As representações sociais configurando as dinâmicas produtivas e ...
As representações sociais configurando as dinâmicas produtivas e ...
As representações sociais configurando as dinâmicas produtivas e ...
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
<strong>As</strong> <strong>representações</strong> <strong>sociais</strong> confi gurando <strong>as</strong> dinâmic<strong>as</strong> produtiv<strong>as</strong>...<br />
a realização do plantio (da semeadura), apontando<br />
em direção a um prognóstico de safra. Nesse sentido,<br />
um importante exemplo, em região vizinha e de<br />
característic<strong>as</strong> semelhantes às do presente estudo, foi<br />
o estudo comparativo 16 da realidade agrária regional,<br />
realizado por Cohen e Duqué (2001), no qual concebem,<br />
explicitamente, a seca como uma importante<br />
representação social dos agricultores familiares.<br />
Nessa pesquisa, <strong>as</strong> autor<strong>as</strong> verifi caram que <strong>as</strong> pesso<strong>as</strong><br />
distinguem, entre <strong>as</strong> chuv<strong>as</strong>, aquel<strong>as</strong> que permitem<br />
ou não a realização d<strong>as</strong> atividades agrícol<strong>as</strong>, isto é, <strong>as</strong><br />
que possibilitam ou não o plantio (o ato de semear)<br />
de cultur<strong>as</strong> de subsistência, como o milho e o feijão.<br />
Além disso, na observação de Cohen e Duqué<br />
(op. cit.), há, para esses agricultores, uma variação<br />
conceitual para a palavra ‘seca’, dependendo da intensidade<br />
e dos intervalos de períodos sem chuv<strong>as</strong>. Isso<br />
lhes permite defi nir, numa espécie de escala, o grau<br />
de intensidade d<strong>as</strong> divers<strong>as</strong> sec<strong>as</strong>, isto é, cl<strong>as</strong>sifi cá-l<strong>as</strong><br />
como mais intens<strong>as</strong> ou menos intens<strong>as</strong>. Esse parâmetro<br />
serve para os agricultores qualifi carem a estação<br />
d<strong>as</strong> chuv<strong>as</strong>, como sendo inverno ‘bom’ ou inverno<br />
‘ruim’. Examinando tais exemplos, <strong>as</strong> autor<strong>as</strong> ponderam<br />
que a análise do discurso dos agricultores sobre a<br />
seca e/ou a chuva, revela a complexidade d<strong>as</strong> <strong>representações</strong><br />
sobre o clima, a ponto da necessária e hierarquizada<br />
interpretação de diferentes categori<strong>as</strong> positiv<strong>as</strong><br />
e negativ<strong>as</strong>. Dessa maneira, para os invernos ruins<br />
(períodos em que chove pouco e/ou irregularmente),<br />
os agricultores os denominam de “seca verde”. Esta<br />
denominação é indicada, sobretudo, pel<strong>as</strong> característic<strong>as</strong><br />
botânic<strong>as</strong> da vegetação nativa permanente e<br />
daquel<strong>as</strong> que se desenvolvem anualmente. Os invernos<br />
são considerados bons, quando chove dentro da<br />
média, de forma bem distribuída ao longo da curta<br />
estação d<strong>as</strong> chuv<strong>as</strong>, acumulando considerável reserva<br />
de água para <strong>as</strong> atividades produtiv<strong>as</strong>.<br />
40<br />
21058 - Ciênci<strong>as</strong> Sociais Nº42 - Revista_MIOLO.indb 40<br />
Na revisão teórica da seção anterior, apresentou-<br />
-se um exemplo de representação ligada às crenç<strong>as</strong>,<br />
quando a questão, também, são <strong>as</strong> preocupações com<br />
os fenômenos climáticos. Ou seja, a idéia é que há<br />
uma forte <strong>as</strong>sociação da incidência d<strong>as</strong> chuv<strong>as</strong> com<br />
determinad<strong>as</strong> dat<strong>as</strong> do calendário religioso, <strong>as</strong> quais<br />
estão totalmente imbricad<strong>as</strong> na morfologia social de<br />
determinad<strong>as</strong> sociedades. Na pesquisa de campo realizada<br />
no semiárido paraibano, isso fi cou patente,<br />
quando muitos afi rmaram ser a seca o principal entrave<br />
d<strong>as</strong> atividades produtiv<strong>as</strong>, a exemplo daquel<strong>as</strong><br />
long<strong>as</strong> estiagens ocorrid<strong>as</strong> entre 2005 e 2007 na região.<br />
O fenômeno também corroborou com o processo<br />
de êxodo rural em algum<strong>as</strong> dess<strong>as</strong> comunidades,<br />
mesmo que haja outr<strong>as</strong> variáveis que impulsionam<br />
a saída dos camponeses do semiárido, que aqui não<br />
cabe destacar, por exemplo, fatores relacionados às<br />
polític<strong>as</strong> públic<strong>as</strong>.<br />
Em face dessa representação ou signifi cação imaginária<br />
dos agricultores, é importante se resgatarem<br />
também <strong>as</strong> considerações de Neves (1994), que examina<br />
concepções imaginári<strong>as</strong> da seca17 . Para este autor,<br />
trata-se de um imaginário instituído pela sociedade<br />
burguesa, frente à natureza inóspita, que propicia<br />
a construção de um universo de <strong>representações</strong> “que,<br />
por um lado, através da separação entre sociedade e<br />
natureza e, por outro lado, elaborando noções de tempo<br />
útil e trabalho produtivo, transforma o controle da<br />
natureza (...) no centro d<strong>as</strong> possibilidades de estabilidade<br />
social” 18 . Na nossa experiência de pesquisa, isso<br />
pode ser verifi cado, ao realizarmos a coleta d<strong>as</strong> informações<br />
(com os “atores <strong>sociais</strong>”) e, posteriormente,<br />
através d<strong>as</strong> entrevist<strong>as</strong> com <strong>as</strong> famíli<strong>as</strong> campones<strong>as</strong>,<br />
quando <strong>as</strong> respost<strong>as</strong> relacionad<strong>as</strong> às questões produtiv<strong>as</strong>,<br />
majoritariamente, estiveram <strong>as</strong>sociad<strong>as</strong> à seca, a<br />
exemplo da manifestação: “(...) ‘anos ruins’, principalmente<br />
para o seguimento produtivo, do município,<br />
REVISTA DE CIÊNCIAS SOCIAIS, FORTALEZA, v. 42, n. 2, jul/dez, 2011, p. 34 - 46<br />
17/04/2012 09:40:03