17.04.2013 Views

Esta página foi deixada propositadamente em branco

Esta página foi deixada propositadamente em branco

Esta página foi deixada propositadamente em branco

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

<strong>Esta</strong> <strong>página</strong> <strong>foi</strong> <strong>deixada</strong> <strong>propositadamente</strong> <strong>em</strong> <strong>branco</strong>


SOCIEDADE<br />

REPORTAGEM<br />

‘<br />

Se quiser<strong>em</strong> saber o que se está<br />

a fazer no mundo, que seja novo e<br />

ousado, terão de procurar <strong>em</strong> Espanha’<br />

Alfons Cornella, perito <strong>em</strong> inovação<br />

80 v 28 DE FEVEREIRO DE 2008


MADRID Na Gran Vía sente-se a energia de uma capital cosmopolita,<br />

que está s<strong>em</strong>pre <strong>em</strong> crescimento e não pára de se reinventar<br />

A imparável<br />

‘movida’<br />

espanhola<br />

O reino vizinho continua a crescer acima<br />

da média europeia e não pára de superar<br />

expectativas, nas mais variadas áreas.<br />

A dias das eleições, viag<strong>em</strong> ao país que faz<br />

sucesso a nível mundial<br />

PATRÍCIA FONSECA TEXTO BRUNO RASCÃO FOTOS<br />

Enviados especias<br />

A<br />

sede da Imaginarium, <strong>em</strong> Saragoça, parece<br />

uma gigantesca construção de Lego<br />

transparente. As 120 pessoas que ali trabalham<br />

separadas por paredes de vidro<br />

não fi cam sentadas muito t<strong>em</strong>po, cirandando<br />

pelos corredores, como crianças<br />

inquietas. Espreita-se a sala de reuniões e a imag<strong>em</strong> é<br />

desconcertante: homens e mulheres, nos seus fatos escuros<br />

de executivo, sentados ao lado de coloridos bonecos<br />

de trapos... como se também eles participass<strong>em</strong> na<br />

discussão dos relatórios e contas da fi rma.<br />

O fundador desta <strong>em</strong>presa de brinquedos, Félix Tena,<br />

47 anos, sabe que o sucesso do negócio depende da criatividade<br />

dos seus colaboradores e procura proporcionar-lhes<br />

o ambiente adequado. Esse será um dos segredos<br />

da transformação da Imaginarium, <strong>em</strong> apenas<br />

15 anos, numa das líderes mundiais do sector, com cerca<br />

de 350 lojas <strong>em</strong> 29 países. Mas o ingrediente principal<br />

para o triunfo poderá residir no facto de esta <strong>em</strong>presa<br />

ter sido fundada <strong>em</strong> Espanha? Félix Tena reconhece<br />

que o ambiente lhe <strong>foi</strong> propício: «Este país é um terreno<br />

fértil para fazer crescer bons projectos.»<br />

À s<strong>em</strong>elhança da Imaginarium, surgiram, na última<br />

década, dezenas de <strong>em</strong>presas com dimensão global,<br />

aproveitando a boleia de um ciclo económico de grande<br />

crescimento, s<strong>em</strong> paralelo na Europa. São as chamadas<br />

«irmãs mais novas da Zara»: a Mango, a Coronel Tapioca<br />

ou a Camper, por ex<strong>em</strong>plo. Hoje, estão todas implantadas<br />

<strong>em</strong> Saragoça, lado a lado com o grupo Inditex, que<br />

detém a Zara mas também a Pull and Bear ou a Massimo<br />

Dutti, no gigantesco complexo industrial Plaza – com<br />

mais de 12 milhões de metros quadrados, é a maior plataforma<br />

logística da Europa.<br />

CRISE? QUAL CRISE?<br />

As centenas de camiões, comboios e aviões (!) que, a<br />

cada hora, sa<strong>em</strong> da Plaza, num ritmo frenético, são<br />

uma das imagens mais pujantes do poderio espanhol<br />

no mundo. Mas não a única. Espanha cresceu s<strong>em</strong>pre<br />

acima da média europeia, na última década (repete a<br />

proeza este ano) e transformou-se, num curto espaço<br />

28 DE FEVEREIRO DE 2008 v 81


SOCIEDADE<br />

REPORTAGEM<br />

Cozinheiro de surpresas<br />

DAVID MUÑOZ, 28 anos<br />

O mundo está rendido à nueva cocina, que destronou, <strong>em</strong> defi nitivo, a nouvelle<br />

cousine. Ferran Adriá ou Arzak continuam a ser mestres na invenção de sabores<br />

e texturas mas há novos talentos a seguir<strong>em</strong>-lhes os passos. David Muñoz,<br />

«cozinheiro-revelação» no Madrid Fusión 2008, conquistou os «mestres» com<br />

pratos tão inesperados como «dim sum de tortilha espanhola». No seu restaurante<br />

DiverXo não há <strong>em</strong>enta: basta sentar e apreciar o desfi le de iguarias. Mas<br />

primeiro há que conseguir reserva…<br />

‘A minha Espanha’<br />

«A alegria e a forma como viv<strong>em</strong>os. Sab<strong>em</strong>os apreciar<br />

o t<strong>em</strong>po e os amigos, não somos escravos do trabalho»<br />

«A má integração dos imigrantes, d<strong>em</strong>asiadas vezes tratados<br />

de forma discriminatória»<br />

Em Espanha, 120 restaurantes têm estrelas Michelin (<strong>em</strong> Portugal há apenas nove)<br />

de t<strong>em</strong>po, dando que falar por muitas razões<br />

– que não apenas as económicas.<br />

Mas <strong>foi</strong> o famoso milagre fi nanceiro espanhol<br />

que permitiu tudo o resto, o que leva<br />

alguns analistas a prever<strong>em</strong> t<strong>em</strong>pos difíceis,<br />

sobretudo devido à recessão no sector<br />

da construção civil, que, nos últimos meses,<br />

fez disparar o des<strong>em</strong>prego. Em vésperas<br />

de eleições (9 de Março), a «crise» é o<br />

t<strong>em</strong>a preferido da oposição e <strong>foi</strong> o assunto<br />

da primeira questão colocada pelo jornal El<br />

82 v 28 DE FEVEREIRO DE 2008<br />

Mundo (conotado com a direita) ao actual<br />

presidente do Governo (socialista). Eleitoralismos<br />

à parte, a resposta de Zapatero<br />

contém apenas factos: «Em que legislatura<br />

houve um crescimento médio de 3,8%,<br />

superior a França, Al<strong>em</strong>anha, Itália, Reino<br />

Unido, EUA, Canadá e Japão, ao mesmo<br />

t<strong>em</strong>po que se criavam 3 milhões de postos<br />

de trabalho, reduzindo <strong>em</strong> 400 mil o número<br />

de des<strong>em</strong>pregados e conseguindo, não<br />

um equilíbrio, mas um excedente orçamen-<br />

tal de 2 por cento?» Convenhamos, só mesmo<br />

<strong>em</strong> Espanha. As contas públicas nunca<br />

estiveram, aliás, tão saudáveis: <strong>em</strong> 2007,<br />

registou-se o maior excedente de s<strong>em</strong>pre,<br />

com 23 368 milhões de euros.<br />

É uma proeza incrível, sobretudo se recordarmos<br />

que Espanha, tal como Portugal,<br />

chegou aos anos 80 com uma única certeza:<br />

depois de décadas de ditadura, tinha<br />

de esforçar-se muito para atingir os níveis<br />

de desenvolvimento dos seus parceiros europeus.<br />

Os dois países entraram de mãos<br />

dadas na CEE mas, a partir de então... Digamos<br />

que Portugal «<strong>foi</strong> andando», enquanto<br />

Espanha deu vários saltos de gigante.<br />

Em especial a partir dos anos 90, tornou-<br />

-se num case study mundial, pela sua capa-<br />

‘<br />

Espanha é um terreno<br />

fértil para fazer crescer<br />

bons projectos. Há um<br />

ambiente propício<br />

ao sucesso’<br />

Félix Tena, fundador da <strong>em</strong>presa Imaginarium


O rei do azeite<br />

JOSE ALVAREZ AGUILLA, 70 anos<br />

As laranjas e os tomates da Andaluzia pod<strong>em</strong> comprar-se <strong>em</strong> todo o mundo e é<br />

também nesta região que se concentram os maiores olivais do país, líder mundial<br />

na produção de azeite. Na província de Jaén, concelho de Martos, não há um<br />

hectare s<strong>em</strong> oliveiras plantadas. Pertenc<strong>em</strong> quase todas à Cooperativa Virgen de<br />

la Villa, a que preside Jose Alvarez Aguilla. Com os subsídios europeus a chegar<strong>em</strong><br />

ao fi m, há que encontrar soluções para o futuro: «Vamos deixar de vender a granel<br />

e construir uma marca 'potente', com todos os produtores da região.»<br />

‘A minha Espanha’<br />

«Viv<strong>em</strong>os <strong>em</strong> paz, apesar de tudo.<br />

E t<strong>em</strong>os uma grande qualidade de vida»<br />

«O terrorismo da ETA»<br />

A produção do ano passado <strong>foi</strong> superior a um milhão de toneladas de azeite<br />

cidade de crescer, inovar e superar todas<br />

as expectativas. Hoje, já não lhe chega ser<br />

a 8.ª potência mundial. «Espanha quer ser<br />

líder», afirma Antonio Silva de Pablos, 45<br />

anos, director de comunicação da Expo<br />

Saragoça 2008. «Mesmo quando o debate<br />

sobre as alterações climáticas parece ser<br />

dominado por Al Gore ou por especialistas<br />

ingleses, estamos a lutar pela liderança nessa<br />

matéria.» A escassez de água potável será<br />

o t<strong>em</strong>a da Expo'08 e o t<strong>em</strong>a continuará a<br />

ser estudado na capital aragonesa nos próximos<br />

anos, no âmbito de uma fundação de<br />

capitais públicos e privados. Como explica<br />

Antonio Pablos, «quando o mundo discutir<br />

as questões da água, quer<strong>em</strong>os que fal<strong>em</strong> da<br />

Carta de Saragoça – tal como hoje falam de<br />

Quioto <strong>em</strong> relação ao aquecimento global».<br />

GENTE COM ‘GANAS’<br />

«Se quiser<strong>em</strong> saber o que se está a fazer no<br />

mundo, que seja novo e ousado, <strong>em</strong> qual-<br />

‘<br />

O país já é a 8ª<br />

potência mundial.<br />

Mas ainda não chega:<br />

‘Espanha quer ser líder’’<br />

Antonio Silva de Pablos, director<br />

de comunicação da Expo Saragoça 2008<br />

quer área, terão de procurar <strong>em</strong> Espanha»,<br />

diz, s<strong>em</strong> hesitar, o catalão Alfons Cornella,<br />

46 anos, perito <strong>em</strong> inovação. Barcelona é<br />

o epicentro deste furacão de novas ideias.<br />

«Há um ambiente criativo, na cidade, e t<strong>em</strong>os<br />

uma qualidade de vida difícil de bater»,<br />

explica o fundador da Infonomia, um projecto<br />

que serve já de ponto de encontro a<br />

17 mil inovadores. O sonho, agora, é criar<br />

uma rede mundial. Até porque «o mundo»<br />

é, obrigatoriamente, o mercado potencial<br />

de todos os projectos que passam pela Infonomia.<br />

«Nos últimos quatro anos», revela<br />

Alfons Cornella, registaram-se «2 mil iniciativas<br />

inovadoras», com aplicação imediata<br />

à indústria. «Os espanhóis têm ‘ganas’ de<br />

fazer coisas», diz, b<strong>em</strong>-humorado.<br />

É um facto comprovado pelos estudos<br />

28 DE FEVEREIRO DE 2008 v 83


SOCIEDADE<br />

REPORTAGEM<br />

do Eurobarómetro, que também colocam<br />

os espanhóis entre os povos mais optimistas<br />

e confi antes no futuro. Têm um «fascínio<br />

invulgar pelo que é novo», segundo o<br />

sociólogo Amado de Miguel, 71 anos, professor<br />

na Universidade Complutense de<br />

Madrid. «Gostam de sentir que estão na<br />

vanguarda... mesmo que tal não passe de<br />

uma aparência», ironiza.<br />

Alfons Cornella lamenta que, estando à<br />

frente no «campeonato das ideias» (a produção<br />

será s<strong>em</strong>pre asiática...), ainda exista<br />

pouca concretização. «Quando procuram<br />

financiamento, não pod<strong>em</strong> pedir um milhão<br />

de euros, pensando apenas no mercado<br />

interno. Têm de pedir 25 milhões e estabelecer<strong>em</strong>-se<br />

<strong>em</strong> termos internacionais. Mas<br />

isso requer corag<strong>em</strong>, t<strong>em</strong> de se ser um pouco<br />

louco... E a banca também t<strong>em</strong> de arriscar<br />

e entrar no jogo, claro.»<br />

O fundador da Imaginarium passou por<br />

todo esse processo e partilha da mesma opi-<br />

Guru da inovação<br />

ALFONS CORNELLA, 46 anos<br />

Barcelona é uma cidade inspiradora? Criativos de todo o mundo<br />

diz<strong>em</strong> que sim: são cada vez mais os estrangeiros a montar<br />

escritório na capital catalã. Quando têm uma nova ideia, bat<strong>em</strong><br />

à porta da Infonomia, um projecto de Alfons Cornella que serve<br />

para contar ao mundo «o que aí v<strong>em</strong>». Através do site e da revista<br />

criadas por este «perito <strong>em</strong> inovação e gestão inteligente da<br />

informação <strong>em</strong> meio <strong>em</strong>presarial» partilham-se já as iniciativas<br />

de mais de 17 mil «mentes inquietas».<br />

‘A minha Espanha’<br />

«T<strong>em</strong>os um ambiente propício à criatividade<br />

e valorizamos o talento e a corag<strong>em</strong> dos <strong>em</strong>preendedores»<br />

«Não falamos inglês…»<br />

84 v 28 DE FEVEREIRO DE 2008<br />

‘<br />

Vivi <strong>em</strong> França e a forma como tratam<br />

os imigrantes é muito diferente... aqui sinto-me<br />

como na minha casa’<br />

Badr Tahmani, marroquino naturalizado espanhol<br />

nião: «Quando se inicia um projecto, t<strong>em</strong> de<br />

se ter um alto grau de inconsciência... se o<br />

lado pragmático vence, a ideia não avança.»<br />

COZINHA COM SENTIDO GLOBAL<br />

O cozinheiro David Muñoz, 28 anos, sabe<br />

b<strong>em</strong> do que fala Félix Tena. Para abrir as<br />

portas do restaurante DiverXo, teve de vender<br />

o seu apartamento e fazer cinco <strong>em</strong>préstimos<br />

bancários diferentes. «Voltei a viver<br />

<strong>em</strong> casa dos meus pais e a dividir um quarto<br />

com o meu irmão...», conta, torcendo a cara,<br />

desagradado. Mas a aposta parece ter valido<br />

a pena. Em menos de um ano, o restaurante<br />

já recebeu o aplauso dos mais exigentes crí-<br />

ticos e a lista de espera para reservar mesa<br />

atinge já os quatro meses...<br />

Em Janeiro, Muñoz <strong>foi</strong> convidado pelos<br />

mestres da cozinha espanhola para participar<br />

no festival gastronómico Madrid Fusión<br />

(um dos mais importantes do mundo) e impressionou<br />

de tal forma os seus pares que<br />

<strong>foi</strong> eleito, por unanimidade, «cozinheiro-<br />

-revelação». Mas que faz David de especial?<br />

Talvez Ferran Adriá, 47 anos, o mais famoso<br />

dos chefes da nueva cocina – que destronou a<br />

nouvelle cousine da vanguarda gastronómica<br />

– tenha dito tudo, quando acabou de jantar,<br />

no DiverXo: «Há muito t<strong>em</strong>po que não me<br />

divertia tanto!» E não é fácil surpreender<br />

Revolucionárias da moda<br />

ANNA DELGADO, 27 anos, e MACARENA BUIL, 28 anos<br />

Os outros falam, falam… mas <strong>foi</strong> a S<strong>em</strong>ana da Moda de Madrid que<br />

vedou a entrada a modelos com um Índice de Massa Corporal inferior<br />

a 18. Agora o governo propõe também revolucionar as medidas<br />

da roupa, adaptando-as às formas reais das mulheres. A dupla<br />

pr<strong>em</strong>iada de estilistas que criou a marca El Delgado Buil, apesar de<br />

não ter essa preocupação <strong>em</strong> mente, criou este ano moldes livres<br />

de condicionantes de cintura, por ex<strong>em</strong>plo, onde «cab<strong>em</strong>» quase<br />

todas as mulheres. Muitas das suas peças são também unissexo.<br />

‘A minha Espanha’<br />

«Qu<strong>em</strong> é sério no seu trabalho acaba<br />

por ser recompensado»<br />

«Como noutros países, o mercado é cruel:<br />

se não vendes não existes»<br />

A Infonomia registou, <strong>em</strong> quatro anos, 2 mil iniciativas inovadoras O Ministério da Saúde espanhol quer acabar com o nº36 na Europa


o hom<strong>em</strong> que dedica seis meses por ano<br />

à criação de receitas novas para o El Bulli<br />

(com três estrelas Michelin) e que, entre outras<br />

«loucuras», inventou o café sólido ou o<br />

pirolito com sabor a gaspacho...<br />

«Sou um cozinheiro de surpresas», explica<br />

David, com orgulho, mas, ao contrário<br />

dos seus antecessores, quer apostar<br />

claramente na fusão. A cozinha asiática<br />

t<strong>em</strong> pouca tradição (e má reputação) <strong>em</strong><br />

Espanha, por isso <strong>foi</strong> para Londres quando<br />

terminou o curso de hotelaria <strong>em</strong> Madrid.<br />

Iniciou-se no prestigiado Nobu (japonês),<br />

mas <strong>foi</strong> no Hakkasan (chinês com uma es-<br />

O senhor Imaginarium<br />

FÉLIX TENA, 44 anos<br />

Espanha t<strong>em</strong> muitas <strong>em</strong>presas de sucesso, reconhecidas a nível<br />

global, e a maioria nasceu nos últimos 15 anos, aproveitando a «boleia»<br />

de um ciclo económico de grande crescimento, s<strong>em</strong> paralelo<br />

na Europa. Entre as chamadas «irmãs mais novas da Zara» estão<br />

<strong>em</strong>presas como a Imaginarium, do sector dos brinquedos, fundada<br />

<strong>em</strong> 1992 por Félix Tena. O segredo? «É preciso ser um pouco louco<br />

e arriscar, desde o início, num projecto para o mundo.»<br />

A Imaginarium t<strong>em</strong> 350 lojas <strong>em</strong> 29 países<br />

trela Michelin) que diz ter aprendido os<br />

segredos mais preciosos. «Ali não aceitam<br />

cozinheiros ocidentais, só consegui trabalho<br />

como mestre-pasteleiro, numa cozinha<br />

à parte. E, depois de um ano a insistir todos<br />

os dias, deixavam-me vê-los trabalhar, nas<br />

minhas folgas», recorda, entusiasmado.<br />

Dominadas as técnicas tradicionais, aventurou-se<br />

na criação de «algo novo», mas<br />

<strong>em</strong> que se distinguiss<strong>em</strong> claramente as<br />

influências. «Queria fazer uma cozinha<br />

global com sentido.» Foi assim que nasceram<br />

pratos tão inesperados como o seu pr<strong>em</strong>iado<br />

dim sum de tortilha espanhola.<br />

‘<br />

O país t<strong>em</strong> cultura arquitectónica e, depois<br />

de anos de mau urbanismo, começa a impor-se<br />

uma nova forma de encarar a habitação’<br />

Pablo Oriol, arquitecto do ateliê Nolaster<br />

‘A minha Espanha’<br />

«A alegria e as 'ganas' de vencer do povo»<br />

«Discutimos muito o passado, devíamos<br />

preocuparmo-nos mais com o futuro»<br />

Qu<strong>em</strong> conseguir mesa no DiverXo provará<br />

esta e outras iguarias, s<strong>em</strong> hipótese<br />

de escolha. Ali não há <strong>em</strong>enta, apenas uma<br />

decisão a tomar: «Menu curto ou largo?»<br />

O «curto» são 18 pratos, por 43 euros. Por<br />

isso há, também, tanta gente <strong>em</strong> lista de<br />

espera. Aqui ninguém se pode apressar. O<br />

restaurante t<strong>em</strong> apenas 20 lugares e uma<br />

refeição dura, <strong>em</strong> média, três horas. «Sei<br />

que não vou fi car rico, até porque os produtos<br />

são muito caros, mas sinto-me realizado<br />

se continuar a ter a casa cheia de gente feliz.»<br />

Pelas suas contas, e a este ritmo, daqui<br />

a dez anos terá os <strong>em</strong>préstimos ao banco<br />

fi nalmente pagos...<br />

IMIGRAÇÃO TRAZ RIQUEZA<br />

O cozinheiro é um dos rostos da nova Espanha,<br />

que está na moda – <strong>em</strong>preendedora e<br />

que fascina o mundo. Já conheceu as grandes<br />

capitais da Europa e regressou à sua Madrid<br />

cosmopolita, instalando-se no bairro<br />

Expocomunicador<br />

ANTONIO SILVA DE PABLOS, 45 anos<br />

Espanha é s<strong>em</strong>pre candidata à organização de grandes eventos,<br />

do Mundial de Futebol aos Jogos Olímpicos. Este ano, a Expo'08<br />

espera atrair 6,5 milhões de visitantes a Saragoça e sensibilizá-los<br />

para o probl<strong>em</strong>a da escassez de água potável. Pela primeira vez,<br />

haverá um fórum científi co numa Expo e o seu director de comunicação<br />

acredita que o futuro da promoção de Espanha passa<br />

por iniciativas deste género. «Quer<strong>em</strong>os que fal<strong>em</strong> de água e de<br />

Saragoça tal como de Quioto <strong>em</strong> relação ao aquecimento global.»<br />

‘A minha Espanha’<br />

«A capacidade de unir os povos <strong>em</strong> paz.<br />

A Expo será um bom ex<strong>em</strong>plo disso mesmo»<br />

«Infra-estruturas: ainda nos faltam algumas ligações<br />

de alta velocidade a cidades-chave»<br />

<strong>Esta</strong> é a segunda Expo <strong>em</strong> território espanhol, <strong>em</strong> 15 anos<br />

28 DE FEVEREIRO DE 2008 v 85


SOCIEDADE<br />

REPORTAGEM<br />

Um espanhol do al-Andaluz<br />

BADR RAHMANI, 31 anos<br />

O número de imigrantes quintuplicou <strong>em</strong> apenas dez anos. O que, parodoxalmente,<br />

surtiu um efeito milagroso na economia: estudos indicam que, entre<br />

2000 e 2005, 50% do crescimento deveu-se ao contributo dos imigrantes.<br />

«Dar o salto» para Espanha é o sonho de muitos marroquinos e Badr não <strong>foi</strong><br />

excepção. Começou por estudar Engenharia de Minas mas depressa se apaixonou<br />

pelo turismo... e por uma andaluza, com qu<strong>em</strong> casou e teve dois fi lhos.<br />

Hoje é «mediador intercultural» numa escola de Córdoba e t<strong>em</strong> nacionalidade<br />

espanhola. A 9 de Março votará, com grande orgulho, pela primeira vez.<br />

‘A minha Espanha’<br />

«A liberdade...<br />

viver realmente <strong>em</strong> d<strong>em</strong>ocracia»<br />

«O terrorismo»<br />

É o segundo país da Europa com maior número de população estrangeira<br />

de Tetuán, entre bazares marroquinos e cabeleireiros<br />

africanos. Apenas lamenta que,<br />

ao contrário do que já sucede <strong>em</strong> Londres<br />

ou Nova Iorque, a integração dos imigrantes<br />

ainda se faça com «difi culdades». O chef<br />

considera que, tal como é a diversidade de<br />

Espanha que a enriquece, também «estas<br />

novas comunidades confer<strong>em</strong> um valor<br />

acrescido às cidades».<br />

O que talvez não saiba é que os imigrantes<br />

representam mesmo riqueza, <strong>em</strong> termos<br />

económicos. Segundo um relatório assina-<br />

86 v 28 DE FEVEREIRO DE 2008<br />

do por Miguel Sebastean, conselheiro do<br />

Governo, 50% do crescimento do PIB, entre<br />

2000 e 2005, deveu-se, unicamente, ao contributo<br />

do trabalho imigrante.<br />

Actualmente, 11% da população residente<br />

<strong>em</strong> Espanha nasceu noutros países,<br />

ultrapassando já os valores de França ou<br />

Inglaterra. São quase 5 milhões de habitantes,<br />

quando, na virag<strong>em</strong> do milénio, eram<br />

apenas 900 mil. A maioria veio da América<br />

Latina e de Marrocos e vive, sobretudo, <strong>em</strong><br />

Madrid.<br />

A famosa movida madrilena absorveu as<br />

infl uências e inclui já bares mais étnicos, espalhados<br />

um pouco por toda a capital – até<br />

amanhecer, não faltam festas. E val<strong>em</strong> todas<br />

as excentricidades, como no novíssimo<br />

bar Le Marquis, de inspiração fetichista...<br />

É neste universo que se mov<strong>em</strong> as mentes<br />

criativas que dão cartas no mundo da moda,<br />

das artes plásticas ou do cin<strong>em</strong>a. Depois do<br />

caminho aberto pelo cineasta Pedro Almodóvar,<br />

não são apenas as brilhantes representações<br />

<strong>em</strong> castelhano a impressionar<br />

Hollywood, como se provou esta s<strong>em</strong>ana,<br />

com a atribuição do Oscar para Melhor Actor<br />

Secundário a Javier Bard<strong>em</strong> – que fala<br />

<strong>em</strong> inglês, num fi lme dos irmãos Coen, fazendo<br />

de assassino implacável, com o corte<br />

de cabelo mais horrendo da história do<br />

cin<strong>em</strong>a.<br />

O espanhol, que o realizador Martin<br />

Scorcese diz ser «o novo Robert de Niro»,<br />

já tinha sido nomeado pela Acad<strong>em</strong>ia de<br />

Hollywood, <strong>em</strong> 2000, por Antes Que Anoiteça.<br />

Na altura, os críticos não lhe pouparam<br />

elogios – mas ninguém ousava atribuir-lhe<br />

o favoritismo. Em 2008, Javier Bard<strong>em</strong> sentou-se<br />

na primeira fi la do Kodak Theatre entre<br />

a mãe, Pilar (uma das melhores actrizes<br />

espanholas de s<strong>em</strong>pre), e Jack Nicholson. Já


se antecipava a história: pela primeira vez,<br />

um actor espanhol ganharia um Oscar. Javier<br />

Bard<strong>em</strong> agradeceu, de forma comedida,<br />

aos realizadores Coen, <strong>em</strong> inglês, depois<br />

dedicou o prémio, de forma <strong>em</strong>ocionada,<br />

<strong>em</strong> espanhol, à sua mãe... e acabou a gritar<br />

«este prémio é de Espanha!»<br />

REVOLUÇÃO SOCIAL<br />

Há momentos assim, especiais – e por mais<br />

que se antecip<strong>em</strong>, nunca se conseguirão<br />

dominar <strong>em</strong>ocionalmente. Aconteceu a<br />

Elisabet Vendrell, 43 anos, quando disse<br />

«sim» na cerimónia de casamento com<br />

Dolor Chavarría, 46, sua companheira de<br />

duas décadas. A 8 de Outubro de 2005, três<br />

Os pioneiros do cheque-bebé<br />

MARIA GARCIA, 35 anos, JOSÉ ANTONIO MARTINEZ,<br />

37 anos, e ROSENDO MARTINEZ, 4 meses<br />

O t<strong>em</strong>po das grandes famílias acabou. Espanha não escapa ao<br />

drama que afecta a Europa, não assegurando a substituição de<br />

gerações. Mas é o primeiro país do Sul a dar incentivos típicos do<br />

Norte, ao instituir o «cheque-bebé», de 2 500 euros. As regiões<br />

compl<strong>em</strong>entam o apoio, com 500 a mil euros. As mães trabalhadoras<br />

receb<strong>em</strong> ainda 100 euros mensais até aos 3 anos da<br />

criança. «É um apoio extraordinário», diz o recém-papá José<br />

‘A minha Espanha’<br />

«A qualidade de vida: a boa comida, o sol, o mar»<br />

«A difi culdade <strong>em</strong> encontrar<br />

um posto de trabalho estável»<br />

Deixa assim de ser um dos piores países no apoio à natalidade<br />

meses depois da entrada <strong>em</strong> vigor da lei que<br />

legalizou o matrimónio de homossexuais,<br />

reconhecendo-lhes, também, o direito de<br />

adoptar<strong>em</strong> filhos, o casal de lésbicas promoveu<br />

uma grande boda, convidando todos<br />

os amigos e familiares. N<strong>em</strong> todos compareceram.<br />

«A festa começou por ser um acto de militância<br />

política», conta Elisabet, professora<br />

universitária de Biologia e presidente da<br />

Associação de Famílias Gays e Lésbicas da<br />

Catalunha. «Queríamos ter um casamento<br />

como todos os nossos irmãos tiveram, para<br />

mostrar a normalidade do nosso amor»,<br />

acrescenta Dolors, investigadora na área da<br />

Pedagogia. «Hoje, recordo-o apenas como o<br />

‘<br />

Os espanhóis têm um fascínio invulgar pelo que<br />

é novo e gostam de sentir que estão na vanguarda...<br />

mesmo que tal não passe de uma aparência ’<br />

Amado de Miguel, sociólogo<br />

dia mais feliz da minha vida», confessa Elisabet,<br />

com o pequeno Josep ao colo, fi ntando<br />

as horas do sono. Com 4 anos, é o terceiro<br />

filho que adoptaram internacionalmente.<br />

Primeiro <strong>foi</strong> Miquel, <strong>em</strong> 1997, que, aos 13<br />

anos, é um pré-adolescente orgulhoso das<br />

suas mães. Dois anos depois, chegou Marlène,<br />

agora com 10 anos. Nos dois primeiros<br />

casos, a adopção <strong>foi</strong> solicitada apenas<br />

por uma das mulheres. «Tiv<strong>em</strong>os de mentir,<br />

dizendo que éramos solteiras. Isso custavanos<br />

muito», confessa Dolors.<br />

Actualmente, já casadas, partilham a<br />

guarda das crianças. «A aprovação desta<br />

lei <strong>foi</strong> um marco histórico para Espanha e<br />

espero que não se retroceda nisto», diz Dolors,<br />

l<strong>em</strong>brando as «promessas» eleitorais<br />

de Mariano Rajoy, líder do PP, que falou <strong>em</strong><br />

«acabar com a adopção gay», se for eleito.<br />

«Sab<strong>em</strong>os que é uma grande revolução<br />

de costumes, mas não há nada de errado<br />

nestas famílias. É curioso ver como os pais<br />

dos colegas de escola dos nossos fi lhos debateram<br />

o assunto connosco, quando a lei<br />

Bioarquitectos do futuro<br />

MARCOS GONZÁLEZ E PABLO ORIOL, 31 anos<br />

Espanha teve, na última década, um dos mais altos índices de<br />

construção da Europa. Ergueram-se edifícios fabulosos, como<br />

a Torre Agbar, desenhada por Jean Nouvel, redefi nindo a paisag<strong>em</strong><br />

de Barcelona. Mas surgiram também projectos de duvidosa<br />

qualidade. Agora, a chamada «bolha imobiliária» rebentou. «Ainda<br />

b<strong>em</strong>!», exclama Marcos González, arquitecto do ateliê Nolaster<br />

(Madrid), sonhando com um futuro <strong>em</strong> que mais lares sejam como<br />

a sua pr<strong>em</strong>iada «Casa Os»: confortáveis mas amigas do ambiente.<br />

‘A minha Espanha’<br />

«É um país onde é possível fazer coisas novas»<br />

«Há muitas pessoas com boas ideias<br />

mas poucas a executá-las»<br />

T<strong>em</strong> obras de todos os grandes arquitectos da actualidade<br />

28 DE FEVEREIRO DE 2008 v 87


SOCIEDADE<br />

REPORTAGEM<br />

Lésbicas, casadas, mães e felizes<br />

ELISABET VENDRELL (à dir.), 43 anos, DOLORS CHAVARRÍA, 46<br />

anos, com MIQUEL, 13 anos, MARLÈNE, 10, e JOSEP, 4<br />

O casamento e a adopção são permitidos a casais homossexuais desde Julho<br />

de 2005. Uma revolução de costumes que ainda não é b<strong>em</strong> aceite por toda a<br />

sociedade, como b<strong>em</strong> sent<strong>em</strong> Dolors e Elisabet. Apaixonadas há 22 anos, só há<br />

dez confessaram a relação à família. Casaram-se <strong>em</strong> Outubro de 2005 e fi zeram<br />

uma grande festa, «para mostrar a normalidade deste amor». Queriam muito<br />

ter fi lhos e decidiram-se pela adopção internacional.<br />

‘A minha Espanha’<br />

«A igualdade de direitos dos fi lhos e fi lhas de gays e lésbicas,<br />

o respeito pelos direitos humanos»<br />

«O atraso na luta contra as alterações climáticas»<br />

Celebraram-se, até fi nal do ano passado, 5 582 casamentos entre homossexuais<br />

<strong>foi</strong> aprovada», recorda Elisabet. «Por regra,<br />

diziam estar contra… mas depois comentavam:<br />

‘Convosco é diferente, vocês educam<br />

muito b<strong>em</strong> os vossos filhos.’ Pois aí está:<br />

não é diferente. O probl<strong>em</strong>a é que a maioria<br />

das pessoas não t<strong>em</strong> modelos e t<strong>em</strong>e o desconhecido.»<br />

No primeiro ano <strong>em</strong> que Espanha se juntou<br />

ao restrito grupo de países que permite<br />

o casamento e a adopção a casais homossexuais,<br />

foram entregues muitas candidaturas<br />

para acolher crianças, mas poucas<br />

88 v 28 DE FEVEREIRO DE 2008<br />

tiveram seguimento – os processos deste<br />

tipo levarão dois a oito anos. No casamento,<br />

tudo <strong>foi</strong> mais célere: até fi nal do ano passado,<br />

5 582 casais do mesmo sexo já tinham<br />

dado o nó.<br />

ARTE, PESO E MEDIDAS<br />

«Espanha é um país fascinante», diz, entusiasmada,<br />

Mieke Verstraeten, 36 anos, enfermeira<br />

belga, no último dos seus quatro<br />

dias de férias <strong>em</strong> Madrid. Em 2007, mais de<br />

60 milhões de turistas partilharam da sua<br />

‘<br />

Sab<strong>em</strong>os que é uma<br />

grande revolução de<br />

costumes, mas não há<br />

nada de errado com<br />

estas famílias’<br />

Elisabet Vendrell, presidente da Associação<br />

de Famílias Gays e Lésbicas da Catalunha<br />

opinião, escolhendo Espanha como destino<br />

de férias. É agora o segundo destino turístico<br />

do mundo (atrás de França) e Barcelona<br />

voltou a ser líder no que diz respeito ao chamado<br />

«turismo de conferências». Poucas<br />

cidades no mundo investiram tanto <strong>em</strong> infra-estruturas<br />

para grandes encontros internacionais<br />

e nenhuma outra conseguiria<br />

acomodar o Mobile World Congress, que<br />

juntou no mesmo local, há duas s<strong>em</strong>anas, 50<br />

mil profi ssionais das telecomunicações.<br />

Barcelona era a primeira opção da turista<br />

belga, mas não havia um único quarto<br />

vago. Por isso, escolheu Madrid, que ainda<br />

não conhecia. À porta do renovado Museu<br />

do Prado – que bateu um recorde de visitantes<br />

<strong>em</strong> 2007, com quase 3 milhões de<br />

entradas –, o namorado Walter vai dizen-


do que têm de regressar, «para apreciar<strong>em</strong><br />

melhor a gastronomia».<br />

Apesar de estar<strong>em</strong> à porta do museu, não<br />

vão entrar. «Está um dia de sol tão bonito...<br />

vamos passear», diz Mieke, abrindo o mapa<br />

da cidade. Como perceber<strong>em</strong>os depois, o<br />

casal não se entendia sobre o que fazer nessa<br />

tarde... Não era fácil. Só no capítulo da<br />

Arte, além dos Goya e Velázquez do Prado,<br />

poderiam ter visto uma das maiores retrospectivas<br />

de Picasso, no Museu Rainha Sofi a,<br />

outra de Modigliani, no Museu Thyssen, ou<br />

dar um salto à ARCO, uma das cinco feiras<br />

de arte mais importantes do mundo.<br />

No If<strong>em</strong>a, o centro de exposições de<br />

Madrid, os primeiros visitantes da ARCO<br />

cruzavam-se com os últimos convidados<br />

para os desfi les da Pasarela Cibeles. No que<br />

se refere à sua s<strong>em</strong>ana da moda a capital<br />

espanhola não t<strong>em</strong> a projecção de Paris ou<br />

Milão, mas quer afi rmar-se como um palco<br />

diferente. A organização conquistou fama<br />

mundial <strong>em</strong> 2006, quando proibiu a participação<br />

de modelos muito magras: qu<strong>em</strong><br />

tenha um Índice de Massa Corporal inferior<br />

a 18, o mínimo considerado saudável<br />

pela Organização Mundial de Saúde, fica<br />

de fora. Quis, assim, contribuir para o debate<br />

sobre os padrões de beleza impostos<br />

pelo mundo da moda.<br />

Nos bastidores do certame, ninguém<br />

gosta de falar do assunto. Mas é incontornável<br />

comentar a nova proposta do Governo,<br />

apresentada na véspera do arranque<br />

da Cibeles, que pretende revolucionar as<br />

medidas das roupas. A pedido do Ministério<br />

da Saúde, investigadores analisaram o<br />

corpo de mais de 10 mil espanholas, comparando,<br />

depois, as suas medidas com o<br />

vestuário disponível nas lojas. Confi rmaram<br />

o que a maioria das mulheres já sabia:<br />

a indústria não desenha roupa adequada às<br />

suas formas reais.<br />

O estudo concluiu que exist<strong>em</strong> três tipos<br />

de corpo: «cilindro», «ampulheta» e «pêra».<br />

E propõe que, na etiqueta das roupas, além<br />

da medida que defi ne estes três «padrões»,<br />

se junte a da altura. Para já, 80% dos industriais<br />

da moda aceitaram discutir o assunto,<br />

mas avisam que, num mercado global, estas<br />

mudanças só farão sentido se extravasar<strong>em</strong><br />

fronteiras. O ministro da Saúde, Bernart<br />

Soria, prometeu lutar, na União Europeia,<br />

pelo desaparecimento das medidas «ultrapassadas<br />

e discriminatórias» que a indústria<br />

instituiu.<br />

É mais um debate que Espanha quer liderar,<br />

honrando o l<strong>em</strong>a inscrito na sua bandeira:<br />

Plus Ultra. Não são de agora as «ganas»<br />

de querer ir «mais além».<br />

‘A diversidade é riqueza’<br />

Ideólogo da lei pró-gay diz que ainda há muito a fazer<br />

na luta contra a discriminação<br />

Deve-se a Pedro Zerolo, 48 anos, secretário<br />

dos Movimentos Sociais<br />

do PSOE, a aprovação da lei que<br />

confere os mesmos direitos civis<br />

aos casais homossexuais – uma das marcas<br />

da governação socialista. É gay, casado e<br />

candidato à adopção.<br />

Acaba de propor uma nova lei <strong>em</strong> matéria de<br />

Igualdade. Espanha não avançou o sufi ciente<br />

nesta matéria?<br />

Depende da perspectiva. Acho que, pela primeira<br />

vez, fomos pontuais no encontro com<br />

a Igualdade – estávamos s<strong>em</strong>pre atrasados.<br />

O que falta mudar?<br />

Já reconhec<strong>em</strong>os a igualdade plena de direitos<br />

entre homens e mulheres mas a Lei<br />

Integral pela Igualdade de Trato e Contra a<br />

Discriminação, que também vai ser pioneira<br />

no mundo, t<strong>em</strong> como objectivo a gestão da<br />

diversidade. Espanha t<strong>em</strong> de se orgulhar das<br />

suas várias faces: porque é branca e negra, é<br />

árabe e cristã… E de região para região t<strong>em</strong><br />

características próprias e únicas, que dev<strong>em</strong><br />

ser preservadas e respeitadas.<br />

Há qu<strong>em</strong> veja nessa diversidade uma das fraquezas<br />

de Espanha…<br />

Não, é a sua maior riqueza! Graças às políticas<br />

de Zapatero este país não está <strong>em</strong> ebulição,<br />

está efervescente. Essa efervescência<br />

gera <strong>em</strong>penho, tanto a nível cultural como<br />

<strong>em</strong>presarial, fazendo o país avançar. Está<br />

provado que os países que sab<strong>em</strong> gerir a diversidade<br />

são os que mais cresc<strong>em</strong> e enriquec<strong>em</strong>.<br />

E como se vai gerir essa diversidade?<br />

Precisamos assegurar a igualdade de oportunidades,<br />

independent<strong>em</strong>ente de qualquer<br />

causa, condição, circunstância pessoal ou<br />

social. Vamos facilitar os meios para lutar<br />

contra todas as formas de discriminação explícitas<br />

e implícitas - como a questão da idade<br />

e do aspecto físico.<br />

PEDRO ZEROLO Mudanças <strong>em</strong> Espanha pod<strong>em</strong> exercer «efeito simpatia» <strong>em</strong> Portugal<br />

Alguns bispos e dirigentes do PP têm criticado<br />

estas leis, considerando-as um «erro»...<br />

O único erro que comet<strong>em</strong>os <strong>foi</strong> o de ter<br />

acreditado que podíamos mudar aqueles<br />

que não quer<strong>em</strong> que nada mude… Custa-me<br />

ver que, <strong>em</strong>bora a esquerda governe, o poder<br />

continua na mão de certos sectores. É um<br />

poder machista, homofóbico e xenófobo,<br />

um lastro que atrasa o passo de Espanha.<br />

Sente que Espanha é hoje um ex<strong>em</strong>plo para outros<br />

países da Europa?<br />

Pod<strong>em</strong>os acelerar as mudanças noutros países<br />

latinos, exercendo um «efeito simpatia».<br />

Sei que Sócrates é corajoso, já aprovou a lei<br />

do aborto e há-de bater-se pela conquista de<br />

mais direitos sociais para os portugueses.<br />

28 DE FEVEREIRO DE 2008 v 89

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!