20.04.2013 Views

historia de um olhar - Eliana Brun

historia de um olhar - Eliana Brun

historia de um olhar - Eliana Brun

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

HISTÓRIA DE UM OLHAR<br />

23<br />

Um dia Israel se aproximou <strong>de</strong> <strong>um</strong> menino. De nove anos,<br />

chamado Lucas. Olhos <strong>de</strong> amêndoa, rosto <strong>de</strong> escon<strong>de</strong>rijo. Bom<br />

<strong>de</strong> bola. Bom <strong>de</strong> rua. De tanto gostar do menino que lhe sorriu,<br />

Israel o seguiu até a escola. Até a porta on<strong>de</strong> Lucas <strong>de</strong>saparecia<br />

todas as tar<strong>de</strong>s, tragado sabe-se lá por qual magia. Até a porta<br />

on<strong>de</strong> as crianças recebiam cucas e leite. Israel chegou até lá por<br />

fome. De comida, <strong>de</strong> afago, <strong>de</strong> lápis <strong>de</strong> cor. Fome <strong>de</strong> <strong>olhar</strong>.<br />

Aconteceu neste inverno. Eliane, a professora, <strong>de</strong>scobriu<br />

Israel. Desajeitado, envergonhado, quase <strong>de</strong>saparecido <strong>de</strong>ntro<br />

<strong>de</strong>le mesmo. Um vulto, <strong>um</strong> espectro na porta da escola. Com<br />

<strong>um</strong> sorriso inocente e uns olhos <strong>de</strong> vira-lata pidão, dando a<br />

cara para bater porque nunca foi capaz <strong>de</strong> escondê-la.<br />

Eliane viu Israel. E Israel se viu refletido no <strong>olhar</strong> <strong>de</strong> Eliane.<br />

E o que se passou naquele <strong>olhar</strong> é <strong>um</strong> milagre <strong>de</strong> gente. Israel<br />

<strong>de</strong>scobriu <strong>um</strong> outro Israel navegando nas pupilas da professora.<br />

Terno, especial, até meio garboso. Israel <strong>de</strong>scobriu nos<br />

olhos da professora que era <strong>um</strong> homem, não <strong>um</strong> escombro.<br />

Capturado por essa irresistível imagem <strong>de</strong> si mesmo, Israel<br />

perseguiu o olho <strong>de</strong> espelho da professora. A cada dia dava<br />

<strong>um</strong> passo para <strong>de</strong>ntro do <strong>olhar</strong>. E, quando perceberam, Israel<br />

estava no interior da escola. E, quando viram, Israel estava na<br />

janela da sala <strong>de</strong> aula da 2ª série C. Com meio corpo para <strong>de</strong>ntro<br />

do <strong>olhar</strong> da professora.<br />

Uma cena e tanto. Israel na janela, espiando para <strong>de</strong>ntro.<br />

Cantando no lado <strong>de</strong> fora, <strong>de</strong>senhando com os olhos. Quando<br />

o chamavam, fugia correndo. Escondia-se atrás dos prédios.<br />

Mas <strong>de</strong>vagar, como bicho acuado, que <strong>de</strong> tanto apanhar ficou<br />

ressabiado, foi pegando primeiro <strong>um</strong> lápis, <strong>de</strong>pois <strong>um</strong> afago.<br />

E, n<strong>um</strong> dia <strong>de</strong> agosto, Israel completou a subversão. Cruzou a<br />

porta e pintou bonecos <strong>de</strong> papel. Israel estava todo <strong>de</strong>ntro do<br />

<strong>olhar</strong> da professora.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!