Mosaico 1.indd - Câmara Municipal de Évora
Mosaico 1.indd - Câmara Municipal de Évora
Mosaico 1.indd - Câmara Municipal de Évora
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Outrora, a matança do porco estendia-se por várias<br />
casas e locais, num espírito comunitário e solidário.<br />
Quem tinha ajudado recebia posteriormente ajuda. Até<br />
meados <strong>de</strong> Março, conforme a extensão do Inverno, havia<br />
sempre festa, na certeza da chegada <strong>de</strong> mais um ano<br />
em que a barriga não pa<strong>de</strong>ceria privações. Mas, a pouco<br />
a pouco, a <strong>de</strong>sertificação do mundo rural, o abandono<br />
dos campos e a adopção <strong>de</strong> novas técnicas agrícolas foram<br />
modificando a vida, mesmo a dos que continuam a<br />
querer resistir à perda dos velhos hábitos.<br />
Actualmente, por via da imposição rígida <strong>de</strong> normas<br />
da União Europeia, a pretexto <strong>de</strong> homogeneizar comportamentos<br />
e globalizar princípios <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> pública, a<br />
matança do porco, na sua versão tradicional, tem sido<br />
largamente combatida. No mínimo exige-se a presença<br />
<strong>de</strong> um veterinário que se faz pagar a peso <strong>de</strong> ouro.<br />
Outras regras sanitárias, como o abate em matadouro,<br />
<strong>de</strong>sincentivam também a sua prática. Determinados imperativos<br />
<strong>de</strong> natureza ética têm ganho também terreno,<br />
con<strong>de</strong>nando costumes ancestrais que os urbanos acoimam<br />
hoje <strong>de</strong> bárbaros.<br />
usos e costumes a matança do porco<br />
Apesar <strong>de</strong> tudo, esta continua a fazer-se <strong>de</strong> forma clan<strong>de</strong>stina<br />
em vilas, al<strong>de</strong>ias e principalmente em lugares ou<br />
montes isolados na vasta planície alentejana, on<strong>de</strong> todos<br />
se conhecem e a presença das autorida<strong>de</strong>s não alcança.<br />
E mesmo que, à distância, algum eco lhes chegue <strong>de</strong>ssas<br />
activida<strong>de</strong>s, o que fazem é ignorá-lo para não cair no<br />
<strong>de</strong>sagrado dos poucos que por ali ainda habitam.<br />
Este ano, a <strong>Câmara</strong> <strong>Municipal</strong> <strong>de</strong> <strong>Évora</strong> achou por<br />
bem fazer a recriação <strong>de</strong>ste hábito tradicional na Praça<br />
do Giraldo, com a óbvia exclusão da parte não permitida<br />
por lei, no intuito <strong>de</strong> fazer <strong>de</strong>scer a ruralida<strong>de</strong> à<br />
cida<strong>de</strong>. Ali instalou dois carros <strong>de</strong> canudo e levantou<br />
um lume <strong>de</strong> chão on<strong>de</strong> as febras foram assadas. Sopa<br />
dos ganhões enriquecida com a presença da carne <strong>de</strong><br />
porco e enchidos cozidos também foi colocado à disposição<br />
<strong>de</strong> quem a quisesse saborear. Grupos <strong>de</strong> cantares<br />
acompanharam a refeição, on<strong>de</strong> a pinga <strong>de</strong> estalo se fez<br />
notar. Turistas nacionais e estrangeiros, surpreendidos<br />
com este evento inédito, teceram loas à iniciativa que<br />
lhes permitiu conhecer melhor a história e os segredos<br />
<strong>de</strong> vida do povo alentejano.<br />
23<br />
Fotografia <strong>de</strong> Carlos Neves