ferreira e letra do próprio Aldemar Paiva,<br />

o título do programa <strong>é</strong> um frevo em homenagem à terra<br />

pernambucana:<br />

80


“Terra boa, <strong>meu</strong> Pernambuco,<br />

Que faz<br />

Frevo bom e maracatu!<br />

Tem mais:<br />

Banho em Beberibe...<br />

Cachaça gostosa...<br />

Mangaba cheirosa...<br />

Ai! Ai! Ai!<br />

Tudo isso minha terra tem!<br />

Tem rede macia<br />

Pra gente sonhar,<br />

Buchada...peixada...<br />

Bate-bate pra enganchar!<br />

Tem morena formosa<br />

Que seu coração não me deu...<br />

Mas por isso não choro, porque<br />

Pernambuco, Você <strong>é</strong> Meu!”.<br />

Campeão de audiência no Brasil, “Pernambuco Você<br />

<strong>é</strong> Meu” conquista muitos corações no exterior, at<strong>é</strong> nos<br />

lugares mais longíquos da Europa e da África, alcançados<br />

p<strong>é</strong>las ondas curtas do Rádio Clube de Pernambuco. Dessa<br />

<strong>é</strong>poca, muitos casos interessantes são lembrados por<br />

Aldemar Paiva:<br />

“Um ouvinte da Guin<strong>é</strong> Bissau, África Ocidental,<br />

escreveu ao programa pedindo uma mensagem<br />

especial para o dia do seu aniversário fazendo<br />

referência a um a namorada brasileira que ele tinha,<br />

por correspondência, no bairro de Água Fria, zona<br />

81


norte do Recife. No dia marcado, levei a moça ao<br />

programa. Foi uma grande surpresa para ele ao<br />

ouvir a voz dela lá na África. Daí nasceu um<br />

encantamento. Ele veio para o Recife, casou-se com<br />

a moça e fui padrinho dele no casamento. Casado<br />

graças às ondas do Pernambuco Você <strong>é</strong> Me, foi<br />

trabalhar na Viana Leal, grande loja de departamentos,<br />

esp<strong>é</strong>cie de primeiro shopping do Recife”.<br />

Com charme, graça, prosa, simpatia e empatia,<br />

Aldemar Paiva enche as ondas da PRA-8 de pernambucanidade<br />

explícita tal qual contida em Gilberto Freyre,<br />

João Cabral de Melo Neto, Manoel Bandeira, Mauro Mota<br />

e Marcos Vilaça. Após 16 anos de sucesso no Rádio Clube,<br />

em 1968, Aldemar Paiva, com sua alma po<strong>é</strong>tica e seu<br />

entusiasmo envolvente, transfere-se para o Rádio Jornal<br />

do Comm<strong>é</strong>rcio, atendendo convite do então superintendente<br />

Paulo Pessoa de Queiroz, filho de F. Pessoa de Queiroz,<br />

fundador da Empresa Jornal do Comm<strong>é</strong>rcio.<br />

São mais quase dez anos de sucesso. De todo o Brasil<br />

e at<strong>é</strong> do exterior, Aldemar Paiva recebe cartas e comunicados<br />

de ouvintes assíduos do seu “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu”.<br />

Um desses ouvintes torna-se, anos depois, seu grande<br />

amigo:<br />

“Era um marinheiro da Marinha Mercante do Brasil.<br />

Por onde andava nesse mundo afora, pela Europa,<br />

pela África, cruzando oceanos, Pedro Chaves ouvia,<br />

diaria-mente, o Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu. Quando<br />

deixou a Marinha, resolveu morar no litoral de<br />

82


Pernambuco ou Alagoas. Acabou parando em<br />

Maragoji, onde virou artesão e montou um restaurante.<br />

Um dia, quando soube que eu ia passar<br />

em Maragoji, fez uma festa pela alegria de poder<br />

me conhecer pessoalmente. Com emoção, relembrou<br />

muitos momentos de Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu, que<br />

aumentava suas saudades do Brasil em muitas partes<br />

do mundo. Foi comovente”.<br />

Mesmo com tanto sucesso no Brasil e no exterior,<br />

em 1977, por ironia do destino, o novo superintendente do<br />

Rádio Jornal do Comm<strong>é</strong>rcio, Ivan Lima, após 23 anos do<br />

seu ingresso na radiofonia do Recife, abençoado pelo então<br />

diretor artístico do Rádio Clube de Pernambuco, Aldemar<br />

Paiva, impõe modificações contratuais em vigor desde o<br />

tempo do superintendente Paulo Pessoa de Queiroz. Deixa<br />

o produtor e apresentador de “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu”<br />

em “situação funcionalmente desconfortável e financeiramente<br />

inviável”.<br />

Em conseqüência, o programa de marcante alegria<br />

das manhãs brasileiras, cativante em tudo por sua<br />

originalidade, <strong>é</strong> apresentado pela última vez em 28 de<br />

outubro de 1977, sem comemorar seus 25 anos em festa já<br />

programada, caprichosamente, para 20 de dezembro do<br />

mesmo ano, com a participação de famosos artistas<br />

nacionais, amigos e admiradores de Aldemar Paiva. Para<br />

milhares de ouvintes do “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu” em<br />

todo o Brasil, uma frustração desde então nunca superada.<br />

Para seu criador, produtor e âncora, um melancólico adeus<br />

às ilusões perdidas no tempo.<br />

83


Em 1977, quando “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu” sai do<br />

ar, o Brasil tem 110 milhões de habitantes, 64% nas cidades<br />

e 36% nos campos. Nordeste tem 30 milhões, Pernambuco<br />

6 milhões e o Recife 1.2 milhão de habitantes. Já existem<br />

no País 65 emissoras de televisão que chegam à população<br />

por meio de 14 milhões de televisores, em cores e preto-ebranco.<br />

Quanto ao rádio, já são 1.050 emissoras e<br />

aproximadamente 45 milhões de aparelhos receptores.<br />

Somam-se 40 emissoras FM. Em plano nacional, o rádio<br />

det<strong>é</strong>m agora apenas 18% do bolo publicitário, enquanto a<br />

televisão aumenta sua fatia para 40%.<br />

No Nordeste e, especialmente, em Pernambuco, já<br />

com quatro estações de TV(Rádio Clube, Jornal do<br />

Comm<strong>é</strong>rcio, Universitária e Globo), a televisão <strong>é</strong> a nova<br />

força de comunicação. Perdendo espaço para a televisão, o<br />

rádio da <strong>é</strong>poca de ouro, de grandes produções, de<br />

magníficos elencos de rádio-teatro, de excelentes orquestras<br />

e dos programas de auditório, está sendo substituído pelo<br />

rádio apenas de “música, esporte e notícia”. É nesse<br />

ambiente que Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu entra para a<br />

antologia dos grandes momentos da história do rádio no<br />

Brasil.<br />

84


9<br />

ETERNO OBELISCO AO FREVO<br />

(Escrito ao som da Orquestra de Frevo de Nelson Ferreira com o<br />

frevo Saudade, de Aldemar Paiva)<br />

Durante três d<strong>é</strong>cadas do s<strong>é</strong>culo XX, exatamente 50,<br />

60 e 70, anos de grande desenvolvimento da radiodifusão<br />

em Pernambuco e, por conseqüência, de intensa promoção<br />

das atividades culturais e artísticas, o frevo vive sua <strong>é</strong>poca<br />

de ouro. Liderada especialmente pelas ricas e intensas<br />

criações e produções de Nelson Ferreira e Lourenço Capiba.<br />

É uma <strong>é</strong>poca de proliferação de grandes orquestras. E, para<br />

atender crescente do mercado consumidor, o Recife ganha,<br />

em 1953, a Fábrica de Discos Rozemblit, a primeira do<br />

Nordeste.<br />

Empolgada com a efervescência musical de<br />

Pernambuco, a Rozemblit chega a lançar uma s<strong>é</strong>rie de discos<br />

denominada “O Melhor do Frevo no Rádio”, em parceria<br />

com mais de 120 emissoras do Norte e Nordeste do Brasil.<br />

Com este sêlo industrial e maior difusão radiofônica, o frevo,<br />

mais valorizado e eficientemente promovido, conquista mais<br />

espaço no cenário nacional. Dessa forma, nessas três<br />

d<strong>é</strong>cadas, o rádio cumpre um papel fundamental na<br />

popularização do frevo como gênero musical genuinamente<br />

pernambucano.<br />

85


Al<strong>é</strong>m de criador, produtor e apresentador de<br />

programas radiofônicos de sucesso, destacando-se Dona<br />

Pinóia e seus Brotinhos, Festa no Varandão e Pernambuco<br />

Você <strong>é</strong> Meu, Aldemar Paiva, membro da Academia de Artes<br />

e Letras de Pernambuco e da Academia Maceioense de<br />

Letras, tem uma significativa produção literária: O Causo<br />

Eu Conto, livro de contos humorísticos; Monólogos e outros<br />

poemas, livro de poesias; e três trabalhos no gênero do<br />

cordelismo: A chegada de Nelson Ferreira no c<strong>é</strong>u; O<br />

encontro de Capiba com Nelson Ferreira; e Gilberto Freyre,<br />

Redescobridor do Brasil. Mas, sem dúvida, sua contribuição<br />

intelectual e artística de maior expressão e visibilidade está<br />

no trabalho desenvolvido na promoção, valorização e<br />

popularização do frevo. Dele são mais de 70 músicas<br />

gravadas, todas sucessos do carnaval.<br />

Carro-chefe dessa popularização, o programa<br />

“Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu” atravessa anos e mais anos<br />

fazendo sucesso, campeão nacional de audiência, como<br />

autêntica estação frevólica, transmitindo valores, símbolos,<br />

id<strong>é</strong>ias, ideais, formas, costumes, tradições, lutas e conquistas<br />

da gente pernambucana para o Brasil e, espantosamente,<br />

alcançando o mundo. É um verdadeiro supershow de bomhumor<br />

e de variedades expressando a riqueza do folclore e<br />

da cultura popular de Pernambuco e do Nordeste.<br />

Grande sucesso do programa gera uma simbiose.<br />

Aldemar Paiva alimenta o público e o público alimenta<br />

Aldemar Paiva com fragmentos de textos, poemas, canções<br />

e divagações, formando e estimulando um imaginário<br />

espetacular. Exercendo um fascínio irrefutável em todo o<br />

86


Nordeste e em parte do imenso Brasil. Definitiva e<br />

obrigatoriamente, “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu” inscreve-se<br />

como uma das produções de maior sucesso da história do<br />

rádio brasileiro. Qual a receita para tanto sucesso? É simples,<br />

direta, objetiva e convincente a resposta do seu criador:<br />

“Em todos os tempos e em todas as classes, as<br />

pessoas sempre têm necessidade de sentir alegria,<br />

energia, fantasia e magia. Al<strong>é</strong>m das atrações e<br />

variedades em informação, entretenimento e cultura<br />

popular, sem abdicar do erudito quando necessário,<br />

recomendável ou conveniente, o formato musical de<br />

Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu garante o espetáculo da<br />

vida cheio de vida pela transmissão de sucessivos<br />

frevos de sucesso, dos carnavais saudosos e dos mais<br />

atuais, tornando o programa empolgante e, ao<br />

mesmo tempo, tipicamente regional, festivamente<br />

brasileiro e sentimentalmente universal”.<br />

Com esse perfil de sucesso e essas características<br />

exclusivas, “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu” e o multimídia<br />

Aldemar Paiva agora fazem parte, definitivamente, da<br />

história social do frevo e da história do rádio no Brasil. O<br />

fabuloso e inesquecível programa, por seu potencial<br />

inovador e renovador em originalidade como show de<br />

varidades, enriquecendo e fortalecendo o regionalismo da<br />

cultura brasileira do Nordeste, proporcionando vitalidade<br />

às tradições que permanecem na história e, sobretudo,<br />

promovendo o frevo, esse ritmo musical que <strong>é</strong> a cara de<br />

Pernambuco.<br />

87


E Aldemar Paiva, na condição de extraordinário oneman<br />

show, com est<strong>é</strong>tica e estilo próprios na exteriorização<br />

emotiva e intelectiva de seus sentimentos e id<strong>é</strong>ias,<br />

expressando múltiplos elementos de literatura, história,<br />

filosofia, sociologia, psicologia, humorismo e humanismo,<br />

sob o imp<strong>é</strong>rio do charme, da elegância, da simpatia, da graça<br />

e do superior espírito da tradicional pernambucanidade. Que<br />

<strong>é</strong> um sentimento mais psicossocial distintivo de fidalguia e<br />

nobreza, que agrega imenso valor ao admirável e inigualável<br />

sentimento pernambucano, de caráter mais geopolítico e<br />

mais ardentemente telúrico.<br />

Como a fama, as palavras no rádio voam e são<br />

facilmente esquecidas, especialmente num País de memória<br />

curta como o Brasil. Mesmo sendo de um carismático<br />

comunicador, grande prosador, admirável poeta, excelente<br />

humorista e extraordinário ser humano, como Aldemar<br />

Paiva. Mas seu espetacular desempenho como animador<br />

cultural e versátil âncora do “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu” <strong>é</strong><br />

tão expressivo que, mesmo quase 30 anos depois do<br />

programa ter saído do ar, em 1977, seu sucesso permanece<br />

tão presente. At<strong>é</strong> hoje, em 2005, Aldemar Paiva <strong>é</strong> saudado<br />

e festejado nas ruas e nos salões do Recife pelo seu vitorioso<br />

programa radiofônico. Daí este ensaio, emblematicamente,<br />

não relata a trajetória dele no passado mas no presente,<br />

presentíssimo. Ele <strong>é</strong> uma das glórias do rádio de<br />

Pernambuco e do Brasil.<br />

Cidadão de Pernambuco e Cidadão do Recife, por<br />

condecoração, Cidadão do Frevo e Cidadão de Boa Viagem,<br />

por aclamação, Memória Viva da Cidade do Recife, por<br />

88


certificação, carinhosamente venerado pelos recifenses<br />

como Barão de Setúbal, agora em tempo de saudades dos<br />

tempos maravilhosos que, infelizmente, não voltam mais,<br />

Aldemar Paiva pode ter a certeza, como o poeta latino<br />

Quintus Horatius Flaccus, ou apenas Horácio, nas belas<br />

Odes, de que seu memorável “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu” <strong>é</strong><br />

um monumento mais duradouro que o bronze. Com a<br />

excelsitude de um grandioso Obelisco ao Frevo no coração<br />

da Veneza Americana. Com aura popular de eternidade. Que<br />

rima com saudade. Saudade de Frevo! Saudade de<br />

Pernambuco!<br />

E enquanto o menino de 80 anos dormia, de repente,<br />

o aparelho começou a transmitir um programa de rádio<br />

do Recife. E, no dia seguinte, para espanto de seu hum...e<br />

de sua hum...(os amigos mais ousados aventuraram trocar<br />

um risinho), o grande Aldemar acordou repetindo, palavra<br />

por palavra, versos de dois saudosos mestres do frevo (dois<br />

raros e insuperáveis que fazem sucesso at<strong>é</strong> os dias de hoje),<br />

Nelson Ferreira e Capiba Lourenço, simplesmente geniais,<br />

fenomenais e imortais.<br />

89


FREVO DE SAUDADE<br />

Letra de Aldemar Paiva<br />

Música de Nelson Ferreira<br />

Quem tem saudade<br />

Não está sozinho,<br />

Tem o carinho<br />

Da recordação...<br />

Por isso quando estou<br />

Mais isolado<br />

Estou bem acompanhado<br />

Com <strong>você</strong> no coração...<br />

Um sorriso,<br />

Uma frase, uma flor,<br />

Tudo <strong>é</strong> <strong>você</strong> na imaginação...<br />

Serpentina ou confete...<br />

Carnaval de amor...<br />

Tudo <strong>é</strong> <strong>você</strong> no coração...<br />

Você existe<br />

Como anjo de bondade<br />

E me acompanha<br />

Neste FREVO DE SAUDADE<br />

90


Posfácio<br />

Ás primeiras horas do Dia de São Pedro, em 1951, nós<br />

chegamos ao Recife como sobreviventes de um temporal. Fomos<br />

salvos – <strong>meu</strong> Austin A-4), eu e <strong>meu</strong> amigo Walter souza – da chuva<br />

torrencial e dos atoleiros ali pelas imediações de Ipojuca. Deus<br />

deve ter mandado aquele caminhoneiro que transportava gado e<br />

rodava de volta pra casa, em nosso socorro. Generoso, o motorista<br />

concordou em acomodar o Walter e eu na bol<strong>é</strong>ia, enquanto o que<br />

sobrou do nosso carro, desmantelado pela tempestade, viajou na<br />

carroceria do caminhão.<br />

No dia seguinte, que amanheceu com “c<strong>é</strong>u de Brigadeiro”,<br />

após as providências de socorro mecânico e alojamento, eu me<br />

dirigi á PRA-8, de acordo com a agenda que devia cumprir no<br />

Recife. Fui recebido pelo diretor do Rádio Clube de Pernambuco,<br />

Arnaldo Moreira Pinto, que confirmou a proposta que me fora<br />

feita atrav<strong>é</strong>s do publicitário Jos<strong>é</strong> Renato, para substituir Chico<br />

Anysio no Departamento de Produção. Apresentou-me ao maestro<br />

Nelson Ferreira – Diretor Artístico – que me conduziu à Musicoteca<br />

e, de forma simpática e inesperada, me passou a primeira tarefa:<br />

“Caríssimo Paiva, tome conta desta sala e desta máquina. Faremos<br />

juntos um bonito progama para sua estr<strong>é</strong>ia. Escolha o repertório e<br />

os int<strong>é</strong>rpretes. O texto <strong>é</strong> seu e da parte musical eu terei o prazer de<br />

cuidar pessoalmente”. Arrisquei uma pergunta: Para quando?<br />

Respondeu em meio a uma baforada do seu havana: “Para amanhã<br />

à noite em horário nobre”.<br />

Mod<strong>é</strong>stia à parte, o programa batizado por mim de “Jardim<br />

das Flores Raras” agradou em cheio. Do princípio ao fim procurei<br />

me mostrar com relativo brilho em diversas formas de minha<br />

91


capacidade artística. Eu confesso que me senti nas nuvens diante<br />

da partitura especial e da Grande Orquestra da PRA-8 regida pelo<br />

genial maestro, projetando um “script” intencionalmente produzido,<br />

dirigido e apresentado por mim. Fui me integrando rapidamente<br />

ao espírito do rádio mais evoluído em que me encontrava.<br />

Prestigiado por Nelson Ferreira, recebia um tratamento especial<br />

de confiança e amizade por parte dos colegas de trabalho e dos<br />

próprios diretores da emissora.<br />

O Rádio Clube possuiu uma equipe de redatores de alto<br />

nível das mais conceituadas emsisoras do Brasil, a começar por<br />

um dos seus diretores, o jornalista e escritor Mário Libânio,<br />

Waldemar de Oliveira, Telga de Araújop, Nilo Pereira, Abílio de<br />

Castro, Luiz Maranhão, Moura Júnior, <strong>Jota</strong> Austreg<strong>é</strong>silo, Clóvis<br />

Neves, Fernando Silveira e tantos outros, amadores e profissionais<br />

que compunham o naipe dos rbilhantes e dedicados intelectuais a<br />

serviço da PRA-8.<br />

O interessante <strong>é</strong> que, para <strong>meu</strong> espanto, de repente, eu me<br />

dei de conta de que estava lá e tamb<strong>é</strong>m era um deles. Não havia<br />

nenhum sinal de competição, mas, de qualquer maneira, todos<br />

elaboravam seus “scripts” com muito amor para uma programação<br />

ecl<strong>é</strong>tica de alto nível em torno de eventos históricos, políticos,<br />

sociais e folclóricos, envolvendo personalidades vivas ou<br />

desaparecidas, música popular, erudita e poesia.<br />

E se eu conseguisse chegar ao coração dos ouvintes do Rádio<br />

Clube já identificados em todo o Brasil, atrav<strong>é</strong>s de uma nova e<br />

revolucionária forma de comunicação? Tecnicamente, a PRA-8 já<br />

possuiu o slogan “A Emissora das Duas Ondas”. E essas ondas media<br />

e curta passaram a transmitir, diariamente, um programa especial de<br />

frevo, gênero musical contagiante e genuinamente pernambucano.<br />

Minha realização implicaria na apresentação de um<br />

programa de estúdio sob o comando de um animador cultural (que<br />

92


seria eu mesmo), intercalando notícias do dia bem humoradas,<br />

serviço de utilidade pública e eventos sociais, com os frevos de<br />

rua, frevos-canção e frevos de bloco. Imbuído da importância<br />

cultural desse programa, preservando, documentando e promovendo<br />

a tradicional expressão da lma popular de Pernambuco,<br />

atrav<strong>é</strong>s do rádio, reuni todos esses ingredientes num esboço de<br />

projeto e fui falar diretamente com o senador João de Medeiros<br />

Calmon.<br />

Dr. Calmon –Superintendente das Emissoras Associadas do<br />

Nordeste – sempre me chamava carinhosamente de Professor. E<br />

foi assim que fui tratado por ele depois de inteirar de todos os<br />

detalhes do <strong>meu</strong> projeto: “Professor Paiva, gostei da id<strong>é</strong>ia, aprovo<br />

o projeto e com <strong>você</strong> aceito o desafio. Falta apenas um detalhe que<br />

eu considero da maior importância para o sucesso que <strong>você</strong> espera.<br />

Qual o título do programa?”Em cima da pergunta do senador eu<br />

deflagrei <strong>meu</strong> tiro de misericórdia: “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu”.<br />

93<br />

Aldemar Paiva<br />

Recife, junho de 2005


Cronologia<br />

20/07/1925 - Nasce em Maceió-Alagoas (Rua do Macena)<br />

16/09/1948 - Inaugura a Rádio Difusora de Alagoas-ZYO-4<br />

19/06/1951 - Ingressa no Rádio Clube de Pernambuco-PRA-8<br />

20/12/1952 - Começa seu programa “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu”<br />

17/06/1954 - Casa-se com Angelita, na capital pernambucana<br />

05/04/1968 - Transfere-se para o Rádio Jornal do Comm<strong>é</strong>rcio<br />

1970 - Homenageado com título de Cidadão do Recife<br />

03/02/1971 - Recebe Medalha do M<strong>é</strong>rito Cidade do Recife<br />

28/10/1977 - Sai do ar o programa “Pernambuco Você <strong>é</strong> Meu”<br />

13/05/1978 - Recebe Medalha do M<strong>é</strong>rito Fundação Joaquim<br />

Nabuco<br />

10-12-1978- Homenageado com título de Cidadão de Pernambuco<br />

20/07/2005 - Comemora 80 anos, 54 como Cidadão de Pernambuco<br />

94


Bibliografia<br />

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18. TINHORÃO, Jos<strong>é</strong> Ramos. Pequena História da Música<br />

Popular. Rio, Vozes, 1978<br />

95

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