Texto VI
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I<br />
lítica precisam ser revistos conforme as circunstâncias<br />
e sempre tendo em vista os fins<br />
coletivos.<br />
No entanto, é bom lembrar que o pensamento<br />
de Maquiavel tem um sentido próprio,<br />
na medida em que ele expressa a tendência<br />
fundamental da sua época, ou seja, a<br />
defesa do Estado absoluto e a valorização da<br />
política secular, não atrelada à religião. Talvez<br />
por isso o extremo politicismo, ou seja, a<br />
hipertrofia do valor político, de cujas conseqüências<br />
últimas talvez nem ele próprio pudesse<br />
suspeitar.<br />
Embora Maquiavel não tivesse usado o<br />
conceito de razão de Estado, é considerado O<br />
pensador que começa a esboçar a doutrina que<br />
vigorará no século seguinte, quando o governante<br />
absoluto. em circunstâncias críticas e<br />
extremamente graves. a ela recorre permitindo-se<br />
violar normas jurídicas, morais, políticas<br />
e econômicas.<br />
Cassirer, filósofo alemão contemporâneo,<br />
observa que a experiência pessoal de<br />
Maquiavel se baseava nas pequenas tiranias<br />
italianas do século X<strong>VI</strong>, que não podem ser<br />
comparadas às monarquias absolutas do século<br />
X<strong>VI</strong>I nem às nossas ditaduras modernas, o<br />
que nos faz ver hoje o maquiavelisrno através<br />
de uma lente de aumento.<br />
6. Maquiavel republicano<br />
Quando estava no ostracismo político,<br />
Maquiavel se ocupa com a elaboração dos<br />
Comentários sobre a primeira década de Tito<br />
Livio ; interrompendo esse trabalho por alguns<br />
meses para escrever O príncipe.<br />
À medida que escreve os Comentários,<br />
lê trechos nas reuniões realizadas por jovens<br />
republicanos, a quem dedica a obra. Aí desenvolve<br />
idéias democráticas, admitindo que o<br />
conflito é inerente à atividade política e que<br />
esta se faz a partir da conciliação de interesses<br />
divergentes.<br />
Defende a proposta do governo misto:<br />
"Se o príncipe, os aristocratas e o povo governam<br />
em conjunto o Estado, podem com facilidade<br />
controlar-se mutuamente".<br />
Considera importante que as monarquias<br />
ou repúblicas sejam governadas pejas<br />
leis e acusa aqueles que, no uso da violência,<br />
abusaram da crueldade, ou a usaram para interesses<br />
menores.<br />
:. ':~<br />
7. A autonomia da política<br />
Maquiavel subverte a abordagem tradicional<br />
da teoria política feita pelos gregos e<br />
medievais e é considerado o fundador da<br />
ciência política, ao enveredar por novos caminhos<br />
"ainda não trilhados".<br />
Pode-se dizer que a política de Maquiavel<br />
é realista, pois procura a verdade efetiva,<br />
ou seja, "como o homem age de fato". As<br />
observações das ações dos homens do seu<br />
tempo e dos estudos dos antigos, sobretudo<br />
da Roma Antiga, levam-no à constatação de<br />
que os homens sempre agiram pelas vias da<br />
corrupção e da violência. Partindo do pressuposto<br />
ela natureza humana capaz do mal e<br />
do erro, analisa a ação política sem se preocupar<br />
em ocultar "o que se faz e não se costuma<br />
dizer".<br />
A esse realismo alia-se a tendência<br />
utilitarista, pela qual Maquiavel pretende desenvolver<br />
uma teoria voltada para a ação eficaz<br />
e imediata. A ciência política só tem sentido<br />
se propiciar o melhor exercício da arte<br />
política. Trata-se do começo da ciência política:<br />
da teoria e da técnica da política, entendida<br />
como disciplina autônoma.<br />
Maquiavel torna a política autônoma<br />
porque a desviucula da ética e da religião,<br />
procurando examiná-Ia na sua especificidade<br />
própria.<br />
Em relação ao pensamento medieval,<br />
Maquiavel procede à secularização da política,<br />
rejeitando o legado ético-cristão. Além<br />
da desvinculação da religião, a ética política<br />
se distingue da moral privada, uma vez<br />
que a ação política deve ser julgada a partir<br />
das circunstâncias vi vidas, tendo em vista<br />
os resultados alcançados na busca do bem<br />
comum.<br />
Com isso, Maquiavel se distancia da<br />
política normativa dos gregos e medievais,<br />
pois não mais busca as normas que definem o<br />
bom regime, nem explicita quais devem ser as<br />
virtudes do bom governante. Em alguns casos,<br />
como o de Platão, a preocupação em definir<br />
como deve ser o bom governo leva à<br />
construção de utopias, o que mereceu a crítica<br />
de Maquiavel.<br />
Talvez alguém inadvertidamente se pergunte<br />
se o próprio Maquiavel não estaria 1\<br />
procura do príncipe ideal, indicando as normas<br />
para conquistar e não perder o poder. No<br />
entanto, há, de fato, diferenças fundamentais<br />
entre o "dever ser" da política clássica e aquele<br />
a que se refere Maquiavel.<br />
Na nova perspectiva, para fazer política<br />
é preciso compreender o sistema de forças<br />
existentes e calcular a alteração do equilíbrio<br />
provocada pela interferência de sua própria<br />
ação nesse sistema.<br />
Exercícios<br />
1. Em que sentido o pensamento de Maquiavel<br />
deve ser compreendido no contexto da formação<br />
das monarquias nacionais?<br />
2. Explique o trecho a seguir, usando os concei<br />
tos de virtú e fortuna: "Era necessário que Ciro<br />
encontrasse os persas descontentes do império dos<br />
rnedas e os rnedas muito eferninados e amolecidos<br />
por uma longa paz. Teseu não teria podido revelar<br />
suas virtudes se não ti vesse encontrado os ateuienses<br />
dispersos. Tais oportunidades, portanto, tornaram<br />
felizes a esses homens; e foram as suas virtudes que<br />
lhes deram o conhecimento daquelas oportunidades.<br />
Graças a isso. a sua pátria se honrou e se tornou<br />
feliz". (Maquiavel)<br />
3. Qual é a relação moral-política na concepção<br />
clássica?<br />
4. Como é analisada a ação política na nova<br />
relação moral-política proposta por Maquiavcl?<br />
5. Como explicar a aparente contradição entre<br />
as obras O principe e os Comentários?<br />
<strong>Texto</strong>s complementares<br />
I<br />
O príncipe<br />
1<br />
Segundo Claude Lefort, como "em definitivo,<br />
em nenhum lugar está traçada a via real<br />
da política", cabe ao homem de ação descobrir,<br />
na paciente exploração dos possíveis, os<br />
sinais da criação histórica e assim inscrever<br />
sua ação no tempo.<br />
6. Em que sentido não se pode dizer que<br />
Maquiavel era "rnaquiavélico"? Ao responder, explique<br />
quais são as inovações do pensamento maquiaveliano.<br />
7. Leia o fragmento I de O príncipe e explique<br />
a preocupação de Maquiavel com a formação<br />
do Estado moderno.<br />
8. Relacione os fragmentos '2 e 3, explicando<br />
qual é a crítica que Maquiavel faz a Savonarola.<br />
9. Leia os fragmentos 4 a 8 e explique como<br />
Maquiavel subverte a relação clássica entre ética e<br />
política.<br />
10. Ainda no fragmento 8, identifique as características<br />
inovadoras do pensamento rnaquiaveliano.<br />
11. Leia os fragmentos 9 a 11. extraídos dos<br />
Comentários, e explique o significado deles. Em<br />
seguida. justifique por que, comparando com o teor<br />
de O príncipe. não se trata de uma contradição da<br />
teoria política de Maquiuvel.<br />
Os príncipes prudentes repeliram sempre tais forças [as mercenárias e as auxiliares], para valer-se<br />
das suas próprias, preferindo antes perder com estas a vencer com auxílio das outras. considerando<br />
falsa a vitória conquistada com forças alheias. (...) Se se considerar o começo da decadência<br />
do Império Romano, achar-se-a que foi motivada somente por ter começado a ter a soldo mercenários<br />
godos.