k(// / CONTRAMÃO DA HISTÓRIA' - Nosso Tempo Digital
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8<br />
ENTRE V!STA Deputado Federal Neiton Friedrich<br />
S4 CONSTITUINTE ESTÁ TIRANDO<br />
O BRASIL <strong>DA</strong> CONTRA~MÃO <strong>DA</strong> H15%TõRIU<br />
O deputado federal constituinte Nelton Friedrich, do PMDB de<br />
Toledo, sempre teve em Foz do Iguaçu uma de suas bases eleitorais e<br />
aqui recebeu uma boa votação. Por isso e porque é um político que, na<br />
Constituinte, assumiu uma postura progressista, coerente e sintonizada<br />
com as uspirações do povo, N(o <strong>Tempo</strong> aproveitou a visita que o deputado<br />
fez à redação nesta semana para levar aos leitores esta entrevista,<br />
onde ele analisa os pontos mais importantes da futura Constituição.<br />
(Juvàici Ma~)<br />
- Como político e parlamentar de<br />
linha ro;.c . -,ista, que balanço faz hoje,<br />
qunQo a nz) ,iã Constitução está quase<br />
pronta, das trabzhos da Constituinte?<br />
- Desde a apura;ão dos votos que elegerem<br />
os constituintes em 15 de novembro<br />
de 1986, notamos um avanço<br />
do conservadorismo especialmente<br />
dentro do PMDB e já no início dos trabalhos<br />
de elaboração da nova Constituição<br />
sentimos e dificuldade que teríamos<br />
para produzir uma ordem jurídica e inutucional<br />
moderna e progressista. Por<br />
isso, desde as primeiras refregas, passamos<br />
a nos articular com as forças<br />
progressistas para cobrar os desvios do<br />
PMDB, detectar os casuísmos da Nova<br />
República e identificar o governo Sarney<br />
como uma pedra no caminho da<br />
transição. Dessa vigilância, aliás, surgiu<br />
a primeira grande dissidência dentro do<br />
PMDB - o Movimento de Unidade Progressista<br />
(MUP). Apesar da predominância<br />
conservadora, e articulação das<br />
forças progressistas fez com que propostas<br />
avançadas fossem contempladas,<br />
resultando num projeto de Constituição<br />
mais moderno do que se imaginava no<br />
começo dos trabalhos; moderno, mas<br />
não suficientemente progressita, devido<br />
à forte reação conservadora que se organizou<br />
no Centrão para combater o<br />
projeto elaborado pela Comissão de<br />
Sistematização. O Centrão reuniu aquela<br />
corrente política conservadora habituada<br />
a mudar desde que fique tudo como<br />
está.___<br />
o<br />
0<br />
e<br />
N 1<br />
o<br />
0<br />
a Ea,<br />
PARA'ONDE VAI O<br />
DINHEIRO VAI O PODER<br />
- A que atribui os avanços conseguidos<br />
pela corrente progressista e qual<br />
é o mérito maior da luta por uma Constituição<br />
que reflita a necessidade de<br />
uma nova ordem política, social e institucional?<br />
- O orimeiro grande mérito desta<br />
Constituinte está no fato inédito de, ao<br />
invés de partir de um ante-projeto de<br />
Constituição, ter partido da consulta à<br />
sociedade, por onde praticamente todos<br />
os setores foram ouvidos, do sem terra<br />
ao latifundiário, do banqueiro ao bancário,<br />
do humilde trabalhador ao grande<br />
empresário; foram ouvidos os jovens, as<br />
crianças, índios, negros, mulheres, homossexuais...<br />
Por esse processo, foi<br />
possível coletar um imenso estoque de<br />
informações, questionamentoS e sugestões<br />
que, certamente, serão objeto<br />
de estudo e pesquisa por muitos anos.<br />
Graças a isso e graças à articulação das<br />
forças progressistas, foi possível consagrar<br />
avanços em alguns setores, mas<br />
mesmo assim, em alguns pontos, temos<br />
resultados extremamente negativos.<br />
- Que exemplos pode dar do que<br />
considera avanço?<br />
- Um importante avanço pode ser<br />
identificado já no primeiro artigo da<br />
Constituição, onde se consagra o reconhecimento<br />
da soberania popular ao<br />
defirir que o poder será exercido pelo<br />
povo, através de seus representantes ou<br />
diretamente. Institui-se aí o princípio<br />
moderno da democracia direta.<br />
- De que formas o povo poderá<br />
exercer o poder diretamente? Ou, como<br />
se materializa a democracia direta?<br />
- De diversas maneiras previstas<br />
na própria Constituição. Uma delas é o<br />
plebiscito, ou referendo popular previsto<br />
para diversos casos e situações.<br />
Outra é a possibilidade de os cidadãos,<br />
individual ou coletivamente, poderem<br />
apresentar propostas e projetos às câmaras<br />
de vereadores, assembléias Igislativas<br />
e ao próprio Congresso Nacional.<br />
Conseguimos avanços significativos no<br />
capítulo dos direitos individuais e coletivos,<br />
onde se consagra o respeito aos<br />
sindicatos e organizações da sociedade.<br />
Esta é a primeira vez no Brasil que a<br />
Constituição inclui dispositivos específicos<br />
sobre direitos coletivos.<br />
- Quais, por exemplo?<br />
- Entre eles está o instituto do<br />
mandado de segurança coletivo; está<br />
também o mandado de injunção, além de<br />
outros instrumentos de exercício de cidadania,<br />
por onde se quebra a visão do liberalismo<br />
arcaico centrado no individualismo.<br />
- Em que consiste o mandato de<br />
injunção?<br />
-O mandada de injução é um instrumento<br />
muito importante. Se a Constituição<br />
prevê um princípio que depende<br />
de regulamentação pela lei ordinária, o<br />
cidadão pode requerer ao Poder Judiciário<br />
que determina a regulamentação<br />
por quem de direito, seja pelo Poder<br />
Legislativo ou Executivo. E o mecanismo<br />
destinado a impedir que determindos<br />
princípios contitucionaiS permaneçam<br />
letra morta. Outro avanço pode ser<br />
identificado na questão dos partidos<br />
políticos, que deixam de ser regidos pela<br />
tutela do Estado para serem regidos<br />
pelo seu próDrio estatuto. E o importante<br />
no capítulo dos direitos e garantias<br />
individuais e coletivas é ainda que ele,<br />
no final, determina que esses direitos e<br />
garantias .devem entrar em vigor imediatamente<br />
após promulgada a Constituição.<br />
- Em que outras áreas houve<br />
avanços?<br />
- Na tributária. Se não se fez uma<br />
ampla reforma tributária, ao menos se<br />
melhorou a distribuição da receita pública.<br />
- Como se dará essa melhor distribuição<br />
- Concretamente. a União perde<br />
para os estados e municípios 30% da receita<br />
tributária que hoje controla. Isso é<br />
decisivo, pois para onde vai o dinheiro<br />
vai também o poder - e o regime militar<br />
foi pródigo nisso. Concentrou ao máximo<br />
os recursos em Braslia para dominar<br />
politicamente os estados e municípios.<br />
- Tão logo e Constituição for<br />
promulgada essa nova distribuição vai<br />
ser implantada?<br />
- Entrará em vigor paulatinamente.<br />
Alguns aspectos entrarão em vi-<br />
gor imediatamente, outros têm prazo de<br />
até cinco anos para serem implantados.<br />
- Como se dará a acomodação a<br />
esse remanejamento? O governo federal<br />
não vai cair em colapso quando perder<br />
o controle sobre 30% dos tributos<br />
que arrecada?<br />
- Não resta dúvida de que o sistema<br />
criará uma crise forte a nível de<br />
União. Mas, se o atual governo fosse<br />
sério, estaria desde agora se preparando<br />
para se adaptar à nova fórmula. Ao<br />
invés disso, vemos o próprio presidente<br />
e ministros criticando e acusando a<br />
Constituinte. Não há dúvida de que é<br />
necessário tirar o super-poder concentrado<br />
na União e, para que a acomodação<br />
à nova ordem seja o menos traumática<br />
possível, é necessária, desde já,<br />
uma ampla e profunda reforma administrativa,<br />
por onde se deve enxugar a<br />
máquina federal em benefício da divisão<br />
de atribuições e responsabilidades com<br />
os estados e municípios.<br />
- Vai mudar só no que se refere à<br />
distribuição tributária ou haverá mudanças<br />
também quanto à taxação de<br />
tributos?<br />
- Muitas coisas vão depender de<br />
um novo código 'ributário, que dependerá<br />
de regulamentação pela lei ordinária,<br />
mas desde 1á se estabelecem novidades,<br />
como a fixação de impostos<br />
sobre grandes fortunas, o que é importatissimo<br />
num país, como o nosso, em<br />
que quem paga mais impostos são os<br />
que menos ganham.<br />
- E em relação ao Poder Judiciário,<br />
o que vai haver novo?<br />
-Em relação à Justiça, a Constituinte<br />
ficou aquém do esperado, mas ai<br />
também se identificam avanços. Por<br />
exemplo, pela nova Constituição, o Juizado<br />
de Pequenas Causas se multiplicará<br />
em todo o país; o juiz de paz terá<br />
também poder de promover conciliação<br />
em casos de pequenas desavanças e ele<br />
será eleito pelo voto popular.<br />
- A nova Constituição vai ampliar<br />
significativamente muitos direitos dos<br />
trabalhadores e quem terá que pagar a<br />
conta, em grande parte, será a previ-<br />
dencia social. Ela vai poder arcar com os<br />
custos da ampliação dos direitos sociais?<br />
- A previdência precisará aumentar<br />
sua arrecadação, e para isso há, entre<br />
outros, um dispositivo que prevê<br />
contribuições tiradas do faturamento<br />
das empresas, não apenas da folha de<br />
pagamento de empregdos. Hoje, a previdência<br />
chega a ser um estimulo ao desemprego.<br />
Se uma empresa tem cem<br />
empregados, paga à previdência pelos<br />
cem empregados, mas se outra empresa,<br />
para ter a mesma produção, emprega<br />
só dez pessoas por causa da automação,<br />
ela vai pagar muito menos à previdência<br />
do que a de cem empregados.<br />
Pela nova Constituição será possível a<br />
previdência arrecadar não só sobre os<br />
empregados, mas também sobre o<br />
faturamentO alobal ou sobre o lucro.Outro<br />
rrecanismo para viabilizar a previdência<br />
deverá ser a descentralização dos recursos,<br />
açabando, desse modo, com a viagem<br />
qtie fazem da fonte de arrecadação<br />
para o governo central e de lá para sua<br />
aplicação, num percurso em que se perdem<br />
em boa parte porque são consumidos<br />
por uma imensa máquina burocrática.<br />
- O poder Legislativo, tão esvaziado<br />
pelo regime militar, vai, enfim, recuperar<br />
suas prerrogativas?<br />
- Sim, especialmente pela faculdad<br />
que terá de influir nos orçamentos<br />
e de controlar os gastos públicos. O Poder<br />
Legislativo deixará de ser o mero<br />
apêndice do Poder Executivo. As comissões<br />
técnicas permanentes do Congresso<br />
terão uma força que nunca tiveram.<br />
Em determinadas questões elas poderão<br />
decidir sem necessidade de apreciação<br />
pelo plenário. Nesse sentido, é cie se<br />
lamentar a não adoção do sistema parlamentarista<br />
de governo.<br />
CENTRÃO FAZ APOLOGIA<br />
DO CAPITAL EXTERNO<br />
- Alguma novidade significativa<br />
na ordem económica?<br />
- Na ordem econômica foi possível<br />
desmontar muito do que o Centrão<br />
estava propondo e que há mais de um<br />
séculos está superado no mundo. De<br />
acordo corri a proposta do Centrão, a<br />
ordem ejonômica se fundamentaria na<br />
livre iniciativa e no trabalho, quando o<br />
conceito universal de hoje é que e ordem<br />
econômica se fundamenta no trabalho,<br />
que é a origem da riqueza. Se<br />
dependesse do Centrão, seria instituído<br />
até o Santo Oficio.<br />
- No conflito capital versus trabalho,<br />
houve, então, uma vitória do trabalho<br />
na Constituinte?<br />
- Ainda não. Apenas o trabalho<br />
conseguiu resgatar alguns princípios<br />
alguns instrumentos. O que houve de<br />
importante nas definições sobre a ordem<br />
econômica foi a definição de empresa<br />
brasileira. Se dependesse dc<br />
Ceritrão, no dia seguinte à promulgaçãc<br />
da nova Constituição, através de meca<br />
nismos contábeis e de detalhes contra<br />
tuais' transformaria qualquer subsidiá<br />
ria de empresa multinacional em em<br />
presa nacional. E realmente lamentáve<br />
o descaramento com que o Centrão fe<br />
e continua fazendo a apologia do capita<br />
estrangeiro, em detrimento do capita<br />
nacional. Ora, que venha o capital es<br />
trangeiro, mas que seja subordinado ai<br />
interesse nacional e ao modelo de de<br />
senvolvimento escolhido pelo Brasil.<br />
- Concretamente, que derrota<br />
sofreram as teses do Centrão na