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Pneumonias adquiridas na comunidade Pneumonias ... - EPUC

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Novembro/Dezembro 2012<br />

Volume 100<br />

Número 5<br />

<strong>Pneumonias</strong> <strong>adquiridas</strong><br />

<strong>na</strong> <strong>comunidade</strong><br />

Manifestações extraesofágicas<br />

da DRGE<br />

Ascite no paciente cirrótico<br />

Hipertireoidismo Polimorfismo GHRd3<br />

e suas implicações <strong>na</strong><br />

prática clínica<br />

Falência hepática aguda<br />

ISSN 0047-2077


Editor: José Maria de Sousa e Melo<br />

In memoriam<br />

Gerente Geral: Daila B. Melo<br />

Gerência Executiva: Lícia M. a S. Andrade<br />

Assistente: Thereza C. Jouan Alé<br />

Redação<br />

Editor Científico: Dr. José Galvão-Alves<br />

Redator-Chefe: Dr. Almir L. da Fonseca<br />

Coorde<strong>na</strong>ção Editorial: Sheila Guedes<br />

Revisor-Chefe: Waldyr dos Santos Dias<br />

Revisores: Joel Vasconcellos<br />

Sueli B. dos Santos<br />

Contato Médico: Jorge de Moura Bastos<br />

Assistente: Jullia<strong>na</strong> P. Rodrigues<br />

Tráfego e Logística: Ma<strong>na</strong>ssés S. Pinto<br />

Programação Visual<br />

Edson de Oliveira Vilar<br />

Editoração Eletrônica<br />

Valter Batista dos Santos<br />

Sonia R. Vian<strong>na</strong> e Silva<br />

Publicidade<br />

Executivo de Contas (RJ): Silvio F. Faria<br />

Assistente: Caroli<strong>na</strong> S. de Jesus<br />

Gerente (SP): Rodrigo Faccas<br />

Executivos de Contas: An<strong>na</strong> Maria Caldeira<br />

Cauê Bonici<br />

Julia<strong>na</strong> Rampani<br />

Maria do Carmo Russo<br />

Assistente: Sirlei T.S. de Lima<br />

Secretária: M. a das Graças Santos<br />

Jor<strong>na</strong>l Brasileiro de Medici<strong>na</strong> é uma revista médico-científica<br />

bimestralmente enviada a mais de<br />

25.000 médicos com clínica ativa em todo o território<br />

<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l. JBM NÃO ACEITA EM HIPÓTESE AL-<br />

GUMA MATÉRIA PAGA EM SEU ESPAÇO EDITORIAL.<br />

Editora de Publicações Científicas Ltda.<br />

Rio de Janeiro: Av. das Américas, 1.155 — Salas 1401<br />

a 1404 — Barra da Tijuca — Tels.: 2492-1856 e 2493-<br />

2694 — Fax: 2492-1279 — CEP 22631-000 — Inscrição:<br />

81.413.177 — CNPJ 33.897.679/0001-12 — E-mail:<br />

redacao.jbm@epuc.com.br — Site: www.epuc.com.br<br />

São Paulo: Rua Dr. Diogo de Faria, 495 — Vila Clementino<br />

— Tel./Fax: 5549-2982 — CEP 04037-001 — Inscrição<br />

108.704.425.112 — CNPJ 33.897.679/0002-01<br />

— E-mail: publicidade.sp@epuc.com.br<br />

Número avulso: R$ 30,00<br />

Registrado <strong>na</strong> Base de Dados Lilacs, organizada<br />

pela Bireme (ex-Index Medicus Latino Americano)<br />

Periodicidade: Bimestral<br />

Impressão: Gráfica Tre<strong>na</strong><br />

Distribuição: Door to Door e Diremadi<br />

Representante no México: Intersistemas S.A. de<br />

C.V. - México<br />

JBM reserva-se todos os direitos, inclusive os de<br />

tradução, em todos os países sig<strong>na</strong>tários da Convenção<br />

Pan-America<strong>na</strong> e da Convenção Inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l<br />

sobre Direitos Autorais.<br />

Os trabalhos publicados terão seus direitos autorais<br />

resguardados pela <strong>EPUC</strong> que, em qualquer situação,<br />

agirá como detentora dos mesmos.<br />

Publicações do Grupo:<br />

A democracia e o silêncio<br />

acadêmico<br />

U<br />

m dos mais intrigantes questio<strong>na</strong>mentos e motivo de grande preocupação<br />

ético-cultural é o silêncio que acometeu a classe médica<br />

universitária após o fim da ditadura. Em tempos idos jamais<br />

aceitaríamos o sucateamento que envolve os hospitais universitários, especialmente<br />

no Rio de Janeiro, berço das grandes revoluções de nosso<br />

país.<br />

Os jovens, iludidos pela ascensão da medici<strong>na</strong> de alta tecnologia e<br />

defensiva, passam a desejar os hospitais privados e não mais lutam pela<br />

qualificação dos nosocômios de ensino e aceitam passivamente a morte<br />

lenta e trágica destas unidades.<br />

Um país onde o conhecimento não emerge da Universidade está<br />

fadado ao fracasso acadêmico e corre o risco de privilegiar a tecnologia<br />

em detrimento do homem. Investe-se mais <strong>na</strong>s máqui<strong>na</strong>s, aparelhos e<br />

prédios do que <strong>na</strong> sabedoria huma<strong>na</strong>, e despreza-se a experiência dos<br />

mestres, alicerce maior das grandes sociedades ao longo da história.<br />

Os exemplos não mais se espelham no saber, <strong>na</strong> ética e no humanismo,<br />

mas sim nos valores econômicos, independente da forma de<br />

conquistá-los. Os jovens se dispersam em lutas e buscas individuais e<br />

distanciam-se das causas comuns, e assim enfraquecem o todo, diminuem<br />

seu poder reivindicatório e suas possíveis conquistas. Nos Centros<br />

Acadêmicos, as lideranças não mais discutem ideias e ideais, e sim privilégios<br />

e vantagens.<br />

Conquistamos o direito de nos expressar, mas perdemos <strong>na</strong> forma,<br />

no conteúdo, <strong>na</strong> força da verdade e <strong>na</strong> maneira honesta e honrada de<br />

viver.<br />

Precisamos estimular a retidão, o comportamento ético e as ações<br />

solidárias.<br />

Precisamos reconquistar a voz da verdade e da honestidade, pois estas<br />

são e sempre serão o caminho mais curto para a felicidade e grandes<br />

conquistas.<br />

A democracia não é ape<strong>na</strong>s o direito de ir e vir, de contestar e de<br />

falar, mas, acima de tudo, o direito de viver melhor, de pensarmos o<br />

todo e de lutarmos pela igualdade entre os homens.<br />

Dr. José Galvão-Alves<br />

ISSN 0047-2077<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5 3<br />

editorial


sumário<br />

4<br />

3<br />

7<br />

17<br />

23<br />

27<br />

35<br />

41<br />

49<br />

50<br />

A democracia e o silêncio acadêmico<br />

Dr. José Galvão-Alves<br />

<strong>Pneumonias</strong> <strong>adquiridas</strong> <strong>na</strong> <strong>comunidade</strong><br />

Profs. Rafael Leal, Gunther Kissman e Carlos Alberto de Barros Franco<br />

Manifestações extraesofágicas da DRGE<br />

Drs. Luiz J. Abrahão Junior e Eponi<strong>na</strong> M. O. Lemme<br />

Ascite no paciente cirrótico<br />

Prof. Angelo Alves de Mattos<br />

Hipertireoidismo — Abordagem das principais causas<br />

e conduta diagnóstica<br />

Dra. Rosita Fontes<br />

Falência hepática aguda<br />

Dr. Olival Cirilo Luce<strong>na</strong> da Fonseca Neto<br />

Polimorfismo GHRd3 e suas implicações <strong>na</strong> prática<br />

clínica<br />

Noticiário<br />

Índice geral<br />

editorial<br />

artigos<br />

Drs. Raquel Machado Andrade, Rafaela Elvira Rozza, Mauro Geller e Karin Soares Gonçalves<br />

Cunha<br />

Atualidades médicas<br />

22 Dra. Andréa F. Mendes<br />

Panorama inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l<br />

34 Dra. Andréa F. Mendes<br />

Relato de caso<br />

Abscesso hepático — Qual a etiologia?<br />

46 Drs. J. Galvão-Alves, M. C. Galvão, D. A. Cavalcanti e N. G. Pereira<br />

seções<br />

Conselho Científico<br />

Presidente<br />

José Galvão-Alves<br />

Membros Honorários<br />

Amaury Coutinho (PE)<br />

Affonso Berardinelli Tarantino (RJ)<br />

Clementino Fraga Filho (RJ)<br />

Mário Barreto Corrêa Lima (RJ)<br />

Re<strong>na</strong>to Dani (MG)<br />

Membros Titulares<br />

Bahia<br />

Zilton A. Andrade<br />

Luis Guilherme Lyra<br />

Brasília<br />

Columbano Junqueira Neto<br />

Espírito Santo<br />

Carlos Sandoval<br />

Goiás<br />

Celmo Celeno Porto<br />

Mi<strong>na</strong>s Gerais<br />

Julio Chebli<br />

Paraná<br />

Miguel Riella<br />

Sergio Bizinelli<br />

Per<strong>na</strong>mbuco<br />

José Roberto de Almeida<br />

Rio de Janeiro<br />

Aderbal Sabrá<br />

Azor José de Lima<br />

Evandro Tinoco<br />

Fábio Cuiabano<br />

Gilberto Perez Cardoso<br />

Jorge Alberto Costa e Silva<br />

José Manoel Jansen<br />

Marta C. Galvão<br />

Mauro Geller<br />

Henrique Sergio Moraes Coelho<br />

Glaciomar Machado<br />

São Paulo<br />

Capital<br />

Adib Jatene<br />

Flair José Carrilho<br />

José Eduardo Souza<br />

José Osmar Medi<strong>na</strong> Pesta<strong>na</strong><br />

Nestor Schor<br />

Sender Miszputen<br />

Botucatu<br />

Oswaldo Melo da Rocha<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5


<strong>Pneumonias</strong> <strong>adquiridas</strong> <strong>na</strong> <strong>comunidade</strong><br />

Rafael leal<br />

GuntheR Kissman<br />

Professores auxiliares do Curso de Pneumologia da Escola Médica de Pós-graduação da PUC-Rio.<br />

Médicos da Clínica Barros Franco — Consultoria em Aparelho Respiratório.<br />

CaRlos albeRto de baRRos fRanCo<br />

Professor titular do Curso de Pneumologia da Escola Médica de Pós-graduação da PUC-Rio.<br />

Diretor médico da Clínica Barros Franco — Consultoria em Aparelho Respiratório. Membro titular<br />

da Academia Nacio<strong>na</strong>l de Medici<strong>na</strong>.<br />

Resumo<br />

<strong>Pneumonias</strong> <strong>adquiridas</strong> fora do ambiente<br />

hospitalar, definidas como pneumonias<br />

comunitárias, são patologias comuns e que<br />

podem apresentar diferentes níveis de gravidade.<br />

A abordagem diagnóstica e terapêutica<br />

depende de uma correta interpretação do<br />

quadro clínico e aspectos radiológicos. Este<br />

trabalho tem como objetivo rever as orientações<br />

atuais para o manejo das pneumonias<br />

comunitárias, baseado nos últimos dados<br />

disponíveis <strong>na</strong> literatura.<br />

Introdução<br />

As pneumonias continuam sendo uma das<br />

principais causas de morte em países desenvolvidos,<br />

mesmo nos dias atuais (1). As altas<br />

taxas de mortalidade, principalmente nos extremos<br />

das faixas etárias, justificam medidas<br />

de saúde pública, como as campanhas de<br />

vaci<strong>na</strong>ção. Os pacientes com quadros mais<br />

graves apresentam alta morbidade, geralmente<br />

com inter<strong>na</strong>ções prolongadas, gerando<br />

custos muito elevados aos órgãos públicos<br />

ou planos de saúde privada. Suas diferentes<br />

apresentações e gravidades constituem um<br />

especial desafio <strong>na</strong>s unidades de emergência.<br />

A agilidade no diagnóstico e a escolha correta<br />

Summary<br />

Pneumonia acquired outside the hospital,<br />

defined as community-acquired pneumonia,<br />

are common pathologies and may provide<br />

different levels of severity. The diagnostic<br />

and therapeutic approach depends on a correct<br />

interpretation of the clinical picture and<br />

radiologic aspects. This paper aims to review<br />

the current guidelines for the ma<strong>na</strong>gement<br />

of community-acquired pneumonia, based<br />

on the latest available data in the literature.<br />

e início precoce dos antibióticos são determi<strong>na</strong>ntes<br />

para uma boa evolução clínica.<br />

Definição<br />

As pneumonias <strong>adquiridas</strong> <strong>na</strong> <strong>comunidade</strong><br />

(PACs) são infecções do trato respiratório<br />

inferior, geralmente ocasio<strong>na</strong>das por bactérias,<br />

embora possam apresentar como agentes<br />

etiológicos vírus ou fungos. Caracterizam-<br />

-se por acometer pacientes fora de unidades<br />

hospitalares, ou com até 48 horas de hospitalização.<br />

Os agentes etiológicos variam de<br />

acordo com a gravidade do quadro, sendo o<br />

S. pneumoniae responsável por quase metade<br />

dos casos de PACs (2) (Figura 1).<br />

PAC ambulatorial (leve) Inter<strong>na</strong>dos (não em UTI) Inter<strong>na</strong>dos em UTI (grave)<br />

S. pneumoniae S. pneumoniae S. pneumoniae<br />

M. pneumoniae M. pneumoniae Bacilos Gram-negativos<br />

C. pneumoniae C. pneumoniae H. influenzae<br />

Vírus respiratórios Vírus respiratórios Legionella sp.<br />

H. influenzae H. influenzae S. aureus<br />

Legionella sp.<br />

Figura 1: Principais agentes etiológicos da PAC ( J. Bras. Pneumol., 35(6): 574-601, 2009).<br />

<strong>Pneumonias</strong> <strong>adquiridas</strong> <strong>na</strong> <strong>comunidade</strong><br />

Unitermos: Pneumonia<br />

adquirida <strong>na</strong> <strong>comunidade</strong>;<br />

diagnóstico; tratamento;<br />

antibióticos.<br />

Keywords: Community-<br />

-acquired pneumonia;<br />

diagnostic; treatment;<br />

antibiotics.<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5 7<br />

pneumologia


8<br />

<strong>Pneumonias</strong> <strong>adquiridas</strong> <strong>na</strong> <strong>comunidade</strong><br />

Coeficiente/100.000<br />

1000<br />

100<br />

10<br />

1<br />

Menor 5 anos<br />

Indivíduos com inter<strong>na</strong>ções recentes<br />

(menos de 90 dias), provenientes de asilos<br />

ou unidades assistenciais (incluindo home<br />

care), devem ser considerados um grupo particular,<br />

bem como aqueles dependentes de<br />

cuidados especiais, como quimioterapia ou<br />

hemodiálise. Desta forma, não serão o foco<br />

de discussão deste trabalho.<br />

Epidemiologia<br />

Segundo dados do Ministério da Saúde,<br />

ocorreram em 2007 cerca de 730 mil<br />

inter<strong>na</strong>ções no Brasil ape<strong>na</strong>s decorrentes de<br />

pneumonias (3). Este número corresponde à<br />

primeira causa de admissão hospitalar por<br />

doença no Sistema Único de Saúde (SUS),<br />

excluindo causas obstétricas e exter<strong>na</strong>s. Nos<br />

EUA, no ano de 2006, 1,2 milhão de pessoas<br />

foram hospitalizadas com pneumonia, com<br />

mais de 55 mil óbitos (4).<br />

As maiores incidências estão concentradas<br />

nos extremos da faixa etária, principalmente<br />

em menores de cinco anos e maiores<br />

de 70 anos. As taxas de mortalidade variam<br />

de acordo com a idade do indivíduo, observando-se<br />

os maiores coeficientes <strong>na</strong> população<br />

mais velha. Nesta parcela da população<br />

ainda se nota uma discreta curva de ascensão<br />

da mortalidade (Figura 2).<br />

2001 2002 2003 2004 2005<br />

5 a 39 anos<br />

40 a 69 anos<br />

70 e mais<br />

Figura 2: Mortalidade por faixa etária <strong>na</strong> pneumonia adquirida <strong>na</strong> <strong>comunidade</strong> ( J. Bras.<br />

Pneumol., 35(6): 574-601, 2009).<br />

Fisiopatologia<br />

Diferentes mecanismos estão envolvidos<br />

<strong>na</strong> gênese da pneumonia em pacientes imunocompetentes.<br />

A i<strong>na</strong>lação de agentes patogênicos é,<br />

sem dúvida, a forma mais comum de infec-<br />

ção. Entretanto, devido principalmente ao<br />

envelhecimento da população, observa-se<br />

um aumento expressivo das infecções decorrentes<br />

de aspiração ou mesmo microaspiração<br />

secundárias a distúrbios de deglutição.<br />

Este grupo, antes fortemente associado a<br />

pneumonias nosocomiais, tor<strong>na</strong>-se cada vez<br />

mais frequente entre os pacientes provenientes<br />

do domicílio.<br />

A inoculação direta de patógenos deve<br />

ser considerada nos pacientes com manipulação<br />

de vias aéreas inferiores ou em ventilação<br />

mecânica. A dissemi<strong>na</strong>ção hematogênica<br />

é menos frequente e geralmente associada<br />

a quadros graves, nos quais existe alta<br />

incidência de infecção por S. aureus.<br />

<strong>Pneumonias</strong> por extensão direta de infecções<br />

em órgãos adjacentes são raras, porém<br />

podem ocorrer principalmente a partir<br />

do espaço pleural e coleções subdiafragmáticas.<br />

Diagnóstico<br />

História e exame físico<br />

O quadro clínico das PACs é composto<br />

pelo início súbito de febre, geralmente alta,<br />

calafrios, tosse, além de sintomas sistêmicos<br />

como taquicardia e taquipneia.<br />

A história clínica detalhada é fundamental<br />

para o diagnóstico correto, sobretudo <strong>na</strong><br />

população mais idosa. Nestes pacientes os<br />

sintomas são geralmente menos exuberantes,<br />

e a presença de comorbidades como,<br />

por exemplo, insuficiência cardíaca pode<br />

facilmente mimetizar um quadro de infecção<br />

pulmo<strong>na</strong>r. Fatores próprios de cada indivíduo,<br />

como história de alcoolismo, doença<br />

pulmo<strong>na</strong>r prévia e outros, podem contribuir<br />

para direcio<strong>na</strong>r o esquema de tratamento a<br />

ser iniciado (Tabela 1).<br />

Durante o exame físico a identificação<br />

de ruídos ventilatórios, como estertores e<br />

roncos localizados, <strong>na</strong> presença de sintomas<br />

sugestivos de infecção, reforça o diagnóstico<br />

de pneumonia. A ocorrência de derrame<br />

pleural deve ser pesquisada tanto no momento<br />

do diagnóstico como durante a evolução<br />

do quadro, por se tratar de complicação<br />

frequente que requer abordagem específica.<br />

A aferição dos si<strong>na</strong>is vitais, incluindo a oximetria<br />

de pulso, é mandatória para a estratificação<br />

de gravidade das pneumonias, como<br />

será discutido adiante.<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5


TABELA 1: Diagnóstico microbiológico diferencial<br />

Alcoolismo S. pneumoniae, a<strong>na</strong>eróbios de boca e M. tuberculosis<br />

Doença pulmo<strong>na</strong>r obstrutiva crônica S. pneumoniae, H. influenzae, M. catarrhalis, Legionella spp.<br />

Exposição a fezes de morcegos Histoplasma capsulatum<br />

Exposição a pássaros Chlamydia psittaci<br />

Aspiração Aeróbios e a<strong>na</strong>eróbios<br />

Bronquiectasias P. aeruginosa, S. aureus<br />

Uso de drogas injetáveis S. aureus, a<strong>na</strong>eróbios, S. pneumoniae, M. tuberculosis<br />

Neutropenia Aspergillus spp.<br />

Infecção por HIV M. tuberculosis, Pneumocystis jiroveci, Cryptococcus spp., Histoplasma spp.<br />

Asplenia S. pneumoniae, H. influenza<br />

Adaptado de Cleveland Clinic: Current Clinical Medicine. 2. ed.<br />

Deve-se ter atenção aos si<strong>na</strong>is e sintomas<br />

extrapulmo<strong>na</strong>res, que podem, em muitos casos,<br />

orientar para diagnósticos diferenciais.<br />

Mal estado de dentição associado à secreção<br />

de odor pútrido sugere a ocorrência de abscesso<br />

pulmo<strong>na</strong>r. Alterações cutâneas como<br />

eritema multiforme e eritema nodoso podem<br />

representar infecções causadas por M. pneumoniae<br />

e M. tuberculosis, respectivamente<br />

(5). O baqueteamento com hipocratismo<br />

digital ocorre em pacientes com patologias<br />

que cursam com hipoxemia crônica, como o<br />

enfisema pulmo<strong>na</strong>r.<br />

Diagnóstico radiológico<br />

Os consensos mais atuais de PAC orientam<br />

para a realização de radiografia simples<br />

de tórax, <strong>na</strong>s incidências póstero-anterior e<br />

perfil, em todos os pacientes com suspeita<br />

de pneumonia (2, 6). Nos indivíduos com suspeita<br />

de derrame pleural deve ser acrescida<br />

a incidência em decúbito lateral sobre o lado<br />

suspeito. Além de ser de baixo custo e fácil<br />

realização, a radiografia de tórax pode confirmar<br />

o diagnóstico e auxiliar <strong>na</strong> definição<br />

da gravidade, como nos casos de infiltrados<br />

multilobares. Apesar de muito útil, a radiografia<br />

de tórax não ajuda <strong>na</strong> determi<strong>na</strong>ção da<br />

etiologia do quadro.<br />

A tomografia computadorizada (TC) de<br />

tórax não está indicada para os pacientes<br />

com quadros leves de PAC. Deve ser empregada<br />

nos casos em que houver dúvida<br />

no diagnóstico e em casos de radiografia<br />

normal com suspeita clínica de pneumonia.<br />

Nova TC de tórax deve ser realizada após<br />

quatro a seis sema<strong>na</strong>s do diagnóstico em<br />

pacientes tabagistas e com mais de 50 anos,<br />

devido ao risco de neoplasia pulmo<strong>na</strong>r associada<br />

à pneumonia (7, 8).<br />

Estratificação de risco<br />

Após o diagnóstico de PAC, os pacientes<br />

devem ser estratificados quanto à gravidade<br />

do quadro. Esta classificação determi<strong>na</strong> o<br />

esquema antibiótico inicial e o local de tratamento.<br />

A realização de testes de identificação<br />

etiológica será definida dependendo do<br />

nível de gravidade de cada caso.<br />

Existem descritos <strong>na</strong> literatura diversos<br />

modelos para definição de gravidade e mortalidade.<br />

É importante ressaltar que em nosso<br />

meio as condições socioeconômicas precisam<br />

ser consideradas <strong>na</strong> tomada fi<strong>na</strong>l de decisão.<br />

O Índice de Gravidade de Pneumonia<br />

(PSI em inglês) foi elaborado através da avaliação<br />

de 20 itens, entre dados físicos e laboratoriais<br />

(9) (Quadros 1 e 2). Sua aplicação<br />

<strong>na</strong> prática diária é restrita, em função dos<br />

múltiplos parâmetros a<strong>na</strong>lisados, o que pode<br />

retardar o diagnóstico. Além disso, por atribuir<br />

peso elevado à idade e à presença de<br />

comorbidades pode, em pacientes jovens e<br />

consequentemente sem doenças associadas,<br />

subestimar riscos.<br />

Um segundo modelo, proposto pela British<br />

Thoracic Society, denomi<strong>na</strong>do CURB-65,<br />

mostrou-se de mais fácil utilização nos serviços<br />

de emergência. Este protocolo considera<br />

parâmetros clínicos associados à doença agu-<br />

<strong>Pneumonias</strong> <strong>adquiridas</strong> <strong>na</strong> <strong>comunidade</strong><br />

Os consensos mais<br />

atuais de PAC orientam<br />

para a realização de<br />

radiografia simples de<br />

tórax, <strong>na</strong>s incidências<br />

póstero-anterior e<br />

perfil, em todos os<br />

pacientes com suspeita<br />

de pneumonia. Nos<br />

indivíduos com suspeita<br />

de derrame pleural deve<br />

ser acrescida a incidência<br />

em decúbito lateral sobre<br />

o lado suspeito.<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5 9


10<br />

<strong>Pneumonias</strong> <strong>adquiridas</strong> <strong>na</strong> <strong>comunidade</strong><br />

QUADRO 1: Índice de Gravidade de Pneumonia (PSI)<br />

Idade<br />

Homens<br />

Mulheres<br />

Procedentes de asilos<br />

Comorbidades<br />

Neoplasia<br />

Doença hepática<br />

ICC<br />

Doença cerebrovascular<br />

Doença re<strong>na</strong>l<br />

Fatores demográficos<br />

pH < 7,35<br />

1 ponto/ano de idade Ureia > 65mg/dl<br />

Sódio < 130mEq/dl<br />

Glicose > 250mg/dl<br />

Hematócrito < 30%<br />

PO2 < 60mmHg<br />

Derrame pleural<br />

Exame físico<br />

Alteração do estado mental<br />

F. respiratória > 30 ciclos/min<br />

PA sistólica > 90mmHg<br />

Temperatura < 35oC ou > 40o Achados laboratoriais e radiológicos<br />

+30<br />

+20<br />

idade -10<br />

+20<br />

idade +10<br />

+10<br />

+10<br />

+10<br />

+10<br />

+30<br />

+20<br />

+20<br />

+20<br />

+10<br />

+20<br />

+10<br />

C<br />

+15<br />

+10 Pulso ≥ 125 bpm<br />

+10<br />

J. Bras. Pneumol., 35(6): 574-601, 2009.<br />

QUADRO 2: Estratificação de risco, segundo o Índice de Gravidade de Pneumonia (PSI)<br />

Classe Pontos Mortalidade (%) Local sugerido de tratamento<br />

I – 0,1 Ambulatório<br />

II ≤ 70 0,6 Ambulatório<br />

III 71-90 2,8 Ambulatório ou inter<strong>na</strong>ção breve<br />

IV 91-130 8,2 Inter<strong>na</strong>ção<br />

V > 130 29,2 Inter<strong>na</strong>ção<br />

J. Bras. Pneumol., 35(6): 574-601, 2009.<br />

da, facilitando sua aplicação. É baseado em<br />

uma pontuação de 0 a 5, onde cada um dos<br />

seguintes itens recebe um ponto: confusão<br />

mental; ureia superior a 50mg/dl; frequência<br />

respiratória maior que 30irpm e pressão arterial<br />

sistólica menor que 90mmHg ou diastólica<br />

inferior a 60mmHg, além da idade supe-<br />

Escore CURB-65<br />

Figura 3: Escore CURB-65 ( J. Bras. Pneumol., 35(6): 574-601, 2009).<br />

rior a 65 anos (Figura 3). Quanto maior o número<br />

de pontos maior a gravidade do caso.<br />

A exclusão de doenças associadas pode, em<br />

alguns casos, subestimar a gravidade da infecção.<br />

Visando uma maior agilidade, uma<br />

versão simplificada foi criada, com a exclusão<br />

da mensuração da ureia (Figura 4).<br />

0-1 2 3 ou +<br />

Mortalidade baixa, 1,5% Mortalidade intermediária, 9,2% Mortalidade alta, 22%<br />

Provável candidato ao<br />

tratamento ambulatorial<br />

Considerar tratamento hospitalar<br />

Tratamento hospitalar<br />

como PAC grave<br />

Escore 4-5: avaliar<br />

inter<strong>na</strong>ção em UTI<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5


Escore CRB-65<br />

0 1 ou 2 3 ou 4<br />

Mortalidade baixa, 1,2% Mortalidade intermediária, 8,15% Mortalidade alta, 31%<br />

Provável tratamento<br />

ambulatorial<br />

Figura 4: Escore simplificado CRB-65 ( J. Bras. Pneumol., 35(6): 574-601, 2009).<br />

A oximetria de pulso e a radiografia de<br />

tórax agregam valor prognóstico ao modelo,<br />

tor<strong>na</strong>ndo-o método de escolha <strong>na</strong> estratificação<br />

do paciente com pneumonia <strong>na</strong> sala de<br />

emergência.<br />

Exames complementares<br />

A radiografia de tórax, como discutido<br />

anteriormente, é obrigatória em todo paciente<br />

com suspeita de pneumonia. A oximetria<br />

de pulso, ainda no setor de emergência,<br />

deve ser aferida antes da eventual instalação<br />

de oxigênio suplementar e com o indivíduo<br />

em repouso. Valores abaixo de 90% indicam<br />

a realização de gasometria arterial, sendo a<br />

hipoxemia forte indicador de admissão para<br />

tratamento hospitalar.<br />

Atualmente existem inúmeros marcadores<br />

biológicos em diferentes fases de implementação.<br />

Os mais usados <strong>na</strong> prática clínica são<br />

a proteí<strong>na</strong> C-reativa (PCR) e a procalcitoni<strong>na</strong><br />

(PCT), com utilização já bastante difundida nos<br />

serviços de emergência. Segundo o último<br />

consenso da Sociedade Brasileira de Pneumologia<br />

e Tisiologia (2), estes marcadores devem<br />

ser utilizados como parte do diagnóstico, porém<br />

não podem ser o único instrumento <strong>na</strong><br />

decisão sobre a indicação de tratamento. É<br />

importante lembrar que níveis séricos elevados<br />

destes marcadores podem ser encontrados em<br />

quadros distintos, como <strong>na</strong> pneumonite química<br />

e <strong>na</strong> lesão por i<strong>na</strong>lação em queimados (10).<br />

Testes de identificação etiológica<br />

Em casos de pacientes com PAC sem<br />

critérios de gravidade, a literatura atual não<br />

recomenda a realização rotineira de exames<br />

de identificação etiológica (11). Isto se deve<br />

ao fato do baixo rendimento destes métodos<br />

e da baixa mortalidade neste grupo (inferior<br />

Avaliar tratamento hospitalar<br />

Hospitalização urgente<br />

a 1%), quando iniciado tratamento empírico<br />

correto e precoce.<br />

Diante de casos graves ou em indivíduos<br />

com condições como alcoolismo e doença<br />

pulmo<strong>na</strong>r estrutural, a investigação etiológica<br />

deve ser considerada. A presença de derrame<br />

pleural ou cavitação pulmo<strong>na</strong>r também<br />

indica abordagens específicas, com utilização<br />

por vezes de métodos invasivos.<br />

Em linhas gerais, a determi<strong>na</strong>ção do<br />

agente etiológico deve ser concentrada<br />

nos casos que requerem inter<strong>na</strong>ção. Cada<br />

paciente necessita de um tipo de avaliação<br />

individualizada, buscando-se métodos que<br />

forne çam maior rendimento diagnóstico (Tabela<br />

2). Devemos ressaltar que a necessidade<br />

de realizar qualquer exame justifica o retardo<br />

no início do tratamento com antibióticos.<br />

Exame de escarro<br />

Apesar do custo baixo e de não ser invasiva,<br />

a coleta de escarro não é indicada de<br />

forma habitual <strong>na</strong> PAC. Muitos indivíduos podem<br />

apresentar dificuldade em fornecer material<br />

— mulheres e idosos, sobretudo, são<br />

incapazes de fornecer material representativo<br />

das vias áreas inferiores (< 10 células epiteliais<br />

e > 25 polimorfonucleares por campo<br />

de pequeno aumento).<br />

A coleta de escarro deve ser reservada<br />

para os casos suspeitos de tuberculose pulmo<strong>na</strong>r<br />

ou nos pacientes com doença estrutural<br />

de vias aéreas (p. ex., bronquiectasias),<br />

pelo risco de colonização por germes Gram-<br />

-negativos multirresistentes.<br />

Hemocultura<br />

A coleta de hemoculturas está indicada<br />

nos pacientes graves que necessitam de inter<strong>na</strong>ção,<br />

sobretudo em UTI. Sua aplicação<br />

<strong>Pneumonias</strong> <strong>adquiridas</strong> <strong>na</strong> <strong>comunidade</strong><br />

Pontos-chave:<br />

> Em casos de pacientes<br />

com PAC sem critérios de<br />

gravidade, a literatura atual<br />

não recomenda a realização<br />

rotineira de exames de<br />

identificação etiológica;<br />

> A determi<strong>na</strong>ção do agente<br />

etiológico deve ser concentrada<br />

nos casos que requerem<br />

inter<strong>na</strong>ção;;<br />

> Cada paciente necessita<br />

de um tipo de avaliação<br />

individualizada, buscando-se<br />

métodos que forne çam maior<br />

rendimento diagnóstico.<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5 11


12<br />

<strong>Pneumonias</strong> <strong>adquiridas</strong> <strong>na</strong> <strong>comunidade</strong><br />

O primeiro passo para<br />

o tratamento após o<br />

diagnóstico de PAC é a<br />

classificação de gravidade<br />

de acordo com os<br />

critérios já mencio<strong>na</strong>dos<br />

(PSI e CURB-65). Esta<br />

classificação implicará <strong>na</strong><br />

escolha do antibiótico<br />

e do local onde o caso<br />

deverá ser conduzido.<br />

TABELA 2: Exames complementares para diagnóstico etiológico<br />

Evidência Hemocultura Bacterioscopia Antígeno urinário Lavado Outros<br />

e cultura para pneumococo broncoalveolar ou<br />

de escarro e Legionella sp. aspirado traqueal<br />

Admissão em UTI Sim Sim Sim Sim Aspirado se<br />

PAC grave realizada<br />

intubação<br />

traqueal<br />

Abuso do uso de álcool Sim Sim<br />

Falha de tratamento clínico Sim Sim Sim Sim*<br />

Doença estrutural Não Sim Não Não<br />

Infiltrado cavitário Sim Sim Não Não BAAR<br />

Derrame pleural Sim Sim Sim Não Toracocentese<br />

UTI: unidade de terapia intensiva; PAC: pneumonia adquirida <strong>na</strong> <strong>comunidade</strong>; e BAAR: bacilo álcool-ácido resistente.<br />

* Não realizar em caso de falha de tratamento ambulatorial.<br />

J. Bras. Pneumol., 35(6): 574-601, 2009.<br />

rotineira, no entanto, ainda é controversa.<br />

Um estudo publicado em 2003, por Campbell<br />

e colaboradores, demonstrou que em<br />

uma coorte de 760 pacientes ape<strong>na</strong>s três<br />

(0,4%) obtiveram alguma melhora após mudanças<br />

terapêuticas guiadas por resultado<br />

de hemocultura (11). Além disso, falso-positivos<br />

são comuns, especialmente se houver<br />

uso prévio de antibióticos (2). O crescimento<br />

de cepas Gram-positivas fora de um contexto<br />

clínico compatível sugere contami<strong>na</strong>ção<br />

da(s) amostra(s) <strong>na</strong> coleta.<br />

Antígenos urinários<br />

Embora ainda não amplamente difundidos,<br />

os antígenos urinários para pneumococo<br />

e Legionella podem contribuir para o<br />

esclarecimento etiológico das pneumonias.<br />

Não invasivos e de rápida execução, o resultado<br />

de ambos não sofre interferência pelo<br />

uso prévio de antibióticos.<br />

O antígeno disponível para Legionella é<br />

positivo ape<strong>na</strong>s para o sorogrupo 1. Embora<br />

seja o mais comum, este teste não é capaz de<br />

identificar infecções pelos outros sorogrupos<br />

de Legionella. Pode permanecer reagente<br />

por até um ano após o quadro infeccioso,<br />

o que aumenta o risco de resultados falso-<br />

-positivos (5) em quadros pulmo<strong>na</strong>res futuros.<br />

O teste urinário para S. pneumoniae possui<br />

sensibilidade que varia de 50% a 80% e<br />

especificidade que atinge 90% (12). Falso-<br />

-positivos podem acontecer em pacientes<br />

com pneumonia por pneumococo nos três<br />

meses anteriores à realização do exame.<br />

Os dados disponíveis <strong>na</strong> literatura ainda<br />

não permitem afirmar se um teste positivo<br />

para determi<strong>na</strong>do antígeno urinário é capaz<br />

de justificar uma alteração de conduta ou é<br />

ape<strong>na</strong>s de interesse epidemiológico.<br />

Tratamento<br />

O primeiro passo para o tratamento após<br />

o diagnóstico de PAC é a classificação de<br />

gravidade de acordo com os critérios já mencio<strong>na</strong>dos<br />

(PSI e CURB-65). Esta classificação<br />

implicará <strong>na</strong> escolha do antibiótico e do local<br />

onde o caso deverá ser conduzido.<br />

Nas formas leves de PAC, quando a mortalidade<br />

é próxima a 1%, o tratamento é preferencialmente<br />

domiciliar, exceto quando há<br />

dificuldade de uso de antibiótico por via oral<br />

ou impossibilidade de aquisição do mesmo<br />

por motivos socioeconômicos. Antibióticos<br />

macrolídeos ou betalactâmicos são indicados<br />

nesses casos. A presença de comorbidades<br />

como diabetes, alcoolismo, doenças malig<strong>na</strong>s<br />

ou imunodeficiência, assim como história prévia<br />

de uso de antibiótico nos últimos três meses,<br />

tor<strong>na</strong> necessária a ampliação do esquema<br />

terapêutico para quinolo<strong>na</strong> respiratória ou associação<br />

de betalactâmico com macrolídeo.<br />

Os pacientes com critérios de gravidade<br />

devem ter o tratamento conduzido em ambiente<br />

hospitalar e ser avaliados quanto à<br />

necessidade de inter<strong>na</strong>ção em unidade de<br />

terapia intensiva (UTI).<br />

Os critérios utilizados atualmente para a<br />

definição dos casos que necessitam de inter<strong>na</strong>ção<br />

em unidades de terapia intensiva<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5


foram desenvolvidos por Ewing e colaboradores.<br />

A presença de dois critérios menores<br />

ou um critério maior define a necessidade de<br />

terapia intensiva. Essa avaliação fornece valor<br />

preditivo negativo próximo de 100%, com<br />

sensibilidade de 78% e especificidade de<br />

94% <strong>na</strong> escolha dos pacientes com indicação<br />

de UTI (13, 14) (Quadro 3).<br />

QUADRO 3: Critérios de gravidade<br />

• Critérios maiores: a presença de um critério indica<br />

a necessidade de UTI<br />

— Choque séptico necessitando de<br />

vasopressores<br />

— Insuficiência respiratória aguda com indicação<br />

de ventilação mecânica<br />

• Critérios menores: a presença de dois critérios<br />

indica a necessidade de UTI<br />

— Hipotensão arterial<br />

— Relação PaO2 /FiO2 menor que 250<br />

— Presença de infiltrados multilobulares<br />

J. Bras. Pneumol., 35(6): 574-601, 2009.<br />

Nos casos de pneumonias moderadas, ou<br />

seja, aquelas que os pacientes são inter<strong>na</strong>dos<br />

fora da UTI, o esquema terapêutico proposto<br />

é o uso de quinolo<strong>na</strong> respiratória ou associação<br />

de cefalospori<strong>na</strong> ou betalactâmico (betalactamase<br />

positiva) com macrolídeo.<br />

Para os pacientes inter<strong>na</strong>dos <strong>na</strong> terapia<br />

intensiva é necessária a ampliação do espectro<br />

de cobertura, incluindo S. aureus, além de<br />

todas as medidas de suporte hemodinâmico e<br />

ventilatório adequadas. É recomendado o emprego<br />

de cefalospori<strong>na</strong>s de terceira geração ou<br />

carbapenêmicos ou associação de piperacili<strong>na</strong><br />

com tazobactam e macrolídeo (Figura 5).<br />

Ambulatoriais<br />

Inter<strong>na</strong>dos<br />

não graves<br />

Admitidos<br />

em UTI<br />

Previamente hígidos<br />

Doenças associadas<br />

Antibióticos (3 meses)<br />

Quinolo<strong>na</strong> ou betalactâmico + macrolídeo<br />

Sem risco de<br />

Pseudomo<strong>na</strong>s sp.<br />

Com risco de<br />

Pseudomo<strong>na</strong>s sp.<br />

É importante neste momento destacar a<br />

necessidade do início precoce do tratamento<br />

de pacientes com PAC, principalmente <strong>na</strong>s<br />

formas mais graves. Um estudo abrangente<br />

publicado em 2004 mostrou que a administração<br />

da primeira dose do antibiótico <strong>na</strong>s<br />

primeiras quatro horas após a chegada ao<br />

hospital estaria associada a uma menor mortalidade<br />

e menor tempo de inter<strong>na</strong>ção (15).<br />

As diretrizes inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>is mais recentes estimulam<br />

o início da terapêutica entre quatro<br />

e oito horas, sem definir o tempo ideal da<br />

primeira dose. Porém é consenso que o tratamento<br />

seja iniciado o mais precocemente<br />

possível, ainda no setor de emergência.<br />

O tempo para tratamento é em geral de<br />

sete dias. O tratamento de PAC leve com<br />

macrolídeos, principalmente azitromici<strong>na</strong>,<br />

permite a utilização por período mais curto<br />

(cinco dias). O menor tempo de tratamento<br />

limita a indução de cepas resistentes, além<br />

de reduzir custos.<br />

Apesar dos resultados promissores, a<br />

azitromici<strong>na</strong> em microesferas (não disponível<br />

no Brasil) ainda não está liberada para uso<br />

corrente.<br />

A transição de antibioticoterapia parenteral<br />

para oral pode ser realizada quando o<br />

paciente se encontra afebril, com capacidade<br />

de ingestão oral e melhora clínica.<br />

É importante lembrar que, como qualquer<br />

tratamento, o uso de antibióticos deve<br />

ser ajustado a cada situação, podendo ser<br />

prolongado em casos de pneumonias necrosantes,<br />

presença de organismos intracelula-<br />

Macrolídeo<br />

Betalactâmico<br />

Quinolo<strong>na</strong> ou betalactâmico + macrolídeo<br />

Betalactâmico + quinolo<strong>na</strong> ou macrolídeo<br />

Betalactâmico + quinolo<strong>na</strong><br />

Figura 5: Tratamento empírico baseado nos critérios de gravidade ( J. Bras. Pneumol., 35(6): 574-601, 2009).<br />

<strong>Pneumonias</strong> <strong>adquiridas</strong> <strong>na</strong> <strong>comunidade</strong><br />

Pontos-chave:<br />

> Nos casos de pneumonias<br />

moderadas, o esquema<br />

terapêutico proposto é o uso<br />

de quinolo<strong>na</strong> respiratória ou<br />

associação de cefalospori<strong>na</strong> ou<br />

betalactâmico;<br />

> Na terapia intensiva é<br />

necessária a ampliação do<br />

espectro de cobertura;;<br />

> É recomendado o emprego<br />

de cefalospori<strong>na</strong>s de terceira<br />

geração ou carbapenêmicos ou<br />

associação de piperacili<strong>na</strong> com<br />

tazobactam e macrolídeo.<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5 13


14<br />

<strong>Pneumonias</strong> <strong>adquiridas</strong> <strong>na</strong> <strong>comunidade</strong><br />

Endereço para<br />

correspondência:<br />

Carlos Alberto de Barros<br />

Franco<br />

Rua Macedo Sobrinho,<br />

8/Grupo 203<br />

22271-080<br />

Rio de Janeiro- RJ<br />

barrosfranco@barrosfranco.<br />

com.br<br />

res (p. ex., Pseudomo<strong>na</strong>s sp.) e alterações<br />

estruturais, como bronquiectasias.<br />

Falha terapêutica<br />

Apesar de a maioria dos portadores de<br />

PAC evoluir com boa resposta e cura, cerca<br />

de 10%-24% dos pacientes hospitalizados<br />

(16) e até 7% dos tratados ambulatorialmente<br />

(17) podem apresentar algum tipo de<br />

complicação. Assim, todos os pacientes em<br />

tratamento de PAC, inclusive aqueles em tratamento<br />

domiciliar, necessitam ser periodicamente<br />

revistos, para se assegurar a eficácia e<br />

a segurança do tratamento.<br />

A falha no esquema inicial acarreta aumento<br />

significativo da mortalidade, assim<br />

como da morbidade. Isto determi<strong>na</strong> maior<br />

tempo de inter<strong>na</strong>ção e aumento dos custos<br />

totais do tratamento. As causas de falha terapêutica<br />

são inúmeras, sendo classificadas<br />

como precoces quando ocorre insuficiência<br />

respiratória com necessidade de ventilação<br />

mecânica e/ou choque séptico com menos<br />

de 72h de tratamento. A persistência de febre<br />

ou seu reaparecimento associados à piora<br />

ventilatória ou hemodinâmica após 72h caracterizam<br />

falha tardia de tratamento. As causas<br />

associadas ao fracasso da terapia inicial<br />

podem ser atribuídas à gravidade da própria<br />

doença ou até mesmo a diagnóstico incorreto,<br />

como nos casos de embolia pulmo<strong>na</strong>r e<br />

Referências<br />

11. MORAN, G.J.; TALAN, D.A. & ABRAHAMIAN, F.M. — Diagnosis<br />

and ma<strong>na</strong>gement of pneumonia in the Emergency<br />

Department. Infect. Dis. Clin. N. Am., 22: 53-72, 2008.<br />

12. SOCIEDADE BRASILEIRA DE PNEUMOLOGIA E TISIO-<br />

LOGIA — Diretrizes brasileiras para pneumonia adquirida<br />

<strong>na</strong> <strong>comunidade</strong> em adultos imunocompetentes — 2009.<br />

J. Bras. Pneumol., 35(6): 574-601, 2009.<br />

13. DATASUS — Homepage <strong>na</strong> internet. Informações de Saúde.<br />

Brasília, Ministério da Saúde.<br />

14. NAIR, G.B. & NIEDERMAN, M.S. — Community-acquired<br />

pneumonia: An unfinished battle. Med. Clin. N. Am., 95:<br />

1143-61, 2011.<br />

15. SCHMITT, S. — Cleveland Clinic: Current Clinical Medicine.<br />

2. ed.<br />

16. AMERICAN THORACIC SOCIETY. INFECTIOUS DISEASES<br />

SOCIETY OF AMERICA — Guidelines for the ma<strong>na</strong>gement<br />

of adults with hospital-acquired, ventilator-associated, and<br />

insuficiência cardíaca. Uma vez identificada a<br />

falha terapêutica, deve-se rever todo o processo<br />

diagnóstico e de tratamento.<br />

Prevenção<br />

A vaci<strong>na</strong>ção antipneumocócica é indicada<br />

em adultos maiores de 65 anos, portadores<br />

de doença crônica ou imunodeprimidos.<br />

A revaci<strong>na</strong>ção é recomendada após<br />

cinco anos para os imunocomprometidos e<br />

para aqueles que receberam a primeira dose<br />

da vaci<strong>na</strong> antes dos 65 anos de idade. Confere<br />

proteção da ordem de 60% a 70% em<br />

pacientes com sistema imune normal.<br />

A vaci<strong>na</strong> anti-influenza deve ser administrada<br />

anualmente para adultos com mais<br />

de 60 anos, portadores de doença crônica,<br />

gestantes e profissio<strong>na</strong>is de saúde. Sua eficácia<br />

está ligada a fatores imunes do paciente<br />

e à correlação entre os sorotipos incluídos<br />

em sua formulação e as cepas circulantes no<br />

ambiente. Esta vaci<strong>na</strong> deve ser evitada em<br />

pessoas com alergia conhecida à proteí<strong>na</strong> do<br />

ovo.<br />

A vaci<strong>na</strong>ção costuma ser muito bem<br />

tolerada, com baixos índices de efeitos colaterais.<br />

Sua utilização em larga escala é justificada<br />

devido ao fato de a infecção pelo vírus<br />

influenza juntamente com o pneumococo<br />

constituírem uma das principais causas de<br />

óbito em idosos.<br />

healthcare-associated pneumonia. Am. J. Respir. Crit. Care<br />

Med., 171(4): 388-416, 2005.<br />

17. MITTL JR., R.L.; SCHWAB, R.J. et al. — Radiographic resolution<br />

of community-acquired pneumonia. Am. J. Respir. Crit.<br />

Care Med., 149(3 Pt. 1): 630-5, 1994.<br />

18. WOODHEAD, M.A.; MACFARLANE, J.T. et al. — Prospective<br />

study of the aetiology and outcome of pneumonia in the<br />

community. Lancet, 1(8534): 671-4, 1987.<br />

19. MULLER, B.; HARBARTH, S. et al. — Diagnostic and prognostic<br />

accuracy of clinical and laboratory parameters in community-acquired<br />

pneumonia. BMC Infect. Dis., 7: 10, 2007.<br />

10. MASIÁ, M.; GUTIÉRREZ, F. et al. — Usefulness of procalcitonin<br />

levels in community-acquired pneumonia according<br />

to the patients outcome research team pneumonia severity<br />

index. Chest, 128(4): 2223-9, 2005.<br />

Obs.: As sete referências restantes que compõem este artigo se<br />

encontram <strong>na</strong> Redação à disposição dos interessados.<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5


Manifestações extraesofágicas da DRGE<br />

Luiz J. AbrAhão Junior<br />

Médico da Unidade de Esôfago do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho — Universidade<br />

Federal do Rio de Janeiro (HUCFF-UFRJ). Doutor em Gastroenterologia pela UFRJ e University<br />

of California, San Diego. Membro titular da Federação Brasileira de Gastroenterologia e da<br />

Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva. Inter<strong>na</strong>tio<strong>na</strong>l Member of the American Society<br />

for Gastrointesti<strong>na</strong>l Endoscopy.<br />

EponinA M. o. LEMME<br />

Professora associada do Departamento de Clínica Médica e chefe da Unidade de Esôfago do<br />

Serviço de Gastroenterologia do HUCFF-UFRJ. Presidente da Sociedade Brasileira de Motilidade<br />

Digestiva no biênio 2010-11.<br />

Resumo<br />

A doença do refluxo gastroesofágico é<br />

decorrente do fluxo retrógrado de secreção<br />

cloridropéptica para o esôfago e órgãos<br />

adjacentes, causando um espectro variável<br />

de lesões e sintomas. Sua incidência vem<br />

aumentando nos últimos anos e sua prevalência<br />

estimada <strong>na</strong> população brasileira é<br />

de cerca de 12%. A DRGE tem como manifestações<br />

típicas a pirose e a regurgitação,<br />

podendo se apresentar com queixas extraesofágicas<br />

tais como asma, tosse crônica,<br />

dor torácica não cardíaca e sintomas otorrinolaringológicos.<br />

Introdução<br />

A doença do refluxo gastroesofágico<br />

(DRGE) é uma afecção crônica que se<br />

desenvolve quando o refluxo do conteúdo<br />

gástrico causa sintomas incomoda­<br />

ti vos ou complicações, sendo sintomas incomodativos<br />

aqueles definidos pelos pacientes (1).<br />

Suas manifestações clínicas incluem a<br />

pirose e a regurgitação (sintomas típicos) e<br />

sintomas atípicos, tais como dor torácica, tosse,<br />

manifestações otorrinolaringológicas (rouquidão,<br />

pigarro, laringite) e asma, dentre outras.<br />

A doença do refluxo gastroesofágico<br />

apresenta alta prevalência <strong>na</strong> população em<br />

geral. Estima­se que cerca de 7%­10% dos indivíduos<br />

saudáveis apresentem azia, o sintoma<br />

capital da doença, diariamente.<br />

Estudo populacio<strong>na</strong>l no Brasil, avaliando<br />

aproximadamente 14 mil indivíduos saudáveis,<br />

Summary<br />

Gastro-oesophageal reflux disease is<br />

caused by the retrograde flow of gastric<br />

acid-peptic secretion into the esophagus<br />

and adjacent organs, causing a variable<br />

spectrum of lesions and symptoms. Its<br />

incidence has been increasing in recent<br />

years and its estimated prevalence in the<br />

Brazilian population is about 12%. Typical<br />

manifestations of GERD are heartburn and<br />

regurgitation, but the di sease may present<br />

with extraesophageal complaints such as<br />

asthma, chronic cough, non-cardiac chest<br />

pain and ENT symptoms.<br />

demonstrou que em torno de 12% apresentavam<br />

azia pelo menos uma vez por sema<strong>na</strong> (2).<br />

Com base no Consenso de Montreal,<br />

divide­se a DRGE em síndrome esofagia<strong>na</strong><br />

(sintomática e com lesões, tais como esofagite,<br />

estenose e esôfago de Barrett) e síndrome<br />

extraesofagia<strong>na</strong> (SEE). Esta é dividida em<br />

SEE de associação estabelecida e SEE de<br />

associação proposta (Quadro 1). Neste artigo<br />

abordaremos as SEEs, a que chamaremos de<br />

manifestações extraesofágicas (MEEs).<br />

Fisiopatologia das manifestações<br />

extraesofágicas<br />

O mecanismo fisiopatológico pelo qual o<br />

refluxo gastroesofágico (RGE) induz as MEEs<br />

não está, ainda, muito bem elucidado.<br />

Admitem­se dois mecanismos para o surgimento<br />

destas manifestações:<br />

Manifestações extraesofágicas da DRGE<br />

Unitermos: Refluxo<br />

gastroesofágico; refluxo<br />

laringofaríngeo/diagnóstico<br />

e terapia.<br />

Keywords:<br />

Gastroesophageal reflux;<br />

laryngopharyngeal reflux/<br />

diagnosis and therapy.<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5 17<br />

gastroenterologia


18<br />

Manifestações extraesofágicas da DRGE<br />

Pontos-chave:<br />

> Das manifestações<br />

respiratórias associadas ao<br />

refluxo, a asma e a tosse<br />

crônica são as mais estudadas;<br />

> Há maior incidência de<br />

refluxo em asmáticos, sendo<br />

encontrado em 55% a 80% dos<br />

pacientes;<br />

> Pacientes com DRGE têm<br />

maior prevalência de asma<br />

do que os que não possuem<br />

DRGE, sendo o fator isolado<br />

que mais dificulta o controle da<br />

asma.<br />

QUADRO 1: Síndromes extraesofagia<strong>na</strong>s (1)<br />

Associação Associação<br />

estabelecida proposta<br />

Tosse Faringite<br />

Laringite Sinusite<br />

Asma Fibrose pulmo<strong>na</strong>r<br />

idiopática<br />

Erosão dentária Otite média crônica<br />

1. Teoria do refluxo, segundo a qual o RGE<br />

atingiria a faringolaringea, ocasio<strong>na</strong>ndo<br />

lesões nestas áreas por contato (manifestação<br />

ORL) ou por aspiração, gerando<br />

broncoespasmo/infecção (manifestação<br />

respiratória).<br />

2. Teoria do reflexo, em que o estímulo pelo<br />

ácido refluído geraria um reflexo de <strong>na</strong>tureza<br />

vagal, desencadeando tosse e pigarro,<br />

os quais, acentuados pelo hábito e fatores<br />

emocio<strong>na</strong>is, propiciariam lesões <strong>na</strong> laringe<br />

e perpetuação dos sintomas.<br />

O mesmo estímulo poderia gerar reflexo<br />

esofagobrônquico, com vias aferente e<br />

eferente de <strong>na</strong>tureza vagal e surgimento de<br />

broncoespasmo. A combi<strong>na</strong>ção dos dois mecanismos<br />

poderia também estar presente no<br />

mesmo paciente (3).<br />

Papel do refluxo “não ácido” <strong>na</strong>s MEEs<br />

da DRGE<br />

O refluxo “não ácido” ou fracamente ácido<br />

é o que ocorre no período pós­prandial, e<br />

o refluxato é o conteúdo gástrico tampo<strong>na</strong>do<br />

pelo alimento ou cujo pH foi alterado pelo<br />

uso de IBP. Tem sido relacio<strong>na</strong>do a sintomas<br />

persistentes, principalmente à tosse e regurgitação<br />

em pacientes em uso de IBPs. O<br />

refluxo “não ácido” pode ser demonstrado<br />

pelo emprego da impedâncio­pHmetria prolongada,<br />

equipamento que avalia, por meio<br />

de cateter contendo pares de eletrodos de<br />

impedância, o trânsito de bolus no interior do<br />

esôfago, quer de forma anterógrada (deglutição,<br />

alimento) ou retrógrada (refluxo), e sua<br />

consistência (líquida, sólida ou gasosa). O pH<br />

do refluxato é avaliado por um sensor de pH,<br />

podendo ser ácido (pH abaixo de 4) ou “não<br />

ácido” ou fracamente ácido (acima de 4). A<br />

maior importância do método é a possibilidade<br />

de correlação entre os sintomas ocorridos e<br />

episódios de refluxo (índice de sintomas positivo),<br />

sejam eles ácidos ou não ácidos, para<br />

que se estabeleçam a causalidade e o tratamento<br />

adequado. Estima­se que 12%­15%<br />

dos pacientes com tosse crônica persistente<br />

<strong>na</strong> vigência de IBPs possam ter este sintoma<br />

relacio<strong>na</strong>do a refluxo “não ácido” (14).<br />

Manifestações respiratórias<br />

Das manifestações respiratórias associadas<br />

ao refluxo, a asma e a tosse crônica são<br />

as mais estudadas.<br />

Há maior incidência de refluxo em asmáticos,<br />

sendo encontrado em 55% a 80% dos<br />

pacientes, porém é difícil avaliar a verdadeira<br />

importância da associação, pois tanto a DRGE<br />

como a asma são de grande prevalência <strong>na</strong><br />

população em geral. Pacientes com DRGE<br />

têm maior prevalência de asma do que os que<br />

não possuem DRGE, sendo o fator isolado que<br />

mais dificulta o controle da asma (4).<br />

O surgimento de sintomas respiratórios <strong>na</strong><br />

idade adulta, a piora ou o desencadeamento<br />

dos sintomas com refeições copiosas, ingestão<br />

de bebidas alcoólicas ou pela madrugada,<br />

após as mesmas, constituem elementos para<br />

o diagnóstico. Outras peculiaridades seriam<br />

a ausência de componente intrínseco e a<br />

má resposta a broncodilatadores e corticosteroides.<br />

Quando interrogados, 40%­70%<br />

dos pacientes apresentarão sintomas típicos,<br />

existindo, portanto, uma parcela de pacientes<br />

em que a asma pode ser a única manifestação.<br />

Considera­se tosse crônica a que persiste<br />

por três ou mais sema<strong>na</strong>s em não fumantes<br />

(3). Está presente em 10%­40% dos pacientes<br />

com refluxo, e a maioria atribui seu início a<br />

uma infecção respiratória.<br />

Em pacientes não fumantes, que não<br />

estejam usando inibidores da enzima conversora<br />

da angiotensi<strong>na</strong> e com radiografia de<br />

tórax normal, as causas mais comuns de tosse<br />

crônica são descarga pós­<strong>na</strong>sal, DRGE e asma<br />

ou bronquite crônica, responsáveis por mais<br />

de 90% dos casos.<br />

A tríade principal da tosse crônica envolve<br />

asma, secreção pós­<strong>na</strong>sal e refluxo. A tosse relacio<strong>na</strong>da<br />

a refluxo predomi<strong>na</strong> durante o dia e<br />

em posição ortostática, durante a fo<strong>na</strong>ção, ao<br />

se levantar da cama e ao se alimentar. Alguns<br />

pacientes podem referir sintomas noturnos.<br />

Pode ser não produtiva ou produzir excesso<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5


de muco, tendo duração média de 13­58<br />

meses. Entre 40%­70% dos pacientes não<br />

têm sintomas de refluxo, enquanto a parcela<br />

restante refere os sintomas típicos precedendo<br />

ou sucedendo o aparecimento da tosse.<br />

Os critérios de seleção para se investigar<br />

refluxo em pacientes com tosse crônica incluem<br />

não tabagismo, ausência de irritantes<br />

ambientais, exclusão de asma, secreção<br />

pós­<strong>na</strong>sal e uso de inibidores de enzima conversora<br />

de angiotensi<strong>na</strong> (ECA), Rx de tórax e<br />

seios da face normais.<br />

Outras manifestações que podem estar<br />

relacio<strong>na</strong>das ao refluxo são a pneumonia de<br />

aspiração, bronquiectasia, bronquite crônica,<br />

fibrose pulmo<strong>na</strong>r e presença de esclerose<br />

sistêmica progressiva.<br />

O diagnóstico da tosse secundária à<br />

DRGE pode ser difícil, uma vez que muitos<br />

pacientes não apresentam os sintomas típicos<br />

da doença.<br />

Manifestações<br />

otorrinolaringológicas<br />

A relação entre DRGE e manifestações<br />

do trato aerodigestivo superior, ou otorrinolaringológicas<br />

(ORLs), também tem sido<br />

bastante estudada. Em torno de 25% dos<br />

pacientes com DRGE apresentam sintomas<br />

relacio<strong>na</strong>dos à cabeça e pescoço e 10% dos<br />

pacientes que procuram o ORL têm sintomas<br />

ou si<strong>na</strong>is que podem ser atribuídos a refluxo.<br />

As queixas mais frequentes são rouquidão,<br />

redução do volume ou falha vocal, pigarro,<br />

necessidade de “clareamento” da garganta<br />

e sensação de globo cervical, sintomas estes<br />

que vêm isoladamente ou em combi<strong>na</strong>ção,<br />

disfagia de localização alta, por vezes com<br />

engasgos ao ato da deglutição, e sensação<br />

de asfixia notur<strong>na</strong>, acompanhada ou não de<br />

estridor laríngeo.<br />

Metade dos pacientes, quando interrogados,<br />

apresentarão queixas típicas, e a existência<br />

de pirose diária ou frequente é preditiva<br />

de refluxo em pacientes com queixas ORLs.<br />

É importante uma história cuidadosa, pois as<br />

queixas laríngeas necessitam diagnóstico diferencial.<br />

Fatores de risco associados incluem<br />

uso frequente da voz, tabagismo, história de<br />

infecções do trato respiratório superior, vômitos,<br />

secreção pós­<strong>na</strong>sal, regurgitação notur<strong>na</strong>,<br />

sintomas alérgicos, contato com animais, uso<br />

recente de ar condicio<strong>na</strong>do ou exposição a<br />

ambientes novos contendo material sintético.<br />

As manifestações ORLs mais frequentemente<br />

descritas estão no Quadro 2.<br />

QUADRO 2: Manifestações ORLs da DRGE (4)<br />

Rouquidão Alterações vocais<br />

Tosse Globo<br />

Dor de garganta Pigarro<br />

Faringite Laringite<br />

Granuloma de prega vocal Disfagia<br />

Estenose subglótica Câncer de laringe<br />

Recentes “candidatos” a manifestações<br />

ORLs da DRGE são a sinusite crônica, a otite<br />

média recorrente, causa frequente de otite<br />

em crianças, e o laringospasmo paroxístico (5).<br />

Deve­se suspeitar de refluxo em casos de<br />

rouquidão pela manhã, piora dos sintomas<br />

com chocolate, café, refeições copiosas, em<br />

casos de ganho de peso precedendo o início<br />

dos sintomas e presença de pirose e/ou regurgitação<br />

ácida, observada em metade dos<br />

pacientes (4).<br />

A maioria dos pacientes com queixa ORL,<br />

com ou sem sintomas típicos associados,<br />

procura um ORL para investigação, sendo <strong>na</strong><br />

maioria das vezes realizada uma laringoscopia.<br />

Anormalidades <strong>na</strong> laringe associadas à DRGE<br />

incluem laringite posterior (edema ou eritema),<br />

frequentemente referida como “laringite<br />

de refluxo”, nódulos em pregas vocais, úlceras<br />

de contato e granulomas, estenose de laringe,<br />

aspecto calcetado de parede posterior e muco<br />

excessivo. No entanto, estas anormalidades<br />

não são específicas da DRGE. Um estudo demonstrou<br />

pelo menos um destes achados em<br />

85% de um grupo de mais de 200 voluntários<br />

saudáveis (6).<br />

Investigação<br />

Infelizmente, não há um teste definitivo<br />

que identifique o refluxo como causa das<br />

manifestações extraesofágicas da DRGE.<br />

A investigação deve se iniciar com a realização<br />

da endoscopia digestiva alta (EDA),<br />

embora a esofagite erosiva seja incomum<br />

neste grupo de pacientes, em torno de 5%­<br />

­10%, e de modo geral leve — ao contrário<br />

das manifestações típicas, em que está<br />

Manifestações extraesofágicas da DRGE<br />

Os critérios de seleção<br />

para se investigar refluxo<br />

em pacientes com tosse<br />

crônica incluem não<br />

tabagismo, ausência de<br />

irritantes ambientais,<br />

exclusão de asma,<br />

secreção pós-<strong>na</strong>sal e<br />

uso de inibidores de<br />

enzima conversora de<br />

angiotensi<strong>na</strong> (ECA), Rx<br />

de tórax e seios da face<br />

normais.<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5 19


20<br />

Manifestações extraesofágicas da DRGE<br />

Pontos-chave:<br />

> Na ausência de esofagite<br />

erosiva, o método de escolha<br />

para o diagnóstico de refluxo<br />

neste grupo de pacientes é a<br />

pHmetria (PHM);<br />

> Na investigação das<br />

manifestações extraesofágicas<br />

da DRGE tem sido preconizada<br />

a PHM de dois sensores;<br />

> Não existe consenso a<br />

respeito da importância do<br />

refluxo proximal.<br />

presente em 30%­50% dos mesmos. Alguns<br />

recomendam a EDA ape<strong>na</strong>s em pacientes com<br />

queixas típicas associadas de longa duração e<br />

para a procura de esôfago de Barrett.<br />

Na ausência de esofagite erosiva, o método<br />

de escolha para o diagnóstico de refluxo<br />

neste grupo de pacientes é a pHmetria (PHM)<br />

esofagia<strong>na</strong> prolongada, que apresenta maior<br />

sensibilidade neste particular. Meta­análise<br />

envolvendo cinco estudos e 316 pacientes<br />

com queixas ORLs demonstrou refluxo anormal<br />

em 44%, em média (7). Em pacientes<br />

asmáticos, a meta­análise de nove estudos e<br />

646 pacientes encontrou média de refluxo por<br />

PHM em 51% (8).<br />

A positividade da PHM depende em<br />

grande parte dos critérios de seleção<br />

(história altamente sugestiva, pacientes<br />

consecutivos ou ao acaso), do número de<br />

pacientes e da <strong>na</strong>tureza do estudo (prospectivo,<br />

retrospectivo).<br />

Na investigação das manifestações extraesofágicas<br />

da DRGE tem sido preconizada a<br />

PHM de dois sensores, o distal <strong>na</strong> posição<br />

tradicio<strong>na</strong>l (5cm acima do esfíncter inferior) e<br />

um proximal. Entretanto, não existe consenso<br />

a respeito da importância do refluxo proximal,<br />

dos valores normais e nem do melhor posicio<strong>na</strong>mento<br />

do segundo sensor, se no esôfago<br />

alto, esfíncter superior ou faringe. Devido a<br />

estas controvérsias, tem sido questio<strong>na</strong>da a<br />

utilidade da PHM de dois sensores.<br />

Figura 1: Traçado de impedâncio-pHmetria.<br />

A impedâncio­pHmetria está principalmente<br />

indicada nos pacientes com suspeita<br />

de DRGE e manifestações extraesofágicas<br />

que persistem, apesar do uso de IBPs em<br />

dose dupla, para o diagnóstico de refluxo<br />

não ácido e correlação com índice de sintomas<br />

(Figura 1).<br />

Mais recentemente, dois métodos têm<br />

ganhado importância <strong>na</strong> investigação das<br />

MEEs da DRGE. O primeiro é a dosagem<br />

da pepsi<strong>na</strong> salivar, o Peptest, um método<br />

simples e não invasivo para se diagnosticar<br />

refluxo laringofaríngeo. Outro novo método é<br />

a pHmetria de faringe minimamente invasiva,<br />

o Restech, capaz de detectar quantidades<br />

mínimas de ácido refluído para a faringe com<br />

mínimo desconforto (Figura 2).<br />

Figura 2: pHmetria de faringe — Restech.<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5


Tratamento das manifestações<br />

extraesofágicas<br />

Interroga­se se as manifestações extraesofágicas<br />

da DRGE seriam uma associação ou<br />

causalidade, devido à sua elevada prevalência.<br />

Há significativa associação epidemiológica<br />

entre as MEEs e a DRGE, inclusive com explicações<br />

fisiopatológicas plausíveis. A relação<br />

temporal entre os sintomas e refluxo pode ser<br />

demonstrada por PHM, e há eficácia de intervenções<br />

terapêuticas em alguns pacientes (9).<br />

Em relação à asma, uma revisão de oito<br />

estudos controlados e randomizados (10)<br />

revelou que o tratamento da DRGE levou à<br />

melhora sintomática de 60% dos asmáticos<br />

tratados e reduziu a necessidade de uso de<br />

broncodilatadores, porém a melhora das<br />

provas de função pulmo<strong>na</strong>r (PFPs) ocorreu<br />

em ape<strong>na</strong>s 25% dos pacientes. Outra meta­<br />

­análise, envolvendo 12 estudos de pacientes<br />

tratados com antagonistas H2 ou inibidores<br />

de bomba protônica (IBPs), demonstrou que<br />

de modo geral não havia melhora das PFPs,<br />

dos sintomas da asma ou noturnos, embora<br />

um seleto subgrupo tenha se beneficiado da<br />

terapêutica antirrefluxo (11).<br />

Estudo recente de pacientes com tosse<br />

crônica, randomizado, placebo­controlado,<br />

com IBPs em dose dupla, demonstrou ausência<br />

de melhora dos sintomas ou da qualidade<br />

de vida dos pacientes (12).<br />

Em relação às manifestações ORLs, de<br />

cinco estudos controlados (IBPs versus placebo)<br />

ape<strong>na</strong>s um mostrou resultados favoráveis<br />

aos IBPs (4). Estudo recente envolvendo 145<br />

pacientes com “laringite de refluxo”, tratados<br />

com esomeprazol duas vezes ao dia versus<br />

Referências<br />

11. VAKIL, N. et al. — The Montreal definition and classification<br />

of gastroesophageal reflux disease: A global evidence­based<br />

consensus. Am. J. Gastroenterol., 101(8): 1900­20, 2006.<br />

12. MORAES­FILHO, J.P. et al. — Prevalence of heartburn and<br />

gastroesophageal reflux disease in the urban Brazilian population.<br />

Arq. Gastroenterol., 42(2): 122­7, 2005.<br />

13. FRYE, J.W. & VAEZI, M.F. — Extraesophageal GERD. Gastroenterol.<br />

Clin. North Am., 37(4): 845­58, 2008.<br />

14. RICHTER, J.E. — Review article: Extraoesophageal manifestations<br />

of gastro­oesophageal reflux disease. Aliment.<br />

Pharmacol. Ther., 22 (Suppl. 1): 70­80, 2005.<br />

15. POELMANS, J. & TACK, J. — Extraoesophageal manifestations<br />

of gastro­oesophageal reflux. Gut, 54(10): 1492­9, 2005.<br />

16. HICKS, D.M. et al. — The prevalence of hypopharynx findings<br />

associated with gastroesophageal reflux in normal volunteers.<br />

J. Voice, 16(4): 564­79, 2002.<br />

placebo, por quatro meses, revelou que a<br />

resolução dos sintomas ORLs ocorreu em ape<strong>na</strong>s<br />

15% e 16% dos dois grupos, e a melhora<br />

dos sintomas foi semelhante (13).<br />

As razões da falta de resposta das MEEs<br />

ao tratamento com IBPs têm sido a<strong>na</strong>lisadas<br />

e envolvem falta de adesão ao tratamento,<br />

necessidade de doses maiores do que as<br />

habituais, além de tempo mais prolongado<br />

de tratamento. Na maior parte dos casos o<br />

paciente melhora da pirose, preditora da associação,<br />

e persistem as MEEs, sugerindo que<br />

elas não seriam causadas por RGE.<br />

Questio<strong>na</strong>­se se o tratamento deve ser<br />

feito <strong>na</strong> base da suspeita clínica (estratégia<br />

empírica) ou após estratégia investigativa,<br />

com o diagnóstico de refluxo anormal feito<br />

por PHM antes do tratamento. Nas duas estratégias<br />

preconiza­se, além das medidas posturais<br />

e comportamentais, o emprego de IBPs<br />

duas vezes ao dia (em jejum e antes do jantar)<br />

por três meses, avaliando­se a resposta e/ou<br />

prosseguimento de investigação após isto (9).<br />

No tocante ao refluxo não ácido, uma vez<br />

estabelecida relação causa/efeito através do<br />

índice de sintomas positivo, alguns autores<br />

têm recomendado a realização da fundoplicatura,<br />

principalmente nos indivíduos com refluxo<br />

ácido anormal em pHmetria convencio<strong>na</strong>l<br />

prévia. Drogas inibidoras dos relaxamentos<br />

transitórios do esfíncter esofágico inferior<br />

(EEI) podem ser utilizadas (como, por exemplo,<br />

o baclofeno), com resultados variáveis e<br />

efeitos colaterais indesejáveis (sonolência).<br />

Novas drogas inibidoras dos relaxamentos<br />

transitórios do EEI, com melhor perfil de segurança,<br />

estão em estudo.<br />

17. WONG, R.K. et al. — ENT manifestations of gastroesophageal<br />

reflux. Am. J. Gastroenterol., 95(8 Suppl.): S15­22, 2000.<br />

18. HAVEMANN, B.D.; HENDERSON, C.A. & EL­SERAG, H.B. —<br />

The association between gastro­oesophageal reflux disease<br />

and asthma: A systematic review. Gut, 56(12): 1654­64, 2007.<br />

19. GALMICHE, J.P.; ZERBIB, F. & BRULEY DES VARANNES, S.<br />

— Review article: Respiratory manifestations of gastro­<br />

­oesophageal reflux disease. Aliment. Pharmacol. Ther., 27(6):<br />

449­64, 2008.<br />

10. FIELD, S.K. & SUTHERLAND, L.R. — Does medical antireflux<br />

therapy improve asthma in asthmatics with gastroesophageal<br />

reflux? A critical review of the literature. Chest, 114(1): 275­83,<br />

1998.<br />

Obs.: As quatro referências restantes que compõem este artigo<br />

se encontram <strong>na</strong> Redação à disposição dos interessados.<br />

Manifestações extraesofágicas da DRGE<br />

Endereço para<br />

correspondência:<br />

Luiz J. Abrahão Junior<br />

Av. Jor<strong>na</strong>lista Alberto<br />

Francisco Torres, 145/801<br />

24230­001<br />

Niterói­ RJ<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5 21


22<br />

Diretrizes para manejo da<br />

rinossinusite bacteria<strong>na</strong> aguda<br />

Arthritis Care Res.<br />

A Infectious Diseases Society of America<br />

(IDSA) publicou diretrizes para o manejo da<br />

rinossinusite bacteria<strong>na</strong> aguda (RSBA), em<br />

adultos e crianças (Chow, A.W. et al. “IDSA<br />

Clinical Practice Guideline for Acute Bacterial<br />

Rhinosinusitis in Childrens and Adults”.<br />

Clin. Infect. Dis. 2012; 54(8):e72-e112). Elaboradas<br />

por especialistas de múltiplas especialidades<br />

— pediatras, clínicos gerais e<br />

infectologistas, entre outros — as novas diretrizes<br />

trazem orientações práticas sobre o<br />

manejo diagnóstico e terapêutico, incluindo<br />

dados relevantes sobre a antibioticoterapia<br />

empírica. Como se sabe, a maior parte dos<br />

quadros de rinossinusite é de etiologia viral;<br />

aqueles bacterianos representam cerca de<br />

5%-10% e, em geral, surgem como complicação<br />

de infecção viral do trato respiratório<br />

superior ou manifestação alérgica. Na prática<br />

a diferenciação é difícil, e a etiologia bacteria<strong>na</strong><br />

deve ser considerada <strong>na</strong> existência de<br />

uma das situações clínicas descritas a seguir:<br />

sintomas persistentes por mais de 10 dias;<br />

quadro grave caracterizado por febre alta,<br />

secreção <strong>na</strong>sal mucopurulenta e dor facial,<br />

por três a quatro dias; ou piora súbita dos<br />

sintomas, após a infecção do trato respiratório<br />

superior ter melhorado, por período de<br />

cinco a seis dias. Após diagnóstico clínico,<br />

as recomendações são para início imediato<br />

de terapia antimicrobia<strong>na</strong> empírica, sendo a<br />

droga de escolha a associação amoxicili<strong>na</strong><br />

e ácido clavulânico, por sete a 10 dias. O<br />

levofloxacino é descrito como opção para<br />

pacientes alérgicos à penicili<strong>na</strong>. A avaliação<br />

por imagem, preferencialmente por tomografia<br />

computadorizada, fica reservada para<br />

os que não melhoram com o tratamento farmacológico<br />

adequado; visa à identificação<br />

de complicações supurativas ou de causas<br />

não infecciosas que justifiquem o quadro clínico.<br />

As principais recomendações para manejo<br />

dos pacientes com RSBA se encontram<br />

descritas em um didático algoritmo.<br />

atualidades médicas<br />

Consenso sobre a interpretação<br />

dos níveis plasmáticos de<br />

troponi<strong>na</strong> <strong>na</strong> prática clínica<br />

J. Am. Coll. Cardiol.<br />

O infarto agudo do miocárdio (IAM)<br />

é, sem dúvida, uma das principais causas<br />

de mortalidade e morbidade em todo o<br />

mundo. Seu diagnóstico precoce é fundamental<br />

para que o tratamento imediato<br />

seja iniciado, resultando em melhor prognóstico.<br />

Atualmente, o eletrocardiograma,<br />

em associação à dosagem plasmática de<br />

troponi<strong>na</strong> cardíaca, constitui a pedra angular<br />

para o diagnóstico em um paciente<br />

com suspeita clínica de IAM. O American<br />

College of Cardiology (ACC), em conjunto<br />

com outras renomadas sociedades médicas,<br />

publicou recentemente as resoluções<br />

de um consenso sobre como utilizar e interpretar,<br />

<strong>na</strong> prática clínica diária, as elevações<br />

plasmáticas de troponi<strong>na</strong> (Newby,<br />

L.K. et al. “ACCF 2012 Expert Consensus<br />

Document on Practical Clinical Considerations<br />

in the Interpretation of Troponin Elevations”.<br />

J. Am. Coll. Cardiol. 2012; online<br />

first). Entre os pontos-chaves do consenso,<br />

os autores destacam que a elevação sérica<br />

de troponi<strong>na</strong> é um marcador extremamente<br />

confiável de necrose miocárdica (apesar<br />

de não específico), devendo ser sempre<br />

realizada quando se suspeitar clinicamente<br />

de IAM. Entretanto, recomendam que<br />

sua utilização seja feita de modo consciente<br />

<strong>na</strong>s decisões clínicas. Desse modo,<br />

nos pacientes com síndrome coro<strong>na</strong>ria<strong>na</strong><br />

aguda sem elevação do segmento ST,<br />

uma avaliação de risco global — mais que<br />

um único marcador sorológico — deve ser<br />

utilizada para guiar a decisão terapêutica.<br />

Além disso, sugerem que o teste não seja<br />

empregado rotineiramente, em contextos<br />

clínicos que sugerem patologia cardíaca<br />

não isquêmica. São exceções a essa regra<br />

a avaliação do prognóstico cardiológico<br />

em pacientes com doença re<strong>na</strong>l crônica e<br />

pacientes em tratamento quimioterápico,<br />

com suspeita de cardiotoxicidade.<br />

Profa. Dra. Andréa F. Mendes<br />

Conduta <strong>na</strong>s fraturas relacio<strong>na</strong>das<br />

à osteoporose no sexo masculino<br />

N. Engl. J. Med.<br />

Em mulheres, o tratamento da osteoporose<br />

e suas complicações está bem definido<br />

<strong>na</strong> literatura médica mundial, com<br />

base em evidências científicas fornecidas<br />

por diversos estudos clínicos. Entre os indivíduos<br />

do sexo masculino, em especial<br />

a partir dos 50 anos de idade, a doença<br />

tem sido cada vez mais diagnosticada<br />

e estudada. Atualmente, a mortalidade<br />

por fraturas relacio<strong>na</strong>das à osteoporose<br />

é maior entre indivíduos do sexo masculino,<br />

havendo a necessidade de estudos e<br />

diretrizes que orientem o adequado manejo<br />

desses casos. Em publicação recente<br />

no periódico The New England Jour<strong>na</strong>l of<br />

Medicine, Boonen, S. e cols. abordam o assunto,<br />

trazendo o resultado de um estudo<br />

multicêntrico, duplo-cego e controlado<br />

por placebo, que buscou avaliar a eficácia<br />

do ácido zoledrônico (AZ) em reduzir o risco<br />

de fraturas em homens portadores de<br />

osteoporose (“Fracture Risk and Zoledronic<br />

Acid Therapy in Men with Osteoporosis”.<br />

N. Engl. J. Med. 2012; 367:1714-23).<br />

O estudo avaliou 1.199 homens entre 50 e<br />

85 anos, com diagnóstico de osteoporose,<br />

randomizados para receberem placebo ou<br />

AZ (5mg, IV) ao início do estudo e 12 meses<br />

após. O objetivo primário foi avaliar o<br />

surgimento de fraturas vertebrais ao longo<br />

de um período de 24 meses, durante<br />

os quais todos receberam suplementação<br />

com cálcio e vitami<strong>na</strong> D. Ao término do<br />

período de acompanhamento concluíram<br />

que o medicamento esteve associado a<br />

um menor risco de fraturas, do ponto de<br />

vista radiológico (1,6% vs. 4,9% no grupo<br />

placebo, representando redução de risco<br />

de 67% com o uso de AZ); entretanto,<br />

apesar de o AZ também ter reduzido a incidência<br />

de fraturas manifestas clinicamente,<br />

essa diferença não alcançou significado<br />

estatístico. O grupo que recebeu AZ apresentou<br />

ainda maior densidade mineral<br />

óssea e menor redução estatural, quando<br />

comparado ao placebo. Fi<strong>na</strong>lmente, os<br />

autores descrevem que não houve diferenças<br />

estatísticas entre os dois grupos no<br />

que diz respeito à mortalidade e eventos<br />

adversos graves. Tais resultados certamente<br />

suportam o uso do AZ como terapia<br />

antirreabsortiva também em homens com<br />

osteoporose. Cabe ressaltar, entretanto,<br />

que nove dos pacientes que receberam<br />

AZ apresentaram IAM (vs. dois no grupo<br />

placebo); seja essa associação por casualidade<br />

ou não, o médico deve estar atento<br />

para possíveis complicações cardiovasculares<br />

quando decidir prescrever a droga.<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5


Ascite no paciente cirrótico<br />

Angelo Alves de MAttos<br />

Professor titular da Discipli<strong>na</strong> de Gastroenterologia e do Curso de Pós-graduação em Hepatologia<br />

da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre.<br />

Resumo<br />

Este artigo, ao fazer uma revisão da<br />

literatura no que tange ao tratamento da<br />

ascite no paciente com cirrose, enfatiza<br />

a importância da dieta com restrição de<br />

sal; do papel da espironolacto<strong>na</strong> no início<br />

do tratamento em pacientes com um<br />

primeiro episódio de ascite e do tratamento<br />

combi<strong>na</strong>do (espironolacto<strong>na</strong> e furosemida)<br />

<strong>na</strong>s ascites recorrentes e da paracentese<br />

terapêutica, com reposição de albumi<strong>na</strong>,<br />

<strong>na</strong> ascite tensa. Conclui ressaltando a<br />

importância da avaliação do transplante<br />

hepático nesta população de doentes.<br />

A ascite é uma complicação frequente<br />

no paciente com cirrose, com prevalência<br />

ao redor de 10%. Em um período de 10 anos<br />

espera-se que metade dos pacientes apresentem<br />

esta complicação. Seu aparecimento<br />

já traduz mau prognóstico, com mortalidade<br />

ao redor de 50% em três anos. Deve ser ressaltado<br />

que sua presença também aumenta<br />

a morbidade desta população de doentes,<br />

uma vez que há risco adicio<strong>na</strong>l de outras<br />

complicações, como a peritonite bacteria<strong>na</strong><br />

espontânea (1).<br />

Tendo em vista sua incidência e o prognóstico<br />

empobrecido que empresta ao paciente,<br />

é fundamental um tratamento adequado.<br />

Em geral, os pacientes com ascite necessitam<br />

hospitalização, embora aqueles com<br />

derrame peritoneal de pequeno volume possam<br />

ser manejados em nível ambulatorial (2).<br />

É fundamental que seja identificada, afastada<br />

ou tratada, quando possível, a causa da<br />

hepatopatia. Assim, por exemplo, em um paciente<br />

com hepatopatia decorrente do alcoolismo<br />

é importante que o uso de álcool seja<br />

suspenso. O tratamento do VHB, da hepatite<br />

autoimune e da hemocromatose também<br />

pode traduzir uma melhora da ascite (1).<br />

Summary<br />

The present article, reviewing medical<br />

literature regarding treatment of ascites in<br />

cirrhotic patients, emphasizes the importance<br />

of a sodium restricted diet; it also explains<br />

the role of espironolactone as the first<br />

treatment in a patient with the first episode of<br />

ascites, that of the combined treatment with<br />

espironolactone and furosemide in cases of<br />

recurrent ascites and that of therapeutical<br />

paracentesis with albumin replacement in<br />

patients with tense ascites. It concludes<br />

highlighting the importance of evaluating<br />

cirrhotic patients with ascites for liver<br />

transplantation.<br />

O repouso em decúbito dorsal, e<strong>na</strong>ltecido<br />

no passado, hoje em dia é regido pelas condições<br />

clínicas do paciente (2).<br />

A dieta com restrição de sódio é um passo<br />

importante do tratamento, sendo preconizado<br />

o uso de 2 gramas ao dia (3, 4, 5). Em regra, é<br />

orientado somente que os pacientes não coloquem<br />

sal em sua dieta e que evitem alimentos<br />

sabidamente com maior conteúdo de sódio<br />

(em média fica permitida uma ingesta de 4,6<br />

a 6,9 gramas de sal ao dia) (2).<br />

O déficit de excreção hídrica é um achado<br />

comum no cirrótico; no entanto, a ingestão<br />

de água só deve ser restringida <strong>na</strong>queles<br />

pacientes em que a concentração sérica de<br />

sódio for inferior a 120-125mEq/l. Caso o<br />

paciente apresente hipo<strong>na</strong>tremia significativa<br />

(inferior a 120mEq/l), os diuréticos devem ser<br />

suspensos (3, 4, 5).<br />

Quando do tratamento da ascite, é importante<br />

que o clínico esteja atento para evitar a<br />

utilização de medicamentos que prejudiquem<br />

a função re<strong>na</strong>l, tais como os anti-inflamatórios<br />

não esteroides, inibidores da enzima conversora<br />

de angiotensi<strong>na</strong>, antagonistas dos<br />

receptores da angiotensi<strong>na</strong> e mesmo drogas<br />

nefrotóxicas como os aminoglicosídeos. É<br />

Ascite no paciente cirrótico<br />

Unitermos: Ascite;<br />

albumi<strong>na</strong>; cirrose;<br />

diuréticos.<br />

Keywords: Ascites;<br />

albumin; cirrhosis; diuretics.<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5 23<br />

clínica médica


24<br />

Ascite no paciente cirrótico<br />

Pontos-chave:<br />

> No início do tratamento<br />

são utilizados diuréticos<br />

poupadores de potássio;<br />

> Preferencialmente a<br />

espironolacto<strong>na</strong>, em decorrência<br />

do hiperaldosteronismo existente<br />

no paciente com cirrose;<br />

> A dose inicial é de 100mg,<br />

podendo ser aumentada a cada<br />

3-5 dias, até um máximo de<br />

400mg/dia.<br />

também importante atentar para o uso de<br />

contrastes radiológicos endovenosos, uma<br />

vez que os mesmos podem induzir a uma<br />

insuficiência re<strong>na</strong>l aguda (1).<br />

Como a resposta à dieta com restrição de<br />

sódio é deficiente, o uso de diuréticos deve<br />

ser considerado desde o início do tratamento.<br />

Tendo em vista a presença de edema periférico<br />

concomitante proteger o paciente quanto<br />

ao desenvolvimento de hipovolemia, em<br />

decorrência de sua mobilização preferencial<br />

e ilimitada, fica sugerido que o tratamento<br />

pode resultar em uma perda média de 1kg/<br />

dia <strong>na</strong>queles pacientes com ascite e edema<br />

periférico e de 300-500g/dia <strong>na</strong>queles só com<br />

ascite (reabsorção limitada) (6).<br />

No início do tratamento são utilizados<br />

diuréticos poupadores de potássio, preferencialmente<br />

a espironolacto<strong>na</strong>, em decorrência<br />

do hiperaldosteronismo existente no paciente<br />

com cirrose. A dose inicial é de 100mg, podendo<br />

ser aumentada a cada 3-5 dias, até um<br />

máximo de 400mg/dia. O intervalo de dias<br />

utilizado para a modificação da dose é baseado<br />

no fato de que o pico de ação da droga<br />

ocorre entre o terceiro e o quinto dia de seu<br />

uso. Esse regime resulta em uma <strong>na</strong>triurese<br />

adequada em 75% dos pacientes. Como os<br />

principais metabólitos da espironolacto<strong>na</strong>,<br />

sua porção ativa, têm meia-vida plasmática<br />

longa, está justificada sua administração uma<br />

vez ao dia (7, 8).<br />

Sendo o sítio de ação da espironolacto<strong>na</strong><br />

ao nível do néfron distal, a retenção proximal<br />

de sódio e de água explica a falha terapêutica<br />

em alguns pacientes. Nestes casos, associa-se<br />

um diurético de alça. A droga habitualmente<br />

utilizada é a furosemida, variando a dose de<br />

40 a 120-160mg/dia (9).<br />

Existe controvérsia <strong>na</strong> literatura no que<br />

tange ao melhor esquema de diuréticos a<br />

ser utilizado inicialmente nos pacientes com<br />

cirrose e ascite. Santos et al. (10) avaliaram a<br />

utilização de espironolacto<strong>na</strong> versus espironolacto<strong>na</strong><br />

e furosemida em pacientes com<br />

ascite moderada, após dieta e repouso. Em<br />

um grupo, quando necessário, aumentavam<br />

as doses de ambos os diuréticos a cada quatro<br />

dias (doses máximas de 400mg para a espironolacto<strong>na</strong><br />

e de 160mg para a furosemida)<br />

e no outro o aumento da dose inicial era da<br />

espironolato<strong>na</strong> e, <strong>na</strong> ausência de resposta, era<br />

então acrescida a furosemida. A resposta ao<br />

tratamento, as complicações e a velocidade<br />

de mobilização da ascite foram semelhantes<br />

nos dois grupos. Recentemente, Angeli et al.<br />

(11), também avaliando pacientes com ascite<br />

moderada, após dieta e repouso, fizeram estudo<br />

com desenho semelhante e observaram<br />

que o tratamento combi<strong>na</strong>do foi mais efetivo<br />

<strong>na</strong> ascite moderada.<br />

Em editorial, Ber<strong>na</strong>rdi (12) comenta que<br />

embora os dois estudos sejam prospectivos,<br />

controlados e randomizados, avaliavam populações<br />

distintas. Assim, no primeiro estudo,<br />

60% dos pacientes tinham ascite de início<br />

recente, em 40% a aldostero<strong>na</strong> estava normal<br />

e todos apresentavam creatini<strong>na</strong> dentro da<br />

normalidade, permitindo sucesso com a espironolacto<strong>na</strong><br />

isoladamente em dose baixa e<br />

com poucos efeitos colaterais. Já no segundo<br />

estudo, em 70% dos pacientes a ascite era<br />

recidivante, a maior parte apresentava hiperaldosteronismo<br />

e tinha diminuição da taxa<br />

de filtração glomerular. Então, o sucesso se<br />

fazia esperado, ou com altas doses de um antagonista<br />

da aldostero<strong>na</strong> ou com tratamento<br />

combi<strong>na</strong>do. Conclui referindo que os pacientes<br />

com ascite de início recente devem ser<br />

tratados de forma distinta daqueles com ascite<br />

recidivante. Recentemente foram publicadas<br />

as diretrizes da European Association for the<br />

Study of the Liver (EASL) (2), sendo que, a este<br />

respeito, se posicio<strong>na</strong>m da seguinte maneira:<br />

os pacientes com um primeiro episódio de<br />

ascite podem ser tratados com doses iniciais<br />

de espironolacto<strong>na</strong>; no entanto, os pacientes<br />

com ascite recorrente devem ser tratados com<br />

a terapia combi<strong>na</strong>da.<br />

Nos pacientes com derrame peritoneal<br />

volumoso (ascite tensa) a proposta terapêutica<br />

a ser avaliada é a paracentese com reposição<br />

de albumi<strong>na</strong>.<br />

A terapêutica através da paracentese, com<br />

infusão endovenosa de 8 gramas de albumi<strong>na</strong><br />

por litro de ascite dre<strong>na</strong>do, mostrou-se mais<br />

efetiva, acarretando menos complicações<br />

e diminuindo o tempo de inter<strong>na</strong>ção dos<br />

pacientes, quando comparada com o tratamento<br />

à base de diuréticos. Ressaltamos que<br />

a reposição com albumi<strong>na</strong> tende a minorar a<br />

disfunção circulatória que pode ocorrer após<br />

a paracentese (disfunção circulatória pós-paracentese).<br />

Recente meta-análise, avaliando<br />

ensaios prospectivos, controlados e randomizados<br />

em pacientes com ascite volumosa e<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5


que realizaram paracentese e reposição com<br />

albumi<strong>na</strong> ou outros expansores, demonstrou<br />

que a albumi<strong>na</strong> diminui a incidência de síndrome<br />

pós-paracentese, de hipo<strong>na</strong>tremia e<br />

de mortalidade (13).<br />

Embora a paracentese terapêutica com<br />

reposição volumétrica seja o tratamento de<br />

eleição para os pacientes com ascite volumosa,<br />

ela não corrige a retenção re<strong>na</strong>l de<br />

sódio existente, e esses pacientes devem<br />

utilizar diuréticos após a remoção do líquido<br />

de ascite.<br />

É importante enfatizar que o transplante<br />

hepático é a forma de terapia definitiva a ser<br />

ofertada aos pacientes com ascite, principalmente<br />

quando a mesma for considerada<br />

refratária (14). As alter<strong>na</strong>tivas anteriormente<br />

consideradas seriam, então, procedimentos<br />

terapêuticos que proporcio<strong>na</strong>riam uma vida<br />

mais dig<strong>na</strong> a esta população de pacientes até<br />

a sua realização. A sobrevida dos pacientes<br />

transplantados em nosso meio é excelente,<br />

sendo ao redor de 80% em um ano e de 60%<br />

em 15 anos (15).<br />

O déficit de excreção de água, decorrente<br />

de uma anormalidade funcio<strong>na</strong>l re<strong>na</strong>l, é um<br />

achado frequente nos cirróticos com ascite.<br />

A depuração de água livre está diminuída em<br />

75% dos pacientes com cirrose, sendo que<br />

a hipo<strong>na</strong>tremia pode ser observada em um<br />

terço dos mesmos, apresentando uma correlação<br />

direta com a gravidade da hepatopatia.<br />

Assim, drogas que aumentem a excreção de<br />

Referências<br />

11. GORDON, F.D. — Ascites. Clin. Liver Dis., 16: 285-99, 2012.<br />

12. EUROPEAN ASSOCIATION FOR THE STUDY OF THE LIVER<br />

— EASL clinical practice guidelines on the ma<strong>na</strong>gement of<br />

ascites, spontaneous bacterial peritonitis, and hepatore<strong>na</strong>l<br />

syndrome in cirrhosis. J. Hepatol., 53: 397-417, 2010.<br />

13. RUNYON, B.A. — AASLD Practice Guidelines Committee.<br />

Ma<strong>na</strong>gement of adult patients with ascites due to cirrhosis:<br />

An update. Hepatology, 49: 2087-107, 2009.<br />

14. GINÈS, P.; CÁRDENAS, A. et al. — Ma<strong>na</strong>gement of cirrhosis<br />

and ascites. N. Engl. J. Med., 350: 1646-54, 2004.<br />

15. MOORE, K.P.; WONG, F. et al. — The ma<strong>na</strong>gement of ascites<br />

in cirrhosis: Report on the Consensus Conference of the Inter<strong>na</strong>tio<strong>na</strong>l<br />

Ascites Club. Hepatology, 38: 258-66, 2003.<br />

16. SHEAR, L.; CHING, S. & GABUZDA, G.J. — Compartmentalization<br />

of ascites and edema in patients with hepatic cirrhosis.<br />

N. Engl. J. Med., 282: 1391-6, 1970.<br />

água livre poderiam influir <strong>na</strong> hipo<strong>na</strong>tremia<br />

dilucio<strong>na</strong>l e <strong>na</strong> hipo-osmolaridade, consequentes<br />

à retenção re<strong>na</strong>l de água observada<br />

nesses pacientes. Atualmente, os antagonistas<br />

dos receptores V2 (vaptans) estão sendo<br />

avaliados. Embora estudos iniciais com o<br />

satavaptan tenham sido promissores, o mesmo<br />

não ocorreu quando da avaliação em estudo de<br />

fase 3 (16). Recentemente outro medicamento,<br />

o tolvaptan, foi aprovado pela FDA para o tratamento<br />

da hipo<strong>na</strong>tremia em pacientes com<br />

cirrose. A despeito de, atualmente, ser muito<br />

pobre a experiência com tais medicamentos<br />

em pacientes com cirrose e ascite, espera-se<br />

que em futuro próximo agentes aquaréticos<br />

venham a ser utilizados <strong>na</strong> prática médica,<br />

proporcio<strong>na</strong>ndo, assim, resposta terapêutica<br />

mais eficaz quando em comparação com o<br />

tratamento convencio<strong>na</strong>l (17).<br />

Ao fi<strong>na</strong>lizarmos esta revisão, entendemos<br />

de interesse as considerações feitas <strong>na</strong> última<br />

diretriz da American Association for the Study<br />

of Liver Diseases (AASLD) (3) e <strong>na</strong> da EASL (2)<br />

no que tange ao tratamento da ascite. Assim,<br />

os principais passos a serem considerados são<br />

estes: tratamento da causa da hepatopatia;<br />

restrição de sódio e início precoce de diuréticos;<br />

restrição hídrica quando o sódio sérico<br />

for inferior a 120-125mEq/l; <strong>na</strong> ascite tensa,<br />

realizar paracentese terapêutica, repondo albumi<strong>na</strong><br />

(mandatória quando o volume dre<strong>na</strong>do<br />

for superior a 5 litros); e avaliar a indicação<br />

de transplante em pacientes com ascite.<br />

17. WONG, F. & BLENDIS, L. — The pathophysiologic basis for<br />

the treatment of cirrhotic ascites. Clin. Liver Dis., 5: 819-32,<br />

2001.<br />

18. ZERVOS, E.F. & ROSEMURGY, A.S. — Ma<strong>na</strong>gement of medically<br />

refractory ascites. Am. J. Surg., 181: 256-64, 2001.<br />

19. RUNYON, B.A. — Ma<strong>na</strong>gement of adult patients with ascites<br />

due to cirrhosis. Hepatology, 39: 841-56, 2004.<br />

10. SANTOS, J.; PLANAS, R. et al. — Spironolactone alone or in<br />

combi<strong>na</strong>tion with furosemide in the treatment of moderate<br />

ascites in no<strong>na</strong>zotemic cirrhosis. A randomized comparative<br />

study of efficacy and safety. J. Hepatol., 39: 187-92, 2003.<br />

Obs.: As sete referências restantes que compõem este artigo se<br />

encontram <strong>na</strong> Redação à disposição dos interessados.<br />

Ascite no paciente cirrótico<br />

É importante enfatizar<br />

que o transplante<br />

hepático é a forma<br />

de terapia definitiva<br />

a ser ofertada aos<br />

pacientes com ascite,<br />

principalmente quando a<br />

mesma for considerada<br />

refratária.<br />

Endereço para<br />

correspondência:<br />

Angelo Alves de Mattos<br />

Rua Cel. Aurélio Bitencourt,<br />

35/Ap. 201<br />

90430-080<br />

Porto Alegre-RS<br />

angeloamattos@gmail.com<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5 25


Hipertireoidismo<br />

Abordagem das principais causas e conduta diagnóstica<br />

Hipertireoidismo<br />

Abordagem das principais causas e conduta diagnóstica<br />

Rosita Fontes<br />

Endocrinologista do Instituto Estadual de Diabetes e Endocrinologia Luis Capriglione (IEDE/RJ).<br />

Professora do Curso de Especialização em Endocrinologia e Metabologia da Pontifícia Universidade<br />

Católica do Rio de Janeiro (PUC/RJ).<br />

Resumo<br />

A tireotoxicose é um estado hipermetabólico<br />

decorrente dos efeitos de níveis<br />

teciduais elevados de hormônios tireoideanos<br />

(HTs). O hipertireoidismo é a causa mais<br />

comum, e decorre do excesso de hormônios<br />

produzidos pela tireoide. Outras causas de<br />

tireotoxicose ocorrem por produção extratireoidea<strong>na</strong><br />

ou administração exóge<strong>na</strong> de hormônios<br />

tireoideanos. A principal causa de<br />

tireotoxicose, o bócio difuso tóxico (BDT) de<br />

causa autoimune, responsável por até 80%<br />

dos casos, é aqui abordado, assim como as<br />

demais causas. O tratamento é realizado<br />

com drogas antitireoidea<strong>na</strong>s, iodo radioativo<br />

ou cirurgia e exige acompanhamento<br />

de longo prazo, tanto pela possibilidade<br />

de recidivas como do desenvolvimento de<br />

hipotireoidismo.<br />

Introdução<br />

A tireotoxicose é um estado hipermetabólico<br />

decorrente dos efeitos de níveis teciduais<br />

elevados de hormônios tireoideanos (HTs).<br />

O hipertireoidismo é a causa mais comum e<br />

decorre do excesso de hormônios produzidos<br />

pela tireoide. Segundo estudos clássicos, como<br />

o Natio<strong>na</strong>l Health and Nutrition Exami<strong>na</strong>tion<br />

Survey (NHANES III) e o Whickham Survey, é<br />

uma doença mais incidente e prevalente em<br />

mulheres, com incidência de 1:1.000 casos por<br />

ano e prevalência entre 1% e 2%, cerca de 10<br />

vezes mais do que nos homens. Em crianças<br />

ocorre em 0,02%, com pico de incidência entre<br />

11 e 15 anos (3, 4). No Brasil, em uma <strong>comunidade</strong><br />

do Nordeste a prevalência foi de 5,9%,<br />

mas os próprios autores comentam a possibilidade<br />

de fatores genéticos e/ou ambientais<br />

Summary<br />

Thyrotoxicosis is a hypermetabolic state<br />

due to the effects of high tissue levels of<br />

thyroid hormones (TH). Hyperthyroidism is<br />

the most common cause and results from<br />

excess hormones produced by the thyroid.<br />

Other causes of thyrotoxicosis occur<br />

extra thyroid production or exogenous<br />

administration of thyroid hormones. The<br />

main cause of thyrotoxicosis, the diffuse<br />

toxic goiter (DTG) of autoimmune cause,<br />

accounting for up to 80% of cases, is discussed<br />

here, as well as other causes. The<br />

treatment is performed with antithyroid<br />

drugs, radioactive iodine or surgery and requires<br />

long­term follow­up, due to both the<br />

possibility of recurrence and the development<br />

of hypothyroidism.<br />

et ent quist, nimilique voluptaturia.<br />

locais envolvidos (1). Em outro estudo, em<br />

uma cidade no sul do país, a prevalência em<br />

uma população com diabetes mellitus tipo 1,<br />

doença sabidamente associada às disfunções<br />

tireoidea<strong>na</strong>s autoimunes, foi de 9,7% (8).<br />

Realizamos em nosso serviço um levantamento<br />

com 336.231 indivíduos que dosaram<br />

hormônio estimulador da tireoide (TSH) e T4<br />

livre (T4L) e observamos hipertireoidismo em<br />

2,1% dos adultos, em 1,8% dos púberes e<br />

em 0,2% dos menores de 12 anos. Apesar de<br />

terem sido excluídos do levantamento todos<br />

os que usavam antitireoideanos, hormônios<br />

tireoideanos ou medicações que pudessem<br />

interferir <strong>na</strong>s dosagens hormo<strong>na</strong>is, a ocorrência<br />

mais elevada do que o relatado <strong>na</strong><br />

literatura pode ser explicada porque havia<br />

indivíduos nos quais a função tireoidea<strong>na</strong><br />

Unitermos:<br />

Hipertireoidismo; tireoide.<br />

Keywords:<br />

Hyperthyroidism; thyroid.<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5 27<br />

endocrinologia


28<br />

Hipertireoidismo<br />

Abordagem das principais causas e conduta diagnóstica<br />

Pontos-chave:<br />

> Doença de Graves (DG) é<br />

responsável por 50% a 80% dos<br />

casos;<br />

> Decorre da ação do anticorpo<br />

estimulador do receptor de<br />

TSH (TSAb) sobre a tireoide,<br />

que produz HT em quantidades<br />

excessivas;<br />

> Incide <strong>na</strong> relação de sete a 10<br />

mulheres para cada homem.<br />

foi pesquisada por apresentarem suspeita<br />

da doença, principalmente entre os menores<br />

de 18 anos, justamente o grupo onde o<br />

percentual de exames alterados foi maior.<br />

Outras causas de tireotoxicose ocorrem<br />

por produção extratireoidea<strong>na</strong> ou administração<br />

exóge<strong>na</strong> de hormônios tireoideanos.<br />

As principais causas de tireotoxicose são<br />

resumidas a seguir.<br />

Causas frequentes<br />

Bócio difuso tóxico (BDT) ou doença de<br />

Graves (DG)<br />

É responsável por 50% a 80% dos casos.<br />

Decorre da ação do anticorpo estimulador do<br />

receptor de TSH (TSAb) sobre a tireoide, que<br />

produz HT em quantidades excessivas. Incide<br />

<strong>na</strong> relação de sete a 10 mulheres para cada<br />

homem. Geralmente vem acompanhado de<br />

bócio e pode estar associado à oftalmopatia,<br />

dermatopatia infiltrativa e acropatia (2, 3, 10).<br />

Bócio multinodular tóxico (BMNT)<br />

Geralmente ocorre em uma glândula multinodular<br />

<strong>na</strong> qual um ou mais nódulos passam a<br />

funcio<strong>na</strong>r autonomamente, produzindo quantidades<br />

aumentadas de HT. Ocorre devido a<br />

mutações somáticas que levam à ativação do<br />

receptor do TSH, além de outros mecanismos<br />

ainda pouco elucidados. É mais prevalente em<br />

populações com insuficiência de iodo (11, 12).<br />

Bócio nodular tóxico (BNT)<br />

Adenoma produtor de hormônios tireoideanos<br />

independentemente do TSH. Quando<br />

atinge determi<strong>na</strong>do tamanho, geralmente<br />

acima de 2,5 a 3cm, é capaz de levar ao hipertireoidismo.<br />

Na Di<strong>na</strong>marca encontrou-se<br />

incidência de 5,7% entre todas as causas de<br />

hipertireoidismo. No Brasil, um estudo mostrou,<br />

em uma peque<strong>na</strong> série de casos com<br />

consumo margi<strong>na</strong>l de iodo, alta prevalência<br />

(86% dos casos) de mutações ativadoras do<br />

receptor do TSH, ao contrário do que foi observado<br />

em outros estudos com alta ingestão<br />

de iodo, onde estas mutações parecem ser<br />

menos prevalentes (13, 14).<br />

Causas pouco frequentes<br />

Tireoidites<br />

Subaguda, granulomatosa ou de Quervain<br />

— É a causa mais comum de dor em<br />

tireoide uni ou bilateral, que pode ser pre-<br />

cedida de febre e faringite. A tireoide é<br />

aumentada e pode-se palpar um ou mais<br />

nódulos. Um hipertireoidismo, geralmente<br />

leve, que dura até seis sema<strong>na</strong>s, ocorre em<br />

50% dos pacientes, por destruição tecidual<br />

e liberação de HT. Em 33% dos pacientes<br />

esta fase é seguida por hipotireoidismo, que<br />

pode durar até seis meses e, então, o retorno<br />

ao eutireoidismo. É pouco frequente que<br />

resulte em hipotireoidismo definitivo (15). Em<br />

um levantamento realizado em nosso serviço<br />

não observamos aumento da incidência em<br />

qualquer época do ano.<br />

Silenciosa — Provavelmente autoimune,<br />

classicamente apresenta as mesmas fases<br />

da tireoidite subaguda; no entanto, a fase<br />

tireotóxica pode ser percebida em somente<br />

5% a 20% dos pacientes, nos quais costuma<br />

durar de três a quatro meses. Apresenta um<br />

pequeno bócio não doloroso (15).<br />

Pós­parto — Tireoidite autoimune definida<br />

como o desenvolvimento de disfunção tireoidea<strong>na</strong><br />

dentro de 12 meses após o parto.<br />

Ocorre em 5% de mulheres previamente<br />

eutireoidea<strong>na</strong>s e não é acompanhada de dor.<br />

Em 25% a 40% a evolução é semelhante à da<br />

tireoidite subaguda; 20% a 30% apresentam<br />

ape<strong>na</strong>s tireotoxicose e 40% somente hipotireoidismo<br />

(15, 16).<br />

Aguda — Por infecção bacteria<strong>na</strong>, geralmente<br />

Staphylococcus aureus, Streptococci species,<br />

Klebsiella pneumoniae ou Escherichia coli;<br />

ou fúngica, geralmente em imunossuprimidos,<br />

por espécies de Aspergillus, Candida<br />

e Coccidioides species. Raramente cursa<br />

destruição tireoidea<strong>na</strong> capaz de levar a hipertireoidismo<br />

(17).<br />

Induzido por drogas<br />

Induzido pela administração de iodo<br />

(Jod­Basedow) — Ocorre quando medicamento<br />

contendo excesso de iodo é<br />

administrado a pacientes em determi<strong>na</strong>das<br />

condições predisponentes, como bócio em<br />

regiões com deficiência endêmica de iodo,<br />

eutireoideanos com doença de Graves,<br />

principalmente após tratamento com antitireoideanos,<br />

bócio nodular atóxico, bócio<br />

multinodular atóxico e bócio difuso atóxico<br />

(BDA) (17).<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5


Induzido por amiodaro<strong>na</strong> — Ocorre em 1,7%,<br />

7,9% e 11,9% dos residentes em áreas com<br />

ingestão de iodo alta, intermediária ou bai -<br />

xa, respectivamente, <strong>na</strong> relação de 3,2 pacientes<br />

do sexo masculino para um do sexo<br />

feminino (23). Clinicamente, a recorrência de<br />

arritmias cardíacas que haviam sido controladas<br />

com a medicação pode sugerir o diagnóstico<br />

(21). Pode ocorrer por dois mecanismos:<br />

no tipo I, que geralmente incide em pacientes<br />

com doença tireoidea<strong>na</strong> preexistente, há<br />

aumento da produção de HT, já que grandes<br />

quantidades de iodo são liberadas para a<br />

circulação durante a sua biotransformação; já<br />

no tipo II o hipertireoidismo é decorrente de<br />

uma tireoidite devido aos efeitos tóxicos da<br />

amiodaro<strong>na</strong> e seu metabólito ativo, a desetilamiodaro<strong>na</strong>.<br />

Os dois tipos podem coexistir,<br />

e o hipertireoidismo pode durar vários meses<br />

(18, 19, 22).<br />

Tireotoxicose induzida por medicamentos<br />

contendo tri-iodotironi<strong>na</strong> (T3) e tireomiméticos<br />

— É causada pela prescrição médica de fórmulas<br />

contendo tri-iodotironi<strong>na</strong>, geralmente<br />

com fi<strong>na</strong>lidade de emagrecimento; pela adição<br />

não mencio<strong>na</strong>da <strong>na</strong> fórmula do hormônio<br />

a alimentos e produtos ditos <strong>na</strong>turais, fitoterápicos<br />

e homeopáticos; e pela ingestão do<br />

tireomimético tiratricol (2, 24, 25, 26).<br />

Tireotoxicoses iatrogênica e factícia — São variações<br />

do mesmo processo de ingestão de hormônio<br />

tireoideano exógeno, a primeira por excesso<br />

da medicação prescrita e a outra por ingestão<br />

abusiva proposital pelo paciente. A administração<br />

excessiva de hormônios tireoideanos cursa sem<br />

bócio e causa sintomas de hipertireoidismo ou<br />

ape<strong>na</strong>s sintomas cardiovasculares e pode levar<br />

a disfunção cardíaca grave, mas reversível com a<br />

retirada da medicação (27, 28, 29).<br />

Hiperêmese gravídica<br />

Ocorre em gestações que cursam com<br />

níveis especialmente elevados de go<strong>na</strong>dotrofi<strong>na</strong><br />

coriônica (hCG) e se caracteriza por um<br />

quadro grave de náuseas e vômitos com perda<br />

de peso, desidratação, cetose, alterações<br />

hidroeletrolíticas significativas (hipo<strong>na</strong>tremia,<br />

hipopotassemia e alcalose metabólica) e aumento<br />

das enzimas hepáticas. Em estatísticas<br />

que variam de 25% a mais de 70% dos casos,<br />

o aumento da hCG está associado a aumento<br />

dos hormônios tireoideanos. Em geral, os si<strong>na</strong>is<br />

e sintomas de tireotoxicidade são mínimos ou<br />

mesmo ausentes. O quadro é transitório e a<br />

maioria normaliza espontaneamente entre quatro<br />

e 20 sema<strong>na</strong>s de gestação, paralelamente<br />

à queda da hCG, com melhora dos vômitos e<br />

ganho de peso. Em 15% a 20% dos casos o<br />

hipertireoidismo ultrapassa este período (30).<br />

Pós-cirurgia para hiperparatireoidismo<br />

Hipertireoidismo transitório pode ocorrer em<br />

cerca de um terço dos pacientes paratireoidectomizados,<br />

com normalização em cerca de um mês.<br />

O quadro é muitas vezes subclínico (31).<br />

Causas raras<br />

Tireotropinomas — Tumores produtores<br />

de TSH, geralmente macroadenomas, raros.<br />

Resistência hipofisária ao hormônio tireoideano<br />

(RHHT) — Maior resistência do mecanismo<br />

de retroalimentação dos HTs <strong>na</strong> hipófise do<br />

que em tecidos periféricos (33).<br />

Tumores trofoblásticos funcio<strong>na</strong>ntes — Incluindo<br />

mola hidatiforme, coriocarcinoma ou carcinoma<br />

embrionário metastático do testículo (2).<br />

Carcinoma de tireoide hiperfuncio<strong>na</strong>nte e<br />

grandes ou múltiplas metástases de carcinoma<br />

folicular de tireoide — Capazes de secretar<br />

hormônios tireoideanos autonomamente (34).<br />

“Struma ovarii” — Por focos hiperfuncio<strong>na</strong>ntes<br />

de tecido tireoideano presentes em 5% a 20%<br />

dos teratomas (35).<br />

Induzido por interferon — Manifestando-se<br />

tanto por mecanismos imunitários (hipertireoidismo<br />

autoimune) como por efeito tóxico<br />

direto <strong>na</strong> tireoide (tireoidite destrutiva) (36).<br />

Hipertireoidismo congênito — Por mutações<br />

ativadoras do receptor do TSH (37).<br />

“Hamburger” tireotoxicose — Causada pelo<br />

consumo de carne moída contendo glândula<br />

tireoide (38).<br />

Síndrome de McCune-Albright — Causada<br />

por mutações ativadoras no gene para a subunidade<br />

alfa da proteí<strong>na</strong> estimuladora G (g<strong>na</strong>s),<br />

<strong>na</strong> qual pode ocorrer hipertireoidismo (39).<br />

Hipertireoidismo<br />

Abordagem das principais causas e conduta diagnóstica<br />

O hipertireoidismo<br />

induzido por amiodaro<strong>na</strong><br />

ocorre em 1,7%, 7,9% e<br />

11,9% dos residentes em<br />

áreas com ingestão de<br />

iodo alta, intermediária ou<br />

baixa, respectivamente,<br />

<strong>na</strong> relação de 3,2<br />

pacientes do sexo<br />

masculino para um do<br />

sexo feminino.<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5 29


30<br />

Hipertireoidismo<br />

Abordagem das principais causas e conduta diagnóstica<br />

Pontos-chave:<br />

> O hipertireoidismo implica<br />

em alto risco de mortalidade;<br />

> Uma meta­análise demonstrou<br />

que esta associação é de<br />

aproximadamente 20%;<br />

> Tanto pode ser<br />

pelas complicações do<br />

hipertireoidismo como por<br />

comorbidades pioradas pela<br />

associação com ele.<br />

Recém­<strong>na</strong>scidos de mães com doença de<br />

Graves — Geralmente transitório, ocorrendo<br />

ao <strong>na</strong>scimento ou alguns dias após, por passagem<br />

transplacentária de títulos elevados de<br />

TSAb materno (37).<br />

Irradiação cervical — Aumenta o risco de hipertireoidismo<br />

autoimune de cinco a 20 vezes,<br />

porém é relacio<strong>na</strong>da a altas doses (40, 41).<br />

Exposição ocupacio<strong>na</strong>l — A solventes e outras<br />

substâncias que levam à tireotoxicose (42).<br />

Quadro clínico<br />

O paciente com hipertireoidismo apresenta<br />

um quadro clínico com os sintomas e si<strong>na</strong>is<br />

típicos mencio<strong>na</strong>dos no Quadro (2, 6).<br />

As crianças apresentam aceleração do<br />

crescimento, avanço da idade óssea e geralmente<br />

têm oftalmopatia (5). Os idosos<br />

podem ter hipertireoidismo apático, com<br />

clínica discreta, que pode ser de difícil<br />

diagnóstico e apresentar ape<strong>na</strong>s perda de<br />

peso, fraqueza muscular proximal e fibrilação<br />

atrial (2, 8).<br />

O hipertireoidismo implica em alto risco de<br />

mortalidade. Uma meta-análise demonstrou<br />

que esta associação é de aproximadamente<br />

20%, e tanto pode ser pelas complicações<br />

do hipertireoidismo como por comorbidades<br />

QUADRO: Sintomas e si<strong>na</strong>is de hipertireoidismo<br />

Sintomas Si<strong>na</strong>is<br />

Nervosismo e labilidade emocio<strong>na</strong>l Taquicardia<br />

Sensibilidade ao calor Hipertermia<br />

Fadiga Sudorese quente<br />

pioradas pela associação com ele. Deve-se a<br />

todas as causas, mas principalmente às cardiovasculares.<br />

Por exemplo, a prevalência de<br />

fibrilação atrial no momento do diagnóstico<br />

de hipertiroidismo pode chegar a 30%, principalmente<br />

em idosos, e 10% a 15% deles têm<br />

um evento arterial embólico (9).<br />

Diagnóstico laboratorial<br />

Em 95% dos casos o dado laboratorial<br />

marcador de tireotoxicose é a combi<strong>na</strong>ção<br />

de TSH suprimido com T4L elevada. Exceções<br />

são os tumores produtores de TSH, a RHHT<br />

e o hipertireoidismo secundário ao uso de<br />

tri-iodotironi<strong>na</strong>. Os anticorpos antitireoideanos<br />

são complementares <strong>na</strong> caracterização<br />

da <strong>na</strong>tureza autoimune da doença. Outras<br />

dosagens podem auxiliar no diagnóstico<br />

diferencial e são comentadas em relação às<br />

principais causas.<br />

No BDT, a causa mais frequente, a T3L ou<br />

a T3T costumam estar proporcio<strong>na</strong>lmente mais<br />

elevados do que a T4L, mas geralmente não<br />

são necessários para o diagnóstico. A antiperoxidase<br />

tireoidea<strong>na</strong> (ATPO) é positiva em 50%<br />

a 80%; a antitireoglobuli<strong>na</strong> (ATG) é positiva em<br />

50% a 70%, mas a positividade da ATPO dispensa<br />

esta dosagem. Na doença de evolução<br />

mais longa a glândula pode ser multinodular e<br />

a positividade do TRAb é útil nos casos em que<br />

Sensação de palpitação Perda de peso (ganho em 10% a 30%)<br />

Dispneia Tremores<br />

Aumento do apetite Descontração rápida dos reflexos profundos<br />

Aumento da frequência de evacuações Geralmente cursa com bócio (sem bócio <strong>na</strong><br />

tireotoxicose factícia)<br />

Oligo ou amenorreia Olhar fixo e brilhante, retração palpebral<br />

Pode haver queixas de ardência e sensação de Si<strong>na</strong>is de oftalmopatia, dermatopatia e acropatia<br />

corpo estranho oculares no BDT<br />

Dor local e odinofagia <strong>na</strong> tireoidite subaguda Dor <strong>na</strong> tireoidite subaguda<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5


as características clínicas não sejam suficientes<br />

para o diagnóstico diferencial com BMNT. Já<br />

os bócios nodulares, seja o BMNT ou o BNT,<br />

às vezes são diagnosticados ainda <strong>na</strong> fase de<br />

hipertireoidismo subclínico, quando a T4L ainda<br />

estará normal, ou como tireotoxicose por<br />

T3, em que, além do TSH suprimido, somente<br />

T3L ou T3T estará aumentada (20).<br />

A tireoidite mais comum, que é a subaguda,<br />

se caracteriza por velocidade de<br />

hemossedimentação (VHS) bastante elevada,<br />

tipicamente acima de 100mm, e proteí<strong>na</strong> C-<br />

-reativa (PCR) elevada em níveis inflamatórios.<br />

A ATPO é positiva em 25% dos casos. Esses<br />

anticorpos estão também positivos em 50%<br />

dos casos de tireoidite silenciosa e em mais<br />

de 80% da tireoidite pós-parto. Já a tireoidite<br />

aguda cursa com marcadores de autoimunidade<br />

negativos e marcadores inflamatórios<br />

moderadamente elevados.<br />

No hipertireoidismo pela amiodaro<strong>na</strong>,<br />

a T3L ou a T3T podem estar elevadas, mas<br />

a relação FT4/FT3 é muito maior do que<br />

no BDT. Na tireotoxicose por T4, a T3L ou<br />

a T3T estão normais. No tipo I a ATPO pode<br />

ser positiva.<br />

Nas formas de hipertireoidismo induzidas<br />

por hormônios tireoideanos, a alteração laboratorial<br />

dependerá do hormônio ingerido.<br />

Assim, se o medicamento for a tri-iodotironi<strong>na</strong><br />

o TSH estará suprimido com T4L baixa ou até<br />

mesmo indosável e T3L ou T3T elevadas. Já<br />

<strong>na</strong> iatrogênica e <strong>na</strong> factícia por uso de L-T4,<br />

o TSH está suprimido e a T4L, elevada. A<br />

tireoglobuli<strong>na</strong> é baixa, devido à supressão<br />

exóge<strong>na</strong> da atividade tireoidea<strong>na</strong>.<br />

O tireotropinoma e a RHHT se diferenciam<br />

da maioria das formas de hipertireoidismo<br />

por não cursarem com TSH suprimido.<br />

Nos tireotropinomas ambos, TSH e T4L, estão<br />

elevados e a subunidade alfa geralmente<br />

também está elevada nos tumores grandes,<br />

podendo estar normal nos microadenomas.<br />

A globuli<strong>na</strong> ligadora de hormônios sexuais<br />

(SHBG), que reflete o grau de hipertireoidismo<br />

hepático, e outros marcadores da<br />

ação tecidual dos HTs estão elevados (32).<br />

Na RHHT o TSH geralmente está normal ou<br />

levemente elevado. A subunidade alfa e os<br />

marcadores da ação do HT tecidual, como a<br />

SHBG, estão normais.<br />

Na síndrome de McCune-Albright outras<br />

alterações podem estar presentes, como<br />

aumento do hormônio de crescimento (GH),<br />

prolacti<strong>na</strong> (PRL), androgênios por hiperplasia<br />

adre<strong>na</strong>l autônoma e hipofosfatemia da osteomalácia<br />

hipofosfatêmica, sem alteração dos<br />

hormônios hipofisários.<br />

Em recém-<strong>na</strong>scidos de mães com doença<br />

de Graves espera-se TRAb elevado pela passagem<br />

transplacentária.<br />

O algoritmo ao fi<strong>na</strong>l deste trabalho mostra<br />

a utilidade dos principais exames de análises<br />

clínicas no diagnóstico do hipertireoidismo.<br />

Outras alterações laboratoriais<br />

A alteração das enzimas hepáticas costuma<br />

ser discreta e reverter com o tratamento,<br />

devendo ser diferenciada da hepatite tóxica<br />

decorrente do tratamento, principalmente<br />

com propiltiouracil, ou da colestática associada<br />

ao metimazol; a dosagem seriada de<br />

enzimas não prediz a ocorrência de formas<br />

graves de hepatite, sendo dispensada. Leucocitose<br />

pode estar presente no paciente<br />

não tratado; com o uso de antitireoideanos<br />

(ATs) leucopenia transitória é pouco comum,<br />

agranulocitose rara e anemia aplástica muito<br />

rara; não há necessidade de acompanhamento<br />

seriado da série branca, a não ser que haja<br />

febre e sintomas e si<strong>na</strong>is de infecção. Hiperglicemia,<br />

geralmente leve, se deve à inibição<br />

catecolaminérgica da liberação de insuli<strong>na</strong> e<br />

glicogenólise aumentada; indivíduos predispostos<br />

podem desenvolver diabetes mellitus;<br />

muito raramente, anticorpo anti-insuli<strong>na</strong> é<br />

positivo e pode ocorrer hipoglicemia. Hipercalcemia<br />

com hipercalciúria e marcadores de<br />

reabsorção e formação óssea aumentados<br />

deve-se ao efeito de estimulação do HT sobre<br />

a remodelação óssea (8).<br />

Dois extremos da doença:<br />

hipertireoidismo subclínico e crise<br />

tireotóxica<br />

O hipertireoidismo subclínico se caracteriza<br />

por níveis normais de T4L e T3L ou T3T,<br />

e o TSH pode estar nitidamente suprimido,<br />

abaixo de 0,1µUI/ml, ou baixo mas detectável,<br />

entre 0,1µUI/ml e o valor de referência<br />

mínimo do método, geralmente em torno<br />

de 03µUI/ml a 0,4µUI/ml. As causas são as<br />

mesmas do hipertireoidismo clínico (13). Em<br />

que pesem os dados de maior ocorrência<br />

de fibrilação arterial, principalmente acima<br />

Hipertireoidismo<br />

Abordagem das principais causas e conduta diagnóstica<br />

A tireoidite mais comum,<br />

que é a subaguda, se<br />

caracteriza por velocidade<br />

de hemossedimentação<br />

(VHS) bastante elevada,<br />

tipicamente acima de<br />

100mm, e proteí<strong>na</strong><br />

C-reativa (PCR) elevada<br />

em níveis inflamatórios. A<br />

ATPO é positiva em 25%<br />

dos casos.<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5 31


32<br />

Hipertireoidismo<br />

Abordagem das principais causas e conduta diagnóstica<br />

Pontos-chave:<br />

> A crise tireotóxica (CT)<br />

decorre da perda aguda da<br />

capacidade de manter os<br />

mecanismos compensatórios<br />

de termorregulação,<br />

cardiovasculares e metabólicos;<br />

> Geralmente ocorre no<br />

paciente que apresenta doença<br />

tireoidea<strong>na</strong> prévia;<br />

> É uma condição fatal se não<br />

for diagnosticada e tratada de<br />

imediato.<br />

Algoritmo<br />

Elevado<br />

Positivos<br />

Provável d.<br />

autoimune;<br />

tireoidites<br />

Suprimido<br />

T4L<br />

Hipertireoidismo<br />

Anticorpos<br />

antitireoideanos<br />

Negativos<br />

Outras<br />

causas<br />

Dados clínicos<br />

Elevado<br />

Normal<br />

T3L<br />

Normal<br />

Hipertireoidismo<br />

subclínico<br />

Outros exames<br />

complementares<br />

TSH – Hormônio estimulador da tireoide;<br />

T3L – Tri-iodotironi<strong>na</strong> livre; T4L – tiroxi<strong>na</strong> livre;<br />

SRHT – Síndrome de resistência ao hormônio<br />

tireoideano; SHBG – Globuli<strong>na</strong> ligadora de<br />

hormônios sexuais.<br />

* O adenoma produtor de TSH geralmente<br />

é visualizado <strong>na</strong> ressonância magnética,<br />

enquanto <strong>na</strong> SRHT a sela turca é normal.<br />

** O diagnóstico definitivo é estabelecido<br />

pela demonstração de mutação no gene<br />

TRb, que ocorre em 85% dos casos de SRHT.<br />

Dados clínicos sugestivos<br />

de hipertireoidismo<br />

de 65 anos, e a possibilidade de aumento<br />

de reabsorção óssea nesses pacientes, não<br />

há consenso a respeito da realização de<br />

triagem para hipertireoidismo subclínico <strong>na</strong><br />

população (7).<br />

A crise tireotóxica (CT) decorre da perda<br />

aguda da capacidade de manter os mecanismos<br />

compensatórios de termorregulação,<br />

cardiovasculares e metabólicos, causada pelo<br />

excesso de HT. Geralmente ocorre no paciente<br />

que apresenta doença tireoidea<strong>na</strong> prévia,<br />

quando há um evento clínico ou cirúrgico desencadeante.<br />

É uma condição fatal se não for<br />

diagnosticada e tratada de imediato. Os níveis<br />

de T3 e T4 não são diferentes dos encontrados<br />

no hipertireoidismo não complicado. O TSH<br />

está tipicamente suprimido, exceto nos raros<br />

casos de CT secundária a hipertireoidismo por<br />

adenoma hipofisário. O hemograma mostra<br />

leucocitose discreta com desvio para a esquerda,<br />

mesmo <strong>na</strong> ausência de infecção; se esta<br />

TSH<br />

Normal<br />

Rever<br />

dados<br />

clínicos<br />

Suspeita<br />

mantida<br />

T4L<br />

Elevado<br />

Normal<br />

Resposta<br />

aumentada<br />

Elevado<br />

Subunidade<br />

alfa<br />

Elevado<br />

Sugere tumor<br />

produtor<br />

TSH*<br />

Sugere SRHT**<br />

SHBG<br />

Teste TRH<br />

Normal<br />

Elevado<br />

Ausência<br />

de resposta<br />

Elevado<br />

T4L<br />

Normal<br />

Hipotireoidismo<br />

subclínico<br />

Rever<br />

diagnóstico<br />

coexiste a leucocitose pode ser acentuada.<br />

Hiperglicemia leve a moderada mesmo em<br />

não diabéticos não é incomum. Hipercalcemia<br />

de grau variável se deve tanto ao aumento da<br />

reabsorção óssea como pela hemoconcentração.<br />

Transami<strong>na</strong>ses e bilirrubi<strong>na</strong>s geralmente<br />

estão elevadas e, caso haja icterícia sem causa<br />

explicada, o prognóstico é desfavorável. Se<br />

houver rabdomiólise a creatinofosfoqui<strong>na</strong>se<br />

estará aumentada. Cortisol elevado indica<br />

resposta adequada ao estresse, devendo-<br />

-se avaliar com cuidado níveis normais que<br />

podem estar i<strong>na</strong>propriados para o quadro<br />

apresentado (10).<br />

Outros exames complementares<br />

Ultrassonografia de tireoide — Pode ser<br />

útil nos casos com bócio e suspeita de nódulo,<br />

a fim de avaliar as características do mesmo,<br />

uma vez que a existência de hipertireoidismo<br />

não exclui a concomitância de malignidade.<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5


Nos casos suspeitos a complementação<br />

diagnóstica é realizada com a punção por<br />

agulha fi<strong>na</strong> da tireoide (PAAF) e classificação<br />

citológica pelo sistema de Bethesda.<br />

Cintigrafia e captação de Na 131 I — Desnecessária<br />

<strong>na</strong> confirmação de BDT. Tem sua aplicação<br />

principal quando são detectados nódulos,<br />

a fim de auxiliar <strong>na</strong> caracterização de BNT ou<br />

BMNT. Nesses casos a captação do iodo é<br />

restrita ou mais intensa <strong>na</strong>s áreas autônomas.<br />

Na tireoidite subaguda, tipicamente, observa-<br />

-se captação extremamente baixa.<br />

Ressonância nuclear magnética — Se o diagnóstico<br />

indica tumor hipofisário<br />

Tratamento<br />

O BDT é tratado com antitireoideanos,<br />

iodo radioativo ou cirurgia. Entre os antitireoideanos,<br />

a medicação de escolha é o tapazol<br />

(TPZ), geralmente <strong>na</strong> dose de 5 a 30mg/dia,<br />

por um período não inferior a um a dois anos.<br />

O nível de T4L definirá os ajustes terapêuticos<br />

Referências<br />

11. PONTES, A.A.N.; ADAN, L.F. et al. — Prevalência de doenças<br />

da tireoide em uma <strong>comunidade</strong> do nordeste brasileiro. Arq.<br />

Bras. Endocrinol. Metab., 46: 544-9, 2002.<br />

12. MANDEL, S.; LARSEN, P.R. & DAVIES, T.F. — Thyrotoxicosis.<br />

In: Larsen, P.R.; Kronenberg, H.M. et al. (eds.) — Williams’<br />

textbook of endocrinology. 10. ed., Philadelphia, WB Saunders<br />

Co., 2002. p. 362-405.<br />

13. HOLLOWELL, J.G.; STAEHLING, N.W. et al. — Serum TSH, T4,<br />

and thyroid antibodies in the United States population (1988<br />

to 1994): Natio<strong>na</strong>l Health and Nutrition Exami<strong>na</strong>tion Survey<br />

(NHANES III). J. Clin. Endocrinol. Metab., 87: 489-99, 2002.<br />

14. VANDERPUMP, M.P.J.; TUNBRIDGE, W.M.G. et al. — The<br />

incidence of thyroid disorders in the community: A twenty-<br />

-year follow-up of the Whickham survey. Clin. Endocrinol.,<br />

43: 55-68, 1995.<br />

15. LA FRANCHI, S. — Hyperthyroidism. In: Kliegman — Nelson<br />

textbook of pediatrics. 19. ed., Saunders Elsevier, 2011.<br />

p. 1909-15.<br />

no início do tratamento, pois o TSH pode<br />

demorar vários meses para normalizar, mesmo<br />

com o paciente já eutireoideano. T3L ou T3T<br />

podem ser usadas, principalmente quando os<br />

níveis de T4L são limítrofes e há dúvida em<br />

relação ao ajuste da medicação. Geralmente<br />

os pacientes evoluem para eutireoidismo<br />

dentro de seis a 12 sema<strong>na</strong>s de tratamento.<br />

Por ser uma doença autoimune, faz parte da<br />

sua história <strong>na</strong>tural, mesmo em indivíduos não<br />

tratados, a possibilidade de evolução para<br />

eutireoidismo ou hipotireoidismo. É essencial<br />

a atenção à oftalmopatia nesta doença, pela<br />

necessidade de tratamento específico, que<br />

vai desde medidas de proteção ocular nos<br />

casos leves até corticoterapia, radioterapia<br />

ou cirurgia em casos avançados.<br />

Já os pacientes com BNT e BMNT podem<br />

usar antitireoideanos por algum período, mas<br />

raramente evoluirão com cura espontânea,<br />

sendo indicado o tratamento com cirurgia ou<br />

iodo radioativo. No BNT a injeção de etanol<br />

também é uma opção.<br />

16. BRENT, G.A. — Clinical practice. Graves’ disease. N. Engl. J.<br />

Med., 358: 2594-605, 2008.<br />

17. SILVA, R.C. — Importância da avaliação da função tireoidia<strong>na</strong><br />

em pacientes com diabetes mellitus. Arq. Bras. Endocrinol.<br />

Metab. (série <strong>na</strong> internet), 49(2): 180-2, 2005 (citado em 29<br />

de março de 2012).<br />

18. NAYAK, B. & HODAK, S.P. — Hyperthyroidism. Endocrinology<br />

and Metabolism Clinics, 36(3): 617-56, 2007.<br />

19. BRANDT, F.A. — Critical review and meta-a<strong>na</strong>lysis of the<br />

association between overt hyperthyroidism and mortality. Eur.<br />

J. Endocrinol., 165(4): 491-7, 2011.<br />

10. IGLESIAS P. — Severe hyperthyroidism: Aetiology, clinical<br />

features and treatment outcome. Clin. Endocrinol., 72(4):<br />

551-7, 2010.<br />

Obs.: As 32 referências restantes que compõem este artigo se<br />

encontram <strong>na</strong> Redação à disposição dos interessados.<br />

Hipertireoidismo<br />

Abordagem das principais causas e conduta diagnóstica<br />

Endereço para<br />

correspondência:<br />

Rosita Fontes<br />

Rua Almirante Alexandrino,<br />

2214/SS-201 — Santa Teresa<br />

20241-261<br />

Rio de Janeiro-RJ<br />

fontesrosita@hotmail.com<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5 33


34<br />

Biomarcadores inflamatórios e<br />

doenças cardiovasculares<br />

N. Engl. J. Med.<br />

panorama inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l<br />

Por representarem importante causa<br />

de morbiletalidade, ao redor de todo<br />

o mundo, as doenças cardiovasculares<br />

(DCVs) são frequentemente motivo de<br />

estudo, em busca de métodos que permitam<br />

diagnóstico cada vez mais precoce,<br />

assim como identificação e correção de<br />

seus fatores de risco. Nos últimos anos,<br />

a utilização de marcadores biológicos de<br />

inflamação — a exemplo da proteí<strong>na</strong> C-reativa<br />

(PCR) e fibrinogênio — como forma<br />

de predizer o risco para o desenvolvimento<br />

de um primeiro evento cardiovascular<br />

tem sido motivo frequente de debate. Um<br />

exemplo é o artigo intitulado “C-reactive<br />

Protein, Fibrinogen, and Cardiovascular<br />

Disease Prediction”, publicado recentemente<br />

no periódico The New England<br />

Jour<strong>na</strong>l of Medicine (N. Engl. J. Med.<br />

2012; 367:1310-20). Nele, os investigadores<br />

do grupo The Emerging Risk Factors<br />

Collaboration descrevem os resultados de<br />

uma meta-análise que incluiu 52 estudos<br />

prospectivos, com dados de quase 250<br />

mil pacientes sem histórico prévio de DCV.<br />

O objetivo principal foi avaliar o impacto<br />

desses marcadores em predizer o risco de<br />

um primeiro evento cardiovascular, além<br />

do real valor de sua realização rotineira.<br />

Quando associados a um modelo básico<br />

de avaliação — que incluiu a pesquisa de<br />

fatores de risco classicamente utilizados<br />

para o estudo das DCVs, como idade,<br />

sexo, tabagismo, pressão arterial, histórico<br />

de diabetes e dislipidemia — a dosagem<br />

dos níveis de PCR e fibrinogênio resultou<br />

em um aumento estatisticamente significativo<br />

(1,52%) <strong>na</strong> capacidade de classificar<br />

os pacientes como apresentando risco<br />

baixo, intermediário ou alto para o desenvolvimento<br />

de DCV. Os autores estimam<br />

que a adição de ambos os marcadores,<br />

mas principalmente da PCR, é capaz de<br />

prevenir pelo menos um evento cardio-<br />

vascular em cada 400-500 pacientes rastreados,<br />

ao longo de uma década. Como<br />

os ganhos adicio<strong>na</strong>is demonstrados com a<br />

inclusão dos biomarcadores inflamatórios<br />

como fatores de risco para as DCVs são<br />

modestos, o médico deve sempre considerar<br />

a relação custo/benefício antes de<br />

solicitar tais exames no acompanhamento<br />

rotineiro de seus pacientes.<br />

Probióticos <strong>na</strong> prevenção da colite<br />

pseudomembranosa<br />

Ann. Intern. Med.<br />

Entre as complicações que podem<br />

advir do uso de antimicrobianos, especialmente<br />

os de amplo espectro, estão a<br />

diarreia associada ao Clostridium difficile<br />

(DACD) e a colite pseudomembranosa.<br />

A colonização da flora intesti<strong>na</strong>l pelo<br />

C. difficile geralmente se dá em ambiente<br />

nosocomial e as manifestações clínicas<br />

surgem quando o equilíbrio normal da<br />

flora intesti<strong>na</strong>l é quebrado pelo uso de<br />

antimicrobianos, havendo liberação de<br />

toxi<strong>na</strong>s que causam dano e inflamação da<br />

mucosa intesti<strong>na</strong>l. A DACD pode acometer<br />

crianças e adultos, caracterizando-se<br />

clinicamente pelo surgimento de diarreia<br />

— frequentemente acompanhada de cólica<br />

abdomi<strong>na</strong>l, com ou sem manifestações<br />

sistêmicas — durante, ou até diversas sema<strong>na</strong>s<br />

após, terapia com antibiótico. Os<br />

principais fármacos relacio<strong>na</strong>dos são a<br />

clindamici<strong>na</strong>, cefalospori<strong>na</strong>s e penicili<strong>na</strong>s<br />

de amplo espectro. De acordo com uma<br />

meta-análise publicada no periódico An<strong>na</strong>ls<br />

of Inter<strong>na</strong>l Medicine, a utilização de<br />

probióticos concomitante ao curso de antibiótico<br />

é capaz de prevenir a DACD, reduzindo<br />

sua incidência em 66% (Johnston,<br />

B.C. et al. “Probiotics for the Prevention of<br />

Clostridium difficile-associated Diarrhea:<br />

A Systematic Review and Meta-a<strong>na</strong>lysis”.<br />

Ann. Intern. Med. 2012; online first). Os<br />

autores chegaram a tal conclusão após<br />

a<strong>na</strong>lisarem dados referentes a 20 estudos<br />

Profa. Dra. Andréa F. Mendes<br />

randomizados que compararam o uso de<br />

probióticos (Bifidobacterium, Lactobacilli,<br />

Saccharomyces e Streptococcus) ao placebo<br />

ou a nenhum tratamento em cerca<br />

de 3.800 pacientes imunocompetentes,<br />

adultos ou pediátricos, em uso de antibióticos.<br />

Considerando a rara ocorrência de<br />

eventos adversos associados aos probióticos<br />

(cerca de 9% vs. 13% no grupo-controle;<br />

principalmente náuseas e febre), os<br />

autores concluem que se deve pensar em<br />

prescrevê-los aos pacientes considerados<br />

em risco de DACD, durante a utilização de<br />

antibióticos de amplo espectro.<br />

Meningite bacteria<strong>na</strong> aguda<br />

The Lancet<br />

A edição de 10 de novembro de 2012<br />

do periódico The Lancet traz três artigos<br />

abordando aspectos diversos do manejo<br />

da meningite bacteria<strong>na</strong> aguda (MBA),<br />

doença que permanece como importante<br />

causa de óbito e incapacidade física. O primeiro<br />

deles, de Brouwer, M.C. e cols. (“Dilemmas<br />

in the Diagnosis of Acute Community-acquired<br />

Bacterial Meningitis”),<br />

aborda os principais dilemas com os quais<br />

o médico se depara quando está frente a<br />

um paciente com suspeita clínica de MBA.<br />

A a<strong>na</strong>mnese e o exame físico isoladamente<br />

costumam não ser suficientes para confirmar<br />

ou excluir o diagnóstico, tor<strong>na</strong>ndo<br />

fundamental a realização de punção lombar<br />

para análise do liquor — exame que<br />

deve ser interpretado de modo cuidadoso,<br />

pois há variações relacio<strong>na</strong>das à causa,<br />

idade, estado imunológico e realização ou<br />

não de tratamento prévio. Em outro artigo,<br />

“Advances in Treatment of Bacterial<br />

Meningitis”, van de Beek e cols. debatem<br />

o tratamento da MBA, destacando dois<br />

pontos principais: a otimização da antibioticoterapia,<br />

considerando o surgimento<br />

crescente de bactérias multirresistentes,<br />

e as controvérsias atuais relacio<strong>na</strong>das à<br />

terapia adjuvante (a exemplo de corticosteroides,<br />

indução de hipotermia, glicerol<br />

e paracetamol). Fi<strong>na</strong>lmente, discute-se o<br />

papel da vaci<strong>na</strong>ção ao redor do mundo,<br />

levando-se em consideração os três principais<br />

agentes etiológicos da MBA: Haemophilus<br />

influenzae, Streptococcus pneumoniae<br />

e Neisseria meningitidis (MacIntyre,<br />

P.B. et al. “Effect of Vaccines on Bacterial<br />

Meningitis Worldwide”).<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5


Falência hepática aguda<br />

Olival CirilO luCe<strong>na</strong> da FOnseCa netO<br />

Médico assistente do Serviço de Cirurgia Geral e Transplante de Fígado do Hospital Universitário<br />

Oswaldo Cruz — Universidade de Per<strong>na</strong>mbuco. Especialista em Medici<strong>na</strong> Intensiva pela<br />

Associação de Medici<strong>na</strong> Intensiva Brasileira — AMIB.<br />

Resumo<br />

Falência hepática aguda é uma síndrome<br />

clínica devastadora, com alta taxa de mortalidade,<br />

apesar dos recentes avanços da terapia<br />

intensiva. Determi<strong>na</strong>r a causa tem importantes<br />

implicações prognósticas, e o transplante<br />

de fígado é um tratamento que salva vidas<br />

em casos selecio<strong>na</strong>dos. O conhecimento das<br />

últimas diretrizes e protocolos pode levar a<br />

melhores resultados.<br />

Introdução<br />

Falência hepática aguda (FHA) é uma síndrome<br />

caracterizada pelo desenvolvimento<br />

de encefalopatia e coagulopatia dentro de<br />

26 sema<strong>na</strong>s do início dos sintomas (icterícia)<br />

(1). É uma desordem rara e complexa, podendo<br />

levar à morte por falência de múltiplos<br />

órgãos. Sua apresentação clínica é rápida,<br />

dramática e requer abordagem multidiscipli<strong>na</strong>r<br />

intensiva. Na ausência do transplante de<br />

fígado, a mortalidade pode chegar a 60% (2).<br />

Definição e etiologia<br />

Desde as primeiras descrições da FHA<br />

(1950) como entidade clínica distinta, várias<br />

classificações foram sugeridas para melhor<br />

caracterizar a síndrome (3) (Quadro 1).<br />

Paciente sem<br />

doença<br />

hepática<br />

prévia<br />

A maioria dos casos de FHA ocorre<br />

em mulheres jovens. Seu registro acurado<br />

é pobre, devido à ausência de código<br />

<strong>na</strong> classificação inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l de doenças<br />

+<br />

Icterícia<br />

Coagulopatia<br />

Encefalopatia<br />

=<br />

Summary<br />

Acute liver failure is a devasting clinical<br />

syndrome, with high mortality rate, despite<br />

critical care advances. Determining the cause<br />

has important prognostic implications, and<br />

the orthotopic liver transplantation is a life­<br />

­saving treatment in select cases. Knowledge<br />

of the latest guidelines and treatment protocols<br />

can lead to improved patient case.<br />

(CID) (4). Acredita-se que aproximadamente<br />

2 mil pessoas por ano nos EUA<br />

sejam acometidas, com 3,5 mortes por<br />

milhão de habitantes. Essa síndrome não<br />

é uma entidade clínica simples, e pode<br />

ser origi<strong>na</strong>da por uma grande variedade<br />

de causas (5).<br />

A etiologia da FHA apresenta variações<br />

geográficas e socioeconômicas (6).<br />

Na Europa e EUA predomi<strong>na</strong>m o uso do<br />

paracetamol e reações idiossincrásicas a<br />

dro gas; nos países em desenvolvimento,<br />

as hepa tites virais agudas (7). A identificação<br />

precoce da etiologia (quando<br />

possível!) permitirá o uso de tratamento<br />

específico: paracetamol, n-acetilcis-<br />

teí<strong>na</strong>; en vene<strong>na</strong>mento por Amanita phal­<br />

Falência<br />

hepática<br />

aguda<br />

loi des, penicili<strong>na</strong>; hepatite B ful mi<strong>na</strong>nte,<br />

lami vudi<strong>na</strong>; vírus do herpes sim ples,<br />

aciclovir; e esteatose aguda da gravidez,<br />

deli vramento (Quadro 2).<br />

Falência hepática aguda<br />

Unitermos: Falência<br />

hepática; hepatite fulmi<strong>na</strong>nte;<br />

transplante de fígado.<br />

Keywords: Hepatic<br />

failure; fulmi<strong>na</strong>nt hepatitis;<br />

liver transplantation.<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5 35<br />

medici<strong>na</strong> intensiva


36<br />

Falência hepática aguda<br />

QUADRO 1: Classificações da FHA<br />

Nomenclatura Definição Autor<br />

Insuficiência hepática Insuficiência hepática aguda grave, Trey & Davison<br />

fulmi<strong>na</strong>nte caracterizada pelo surgimento de<br />

encefalopatia no intervalo de 8 sema<strong>na</strong>s<br />

do início dos sintomas, sem doença<br />

hepática prévia<br />

Insuficiência hepática Insuficiência hepática aguda caracterizada Gimson<br />

subaguda pelo surgimento de encefalopatia no<br />

(início tardio) intervalo de 8 a 24 sema<strong>na</strong>s do início dos<br />

sintomas, sem doença hepática prévia<br />

Insuficiência hepática: O’Grady<br />

Hiperaguda Encefalopatia hepática dentro de 7 dias<br />

do início da icterícia<br />

Aguda Encefalopatia hepática entre 8 e 28 dias<br />

do início da icterícia<br />

Subaguda Encefalopatia hepática entre 4 e 12 sema<strong>na</strong>s<br />

do início da icterícia<br />

Insuficiência hepática: Benhamou<br />

Aguda grave Coagulopatia (fator V < 50%)<br />

Fulmi<strong>na</strong>nte Coagulopatia e encefalopatia dentro de 2<br />

sema<strong>na</strong>s do início da icterícia<br />

Subfulmi<strong>na</strong>nte Coagulopatia e encefalopatia entre 2 e 12<br />

sema<strong>na</strong>s do início da icterícia<br />

QUADRO 2: Etiologia da FHA<br />

Causa Agente responsável<br />

Hepatite viral VHA, VHB, VHD, VHE, CMV, hepatite soronegativa<br />

Relacio<strong>na</strong>da a drogas Paracetamol (dose relacio<strong>na</strong>da), reações idiossincrásicas<br />

(tuberculostáticos, estati<strong>na</strong>s, drogas ilícitas, anticonvulsivantes,<br />

anti-inflamatórios não esteroides, ciprotero<strong>na</strong> e muitas outras)<br />

Toxi<strong>na</strong>s Tetracloreto de carbono, Amanita phalloides<br />

Eventos vasculares Hepatite isquêmica, síndrome de Budd-Chiari, doença veno-oclusiva<br />

Outras Doenças hepáticas relacio<strong>na</strong>das à gravidez, doença de Wilson, linfoma,<br />

carcinoma, trauma<br />

Diagnóstico<br />

O reconhecimento precoce é fundamental<br />

para guiar o tratamento e obter bons resultados.<br />

Na identificação de alteração do<br />

sensório (encefalopatia) deve-se hospitalizar<br />

o paciente e transferi-lo para um centro<br />

transplantador (8, 9).<br />

Obter história clínica pode ser difícil<br />

(presença ou não de encefalopatia). Caso<br />

no exame físico percebam-se estigmas de<br />

doença hepática (aranhas vasculares, esplenomegalia),<br />

afasta-se o diagnóstico de<br />

FHA. Icterícia, fígado não palpável e encefalopatia<br />

podem ser os únicos achados à<br />

admissão do paciente. Quanto à avaliação<br />

laboratorial, ela é extensiva, variando da<br />

classificação sanguínea ao nível de ceruloplasmi<strong>na</strong><br />

sérica. A biopsia hepática pode ser<br />

realizada (transjugular), mas deve ser muito<br />

bem avaliada, para não causar mais dano<br />

(coagulopatia). A USG de abdome pode<br />

ser solicitada para se observar a textura do<br />

parênquima e outros achados que sugiram<br />

doença hepática crônica (10).<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5


Aspectos clínicos e manejo<br />

As manifestações iniciais podem ser<br />

inespecíficas. A curva das transami<strong>na</strong>ses<br />

não prediz o prognóstico; entretanto, a<br />

sua queda associada com aumento progressivo<br />

da bilirrubi<strong>na</strong> e INR selam o diagnóstico<br />

de FHA. Com a necrose hepática<br />

maciça aparecem as disfunções dos vários<br />

sistemas.<br />

Encefalopatia hepática<br />

A sua origem é diferente daquela que<br />

ocorre nos pacientes cirróticos. Na FHA<br />

o edema cerebral é a principal causa de<br />

morte precoce. A TAC de crânio deve ser<br />

solicitada nos estágios 3 e 4 da encefalopatia.<br />

Atenção especial para a hipertensão<br />

intracrania<strong>na</strong> (PIC) que se estabelece silenciosamente<br />

(11).<br />

O manejo da PIC requer a instalação<br />

de monitores invasivos de PIC, administração<br />

de manitol 20% ou solução sali<strong>na</strong> hipertônica.<br />

Tiopental e fenobarbital podem<br />

também ser usados (12). A hipotermia vem<br />

sendo utilizada, com ressalvas, em alguns<br />

centros transplantadores. Elevar o decúbito<br />

cefálico em 30º e hiperventilar são<br />

atitudes simples que podem ser utilizadas<br />

inicialmente (13).<br />

Coagulopatia<br />

É caracterizada por prolongamento do<br />

tempo de protrombi<strong>na</strong> e disfunção plaquetária.<br />

Apesar da severidade da coagulopatia,<br />

não é usual a hemorragia espontânea.<br />

Proteí<strong>na</strong>s anticoagulantes C, S e antitrombi<strong>na</strong><br />

III apresentam diminuição em sua produção<br />

(14). A administração profilática de<br />

plasma fresco não é necessária e dificulta a<br />

avaliação do escore prognóstico (15). Atualmente,<br />

plasma fresco, plaqueta, crioprecipitado<br />

ou fatores recombi<strong>na</strong>ntes/complexo<br />

protrombínico só devem ser utilizados em<br />

vigência de sangramento ou antes de procedimentos<br />

invasivos.<br />

Disfunção pulmo<strong>na</strong>r<br />

Injúria pulmo<strong>na</strong>r aguda pode acontecer<br />

em pacientes com FHA e contribui aumentando<br />

a morbimortalidade. Alterações <strong>na</strong><br />

vasculatura e <strong>na</strong> permeabilidade são observadas<br />

<strong>na</strong> FHA. O edema cerebral pode<br />

ser acelerado pelas manobras da estratégia<br />

ventilatória protetora utilizada <strong>na</strong> síndrome<br />

do desconforto respiratório do adulto<br />

(SDRA) (16).<br />

Falência re<strong>na</strong>l<br />

Ocorre em 70% dos pacientes e é multifatorial.<br />

Desidratação, sepse, hipotensão,<br />

drogas, etc. podem ser a origem da injúria<br />

re<strong>na</strong>l. Síndrome hepatorre<strong>na</strong>l pode ocorrer,<br />

mas não está relacio<strong>na</strong>da com a severidade<br />

da FHA. Porém, a presença da síndrome da<br />

resposta inflamatória prediz disfunção re<strong>na</strong>l.<br />

Terapia de substituição re<strong>na</strong>l frequentemente<br />

é necessária (17).<br />

Alterações hemodinâmicas<br />

Quando semelhantes à sepse são comuns:<br />

resistência vascular sistêmica e pulmo<strong>na</strong>r<br />

básica, elevado débito cardíaco, hipermetabolismo<br />

e hipotensão. Acidose e hiperlactemia<br />

são frequentes. Hipovolemia deve<br />

ser corrigida (ressuscitação com cristaloides)<br />

e vasopressores podem ser necessários (18).<br />

Infecção e sepse<br />

O sistema imune está alterado <strong>na</strong> FHA,<br />

principalmente a relação complemento/opsonização<br />

e o sistema i<strong>na</strong>to. A infecção é causa<br />

de morte em um terço dos pacientes com<br />

FHA. As enterobactérias são as mais frequentes<br />

e, depois, os Gram-positivos, devido aos<br />

procedimentos invasivos. Infecção fúngica<br />

também pode ocorrer. A infecção piora a encefalopatia.<br />

Na FHA, a síndrome da resposta<br />

inflamatória sistêmica está associada à injúria<br />

pulmo<strong>na</strong>r, sepse e falência de múltiplos<br />

órgãos. Antibioticoprofilaxia deve ser feita,<br />

e atenção especial com infecção fúngica é<br />

mandatória (19).<br />

Desordens eletrolíticas e acidobásicas<br />

Hipo<strong>na</strong>tremia, hiper e hipopotassemia,<br />

hiperlactatemia, acidose metabólica e hipofosfatemia<br />

são comuns. Níveis aumentados<br />

de fósforo podem estar associados com mau<br />

prognóstico.<br />

Hipoglicemia<br />

Ocorre em mais de 45% dos pacientes<br />

com FHA. A monitorização da glicose é mandatória<br />

e glicose hipertônica é necessária.<br />

Suporte nutricio<strong>na</strong>l deve ser iniciado o mais<br />

precocemente possível.<br />

Falência hepática aguda<br />

A etiologia da FHA<br />

apresenta variações<br />

geográficas e<br />

socioeconômicas: <strong>na</strong><br />

Europa e EUA predomi<strong>na</strong><br />

o uso do paracetamol e<br />

reações idiossincrásicas<br />

a drogas; nos países em<br />

desenvolvimento, as<br />

hepatites virais agudas.<br />

A identificação precoce<br />

da etiologia permitirá<br />

o uso de tratamento<br />

específico.<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5 37


38<br />

Falência hepática aguda<br />

Pontos-chave:<br />

> A decisão de incluir um<br />

paciente com FHA <strong>na</strong> lista de<br />

transplante de emergência é<br />

difícil;;<br />

> O julgamento entre o risco<br />

de recuperação espontânea<br />

com suporte intensivo e<br />

indicação tardia ao TxF faz<br />

parte do exercício contínuo da<br />

equipe transplantadora;<br />

> A FHA apresenta alta<br />

mortalidade, e enquanto<br />

espera o TxF o paciente poderá<br />

desenvolver contraindicações<br />

médicas.<br />

Sangramento gastrointesti<strong>na</strong>l<br />

Existe alto risco de sangramento gastrointesti<strong>na</strong>l<br />

nos pacientes com FHA, e a<br />

profilaxia com antiácidos pode ser utilizada.<br />

Transplante de fígado<br />

Avanços nos cuidados críticos aumentam<br />

a sobrevida espontânea nos pacientes<br />

com FHA (entre 15% e 40%). Com o advento<br />

do transplante de fígado (TxF) a taxa de<br />

sobrevida pode chegar a 60%. Devido à<br />

grande variabilidade <strong>na</strong> sobrevida entre pacientes<br />

com FHA, é muito difícil estabelecer<br />

quem vai precisar ou não do TxF. É obrigatória<br />

a atenção ao aparecimento de contraindicações<br />

nesses pacientes, para evitar<br />

um transplante fútil (20).<br />

QUADRO 3: Indicadores prognósticos<br />

<strong>na</strong> FHA<br />

Lactato (sérico)<br />

Fósforo (sérico)<br />

Relação fator VIII/V<br />

Interleuci<strong>na</strong>s 6 e 8 (circulantes)<br />

Histologia hepática (necrose)<br />

Tempo de protrombi<strong>na</strong> (INR)<br />

Tamanho do fígado à tomografia<br />

Razão corporal da ceto<strong>na</strong> arterial<br />

Proteí<strong>na</strong> carreadora da vit. D (sérica)<br />

MELD (> 32)<br />

QUADRO 4: Critério de pior prognóstico do King’s College<br />

Paracetamol Listar para TxF se:<br />

• pH arterial < 7,3<br />

Ou os três parâmetros abaixo em 24 horas:<br />

• Encefalopatia grau III-IV<br />

• INR > 6,5<br />

• Creatini<strong>na</strong> > 3,5<br />

Prognóstico<br />

A decisão de incluir um paciente com<br />

FHA <strong>na</strong> lista de transplante de emergência<br />

é difícil. O julgamento entre o risco<br />

de recuperação espontânea com suporte<br />

intensivo e indicação tardia ao TxF faz<br />

parte do exercício contínuo da equipe<br />

transplantadora. Vários escores de prognóstico<br />

foram propostos, baseados em<br />

suporte matemático, sorológico, histológico<br />

e radiológico (Quadro 3). O escore<br />

MELD (Model for End-stage Liver Disease)<br />

também foi testado e aprovado para<br />

ser utilizado entre pacientes com FHA.<br />

Os critérios do King’s College e de Clichy<br />

(Quadros 4 e 5) são os mais utilizados<br />

para avaliar os pacientes que necessitarão<br />

de TxF.<br />

QUADRO 5: Critério de pior prognóstico<br />

de Clichy<br />

Listar o paciente para TxF se:<br />

• Encefalopatia e idade < 20 anos com fator<br />

V < 20%<br />

• Encefalopatia e idade < 30 anos com fator<br />

V < 30%<br />

Não paracetamol Listar para TxF se:<br />

• INR > 6,5 (sozinho)<br />

Ou três dos cinco parâmetros abaixo:<br />

• Idade < 10 e > 40<br />

• Intervalo > 7 dias entre a icterícia e a encefalopatia<br />

• INR > 3,5<br />

• Bilirrubi<strong>na</strong> > 17,5<br />

• Etiologia desfavorável: sorologia viral negativa, doença de Wilson,<br />

halotano, reação idiossincrásica à droga<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5


Considerações fi<strong>na</strong>is<br />

A FHA apresenta alta mortalidade, e<br />

enquanto espera o TxF o paciente poderá<br />

desenvolver contraindicações médicas (disfunções<br />

orgânicas termi<strong>na</strong>is). Aparelhos de<br />

suporte hepático podem ser utilizados como<br />

ponte para o TxF ou para ajudar <strong>na</strong> recuperação<br />

espontânea. Existem dois tipos: artificial<br />

e bioartificial. Em ambos há evidência de<br />

melhora neurológica e diminuição do grau<br />

da encefalopatia, mas sem a observação de<br />

qualquer melhora <strong>na</strong> sobrevida.<br />

Referências<br />

1. RIFAI, K. & BAHR, M.J. — Acute liver failure. Internist (Berl.),<br />

44(5): 585-90, 592-8, 2003.<br />

2. CRAIG, D.G.N.; LEE, A. et al. — Review article: The current<br />

ma<strong>na</strong>gement of acute liver failure. Aliment. Pharmacol.<br />

Ther., 31(3): 345-58, 2010.<br />

3. LARSON, A.M. — Diagnosis and ma<strong>na</strong>gement of acute liver<br />

failure. Curr. Opin. Gastroenterol., 26(3): 214-21, 2010.<br />

4. TROTTER, J.F. — Practical ma<strong>na</strong>gement of acute liver failure<br />

in the Intensive Care Unit. Curr. Opin. Crit. Care, 15(2): 163-7,<br />

2009.<br />

5. MUNOZ, S.J.; STRAVITZ, R.T. & GABRIEL, D.A. — Coagulopathy<br />

of acute liver failure. Clin. Liver Dis., 13(1): 95-107,<br />

2009.<br />

6. BLEI, A.T. — Brain edema in acute liver failure. Crit. Care<br />

Clin., 24(1): 99-114, 2008.<br />

Conclusão<br />

O transplante de fígado continua sendo<br />

o tratamento de escolha para os pacientes<br />

que não se recuperam da FHA. Entretanto,<br />

marcadores prognósticos devem ser utilizados<br />

para impedir transplante de fígado entre<br />

pacientes com contraindicações, isto é,<br />

transplante fútil.<br />

7. TSAI, M.H.; CHEN, Y.C. et al. — Hemody<strong>na</strong>mics and metabolic<br />

studies on septic shock in patients with acute liver<br />

failure. J. Crit. Care, 23(4): 468-72, 2008.<br />

8. KRAMER, D.J. — Invited commentary: Septic shock in acute<br />

liver failure. J. Crit. Care, 23(4): 473-4, 2008.<br />

9. COTÉ, G.A.; GOTTSTEIN, J.H. et al. — Acute Liver Failure<br />

Study Group. The role of etiology in the hyperamylasemia<br />

of acute liver failure. Am. J. Gastroenterol., 104(3): 592-7,<br />

2009.<br />

10. RASCHKE, R.A.; CURRY, S.C. et al. — Results of a protocol<br />

for the ma<strong>na</strong>gement of patients with fulmi<strong>na</strong>nt liver failure.<br />

Crit. Care Med., 36(8): 2244-8, 2008.<br />

Obs.: As 10 referências restantes que compõem este artigo se<br />

encontram <strong>na</strong> Redação à disposição dos interessados.<br />

Tema Central: Diagnóstico e terapêutica em Gastroenterologia<br />

Coorde<strong>na</strong>ção científica: Prof. José Galvão-Alves<br />

Convidados inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>is<br />

Vicente Arroyo (Espanha) • Fer<strong>na</strong>ndo Magro (Portugal)<br />

Santa Casa da Misericórdia do RJ<br />

Federação Brasileira de Gastroenterologia<br />

Apoio<br />

Falência hepática aguda<br />

Endereço para<br />

correspondência:<br />

Olival Cirilo Luce<strong>na</strong> da<br />

Fonseca Neto<br />

Rua Jacobi<strong>na</strong>, 45/1002<br />

— Graças<br />

52011-180<br />

Recife-PE<br />

olivalneto@globo.com<br />

Sociedade de Gastroenterologia do RJ<br />

Sociedade Brasileira de Clínica Médica do RJ<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5 39


Polimorfismo GHRd3 e suas implicações <strong>na</strong> prática clínica<br />

Polimorfismo GHRd3 e suas implicações<br />

<strong>na</strong> prática clínica<br />

Raquel Machado andRade<br />

Alu<strong>na</strong> de mestrado do Programa de Pós-graduação em Patologia da Universidade Federal<br />

Fluminense (UFF), Niterói, RJ.<br />

Rafaela elviRa Rozza<br />

Alu<strong>na</strong> de doutorado do Programa de Pós-graduação em Patologia da UFF.<br />

MauRo GelleR<br />

Professor titular de Imunologia Clínica da Faculdade de Medici<strong>na</strong> do Centro Universitário Serra<br />

dos Órgãos. Professor titular do Curso de Especialização em Imunologia Clínica do Instituto<br />

de Pós-graduação Médica Carlos Chagas. Professor e coorde<strong>na</strong>dor do Setor de Facomatoses<br />

do Serviço de Genética Clínica do Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira, da<br />

Universidade Federal do Rio de Janeiro.<br />

KaRin SoaReS GonçalveS cunha<br />

Professora adjunta da Faculdade de Odontologia do Polo Universitário de Nova Friburgo da UFF.<br />

Coorde<strong>na</strong>dora do Programa de Pós-graduação em Patologia da Faculdade de Medici<strong>na</strong> da UFF.<br />

Resumo<br />

O hormônio do crescimento (GH), ou<br />

somatotropi<strong>na</strong>, é um hormônio secretado<br />

pela glândula hipófise anterior, cuja função<br />

é promover e controlar o crescimento corporal.<br />

Polimorfismos em receptores de hormônios<br />

têm sido apontados como importantes<br />

no desenvolvimento de muitas doenças e,<br />

entre os polimorfismos do gene GHR, o<br />

polimorfismo representado pela deleção<br />

do éxon 3 do gene GHR (GHRd3) tem sido<br />

o mais estudado. Este polimorfismo tem<br />

influência sobre a expressão e/ou responsividade<br />

do GHR, afetando sua ligação ao<br />

GH. O objetivo deste trabalho é realizar uma<br />

revisão sobre o polimorfismo GHRd3 e suas<br />

implicações <strong>na</strong> prática clínica.<br />

Introdução<br />

O hormônio do crescimento (GH), ou<br />

somatotropi<strong>na</strong>, é um hormônio secretado<br />

pela glândula hipófise anterior cuja função é<br />

promover e controlar o crescimento corporal<br />

(1). O GH apresenta uma variedade de funções<br />

biológicas em diferentes tecidos e células,<br />

atuando sobre a mitogênese, diferenciação e<br />

metabolismo (2).<br />

Summary<br />

Growth hormone (GH) or somatotropin is<br />

a hormone secreted by the anterior pituitary<br />

gland, whose function is to promote and<br />

control the body growth. Polymorphisms<br />

in hormone receptors have been identified<br />

as important in the development of many<br />

diseases, and, among the GHR gene polymorphisms,<br />

the polymorphism represented<br />

by the deletion of exon 3 of the GHR gene<br />

(GHRd3) has been the most studied. This<br />

polymorphism influences the expression<br />

and/or responsiveness of GHR, affecting its<br />

binding to GH. The aim of this study is to<br />

perform a review of GHRd3 polymorphism<br />

and its implications for clinical practice.<br />

et ent quist, nimilique voluptaturia.<br />

O GH promove seus efeitos biológicos<br />

diretamente, através de sua ligação ao receptor<br />

do hormônio do crescimento (GHR)<br />

em células-alvo, ou indiretamente, via indução<br />

da secreção do fator de crescimento similar<br />

à insuli<strong>na</strong> tipo 1 (IGF-1), o qual atua sinergicamente<br />

com o GH em muitas funções (3).<br />

A hipo e a hipersecreção do GH provocam<br />

anomalias físicas e/ou metabólicas, como <strong>na</strong>-<br />

Unitermos: Hormônio do<br />

crescimento; somatotropi<strong>na</strong>;<br />

receptores do hormônio do<br />

crescimento; polimorfismo<br />

genético.<br />

Keywords: Growth<br />

hormone; somatotropin;<br />

growth hormone receptors;<br />

genetic polymorphism.<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5 41<br />

endocrinologia


42<br />

Polimorfismo GHRd3 e suas implicações <strong>na</strong> prática clínica<br />

Pontos-chave:<br />

> A hipo e a hipersecreção<br />

do GH provocam anomalias<br />

físicas e/ou metabólicas,<br />

como <strong>na</strong>nismo, gigantismo e<br />

acromegalia;<br />

> Trabalhos têm identificado<br />

o GH e IGF-1 como potentes<br />

indutores de crescimento<br />

celular em vários tumores<br />

benignos e malignos;<br />

> Polimorfismos em receptores<br />

hormo<strong>na</strong>is têm sido apontados<br />

como importantes no<br />

desenvolvimento de muitas<br />

doenças, incluindo neoplasias.<br />

nismo, gigantismo e acromegalia. Além disto,<br />

trabalhos têm identificado o GH e IGF-1 como<br />

potentes indutores de crescimento celular em<br />

vários tumores benignos e malignos (4-7).<br />

Polimorfismos em receptores hormo<strong>na</strong>is<br />

têm sido apontados como importantes<br />

no desenvolvimento de muitas doenças,<br />

incluindo neoplasias (6, 8). Alguns desses<br />

polimorfismos têm sido relacio<strong>na</strong>dos com a<br />

maior expressão dos seus receptores. Polimorfismos<br />

no gene GHR têm sido descritos<br />

nos éxons 3, 4, 6, 9 e 10 (7). No entanto,<br />

o polimorfismo representado pela deleção<br />

completa do éxon 3 do GHR (GHRd3) tem<br />

sido o mais estudado.<br />

No GHRd3, esta deleção corresponde a<br />

22 aminoácidos localizados fora do sítio de<br />

ligação do domínio extracelular do receptor<br />

(4). As consequências funcio<strong>na</strong>is desta deleção<br />

ainda não foram totalmente elucidadas.<br />

Entretanto, tem sido relatado que este polimorfismo<br />

pode influenciar a expressão ou<br />

responsividade do receptor, afetando, assim,<br />

a ligação ao GH (8). O objetivo deste trabalho<br />

é realizar uma revisão da literatura sobre o<br />

polimorfismo GHRd3 e suas implicações <strong>na</strong><br />

prática clínica.<br />

Material e métodos<br />

Foi realizado um levantamento bibliográfico<br />

através das ferramentas de pesquisa<br />

Google Acadêmico (http://scholar.google.<br />

com.br) e PubMed (http://www.ncbi.nlm.<br />

nih.gov/pubmed), utilizando as palavras-<br />

-chaves GHRd3, receptor, hormônio do<br />

crescimento e polimorfismo. Os artigos<br />

disponíveis foram selecio<strong>na</strong>dos e, após sua<br />

leitura, algumas referências citadas foram<br />

também selecio<strong>na</strong>das para o desenvolvimento<br />

desta revisão.<br />

Revisão da literatura<br />

Receptor do hormônio do crescimento<br />

O gene que codifica o GHR está localizado<br />

no cromossomo 5p13-p12, apresenta nove<br />

éxons numerados de 2 a 10 e uma região de<br />

íntrons com 3.400 pares de bases (4, 9). O<br />

éxon 2 codifica o peptídeo de si<strong>na</strong>l, os éxons<br />

3 a 7 codificam o domínio extracelular, o<br />

éxon 8 codifica o domínio transmembra<strong>na</strong>r<br />

e os éxons 9 e 10 codificam o domínio citoplasmático<br />

do GHR (4).<br />

O GHR é uma proteí<strong>na</strong> transmembra<strong>na</strong>r<br />

do tipo 1 localizada <strong>na</strong> membra<strong>na</strong> citoplasmática;<br />

sua estrutura, como um todo, assemelha-<br />

-se ao receptor de prolacti<strong>na</strong> e seu domínio<br />

extracelular se assemelha aos receptores da<br />

superfamília das citoci<strong>na</strong>s, sendo um sítio<br />

potencial para glicosilação (2). O GHR é uma<br />

proteí<strong>na</strong> integral de membra<strong>na</strong>, com aproximadamente<br />

637 aminoácidos, sendo 246 aminoácidos<br />

do domínio extracelular, um único<br />

domínio transmembra<strong>na</strong>r e 350 aminoácidos<br />

do domínio citoplasmático (4, 9, 10).<br />

Polimorfismo GHRd3<br />

Em 1989, Godowski et al. (4) foram os<br />

primeiros a relatar a existência de duas isoformas<br />

do GHR, sendo uma caracterizada pela<br />

deleção do éxon 3 (GHRd3) e a outra que<br />

possui o comprimento completo (GHRfl) do<br />

éxon 3 (4, 9, 11). A prevalência do polimorfismo<br />

GHRd3 <strong>na</strong> população em geral é de 49%,<br />

sendo que 37% são heterozigotos e 12% são<br />

homozigotos (12).<br />

A sequência do éxon 3 é composta<br />

por 66 nucleotídeos, que são flanqueados<br />

por duas regiões de elementos retrovirais<br />

longos de repetição (LTR) com 251 pares<br />

de bases (PB), anterior e posterior a este<br />

mesmo éxon (10). No GHRd3 existe a deleção<br />

de toda a extensão do éxon 3 e dos<br />

elementos de repetição posterior ao éxon,<br />

permanecendo a LTR anterior. Esta deleção<br />

corresponde a 22 aminoácidos localizados<br />

fora do sítio de ligação do domínio extracelular<br />

do receptor (4, 8).<br />

Origem do polimorfismo GHRd3<br />

A perda do éxon 3 pode ser explicada, em<br />

parte, por um mecanismo mediado por um<br />

retrovírus (10). Esta deleção espécie-específica<br />

ocorreu tardiamente durante a evolução dos<br />

primatas, sendo o produto de recombi<strong>na</strong>ção<br />

intracromossomial entre retroelementos específicos<br />

de primatas que flanqueiam o éxon 3<br />

(8). Desta forma, existe a hipótese de o GHRd3<br />

ser proveniente de um splicing alter<strong>na</strong>tivo<br />

espécie-específico do DNA genômico do<br />

GHRfl, sendo esta deleção herdada de forma<br />

mendelia<strong>na</strong> (10). Entretanto, estudos realizados<br />

correlacio<strong>na</strong>ndo fenótipo e genótipo in<br />

vitro e in vivo levantaram evidências contra a<br />

existência de splicing alter<strong>na</strong>tivo envolvendo<br />

a deleção do éxon 3 (13-15).<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5


Alterações funcio<strong>na</strong>is do GHRd3<br />

As consequências funcio<strong>na</strong>is do GHRd3<br />

ainda não foram bem elucidadas, pois, embora<br />

tenham sido descritas mais de 50 mutações<br />

em vários éxons do GHR, somente uma foi<br />

observada no éxon 3 (GHR W16X ), porém<br />

ainda não se sabe qual é a sua função (13).<br />

Tem sido relatado que o polimorfismo GHRd3<br />

pode influenciar a expressão ou responsividade<br />

do receptor, afetando, assim, a ligação ao GH<br />

e aumentando sua ação (8, 16). A razão do<br />

aumento da responsividade do GHRd3 não é<br />

conhecida, entretanto, o mecanismo molecular<br />

não parece envolver maior ligação ou menor<br />

inter<strong>na</strong>lização do hormônio, mas sim um dobramento<br />

mais fácil ou precoce do receptor,<br />

facilitando sua ligação ao GH (17). Dos Santos<br />

et al. (8) relataram também que é possível que<br />

o GHRd3 altere o processamento, o transporte<br />

e a estabilidade do receptor, além da ligação a<br />

outros ligantes e a dimerização dos monômeros<br />

de GHR e transdução de si<strong>na</strong>l.<br />

A deleção do éxon 3 está associada à perda<br />

de quatro sítios de fosforilação, uma área<br />

de N-glicosilação no DNA e à substituição de<br />

uma alani<strong>na</strong> por asparagi<strong>na</strong> no fi<strong>na</strong>l do éxon 2,<br />

que provavelmente afeta a glicosilação pós-<br />

-transcricio<strong>na</strong>l da parte extracelular do receptor<br />

(8, 16). Esta modificação gera mudança de<br />

carga, tamanho e hidrofobicidade do domínio<br />

extracelular do receptor (8). Provavelmente,<br />

estas mudanças interferem <strong>na</strong> interação do<br />

receptor com as proteí<strong>na</strong>s envolvidas <strong>na</strong><br />

transdução de si<strong>na</strong>l (16).<br />

GHRd3 e puberdade precoce<br />

Tem sido cada vez mais discutida a importância<br />

do eixo GH/IGF-1 no desenvolvimento<br />

go<strong>na</strong>dal. Sorensen et al. (18) relataram que a<br />

homozigose para a deleção do éxon 3 apresenta-se<br />

relacio<strong>na</strong>da com desenvolvimento<br />

go<strong>na</strong>dal e aumento dos níveis de testostero<strong>na</strong><br />

precoces em meninos, quando comparados<br />

com homozigotos sem a deleção.<br />

GHRd3 <strong>na</strong> terapia com hormônio do<br />

crescimento recombi<strong>na</strong>nte<br />

Vários estudos têm investigado o polimorfismo<br />

GHRd3 e sua maior responsividade<br />

em pacientes submetidos ao tratamento com<br />

GH recombi<strong>na</strong>nte (19-22). Binder et al. (11)<br />

demonstraram que crianças <strong>na</strong>scidas com<br />

baixa estatura para a idade gestacio<strong>na</strong>l e<br />

portadoras da síndrome de Turner, que possuíam<br />

a deleção do éxon 3 em pelo menos um<br />

alelo, submetidas à reposição farmacológica<br />

de GH, apresentaram maior taxa e velocidade<br />

de crescimento, quando comparadas com<br />

as crianças que possuíam o GHR completo.<br />

Assim, constatou-se que a presença de pelo<br />

menos um alelo de GHRd3 favorece maior<br />

incremento <strong>na</strong> altura após reposição hormo<strong>na</strong>l<br />

(11). Wasse<strong>na</strong>ar et al. (12), em um estudo de<br />

meta-análise, verificaram que pacientes com<br />

deficiência severa de GH também apresentaram<br />

taxa e velocidade de crescimento maiores<br />

após reposição hormo<strong>na</strong>l quando possuíam<br />

pelo menos um alelo de deleção no éxon 3,<br />

quando comparados com os homozigotos<br />

sem deleção (11, 12).<br />

Influência do polimorfismo GHRd3 no<br />

crescimento espontâneo e suas vias<br />

compensatórias<br />

Nos portadores do gene GHRd3, existe<br />

uma via hipofisária compensatória sobre a<br />

secreção do GH, que diminui os níveis séricos<br />

deste hormônio, reduzindo o efeito do GHRd3<br />

no crescimento espontâneo (8, 11, 12). Desta<br />

forma, não se espera que a presença do<br />

polimorfismo GHRd3 esteja relacio<strong>na</strong>da com<br />

variações fisiológicas do crescimento humano<br />

(8, 11, 12).<br />

Entretanto, durante o desenvolvimento<br />

pré-<strong>na</strong>tal, a presença do GHRd3 influencia<br />

negativamente o crescimento. Crianças<br />

<strong>na</strong>scidas com baixa estatura são em sua<br />

maioria homozigotas para deleção do éxon 3<br />

quando comparadas com crianças <strong>na</strong>scidas<br />

com tamanho normal (18, 23). Essa diferença<br />

provavelmente ocorre por fatores maternos e<br />

pela via compensatória GH/GHR placentário<br />

(24-26). Devido a uma maior responsividade<br />

do GHR placentário, a secreção do GH placentário<br />

seria diminuída, assim como a do IGF-1<br />

e o aporte de nutrientes, fazendo que o feto<br />

tivesse menor crescimento (24-26).<br />

Pantel et al. (4), em 2003, relataram o<br />

caso de uma criança portadora de uma doença<br />

autossômica recessiva contendo, no seu<br />

genótipo, a mutação GHR (W16x) no éxon 3<br />

e uma mutação no éxon 4 (C38x), levando a<br />

um fenótipo de insensibilidade congênita ao<br />

GH. Durante a avaliação genotípica dos pais,<br />

observou-se que a presença de ape<strong>na</strong>s um<br />

alelo normal (GHRfl) ou um alelo contendo a<br />

Polimorfismo GHRd3 e suas implicações <strong>na</strong> prática clínica<br />

A razão do aumento<br />

da responsividade do<br />

GHRd3 não é conhecida,<br />

entretanto, o mecanismo<br />

molecular não parece<br />

envolver maior ligação ou<br />

menor inter<strong>na</strong>lização do<br />

hormônio, mas sim um<br />

dobramento mais fácil<br />

ou precoce do receptor,<br />

facilitando sua ligação<br />

ao GH.<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5 43


44<br />

Polimorfismo GHRd3 e suas implicações <strong>na</strong> prática clínica<br />

Pontos-chave:<br />

> O polimorfismo GHRd3<br />

parece ter impacto relevante<br />

<strong>na</strong> avaliação bioquímica<br />

pós-tratamento da acromegalia;<br />

> Mesmo após a neurocirurgia,<br />

é mantida a discrepância entre<br />

os níveis séricos IGF-1/GH,<br />

fato que não se observa <strong>na</strong><br />

presença do GHRfl;<br />

> As complicações nos<br />

indivíduos GHRd3 com<br />

acromegalia podem estar<br />

associadas com o aumento da<br />

prevalência da osteoartrite,<br />

dolicocólon e pólipos<br />

adenomatosos no cólon.<br />

deleção completa do éxon 3 (GHRd3) garantiu<br />

um crescimento normal, já que os pais não<br />

eram portadores da doença.<br />

GHRd3 <strong>na</strong> acromegalia<br />

O polimorfismo GHRd3 parece ter impacto<br />

relevante <strong>na</strong> avaliação bioquímica pós-<br />

-tratamento da acromegalia. Mesmo após a<br />

neurocirurgia, é mantida a discrepância entre<br />

os níveis séricos IGF-1/GH, fato que não se<br />

observa <strong>na</strong> presença do GHRfl (27). A ausência<br />

do éxon 3 também pode estar associada<br />

com maior morbidade clínica nos pacientes<br />

com acromegalia (28). As complicações nos<br />

indivíduos GHRd3 com acromegalia podem<br />

estar associadas com o aumento da prevalência<br />

da osteoartrite, dolicocólon e pólipos<br />

adenomatosos no cólon (29).<br />

GHRd3 e o metabolismo da glicose<br />

e lipídeos<br />

Estudos têm sugerido que a presença de<br />

pelo menos um alelo do GHRd3, em crianças<br />

saudáveis e adolescentes normais durante a<br />

puberdade, está relacio<strong>na</strong>da com secreção de<br />

insuli<strong>na</strong> elevada para um determi<strong>na</strong>do grau<br />

de sensibilidade e também a níveis elevados<br />

de triglicerídeos (18). Desta forma, eles sugerem<br />

que é possível que este polimorfismo<br />

possa desempenhar um papel importante<br />

<strong>na</strong> capacidade compensatória das células ß<br />

pancreáticas (18).<br />

Indivíduos homozigotos para GHRd3<br />

parecem ser menos suscetíveis ao desenvolvimento<br />

de diabetes mellitus tipo 2 (30). Todavia,<br />

quando outros fatores estão envolvidos<br />

e são característicos para o desenvolvimento<br />

do diabetes mellitus tipo 2, o alelo GHRd3<br />

confere um fenótipo indicativo de desordem<br />

metabólica (30).<br />

Vários trabalhos têm estudado o papel das<br />

citoci<strong>na</strong>s pró-inflamatórias e da autoimunidade<br />

no desenvolvimento do diabetes mellitus<br />

tipo 1 (31-34). Em um estudo com portadores<br />

desta doença foi observada relação entre<br />

a presença do GHRd3, a concentração de<br />

anticorpos anti-insuli<strong>na</strong> e a concentração<br />

aumentada de citoci<strong>na</strong>s pró-inflamatórias,<br />

com aumento da expressão proteica do<br />

GHRd3 em células de mucosa gástrica (33).<br />

Esse estudo é prelimi<strong>na</strong>r, sendo necessário o<br />

desenvolvimento de pesquisas com diferentes<br />

modelos experimentais e metodologias, a fim<br />

de verificar sua correspondência no sistema<br />

imunológico e sua verdadeira relação com a<br />

presença de autoanticorpos (33).<br />

GHRd3 e doença arterial coro<strong>na</strong>ria<strong>na</strong><br />

Maitra et al. (35) relataram, em um estudo<br />

com pacientes indianos portadores de<br />

doença arterial coro<strong>na</strong>ria<strong>na</strong>, que a presença<br />

do GHRd3 aumentou o nível sérico da lipoproteí<strong>na</strong><br />

de alta densidade (HDL, high density<br />

lipoprotein), demonstrando efeito protetor no<br />

desenvolvimento da doença arterial coro<strong>na</strong>ria<strong>na</strong>.<br />

Porém, são necessárias outras pesquisas<br />

para confirmação dos dados <strong>na</strong>s diferentes<br />

etnias (35).<br />

Conclusão<br />

O polimorfismo GHRd3 apresenta características<br />

distintas do receptor GHRfl: maior responsividade<br />

ao GH e, provavelmente, maior<br />

expressão do receptor <strong>na</strong>s células-alvo. Desta<br />

forma, todos os sistemas que são alvos do GH<br />

estão sujeitos a um aumento de responsividade,<br />

porém nos indivíduos normais existem vias<br />

compensatórias, diminuindo a secreção do<br />

GH pela hipófise e aumentando a secreção de<br />

insuli<strong>na</strong> pelas células ß pancreáticas.<br />

O GHRd3 representa um fator de risco<br />

para complicações em portadores de acromegalia<br />

e um fator preditivo de melhor resposta<br />

ao tratamento de reposição hormo<strong>na</strong>l em pacientes<br />

com baixa estatura. Desta forma, é importante<br />

identificar o genótipo com relação ao<br />

gene GHR em candidatos a tratamento com<br />

GH recombi<strong>na</strong>nte, para que se possa ajustar a<br />

dose para melhor resposta terapêutica (8, 11).<br />

Além disto, a presença do GHRd3 representa<br />

um possível marcador genético preditivo de<br />

doença coro<strong>na</strong>ria<strong>na</strong>.<br />

No entanto, ainda é necessária a elucidação<br />

dos mecanismos de ação e funções deste<br />

polimorfismo, já que pouco se sabe sobre sua<br />

funcio<strong>na</strong>lidade, suas características e suas<br />

implicações. Outras pesquisas são necessárias<br />

para melhor entender as aplicações clínicas a<br />

partir de descobertas sobre o polimorfismo<br />

GHRd3.<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5


Referências<br />

11. MEDEIROS, R.J. & DE SOUSA, M. — Compreendendo o<br />

hormônio do crescimento nos âmbitos da saúde, desenvolvimento<br />

e desempenho físico. Revista da Faculdade de<br />

Educação Física da Unicamp, 6(3): 1983-930, 2008.<br />

12. BILLESTRUP, N.; HANSEN, J.A. et al. — Molecular mechanism<br />

of growth hormone sig<strong>na</strong>lling. Endocr. J., 45(Suppl.): S41-5,<br />

1998.<br />

13. CARTER-SU, C.; RUI, L. & STOFEGA, M.R. — SH2-B and SIRP:<br />

JAK2 binding proteins that modulate the actions of growth<br />

hormone. Recent Prog. Horm. Res., 55: 293-311, 2000.<br />

14. PANTEL, J.; GRULICH-HENN, J. et al. — Heterozygous nonsense<br />

mutation in exon 3 of the growth hormone receptor<br />

(GHR) in severe GH insensitivity (Laron syndrome) and the<br />

issue of the origin and function of the GHRd3 isoform. J. Clin.<br />

Endocrinol. Metab., 88(4): 1705, 2003.<br />

15. BENGTSSON, B.A.; EDÉN, S. et al. — Epidemiology and long-<br />

-term survival in acromegaly. A study of 166 cases diagnosed<br />

between 1955 and 1984. Acta Med. Scand., 223(4): 327-35,<br />

1988.<br />

16. CUNHA, K.S.G.; BARBOZA, E.P. & DA FONSECA, E.C.<br />

— Identification of growth hormone receptor in localised<br />

neurofibromas of patients with neurofibromatosis type 1. JCP,<br />

56(10): 758, 2003.<br />

17. GODDARD, A.D.; COVELLO, R. et al. — Mutations of the<br />

growth hormone receptor in children with idiopathic short<br />

stature. N. Engl. J. Med., 333(17): 1093-8, 1995.<br />

18. DOS SANTOS, C.; ESSIOUX, L. et al. — A common polymorphism<br />

of the growth hormone receptor is associated with<br />

increased responsiveness to growth hormone. Nat. Genet.,<br />

36(7): 720-4, 2004.<br />

19. GODOWSKI, P.J.; LEUNG, D.W. et al. — Characterization of<br />

the human growth hormone receptor gene and demonstration<br />

of a partial gene deletion in two patients with Laron-type<br />

dwarfism. Proc. Natl. Acad. Sci. U S A, 86(20): 8083-7, 1989.<br />

10. PANTEL, J.; MACHINIS, K. et al. — Species-specific alter<strong>na</strong>tive<br />

splice mimicry at the growth hormone receptor locus revealed<br />

by the lineage of retroelements during primate evolution. JBC,<br />

275(25): 18664, 2000.<br />

Obs.: As 25 referências restantes que compõem este artigo se<br />

encontram <strong>na</strong> Redação à disposição dos interessados.<br />

Polimorfismo GHRd3 e suas implicações <strong>na</strong> prática clínica<br />

Endereço para<br />

correspondência:<br />

Karin Soares Gonçalves Cunha<br />

Hospital Universitário Antônio<br />

Pedro<br />

Rua Marquês do Paraná, 303<br />

— Centro<br />

24033-900<br />

Niterói-RJ<br />

karingcunha@gmail.com<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5 45


elato de caso<br />

46<br />

Abscesso hepático<br />

Qual a etiologia?<br />

J. Galvão-alves<br />

Chefe da 18 a Enfermaria do Hospital<br />

Geral da Santa Casa da Misericórdia<br />

do Rio de Janeiro — Serviço de Clínica<br />

Médica. Professor titular de Clínica<br />

Médica da Faculdade de Medici<strong>na</strong><br />

da Fundação Técnico--Educacio<strong>na</strong>l<br />

Souza Marques. Professor titular de<br />

Pós-graduação em Gastroenterologia da<br />

Pontifícia Universidade Católica do Rio<br />

de Janeiro. Membro titular da Academia<br />

Nacio<strong>na</strong>l de Medici<strong>na</strong>. Presidente da<br />

Federação Brasileira de Gastroenterologia<br />

(2010-2012). Professor de Clínica Médica<br />

da Uni-FOA — Universidade da Fundação<br />

Osvaldo Aranha.<br />

M. C. Galvão<br />

Professora de Radiologia da FTESM.<br />

Professora mestre responsável do Curso<br />

de Radiologia da UniFOA — Universidade<br />

da Fundação Osvaldo Aranha. Professora<br />

da UGF — Universidade Gama Filho.<br />

Radiologista do Hospital Federal da<br />

Lagoa, RJ.<br />

D. a. CavalCanti<br />

Médica membro do “staff” da 18 a<br />

Enfermaria da Santa Casa da Misericórdia<br />

do Rio de Janeiro. Docente auxiliar<br />

do Curso de Especialização de<br />

Gastroenterologia pela PUC-RJ.<br />

n. G. Pereira<br />

Professor associado da Faculdade de<br />

Medici<strong>na</strong> da UFRJ, Infectologia. Professor<br />

adjunto de Clínica Médica da Fundação<br />

Técnico-Educacio<strong>na</strong>l Souza Marques —<br />

FTESM. Doutor em Medici<strong>na</strong> Tropical —<br />

FIOCRUZ.<br />

Relato do caso<br />

M.B., sexo masculino, 68 anos, branco,<br />

casado, proveniente de Petrópolis<br />

(RJ), empresário.<br />

Queixa principal — Febre e cansaço.<br />

História da doença atual — Aproximadamente<br />

12 dias antes teve início episódio<br />

de febre vesperti<strong>na</strong> diária, com temperatura<br />

axilar aferida, em média, de 37,5⁰C,<br />

Abscesso hepático<br />

Qual a etiologia?<br />

associada a calafrios. Referia ainda astenia<br />

significativa, não apresentando disposição<br />

para realizar suas atividades do<br />

dia a dia. Utilizou amoxacili<strong>na</strong> por conta<br />

própria, pois havia apresentado episódio<br />

anterior semelhante com febre e astenia,<br />

tendo sido diagnosticado com prostatite<br />

por médico urologista e tratado com<br />

sucesso. Não houve melhora com o uso<br />

do antibiótico referido, o que levou o<br />

paciente a buscar serviço de emergência.<br />

Revisão de sistemas — Desconforto em<br />

hipocôndrio direito.<br />

História patológica pregressa — Hipertensão<br />

arterial sistêmica, doença arterial<br />

coro<strong>na</strong>ria<strong>na</strong> (infarto agudo do miocárdio<br />

em 1989, revascularização em 2004),<br />

fibrilação atrial, marcapasso definitivo,<br />

insuficiência cardíaca compensada,<br />

apendicectomia, prostatite três meses<br />

antes. História de tratamento dentário há<br />

cerca de um mês. Medicações em uso:<br />

losarta<strong>na</strong> potássica, ramipril, amiodaro<strong>na</strong>,<br />

varfari<strong>na</strong>, aldactone, AAS, esomeprazol e<br />

domperido<strong>na</strong>.<br />

História social — Etilista (em média 40g<br />

de etanol/dia); nega tabagismo.<br />

Exame físico — Lúcido e orientado, afebril<br />

(temperatura axilar: 36⁰C), anictérico,<br />

acianótico, hidratado, normocorado.<br />

Si<strong>na</strong>is vitais: PA: 110 x 60mmHg; FC:<br />

70bpm; FR: 18irpm; SatO2: 95% em ar<br />

ambiente.<br />

Abdome flácido, depressível, peristáltico.<br />

Fígado palpável à inspiração<br />

profunda, com borda romba e lisa, dor<br />

de peque<strong>na</strong> intensidade.<br />

Loja do marcapasso sem si<strong>na</strong>is de<br />

infecção.<br />

Evolução — Solicitados hemograma, bioquímica,<br />

EAS, urinocultura, hemoculturas,<br />

tomografia computadorizada do abdome<br />

e ecocardiograma transtorácico.<br />

Os exames demonstravam: Hb 10,8g/<br />

dl; leucócitos 11.700; PCR 14,9; INR 2,8.<br />

Eco: disfunção diastólica significativa do<br />

VE. Tomografia do abdome: lesão de<br />

parede espessa e irregular em segmento<br />

VIII hepático não captante de contraste,<br />

de conteúdo liquefeito, podendo<br />

corresponder a abscesso hepático ou<br />

lesão tumoral com conteúdo necrótico.<br />

Solicitados anticorpo anti-E. histolytica,<br />

pesquisa de antígeno para E. histolytica<br />

<strong>na</strong>s fezes e hepatocintigrafia. Optou-se<br />

por não dre<strong>na</strong>r no momento (alto risco<br />

cardiovascular, INR elevado), iniciando-se<br />

metronidazol 750mg VO, 8/8h.<br />

Evoluiu com melhora clínica (afebril<br />

> 48h) e laboratorial (PCR em queda, leucócitos<br />

normais): alta hospitalar no D8 de<br />

metronidazol (programados 10 dias). Após<br />

cinco dias o paciente retornou ao hospital<br />

com queixa de dispneia e sem febre,<br />

sendo diagnosticada descompensação da<br />

insuficiência cardíaca, com modificação<br />

das medicações (inclusão de furosemida<br />

e dabigatra<strong>na</strong>). A hepatocintigrafia confirmou<br />

o achado da TC prévia, sugestiva de<br />

abscesso hepático. Nova TC, com redução<br />

da coleção intra-hepática.<br />

Alta hospitalar após compensação<br />

cardíaca — afebril, completados 14 dias<br />

de metronidazol e com PCR normal.<br />

Sorologia negativa para ameba. Retorno<br />

da febre. Nova TC: aumento da formação<br />

hepática hipodensa ovalada no segmento<br />

VIII, medindo 5,6cm nesse estudo<br />

versus 4,2cm no exame do dia 08/11;<br />

discreta infiltração <strong>na</strong> gordura peri-hepática<br />

adjacente à lesão. Suspensão dos<br />

anticoagulantes e início de ciprofloxacino<br />

e metronidazol. Dre<strong>na</strong>gem percutânea<br />

guiada por TC. Cultura: S. viridans; iniciada<br />

amoxacili<strong>na</strong> com clavula<strong>na</strong>to (guiado<br />

por antibiograma), com melhora clínica.<br />

USG após tratamento não identifica mais<br />

a lesão descrita em exames anteriores.<br />

Diagnóstico fi<strong>na</strong>l — Abscesso hepático<br />

piogênico.<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5


Discussão<br />

Após o resultado da TC do abdome,<br />

o diagnóstico de abscesso hepático amebiano<br />

(AHA) foi considerado, iniciando-se<br />

metronidazol 750mg via oral, três vezes<br />

ao dia. Embora a diferenciação entre<br />

abscesso hepático amebiano e abscesso<br />

hepático piogênico (AHP) não seja<br />

possível por exame de imagem, o AHA<br />

comumente localiza-se no lobo direito,<br />

próximo ao diafragma, e geralmente é<br />

único. É possível tratá-lo conservadoramente,<br />

baseando o diagnóstico <strong>na</strong><br />

suspeita clínica, imagem hepática e teste<br />

sorológico, reservando a aspiração para<br />

quando houver incerteza diagnóstica,<br />

quando não houver resposta à antibioticoterapia<br />

após cinco ou sete dias ou<br />

quando o abscesso, no lobo esquerdo,<br />

está próximo ao pericárdio (4).<br />

Este paciente apresentava-se anticoagulado,<br />

motivo principal para não<br />

se realizar a dre<strong>na</strong>gem de imediato, e<br />

respondeu bem ao esquema proposto:<br />

melhora da febre, normalização da leucometria<br />

e queda da PCR. Porém, após<br />

o término da terapia, houve recidiva da<br />

sintomatologia. Nesse momento chegou<br />

o resultado negativo do teste sorológico<br />

para E. histolytica. Este teste deve ser<br />

interpretado num contexto clínico, porque<br />

os níveis séricos permanecem elevados<br />

por anos após a cura. A sensibilidade é de<br />

aproximadamente 95% e a especificidade<br />

é maior que 95% (4). A negatividade, portanto,<br />

praticamente exclui este diagnóstico.<br />

Passou-se a considerar o diagnóstico<br />

de AHP, e foi iniciada terapia empírica com<br />

ciprofloxacino e metronidazol, até que o<br />

paciente tivesse condições clínicas de ser<br />

submetido à dre<strong>na</strong>gem percutânea. O<br />

resultado da cultura evidenciou S. viridans<br />

e a terapia, guiada pelo antibiograma, foi<br />

instituída com sucesso.<br />

Os microrganismos podem alcançar<br />

o fígado por diversas vias: ductos biliares,<br />

em pacientes com colangite supurativa;<br />

Referências<br />

1. HARISSON — Medici<strong>na</strong> Inter<strong>na</strong>. 17. ed., Rio de Janeiro,<br />

Mc Graw Hill, 2008. p. 811-2.<br />

2. MCPHEE, S.J. & PAPADAKIS, M.A. — Current medical<br />

diagnosis & treatment. 21. ed., Mc Graw Hill, 2012.<br />

p. 681-2 e 1462-3.<br />

sistema venoso portal, em pacientes com<br />

apendicite ou diverticulite; pela artéria<br />

hepática, como ocorre em pacientes com<br />

osteomielite ou com endocardite bacteria<strong>na</strong><br />

subaguda (3). Ocorrem geralmente no<br />

curso de uma doença biliar, porém aproximadamente<br />

40% são “criptogênicos”<br />

em sua origem (2). A flora oral tem sido<br />

proposta como origem potencial em tais<br />

casos, principalmente em pacientes com<br />

grave doença peridental (4). A maioria dos<br />

AHPs são polimicrobianos. Os microrganismos<br />

mais frequentemente isolados são<br />

Escherichia coli e Klebsiella, Proteus, Pseudomo<strong>na</strong>s<br />

e espécies de Streptococcus,<br />

particularmente o grupo Streptococcus<br />

milleri. Algumas cepas virulentas de Klebsiella<br />

pneumoniae podem causar abscesso<br />

hepático <strong>na</strong> ausência de doença hepatobiliar<br />

de base. Com a melhora nos métodos<br />

de cultivo e diagnóstico precoce, o número<br />

de casos causados por organismos a<strong>na</strong>eróbicos<br />

tem aumentado. Provavelmente, este<br />

fato justifica a melhora clínica do paciente<br />

com o uso do metronidazol.<br />

O AHP associado à colangite piogênica<br />

recorrente pode ser causado por<br />

Salmonella typhi. Espécies de Clostridium<br />

e Actinomyces são causas incomuns de<br />

abscesso hepático e casos raros são causados<br />

por Yersinia enterocolitica, Pasteurella<br />

multocida, Haemophilus parainfluenzae e<br />

Listeria. O abscesso hepático (AH) causado<br />

por infecção por Staphylococcus aureus<br />

é mais comum em crianças e em pacientes<br />

com septicemia ou outras condições<br />

associadas à baixa resistência do hospedeiro,<br />

incluindo doen ça granulomatosa.<br />

Em casos de AH, enquanto a etiologia<br />

não está definida, devemos usar um esquema<br />

que cubra suas principais causas<br />

(E. histolytica, a<strong>na</strong>eróbios, Gram-negativo<br />

e Streptococcus do grupo viridans), como,<br />

por exemplo, levofloxacino (E. viridans e<br />

Gram-negativo) + metronidazol (a<strong>na</strong>eróbios<br />

e E. histolytica), fazendo-se posteriormente<br />

os ajustes baseados <strong>na</strong>s culturas.<br />

3. DE MATOS, A.A. & DANTAS-CORRÊA, E.B. — Tratado<br />

de Hepatologia. Rio de Janeiro, Rubio, 2010. p. 66,<br />

277-81.<br />

4. SLEISENGER & FORDTRAN’S — Gastrointesti<strong>na</strong>l and<br />

liver disease. Pathophysiology/diagnosis/ma<strong>na</strong>gement.<br />

Philadelphia, Saunders Elsevier, 2010. p. 1366-9.<br />

Abscesso hepático<br />

Qual a etiologia?<br />

Endereço para correspondência:<br />

José Galvão-Alves<br />

Rua Real Grandeza, 108/Sala 123<br />

— Botafogo<br />

22281-034<br />

Rio de Janeiro-RJ<br />

jgalvaorj@terra.com.br<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5 47


Ferring apresenta<br />

Menopur<br />

De acordo com a Sociedade<br />

America<strong>na</strong> de<br />

Medici<strong>na</strong> Reprodutiva, a<br />

ausência de gravidez após<br />

um ano de relações sexuais<br />

frequentes sem uso de<br />

método contraceptivo é<br />

classificada como infertilidade.<br />

Para o casal que se encaixa nesse<br />

perfil vale reforçar que existem vários<br />

tratamentos visando reverter esse quadro<br />

e aumentar as chances de gravidez. Um<br />

deles é Menopur (menotropi<strong>na</strong>), uma associação<br />

de hormônios <strong>na</strong>turais entre o<br />

FSH, folículo-estimulante, e o LH, luteinizante,<br />

para a indução da ovulação em<br />

técnicas de reprodução assistida. É um<br />

medicamento em pó liofilizado e diluente<br />

para solução injetável de administração<br />

intramuscular ou subcutânea.<br />

Quando perguntado sobre a atuação<br />

desses medicamentos no corpo humano,<br />

o diretor médico da Ferring Pharmaceuticals,<br />

Rogerio Acquaroli, explica que Menopur,<br />

por exemplo, “é um medicamento<br />

de indução altamente purificado e sua<br />

composição foi desenvolvida utilizando<br />

substâncias <strong>na</strong>turais do próprio corpo humano,<br />

proporcio<strong>na</strong>ndo um estímulo que<br />

resulta <strong>na</strong> indução da produção de hormônios<br />

sexuais”.<br />

Muitas pessoas não sabem que esse<br />

tipo de tratamento também pode ser realizado<br />

em homens — neles Menopur estimula<br />

a produção de espermatozoides. Na<br />

mulher, Menopur estimula o crescimento<br />

do folículo, apresentando níveis menores<br />

de progestero<strong>na</strong>, o que pode resultar em<br />

melhor receptividade endometrial para a<br />

implantação do embrião.<br />

É importante ressaltar que os tratamentos<br />

devem ser iniciados sob a supervisão<br />

de um médico com experiência <strong>na</strong><br />

área de fertilidade, pois existe uma grande<br />

variação <strong>na</strong> resposta ao tratamento<br />

de paciente para paciente. Isto dificulta<br />

a definição de um esquema posológico,<br />

o que exige um ajuste de dosagem individual.<br />

noticiário<br />

Tratamento cardíaco invasivo<br />

é mais eficaz em diabéticos<br />

P e s q u i s a<br />

publicada pelo<br />

New England<br />

Jour<strong>na</strong>l of Medicine,abrang<br />

e n d o 1 4 0<br />

hospitais e 1,9<br />

mil diabéticos<br />

portadores de<br />

doença coro<strong>na</strong>ria<strong>na</strong><br />

em estágio avançado, revela que<br />

a cirurgia para implante de pontes, como<br />

safe<strong>na</strong> e mamária, é mais indicada nesses<br />

pacientes que a angioplastia. O estudo<br />

Avaliação de Revascularização Futura em<br />

Pacientes com Diabetes foi coorde<strong>na</strong>do<br />

pelos pesquisadores Michael Farkouh e Valentin<br />

Fuster, da Escola de Medici<strong>na</strong> Mount<br />

Si<strong>na</strong>i, de Nova York.<br />

Foram selecio<strong>na</strong>dos 3.309 pacientes,<br />

dos quais 1,9 mil aceitaram participar da<br />

pesquisa. Com idade média de 63 anos,<br />

71% dos participantes eram do sexo masculino,<br />

40% tinham colesterol elevado e<br />

83% apresentavam obstrução em múltiplas<br />

artérias, o que caracteriza o estágio mais<br />

avançado da doença coro<strong>na</strong>ria<strong>na</strong>.<br />

O estudo custou 400 milhões de dólares<br />

e foi patroci<strong>na</strong>do pelo Natio<strong>na</strong>l Institutes of<br />

Health (NIH) e por fabricantes de stent. Os<br />

pacientes passarão por uma reavaliação sete<br />

anos após o procedimento.<br />

Anvisa debate <strong>na</strong>notecnologia<br />

A Agência Nacio<strong>na</strong>l<br />

de Vigilância<br />

Sanitária (Anvisa)<br />

promoveu, no dia<br />

31/10, discussão<br />

t e m á t i c a s o b r e<br />

<strong>na</strong>notecnologia e<br />

vigilância sanitária.<br />

Foram debatidos conceitos e apresentadas<br />

as perspectivas da área no Brasil, sendo<br />

também abordados os riscos sanitários relacio<strong>na</strong>dos<br />

ao tema.<br />

A <strong>na</strong>notecnologia — o estudo da manipulação<br />

da matéria numa escala atômica<br />

e molecular — é considerada uma área<br />

estratégica, com inúmeras possibilidades<br />

de aplicação. Seu desenvolvimento tem<br />

atraído a atenção dos cientistas e dos<br />

governos em todo o mundo. É um campo<br />

promissor, que já mostra resultados <strong>na</strong><br />

produção de componentes eletrônicos<br />

de alta precisão e tecnologia, empregados<br />

em diversas áreas — como Medici<strong>na</strong>,<br />

Eletrônica, Ciência da Computação, Física,<br />

Química, Biologia e Engenharia dos<br />

Materiais.<br />

Participaram do debate o farmacêutico<br />

e professor da Universidade Federal do Rio<br />

de Janeiro, André Luís Gemal; o diretor do<br />

Departamento de Tecnologia Inovadora<br />

da Secretaria de Inovação do Ministério<br />

do Desenvolvimento, Indústria e Comércio<br />

Exterior, João Batista Bó; o secretário substituto<br />

da Secretaria de Desenvolvimento<br />

Tecnológico, Adalberto Fazzio; e o pesquisador<br />

da Fundação Oswaldo Cruz, William<br />

Waissmann.<br />

CFM proíbe uso de terapias<br />

antienvelhecimento<br />

A R e s o l u ç ã o<br />

1999/2012, aprovada<br />

pelo plenário<br />

do Conselho<br />

Federal de Medici<strong>na</strong> (CFM), prevê que os<br />

médicos brasileiros que prescreverem terapias<br />

com o objetivo específico de conter o<br />

envelhecimento, práticas conhecidas como<br />

antiaging, estarão sujeitos às pe<strong>na</strong>lidades<br />

previstas em processos ético-profissio<strong>na</strong>is.<br />

No caso de conde<strong>na</strong>ção, após denúncia<br />

formal, eles poderão sofrer pe<strong>na</strong>s que<br />

variam de uma advertência até a cassação<br />

do registro profissio<strong>na</strong>l.<br />

A decisão, publicada no Diário Oficial<br />

da União do dia 19 de outubro, se baseia<br />

em extensa revisão de estudos que concluiu<br />

pela inexistência de evidências científicas<br />

que justifiquem e validem a prescrição<br />

destas práticas. Na avaliação do plenário<br />

do CFM, o aumento da longevidade não<br />

decorre tratamentos específicos, mas de<br />

uma mudança de atitude, que inclui a<br />

adoção de hábitos saudáveis (melhor alimentação,<br />

prática de esportes, abandono<br />

do tabaco e uso limitado do álcool, entre<br />

outros pontos).<br />

O Conselho entende que a prescrição<br />

e o emprego de tratamentos de<br />

forma i<strong>na</strong>dequada colocam a saúde dos<br />

pacientes em risco, posição idêntica à de<br />

outros órgãos de regulação <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>is e<br />

inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>is.<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5 49


50<br />

Artigos<br />

índice geral<br />

— A RAZÃO DO USO DO rtPA NA TROMBÓLISE DO AVE ISQUÊMICO —<br />

Dr. Victor Masse<strong>na</strong> — n o 3 — p. 19<br />

— ALBUMINA HUMANA — USOS E ABUSOS — Dr. Olival Cirilo Luce<strong>na</strong> da<br />

Fonseca Neto — n o 1 — p. 12<br />

— ASCITE NO PACIENTE CIRRÓTICO — Prof. Angelo Alves de Mattos —<br />

n o 5 — p. 23<br />

— ASMA — A ARTE DO ENCONTRO — Dr. Hisbello S. Campos — n o 2 —<br />

p. 44<br />

— CÂNCER DE MAMA — ALCANCE DO TRATAMENTO LOCAL — Drs.<br />

Ludmila Helene Ferreira de Freitas, Natália Bragança Oliveira, Priscilla Kelly<br />

Soares Torres, Thaís Meyin Lin Santos e Marcos Mendonça — n o 1 — p. 38<br />

— CÂNCER DE PELE — O PAPEL DA EXPOSIÇÃO SOLAR COMO FATOR<br />

CAUSAL E DA FOTOPROTEÇÃO NA PREVENÇÃO — Drs. Heron Fer<strong>na</strong>ndo<br />

de Sousa Gonzaga, A<strong>na</strong> Cristi<strong>na</strong> Nazari, A<strong>na</strong> Caroli<strong>na</strong> Nazari Bonessi,<br />

Amanda de Queiroz Assis Andreotti e Maria Augusta Jorge — n o 1 — p. 15<br />

— DESMITIFICANDO O USO DE BETABLOQUEADORES NO TRATAMEN-<br />

TO DA HIPERTENSÃO ARTERIAL SISTÊMICA — Dr. Marcelo Montera —<br />

n o 4 — p. 15<br />

— DIARREIA AGUDA — Drs. Antônio Carlos Moraes e Fer<strong>na</strong>ndo M. M. Castro<br />

— n o 3 — p. 41<br />

— DISTÚRBIOS RESPIRATÓRIOS DO SONO — Dr. Hisbello S. Campos —<br />

n o 4 — p. 27<br />

— DOENÇA DO REFLUXO GASTROESOFÁGICO — Dr. José Galvão-Alves —<br />

n o 3 — p. 67<br />

— ETIOPATOGENIA DO DIABETES MELLITUS TIPO 2 — Dr. Leão Zagury —<br />

n o 2 — p. 39<br />

— FALÊNCIA HEPÁTICA AGUDA — Dr. Olival Cirilo Luce<strong>na</strong> da Fonseca Neto<br />

— n o 5 — p. 35<br />

— GRAU DE INVESTIGAÇÃO DE DISFUNÇÃO ERÉTIL POR CARDIOLOGIS-<br />

TAS E ENDOCRINOLOGISTAS NO MUNICÍPIO DE MARÍLIA/SP — Drs.<br />

Geraldo Benedito Gentile Stefano, Ro<strong>na</strong>ldo Garcia Rondi<strong>na</strong>, Luiz Henrique<br />

Soares Santos Stefano e Bruno Garcia de Rossi — n o 1 — p. 34<br />

— HEPATITE AGUDA — COMO AVALIAR? — Drs. Adávio de Oliveira e Silva,<br />

Raul Carlos Wahle, Evandro de Oliveira Souza, Verônica Desiree Samudio<br />

Cardozo, Maria Elizabeth Calore Neiva, Flávia Costa Cardoso, Fábio Rosa<br />

Moraes e Gerusa Máximo de Almeida — n o 4 — p. 63<br />

— HIPERTENSÃO ARTERIAL RESISTENTE — DIAGNÓSTICO E TRATAMEN-<br />

TO — Drs. Evandro Tinoco Mesquita e Antonio José Lagoeiro Jorge —<br />

n o 2 — p. 16<br />

— HIPERTIREOIDISMO — ABORDAGEM DAS PRINCIPAIS CAUSAS E CON-<br />

DUTA DIAGNÓSTICA — Dra. Rosita Fontes — n o 5 — p. 27<br />

— INSUFICIÊNCIA EXÓCRINA DO PÂNCREAS — ETIOLOGIAS — Dr. José<br />

Galvão-Alves — n o 2 — p. 23<br />

— MANIFESTAÇÕES EXTRAESOFÁGICAS DA DRGE — Drs. Luiz J. Abrahão<br />

Junior e Eponi<strong>na</strong> M. O. Lemme — n o 5 — p. 17<br />

— MICROBIOTA INTESTINAL — SUA IMPORTÂNCIA E FUNÇÃO — Drs.<br />

Claudio Fiocchi e Heitor Siffert Pereira de Souza — n o 3 — p. 30<br />

— MIRIZZI — O HOMEM E A SÍNDROME — Dr. Olival Cirilo Luce<strong>na</strong> da Fonseca<br />

Neto — n o 1 — p. 22<br />

— NOVAS PERSPECTIVAS DE TRATAMENTO MEDICAMENTOSO DO DIA-<br />

BETES MELLITUS — Drs. João Roberto de Sá e Tiago Munhoz Vidotto —<br />

n o 4 — p. 7<br />

— O CONTEXTO DO TRANSPLANTE DE ÓRGÃOS NO BRASIL EM 2011 —<br />

Drs. José O. Medi<strong>na</strong> Pesta<strong>na</strong>, Valter Duro Garcia, Claudia Rosso Felipe, Mário<br />

Abbud-Filho, Nelson Zocoler Galante, Elia<strong>na</strong> Regia Barbosa de Almeida<br />

e Emil Sabbaga — n o 2 — p. 7<br />

— OTOSCOPIA — EXAME DA ORELHA — Drs. Guilherme Eduardo Wambier,<br />

Henrique Wending Sava, Claudia Paraguaçu Pupo Sampaio e Angelo Amado<br />

de Paula — n o 1 — p. 24<br />

— PNEUMONIAS ADQUIRIDAS NA COMUNIDADE — Drs. Rafael Leal, Gunther<br />

Kissman e Carlos Alberto de Barros Franco — n o 5 — p. 7<br />

— POLIMORFISMO GHRd3 E SUAS IMPLICAÇÕES NA PRÁTICA CLÍNICA —<br />

Drs. Raquel Machado Andrade, Rafaela Elvira Rozza, Mauro Geller e Karin<br />

Soares Gonçalves Cunha — n o 5 — p. 41<br />

— REATIVAÇÃO DE TUBERCULOSE NO TRATAMENTO COM IMUNOBIO-<br />

LÓGICOS — Drs. Priscila Regi<strong>na</strong> Orso Rebellato, Adriane Reichert Faria e<br />

Roberto Gomes Tarlé — n o 1 — p. 32<br />

— RINOSSINUSITE — Dr. Jair de Carvalho e Castro — n o 4 — p. 41<br />

— TERAPIA BIOLÓGICA EM ARTRITE REUMATOIDE — NOVAS PERSPECTI-<br />

VAS NO CONTROLE E REMISSÃO — Drs. W. A. Bianchi, G. B. Maretti,<br />

D. V. Bianchi, R. F. Elias e B. V. Bianchi — n o 2 — p. 57<br />

— TRANSTORNOS DE ANSIEDADE — TERAPIA COM ESTIMULAÇÃO MAG-<br />

NÉTICA TRANSCRANIANA — Drs. Flávia Paes, Adria<strong>na</strong> Cardoso Silva, Antonio<br />

E. Nardi, Sergio Machado e José A. Crippa — n o 4 — p. 35<br />

— TRATAMENTO DA FIBRILAÇÃO ATRIAL — O ESTADO DA ARTE — Drs.<br />

Eduardo B. Saad, Luiz Antônio Inácio Jr., Charles Slater e Luiz Eduardo Camanho<br />

— n o 3 — p. 7<br />

— TROMBOFILIAS — A PREVENÇÃO DIRECIONADA A UMA GRAVIDEZ<br />

BEM-SUCEDIDA — Drs. Lucia<strong>na</strong> Lara dos Santos, Rosangela Franco Guedes,<br />

Aline Paszter<strong>na</strong>k Paixão, Patrícia Maria Paixão Vaintraub e Marco Túlio<br />

Vaintraub — n o 1 — p. 8<br />

Seções<br />

Atualidades médicas<br />

— no 1 — p. 31 — no 3 — p. 39 — no 5 — p. 22<br />

Congresso<br />

— no 1 — p. 46<br />

Diagnóstico laboratorial<br />

— TUBERCULOSE — Dr. Helio Magarinos Torres Filho — no 3 — p. 53<br />

Editorial<br />

— A ARTE DA CLÍNICA MÉDICA — no 2 — p. 3<br />

— A ATUALIZAÇÃO MÉDICA CONTINUADA — no 4 — p. 3<br />

— A DEMOCRACIA E O SILÊNCIO ACADÊMICO — no 5 — p. 3<br />

— OUVIDOS PARA OUVIR — no 1 — p. 3<br />

— PROF. ISMAR CHAVES DA SILVEIRA — no 3 — p. 3<br />

Imagem e diagnóstico<br />

(Coorde<strong>na</strong>ção: Dra. Marta Carvalho Galvão)<br />

— ENDOMETRIOSE DA BEXIGA — Drs. Marta Carvalho Galvão, Caroli<strong>na</strong> Souza<br />

Nogueira, Edson Balieiro Junior e Guilherme Tabet — no 3 — p. 72<br />

Imagem em medici<strong>na</strong> inter<strong>na</strong><br />

(Coorde<strong>na</strong>ção: Dra. Marta Carvalho Galvão)<br />

— APENDICITE AGUDA — Dras. Marta Carvalho Galvão, Beatriz da Cunha<br />

Raymundo e Maria<strong>na</strong> de Magalhães Bastos — no 2 — p. 36<br />

— RABDOMIOSSARCOMA DO MEDIASTINO ANTERIOR — UM TUMOR<br />

COMUM EM LOCALIZAÇÃO RARA — A PROPÓSITO DE UM CASO —<br />

Dras. Marta Carvalho Galvão e Caroli<strong>na</strong> Souza Nogueira — no 4 — p. 58<br />

Notas de psiquiatria<br />

— TIROS EM REALENGO — Dr. Alfredo Castro Neto — no 1 — p. 21<br />

Noticiário<br />

— no 1 — p. 47 — no 2 — p. 66 — no 3 — p. 74 — no 4 — p. 74 — no 5 — p. 49<br />

Noticiário especial<br />

— no 4 — p. 73<br />

Panorama inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l<br />

— no 1 — p. 7 — no 2 — p. 55 — no 3 — p. 51 — no 4 — p. 13 — no 5 — p. 34<br />

Relato de caso<br />

— ABSCESSO HEPÁTICO: QUAL A ETIOLOGIA? — Drs. J. Galvão-Alves, M.<br />

C. Galvão, D. A. Cavalcanti e N. G. Pereira — no 5 — p. 46<br />

— DOENÇA DE CROHN, COLANGITE ESCLEROSANTE PRIMÁRIA E SÍN-<br />

DROME DO ANTICORPO ANTIFOSFOLIPÍDEO — ASSOCIAÇÃO INCO-<br />

MUM OU MERA CASUALIDADE? — Drs. J. Galvão-Alves, M. C. Galvão,<br />

D. A. Cavalcanti e H. Rzetel<strong>na</strong> — no 2 — p. 31<br />

— “SLING” URETRAL PUBOVAGINAL E CIRURGIA DE CONTROLE DE DA-<br />

NOS — Drs. Olival Cirilo Luce<strong>na</strong> da Fonseca Neto e Diogo Camarotti —<br />

no 1 — p. 44<br />

— TUMOR SECRETOR DE CATECOLAMINA NEGATIVO PARA CINTILOGRA-<br />

FIA COM 123IODO-MIBG — Drs. Alan Yazaldy Chambi Cotrado, Maria Fer<strong>na</strong>nda<br />

Rezende, Ber<strong>na</strong>rdo Sanches L. Vian<strong>na</strong>, Rodrigo Rodrigues Batista,<br />

Marcos F. H. Cavalcanti, Marcelo César G. Carneiro, Jader Cunha de Azevedo,<br />

Re<strong>na</strong>ta Christian Martins Felix, Nilton Lavatori Correa, Evandro Tinoco<br />

Mesquita, Marcus Vinicius J. Santos, Claudio Tinoco Mesquita e José<br />

Galvão-Alves — no 3 — p. 59<br />

JBM NOVEMBRO/DEZEMBRO VOL. 100 N o 5

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