106 • Catálogo de Filmes: 81 anos de cinema no ... - ABD Capixaba
106 • Catálogo de Filmes: 81 anos de cinema no ... - ABD Capixaba
106 • Catálogo de Filmes: 81 anos de cinema no ... - ABD Capixaba
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
<strong>106</strong> <strong>•</strong> <strong>Catálogo</strong> <strong>de</strong> <strong>Filmes</strong>: <strong>81</strong> <strong>a<strong>no</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>cinema</strong> <strong>no</strong> Espírito Santo
<strong>a<strong>no</strong>s</strong><br />
80<br />
<strong>Catálogo</strong> <strong>de</strong> <strong>Filmes</strong>: <strong>81</strong> <strong>a<strong>no</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>cinema</strong> <strong>no</strong> Espírito Santo <strong>•</strong> 107
108 <strong>•</strong> <strong>Catálogo</strong> <strong>de</strong> <strong>Filmes</strong>: <strong>81</strong> <strong>a<strong>no</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>cinema</strong> <strong>no</strong> Espírito Santo<br />
Cleber Carminati<br />
Rumo ao audiovisual: os <strong>a<strong>no</strong>s</strong> 80 entre o <strong>cinema</strong> e o ví<strong>de</strong>o<br />
Vitória, julho <strong>de</strong> 2007. Numa ensolarada manhã <strong>de</strong> domingo, <strong>no</strong> alto <strong>de</strong><br />
São Benedito, terminando o café com a família me chega Rodrigo com<br />
o celular.<br />
- Olha, tio, olha o filme que fiz!<br />
Pego o aparelho e assisto <strong>no</strong> peque<strong>no</strong> visor uma cena <strong>de</strong> luta entre dois<br />
meni<strong>no</strong>s. São Guilherme e Glauber, primos me<strong>no</strong>res <strong>de</strong> Rodrigo que tentam<br />
reproduzir os golpes que tanto vêem <strong>no</strong>s <strong>de</strong>senhos animados e similares.<br />
Para além da preocupação inicial – os movimentos <strong>de</strong>sencontrados da<br />
“luta” que po<strong>de</strong>riam acabar machucando os peque<strong>no</strong>s e a forte influência<br />
da tevê <strong>no</strong> imaginário infantil, constatei nas mãos <strong>de</strong> uma criança <strong>de</strong> 11<br />
<strong>a<strong>no</strong>s</strong> a concretização <strong>de</strong> uma utopia que mobilizou muita gente <strong>no</strong>s <strong>a<strong>no</strong>s</strong><br />
80: o ví<strong>de</strong>o ao alcance <strong>de</strong> todos.<br />
Os <strong>a<strong>no</strong>s</strong> 80 foram marcados como um momento <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s transformações<br />
na produção audiovisual em terras capixabas. Po<strong>de</strong>mos dizer mesmo<br />
que o a<strong>no</strong> <strong>de</strong> 85 foi uma espécie <strong>de</strong> divisor <strong>de</strong> águas neste campo. Foi<br />
quando o curso <strong>de</strong> Comunicação Social da UFES adquire, após uma greve<br />
<strong>de</strong> estudantes, uma câmera cancor<strong>de</strong>r da Sony. Gravando em Betamax<br />
– formato que <strong>de</strong>sapareceu com a entrada <strong>no</strong> mercado do VHS – essa<br />
máquina caiu nas mãos <strong>de</strong> um grupo que vinha provocando muita polêmica<br />
<strong>no</strong> campus por suas ativida<strong>de</strong>s político-culturais: o Balão Mágico.<br />
Rapidamente a Beta se transformou numa espécie <strong>de</strong> dispositivo <strong>de</strong> captura<br />
da realida<strong>de</strong>. Com a mobilida<strong>de</strong> e a facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> manuseio que essa<br />
câmera trazia buscávamos registrar tudo ao <strong>no</strong>sso redor. E exibíamos tudo<br />
a todos. Impossível não se lembrar das infindáveis horas <strong>de</strong> registro da<br />
fauna e flora da matinha da UFES, do sol se pondo lentamente em tons <strong>de</strong><br />
laranja gravados na caixa d’água... Enfim, capturávamos o tempo. O <strong>no</strong>sso<br />
tempo. E tínhamos todo o tempo do mundo.<br />
Assim, o ví<strong>de</strong>o entrou na <strong>no</strong>ssa cotidianida<strong>de</strong>. Cada manifestação, cada protesto,<br />
cada grafite, cada performance era agora presenciada infinitas vezes,
multiplicada <strong>no</strong>s olhos <strong>de</strong> quem assistia. O ví<strong>de</strong>o se tornara ví<strong>de</strong>o-ação,<br />
numa extensão do <strong>no</strong>sso corpo, do <strong>no</strong>sso olhar, do <strong>no</strong>sso movimento.<br />
Quando <strong>no</strong>s <strong>de</strong>mos conta, esse movimento já trazia para si uma <strong>de</strong>manda<br />
<strong>de</strong> projetos que não encontravam <strong>no</strong>s já tradicionais meios audiovisuais<br />
– <strong>cinema</strong> e televisão – condições <strong>de</strong> realização. Tanto o <strong>cinema</strong> quanto<br />
a tevê possuíam (e ainda possuem) um modo <strong>de</strong> operar pouco acessível<br />
a jovens realizadores como nós, distantes dos cargos <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r e dos<br />
mecanismos <strong>de</strong> financiamento. Foi a tec<strong>no</strong>logia eletrônica do ví<strong>de</strong>o que<br />
<strong>no</strong>s permitiu ingressar efetivamente <strong>no</strong> universo audiovisual dos bens simbólicos<br />
e estabelecer um modo <strong>de</strong> produção que alguns vão chamar <strong>de</strong><br />
in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, outros <strong>de</strong> alternativo, outros ainda <strong>de</strong> amador. Prefiro imaginar<br />
uma filosofia mais próxima do movimento punk que explodiu <strong>no</strong> final<br />
dos <strong>a<strong>no</strong>s</strong> 70 e início dos 80, o do you it yourself. O “faça você mesmo”<br />
sua banda, suas músicas, apontava para uma experiência radical <strong>no</strong> âmbito<br />
da produção artístico-cultural. E o Movimento Ví<strong>de</strong>o aqui traduziu bem o<br />
espírito da época.<br />
Vivíamos, <strong>no</strong> início da década <strong>de</strong> 80, um período <strong>de</strong> transição entre a ditadura<br />
militar e a retomada da <strong>de</strong>mocracia. A socieda<strong>de</strong> civil experimentava<br />
ares <strong>de</strong> mudança, <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong>, contaminando a todos com um sentimento<br />
<strong>de</strong> união, <strong>de</strong> coletivida<strong>de</strong>. O movimento pela anistia fez com os exilados<br />
retornassem e a Política voltava às praças com força e com vonta<strong>de</strong>. Em 84<br />
o movimento das diretas já ganhava as ruas do país, para ser barrado pelo<br />
conservadorismo do Congresso Nacional que preferiu eleger Tancredo<br />
Neves presi<strong>de</strong>nte da república. Mas quem tomou posse mesmo foi o vice<br />
José Sarney, fiel escu<strong>de</strong>iro do regime anterior, que praticamente encerrou<br />
a década <strong>no</strong> po<strong>de</strong>r.<br />
Se as mudanças que tanto sonhávamos para a implementação <strong>de</strong> uma nação<br />
livre e <strong>de</strong>mocrática apareciam aos <strong>no</strong>ssos olhos como numa cena em<br />
câmera lenta, <strong>no</strong> micro universo ao <strong>no</strong>sso redor as transformações ocorriam<br />
<strong>de</strong> forma acelerada. Tudo que era sólido se <strong>de</strong>smanchava <strong>no</strong> ar. E o<br />
ví<strong>de</strong>o era a <strong>no</strong>ssa testemunha. Com a instantaneida<strong>de</strong> da imagem eletrônica<br />
podíamos prescindir <strong>de</strong> toda espera mística da revelação. Gravávamos,<br />
assistíamos, não ficava bom, então voltávamos a fita e fazíamos <strong>de</strong> <strong>no</strong>vo.<br />
Esse tipo <strong>de</strong> procedimento vigorava muito na época, pois as ilhas <strong>de</strong> edição<br />
se achavam restritas às tevês e a algumas poucas produtoras in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes,<br />
além do Laboratório <strong>de</strong> Audiovisual da Ufes – Laufes, <strong>no</strong> antigo centro<br />
pedagógico.<br />
Assim, às dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong>correntes da precarieda<strong>de</strong> tec<strong>no</strong>lógica contrapú-<br />
<strong>Catálogo</strong> <strong>de</strong> <strong>Filmes</strong>: <strong>81</strong> <strong>a<strong>no</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>cinema</strong> <strong>no</strong> Espírito Santo <strong>•</strong> 109
nhamos a imaginação criativa que, potencializada pelo trabalho coletivo,<br />
materializava-se em soluções práticas, mas também conceituais. Isso fez<br />
com que <strong>de</strong>senvolvêssemos alguns percursos que merecem registro, principalmente<br />
<strong>no</strong> entendimento do ví<strong>de</strong>o mais como processo do que como<br />
produto.<br />
É o caso do projeto Ví<strong>de</strong>o-Comunitário em São Pedro (86-87). Essa localida<strong>de</strong><br />
ganhara fama na cida<strong>de</strong> por abrigar um gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>pósito <strong>de</strong> lixo a<br />
céu aberto, o “lixão”. Várias pessoas tiravam <strong>de</strong>le o seu sustento, o que<br />
foi retratado em cores naturalistas <strong>no</strong> documentário em ví<strong>de</strong>o Lugar <strong>de</strong><br />
toda Pobreza (1983). Dirigido pelo crítico e cineasta Amylton <strong>de</strong> Almeida e<br />
produzido pela Re<strong>de</strong> Gazeta <strong>de</strong> Comunicações, sua exibição <strong>no</strong> cineclube<br />
Metrópolis da Ufes provocou uma comoção generalizada entre jovens universitários<br />
pouco familiarizados com a <strong>no</strong>ssa realida<strong>de</strong>. Apesar <strong>de</strong> apresentar<br />
uma situação <strong>de</strong> vida indigna e calamitosa naquelas condições, algumas<br />
li<strong>de</strong>ranças locais entendiam que o ví<strong>de</strong>o reforçava o preconceito contra a<br />
região, pois não só lixo existia ali. Fruto <strong>de</strong> ocupações <strong>no</strong>s <strong>a<strong>no</strong>s</strong> 70, a comunida<strong>de</strong><br />
organizada lutava por melhorias em várias frentes; e para seus integrantes<br />
a imagem <strong>de</strong> lugar <strong>de</strong> toda pobreza não ajudava muito. Polêmica<br />
à parte, surgiu a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> realizar, em parceria com o movimento<br />
social dali, um trabalho que consistia basicamente em ví<strong>de</strong>os-reportagens<br />
sobre o local, conduzidas pelos próprios moradores. Estas eram <strong>de</strong>pois<br />
mostradas e discutidas por todos nas reuniões da associação <strong>de</strong> bairro.<br />
Era o ví<strong>de</strong>o em sua dimensão política <strong>de</strong> TV comunitária. E não éramos os<br />
únicos. Dentro <strong>de</strong>sta perspectiva <strong>de</strong> <strong>de</strong>mocratização do acesso aos meios<br />
<strong>de</strong> comunicação, outras experiências semelhantes se <strong>de</strong>senvolviam pelo<br />
país afora. Era o movimento do ví<strong>de</strong>o popular que ganhava força enquanto<br />
dispositivo <strong>de</strong> resistência.<br />
Malgrado o estigma imposto em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> sua “imagem precária”,<br />
“aquém” da “qualida<strong>de</strong> técnica” exigida pelas emissoras <strong>de</strong> tv e pouco dada<br />
à “impressão <strong>de</strong> realida<strong>de</strong>” tão cara à imagem <strong>cinema</strong>tográfica, o Movimento<br />
Ví<strong>de</strong>o na UFES conseguiu realizar alguns experimentos que entraram<br />
para a história do audiovisual <strong>no</strong> Espírito Santo. Isto <strong>de</strong>ntro da proposta do<br />
ví<strong>de</strong>o como obra acabada, <strong>no</strong>s mol<strong>de</strong>s do <strong>cinema</strong> e da televisão. É o caso<br />
<strong>de</strong> Refluxo (1986), tido como o primeiro ví<strong>de</strong>o <strong>de</strong> ficção do estado. Com<br />
argumento e direção <strong>de</strong> Sergio <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros, po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rado como<br />
uma típica produção coletiva do ví<strong>de</strong>o dos <strong>a<strong>no</strong>s</strong> 80, on<strong>de</strong> os limites e as<br />
funções <strong>de</strong> cada participante não eram <strong>de</strong>finidos claramente. Imperava a<br />
máxima do fazer apren<strong>de</strong>ndo e do apren<strong>de</strong>r fazendo; e todos colaboravam<br />
<strong>de</strong> alguma forma.<br />
110 <strong>•</strong> <strong>Catálogo</strong> <strong>de</strong> <strong>Filmes</strong>: <strong>81</strong> <strong>a<strong>no</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>cinema</strong> <strong>no</strong> Espírito Santo
Com este mesmo princípio foi realizado, em 1987, o documentário O<br />
Resgate, que tem como tema a retomada do patrimônio dos estudantes<br />
capixabas, confiscado durante a ditadura. Outra produção que mobilizou<br />
a Turma do Balão nesse período foi Rendam-se Terráqueos. Este ví<strong>de</strong>o era<br />
parte do projeto <strong>de</strong> graduação Cida<strong>de</strong> Utópica, do então estudante <strong>de</strong> arquitetura<br />
Antônio Chalhub, e ainda permanece para mim um mistério por<br />
não ter tido a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vê-lo finalizado.<br />
Po<strong>de</strong>mos <strong>de</strong>stacar outras produções que marcaram época na universida<strong>de</strong><br />
e que não estavam ligadas diretamente ao Balão Mágico. Formólia (1986),<br />
<strong>de</strong> Ricardo Nespoli e Paulo Sérgio Socó, <strong>no</strong>s jogava <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um ferrovelho<br />
para então revelar a beleza dos seus recantos e ruínas. O ví<strong>de</strong>o ampliava<br />
a plasticida<strong>de</strong> dos escombros a ponto <strong>de</strong> tocar a poesia. Também <strong>de</strong><br />
Ricardo Nespoli, agora em parceria com Renzo Pretti, veio Janelas (1987)<br />
com uma visão antropofágica do universo das relações pessoais.<br />
O projeto <strong>de</strong> caráter performático Ae<strong>de</strong>s aegyptis (1986-87), dos jovens<br />
artistas Mac, Rosana Paste e Celso Adolfo, usava o ví<strong>de</strong>o para registrar as<br />
suntuosas encenações <strong>de</strong>senvolvidas a partir <strong>de</strong> uma surreal recriação do<br />
mundo dos faraós. Daí para o teatro foi um passo. Com o grupo É<strong>de</strong>n<br />
Dionisíaco do Brasil o ví<strong>de</strong>o subiu ao palco como personagem. Na montagem<br />
dos Quadros Bíblicos (1989) a cabeça <strong>de</strong> João Batista foi entregue<br />
numa tevê e a visão do Infer<strong>no</strong> ganhou projeção eletrônica para finalizar o<br />
espetáculo.<br />
Vale <strong>de</strong>stacar também uma outra aproximação entre ví<strong>de</strong>o e televisão, responsável<br />
por um momento <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> riqueza criativa na esfera da artemídia<br />
local. Produzido pela TV Educativa, concebido e dirigido pelo artista<br />
plástico Ronaldo Barbosa em parceria com Ricardo Néspoli, Graúna Barroca<br />
(1989-90) evi<strong>de</strong>nciava o belo e o trágico dos encontros, entre mar e<br />
areia, entre fogo e água e, principalmente, entre homem e natureza. Sem<br />
dúvida uma obra <strong>de</strong> rara beleza visual.<br />
Fechando a década, o ví<strong>de</strong>o virou objeto, tema e produto dos dois primeiros<br />
trabalhos <strong>de</strong> conclusão <strong>de</strong> curso da comunicação social da Ufes:<br />
a minha meta-reflexão sobre O ví<strong>de</strong>o como aparelho eletrodoméstico e<br />
Ricardo Néspoli com sua vivência <strong>de</strong> Graúna Barroca.<br />
Para não dizer que não falei das flores, o <strong>cinema</strong> transitou entre os dois<br />
campos mais conhecidos do seu fazer: o da ficção e o da documentação.<br />
O primeiro pólo é representado pelo <strong>cinema</strong> <strong>de</strong> Sergio <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros com<br />
os seus Sinais <strong>de</strong> Fascismo e Santa Maria Julião. Ambos <strong>de</strong> 1980, foram ro-<br />
<strong>Catálogo</strong> <strong>de</strong> <strong>Filmes</strong>: <strong>81</strong> <strong>a<strong>no</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>cinema</strong> <strong>no</strong> Espírito Santo <strong>•</strong> 111
teirizados, respectivamente, um a partir <strong>de</strong> <strong>no</strong>tícias <strong>de</strong> jornal sobre policiais<br />
civis acusados <strong>de</strong> torturar e ven<strong>de</strong>r crianças, e outro adaptado <strong>de</strong> conto<br />
homônimo do escritor e músico capixaba Gustavo Haddad. No campo do<br />
documentário <strong>de</strong>stacaram-se Os votos <strong>de</strong> Frei Palácios (1980) <strong>de</strong> Ramon<br />
Alvarado, As Paneleiras do Barro (1983) e Dos Reis Magos dos Tupiniquim<br />
(1985), <strong>de</strong> Orlando Bonfim Netto e Receita artesanal (1988), <strong>de</strong> Douglas<br />
Lynch. Aqui, a forte presença <strong>de</strong> temas ligados às tradições folclóricas e<br />
culturais características do estado evi<strong>de</strong>nciava o caráter instrumental do <strong>cinema</strong><br />
na construção e fixação <strong>de</strong> uma possível i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> capixaba.<br />
E é o documentário que melhor tirou proveito das i<strong>no</strong>vações que o ví<strong>de</strong>o<br />
trouxe. Nas décadas seguintes, principalmente com advento e barateamento<br />
das tec<strong>no</strong>logias digitais na entrada do <strong>no</strong>vo milênio, houve uma explosão<br />
<strong>no</strong> modo <strong>de</strong> fazer documental, colocando por terra várias concepções<br />
clássicas <strong>de</strong> documentar. Multiplicaram-se os olhares, diversificaram-se os<br />
temas, misturaram-se os formatos e gêneros, intensificaram-se a circulação<br />
e distribuição das obras. Saímos do anzol e caímos na re<strong>de</strong>.<br />
Sob a égi<strong>de</strong> da Lei Rubem Braga <strong>de</strong> incentivo à produção cultural e dos<br />
Festivais <strong>de</strong> Cinema <strong>de</strong> Vitória, <strong>no</strong>s <strong>a<strong>no</strong>s</strong> <strong>no</strong>venta o ví<strong>de</strong>o passaria a ser<br />
institucionalmente um sistema “me<strong>no</strong>r” <strong>no</strong> universo das produções simbólicas.<br />
No eter<strong>no</strong> retor<strong>no</strong> do mesmo, predominaria o culto fetichista à<br />
imagem fotoquímica. Mas esta não é mais a mesma, já está contaminada e<br />
irremediavelmente con<strong>de</strong>nada a se integrar ao audiovisual, a <strong>de</strong>speito <strong>de</strong><br />
toda e qualquer forma <strong>de</strong> hierarquização e controle. O meni<strong>no</strong> Rodrigo<br />
com o celular nas mãos parecia querer me mostrar isso.<br />
E o ví<strong>de</strong>o? Bem...Acho que o ví<strong>de</strong>o continuará a reinar <strong>de</strong> maneira criativa<br />
e irreverente, mas não me<strong>no</strong>s transformadora. Às vezes fazendo-se claro<br />
e ruidoso, outras, oculto entre as mais variadas formas do ver. Pois Vi<strong>de</strong>o<br />
é o ato mesmo do olhar.<br />
p.s.: o olhar lançado nessa apresentação, com certeza está cheio <strong>de</strong> lacunas,<br />
pois é fruto <strong>de</strong> uma apropriação muito particular daqueles momentos.<br />
Demandam-se assim ajustes que, para fazer jus à riqueza do período, <strong>de</strong>verão<br />
ser feitos a partir <strong>de</strong> pesquisas mais criteriosas, tanto em termos históricos<br />
quanto em análises formais das obras. É esperar para melhor ver.<br />
Cleber Carminati é mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC/SP.<br />
Professor do Curso <strong>de</strong> Comunicação Social da UFES. Coor<strong>de</strong>nador do<br />
Programa Conexões <strong>de</strong> Saberes da UFES.<br />
112 <strong>•</strong> <strong>Catálogo</strong> <strong>de</strong> <strong>Filmes</strong>: <strong>81</strong> <strong>a<strong>no</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>cinema</strong> <strong>no</strong> Espírito Santo
Santa Maria Julião<br />
<strong>•</strong>1980<strong>•</strong><br />
Captação: 16 mm<br />
Finalização: 16 mm<br />
Curta-metragem 8 minutos - Preto e branco<br />
Som: mo<strong>no</strong><br />
Categoria: ficção<br />
gênero: drama<br />
loCal <strong>de</strong> produção: Vitória - ES (1980)<br />
lançamento: Sala <strong>de</strong> projeção da Telefilme<br />
Produções, Vitória - ES (1980)<br />
Si<strong>no</strong>pse: Ante<strong>no</strong>r, um senhor <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> que vive solitário, encontra-se em<br />
avançado estado <strong>de</strong> <strong>de</strong>cadência física e psicológica. Ele ocupa seu tempo<br />
entre relembrar uma musa do passado e perseguir um rato que há <strong>a<strong>no</strong>s</strong> lhe<br />
inferniza a vida. Mas sempre <strong>de</strong>ixa o roedor escapar, já que é o seu único<br />
companheiro. A história é narrada do ponto <strong>de</strong> vista do rato que se chama<br />
Santa Maria Julião.<br />
argumento e roteiro: Sergio <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros<br />
HiStória baSeada: <strong>no</strong> conto homônimo do escritor capixaba Gustavo Haddad<br />
direção: Sergio <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros<br />
produção: Telefilme Produções Cinematográficas<br />
produção exeCutiva: Luiz Roberto Teixeira<br />
direção <strong>de</strong> produção: Carlos Noell<br />
direção <strong>de</strong> FotograFia: Jorge Britto<br />
direção <strong>de</strong> arte: Siloé Avilis<br />
Som direto: Marcão<br />
montagem: Jorge Britto<br />
edição <strong>de</strong> Som: Jorge Britto<br />
mixagem: Jorge Britto<br />
elenCo: Cristina Almeida (musa <strong>de</strong> Ante<strong>no</strong>r) e José Galdi<strong>no</strong> <strong>de</strong> Araújo (Ante<strong>no</strong>r)<br />
Fonte: Sergio <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros<br />
<strong>Catálogo</strong> <strong>de</strong> <strong>Filmes</strong>: <strong>81</strong> <strong>a<strong>no</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>cinema</strong> <strong>no</strong> Espírito Santo <strong>•</strong> 113
114 <strong>•</strong> <strong>Catálogo</strong> <strong>de</strong> <strong>Filmes</strong>: <strong>81</strong> <strong>a<strong>no</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>cinema</strong> <strong>no</strong> Espírito Santo<br />
Sinais <strong>de</strong> fascismo<br />
<strong>•</strong>1980<strong>•</strong><br />
Captação: super 8<br />
Finalização: super 8<br />
Longa-metragem 70 minutos - Colorido<br />
Som: mo<strong>no</strong><br />
Categoria: ficção<br />
gênero: drama<br />
loCal <strong>de</strong> produção: Vitória - ES (1979)<br />
lançamento: Cineclube da Ufes, Vitória - ES<br />
(1980)<br />
Informação complementar: <strong>no</strong> último dia <strong>de</strong> exibição do filme, um grupo <strong>de</strong> policiais do<br />
DOPS (Departamento <strong>de</strong> Organização Política e Social) invadiu a cabine <strong>de</strong> projeção do<br />
cineclube e apreen<strong>de</strong>u parte do filme, alegando falta do certificado <strong>de</strong> censura, documento<br />
obrigatório na época. Foi uma operação ilegal, pois a Sub-Reitora Comunitária havia autorizado<br />
a exibição <strong>no</strong> campus da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Espírito Santo (Ufes), em <strong>no</strong>me<br />
da auto<strong>no</strong>mia universitária. Foi apreendida parte do filme que <strong>de</strong>nunciava alguns policiais<br />
envolvidos em crimes abordados na obra.<br />
Si<strong>no</strong>pse: história real <strong>de</strong> um me<strong>no</strong>r preso na <strong>de</strong>legacia <strong>de</strong> Argolas, em Vila<br />
Velha. O fato <strong>de</strong>sperta a curiosida<strong>de</strong> da imprensa, que passa a investigar<br />
o caso. É <strong>de</strong>scoberto um esquema em que policiais civis são acusados <strong>de</strong><br />
torturar e ven<strong>de</strong>r crianças presas para exploração sexual.<br />
argumento: Sergio <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros<br />
roteiro: Sergio <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros e Luiz Roberto Teixeira<br />
HiStória: baseada em fatos reais, relatados na reportagem “Campo <strong>de</strong> concentração<br />
para me<strong>no</strong>res <strong>no</strong> ES”, do Jornal A Gazeta (1978)<br />
direção: Sergio <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros<br />
produção: Canaã Cinema Clube<br />
produção exeCutiva: Jorge Britto e Sergio <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros.<br />
direção <strong>de</strong> produção: Carlos Noell<br />
direção <strong>de</strong> FotograFia: Sergio <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros<br />
direção <strong>de</strong> arte: Cézar Pardal<br />
Som direto: Luiz Roberto Teixeira<br />
montagem: Sergio <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros<br />
edição <strong>de</strong> Som e mixagem: Osmar Luiz Dalmaschio<br />
trilHa So<strong>no</strong>ra não original: Chico Buarque <strong>de</strong> Holanda<br />
elenCo: Cláudia Figueiredo (Moça Assaltada); José Galdi<strong>no</strong> <strong>de</strong> Araújo<br />
(Delegado); Jovi<strong>no</strong> Intra (Criança Presa); Flávio Sales (Empresário); Jurady<br />
Souza (Assaltante); Sergio Schena (Repórter); Marcos Suaid (Pai da Moça<br />
Assaltada); Joelson Souza (Pa<strong>de</strong>iro).<br />
Fonte:Sergio <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros
Os votos <strong>de</strong> Frei Palácios <strong>•</strong>1980<strong>•</strong><br />
Captação: 35 mm<br />
Finalização: 35 mm<br />
Curta-metragem 8 minutos - Colorido<br />
Som: mo<strong>no</strong><br />
Categoria: documentário<br />
loCal <strong>de</strong> produção: Vitória e Vila Velha - ES (1980)<br />
Si<strong>no</strong>pse: documentário sobre a vida do Frei Pedro Palácios, a partir da memória<br />
arquitetônica, pictórica e ico<strong>no</strong>gráfica.<br />
Fontes: www.<strong>cinema</strong>teca.com.br e Ramon Alvarado<br />
roteiro e direção: Ramon Alvarado<br />
produção: RA Produções Cinematográficas<br />
Co-produção: Rubem Azeredo<br />
produção exeCutiva: Vitor Lustosa<br />
direção <strong>de</strong> FotograFia e montagem: Ramon Alvarado<br />
trilHa So<strong>no</strong>ra: Ronaldo Tapajós<br />
narração: Cida Azeredo<br />
<strong>Catálogo</strong> <strong>de</strong> <strong>Filmes</strong>: <strong>81</strong> <strong>a<strong>no</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>cinema</strong> <strong>no</strong> Espírito Santo <strong>•</strong> 115
As paneleiras do barro <strong>•</strong>1983<strong>•</strong><br />
116 <strong>•</strong> <strong>Catálogo</strong> <strong>de</strong> <strong>Filmes</strong>: <strong>81</strong> <strong>a<strong>no</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>cinema</strong> <strong>no</strong> Espírito Santo<br />
Captação: 35 mm e ví<strong>de</strong>o<br />
Finalização: 16 mm<br />
Média-metragem 55<br />
minutos - Colorido<br />
Som: mo<strong>no</strong><br />
Categoria: documentário<br />
loCal <strong>de</strong> produção: Vitória,<br />
ES (1982); Rio <strong>de</strong><br />
Janeiro - RJ (1983)<br />
lançamento: TVE, Rio <strong>de</strong><br />
Janeiro - RJ (1983)<br />
Si<strong>no</strong>pse: história da confecção da panela <strong>de</strong> barro capixaba <strong>no</strong> momento<br />
em que houve risco <strong>de</strong> extinção <strong>de</strong> sua produção, por causa da urbanização<br />
e da falta <strong>de</strong> reconhecimento <strong>de</strong> sua importância para a cultura do<br />
Espírito Santo.<br />
Roteiro: Orlando Bomfim Netto<br />
Texto: Rubinho Gomes<br />
direção: Orlando Bomfim Netto<br />
direção <strong>de</strong> produção: Orlando Bomfim Netto<br />
direção <strong>de</strong> FotograFia: Douglas Lynch<br />
montagem: Alexandre Alencar<br />
mixagem: TVE Rio <strong>de</strong> Janeiro<br />
trilHa So<strong>no</strong>ra: Orlando Bomfim Netto<br />
Fontes: www.<strong>cinema</strong>teca.com.br e Orlando Bomfim Netto
Dos Reis Magos dos tupiniquim <strong>•</strong>1985<strong>•</strong><br />
Captação: 35 mm<br />
Finalização: 35 mm<br />
Curta-metragem 10 minutos - Colorido<br />
Som: mo<strong>no</strong><br />
Categoria: documentário<br />
loCal <strong>de</strong> produção: Serra - ES (19<strong>81</strong>-1985)<br />
lançamento: Nova Almeida - ES (1985)<br />
Si<strong>no</strong>pse: os movimentos culturais na Vila <strong>de</strong> Nova Almeida e a restauração<br />
do altar da Igreja dos Reis Magos são p<strong>a<strong>no</strong>s</strong> <strong>de</strong> fundo para uma síntese da<br />
História do Brasil.<br />
argumento, roteiro e direção: Orlando Bomfim Netto<br />
produção: Circus Produções Cinematográficas<br />
produção exeCutiva: Maria <strong>de</strong> Fátima<br />
direção <strong>de</strong> produção: Orlando Bomfim Netto<br />
direção <strong>de</strong> FotograFia: Douglas Lynch<br />
direção <strong>de</strong> arte: Augusto Bomfim (letreiros)<br />
Som direto: Flávio Holanda<br />
montagem: Alexandre Alencar<br />
mixagem: Carlos <strong>de</strong> Lariva<br />
trilHa So<strong>no</strong>ra: Orlando Bomfim Netto<br />
Fontes: www.<strong>cinema</strong>teca.com.br e Orlando Bomfim Netto<br />
<strong>Catálogo</strong> <strong>de</strong> <strong>Filmes</strong>: <strong>81</strong> <strong>a<strong>no</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>cinema</strong> <strong>no</strong> Espírito Santo <strong>•</strong> 117
Receita artesanal <strong>•</strong>1988<strong>•</strong><br />
Captação: 16 mm<br />
Finalização: 16 mm<br />
Curta-metragem 15 minutos - Colorido<br />
Som: mo<strong>no</strong><br />
Categoria: documentário<br />
loCal <strong>de</strong> produção: Litoral capixaba - ES (1988)<br />
lançamento: Centro Cultural Carmélia M. <strong>de</strong> Souza,<br />
Vitória, ES (1988)<br />
Si<strong>no</strong>pse: o filme faz um pa<strong>no</strong>rama da<br />
situação dos pescadores do litoral do<br />
Espírito Santo e revela os segredos da<br />
receita da moqueca capixaba.<br />
Prêmios/ carreira:<br />
roteiro vencedor do concurso Ludovico Persici<br />
Promovido PeLo <strong>de</strong>Partamento estaduaL <strong>de</strong><br />
cuLtura - vitória - es (1986).<br />
Prêmio esPeciaL do Júri <strong>no</strong> iv rio/cine FestivaL -<br />
rio <strong>de</strong> Janeiro -rJ (1989)<br />
Roteiro: Adilson Vilaça e Helô Dias<br />
História baseada: poema <strong>de</strong> Adilson Vilaça<br />
Direção: Douglas Lynch<br />
Produção: Cena <strong>Filmes</strong> e Departamento<br />
Estadual <strong>de</strong> Cultura /ES<br />
Produção executiva: Douglas Lynch<br />
Direção <strong>de</strong> produção: Sonia Machado<br />
Direção <strong>de</strong> fotografia: Douglas Lynch<br />
Som direto e montagem: Jaceguay Lins<br />
Edição <strong>de</strong> som e mixagem: Walter Goulart<br />
Trilha so<strong>no</strong>ra: Achiles Siqueira, Banda <strong>de</strong> Congo Amores da Lua<br />
Locução: Luiz Ta<strong>de</strong>u Teixeira e Geisa Ramos<br />
Fonte: www.<strong>cinema</strong>teca.com.br e jornais A Gazeta e A Tribuna<br />
118 <strong>•</strong> <strong>Catálogo</strong> <strong>de</strong> <strong>Filmes</strong>: <strong>81</strong> <strong>a<strong>no</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>cinema</strong> <strong>no</strong> Espírito Santo
<strong>Catálogo</strong> <strong>de</strong> <strong>Filmes</strong>: <strong>81</strong> <strong>a<strong>no</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>cinema</strong> <strong>no</strong> Espírito Santo <strong>•</strong> 119