Edição 145 - Jornal Rascunho
Edição 145 - Jornal Rascunho
Edição 145 - Jornal Rascunho
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
inQuÉrito : : sergio faraCo<br />
mÉtodo de trabalho<br />
QUEM SOMOS C O N TA T O ASSINATURA DO JORNAL IMPRESSO C A R TA S<br />
Com COLUNISTAS 42 ENSAIOS anos E RESENHAS de carreira e<br />
mais de 20 obras publicadas<br />
— entre romances, livros de<br />
contos, crônicas e memórias<br />
—, Sergio Faraco afirma possuir “todas<br />
as dúvidas e incertezas possíveis”.<br />
Para o escritor nascido em Alegrete<br />
(rS), em 1940, nada mais saudável.<br />
No entanto, Faraco não deixa espaço<br />
para dúvidas quando o assunto é seu<br />
ofício: “Quem escreve tem a obrigação<br />
de buscar sempre a última fronteira de<br />
sua capacidade, jamais se contentando<br />
com menos”. Essa força, que talvez<br />
possa ser traduzida como necessidade,<br />
está presente em A dama do Bar<br />
Nevada e Noite de matar um<br />
homem, entre outros títulos que<br />
fizeram de Faraco um renomado<br />
contista brasileiro, publicado em mais<br />
de dez países e vencedor de diversos<br />
prêmios literários. Os sentimentos e<br />
idéias que movem sua criação literária<br />
e os valores e circunstâncias que<br />
considera prejudiciais ao processo<br />
criativo são abordados por Faraco no<br />
Inquérito a seguir.<br />
S DOM CASMURRO ENTREVISTASPAIOL LITERÁRIO PRATELEIRA NOTÍCIAS OTRO OJO<br />
• Quando se deu conta de que queria<br />
ser escritor?<br />
Sempre gostei de escrever, desde a adolescência,<br />
quando estava no internato e<br />
escrevia cartas a meus pais. Quando me<br />
dei conta de que podia ser um escritor,<br />
acho que eu já era.<br />
• Quais são suas manias e obsessões<br />
literárias?<br />
Não tenho. Eu costumava retrabalhar<br />
meus contos durante anos, mas não era<br />
uma obsessão, era uma necessidade.<br />
• Que leitura é imprescindível no<br />
seu dia-a-dia?<br />
Nenhuma, exceto o jornal. livros, leio<br />
mais os históricos do que os de ficção,<br />
mas se não estou lendo nada não me faz<br />
muita falta, aproveito o tempo para cuidar<br />
do meu jardim.<br />
• Quais são as circunstâncias ideais<br />
para escrever?<br />
Os dias e as horas de despreocupação, suponho.<br />
Um escritor preocupado com algo<br />
que o enerva ou irrita não tem condições<br />
de empregar todos os seus recursos.<br />
• Quais são as circunstâncias ideais<br />
de leitura?<br />
As mesmas. Sem paz de espírito não se<br />
usufrui a leitura, que também é um processo<br />
criativo.<br />
• O que considera um dia de trabalho<br />
produtivo?<br />
Escrever umas linhas legíveis ou retocá-las<br />
com vantagem, ler um bom livro,<br />
pesquisar algo importante na web ou então<br />
não fazer nada — a preguiça, segundo<br />
Quintana, também é um método de<br />
trabalho.<br />
reprodução<br />
maio de 2012<br />
• O que lhe dá mais prazer no processo de escrita?<br />
Cortar aqui, acrescentar ali, experimentar outra tônica, outra melodia, isto<br />
é, reelaborar um texto. É o que mais gosto de fazer.<br />
• Qual o maior inimigo de um escritor?<br />
A satisfação com o que realizou. É muito comum. Aquele que se satisfaz já<br />
deixou de ser escritor e não sabe. Ou nunca foi.<br />
• O que mais lhe incomoda no meio literário?<br />
tudo. Não há o que se aproveite.<br />
• Um autor em quem se deveria prestar mais atenção.<br />
Brasileiro? Jaime Prado Gouvêa, autor de Fichas de vitrola. Estrangeiros<br />
não preciso citar, já se presta atenção demais e a maioria nem merece.<br />
• Um livro imprescindível e um descartável.<br />
O Quarteto de Alexandria, de lawrence Durrell, na edição portuguesa<br />
de 1960-1. já livro descartável não sei se existe.<br />
• Que defeito é capaz de destruir ou comprometer um livro?<br />
As teses. Uma narrativa tem de se desenvolver conforme suas exigências internas<br />
e não de acordo com proposições antecipadas.<br />
• Que assunto nunca entraria em sua literatura?<br />
Não tenho restrições a temas. Se são reivindicados pelo enredo, eu os abordo<br />
sem preconceitos.<br />
• Qual foi o canto mais inusitado de onde tirou inspiração?<br />
A idéia mais estranha que me levou a escrever foi uma história de gatos: no<br />
resultado, curiosamente, não há gatos.<br />
• Quando a inspiração não vem...<br />
Não tento encontrá-la, eu espero. Se não dá hoje, dá amanhã. Só escrevo<br />
quando realmente estou com vontade e há consistências em perspectiva.<br />
• O que é um bom leitor?<br />
Cada um pode ser um bom leitor do seu próprio jeito. O que serve para mim<br />
nem sempre serve para os outros.<br />
• O que te dá medo?<br />
Escrevendo? Nada. Sempre dou o meu melhor e então não faz diferença se<br />
gostam ou não gostam, tanto os leitores como a crítica.<br />
• O que te faz feliz?<br />
Como acabo de dizer, faço o trabalho de acordo com o que sou capaz, e não<br />
espero ficar feliz ou infeliz com o resultado, que independe de minha vontade.<br />
• Qual dúvida ou certeza guia seu trabalho?<br />
tenho todas as dúvidas e incertezas possíveis. Que bom.<br />
• Qual a sua maior preocupação ao escrever?<br />
Que as emoções contidas num texto se pareçam com aquelas que me levaram<br />
a escrevê-lo.<br />
• A literatura tem alguma obrigação?<br />
Quem escreve tem a obrigação de buscar sempre a última fronteira de sua<br />
capacidade, jamais se contentando com menos.<br />
• Qual o limite da ficção?<br />
Não há limites. Ou então não entendi a pergunta.<br />
• O que lhe dá forças para escrever?<br />
As injustiças.<br />
• Se um ET aparecesse na sua frente e pedisse “leve-me ao seu líder”,<br />
a quem você o levaria?<br />
Provavelmente ele teria de fazer esse pedido a outra pessoa, eu não me lembraria<br />
de ninguém para indicar.<br />
• O que você espera da eternidade?<br />
O que posso esperar? Ela não existe, é um conceito tão mortal como qualquer<br />
outro. Morre com você.<br />
17