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Movimentos Negros - Mídia Etnia Educomunica

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Projeto Raça, Desenvolvimento e Desigualdade Social Race, Development and Social Inequality Project<br />

MOVIMENTOS NEGROS: (IN)VISIBILIDADE NA EDUCAÇÃO E NA MÍDIA<br />

Rosangela Malachias *<br />

Este artigo objetiva demonstrar como os movimentos negros 1 politicamente organizados<br />

atuam, desde o início do século XX até a contemporaneidade, como agentes históricos<br />

impulsionando a transformação da sociedade brasileira. Se nos dias atuais, a mídia abre<br />

espaço para o debate sobre ações afirmativas, cotas raciais nas universidades públicas,<br />

mercado de trabalho e nos meios de comunicação é porque indivíduos anônimos,<br />

organizados em grupos políticos e ou culturais, questionaram a sua situação de exclusão.<br />

Desse questionamento constante, algumas conquistas foram contabilizadas. Dentre elas<br />

está a lei 10.639/03, que estabelece a obrigatoriedade do ensino de História da África e<br />

Cultura Afro-brasileira no ensino fundamental. Graças a iniciativas de organizações não<br />

governamentais, centros e núcleos de pesquisa de universidades públicas voltados aos<br />

estudos étnico-raciais, a formação de professores da rede pública foi iniciada. O trabalho<br />

pode ser comparado a gotas num imenso oceano, em especial na cidade e estado de<br />

São Paulo, cujo número de estabelecimentos e de agentes escolares é imenso. Todavia,<br />

o clima tem se mostrado propício. Os ventos sopram e, através dos meios de<br />

comunicação, levam a diferentes localidades a informação.<br />

A posse da informação demanda a busca do conhecimento. Como negar as dificuldades<br />

dos brasileiros em tratar e enfrentar situações de preconceito e de racismo? Como<br />

reverter os indicadores de exclusão, registrados nas pesquisas oficiais do governo, que<br />

demonstram a desigualdade econômica e de acesso a direitos dos afro-brasileiros? Qual<br />

deve ser o papel da educação e dos meios de comunicação para a construção da<br />

igualdade de direitos entre brancos e negros, homens e mulheres?<br />

Os movimentos negros no Brasil centralizaram suas reivindicações no campo da<br />

Educação. Quando resgatamos a cronologia das ações desse ativismo social em São<br />

Paulo constatamos que a Cultura foi o caminho escolhido para a resistência à violência<br />

do racismo, que é um mecanismo eficaz de exclusão. O racismo, pseudo-ciência<br />

* A autora é jornalista, doutora em Ciências da Comunicação pela ECA/USP, SYLFF fellow (Japão),<br />

consultora acadêmica do Programa Raça Desenvolvimento e Desigualdade Social Brasil-Estados Unidos<br />

(USP-UFBa-Howard University e Vanderbilt University) e co-fundadora do Grupo <strong>Mídia</strong> e <strong>Etnia</strong>.<br />

1 Lélia Gonzales escreveu Movimento ou movimentos negros? Nele, a falecida historiadora explica o porquê<br />

da forma plural. Dentre as razões estaria a diversidade de caminhos seguidos por diferentes organizações ou<br />

entidades na luta anti-racista. Todavia, a autora ao usar o termo no singular não abre mão da sua essência<br />

plural. Ver (Gonzales e Hasenbalg: 1982, p.18-20).<br />

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Projeto Raça, Desenvolvimento e Desigualdade Social Race, Development and Social Inequality Project<br />

elaborada no final do século XIX, tenta legitimar a dominação européia resultante do<br />

sistema colonial. Os povos americanos (indígenas), africanos e asiáticos tiveram suas<br />

culturas milenares subjugadas à força civilizarória do continente europeu.<br />

A resistência negra ocorreu nos espaços culturais. Dentre eles citamos os ‘territórios’<br />

negros (quilombos), a religião (terreiros de candomblé, irmandades de Nossa Senhora e<br />

São Benedito), a capoeira, as escolas de samba e os clubes recreativos denominados<br />

“13 de Maio”, comuns nas cidades do interior.<br />

Tem sido no trabalho de formação de professores, que eu, pesquisadora acadêmica e<br />

militante, tenho protagonizado a experiência de dar visibilidade a essas ações do ativismo<br />

negro, constatando a surpresa de meus interlocutores -professores(as) da rede pública -<br />

quando ouvem o relato dos fatos históricos que eles não aprenderam e, por conseguinte,<br />

não ensinam na escola.<br />

A existência de uma Imprensa Negra em São Paulo, no início do século XX, é um dos<br />

exemplos da indignação, que toma conta dos participantes dos cursos de formação,<br />

iniciados a partir da lei 10.639/03. Muitos(as) professores(as) de História perguntam-me:<br />

“por quê nunca me ensinaram isso?”<br />

Respondo que o desconhecimento cultural do legado da civilização africana e de suas<br />

transculturações ocorridas na diáspora consolidam o racismo anti negro. A dificuldade de<br />

pessoas negras se reconhecerem como tal, assumirem a positividade de sua identidade<br />

étnica explica-se, em parte, pela invisibilidade da história das populações negras, de suas<br />

conquistas e personagens. As crianças negras são as que mais sofrem na escola. Não<br />

encontram referenciais que valorizem seu povo e cultura. Nas aulas de história<br />

encolhem-se quando o tema é escravidão e isso é notado por docentes mais atentos.<br />

A lei 10.639/03 aponta diretrizes para o desenvolvimento de um processo educacional<br />

reflexivo, crítico, que observa e analisa as ações dos homens e das mulheres na história,<br />

sem preconceitos, hierarquizações étnicas e de gênero. Abre portas para o exercício dos<br />

pilares 2 da educação, quando nos impulsiona a aprender a conhecer o protagonismo dos<br />

africanos na construção das riquezas do país e todo o seu conhecimento no campo da<br />

mineralogia, metalurgia, arquitetura, agricultura, escultura... A condição de escravo<br />

resignado – ainda presente na abordagem do tema - dá lugar à condição real de um povo<br />

2 Aprender a conhecer (Aprender), Aprender a Conviver, Aprender a Fazer, Aprender a Ser (Delors, 2001).<br />

2


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detentor de saberes civilizatórios, que resistiu ao sistema escravista promovendo<br />

rebeliões e insurreições contínuas 3 .<br />

Mas a mudança metodológica acima proposta é mais ampla. Ela considera a co-<br />

responsabilidade da mídia, ou seja, do conjunto dos meios de comunicação, na<br />

perpetuação de estereótipos negativos. Personagens negras são sempre relacionadas à<br />

comicidade, à criminalidade ou à servidão. As apresentadoras de programas infantis,<br />

assim como as atrizes e modelos que mais aparecem na mídia são loiras. Ter o cabelo<br />

crespo significa ter “cabelo ruim”. “Cabelo bom” é liso e para tê-lo, mulheres negras e<br />

brancas tornam-se escravas de escovas, processos químicos, pranchas e chapinhas<br />

para alisar e alongar seus cabelos.<br />

O ideal estético de sucesso propagado pela mídia é branco (talvez por isso os homens<br />

negros bem sucedidos casam-se 4 com mulheres brancas) e embora seja válido registrar<br />

as mudanças já percebidas nas novelas, como a inserção limitada de atores e atrizes<br />

afrodescendentes, ainda persiste a valorização da beleza branca.<br />

Como alterar essa realidade, em favor da pluralidade étnica existente no Brasil?<br />

A prática educativa que respeita as diferenças, considera a diversidade em prol da<br />

igualdade de direitos, constitui-se numa alternativa ao desenvolvimento. Entretanto, sem<br />

o acesso ao conhecimento da história dos outros – os diferentes – não se consegue<br />

avançar.<br />

Temos apostado na difusão dos fatos históricos. A atual reivindicação de cotas raciais<br />

nas universidades públicas ganha espaço nas páginas dos jornais, revistas de opinião,<br />

programas de rádio e televisão. Tamanha visibilidade não significa a tomada de<br />

consciência da sociedade da existência de uma intervenção constante, capaz de<br />

transformar a história. Lemos notícias, assistimos os jornais da TV, obedecemos a<br />

decisões governamentais acreditando, muitas vezes, que as medidas de impacto social<br />

são fruto da boa vontade dos parlamentares e nem sempre observamos a pressão<br />

3 Ler Clóvis Moura.<br />

4 Não descartamos a questão do sentimento. Muitos casais mistos casam-se por amor. Referimo-nos a<br />

situação anterior. O que motivaria os homens (e mulheres) negros(as) a rejeitarem como companheiros(as)<br />

pessoas do mesmo grupo étnico? Qual seria o seu ideal de beleza e preferência? Será que esse ideal e<br />

preferência foram construídos a partir das imagens que recebemos na mídia (capas de revista, TV) e na<br />

escola?<br />

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exercida por homens e mulheres organizados no ativismo social, tanto na esfera local<br />

quanto global.<br />

As conquistas contemporâneas, como a Lei 10.639/03 e a adoção de ações afirmativas<br />

nos remetem obrigatoriamente ao passado, aos anos seguintes à Abolição, quando<br />

alguns jovens negros paulistas, autodidatas ou apadrinhados, situação que lhes garantia<br />

o acesso educacional, uniram-se para democratizar o seu forte interesse pela leitura.<br />

Juntos criaram a Imprensa Negra.<br />

Em 1916 é fundado o periódico O Menelike, cujo teor manifestava uma consciência<br />

racial nascente. Surgem depois O Bandeirante (1918); O Alfinete (1918), A Liberdade<br />

(1919); O Kosmos (1924); O Elite (1924); O Patrocínio (1925); Auriverde (1928). A fase<br />

mais combativa da Imprensa Negra começa após a fundação do jornal O Clarim, pelos<br />

jovens José Correia Leite e Jayme Aguiar (ambos fundadores da FNB), que depois muda<br />

seu nome para O Clarim da Alvorada.<br />

Esses jornais pautavam o cotidiano da comunidade 5 e sugeriam normas de conduta<br />

(comportamento, higiene, postura etc) que, numa análise superficial, descontextualizada,<br />

poderiam ser interpretadas como preconceituosas, todavia, na época, representavam a<br />

tentativa de ‘educar’ os leitores e lhes garantir um tratamento digno por parte da<br />

sociedade branca dominante.<br />

Em 1931, a Frente Negra Brasileira (FNB) é fundada, como o primeiro movimento negro -<br />

de cunho político do país. Os jovens negros Correia Leite, Gervásio de Moraes, Raul<br />

Amaral, Arlindo e Isaltino Veiga dos Santos integram a liderança da entidade 6 , cuja<br />

perspectiva política era a integração da população negra à sociedade, a partir do direito<br />

e acesso à educação e ao trabalho.<br />

Em 1945 nasce o Teatro Experimental do Negro (TEN), fundado por Abdias Nascimento<br />

e pelo poeta Solano Trindade e que contava com a participação da então jovem (e<br />

5 Vale destacar a ação feminina que segundo Correia Leite, em sua bibliografia gravada e escrita (1989) por<br />

Cuti, poeta negro fundador do movimento literário Quilombhoje, tanto a Imprensa Negra, quanto a Frente<br />

Negra recebiam auxílio financeiro das mulheres cozinheiras, cujos salários, na época, eram os melhores. No<br />

período pós abolição, as mulheres negras tornaram-se ‘arrimo de família’, uma vez que os homens negros<br />

eram preteridos no mercado de trabalho em favorecimento ao acesso dos imigrantes europeus, que ficavam<br />

com as vagas. Graças às mulheres negras, era possível produzir os informativos, posteriormente distribuídos<br />

nos salões de bailes, freqüentados exclusivamente por negros.<br />

6 Ver: Malachias, R: 1996, 34-35.<br />

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premiada) 7 atriz Ruth de Souza. O TEN inova o texto e a linguagem teatral trazendo<br />

temáticas sobre preconceito racial e contando histórias de líderes negros invisibilizados<br />

na história oficial promovendo, desse modo, uma intervenção educativa contra a<br />

ideologia vigente.<br />

O golpe militar de 1964 leva Abdias Nascimento ao exílio nos Estados Unidos, no<br />

momento em que a juventude negra norte-americana lutava por direitos civis e se dividia<br />

entre a luta pacífica (discurso da não violência pregado por Martin Luther King Jr) e a luta<br />

armada (a “arma” legal, representada pelo conhecimento da constituição norte-<br />

americana, do direito ao porte de arma, do direito a observação do trabalho policial e a<br />

identificação do número de registro desse policial em casos de violência) que os Black<br />

Panters (Panteras Negras) e seu líder, Malcom X utilizavam.<br />

Abdias e outros jovens brasileiros se identificam com a mobilização internacional que<br />

agita os anos 60 (guerra do Vietnã, luta pelo direito ao ensino gratuito na França,<br />

Revolução Cubana, guerrilha no Brasil contra o golpe). Nos anos 70, na África, a<br />

juventude luta pela independência de seus países, que ainda mantinham o status de<br />

colônias européias. Jovens líderes como o congolês Patrick Lumumba e o sul africano<br />

Stevie Biko também sensibilizam a juventude negra que passava a se interessar pelas<br />

lutas independentistas dos países africanos.<br />

Em 1978, na cidade de São Paulo, ainda no regime militar, um jovem chamado Robson<br />

Silveira da Luz é preso, espancado e assassinado por policiais quando retornava para<br />

sua casa. Os jornais noticiam a manifestação de protesto contra a violência policial, que<br />

ocupa as escadarias do teatro municipal de São Paulo dando respaldo à contradição<br />

entre o discurso oficial da democracia racial e a ação violenta da polícia, para quem ‘ser<br />

negro’ significa ‘ser suspeito’. Nasce aí o MNU (Movimento Negro Unificado) 8 , a primeira<br />

organização do movimento negro a ter amplitude e representação nacional assumindo,<br />

inclusive, uma postura, denominada “de esquerda”.<br />

O crescimento da militância sensibiliza pesquisadores, que já encontravam nas obras de<br />

Roger Bastide e Florestan Fernandes (anos 50, 60 e 70) indicativos da desigualdade<br />

7 Ruth de Souza recebeu vários prêmios e a indicação de melhor atriz no Festival de Veneza, em 1953, por<br />

sua atuação no filme Sinhá Moça.<br />

Era 23 de julho de 1978. A sigla inicial era MNUCVP – Movimento Negro Unificado contra a Violência Policial,<br />

depois foi mudada para MNUCDR – Movimento Negro Unificado contra a Discriminação Racial até tornar-se<br />

nacionalmente apenas MNU, Movimento Negro Unificado.<br />

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sócio-econômica entre brancos e negros na sociedade brasileira. Estudos realizados pela<br />

chamada Escola Paulista, formada por Emília Viotti, Octávio Ianni, Fernando Henrique<br />

Cardoso dentre outros, contrapõem-se à perspectiva culturalista adotada anos antes por<br />

Gilberto Freire, o ideólogo do mito das três raças. 9<br />

Nos anos 80, pesquisas do IBGE comprovam o que antes era apenas discurso militante.<br />

Com o aumento de pesquisas – inclusive as produzidas por e sobre negros – apuram-se<br />

quantitativamente os índices de exclusão, evidenciando a fragilidade da crença na<br />

democracia racial.<br />

Quem não se emocionou, nos anos 90, com a libertação de Nelson Mandela e a sua<br />

chegada à presidência da África do Sul? Pela TV, vimos o líder negro, preso durante 27<br />

anos, ser aclamado por chefes de Estado de todo o mundo; testemunhamos a queda do<br />

apartheid, graças à luta histórica da população negra sul africana e do apoio<br />

internacional, que promoveu sanções, boicotes econômicos e atividades culturais visando<br />

a libertação de Mandela.<br />

No Brasil, o movimento sul-africano provoca reflexões do ativismo social e de intelectuais<br />

favorecendo a publicação de artigos sobre políticas compensatórias e outros conceitos 10 ,<br />

ainda novos no país, aplicados aos sujeitos sociais.<br />

Em 1995, entidades do movimento negro marcham 11 até a capital do país e entregam ao<br />

então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, uma pauta de<br />

reivindicações cobrando medidas políticas de inclusão social dos afrodescendentes. Em<br />

1996, o Governo Federal atende, em parte, essas demandas e promove um Seminário<br />

Internacional sobre Políticas de Ações Afirmativas reunindo, em Brasília, estudiosos<br />

brasileiros e convidados dos Estados Unidos e África do Sul. Neste evento, divulga a<br />

criação de um GTI - Grupo de Trabalho Interministerial para o desenvolvimento de<br />

9 A democracia racial resultaria da harmonia entre o indígena, o europeu e o negro. Vale citar a visão mais<br />

realista de outro etnólogo – o cubano Fernando Ortiz, contemporâneo do brasileiro Freire. Profundo estudioso<br />

da sociedade cubana, Ortiz se apoiará no conceito de transculturación, que não reduz o encontro desses<br />

povos numa relação harmônica, mas explicita o conflito e a resistência, em fases diferenciadas e dialéticas -<br />

o choque, a adaptação, o estranhamento, a resistência. Ver: Malachias, R - Ação transcultural: a visibilidade<br />

da juventude negra nos bailes black de São Paulo (Brasil) e Havana (Cuba). Dissertação de Mestrado, São<br />

Paulo, Prolam/USP - Programa de Pós-Graduação em Integração da América Latina da Universidade de São<br />

Paulo, outubro, 1996.<br />

10 Referimo-nos aos conceitos de gênero, ações afirmativas, multiculturalismo, reparações, advocacy,<br />

empowerment. (Malachias, 2002).<br />

11 Marcha Zumbi dos Palmares contra o Racismo, pela Cidadania e a Vida.<br />

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Projeto Raça, Desenvolvimento e Desigualdade Social Race, Development and Social Inequality Project<br />

Políticas para a Valorização da População Negra nas seguintes áreas: Quesito Cor –<br />

Trabalho – Emprego – Comunicação – Educação – Relações Internacionais – Terra<br />

(Remanescentes de Quilombos) – Políticas de Ação Afirmativa – Mulher Negra –<br />

Racismo – Violência – Saúde – Religião – Esportes – Legislação – Estudos e Pesquisa –<br />

Ciência – Tecnologia – Cultura.<br />

No mesmo ano, a presidência da República lança o PNDH – Programa Nacional de<br />

Direitos Humanos comprometendo-se a implementar políticas compensatórias e ações<br />

afirmativas de curto, médio e longo prazo, direcionadas às populações historicamente<br />

excluídas: negros, indígenas, mulheres, idosos etc. Esta atitude marca o reconhecimento<br />

oficial da existência do racismo no Brasil, fato de significativa importância, pois durante<br />

décadas, estudos 12 consagrados e discursos governamentais 13 propagaram o mito da<br />

democracia racial.<br />

Governo, ONGs e intelectuais ligados às universidades compõem um Comitê, que atua<br />

no processo de construção da participação brasileira na 3 a Conferência Mundial contra o<br />

Racismo, realizada em 2001, na África do Sul. As formulações 14 desse grupo referentes<br />

especificamente à inclusão educacional - são as seguintes: “adoção de medidas<br />

reparatórias às vítimas do racismo”; “criação de um fundo de reparação social gerido<br />

pelo Governo e pela sociedade civil destinados a financiar políticas de cunho inclusivo no<br />

âmbito da educação”, “adoção de cotas ou outras medidas afirmativas que promovam o<br />

acesso de negros às universidades públicas”.<br />

O documento final da 3 a Conferência contra o Racismo, denominado Plano de Ação<br />

Durban, passa a ser utilizado como norte à promoção de políticas para a igualdade racial.<br />

Ao assumir a presidência, em 2002, Luís Inácio Lula da Silva herda do governo anterior,<br />

a responsabilidade do cumprimento dessas políticas compensatórias. Nomeia 15 três<br />

ministras negras e, numa atitude inédita na história do país, escolhe um jurista 16 negro<br />

para compor o Supremo Tribunal Federal. Em janeiro de 2003, o presidente Lula institui a<br />

12 Casa Grande e Senzala, de Gilberto Freyre é, sem dúvida, um marco na construção do mito de “harmonia<br />

racial” entre os povos formadores do Brasil – indígenas, europeus e africanos.<br />

13 Emitidos pela Diplomacia brasileira.<br />

14 Relatório do Comitê nacional para a Preparação da Participação Brasileira na III Conferência Mundial<br />

contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata. (Bento e Silva Júnior, 2003).<br />

15 Ministras Benedita da Silva, Marina Silva, Matilde Ribeiro e o juiz Joaquim Barbosa Gomes.<br />

16 Joaquim Barbosa<br />

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obrigatoriedade 17 do Ensino de História da África e da Cultura Afro-Brasileira no ensino<br />

fundamental e médio. No dia 21 de março 18 deste mesmo ano, com uma medida<br />

provisória, cria a SEPPIR – Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade<br />

Racial, com status de ministério.<br />

Passados 95 anos dessa cronologia, as entidades do movimento negro atuam na<br />

contemporaneidade em prol do acesso à educação de qualidade como caminho ao<br />

ingresso no mercado de trabalho, mas também como espaço para o desenvolvimento de<br />

novas mentalidades anti racistas. Reivindicam também o acesso às novas tecnologias de<br />

informação e se utilizam do conceito advocacy (ajuda a quem necessita nos campos da<br />

política, do direito e da comunicação) para se instrumentalizar como receptoras, criadoras<br />

e mediadoras de mensagens.<br />

A prática do conceito advocacy demanda o estabelecimento de redes e foruns capazes<br />

de ampliar as questões de interesse do grupo. Assim, se nos a grande mídia tem poder<br />

para difundir estereótipos contra os negros, os telespectadores, organizados, podem,<br />

conscientes da legislação e de seus direitos, protestarem e modificarem tal situação.<br />

O ativismo escrito na história do país, ainda não usufrui a justa visibilidade, a educação<br />

reflexiva proposta pela lei 10.639/03 pode reverter tal situação. Porém, no que diz<br />

respeito aos meios de comunicação, devemos nos conscientizar da nossa capacidade de<br />

intervir enquanto mediadores, refutando e recusando preconceitos e estereótipos.<br />

Bibliografia<br />

BLAJBERG, Jennifer Dunjwa - O legado do apartheid formal e os desafios enfrentados na<br />

reconstrução e desenvolvimento da África do Sul - 1994-1995. In: Estratégias de<br />

Combate ao Racismo - (Org.) MUNANGA, K., São Paulo, Edusp/Estação ciência,<br />

1996.<br />

BLAJBERG, Salomon - As idiossincrasias raciais brasileiras na formulação das políticas<br />

públicas em vista da eliminação do apartheid formal na África do Sul. In: Estratégias<br />

de Combate ao Racismo - (Org.) MUNANGA, K., São Paulo, Edusp/Estação ciência,<br />

1996.<br />

17 Lei 10.639/2003.<br />

18 Dia Internacional de Luta contra o Racismo.<br />

8


Projeto Raça, Desenvolvimento e Desigualdade Social Race, Development and Social Inequality Project<br />

CONE, James . - Malcolm X et Martin Luther King - Les effets d'une collère noire,<br />

Genève, Labor et Fides, 1991.<br />

DELORS, Jaques – Educação um tesouro a descobrir. Sào paulo,contexto/Unesco, 2001.<br />

FREIRE, Paulo – Pedagogia da Autonomia – saberes necessários à prática educativa,<br />

São Paulo, Paz e Terra, 2000. 16 ª ed.<br />

KELLNER, Douglas – A Cultura da <strong>Mídia</strong>. Estudos culturais: identidade e política entre o<br />

moderno e o pós moderno. (Trad. Ivone Castilho Benedetti), Bauru, São Paulo,<br />

EDUSC, 2001.<br />

LEITE, José Correia - E disse o velho militante... (Org.) Cuti, São Paulo, Secretaria<br />

Municipal de Cultura, 1992.<br />

MALACHIAS, Rosangela - Ação transcultural: a visibilidade da juventude negra nos bailes<br />

black de São Paulo (Brasil) e Havana (Cuba). Dissertação de Mestrado, São Paulo,<br />

PROLAM/USP – Programa de Pós-Graduação em Integração da América Latina da<br />

Universidade de São Paulo, outubro/1996.<br />

________________ - Os sonhos podem acontecer. Teorias e práticas à ampliação do<br />

discurso preventivo ao abuso de drogas, com a inclusão de jovens negros e<br />

mulheres. Tese de Doutorado apresentada ao Departamento de Comunicações e<br />

Artes da ECA/USP – Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São<br />

Paulo. Outubro, 2002.<br />

MUNANGA, Kabengele - Negritude - usos e sentidos - São Paulo, Ed. Ática, 1986.<br />

NASCIMENTO, Elisa Larkin - Pan-africanismo na América do Sul - emergência de uma<br />

rebelião negra, Petrópolis, Ed. Vozes/IPEAFRO-PUC/SP, 1981.<br />

PROGRAMA NACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS – Presidência da República, 1996.<br />

9

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