COMUNICAÇÃO DIOCESANA – Setembro / 2011 - Diocese de Erexim
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Estragos e/ou sinais divinos?!<br />
Uma vez por semana, na quinta-feira,<br />
às 7h, os padres da Área Pastoral <strong>de</strong><br />
Erechim se encontram para fazer juntos a<br />
oração da manhã e refletir sobre a liturgia<br />
dominical. Nós padres da Catedral, fazemos<br />
outro encontro matinal, na terça-feira,<br />
no mesmo horário, para rezarmos e<br />
combinarmos as ativida<strong>de</strong>s semanais.<br />
Na segunda terça-feira <strong>de</strong> agosto, dia<br />
09, marcado pela madrugada do vendaval<br />
<strong>de</strong>struidor em todo o nosso Estado e parte<br />
<strong>de</strong> Santa Catarina, realizamos o encontro à<br />
luz <strong>de</strong> velas, preocupados com o que po<strong>de</strong>ria<br />
ter acontecido <strong>de</strong> prejuízos para muita<br />
gente. Mesmo ainda escuro, percebemos<br />
que uma árvore no canteiro ao lado da Catedral,<br />
pela Av. Presi<strong>de</strong>nte Vargas, fora <strong>de</strong>rrubada.<br />
Na igreja, havia entrado muita água<br />
por baixo das portas. Mas não havia outros<br />
estragos.<br />
Recor<strong>de</strong>i vivamente o tempo em que<br />
em nossa casa no meio rural, como em<br />
tantas outras, não dispúnhamos da luz elétrica.<br />
Durante as férias, para ler algum tempo<br />
à noite, utilizava duas ou três velas acesas<br />
para não cansar muito as vistas. Fiquei<br />
pensando também como a nossa vida urbana<br />
atual, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> energia elétrica<br />
e combustível, po<strong>de</strong> ficar paralisada instantaneamente.<br />
Durante aquele dia e vários outros,<br />
muitas pessoas diziam nunca terem tido tanto<br />
medo e terem rezado tanto como naquela<br />
madrugada. Uma jovem, resi<strong>de</strong>nte no<br />
décimo primeiro andar <strong>de</strong> um edifício, me<br />
falou que o jeito foi agarrar-se ao terço.<br />
Rezou-o três vezes. Quanto mais forte o<br />
vento, mais alto orava, revelou. Como ela,<br />
quantos outros nos recomendamos a Deus!<br />
A oração <strong>de</strong> todos não acalmou a fúria<br />
do vento. Ele até durou bem mais do<br />
que <strong>de</strong> outras vezes. Mas é significativo<br />
que não tenha acontecido nenhuma morte.<br />
Nossa confiança e nossa súplica a Deus<br />
po<strong>de</strong>m não nos tirar os problemas ou não<br />
dar-nos soluções, arrumando emprego,<br />
carro, casa e outros bens por encanto,<br />
como certas pregações pentecostais apregoam,<br />
na chamada “teologia da prosperida<strong>de</strong>”,<br />
mas nos tornam fortes no meio <strong>de</strong>les.<br />
Como dizia esta mesma jovem, citando<br />
sua mãe: se rezando acontece tanta coisa,<br />
imagine sem oração. Significativo também<br />
foi que entre os vários eucaliptos e<br />
ciprestes <strong>de</strong>rrubados no terreno do Seminário,<br />
dois caíram a uns 20 metros do monumento.<br />
Se caíssem em direção a ele ou<br />
fossem dois bem próximos ao mesmo, o<br />
<strong>de</strong>struiriam. Na comunida<strong>de</strong> Nossa Senhora<br />
do Rosário, Sete <strong>de</strong> <strong>Setembro</strong>, paróquia<br />
São Pedro <strong>de</strong> Erechim, o vento <strong>de</strong>stroçou<br />
três pare<strong>de</strong>s e o coberto da igreja, mas<br />
<strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> pé aquela do crucifixo, do<br />
sacrário e um vasinho <strong>de</strong> flores, que permaneceram<br />
intactos. Uma imagem <strong>de</strong> Nossa<br />
Senhora foi ao chão, mas sem ser quebrada.<br />
No teto, havia o <strong>de</strong>senho <strong>de</strong> uma<br />
cruz. Foi a única parte do forro a ficar inteira<br />
entre os pedaços removidos.<br />
No meio das consequências<br />
funestas do vendaval,<br />
encontramos alguns<br />
sinais indicativos <strong>de</strong><br />
uma força maior daquela<br />
da natureza. Pelos próprios<br />
estragos e por estes sinais,<br />
Deus nos fala. O que<br />
não se apren<strong>de</strong> por amor,<br />
se apren<strong>de</strong> na dor...<br />
Ouvindo alguém falar<br />
<strong>de</strong> que rezou muito naquele<br />
momento, outra<br />
pessoa acrescentou: é necessário rezar<br />
sempre, bem antes do temporal. Escutando<br />
comentário <strong>de</strong> que, na capelinha da Catedral,<br />
diversas pessoas acendiam maços<br />
e maços <strong>de</strong> velas naquele dia e nos posteriores,<br />
alguém dizia: bastaria uma vela acesa<br />
com fé ou até nem precisaria a vela, bastaria<br />
que a gente andasse na luz <strong>de</strong> Cristo e a<br />
irradiasse sempre!<br />
No rescaldo do temporal, po<strong>de</strong>m ser<br />
feitas outras consi<strong>de</strong>rações.<br />
A primeira, já mencionada, é a da<br />
nossa limitação e <strong>de</strong>pendência. A ciência e<br />
a tecnologia continuam avançando. A cada<br />
dia, temos novos recursos à disposição.<br />
Enquanto tudo funciona, nos damos por<br />
autosuficientes, sem consciência permanente<br />
do possível colapso, sem preocupação<br />
por uma vida mais sóbria, com a indispensável<br />
preservação dos bens na natureza.<br />
É maravilhosa a informatização cada<br />
vez maior da vida. Mas basta faltar energia<br />
e tudo fica parado. Bancos, estabelecimentos<br />
comerciais, meios <strong>de</strong> comunicação não<br />
operam. Uma pessoa do interior relatava<br />
que a família acordou às 4h30 com as camas<br />
molhadas. Ouviam barulho <strong>de</strong> coisas<br />
quebrando, mas não havia o que fazer na<br />
escuridão. Ao clarear o dia, havia tanta coisa<br />
a consertar que não sabiam por on<strong>de</strong> começar.<br />
E pior, sentiam-se isolados <strong>de</strong> tudo,<br />
pois não havia como sintonizar rádio, ligar<br />
o televisor e nem utilizar o celular.<br />
Porém, mesmo com um vendaval<br />
aqui, um terremoto ali, um tsunami acolá,<br />
o consumismo <strong>de</strong>senfreado, a exploração<br />
predatória do planeta, o hedonismo, tudo<br />
continua em escala crescente e nunca o<br />
contrário. Diante da crise econômica em<br />
que se encontram as chamadas maiores<br />
economias mundiais, seus cidadãos, nem<br />
<strong>de</strong> longe, mudam <strong>de</strong> estilo <strong>de</strong> vida. Mais,<br />
exigem dos países do terceiro mundo medidas<br />
drásticas <strong>de</strong> redução do efeito estufa.<br />
Nas Conferências Mundiais sobre o<br />
meio ambiente são eles que criam impasses<br />
nas medidas a tomar. Em nome <strong>de</strong> uma<br />
mal entendida laicida<strong>de</strong> dos estados, se<br />
propugna a banição <strong>de</strong> Deus e dos símbolos<br />
religiosos em lugares públicos. Estado<br />
laico significa não ter religião oficial, mas<br />
nunca que seja sem religião, ou que os cidadãos<br />
não tenham liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> expressão<br />
religiosa. Evi<strong>de</strong>ntemente, cada cidadão respeitando<br />
a do outro.<br />
Uma segunda consi<strong>de</strong>ração é em relação<br />
à <strong>de</strong>mora no restabelecimento dos<br />
Capela N. Sra. do Rosário, Sete <strong>de</strong> <strong>Setembro</strong>,<br />
paróquia São Pedro, <strong>de</strong>struída pelo vento.<br />
serviços afetados pelo vendaval, especialmente<br />
em relação à energia elétrica, fazendo<br />
inúmeros agricultores amargarem pesadas<br />
perdas no leite, na criação <strong>de</strong> aves e<br />
suínos. Não há dúvida, o estrago foi gran<strong>de</strong><br />
e em região ampla. Falava-se em mais<br />
<strong>de</strong> dois mil postes <strong>de</strong> luz danificados. Mas<br />
se houvesse uma manutenção melhor, teriam<br />
caído tantos? Não se po<strong>de</strong> ignorar que<br />
os fenômenos extravagantes da natureza<br />
são imprevisíveis, suas consequências mais<br />
ainda. Porém, é necessário <strong>de</strong>senvolver planos<br />
estratégicos mais avançados para possíveis<br />
emergências.<br />
A terceira consi<strong>de</strong>ração é em relação<br />
às árvores <strong>de</strong>rrubadas, particularmente pinheiros<br />
(araucárias) e nativas, em relação<br />
às quais há legislação rigorosa para sua exploração.<br />
Não se questiona tal disposição.<br />
Mas quando uma árvore <strong>de</strong>stas está próxima<br />
<strong>de</strong>mais a uma residência ou apresenta<br />
<strong>de</strong>terioração, por que se dificulta tanto sua<br />
remoção antes que cause danos como os<br />
verificados no vendaval? Dizia um bispo,<br />
hoje emérito, em relação aos prédios tombados<br />
para preservação <strong>de</strong> patrimônios históricos:<br />
não <strong>de</strong>ixam reformar ou <strong>de</strong>rrubar,<br />
mas não impe<strong>de</strong>m que caiam.... Quanto aos<br />
pinheiros e árvores <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira “<strong>de</strong> lei” <strong>de</strong>rrubados<br />
pelo vento, não se po<strong>de</strong>ria apressar<br />
sua retirada, agilizando os trâmites burocráticos?<br />
Ainda hoje, vinte dias após o<br />
vendaval, escutava-se, em rádio, entida<strong>de</strong><br />
recomendando aos proprietários terem calma,<br />
dirigirem-se à secretaria <strong>de</strong> agricultura<br />
<strong>de</strong> seu município, a fim <strong>de</strong> obterem a licença<br />
para a retirada das árvores. E se uma ou<br />
mais afetam benfeitorias ou trancam o trânsito<br />
<strong>de</strong> circulação interna da proprieda<strong>de</strong>?!<br />
Que haja, sim, fiscalização rigorosa para que<br />
ninguém se aproveite da oportunida<strong>de</strong> para<br />
explorar comercialmente árvores não atingidas.<br />
Mas a legislação não vai colocar <strong>de</strong><br />
pé as que foram tombadas pelo vento...<br />
Certamente, muitos fizeram e fazem<br />
outras reflexões. A maioria das pessoas, levadas<br />
pela correria da vida, continuam tudo<br />
como se nada tivesse acontecido. Bem<br />
como no tempo <strong>de</strong> Noé <strong>–</strong> comiam, bebiam,<br />
casavam-se e davam-se em casamento ...<br />
até o momento em que veio o dilúvio e os<br />
levou a todos (Mt 24,37-39; Lc 17,26-27).<br />
Erechim, 23 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> <strong>2011</strong>,<br />
Festa <strong>de</strong> Santa Rosa <strong>de</strong> Lima, padroeira da América Latina.<br />
Pe. Antonio Valentini Neto,<br />
Pároco da Catedral São José.<br />
<strong>Setembro</strong> / <strong>2011</strong> <strong>–</strong> <strong>COMUNICAÇÃO</strong> <strong>DIOCESANA</strong> <strong>–</strong> 9