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Março - UBC

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EDIÇÃO ESPECIAL COMEMORATIVA DO CENTENÁRIO DE BRAGUINHA<br />

auta extra<br />

www.ubc.org.br pautaextra@ubc.org.br<br />

Órgão Informativo da Ubc - União brasileira de compositores :: Ano III :: 2006 :: N0 7<br />

O dom de nos<br />

fazer voltar aos<br />

tempos de criança<br />

Para os amigos<br />

um até logo,<br />

jamais um adeus<br />

PÁGINA5<br />

Uma tarde de<br />

saudades em<br />

Copacabana<br />

PÁGINA4<br />

PÁGINA6<br />

1907-2006<br />

Braguinha<br />

UM HOMEM, UM MITO, UM GÊNIO<br />

PÁGINAS2e3


100<br />

Pauta Extra - EDIÇÃO ESPEcIAL cOMEMORATIVA DO cENTENÁRIO DE bRAGUINHA<br />

EDIÇÃO ESPEcIAL cOMEMORATIVA DO cENTENÁRIO DE bRAGUINHA - Pauta Extra<br />

2 MARÇO # N. 7 # 2007 # pautaextra@ubc.org.br<br />

pautaextra@ubc.org.br # MARÇO # N. 7 # 2007 3<br />

Braguinha,<br />

um centenário de glórias<br />

São muitos os gênios que fazem parte do quadro de associados da <strong>UBC</strong>. Entre estes, destaca-se um grande número de consagrados autores, alguns deles ainda conosco desde a<br />

Balancê (sucesso com Gal, 42 anos depois), Andaluzia (recriada por<br />

fundação desta entidade representativa dos autores musicais brasileiros. Seria o caso do querido e saudoso Carlos Alberto Ferreira Braga, o popular João de Barro, ou se prefe-<br />

Maria Bethânia), China pau, Chiquita bacana, (que projetou Emilirirem,<br />

Braguinha, se não tivesse resolvido nos deixar exatamente na véspera de Natal. Sim, logo na data que para ele significava a maior e mais linda festa de todo o calendário,<br />

nha Borba), A mulata é a tal, Adolfito mata-mouros (sátira a Hitler) e<br />

além do fato de que estava bem próximo de completar cem anos de vida.<br />

Touradas em Madri, cantado por um Maracanã em festa na goleada do<br />

Hoje, ele está junto a outros magos da MPB que há muito abrilhantam o céu, entoando suas composições, tudo isso, claro, em meio a um melodioso “assobio”! Poético? Talvez!<br />

Brasil sobre a Espanha, na fatídica Copa de 50.<br />

Mas de forma bastante apropriada para se falar no criador de tanta poesia, de tantas jóias e preciosidades musicais. Por isso, hoje, através de Pauta Extra – esse informativo criado<br />

Eis o nosso inesquecível Braguinha, que com a simplicidade própria somente<br />

dos poetas, preferia chamar de “versinhos em que são colocadas músicas”, suas<br />

geniais criações. Nascido em meio a uma família festeira, ele foi acostumado a ter a<br />

música como complemento de seus folguedos, mesclando-a com suas brincadeiras de<br />

Por ocasião<br />

criança. Foi nessa ocasião, ainda menino, que Braguinha teve descoberto seu talento por seus<br />

do Congresso<br />

familiares, que percebiam que além de cantar e assobiar sucessos da época, ele criava suas próprias<br />

de Bergen, na Noruega,<br />

melodias e nelas colocava verdadeiros poemas.<br />

a paisagem do “fjord” serve de fundo<br />

à alegre delegação da <strong>UBC</strong>, integrada por<br />

Braguinha, Humberto Teixeira e Oswaldo<br />

Santiago com suas respectivas esposas,<br />

tendo ainda o escritor Juracy Camargo<br />

para ser mais um elo entre esta entidade e seus associados – a <strong>UBC</strong> registra nesta Edição Especial a sua Homenagem Póstuma a quem em 22 de junho de 1942, junto com outros<br />

autores, fundou a <strong>UBC</strong>.<br />

Tudo começou com os Tangarás<br />

Ele havia “estourado” como autor de belas composições e fazia parte do não menos famoso grupo<br />

Bando dos Tangarás, compondo, cantando e tocando ao lado de Almirante e Noel Rosa, entre<br />

outros bambas. Paralelamente, decide se empenhar na luta pelos direitos de todos os demais<br />

autores musicais do país, sendo um pioneiro, um obstinado que junto a uns poucos iguais<br />

a ele, acaba tendo que enfrentar verdadeiras batalhas para derrubar o grande número de<br />

barreiras existentes na época.<br />

Nesse tempo o Direito Autoral ainda era tabu. E por muitos e muitos anos, Braguinha e o<br />

grupo que empunhava a bandeira de libertação da categoria de compositores, lutavam contra<br />

aqueles que se aproveitavam da falta de uma lei reguladora e saneadora, que resolvesse o antigo<br />

problema que atingia a uma classe totalmente desprotegida e visivelmente desrespeitada. Até<br />

então, os autores não tinham os seus direitos autorais reconhecidos. E a luta ainda prosseguiria<br />

por um bom tempo.<br />

Um bamba, nascido no berço do samba<br />

Carioca de Vila Isabel, nascido em uma avenida de casas pertencente à Fábrica de Tecidos Confiança<br />

eternizada no samba do também gênio Noel Rosa, que ressalta os acordes do apito do trem despertando<br />

as belas operárias da fábrica do bairro do Andaraí, filho do gerente da referida fábrica, hoje desativada,<br />

Braguinha começou a cantar na época em que os moços de família não podiam viver de música.<br />

Mesmo assim, ainda bem jovem, elevaria o nome do Brasil no exterior, compondo a convite de Walt Disney<br />

para desenhos animados como Branca de Neve e os Sete Anões, Cinderela, Bambi, Bela Adormecida, Dumbo e<br />

outros tesouros infantis. Ao todo, ele foi autor de mais de 500 obras, todas ouvidas durante décadas em gravações<br />

feitas pelo próprio compositor ou na voz de astros e estrelas do cancioneiro popular.<br />

São jóias como Pastorinhas, Trem blindado, Moreninha da praia, Carinhoso,<br />

Copacabana, Pirata da perna de pau, Vai com jeito vai, Tem gato na tuba, Laura,<br />

Linda lourinha, Uma andorinha não faz verão, Dama das camélias, Cadê Mimi,<br />

Expediente: União Brasileira de Compositores/Rio - Rua Visconde de Inhaúma, 107 - Tel: (21) 2223-3233 :: Editor: Jorge Paranhos :: Diagramação: Romulo Rodrigues :: Colaboraram nesta edição:<br />

Frederico Lemos, Fernando Brant, Antônio Paulo Baptista, Gustavo Gonzalez, Ana Lúcia Martins Abib e Maria Isabel Pinto Ceperuelo :: Críticas e sugestões para: pautaextra@ubc.org.br<br />

Destaque também no primeiro mundo<br />

Para o “primeiro mundo”, Braguinha criou preciosidades como “Sorri”, um clássico para a<br />

versão de “Smile”, de Charles Chaplin. Sua obra foi considerada de tal perfeição, que até hoje é<br />

procurada para regravações, como ocorreu com Djavan, que a escolheu para o CD Malásia.<br />

Sem dúvida, nosso homenageado nascera para nos propiciar o prazer de desfrutar das obras<br />

musicais de sua autoria, dessas que nem mesmo o tempo destrói ou relega ao esquecimento,<br />

todas verdadeiras jóias do nosso cancioneiro popular. Mas Braguinha não parava de nos presentear<br />

e além das obras-primas que vão de marchinhas carnavalescas, a chorinhos, sambas<br />

Yes, nós temos Braguinha, um criador de sonhos<br />

Mas a maior homenagem recebida pelo compositor foi o convite feito pela Mangueira<br />

para ser o enredo da escola no desfile de 1984. Inaugurava-se o Sambódromo e a<br />

Verde-e-Rosa conseguia sagrar-se campeã. Por ser a última a desfilar, retornou da Apoteose<br />

à concentração com o público seguindo-a aos gritos de “Já ganhou! Já ganhou”,<br />

e entoando o samba enredo “Yes, Nós Temos Braguinha”.<br />

Era também um gênio como diretor de gravadoras, como foi na Colúmbia e Continental,<br />

quando previu o sucesso de Brasileirinho, somente sossegando depois de haver<br />

e sambas-canções, no auge de sua popularidade decide aceitar o desafio feito a ele pelo cinema<br />

brasileiro.<br />

E para a Sétima Arte em nosso país, Braguinha também mostrou sua criatividade, tendo participado<br />

dela com roteiros que foram levados à tela com total sucesso, além de também assinar<br />

direção e trilha sonora dos filmes Alô alô Brasil, Estudantes, Alô alô carnaval e João ninguém.<br />

Também foi alvo de escritores como Carlos Aberto Rabaça, que o imortalizou no livro “Braguinha<br />

para Crianças – Um Canto de Felicidade”.<br />

convencido o criador do chorinho, Waldir Azevedo, a gravá-lo. Assim, nesta edição<br />

especial de Pauta Extra, a <strong>UBC</strong> - União Brasileira de Compositores, homenageia a<br />

quem muito fez por nossa música.<br />

Parabéns, Braguinha, que nos passeios pela orla do Rio, principalmente por sua Copacabana,<br />

compôs as mais belas páginas de nosso cancioneiro popular, como “Princesinha<br />

do Mar”. Ao Mestre Braguinha, com muito amor, carinho, afeto, admiração,<br />

agradecimento, e, sobretudo, saudade.


Pauta Extra - EDIÇÃO ESPEcIAL cOMEMORATIVA DO cENTENÁRIO DE bRAGUINHA<br />

4 MARÇO DEzEMbRO MARÇO # N. # 7 N. # 6 2007 # 2006 # pautaextra@ubc.org.br<br />

# pautaextra@ubc.org.br<br />

Um gênio que nos faz voltar aos<br />

tempos de criança<br />

E<br />

Eu me lembro, tinha cinco anos de idade, havíamos acabado de nos mudar<br />

para Diamantina. Foi o meu primeiro Natal na terra de meu pai e de JK.<br />

Trazia comigo uma enorme timidez. Pediram-me para cantar alguma cantiga,<br />

naquela festa de fim de ano do Clube Acaiaca. Escolhi o “Peixe vivo”,<br />

que aprendera, completo, em casa. “Os pastores dessa aldeia já me fazem<br />

zombaria, por me ver assim sozinho, sem a tua, sem a tua companhia”. Ao<br />

fim da sessão, ganhei um trem de ferro de madeira, que povoou de alegria<br />

os meus dias seguintes.<br />

Mas o que mais me impressionou, naqueles festejos que me voltam agora à<br />

memória, foi a encenação da “História de Dona Baratinha”. Quem quer casar<br />

com a Senhora Baratinha, que tem fita no cabelo e dinheiro na caixinha?<br />

João ratão caiu na panela de feijão. Ohhh. Foi um delírio para meus olhos<br />

e ouvidos infantis. Não tinha idéia, naquele tempo, de que existiam autores<br />

e compositores, que inventavam histórias e canções para nos cativar. Não<br />

sabia que estava começando a conhecer a obra de Braguinha, o maravilhoso<br />

criador brasileiro de músicas e textos que preencheram de beleza o século<br />

vinte de nosso país.<br />

Se a meninada se encantava com os discos de histórias infantis que produziu<br />

por muito tempo, junto com as versões dos desenhos animados de Disney,<br />

não há folião que não saiba de cor as suas marchas carnavalescas. “As<br />

pastorinhas”, parceria com Noel Rosa, até hoje balança os bailes dos clubes<br />

Fernando Brant,<br />

Braguinha e<br />

Abel Silva<br />

no período de Momo. “Carinhoso”, letra para a melodia de Pixinguinha, é<br />

eterna. O Maracanã, na Copa de 50, cantou, em uníssono, sua parceria com<br />

Alberto Ribeiro, “Touradas em Madrid”: eu conheci uma espanhola,<br />

natural da Catalunha, queria que eu tocasse castanholas e pegasse touro à unha...<br />

E quem não se emocionou com as palavras que escreveu para a versão de<br />

“Smiles” de Carlitos?<br />

Eu sou o pirata da perna de pau, de olho de vidro, da cara de mau. Yes,<br />

nós temos banana, banana pra dar e vender. Chiquita bacana, lá da Martinica,<br />

se veste com uma casca de banana nanica. Existencialista, com toda razão,<br />

só faz o que manda o seu coração. Copacabana, princesinha do mar.<br />

Braguinha, Carlos Alberto Ferreira Braga, também conhecido como João de<br />

Barro (nome que usou, no início da carreira, para que seu pai não soubesse<br />

que ele estava se dedicando à música), faria cem anos no começo de 2007.<br />

Era venerado, admirado, por seus companheiros de profissão e por todos<br />

os que amam a música popular brasileira. Ele nos deixou na véspera do<br />

Natal, semeando tristeza entre as crianças brasileiras que se acostumaram<br />

com o lirismo encantador de suas histórias e canções. Braguinha se vai,<br />

mas seu sorriso fica. E sua obra: límpida expressão da criação de nosso povo,<br />

poesia e música para sempre.<br />

Fernando Brant<br />

fbrant@ubc.org.br<br />

EDIÇÃO ESPEcIAL cOMEMORATIVA DO cENTENÁRIO DE bRAGUINHA - Pauta Extra<br />

pautaextra@ubc.org.br pautaextra@ubc.org.br # DEzEMbRO # MARÇO # N. 7 6 # 2007 2006 5<br />

Jamais um Adeus...<br />

Uma fã do cavalheiro Braguinha<br />

MMaria Isabel Pinto Ceperuelo, a Belinha, que dedica parte de seu dia-a-dia à <strong>UBC</strong>, também<br />

desfrutou por uns bons anos da convivência diária de Braguinha, um de nossos fundadores<br />

e perpétuo conselheiro. É com muita saudade, mas também com muito carinho, que ela<br />

lembra de Braguinha.<br />

“Ele era tudo isso que dizem e até muito mais, pois como membro vitalício de nosso quadro<br />

de conselheiros, foi sempre muito atencioso com todos os departamentos, não deixando de<br />

cumprimentar a todos os funcionários e a estes presenteando com pequeninas e graciosas<br />

lembranças que trazia de fora por ocasião de suas viagens a trabalho”, recorda.<br />

“Era, para todos nós, um verdadeiro gentleman. Tenho sim, muitas saudades dele, assim<br />

como todos que o conheceram de perto, pois além de o adorarmos por suas belíssimas criações,<br />

nos afeiçoamos a ele por seu jeito de ser, um homem que sabia lidar com as pessoas<br />

...sempre muito atencioso com<br />

todos os departamentos, não<br />

deixando de cumprimentar a todos<br />

os funcionários...<br />

O parceiro e amigo J. Júnior<br />

Braguinha era homem de muitos amigos, mas nem todos seus parceiros, já que apenas alguns compunham.<br />

Mas entre os que com ele criaram sucessos que hoje o imortalizam, alguns se destacam pelo<br />

muito que tiveram de convívio com o nosso homenageado. É o caso do compositor J. Júnior, que somente<br />

com Braguinha assinou 23 composições. Assim, além de parceiro por mais de 40 anos, J. Júnior foi<br />

também um grande amigo, um dos muitos que Braguinha colecionou durante sua carreira.<br />

A amizade entre esses dois gênios da MPB começou no início de 1950, quando J. Júnior foi levado por<br />

Marlene à gravadora Continental, da qual Braguinha era diretor. A popular cantora iria gravar “Sapato de<br />

Pobre é Tamanco”, de autoria de J. Júnior, dando início a sólida amizade entre os dois compositores.<br />

Inspiração nunca faltava<br />

Segundo J. Júnior, além do entrosamento, o que mais havia entre os dois compositores era a vontade<br />

de trabalhar e muita inspiração. Ele lembra de que criavam em cima de qualquer motivo, de qualquer<br />

idéia: “Tanto que houve dias em que chegamos a compor três músicas. E todas elas dentro aquele padrão<br />

que fazíamos questão de manter, abordando o que de mais importante havia no momento, dando<br />

a elas o lirismo de uma boa melodia e o cuidado de boas rimas, tudo muito bem elaborado”.<br />

Nosso entrevistado volta a falar do amigo com grande ternura, ressaltando a pureza que existia em tudo<br />

que Braguinha fazia. Para ele, além de ser gênio, seu parceiro era uma pessoa pura, um homem de<br />

bem, com uma alma por demais expansiva. “Embora fosse um ser humano de estatura mediana, parecia<br />

um gigante, tão imenso era o que tinha para nos mostrar, para nos oferecer de bom, de carinhoso,<br />

de alegre. Ainda hoje eu adoto por lema o que consegui extrair de uma frase deste grande amigo: ‘A vida<br />

só gosta, de quem gosta dela”, finalizou.<br />

como muito poucos, nunca lhes negando um sorriso, uma mensagem positiva”, ressalta.<br />

E com a certeza de que sente por Braguinha o mesmo que a maioria dos brasileiros, Belinha<br />

prossegue afirmando que é com muita ternura que lembra do querido compositor, “que um<br />

dia foi escolhido por Walt Disney para musicar suas grandes produções cinematográficas da<br />

época, desenhos como os de Branca de Neve, Cinderela, Bela Adormecida, entre outros”.<br />

Para ela, um outro grande feito de Braguinha foi colocar letras em músicas como “Luzes<br />

da ribalta”, de Charles Chaplin; “Aqueles olhos verdes”, de Adolfo Utrera e Nilo Menendez; e<br />

“Valsa da despedida”, de George Chet Forrest, Herbert Stothart, Robert Craig e Bob Wright, que<br />

ainda hoje são tidas como obras-primas criadas por gênios.<br />

*Na letra colocada em Luzes da ribalta, Braguinha teve a parceria de Antônio Almeida. **Na<br />

letra composta para a Valsa do adeus, seu parceiro foi Alberto Ribeiro.<br />

A criação do jabá<br />

“Infelizmente, as gravadoras passaram a argumentar que<br />

deixara de ser lucrativo gravar músicas carnavalescas! Talvez<br />

fosse por estarmos na era de ritmos não tão alegres quanto<br />

o da marchinha, mas também agradáveis, principalmente<br />

aos jovens”, ressalta J. Júnior, que mesmo assim prosseguiu<br />

compondo com o seu parceiro Braguinha.<br />

“Insistíamos, porque sabíamos que estávamos certos. Tínhamos<br />

quem gostasse do que criávamos e só diminuímos o ritmo<br />

de trabalho porque fazíamos música para ganhar dinheiro<br />

e não para gastar”, numa alusão às emissoras que passavam<br />

a cobrar para tocar qualquer tipo de música. Mesmo remando<br />

contra a maré, foram vitoriosos em muitas composições<br />

de Carnaval, entre elas, “Garota Saint-Tropez”.


Pauta Extra - EDIÇÃO ESPEcIAL cOMEMORATIVA DO cENTENÁRIO DE bRAGUINHA<br />

6 MARÇO # N. 7 # 2007 # pautaextra@ubc.org.br<br />

Uma tarde de<br />

saudades<br />

Ainda que os olhares se turvassem vez por outra com um<br />

rápido lacrimejar, denunciando discretamente a presença<br />

de uma incontrolável saudade, a filha única e dois dos<br />

três netos do querido e saudoso Braguinha, prosseguiam<br />

desfilando recordações, esforçando-se para não se<br />

deixarem dominar pela forte emoção do momento.<br />

E como se estivessem vivenciando o que contavam,<br />

narrando episódios que marcaram a vida de cada<br />

um deles, daqueles que tiveram o privilégio de privar<br />

com maior intimidade de seu inesquecível convívio. A<br />

cada relato, uma nova emoção. Assim foi a entrevista<br />

concedida pela filha única Maria Cecília e pelos netos<br />

Carlos Alberto e Maria Luiza.<br />

Braguinha, Jadyr de Araújo, Dona Astrea,<br />

João de Oliveira, Guilherme de Brito e Marly de Araújo<br />

Luiz Henrique, Abel Silva, Dona Astrea, Braguinha,<br />

Maria Cecília , Jadyr de Araújo e Maria Cláudia<br />

Braguinha, Jadyr de Araújo, José Antônio Perdomo, Abel Silva, Nivaldo<br />

Duarte, João de Oliveira, Dona Astrea e Guilherme de Brito<br />

Em edição<br />

especial<br />

EDIÇÃO ESPEcIAL cOMEMORATIVA DO cENTENÁRIO DE bRAGUINHA - Pauta Extra<br />

pautaextra@ubc.org.br # MARÇO # N. 7 # 2007<br />

A <strong>UBC</strong> decidira editar o seu informativo Pauta Extra de março como uma edição<br />

especial “comemorativa ao centenário de nascimento de Braguinha”, um de seus<br />

mais ilustres fundadores. Assim, além de pesquisar nas fontes que registram a vida<br />

desse inigualável autor, decidiu ouvir dos familiares do compositor e saber “algo<br />

mais” através de quem com ele conviveu estreitamente. A idéia era descobrir como<br />

era o dia-a-dia, não de um gênio, mas do esposo, pai e avô, enfim, do homem<br />

que conseguia transformar em verdadeiras pérolas os mais comuns dos fatos do<br />

cotidiano carioca.<br />

O fon-fon e a<br />

bússola<br />

Em maio de 1951, por exemplo, Braguinha resolveu presentear a esposa<br />

com um belo automóvel. Ao entrar em casa, dirigiu-se à mulher,<br />

entregando-lhe um chaveiro feito de uma pequena bússola e junto a<br />

este um bilhete em que escrevera de próprio punho o seguinte verso:<br />

“Mariquinha, o seu fon-fon, / no portão já está parado / Passeie nele<br />

bastante, / mas, tome muito cuidado! / Se a tentação, por acaso, /<br />

sentar-se um dia ao seu lado, / consulte a bússola amiga, / não ande<br />

em caminho errado”.<br />

Além de chamar a mulher de Mariquinha, Braguinha assinou o bilhete<br />

como Carlinhos. Aliás, colocar apelidos era com ele mesmo, tanto<br />

que a própria esposa era também Boni, um jeito carinhoso de chamála<br />

de bonita. Esse era o nosso querido Braguinha, uma pessoa feliz,<br />

sempre de bem com a vida, que irradiava alegria por onde passava.<br />

Carlos Alberto, seu neto, recorda dos tempos em que brincava com o<br />

avô como se este fosse da sua idade. Tanto que chegou a apelidá-lo<br />

de “play-vô”, numa alusão à jovialidade daquele de quem muito se<br />

orgulhava.<br />

Fácil ser<br />

botafoguense<br />

E continuamos sabendo muito mais sobre Braguinha, que jogou na escolinha de futebol do<br />

Botafogo, tornando-se um apaixonado pelo clube de General Severiano, onde, na época, jogavam<br />

craques como Heleno de Freitas, entre outros. Daí, para que toda a família se tornasse<br />

alvinegra, não foi necessário nenhuma imposição, como garante seu neto: “era fácil torcer<br />

pelo melhor!” E também era comum saírem todos em direção aos estádios onde o Botafogo<br />

jogava – “e vencia” – ressalta o neto Carlos Alberto, em meio ao coro feito pela mãe Maria<br />

Cecília e da irmã Maria Luíza.<br />

Com o álbum de fotografias da família, e cópias xerox do livro “Mestres da música no Brasil”,<br />

que será lançado brevemente com a biografia de seu pai, Maria Cecília prossegue desfilando<br />

suas lembranças, ora descrevendo uma foto, ora destacando um trecho de uma das páginas<br />

do livro. Mostra fotos do casamento dos pais, do carro presenteado à mãe e muitas outras.<br />

Flor do tempo<br />

Fechados o álbum e a brochura, os três “voltam à sala” e apontam para o piano em que Braguinha, sem<br />

muita técnica, conseguia tirar as notas que precisava para ter a noção exata do que acabara de criar ao som do<br />

assovio. Esse era o seu “instrumento” predileto, muito embora – recordam os entrevistados – ele adorasse o<br />

violão que ganhara ainda jovem e que o acompanhava desde os tempos do Colégio Batista, quando integrava<br />

o conjunto musical “Flor do Tempo”. Por sinal, nome dado à casa da Tijuca, numa época em que as casas<br />

recebiam de seus donos um nome que significava algo para seus moradores.<br />

E bateu a lembrança da primeira lancha, que também se chamava “Flor do Tempo”, bem como das duas<br />

seguintes, que foram batizadas por “Pastorinhas” e “Pastorinhas II”. Nelas Braguinha gostava de pescar com<br />

a família ou com os amigos, quase sempre em águas próximas à Ilha de Paquetá. Outro hobby do compositor<br />

era o ferrorama, com o qual passava horas brincando com o neto, fazendo questão de modificar o leito<br />

ferroviário conforme sua imaginação criativa. E a cada dia, o compositor idealizava novas engenharias, “que<br />

na maioria das vezes não saía do planejamento” - completa o neto Carlos Alberto.


Pauta Extra - EDIÇÃO ESPEcIAL cOMEMORATIVA DO cENTENÁRIO DE bRAGUINHA<br />

MARÇO # N. 7 # 2007 # pautaextra@ubc.org.br<br />

Carreira<br />

internacional<br />

Braguinha, um sinônimo de simplicidade, até mesmo<br />

depois de ser convidado pelo próprio Walt Disney para<br />

musicar seus desenhos animados de longa-metragem,<br />

que ainda hoje é sucesso nos países em que são exibidos,<br />

inclusive no Brasil. Foi naquela época que o<br />

nosso herói, cuja criatividade ia muito além de suas<br />

belíssimas composições, lançou um pequeno disco de<br />

vinil colorido, de 45 RPM, que durante muito tempo fez<br />

também um grande sucesso entre as gravadoras, que o<br />

adotaram por sua eficácia e total aceitação no mercado<br />

fonográfico.<br />

Ainda hoje Braguinha é lembrado na família e entre<br />

amigos como um nacionalista, que lia Jorge Amado e<br />

aplaudia as leis criadas por Getúlio Vargas em prol dos<br />

trabalhadores. Procurando estar sempre bem informado,<br />

lia diariamente vários jornais, dando preferência<br />

para o Jornal do Brasil e O Globo, quando procurava se<br />

informar sobre o país, o Botafogo, a Seleção Brasileira,<br />

mas, principalmente, sobre a Fórmula 1, que acompanhava<br />

pessoalmente, fosse a corrida no Rio ou em São<br />

Paulo. Como fazia questão que a família o acompanhasse,<br />

todos acabaram ficaram fãs de Emerson Fittipaldi,<br />

Nélson Piquet e Ayrton Senna.<br />

Bando dos<br />

tangarás<br />

Voltando à vida artística de nosso homenageado, veio à lembrança de seus familiares o tempo em que ele integrara<br />

o “Bando dos Tangarás”, ao lado de Almirante, Pixinguinha e Noel Rosa. Nessa época, ele se lançara também como<br />

intérprete e conseguira se manter nas paradas de sucessos. E Braguinha era um vitorioso, principalmente com suas<br />

marchinhas carnavalescas, que muito ajudaram a descobrir e consagrar inúmeros cantores.<br />

Nomes como Alcir Pires Vermelho, Heloísa Helena, Henrique Brito e J. Júnior, entre tantos outros compositores e<br />

músicos seus amigos foram lembrados na entrevista. Com alguns, Braguinha chegou a fazer parceria, principalmente<br />

quando queria colocar em suas letras uma melodia mais rebuscada, com mais arranjos. Ele gostava de se<br />

reunir com os amigos em bares e lanchonetes, de preferência no bairro onde residia.<br />

Natal,<br />

sua principal festa<br />

Braguinha na entrega<br />

dos prêmios <strong>UBC</strong><br />

Já ao término da entrevista, foram lembrados os muitos encontros familiares naquele mesmo apartamento, principalmente os natais em<br />

que toda a família e não dispensava a presença de nenhum de seus membros. “Era de fato uma grande festa, onde todos se confraternizavam<br />

em meio a muito amor e alegria, momentos, sem dúvida, inesquecíveis para todos nós que vivemos esses dias gloriosos, onde a<br />

paz, compreensão e carinho eram a tônica desses encontros familiares”, recordam os entrevistados.<br />

Dessa mesma emoção participamos nós, da <strong>UBC</strong>, que também tivemos o privilégio de privar da companhia e da amizade deste homem<br />

singular, dono de uma genialidade que o torna imortal, bem como a sua obra. Para nós brasileiros, é como se Braguinha – ou João de<br />

Barro – estivesse se ocupando com mais uma de suas criações para a qualquer momento retornar ao nosso convívio, ao convívio de<br />

seus admiradores, de seus eternos fãs. Com a nossa homenagem, vão os nossos agradecimentos a ele, a sua família e principalmente<br />

a Deus, por tê-lo criado.

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