JORGE MEDAUAR o homem que sabia <strong>de</strong>mais 202 A vida não po<strong>de</strong> ser uma ponte sem rio <strong>Jorge</strong> <strong>Medauar</strong> Jr. emanuel dimas <strong>de</strong> melo pimenta Em Abril <strong>de</strong> 2004, mês e ano em que meu pai faria oitenta e seis anos, estive em Água Preta, na Bahia, com minha mãe, para aten<strong>de</strong>r um <strong>de</strong> seus últimos <strong>de</strong>sejos: jogar, da ponte que hoje leva o seu nome, as suas cinzas no rio em que passara a sua infância, entre mergulhos e olhares escondi<strong>do</strong>s sobre as cochas das lava<strong>de</strong>iras que batiam roupa, <strong>de</strong> cócoras nas margens. Na terra em que brincara <strong>de</strong> bo<strong>do</strong>que, arco e flecha, picula pelas ruas estreitas, batidas <strong>de</strong> terra, on<strong>de</strong> trafegavam jegues e burros com seus caçuás <strong>de</strong> aipim, laranja, banana da terra e cacau. Antes <strong>de</strong> aten<strong>de</strong>r àquele pedi<strong>do</strong>, alguns intelectuais, familiares e amigos, estiveram reuni<strong>do</strong>s para falar um pouco sobre a sua vida e a sua obra. Uma <strong>de</strong>ssas pessoas disse uma coisa bastante interessante: que Água Preta só teve história até quan<strong>do</strong> se chamava Água Preta. Depois que mudaram o nome para Uruçuca, ninguém nunca mais ouviu falar daquela cida<strong>de</strong> perto <strong>de</strong> Ilhéus. E isso se <strong>de</strong>via ao trabalho literário <strong>de</strong> meu pai e, portanto, a cida<strong>de</strong> tinha, para com ele e com a família, uma enorme dívida, que seria paga através <strong>de</strong> acções que pu<strong>de</strong>ssem perenizar o seu nome e a sua obra. Já estamos trabalhan<strong>do</strong> nisso fortemente, com a inauguração da Biblioteca <strong>Jorge</strong> <strong>Medauar</strong>, no colégio em que ele estu<strong>do</strong>u, com o Memorial <strong>de</strong> <strong>Jorge</strong> <strong>Medauar</strong>, com o lançamento <strong>do</strong> Concurso Literário <strong>Jorge</strong> <strong>Medauar</strong>, entre outras homenagens. Ao ser convida<strong>do</strong> pelo velho e queri<strong>do</strong> amigo <strong>Emanuel</strong> Dimas <strong>de</strong> Melo <strong>Pimenta</strong> para escrever uma biografia <strong>do</strong> meu pai, confesso que senti uma punhalada por <strong>de</strong>ntro, pois estava diante <strong>do</strong> maior <strong>de</strong>safio <strong>de</strong> toda a minha vida. Afinal, a não ser pelo facto <strong>de</strong> ser seu filho, quem sou eu para escrever ou falar sobre
JORGE MEDAUAR o homem que sabia <strong>de</strong>mais 203 emanuel dimas <strong>de</strong> melo pimenta alguém cuja a maior <strong>de</strong> todas as obras, foi ter consegui<strong>do</strong> escrever o nome <strong>de</strong> sua cida<strong>de</strong> no mapa literário e geográfico <strong>do</strong> Brasil e <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>? Aliás, já houve quem dissesse que, “ao cantar a sua al<strong>de</strong>ia, estarás cantan<strong>do</strong> o mun<strong>do</strong>”. Foi isso, em resumo, o que meu pai fez, como escritor. Cantou a sua al<strong>de</strong>ia. Projectou-a para o mun<strong>do</strong>. Mas por trás <strong>do</strong> escritor <strong>de</strong> “Chuva sobre a tua Semente”, “Morada <strong>de</strong> Paz”, “À estrela e aos bichos”, “Histórias <strong>de</strong> Menino”, “O incêndio”, “Visgo da Terra”, “Água Preta”, “Bom como diabo” – só para citar alguns <strong>de</strong> seus mais <strong>de</strong> vinte livros <strong>de</strong> poesia e contos e sem falar na presença em <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> antologias publicadas no Brasil e no exterior – tivemos, <strong>Emanuel</strong>, eu e tantos outros, a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conhecer e conviver com um homem que, para além da dignida<strong>de</strong>, da bonda<strong>de</strong>, <strong>do</strong> carácter, da educação, tinha um bom humor invejável. Contava ane<strong>do</strong>tas, percebia coisas extraordinárias, ria e fazia rir. Só para se ter uma i<strong>de</strong>ia, não conheço nenhuma fotografia em que meu pai não apareça com os olhos puxa<strong>do</strong>s e a boca rasgada, como se <strong>de</strong>senhada com a ponta <strong>de</strong> um punhal, quero dizer, com a cara aberta, a expressão alegre, como foi o seu coração, a sua alma, a sua casa. E foi isso que o aproximou <strong>de</strong> tanta gente boa. E foi isso que aproximou tanta gente boa <strong>de</strong>le. <strong>Jorge</strong> Ama<strong>do</strong>, Carlos Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, Érico Veríssimo, Luiz Carlos Prestes, Raquel <strong>de</strong> Queirós, Guilherme <strong>de</strong> Almeida, Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, Antonio Olinto, Moreira Campos, Hélio Pólvora, Ana Maria Martins, Cassiano Ricar<strong>do</strong>, Graciliano Ramos, Di Cavalcanti, Clóvis Graciano, Heitor Villa Lobos, Renato Castelo Branco, Antonio Houassis, Roberto Duailibi, Breno Caldas, Rivadávia <strong>de</strong> Souza foram algumas <strong>de</strong>ssas pessoas, em São Paulo, na Bahia, no Rio <strong>de</strong> Janeiro, em Porto Alegre. Mais que colegas no ofício das artes e das letras, foram amigos. Quase parentes. O que, certamente, contribuiu para sua formação como homem e como poeta. Como memorialista, contista, ensaísta, publicitário, jornalista, conferencista, professor. Como boémio, pai, amigo, conselheiro. Ele costumava dizer que a gente nunca iria ver um intelectual sain<strong>do</strong> <strong>de</strong> uma leitaria. Hoje nem existe mais leitaria. E, com certeza, também já não existem mais intelectuais como antigamente. Como alguns cita<strong>do</strong>s aqui. Como ele, afinal. Privilegia<strong>do</strong>s, posso dizer sem modéstia, foram aqueles que pu<strong>de</strong>ram participar, em sua companhia, <strong>de</strong> um prato <strong>de</strong> lentilhas, sentir o cheiro <strong>do</strong> assa<strong>do</strong> toman<strong>do</strong> conta da casa, <strong>do</strong> vinho sobre a mesa, das viagens, das caminhadas na praia, das madrugadas regadas com muita música e poesia. Meu pai, por fim, apesar <strong>de</strong> toda essa mala cheia <strong>de</strong> histórias e relacionamentos, foi um homem simples e humil<strong>de</strong>, porque foi cria<strong>do</strong> no meio da gente miúda da sua terra – tropeiros,
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