Cinquenta Anos da Internacional Socialista - Fundação Mário Soares
Cinquenta Anos da Internacional Socialista - Fundação Mário Soares
Cinquenta Anos da Internacional Socialista - Fundação Mário Soares
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
1. PORTUGAL E A ASSOCIAÇÃO INTERNACIONAL DOS TRABALHADORES<br />
Entretanto o José Fontana (1)<br />
continuava a apparecer, sempre<br />
mysterioso, acautellado,<br />
fallando pouco e baixo, sorrindo<br />
com melancholia, mostrando<br />
cartas e promettendo que,<br />
sem falta ella rebentaria, - para<br />
a semana.<br />
D’uma vez entrou-n’os, de<br />
noute, em casa, onde o Anthero<br />
(2) e eu prevenidos, o esperavamos<br />
sós. Vinha acompanhado<br />
de tres homens estrangeiros,<br />
novos ain<strong>da</strong>, pobremente vestidos:<br />
Eram tres chefes<br />
emissarios <strong>da</strong> Associação internacional<br />
dos Trabalhadores.<br />
Estes tres homens, sem duvi<strong>da</strong><br />
muito notaveis e, depois, muito<br />
conhecidos em todo o mundo,<br />
- disseram-nos o plano <strong>da</strong><br />
vasta organisação, expuseram<br />
as doutrinas de Karl Marx, e<br />
as theorias que, já mesmo então,<br />
dividiam o Socialismo nascente,<br />
sob esta nova fórma de<br />
combate.<br />
Ouvimo-los quasi to<strong>da</strong> a noute.<br />
No dia seguinte o José Fontana<br />
appareceu mais cedo e contounos,<br />
sempre tranquillo, sempre<br />
sorrindo, que a policia o seguia<br />
por to<strong>da</strong> a parte, que não<br />
podiamos tornar a reunir-nos<br />
n’uma casa qualquer, e<br />
suggerio o Tejo e um barco.<br />
N’essa mesma noute fomos ao<br />
Aterro, o Anthero e eu, pagámos<br />
a um barqueiro para nos<br />
deixar remar sósinhos no seu<br />
bote e fizemo-nos ao largo. A<br />
uma hora combina<strong>da</strong> aproximámo-nos<br />
d’um outro caes<br />
onde o José Fontana nos esperava<br />
com os internacionalistas.<br />
E durante horas, n’essa noute<br />
e nas seguintes, sobre o Tejo,<br />
emquanto eu remava, o<br />
Anthero discutia, com os<br />
emissarios socialistas, a revolução<br />
operaria que já lavrava<br />
na Europa.<br />
Jayme Batalha Reis, Annos de Lisboa (Algumas Lembranças), incluído no<br />
Anthero de Quental – In Memoriam, Editorial Presença, Lisboa, 1993<br />
(1) José Fontana (1841-1876). Foi, com Azedo Gneco,<br />
um dos fun<strong>da</strong>dores do Partido <strong>Socialista</strong> Português<br />
(3) Azedo Gneco (1849- (4) Angelina Vi<strong>da</strong>l (1853-<br />
1911). Fun<strong>da</strong>dor e dirigen- 1917). Professora, escritora<br />
te do Partido <strong>Socialista</strong> Por- e jornalista, defensora <strong>da</strong>s<br />
tuguês<br />
classes trabalhadoras<br />
(6) Aspecto <strong>da</strong> sessão inaugural do VI Congresso do<br />
Partido <strong>Socialista</strong> Português, Porto, 21 a 24 de Junho<br />
de 1913<br />
(2) Antero de Quental (1842-1891). Poeta e defensor<br />
dos ideais socialistas. Retrato <strong>da</strong> autoria de Columbano<br />
Bor<strong>da</strong>lo Pinheiro, 1889 (Museu do Chiado, IPM)<br />
(5) O Protesto Operário, orgão do Partido Operário<br />
<strong>Socialista</strong>, 10 de Janeiro de 1885<br />
(7) República Social, orgão <strong>da</strong> Federação Municipal <strong>Socialista</strong> do Porto, 8 de Janeiro de 1927