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1 museu ibérico de arqueologia e arte de abrantes AT

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<strong>AT</strong><br />

1 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong>


<strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

antevisão i v


promotores<br />

câmara municipal<br />

<strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Presi<strong>de</strong>nte<br />

Maria do Céu Albuquerque<br />

fundação estrada<br />

Presi<strong>de</strong>nte<br />

João Lourenço Sigalho Estrada<br />

coor<strong>de</strong>nação geral do projeto<br />

Isilda Jana<br />

museologia e história da <strong>arte</strong><br />

Fernando António Baptista Pereira<br />

<strong>arqueologia</strong><br />

Luiz Oosterbeek<br />

(coor<strong>de</strong>nação)<br />

Davi<strong>de</strong> Delfino<br />

Gustavo Portocarrero<br />

Álvaro Batista<br />

Filomena Gaspar<br />

textos<br />

Álvaro Batista<br />

Fernando António Baptista Pereira<br />

Luiz Oosterbeek<br />

Davi<strong>de</strong> Delfino<br />

Gustavo Portocarrero<br />

Rui Oliveira Lopes<br />

Luís Jorge Gonçalves<br />

catálogo<br />

Paulo Passos<br />

Gabinete <strong>de</strong> Comunicação / CMA<br />

fotografia<br />

Fernando Sá Baio<br />

Gabinete <strong>de</strong> Comunicação / CMA<br />

montagem museográfica <strong>de</strong> peças<br />

José Manuel Frazão<br />

produção <strong>de</strong> lettering<br />

Gabinete <strong>de</strong> Comunicação / CMA<br />

impressão<br />

Tipografia Central do Entroncamento, Lda<br />

isbn<br />

978-972-9133-41-1<br />

<strong>de</strong>pósito legal<br />

311943/10<br />

2<br />

em pedra:<br />

lascar, polir,<br />

gravar,<br />

esculpir…<br />

3 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

antevisão i v


4<br />

pedras<br />

que falam<br />

A pedra é a matéria-prima mais antiga,<br />

mais abundante e mais perene.<br />

É, por isso, uma ótima testemunha<br />

das formas <strong>de</strong> vida das comunida<strong>de</strong>s<br />

humanas ao longo dos tempos.<br />

Por isso, esta exposição escolheu a pedra<br />

como tema, aqui apresentado através<br />

<strong>de</strong> uma seleção cuidada nas várias<br />

coleções que compõem o MIAA:<br />

<strong>arqueologia</strong> da coleção do Museu<br />

D. Lopo <strong>de</strong> Almeida, <strong>arte</strong> sacra e objetos<br />

diversos da Coleção Estrada, um relógio<br />

<strong>de</strong> sol <strong>de</strong> Ch<strong>arte</strong>rs <strong>de</strong> Almeida e pinturas<br />

<strong>de</strong> pedras e muros tão do gosto <strong>de</strong> Maria<br />

Lucília Moita.<br />

“EM PEDRA: lascar, polir, gravar,<br />

esculpir…” é já a iv Antevisão do Museu<br />

Ibérico <strong>de</strong> Arqueologia e Arte e mostra<br />

que o MIAA não é ainda um edifício<br />

com uma exposição permanente,<br />

mas é já um projeto em execução,<br />

através das quatro antevisões,<br />

<strong>de</strong> uma exposição antológica da obra<br />

<strong>de</strong> Ch<strong>arte</strong>rs <strong>de</strong> Almeida e <strong>de</strong> duas<br />

Jornadas Internacionais do MIAA<br />

com a publicação das respetivas Atas.<br />

5 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

O projeto da 1ª fase do Museu está<br />

concluído. Prevê a recuperação,<br />

a remo<strong>de</strong>lação e musealização<br />

do Convento <strong>de</strong> São Domingos.<br />

Desta forma se preserva o património<br />

edificado que constitui o próprio<br />

convento, <strong>de</strong>stinando-o a uma função<br />

nobre.<br />

Mas esta exposição não se fecha sobre<br />

ela própria ou sobre as peças que a<br />

compõem. Pelo contrário, é p<strong>arte</strong> inteira<br />

<strong>de</strong> um projeto em execução que não<br />

é local, mas, no mínimo, regional<br />

e aberto numa dimensão global.<br />

O MIAA – Museu Ibérico <strong>de</strong> Arqueologia<br />

e Arte é um investimento cultural<br />

que preten<strong>de</strong> ser um <strong>de</strong>safio <strong>de</strong> futuro,<br />

uma aposta <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento.<br />

Esta IV Antevisão permite-nos,<br />

mais uma vez, olhar para <strong>de</strong>ntro<br />

das coleções e, através <strong>de</strong>las,<br />

espreitar esse futuro em construção.<br />

Maria do Céu Albuquerque<br />

Presi<strong>de</strong>nte da Câmara Municipal<br />

<strong>de</strong> Abrantes<br />

“Um monte <strong>de</strong> pedras<br />

<strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser um monte<br />

<strong>de</strong> pedras no momento<br />

em que um único<br />

homem o contempla,<br />

nascendo <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>le<br />

a imagem <strong>de</strong> uma<br />

catedral.”<br />

Antoine <strong>de</strong> Saint-Exupéry


antevisão 4<br />

pedras para a estruturação<br />

do futuro do Médio Tejo<br />

A antevisão 4 do MIAA tem lugar num<br />

contexto, há muito percepcionável, <strong>de</strong><br />

crise sistémica, que obriga a repensar<br />

todas as esferas <strong>de</strong> intervenção e<br />

organização da socieda<strong>de</strong>. Vivemos ainda,<br />

em 2012, um ciclo <strong>de</strong> incerteza, marcado<br />

por uma instabilida<strong>de</strong> crescente. Uma<br />

leitura superficial e comum centra as<br />

atenções nos “mercados” mas…o que são<br />

esses mercados? Na verda<strong>de</strong>, são pessoas,<br />

em boa p<strong>arte</strong> especuladores mas não só,<br />

e no essencial pessoas.<br />

E porque se comportam <strong>de</strong>sta forma<br />

voraz e suicidária?<br />

A resposta não po<strong>de</strong> ser encontrada<br />

olhando apenas os mercados. Na verda<strong>de</strong>,<br />

vivemos mais um episódio <strong>de</strong> uma crise<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>sestruturação longa, larvar, que teve<br />

o seu início simbólico em 1970, quando<br />

os EUA, face à primeira crise petrolífera,<br />

terminaram com a parida<strong>de</strong> dólar/ouro.<br />

Nessa ocasião, começou o fim do sistema<br />

monetário internacional, concebido após<br />

a II Guerra Mundial em Bretton Woods.<br />

Sim, vale a pena olhar o passado, recente<br />

e remoto, para enten<strong>de</strong>r o presente, e um<br />

<strong>museu</strong> é antes <strong>de</strong> mais isso mesmo: um<br />

treino para apren<strong>de</strong>r a olhar o passado,<br />

para nos vermos no passado; um exercício<br />

<strong>de</strong> humilda<strong>de</strong>, na verda<strong>de</strong>.<br />

O sistema económico alicerçado no<br />

mercado mundial, na industrialização e na<br />

livre concorrência conheceu, nos últimos<br />

200 anos, várias crises cíclicas (explicadas<br />

pelos <strong>de</strong>sequilíbrios <strong>de</strong> oferta e procura<br />

e caracterizadas pela incapacida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

escoamento <strong>de</strong> exce<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> produção<br />

em <strong>de</strong>terminadas regiões), mas viveu,<br />

também, duas <strong>de</strong>pressões profundas:<br />

entre 1873 e 1896, que está na origem<br />

do gran<strong>de</strong> surto migratório da Europa<br />

para as Américas, bem como <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s<br />

conflitos militares e revoluções (<strong>de</strong> que<br />

Portugal experimentou a chamada “crise<br />

do mapa cor-<strong>de</strong>-rosa”); e entre 1914 e 1947<br />

(marcada pelas duas guerras mundiais).<br />

Estas <strong>de</strong>pressões, além da violência que<br />

as acompanhou, re<strong>de</strong>finiram fronteiras<br />

e o mapa geo-estratégico: na primeira,<br />

emergiram os EUA e o Japão como<br />

nações capazes <strong>de</strong> disputar a primazia<br />

às potências europeias; na segunda a<br />

Europa inverteu posição com os EUA,<br />

que passaram a ser a principal potência<br />

mundial num cenário <strong>de</strong> consolidação<br />

do bloco soviético.<br />

A questão que muitos se colocam é:<br />

a actual crise é uma crise cíclica, ou<br />

uma nova <strong>de</strong>pressão? Parece evi<strong>de</strong>nte<br />

que o que afecta o sistema global não<br />

é um problema <strong>de</strong> não escoamento <strong>de</strong><br />

produção, ou seja, um problema resolúvel<br />

pelo incremento nos investimentos e pela<br />

regulação dos sistemas <strong>de</strong> distribuição,<br />

mas algo mais profundo: quebra da<br />

natalida<strong>de</strong>, pressão insustentável das<br />

tecnologias sobre o ambiente, inovação<br />

tecnológica <strong>de</strong> menor consumo energético<br />

menos <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte da mão-<strong>de</strong>-obra e<br />

facilmente <strong>de</strong>slocalizável, importância<br />

crescente das matérias primas raras,<br />

migrações massivas, colapso <strong>de</strong> Estados,...<br />

Todos estes ingredientes se assemelham<br />

ao caldo <strong>de</strong> crise <strong>de</strong> 1873 ou <strong>de</strong> 1914,<br />

sobretudo na sua expressão mais imediata:<br />

o empobrecimento das classes médias em<br />

vastas regiões e a emergência <strong>de</strong> outras<br />

dinâmicas sociais.<br />

E o que tem tudo isto a ver com o MIAA<br />

e a sua antevisão 4?<br />

Nesta exposição falamos <strong>de</strong> pedra, e <strong>de</strong><br />

gestos sobre a pedra. Há <strong>de</strong> factos muitas<br />

formas <strong>de</strong> olhar esta exposição, e <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

logo a estética é fundamental: o equilíbrio<br />

e ritmo <strong>de</strong> algumas peças que agora se<br />

apresentam é assinalável, não apenas<br />

nas formas mas no modo como a pedra<br />

também se combina, por vezes, com o<br />

ouro. Neste percurso expositivo se po<strong>de</strong><br />

ver como o senso estético não evoluem<br />

apenas com o tempo, e estão presentes<br />

em todas as épocas: senão, como explicar<br />

a complexida<strong>de</strong> gestual necessária para<br />

produzir as pequenas pontas <strong>de</strong> seta<br />

neolíticas e calcolíticas?<br />

Mas há um olhar mais arqueológico, ou<br />

tecno-económico, que é também essencial<br />

neste <strong>museu</strong>, que se quer <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e<br />

<strong>arte</strong>, ou seja, <strong>de</strong> um duplo olhar.<br />

6<br />

A antevisão 4 do MIAA tem como foco a<br />

pedra e as sequências <strong>de</strong> gestos e técnicas<br />

que permitiram nela revelar formas não<br />

evi<strong>de</strong>ntes. Ao lascar, polir, gravar ou<br />

esculpir, os <strong>arte</strong>sãos/artistas da préhistória,<br />

da época romana ou da Europa<br />

cristã medieval, foram construindo uma<br />

relação elaborada entre um conhecimento<br />

profundo das matérias primas (calcários,<br />

basaltos, sílex, mármore,…), um apuro<br />

técnico na sua transformação, uma<br />

sensibilida<strong>de</strong> contextualizada às formas e<br />

uma visão particular sobre o mundo que<br />

por essa via representavam.<br />

A exposição permite diversos percursos,<br />

e o cronológico também é fundamental,<br />

pois na produção da <strong>arte</strong> da pedra o que<br />

vemos são concretizações possíveis <strong>de</strong><br />

arquétipos que marcaram <strong>de</strong>terminadas<br />

culturas. Por isso, reencontramos “as<br />

mesmas pedras”, às vezes “os mesmos<br />

gestos”, mas o olhar do artista que<br />

já morreu é sempre distinto, e ficou<br />

fossilizado nas formas concretas que<br />

observamos.<br />

A exposição é, por isso, também um<br />

convite a olhar os <strong>de</strong>talhes, por exemplo<br />

nas gemas romanas ou na escolha<br />

do alabastro que, no Egipto antigo,<br />

prolongava uma ancestral valorização<br />

dos materiais cristalinos, como a calcite<br />

e o quartzo (que se testemunha nos<br />

enterramentos megalíticos do baixo<br />

Zêzere, entre Tomar e Abrantes).<br />

A pedra das colecções do MIAA oferece<br />

também um motivo <strong>de</strong> reflexão sobre a<br />

relação do Museu com este território do<br />

Alto Ribatejo, on<strong>de</strong> são as estruturas e<br />

objectos em pedra que constituem mais<br />

<strong>de</strong> 85% <strong>de</strong> todo o património (como se<br />

po<strong>de</strong> ver no circuito turístico regional<br />

organizado pelo Museu <strong>de</strong> Arte Pré-<br />

Histórica <strong>de</strong> Mação, que recebeu ao nome<br />

Lithos).<br />

A antevisão é por isso um convite não<br />

apenas a ver, por <strong>de</strong>trás <strong>de</strong>stes objectos,<br />

as formações geológicas e os gestos que<br />

os originaram, mas também a, uma vez<br />

saindo do Castelo, olhar para os xistos<br />

7 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

e granitos que se vão <strong>de</strong>nunciando nas<br />

colinas, ou para os calcários que se<br />

enxergam mais para Oeste, e ver um<br />

conjunto <strong>de</strong> recursos que sempre foram a<br />

base do sustento das comunida<strong>de</strong>s e, por<br />

isso, também a base das suas <strong>arte</strong>s, do seu<br />

génio. Ontem…como hoje. E, por isso,<br />

um convite a re<strong>de</strong>scobrir o território, a sua<br />

diversida<strong>de</strong> e potencialida<strong>de</strong>s, tão bem<br />

conhecidas dos primeiros metalurgistas<br />

<strong>de</strong>sta região.<br />

Em tempos <strong>de</strong> crise, ver na antevisão 4<br />

a tecnologia, o conhecimento científico<br />

e a economia das socieda<strong>de</strong>s que nos<br />

prece<strong>de</strong>ram, é compreen<strong>de</strong>r como<br />

economia e cultura se não po<strong>de</strong>m separar,<br />

e que é um erro dizer que “a economia<br />

é condicional mas a cultura é que é<br />

essencial”, como já ouvimos a uns, ou que<br />

“a economia é fundamental e a cultura<br />

acessória”, como insistirão outros. A<br />

antevisão 4 é, ainda, o sublinhar <strong>de</strong> uma<br />

atitu<strong>de</strong> comportamental que se prolonga<br />

nas indústrias <strong>de</strong> hoje em Abrantes e no<br />

Médio Tejo, da economia do fazer das<br />

pedreiras às metalúrgicas à cultura do<br />

programar do Instituto Politécnico <strong>de</strong><br />

Tomar ou do Tecnopólo <strong>de</strong> Abrantes.<br />

A antevisão 4, ao revisitar culturas e<br />

civilizações que morreram, dos caçadores<br />

paleolíticos aos primeiros agricultores, da<br />

Suméria à época medieval ou do Egipto<br />

antigo ao Império Romano, é também<br />

um convite a lembrar que os momentos a<br />

complexida<strong>de</strong> tecnológica e a exuberância<br />

artística sempre andaram <strong>de</strong> mãos dadas<br />

com a economia, e que após a morte<br />

<strong>de</strong>ssas socieda<strong>de</strong>s, a pós o seu colapso<br />

económico, se forjaram outras i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s<br />

e culturas.<br />

O MIAA vai sendo, assim, a casa não<br />

apenas das memórias, mas também dos<br />

olhares sobre o futuro, ancorados no<br />

rigoroso conhecimento do território.<br />

Lisboa, 10 <strong>de</strong> Maio <strong>de</strong> 2012<br />

Luiz Oosterbeek<br />

Instituto Politécnico <strong>de</strong> Tomar<br />

Instituto Terra e Memória<br />

Em cada bloco<br />

<strong>de</strong> mármore vejo<br />

uma estátua; vejo-a tão<br />

claramente como se<br />

estivesse na minha frente,<br />

moldada e perfeita na pose<br />

e no efeito. Tenho apenas<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>sbastar as pare<strong>de</strong>s<br />

brutas que aprisionam<br />

a adorável aparição para<br />

revelá-la a outros olhos<br />

como os meus já a vêem.<br />

Michelangelo Buonarroti


8<br />

sinais da importância<br />

da pedra na evolução<br />

humana na região<br />

<strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Não é fácil falar da PEDRA, como<br />

produto da ação humana. Esta, <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

sempre, tem acompanhado o homem,<br />

<strong>de</strong>ntro do seu processo <strong>de</strong> aprendizagem<br />

e evolução.<br />

Esta realida<strong>de</strong> expressa-se em diversos<br />

formatos, em diversos contextos<br />

e numa evolução cronológica, ao longo<br />

dos milénios, até que é substituída,<br />

em p<strong>arte</strong>, pelo uso do metal.<br />

A PEDRA – <strong>de</strong> simples massa <strong>de</strong>fensiva<br />

ou <strong>de</strong> ataque, a pedra serviu também<br />

como percutor e <strong>de</strong>la o homem obteve<br />

simples lascas <strong>de</strong> gumes cortantes<br />

ou instrumentos mais aprimorados,<br />

o que implicou a assimilação <strong>de</strong> diversos<br />

gestos técnicos e conceitos mentais.<br />

Na pedra o homem expressou o seu<br />

pensamento mágico-religioso. Nela<br />

o homem pintou e gravou o que então<br />

lhe ia na alma.<br />

A pedra marcou territórios, <strong>de</strong>finiu<br />

recintos rituais e sob as pedras o homem<br />

<strong>de</strong>positou os seus mortos.<br />

Centramo-nos na região que hoje<br />

habitamos - o concelho <strong>de</strong> Abrantes.<br />

Este território em torno do Tejo foi<br />

uma região apetecível para a caça, pesca,<br />

favorável à agricultura e pastorícia, fatores<br />

<strong>de</strong> sobrevivência humana e por isso, por<br />

aqui passaram e se fixaram, ao longo<br />

<strong>de</strong> muitos milhares <strong>de</strong> anos, muitos<br />

grupos humanos que nos <strong>de</strong>ixaram<br />

as suas marcas.<br />

É um pouco <strong>de</strong>ssas marcas em PEDRA<br />

que trazemos a esta exposição.<br />

Do Paleolítico começamos por observar<br />

a ca<strong>de</strong>ia operatória 1: em que um simples<br />

seixo conduz a um biface (como aconteceu<br />

no Paleolítico Superior e Médio) e a<br />

ca<strong>de</strong>ia operatória 2: em que <strong>de</strong> um núcleo<br />

se obtém uma lasca simples ou retocada<br />

(como aconteceu a partir do Paleolítico<br />

Superior).<br />

9 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Também o Levalloisense e Mustierense<br />

ocorrem no território, notório pelos<br />

núcleos ditos “carapaça <strong>de</strong> tartaruga”<br />

sobre seixo <strong>de</strong> quartzito. Aqui o seixo<br />

passou a constituir o núcleo do qual<br />

se obtinham instrumentos.<br />

Há toda uma indústria macrolítica<br />

holocénica (que se prolonga até ao<br />

Calcolítico) que se <strong>de</strong>senvolve na zona,<br />

da qual nos chegam inúmeros<br />

testemunhos.<br />

Nos finais do 6º milénio a.C. surge,<br />

no Vale do Tejo, o Neolítico. Neste<br />

período, com o advento da agricultura<br />

chega o machado <strong>de</strong> pedra polida, a enxó,<br />

a mó plana, os pesos <strong>de</strong> re<strong>de</strong> e toda uma<br />

indústria laminar a par da macrolítica.<br />

A pedra assume então um novo estatuto<br />

com o surgir <strong>de</strong> todo um espaço ritual e<br />

sepulcral. Por volta <strong>de</strong> 4000 a.C. na zona<br />

norte do concelho erguem-se monólitos,<br />

ora simples, como o menir da Medroa ou<br />

talvez mesmo o cromeleque do Alqueidão<br />

(Martinchel). O espaço dos mortos,<br />

também em 4000 a. C, ganha contornos<br />

visíveis com enterramentos individuais em<br />

torno <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s afloramentos, como o da<br />

Anta 5 da Jogada (Al<strong>de</strong>ia do Mato) e, mais<br />

tar<strong>de</strong>, enterramentos coletivos como o<br />

aqui representado pelos instrumentos<br />

<strong>de</strong> Colos – S. Facundo.<br />

O instrumento <strong>de</strong> pedra, <strong>de</strong> carácter<br />

utilitário, passa também a simbólico.<br />

Torna-se oferta que acompanha o morto<br />

na sua morada final. São as lâminas, as<br />

pontas <strong>de</strong> seta, as pontas <strong>de</strong> lança,<br />

o punhal, as alabardas, os machados <strong>de</strong><br />

pedra polida e, por último, as placas ídolo,<br />

<strong>de</strong>coradas como expressão <strong>de</strong> <strong>arte</strong>, agora<br />

funerária.<br />

Bastão <strong>de</strong> comando<br />

Ida<strong>de</strong> do Bronze<br />

Anfibolite<br />

altura (19,5 cm), comprimento (6 cm)<br />

Baton of command<br />

Bronze Age<br />

Amphibolite<br />

length (19,5 cm), width (6 cm)


O trabalho da pedra em elementos<br />

móveis, assume agora uma nova faceta<br />

ritual ou simbólica. A expressão<br />

mágico-religiosa é também uma<br />

componente do quotidiano dos vivos.<br />

Os dois “ídolos” aqui presentes falam-nos<br />

<strong>de</strong>ssa realida<strong>de</strong>. O “ídolo fálico”, sinónimo<br />

<strong>de</strong> sexo masculino e fecundação, e o<br />

“ídolo oculado” <strong>de</strong> cariz feminino, talvez<br />

conotado com fertilida<strong>de</strong> ou imagem da<br />

Deusa-Mãe. Enquanto, que o primeiro<br />

nos remete para o mundo megalítico,<br />

cujo paralelo po<strong>de</strong>mos observar no<br />

Menir dos Sete – Monforte, o segundo<br />

parece apontar para a Andaluzia, mais<br />

propriamente para a Cultura <strong>de</strong> Los<br />

Millares, como área <strong>de</strong> origem e dispersão<br />

para Norte até ao Tejo. A <strong>arte</strong> gravada<br />

também presente é expressa por covinhas,<br />

círculos, antropomorfo, e representação<br />

solar.<br />

Com o advento da Ida<strong>de</strong> do Bronze<br />

assiste-se a uma mutação a nível do<br />

povoamento e surgem-nos povoados<br />

em locais baixos, em terrenos férteis<br />

<strong>de</strong> aluvião, próximos do Tejo. Aqui um<br />

exemplo marcante é o povoado<br />

da Pedreira, em Rio <strong>de</strong> Moinhos.<br />

O enterramento individual em urna<br />

sob mamoa <strong>de</strong> seixos, remete-nos para<br />

o enterramento individual em oposição<br />

ao coletivo do período anterior.<br />

Assiste-se a partir daqui a um crescente<br />

aumento da circulação <strong>de</strong> objetos <strong>de</strong><br />

bronze <strong>de</strong> feição Atlântica, sendo marcado<br />

ainda pelos “escon<strong>de</strong>rijos <strong>de</strong> fundidor”<br />

do Porto do Concelho (Mação) e o <strong>de</strong><br />

Barreiras do Tejo (Abrantes) <strong>de</strong>scoberto<br />

no interior <strong>de</strong> um vaso carenado. Mas a<br />

par <strong>de</strong>stes o uso da pedra assume outra<br />

faceta, agora usada para nela se verter<br />

o metal fundido e se obter o produto<br />

acabado. E aqui entra o mol<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> fundição da Pedreira.<br />

O machado <strong>de</strong> calaíte ver<strong>de</strong> oriundo<br />

do Castelo <strong>de</strong> Abrantes, remete-nos<br />

para um carácter ritual ou simbólico<br />

no mesmo período. Para igual uso nos<br />

remete, pela sua envergadura, o magnífico<br />

machado <strong>de</strong> pedra polida <strong>de</strong> secção<br />

circular.<br />

Da Ida<strong>de</strong> do Ferro expõe-se o bastão<br />

<strong>de</strong> mando, certamente também conotado<br />

com um símbolo <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r, na mesma<br />

linha do ídolo fálico.<br />

Com a chegada dos romanos atraídos<br />

pela riqueza mineira da Península Ibérica<br />

assistimos a um recru<strong>de</strong>scer da pedra<br />

como um material aplicado para os mais<br />

diversos usos. Um pouco por todo o<br />

concelho existem vestígios <strong>de</strong>ssa presença:<br />

duas estátuas, marcos miliários e colunas<br />

miliárias, diversas inscrições funerárias<br />

em Mouriscas e a ara anepígrafa da<br />

Pedreira, bases <strong>de</strong> colunas, pesos <strong>de</strong> lagar,<br />

mós manuárias. E um pouco por todo<br />

o território <strong>de</strong>scobriram-se estruturas<br />

<strong>de</strong> casas, lareiras, pavimentos <strong>de</strong> terra<br />

batida, <strong>de</strong> opus signinum e <strong>de</strong> tesselatum,<br />

tanques, esgotos. E já na agonia do<br />

império sepulcros tardo romano e<br />

visigóticos e estruturas habitacionais.<br />

Com a fundação da nacionalida<strong>de</strong><br />

portuguesa no solo urbano jazem<br />

sepulcros escavados na rocha, estelas<br />

funerárias, silos, elementos arquitetónicos<br />

e um sem número <strong>de</strong> <strong>de</strong>tritos acumulados<br />

ao longo <strong>de</strong> milénios <strong>de</strong> ampla ativida<strong>de</strong><br />

humana. Mas também ainda se erguem<br />

edifícios e túmulos em cuja pedra se<br />

vislumbram a marca do cinzel ou as<br />

marcas dos canteiros <strong>de</strong> outrora e que<br />

resultaram em trabalhos belíssimos como<br />

o pórtico renascentista, datado <strong>de</strong> 1548,<br />

da Igreja da Stª Casa da Misericórdia ou<br />

os túmulos góticos da família dos<br />

Almeidas, con<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Abrantes que jazem<br />

na Igreja <strong>de</strong> Stª Maria do Castelo, local<br />

<strong>de</strong>sta exposição.<br />

Esta é uma p<strong>arte</strong> da nossa herança<br />

cultural, são ecos do passado que vos<br />

convidamos a ver nesta Antevisão IV.<br />

Esta é uma p<strong>arte</strong> do acervo do Museu<br />

D. Lopo <strong>de</strong> Almeida que irá integrar<br />

o MIAA.<br />

E assim continuará a simbiose entre<br />

o homem e a PEDRA num retorno sem<br />

fim. No início talhava-a. Agora expõe<br />

o fruto <strong>de</strong>sse trabalho.<br />

Álvaro Batista<br />

Bibliografia<br />

Batista Á. (2004)<br />

Carta Arqueológica do Concelho Constância,<br />

Associação ESCORA. Constância,<br />

p. 165, nota 26<br />

Calado M. (2011)<br />

Placas <strong>de</strong> xisto a <strong>arte</strong> rupestre: a propósito<br />

da colecção estrada, in Actas das I Jornadas<br />

Internacionais do MIAA, Museu Ibérico <strong>de</strong><br />

Arqueologia e Arte <strong>de</strong> Abrantes, CMA, p. 76<br />

Félix P. (2006)<br />

O final da Ida<strong>de</strong> do Bronze e os inícios da<br />

Ida<strong>de</strong> do Ferro no Ribatejo Norte (Centro<br />

<strong>de</strong> Portugal): uma breve síntese dos dados<br />

arqueográficos. Conimbriga, Coimbra, pp.<br />

45-65<br />

Oliveira J. (s/d)<br />

A <strong>arte</strong> rupestre no contexto megalítico<br />

Norte-Alentejano<br />

10 11 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Machado<br />

Ida<strong>de</strong> do Ferro<br />

Calaíte<br />

altura (3 cm), comprimento (11 cm)<br />

Proveniência – Castelo <strong>de</strong> Abrantes<br />

Axe<br />

Iron Age<br />

Calaite<br />

length (3 cm), width (11 cm)<br />

Provenance - Castle of Abrantes


12<br />

13 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Pesos <strong>de</strong> re<strong>de</strong><br />

Ida<strong>de</strong> do Ferro<br />

Quartzito e xisto<br />

comprimento (7,3 cm), largura (5,4)<br />

Proveniência – Zambujal<br />

Fishing net weights<br />

Iron Age<br />

Quartzite and schist<br />

length (7,3 cm), width (5,4 cm)<br />

Provenance – Abrantes


3 Alabardas<br />

Calcolítico<br />

Sílex<br />

máximo: comprimento (15,4 cm), largura<br />

(14 cm)<br />

Proveniência – S. Facundo<br />

3 Halberds<br />

Chalcolithic<br />

Silex<br />

Maximum: length (15,4 cm), width (14 cm)<br />

Provenance – S. Facundo<br />

14<br />

15 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong>


Punhais<br />

Calcolítico<br />

Sílex<br />

máximo: comprimento (10,8 cm), largura<br />

(3,2 cm)<br />

Proveniência – S. Facundo<br />

Poignards<br />

Chalcolithic<br />

Silex<br />

maximum: length (10,8 cm), width (3,2 cm)<br />

Provenance – S. Facundo<br />

16<br />

Pontas <strong>de</strong> seta<br />

Neolítico ou Calcolítico<br />

Sílex<br />

máximo: comprimento (3,5 cm), largura<br />

(2 cm)<br />

Proveniência – S. Facundo<br />

Points of arrow<br />

Neolithic or Chalcolithic<br />

Silex<br />

maximum: length (3,5 cm), width (2 cm)<br />

Provenance – S. Facundo<br />

17 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong>


18<br />

19 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Lâminas<br />

Neolítico<br />

Sílex<br />

máximo: comprimento (19,5 cm), largura<br />

(2,2 cm)<br />

Proveniência – S. Facundo<br />

Bla<strong>de</strong>s<br />

Neolithic<br />

Silex<br />

Maximum: length (19,5 cm), width (2,2 cm)<br />

Provenance – S. Facundo


20<br />

21 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Machado<br />

Neolítico<br />

Anfibolite<br />

comprimento (35 cm), largura (8,2 cm)<br />

Proveniência – Castelo <strong>de</strong> Abrantes<br />

Axe<br />

Neolithic<br />

Amphibolite<br />

length (35 cm), width (8,2 cm)<br />

Provenance – Castle of Abrantes


Ídolo oculado<br />

Calcolítico<br />

Quartzito<br />

comprimento (6 cm), largura (2 cm)<br />

Proveniência – Alvega<br />

Idol with eyes<br />

Chalcolithic<br />

Quartzite<br />

length (6 cm), width (2 cm)<br />

Provenance – Alvega<br />

22<br />

Ídolo fálico<br />

Neolítico ou Calcolítico<br />

Quartzito<br />

comprimento (11,7 cm), largura (10,3 cm)<br />

Proveniência – Pego<br />

Phallic idol<br />

Neolithic or Chalcolithic<br />

Quartzite<br />

length (11,7 cm), width (10,3 cm)<br />

Provenance - Pego<br />

23 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong>


24<br />

25 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Mó<br />

Neolítico<br />

Sílex<br />

comprimento (45 cm), largura (29 cm)<br />

Proveniência – Abrantes<br />

Grindstone<br />

Neolithic<br />

Silex<br />

length (45 cm), width (29 cm)<br />

Provenance – Abrantes


Placa com grafitos<br />

Neolítico<br />

Xisto<br />

comprimento (14 cm), largura (12,5 cm)<br />

Proveniência – Povoado <strong>de</strong> Fontes<br />

Plaque with graffiti<br />

Neolithic<br />

Schist<br />

length (14 cm), width (12,5 cm)<br />

Provenance – Povoado das Fontes


Placa <strong>de</strong> xisto<br />

Neolítico<br />

Xisto<br />

comprimento (17,6 cm), largura (12 cm)<br />

Proveniência – S. Facundo<br />

Schist plaque<br />

Neolithic<br />

Schist<br />

length (17,6 cm), width (12 cm)<br />

Provenance – S. Facundo<br />

28<br />

29 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Placa <strong>de</strong> xisto<br />

Neolítico<br />

Xisto<br />

comprimento (15,4 cm), largura (9,1 cm)<br />

Proveniência – S. Facundo<br />

Schist plaque<br />

Neolithic<br />

Schist<br />

length (15,4 cm), width (9,1 cm)<br />

Provenance – S. Facundo


Machado<br />

Calcolítico<br />

Anfibolite<br />

comprimento (11 cm), largura (5,5 cm)<br />

Proveniência – S. Facundo<br />

Axe<br />

Chalcolithic<br />

Amphibolite<br />

length (11 cm), width (5,5 cm)<br />

Provenance – S. Facundo<br />

Enxó<br />

Calcolítico<br />

Anfibolite<br />

comprimento (8,3 cm), largura (8 cm)<br />

Proveniência – S. Facundo<br />

Adz<br />

Chalcolithic<br />

Amphibolite<br />

length (14 cm), width (12,5 cm)<br />

Provenance – S. Facundo<br />

30<br />

31 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Ca<strong>de</strong>ia operatória<br />

no Paleolitico Inferior<br />

Operational chain<br />

in the Lower Paleolithic


32<br />

Ca<strong>de</strong>ia operatória<br />

no Paleolítico Superior<br />

Operational chain<br />

in the Upper Paleolithic<br />

33 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong>


mais <strong>de</strong> 40.000 anos<br />

<strong>de</strong> evolução dos gestos<br />

na pedra em 3 continentes<br />

na colecção estrada<br />

Os instrumentos <strong>de</strong> pedra são dos mais<br />

importantes para a evolução do saber<br />

fazer humano. Testemunhos da unida<strong>de</strong><br />

do homem em saber transformar a forma<br />

da matéria-prima em objectos que lhe<br />

permitam não só sobreviver, mas<br />

também melhorar a própria vida,<br />

adaptar- se ao meio ambiente,<br />

e, finalmente, em manifestar a sua<br />

capacida<strong>de</strong> intelectual única entre<br />

os seres vivos, <strong>de</strong> manter e melhorar<br />

as aquisições técnicas, transmitindo<br />

<strong>de</strong> geração em geração os resultados<br />

<strong>de</strong> necessida<strong>de</strong>s, experimentações<br />

e soluções.<br />

O homem põe os alicerces<br />

das indústrias e das culturas:<br />

o Paleolítico<br />

Des<strong>de</strong> os períodos mais antigos<br />

da Pré-História, o homem conseguiu<br />

afinar a técnica <strong>de</strong> produção da indústria<br />

lítica, partindo <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o simples gesto<br />

<strong>de</strong> “esculpir” o instrumento que precisava<br />

directamente nos seixos criando bifaces<br />

(CE3581) no Paleolítico Inferior<br />

(2,5 milhões a 200.000 anos atrás):<br />

isso diferenciou o género homo dos<br />

outros seres do reino animal, dado não<br />

só ter a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> usar o que a<br />

natureza lhe oferece, como conseguem<br />

fazer alguns animais, mas também <strong>de</strong><br />

adaptar a matéria-prima às suas<br />

necessida<strong>de</strong>s.<br />

Com a invenção da técnica levallois,<br />

no Paleolítico Médio (200.000 a 30.000<br />

anos atrás), o homem conseguiu criar<br />

instrumentos mais finos e em maior<br />

quantida<strong>de</strong>, aproveitando as lascas tiradas<br />

dos seixos, e não apenas esculpindo<br />

a pedra, e retocando-as até formar<br />

pontas, lâminas, raspadores e outros<br />

instrumentos. Assim, enquanto no<br />

Paleolítico Inferior era possível, partindo<br />

<strong>de</strong> um seixo, obter uma ferramenta, com<br />

a técnica levallois foi possível obter mais<br />

ferramentas explorando um único seixo.<br />

Um outro exemplo <strong>de</strong> superiorida<strong>de</strong> da<br />

técnica levallois, são as pontas finas<br />

e com morfologias que permitiam mais<br />

eficácia que se consegui produzir, como<br />

a CE02860 que mostra uma particular<br />

indústria lítica do norte da África<br />

oci<strong>de</strong>ntal, a Ateriense. A técnica levalllois<br />

revolucionou o modo <strong>de</strong> fazer a indústria<br />

lítica, até se afinar no <strong>de</strong>curso do<br />

Paleolítico Superior (35.000-9.000 anos<br />

atrás) com gestos cada vez mais técnicos<br />

e ricos <strong>de</strong> sabedoria, que conseguiram<br />

produzir instrumentos bastante finos<br />

e eficazes, como as pontas solutrenses<br />

(CE01305, CE01306), cujo nome vem<br />

da Cultura Solutrense que as produziu.<br />

Nascem as culturas se<strong>de</strong>ntárias<br />

e novas técnicas da pedra:<br />

o Neolítico e o Calcolítico<br />

Duas novas revoluções técnicas surgiram<br />

com o Neolítico, cerca <strong>de</strong> 8.000-7.000<br />

anos a.C.: a indústria laminar e a pedra<br />

polida. A indústria lítica laminar surgiu<br />

quando se passou a produzir lâminas<br />

a partir <strong>de</strong> um núcleo, o que permitiu<br />

a produção <strong>de</strong> instrumentos ainda<br />

mais finos e em maior quantida<strong>de</strong>.<br />

Os melhores materiais para esta nova<br />

técnica eram o sílex, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> ser<br />

aquecido para ter melhores proprieda<strong>de</strong>s,<br />

e a obsidiana. Os utensílios produzidos<br />

são também testemunhos das activida<strong>de</strong>s<br />

económicas <strong>de</strong>senvolvidas.<br />

34<br />

Em primeiro lugar, a caça, <strong>de</strong> velha<br />

tradição paleolítica, on<strong>de</strong> eram cada vez<br />

mais empregues pontas para as setas,<br />

melhoradas ao longo do tempo,<br />

quer para penetrar no corpo dos animais,<br />

quer para se fixar melhor à haste<br />

da flecha (CE03568). Em alguns casos,<br />

as mesmas armas usadas para a caça,<br />

po<strong>de</strong>riam converter-se para uso bélico;<br />

tal é visível em particular nas pontas<br />

que dificultariam a extracção da flecha<br />

(CE02858, CE02859, CE02862) e cujo<br />

uso se acentuaria, com exemplares<br />

<strong>de</strong> menores dimensões, quando entre<br />

o Neolítico Final e o Calcolítico<br />

(entre o 4.000 e 2.000 anos a.C.)<br />

surgem cada vez mais instrumentos<br />

especificamente feitos para a guerra<br />

(CE03566), juntamente com os primeiros<br />

guerreiros profissionais da Cultura<br />

do Vaso Campaniforme. Outra activida<strong>de</strong><br />

que se iniciou no Neolítico era<br />

a agricultura, sobretudo no cultivo<br />

dos cereais, introduzidos na Europa<br />

a partir dos planaltos do Curdistão,<br />

e on<strong>de</strong> era necessário usar foices para<br />

cortar as plantas, nomeadamente o trigo,<br />

e recolher as espigas. Estas primeiras<br />

foices produzidas pelo homem tinham<br />

uma lâmina para cortar composta<br />

por variadas lascas <strong>de</strong> sílex triangulares,<br />

afiadas (CE03565) e encaixadas juntas no<br />

corpo da foice, feito <strong>de</strong> corno ou ma<strong>de</strong>ira.<br />

É nesta altura que surge a pedra polida,<br />

uma inovação que resultou do polimento<br />

<strong>de</strong> rochas duras com pedras abrasivas:<br />

as proprieda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> resistência mecânica<br />

das pedras que davam para ser lascadas,<br />

como o sílex, o quartzito e a obsidiana,<br />

não prestavam para cortar as árvores<br />

durante a abertura <strong>de</strong> áreas para a<br />

agricultura, mas também para outros<br />

trabalhos como a laboração da ma<strong>de</strong>ira<br />

e a mineração com vista obtenção <strong>de</strong><br />

materiais estratégicos como o sílex e,<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o Calcolítico, o cobre. Portanto,<br />

o homem precisou <strong>de</strong> trabalhar pedras<br />

com maiores proprieda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> resistência<br />

aos golpes, para construir novas<br />

ferramentas como machados e enxós.<br />

35 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

O gesto <strong>de</strong> polir pedras duras po<strong>de</strong> ser<br />

pensado como um dos mais <strong>de</strong>morados<br />

e cansativos da Pré-História: era normal<br />

a produção <strong>de</strong> um machado <strong>de</strong>morar<br />

horas, senão dias, durante os quais<br />

o continuado trabalho <strong>de</strong> esfregar a pedra<br />

dura sobre uma abrasiva (CE03580),<br />

molhada com água, po<strong>de</strong>ria causar<br />

vários calos nas mãos do trabalhador.<br />

Por isso a pedra era normalmente polida<br />

completamente só on<strong>de</strong> interessava ela<br />

ter um corte, ou seja no gume, como<br />

é possível ver nas peças CE03583,<br />

CE03586, CE03867 que provavelmente<br />

são machados para cortar árvores, tendo<br />

o gume relativamente estreito, adaptado<br />

para concentrar num só ponto toda<br />

a força do golpe, dado em sentido quase<br />

perpendicular à árvore. O cabo, em<br />

ma<strong>de</strong>ira, era unido ao talão do machado<br />

com fibras vegetais. Nos machados<br />

produzidos para uma qualquer função<br />

ritual po<strong>de</strong> observar-se um polimento<br />

mais completo, como na peça CE03578,<br />

sendo privilegiada mais a estética e a<br />

mostra da habilida<strong>de</strong> (e do empenho)<br />

do polidor. Machados feitos mais para<br />

tirar a casca dos postes ou os ramos das<br />

árvores, tinham o gume mais expandido<br />

(CE03587 e CE03588) para permitir uma<br />

maior superfície no corte dado em<br />

sentido quase paralelo à superfície<br />

a trabalhar. Finalmente, no final<br />

do Neolítico/início do Calcolítico<br />

(iv-iii milénio a.C.), apareceu um novo<br />

sistema <strong>de</strong> ligação entre o cabo e o talão,<br />

com este inserido directamente no corpo<br />

daquele. Para tal, passaram a ser<br />

produzidos machados com secção<br />

quadrangular, com lados bastante largos<br />

(CE03890), para permitir fazer a meio<br />

do corpo do machado um buraco on<strong>de</strong><br />

se pu<strong>de</strong>sse inserir o cabo (CE03547,<br />

CE03571).


Típico do Neolítico Final-Calcolítico<br />

do Sudoeste da Península Ibérica,<br />

é o uso do xisto para produzir objectos<br />

rituais, as chamadas “placas <strong>de</strong> xisto”,<br />

que faziam p<strong>arte</strong> do a<strong>de</strong>reço funerário<br />

das sepulturas em antas, e,<br />

sucessivamente, em tholoi,<br />

caracterizando uma forma <strong>de</strong> <strong>arte</strong> <strong>de</strong><br />

gravar figuras geométricas numa pedra<br />

mole, nomeadamente triângulos<br />

enchidos <strong>de</strong> linhas, até dar às placas<br />

um aspecto <strong>de</strong> figura humana. As placas<br />

<strong>de</strong> xisto eram obtidas aproveitando<br />

a facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sta pedra <strong>de</strong> ser cortada<br />

em placas relativamente finas, para<br />

<strong>de</strong>pois serem polidas até criar uma<br />

superfície lisa on<strong>de</strong> gravar, com pontas<br />

<strong>de</strong> pedra dura como o quartzo, os<br />

padrões <strong>de</strong>corativos. O uso <strong>de</strong>stes<br />

objectos não é claro, po<strong>de</strong>ndo representar<br />

o <strong>de</strong>funto, um <strong>de</strong>us/<strong>de</strong>usa do além,<br />

ou algo mais. A peça CE02115 é uma peça<br />

única, sendo <strong>de</strong> dimensões pouco<br />

comuns entre as placas <strong>de</strong> xisto e<br />

<strong>de</strong>notando uma excelente qualida<strong>de</strong><br />

técnica na realização das gravuras.<br />

O “ouro preto” da indústria<br />

lítica: a obsidiana<br />

Para terminar, regressa-se à pedra<br />

lascada, com as ferramentas <strong>de</strong> obsidiana,<br />

sendo que a sua circulação e produção<br />

datam a partir do vii milénio a.C. tendo<br />

permanecido até meados do II milénio<br />

d.C. nas culturas da Meso-América.<br />

É um vidro vulcânico formado durante<br />

as erupções, que não precisa <strong>de</strong> ser<br />

aperfeiçoado com tratamento térmico,<br />

como acontecia com o sílex, tendo assim<br />

condições mais que óptimas para ser<br />

trabalhado no seu estado natural.<br />

Por isso, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a Pré-História, foi um<br />

material muito procurado e precioso,<br />

sendo possível realizar com a obsidiana<br />

ferramentas <strong>de</strong> corte muito eficazes.<br />

Também era procurada por <strong>arte</strong>sãos<br />

hábeis no trabalho da pedra, dado a<br />

obsidiana ser um material que exige<br />

muita técnica e muita precisão, mas<br />

não <strong>de</strong>masiada força, para ser bem<br />

trabalhada: ou seja, poucos golpes,<br />

mas bem dados. Objectos neste material,<br />

que se afinado corta como um vidro,<br />

nomeadamente lâminas, pontas e facas,<br />

são conhecidos em diferentes áreas do<br />

mundo, praticamente em todos os<br />

continentes com a excepção da Austrália.<br />

A peça CE02048 é uma ponta <strong>de</strong> lança<br />

do período Asteca, dado que quer as<br />

pontas em obsidiana do neolítico<br />

europeu, quer as da Meso-América<br />

pré-Asteca, têm forma ten<strong>de</strong>ncialmente<br />

amigdaloi<strong>de</strong>. Entre o uso da obsidiana<br />

que se fez nas culturas pré-colombianas<br />

da Meso-América, havia a produção <strong>de</strong><br />

armas, como é o caso da peça exposta,<br />

bem como <strong>de</strong> punhais usados para extrair<br />

o coração das vítimas nos sacrifícios<br />

humanos.<br />

Davi<strong>de</strong> Delfino<br />

Inv. CE01040<br />

Bíface<br />

Paleolítico (600.000-200.000 a.C.)<br />

Rocha silicosa<br />

altura (13 cm), comprimento (7,4 cm),<br />

largura (3,4 cm)<br />

Biface<br />

Paleolithic (600.000-200.000 B.C.)<br />

Siliceous stone<br />

height (13 cm), length (7,4 cm),<br />

width (3,4 cm)<br />

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Inv. CE02860<br />

Ponta <strong>de</strong> flecha<br />

África do Noroeste,<br />

Paleolítico (40.000-35.000 a.C.)<br />

Silex<br />

altura (3 cm), comprimento (5,1 cm),<br />

largura (0,8 cm)<br />

Arrowhead<br />

North-western Africa, Paleolithic<br />

(40.000-35.000 BC)<br />

Flint<br />

height (3cm), length (5,1 cm), width<br />

(0,8 cm)<br />

38<br />

39 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Inv. CE01305<br />

Ponta solutrense<br />

França e Península Ibérica ,<br />

Paleolítico (22.000-18.000 a.C.)<br />

Rocha silicosa<br />

altura (6,1 cm), comprimento (1,6 cm),<br />

largura (0,4 cm)<br />

Solutrean point<br />

France and Iberian Peninsula,<br />

Paleolithic (22.000-18.000 BC)<br />

Siliceous stone<br />

height (6,1 cm), length (1,6 cm),<br />

width (0,4 cm)<br />

Inv. CE01306<br />

Ponta solutrense<br />

França e Península Ibérica,<br />

Paleolítico (22.000-18.000 a.C.)<br />

Rocha silicosa<br />

altura (5,6 cm), comprimento (1,6 cm),<br />

largura (0,4 cm)<br />

Solutrean point<br />

France and Iberian Peninsula,<br />

Paleolithic (22.000-18.000 BC)<br />

Siliceous stone<br />

height (5,6 cm), length (1,6 cm),<br />

width (0,4 cm)


Inv. CE03565<br />

Conjunto <strong>de</strong> 6 <strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> foice<br />

Neolítico/Calcolítico Europeu<br />

(VI-IV milénio a.C.)<br />

Sílex<br />

média: altura (1,4 cm),<br />

comprimento (1,6 cm), largura (0,3 cm)<br />

Set of 6 teeth of sickle<br />

Neolithic/Chalcolithic Europe<br />

(VI-IV millennium BC)<br />

Flint<br />

Average: height (1,4 cm), length (1,6 cm),<br />

width (0,3 cm)<br />

Inv. CE03568<br />

Conjunto <strong>de</strong> 9 pontas triangulares<br />

Neolítico Europeu (VI-V milénio a.C.)<br />

Sílex<br />

média: altura (2 cm),<br />

comprimento (1,3 cm), largura (0,4 cm)<br />

Set of 9 triangular points<br />

European Neolithic<br />

(VI-V millennium BC)<br />

Flint<br />

Average: height (2 cm), length (1,3 cm),<br />

width (0,4 cm)<br />

40<br />

41 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong>


Inv. CE02858<br />

Ponta <strong>de</strong> flecha triangular<br />

Neolítico Pré-cerâmico,<br />

Mediterrâneo Oriental (VII milénio a.C.)<br />

Sílex<br />

altura (2,1 cm); comprimento (6 cm);<br />

largura (0,5 cm)<br />

Triangular arrowhead<br />

Pre-ceramic Neolithic,<br />

Eastern Mediterranean<br />

(VII millennium B.C.)<br />

Flint<br />

height (2,1 cm), length (6 cm),<br />

width (0,5 cm)<br />

Inv. CE02859<br />

Ponta <strong>de</strong> flecha triangular<br />

Neolítico (V-IV milénio a.C.)<br />

Sílex<br />

altura (1,7 cm), comprimento (6,5 cm),<br />

largura (0,6 cm)<br />

Triangular arrowhead<br />

Neolithic (V-IV millennium B.C.)<br />

Flint<br />

Dimensions: height (1,7 cm),<br />

length (6,5 cm), width (0,6 cm)<br />

Inv. CE02862<br />

Ponta <strong>de</strong> flecha triangular<br />

Neolítico (V-IV milénio a.C.)<br />

Sílex<br />

altura (3,3 cm), comprimento (7,8cm),<br />

largura (0,8 cm)<br />

Triangular arrowhead<br />

Neolithic (V-IV millennium B.C.)<br />

Flint<br />

height (3,3 cm), length (7,8 cm),<br />

width (0,8 cm)<br />

42<br />

43 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Inv. CE03566<br />

Conjuntos <strong>de</strong> pontas <strong>de</strong> flecha<br />

triangulares e romboi<strong>de</strong>s<br />

Neolítico (VII milénio a.C.)<br />

Sílex<br />

altura (2,1 cm), comprimento (6 cm),<br />

largura (0,5 cm)<br />

Set of triangular and rhomboidal<br />

arrowheads<br />

Neolithic (VII millennium B.C.)<br />

Flint<br />

height (2,1 cm), length (6 cm),<br />

width (0,5 cm)


Inv. CE03586<br />

Machado<br />

Neolítico/Calcolítico Europeu<br />

(V-IV milénio a.C.)<br />

Serpentina<br />

altura (4,9 cm),<br />

comprimento (12,2 cm),<br />

largura (3,6 cm)<br />

Axe<br />

Neolithic/Chalcolithic Europe<br />

(V-IV millennium B.C.)<br />

Serpentine<br />

height (4,9 cm),<br />

length (12,2 cm),<br />

width (3,6 cm)<br />

Inv. CE03583<br />

Machado<br />

Calcolítico Europeu<br />

(IV milénio a.C.)<br />

Anfibolito<br />

altura (3,9 cm), comprimento (8,8cm),<br />

largura (3, 1cm)<br />

Axe<br />

Chalcolithic Europe<br />

(IV millennium B.C.)<br />

Amphibolite<br />

height (3,9 cm), length (8,8 cm),<br />

width (3,1 cm)<br />

Inv. CE03580<br />

Polidor<br />

Neolitico/Calcolítico Europeu<br />

(V-IV milénio a.C.)<br />

Rocha carbonática<br />

altura (5,3cm), comprimento (12,9cm),<br />

largura (3cm)<br />

Polisher<br />

Neolithic/Chalcolithic Europe<br />

(V-IV millennium B.C.)<br />

Carbonatic rock<br />

height (5,3 cm), length (12,9 cm),<br />

width (3 cm)<br />

Inv. CE03867<br />

Machado<br />

Neolitico/Calcolítico Europeu<br />

(V-IV milénio a.C.)<br />

Granito<br />

altura (4,5 cm), comprimento (11,8 cm),<br />

largura (3,7 cm)<br />

Axe<br />

Neolithic/Chalcolithic Europe (V-IV<br />

millennium B.C.)<br />

Granite<br />

height (4,5 cm), length (11,8 cm),<br />

width (3,7 cm)<br />

44<br />

Inv. CE03578<br />

Machado<br />

Neolítico/Calcolítico Europeu<br />

(V-IV milénio a.C.)<br />

Serpentina<br />

altura (4,7 cm), comprimento (11,5 cm),<br />

largura (5,9 cm)<br />

Axe<br />

Neolithic/Chalcolithic Europe<br />

(V-IV millennium BC)<br />

Serpentine<br />

height (4,7 cm), length (11,5 cm),<br />

width (5,9 cm)<br />

Inv. CE03588<br />

Machado<br />

Neolitico/Calcolítico Europeu<br />

(V-IV milénio a.C.)<br />

Anfibolito<br />

altura (6,9 cm), comprimento (10,8 cm),<br />

largura (4,1cm)<br />

Axe<br />

Neolithic/Chalcolithic Europe<br />

(V-IV millennium B.C.)<br />

Amphibolite<br />

height (6,9 cm), length (10,8 cm),<br />

width (4,1 cm)<br />

45 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Inv. CE03587<br />

Machado<br />

Neolítico/Calcolítico Europeu<br />

(V-IV milénio a.C.)<br />

Anfibolíto<br />

altura (4,7 cm), comprimento (7,8 cm),<br />

largura (4,3 cm)<br />

Axe<br />

Neolithic/Chalcolithic Europe<br />

(V-IV millennium BC)<br />

Amphibolite<br />

height (7,8 cm), length (4,7 cm),<br />

width (4,3 cm)<br />

Inv. CE03890<br />

Machado<br />

Neolitico/Calcolítico Europeu<br />

(V-IV milénio a.C.)<br />

Anfibolito<br />

altura (4,7 cm), comprimento (11,4 cm),<br />

largura (4,2cm)<br />

Axe<br />

Neolithic/Chalcolithic Europe<br />

(V-IV millennium B.C.)<br />

Amphibolite<br />

height (4,7 cm), length (11,4 cm),<br />

width (4,2 cm)


Inv. CE03571<br />

Machado<br />

Neolítico da Europa Mediterrânea<br />

e Balcânica (V-IV milénio a.C.)<br />

Diorito<br />

altura (4,7 cm), comprimento (11,5 cm),<br />

largura (5,9 cm)<br />

Axe<br />

Mediterranean and Balkanic<br />

Neolithic Europe (V-IV millennium BC)<br />

Diorite<br />

Height (4,7 cm), length (11,5 cm),<br />

width (5,9 cm)<br />

46<br />

Inv. CE03547<br />

Machado<br />

Europa Mediterrânica e Oriental<br />

(meados do IV milénio a.C.)<br />

Anfibolito<br />

altura (10,2cm), comprimento (5,4cm),<br />

largura (4,2cm)<br />

Axe<br />

Mediterranean and Eastern Europe<br />

(middle of IV millennium BC)<br />

Amphibolite<br />

height (10,2 cm), length (5,4 cm),<br />

width (4,2 cm)<br />

47 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong>


48<br />

49 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Inv. CE02115<br />

Placa <strong>de</strong> Xisto<br />

Península Ibérica (IV-III milénio a.C.)<br />

Xisto<br />

altura (36,5cm), comprimento (11,5 cm),<br />

largura (0,5 cm)<br />

Schist plaque<br />

Iberian Peninsula (IV-II millennium BC)<br />

Schist<br />

height (36,5 cm), length (11,5 cm),<br />

width (0,5 cm)


50<br />

51 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Inv. CE02048<br />

Ponta <strong>de</strong> lança<br />

Cultura Asteca (XIII-XV d.C.)<br />

Obsidiana<br />

altura (3,3cm), comprimento (16,8 cm),<br />

largura (0,8 cm)<br />

Spearhead<br />

Aztec culture (XIII-XV A.D.)<br />

Obsidian<br />

height (3,3 cm), Length (16,8 cm),<br />

width (0,8 cm)


esculpir e polir a pedra<br />

no mediterrâneo<br />

e próximo oriente antigos<br />

cânones, simbolismo e técnicas<br />

As <strong>arte</strong>s ancestrais:<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> a Pré-história<br />

até às civilizações urbanas<br />

O corpo humano, juntamente com<br />

as figuras zoomorfas, é um dos primeiros<br />

protagonistas da <strong>arte</strong> móvel: já <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

o Paleolítico Superior aparecem objectos<br />

cultuais que representam figuras femininas,<br />

esculpidas em diferentes materiais: osso,<br />

marfim, pedra. Estas esculturas foram<br />

<strong>de</strong>nominadas “Vénus” sendo que a primeira<br />

que foi <strong>de</strong>scoberta, em 1864 no abrigo<br />

<strong>de</strong> Laugerie-Basse na França, era tão<br />

naturalística que lembrou as estátuas<br />

da <strong>de</strong>usa Vénus da <strong>arte</strong> clássica. Na verda<strong>de</strong><br />

estas “Vénus”pré-históricas não tinham<br />

muito em comum com as perfeitas<br />

proporções somáticas da escultura clássica,<br />

sendo que representavam a <strong>de</strong>usa<br />

“Terra-Mãe” com atributos somáticos<br />

exagerados, provavelmente com o fim<br />

<strong>de</strong> propiciar a fertilida<strong>de</strong>. As características<br />

<strong>de</strong>stas “Vénus” sofreram diferentes<br />

mudanças a nível estilístico com o passar<br />

do tempo: mais naturalístico no Paleolítico<br />

Superior (35.000-10.000 a.C..), esquemático<br />

no Epipaleolítico (10.000-7.000 a.C.),<br />

e seminaturalístico no Neolítico<br />

(7.000-3.000 a.C.). As “Vénus” das fases<br />

mais antigas do Neolítico, como a peça<br />

CE01233, tinham uma postura ligeiramente<br />

diferente das paleolíticas, sendo<br />

maioritariamente sentadas, com caracteres<br />

mais esquemáticos, com traços mais<br />

essenciais, limpos e claros, mas ainda<br />

mantendo os caracteres paleolíticos <strong>de</strong><br />

exagerar algumas p<strong>arte</strong>s do corpo, com<br />

os braços recolhidos no peito a enfatizar<br />

o seio e sendo ainda algumas em pedra.<br />

São iconografias que reflectem, na <strong>arte</strong><br />

móvel, a gran<strong>de</strong> passagem cultural entre<br />

caçadores-recolectores itinerantes e os<br />

pastores-agricultores se<strong>de</strong>ntários, mas<br />

mantendo algumas tradições ancestrais.<br />

No Neolítico a maioria das “Vénus” são<br />

feitas em terracota, o “novo material”<br />

que em p<strong>arte</strong> vai substituir em p<strong>arte</strong><br />

a pedra na <strong>arte</strong> móvel.<br />

A figura humana no <strong>de</strong>curso do Neolítico<br />

torna-se cada vez mais esquematizada,<br />

chegando a ser <strong>de</strong>senvolvida no<br />

Mediterrâneo Oriental um grupo<br />

<strong>de</strong> esculturas marcantes do período final<br />

do Neolítico e do inicio da Ida<strong>de</strong> do Bronze,<br />

mais precisamente nas ilhas Cícla<strong>de</strong>s<br />

(5.300-2.000 a.C.), uma das três áreas,<br />

juntamente com Creta e o Peloponeso<br />

(Grécia), on<strong>de</strong> nasceram, na Ida<strong>de</strong> do<br />

Bronze, as civilizações gregas pré-clássicas.<br />

Este fenómeno <strong>de</strong> esculturas humanas,<br />

sobretudo em mármore, marcou um dos<br />

primeiros gran<strong>de</strong>s fenómenos artísticos<br />

do Mediterrâneo produzindo os chamados<br />

“Ídolos Cicládicos”. São representações<br />

quer <strong>de</strong> homens, aparentemente músicos<br />

e guerreiros, quer <strong>de</strong> mulheres, sempre<br />

com órgãos sexuais <strong>de</strong>talhados e braços<br />

cruzados no seio. Esta última postura<br />

po<strong>de</strong> ser ainda vista como uma herança<br />

das “Vénus” pré-históricas. Ainda não é<br />

possível explicar o que representam estas<br />

esculturas (se <strong>de</strong>uses e <strong>de</strong>usas, se <strong>de</strong>funtos,<br />

se personagens com funções específicas<br />

na socieda<strong>de</strong>), sendo que a maioria dos<br />

exemplares conhecidos não tem contexto<br />

arqueológico certo, embora os poucos<br />

que po<strong>de</strong>m ser contextualizados, porque<br />

achados em escavações mo<strong>de</strong>rnas,<br />

provenham <strong>de</strong> sepulturas. Estilisticamente<br />

as centenas <strong>de</strong> ídolos cicládicos que<br />

se conhecem, são classificados em tipos<br />

“pré-canónicos”, típicos do Neolítico<br />

(maioritariamente em forma esquemática<br />

<strong>de</strong> violão) e tipos “canónicos”, típicos da<br />

Ida<strong>de</strong> do Bronze Antigo (<strong>de</strong> formas mais<br />

realistas). Estilisticamente, portanto,<br />

regressa-se no inicio da Ida<strong>de</strong> do Bronze<br />

a um certo realismo na figura humana,<br />

embora seja um realismo minimalista, como<br />

é possível ver na peça CE03026. Tecnicamente<br />

estas esculturas eram obtidas, para além<br />

<strong>de</strong> uma matéria-prima comum nas Cícla<strong>de</strong>s,<br />

o mármore, com o auxílio <strong>de</strong> outras pedras<br />

locais: obsidiana para rasgar e pedras<br />

vulcânicas para polir (particularmente a<br />

pedra pomes). Parece que alguns “ídolos”<br />

eram, originalmente, pintados<br />

nomeadamente nos olhos e na boca.<br />

52<br />

No Neolítico, a escultura não é o único<br />

eixo para o trabalho <strong>de</strong> pedras calcárias.<br />

No Próximo Oriente Antigo, no Egipto<br />

Pré-dinástico e no Mediterrâneo Oriental,<br />

são frequentemente realizados recipientes<br />

em calcário, mármore e alabastro,<br />

sobretudo em contextos do Neolítico<br />

pré-cerâmico: nas fases iniciais <strong>de</strong>ste<br />

período (vii milénio a.C.) em algumas<br />

regiões entre o Baixo Egipto, Chipre<br />

e a Palestina, há evidências <strong>de</strong> pastores<br />

e/ou agricultores que ainda não tinham<br />

cerâmica, mas que usavam contentores<br />

feitos em pedra (peça CE03499),<br />

aproveitando, portanto, um material<br />

no qual o homem tinha milhares <strong>de</strong> anos<br />

<strong>de</strong> experiência. Também em fases mais<br />

<strong>de</strong>senvolvidas do Neolítico, continua<br />

a produção <strong>de</strong> recipientes em pedra,<br />

tomando inspiração das formas cerâmicas<br />

e com uma função <strong>de</strong>sta vez sobretudo<br />

artística, envolvendo na feitura, materiais<br />

esteticamente agradáveis, como<br />

o alabastro (peça CE03504).<br />

Entretanto, em meados do ii milénio a.C,<br />

nascem na Anatólia centro-oriental e no<br />

norte <strong>de</strong> Iraque as gran<strong>de</strong>s entida<strong>de</strong>s<br />

estatais que competiram com o império<br />

egípcio pelo controlo da Próximo Oriente:<br />

os reinos <strong>de</strong> Mitanni e <strong>de</strong> Hatti (melhor<br />

conhecido como reino Hittita).<br />

Este último nasceu <strong>de</strong> uma invasão dum<br />

povo indo-europeu proveniente da Ásia<br />

Central, tendo criado um estado on<strong>de</strong><br />

a <strong>arte</strong> floresceu, nomeadamente a dos<br />

metais e da pedra. Um exemplo é a peça<br />

CE00638, representando um berrão, que<br />

na simbologia indo-europeia, juntamente<br />

com o javali, era usado para representar<br />

a força da natureza, simbolizando quer<br />

a força guerreira masculina, quer a mesma<br />

natureza brutal que a civilização humana<br />

conseguia subjugar. O estilo ainda entre<br />

o esquemático e o naturalista, mais<br />

inclinado para o primeiro, é típico<br />

da <strong>arte</strong> móvel hittita.<br />

53 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong>


A <strong>arte</strong> da pedra no período<br />

“orientalizante”<br />

Com o final da Ida<strong>de</strong> do Bronze<br />

e do Império Novo egípcio, da civilização<br />

micénica e do império hittita, após um<br />

período <strong>de</strong> fragmentação e instabilida<strong>de</strong><br />

política entre os sécs. xii e x a.C., a área do<br />

Levante Mediterrânico conheceu uma<br />

renovada unida<strong>de</strong> política e, em gran<strong>de</strong><br />

medida, cultural com o império assírio<br />

e a civilização fenícia. Estas duas<br />

entida<strong>de</strong>s, que sempre se relacionaram<br />

entre elas como império continental<br />

(assírios) e cida<strong>de</strong>s marítimas comerciais<br />

vassalas (fenícios), produziram uma<br />

florescente <strong>arte</strong> móvel que se difundiu<br />

ao longo do Mediterrâneo elos<br />

comerciantes e colonos fenícios entre<br />

os sécs. ix e vi a.C., constituindo o dito<br />

“fenómeno orientalizante”; difundiu-se<br />

assim, não só novos materiais e técnicas,<br />

mas também crenças, modos <strong>de</strong> vida<br />

e simbologias orientais. Entre todas as<br />

produções <strong>arte</strong>sanais, do ouro, do marfim,<br />

do vidro, da cerâmica, o trabalho em<br />

pedra teve também a sua importância.<br />

Muita inspiração para a simbologia<br />

e os padrões <strong>de</strong>corativos foram adoptados<br />

do Egipto: plantas <strong>de</strong> papiro, flores <strong>de</strong> loto,<br />

falcões, esfinges e leões inspiraram<br />

os <strong>arte</strong>sãos fenícios que trabalhavam<br />

a pedra dura. Como exemplo, veja-se<br />

um pen<strong>de</strong>nte em forma <strong>de</strong> falcão,<br />

representando o <strong>de</strong>us Hórus egípcio<br />

(CE01486); pela sua força e beleza,<br />

representava o princípio celeste, sendo<br />

um símbolo ascensional e indicando<br />

superiorida<strong>de</strong> e vitória, adquiridas<br />

ou em via <strong>de</strong> ser adquiridas. Outro<br />

pen<strong>de</strong>nte representa um leão (CE01487),<br />

símbolo do po<strong>de</strong>r, sabedoria e justiça.<br />

Ambos os pen<strong>de</strong>ntes foram feitos numa<br />

pedra dura vermelha, cor do princípio<br />

da vida e da sua força, constituindo,<br />

como tal, um amuleto do bom augúrio.<br />

No trabalho das pedras, não parou a<br />

produção <strong>de</strong> recipientes, agora mais<br />

aperfeiçoados e finos: padrões <strong>de</strong>corativos<br />

presentes também nos marfins das escolas<br />

<strong>de</strong> entalhe fenícias e assírias, aparecem<br />

também em pequenas tigelas <strong>de</strong> calcário<br />

(peça CE01096) <strong>de</strong> alta qualida<strong>de</strong><br />

escultórica, usadas para cerimoniais<br />

religiosos e domésticos, como a ostentação<br />

<strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> luxo.<br />

Os fenícios produziram em pedra<br />

também miniaturas <strong>de</strong> recipientes, usados<br />

quer na cosmética durante o dia-a-dia,<br />

quer como p<strong>arte</strong> <strong>de</strong> a<strong>de</strong>reços funerários.<br />

Formas <strong>de</strong> unguentários, copos e <strong>de</strong><br />

ânforas são difusas ao longo das colónias e<br />

das implantações fenícias no Mediterrâneo<br />

até a Península Ibérica. A anforeta<br />

CE03048 tem uma forma próxima da das<br />

ânforas fenício-púnicas, na p<strong>arte</strong> superior,<br />

testemunhando portanto a difusão <strong>de</strong>sta<br />

<strong>arte</strong> <strong>de</strong> fazer recipientes miniaturísticos<br />

em pedra até aos sécs. vi-iv a.C..<br />

Chipre centro cultural do<br />

Mediterrâneo: a estatuária<br />

entre o “orientalizante”<br />

e o período clássico<br />

Ao longo do “fenómeno orientalizante”,<br />

a ilha <strong>de</strong> Chipre, a meio do Mediterrâneo<br />

oriental, acabou para ser um pólo <strong>de</strong><br />

atracão das variadas correntes artísticas<br />

no <strong>de</strong>curso da primeira meta<strong>de</strong><br />

do i milénio a.C. Des<strong>de</strong> os finais da Ida<strong>de</strong><br />

do Bronze, comunida<strong>de</strong>s helénicas<br />

estabeleceram-se em Chipre, para <strong>de</strong>pois<br />

os Fenícios fundarem colónias nesta ilha,<br />

rica em cobre e ma<strong>de</strong>ira para a construção<br />

naval, nos finais do séc. ix a.C.,<br />

importando os seus próprios cultos<br />

e estilos artísticos, juntamente com<br />

mo<strong>de</strong>los egípcios que eles mesmos<br />

adoptaram. Finalmente <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o<br />

séc. vii a.C. os reis <strong>de</strong> Chipre tornaram-se<br />

vassalos dos reis da Assíria. Todas estas<br />

confluências <strong>de</strong> culturas e influências<br />

artísticas direitas e indirectas, no espaço<br />

<strong>de</strong> 500 anos, levaram a uma produção<br />

<strong>de</strong> uma escultura particular,<br />

maioritariamente com sujeitos humanos,<br />

que contribuiu para disponibilizar<br />

mo<strong>de</strong>los para a <strong>arte</strong> grega do período<br />

pré-clássico. Estas estátuas, no caso<br />

daquelas em pedra, foram esculpidas<br />

aproveitando o calcário, muito abundante<br />

em Chipre.<br />

Inv. CE01233<br />

Estatueta <strong>de</strong> figura feminina<br />

nua grávida e sentada<br />

Próximo Oriente ou Mediterrâneo<br />

Oriental (VI milénio a.C.)<br />

Anfibolito<br />

altura (5cm), comprimento (2,9 cm),<br />

largura (2,9 cm)<br />

Statuette of a nu<strong>de</strong> female<br />

pregnant and sitting<br />

Near East or Eastern<br />

Mediterranean (VI millenium BC)<br />

Amphibolite<br />

height (5 cm), length (2,9 cm),<br />

width (2,9 cm)<br />

54<br />

Para o período dito “arcaico” <strong>de</strong> Chipre<br />

(750- 480 a.C.) a estatuária costuma<br />

incluir esculturas em calcário e terracota.<br />

Entre aquelas em calcário costumam ser<br />

representados altos dignitários e<br />

sacerdotes, com postura rígida e estática,<br />

talvez com policromia original, hoje em<br />

dia <strong>de</strong>saparecida. Entre as influências<br />

estilísticas, po<strong>de</strong>m-se contar as orientais e<br />

as egípcias: na maioria são prevalecentes<br />

as orientais, como nas peças CE03028,<br />

CE03029 e CE03030, com olhos em forma<br />

<strong>de</strong> amêndoa e barrete <strong>de</strong> feitura oriental;<br />

em alguns casos são mais evi<strong>de</strong>ntes as<br />

influências egípcias, como na peça<br />

CE03065 on<strong>de</strong> se nota o clássico nemes.<br />

Finalmente, na passagem ao período<br />

“Clássico” (480- 310 a.C.), no qual Chipre<br />

passa a estar sob domínio directo do<br />

Império Persa até à conquista da ilha por<br />

Alexandre Magno, assiste-se ao<br />

surgimento dos cânones da <strong>arte</strong> grega<br />

clássica, como um penteado mais cuidado,<br />

feições mais graciosas e uma provável<br />

policromia original (CE3027).<br />

Davi<strong>de</strong> Delfino<br />

55 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

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East, London: Thames and Hudson<br />

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VIALOU, D. (1999) Art Pré-Historique,<br />

In Dictionnaire <strong>de</strong> la Préhistoire, Paris:<br />

Encyclopedia Universalis et Albin Michel,<br />

182-186


Inv. CE03026<br />

Ídolo Cicládico,<br />

tipo Spedos<br />

/Dokathismata<br />

Ida<strong>de</strong> do Bronze Antigo<br />

das Cícla<strong>de</strong>s- período Antigo<br />

Cicládico II (2700- 2400 a.C.)<br />

Mármore<br />

altura (23 cm), comprimento (4,1 cm),<br />

largura (2,5 cm)<br />

Cycladic Idol, type Spedos<br />

/Dokathismata<br />

Cycladic Early Bronze Age<br />

- Early Cycladic II (2700- 2400 BC)<br />

Marble<br />

Dimensions: height (23 cm),<br />

length (4,1 cm) width (2,5 cm)<br />

56<br />

57 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Inv. CE03499<br />

Copo troncocónico<br />

Próximo Oriente ou Egipto<br />

(VII milénio a.C.)<br />

Mármore<br />

altura (8,8 cm), comprimento (10,1 cm),<br />

largura (10,1 cm)<br />

Troncoconic glass<br />

Near East or Egypt<br />

(VII millennium BC)<br />

Marble<br />

Dimensions: height (8,8 cm),<br />

length (10,1 cm), width (10,1 cm)


Inv. CE03504<br />

Vaso <strong>de</strong> forma cónica,<br />

sobre pé,<br />

rebordo expandido<br />

Próximo Oriente<br />

ou Egípto (II milénio a.C.)<br />

Alabastro<br />

altura (10,5 cm), comprimento (16,5 cm),<br />

largura (16,5 cm)<br />

Vessel conical shape on standing<br />

edge expan<strong>de</strong>d<br />

Near East or Egypt<br />

(II millennium BC)<br />

Alabaster<br />

height (10,5 cm), length (16,5 cm,)<br />

width (16,5 cm)<br />

58<br />

Inv. CE01096<br />

Pátera <strong>de</strong> forma ovói<strong>de</strong><br />

com <strong>de</strong>coração entalhada<br />

Síria-Palestina (900- 700 a.C.)<br />

Calcário<br />

altura (4,1 cm), comprimento (10,5 cm),<br />

largura (10,5 cm)<br />

Patera of ovoid form<br />

with carved <strong>de</strong>coration<br />

Syria- Palestine (900- 700 BC)<br />

Limestone<br />

height (4,1 cm), length (10,5 cm),<br />

width (10,5 cm)<br />

59 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong>


Inv. CE00638<br />

Estatueta <strong>de</strong> berrão<br />

Próximo Oriente<br />

(meados do II milénio a.C.)<br />

Rocha metamórfica<br />

altura (7,5 cm), comprimento (4,1 cm),<br />

largura (12,2cm)<br />

Statuette of boar<br />

Near East (middle II millennium BC)<br />

Metamorphic stone<br />

Dimensions: height (7,5 cm),<br />

length (4,1 cm), width (12,2 cm)<br />

60<br />

61 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Inv. CE01487<br />

Pen<strong>de</strong>nte com forma <strong>de</strong> cavalo<br />

Próximo Oriente (800- 600 a.C.)<br />

Âmbar<br />

altura (1,3 cm), comprimento (1,7 cm),<br />

largura (1,7 cm)<br />

Horse-shaped pen<strong>de</strong>nt<br />

Near East (800- 600 BC)<br />

Amber<br />

Dimensions: height (1,3 cm),<br />

length (1,7 cm), width (1,7 cm)<br />

Inv. CE01486<br />

Pen<strong>de</strong>nte com forma <strong>de</strong> falcão<br />

Próximo Oriente (800- 600 a.C.)<br />

Corníola<br />

altura (1,4 cm), comprimento (1,8 cm),<br />

largura (0,6 cm)<br />

Falcon-shaped pen<strong>de</strong>nt<br />

Near East (800- 600 BC)<br />

Corniole<br />

Dimensions: height (1,4 cm),<br />

length (1,8 cm), width (0,6 cm)


Inv. CE03029<br />

Fragmento <strong>de</strong> busto feminino,<br />

com dia<strong>de</strong>ma<br />

Chipre, período arcaico (550- 500 a.C.)<br />

Calcário<br />

altura (10 cm), comprimento (6,8 cm),<br />

largura (5 cm)<br />

Fragment of female bust with<br />

dia<strong>de</strong>m<br />

Cyprus, archaic period (550- 500 BC)<br />

Limestone<br />

height (10 cm), length (6,8 cm),<br />

width (5 cm)<br />

Inv. CE03030<br />

Fragmento <strong>de</strong> busto<br />

Chipre, período arcaico (600-550 a.C.)<br />

Calcário<br />

altura (5,5 cm), comprimento (4 cm),<br />

largura (3,6 cm)<br />

Fragment of bust<br />

Cyprus, archaic period (600-550 BC)<br />

Limestone<br />

height (5,5 cm), length (4 cm)<br />

width (3,6 cm)<br />

Inv. CE03065<br />

Fragmento <strong>de</strong> busto com nemes<br />

Chipre, período arcaico (575-550 a.C.)<br />

Calcário<br />

altura (9,9 cm), comprimento (8,7 cm),<br />

largura (5,4 cm)<br />

Fragment of bust with nemes<br />

Cyprus, archaic period (575-550 BC)<br />

Limestone<br />

height (9,9 cm), length (8,7 cm),<br />

width (5,4 cm)<br />

Inv. CE03027<br />

Cabeça <strong>de</strong> estatueta<br />

Chipre (500-475 a.C.)<br />

Calcário<br />

altura (8,1 cm), comprimento (6,4 cm),<br />

largura (4,2 cm)<br />

Head of statuette<br />

Cyprus (500-475 BC)<br />

Limestone<br />

Dimensions: height (8,1 cm), length (6,4<br />

cm,) width (4,2 cm)


Inv. CE03028<br />

Fragmento <strong>de</strong> busto masculino,<br />

com barrete na cabeça<br />

Chipre, período arcaico (600-550 a.C.)<br />

Calcário<br />

altura (9,4 cm), comprimento (4,2 cm),<br />

largura (7,4 cm)<br />

Fragment of male bust,<br />

with cap on his head<br />

Cyprus, archaic period (600-550 BC)<br />

Limestone<br />

height (9,4 cm), length (4,2 cm),<br />

width (7,4 cm)<br />

64<br />

65 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Inv. CE03048<br />

Jarrinho<br />

Mediterrâneo orientalizante<br />

(VI-IV a.C.)<br />

Rocha metamórfica com olivina<br />

altura (7,2 cm), comprimento (5,2 cm),<br />

largura (3,1 cm)<br />

Little jar<br />

Orientalizing Mediterranean<br />

(600- 300 BC)<br />

Metamorphic stone with olivine<br />

height (7,2 cm), length (5,2 cm),<br />

width (3,1 cm)


escultura romana<br />

clássica e paleo-cristã<br />

Apresenta-se nesta exposição um conjunto<br />

<strong>de</strong> esculturas da época romana, algumas<br />

<strong>de</strong>las provenientes <strong>de</strong> Abrantes (CMA001<br />

e CMA002), enquanto que as restantes são<br />

da Col. Estrada. A escultura remete-nos<br />

para diferentes aspectos do quotidiano<br />

das elites romanas e vamos analisar<br />

<strong>de</strong> seguida três <strong>de</strong>les.<br />

Em primeiro lugar, um plano religioso,<br />

como a estátua em mármore <strong>de</strong> uma<br />

Fortuna sentada com a sua cornucópia<br />

(CE00754). Trata-se <strong>de</strong> uma escultura<br />

doméstica que pedia à <strong>de</strong>usa das colheitas<br />

protecção ao nível da vida privada para<br />

aspectos concretos da mesma, como ter<br />

boas colheitas. À Fortuna pedia-se também<br />

sorte para aspectos mais gerais da vida.<br />

Um segundo grupo <strong>de</strong> esculturas, mais<br />

numeroso, está ligado ao imaginário da<br />

morte. Dois exemplares, <strong>de</strong> uma mulher<br />

(CE00734) e <strong>de</strong> uma criança (CE03493),<br />

po<strong>de</strong>m correspon<strong>de</strong>r a retratos <strong>de</strong> pessoas<br />

falecidas. De assinalar também dois<br />

fragmentos <strong>de</strong> sarcófagos (CE00735<br />

e CE00739), uma estela (CE03510)<br />

e um fragmento <strong>de</strong> uma composição<br />

<strong>de</strong> maior tamanho, provavelmente<br />

funerária, com uma mulher em relevo<br />

(CE00902).<br />

Finalmente, um terceiro grupo<br />

<strong>de</strong> esculturas, <strong>de</strong>sta vez no domínio<br />

público, constituído por dois exemplares<br />

<strong>de</strong> figuras femininas com manto, faltando<br />

no entanto as respectivas cabeças<br />

(CMA001 e CMA002). Foram encontradas<br />

no concelho <strong>de</strong> Abrantes e <strong>de</strong>vem ter<br />

representado <strong>de</strong>usas que estariam no fórum<br />

<strong>de</strong> uma cida<strong>de</strong> romana nas imediações<br />

Para terminar, estão ainda expostas duas<br />

estelas funerárias (CE00961 e CE00962),<br />

datáveis do século V e provenientes do<br />

Egipto, quando o império romano tinha<br />

como religião oficial o cristianismo,<br />

e on<strong>de</strong> são visíveis diferenças iconográficas<br />

em relação ao período anterior, como<br />

a pomba numa das mãos (o Espírito Santo)<br />

e um cacho <strong>de</strong> uvas na outra (o sangue<br />

<strong>de</strong> Cristo).<br />

Luís Jorge Gonçalves<br />

e Gustavo Portocarrero<br />

Bibliografia<br />

GROSSMAN, Janet (2003)<br />

Looking at Greek and Roman Sculpture in<br />

Stone: A Gui<strong>de</strong> to Terms, Styles and Techniques,<br />

J. Paul Getty Museum<br />

KLEINER, Diana (1987)<br />

Roman Imperial Funerary Altars with Portraits,<br />

Roma: Bretschnei<strong>de</strong>r<br />

KLEINER, Diana (1992)<br />

Roman Sculpture, New Haven:<br />

Yale University Press<br />

MCCANN, A. M. (1978)<br />

Roman Sarcophagi in the Metropolitan<br />

Museum of Art, New York: Metropolitan<br />

Museum of Art<br />

Inv. CE00754<br />

Estatueta da <strong>de</strong>usa Fortuna<br />

Romano, I – II d.C.<br />

Mármore<br />

altura (38,2 cm), comprimento (19 cm),<br />

largura (12,3 cm)<br />

Statuette of Fortune god<strong>de</strong>ss<br />

Roman, I-II A.D.<br />

Marble<br />

height (38,2 cm), length (19 cm),<br />

width (12,3 cm)<br />

66<br />

67 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong>


Inv. CE00734<br />

Retrato feminino<br />

Romano, I - II D.C.<br />

Mármore<br />

altura (25 cm), comprimento (15,7 cm),<br />

largura (10,5 cm)<br />

Female portrait<br />

Roman, I - II A.D.<br />

Marble<br />

height (25 cm), length (15,7 cm),<br />

width (10,5 cm)<br />

68<br />

69 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Inv. CE03493<br />

Cabeça <strong>de</strong> criança<br />

Romano, I - II d.C.<br />

Mármore<br />

altura (11 cm), comprimento (8,2 cm),<br />

largura (11,4 cm)<br />

Child’s head<br />

Roman, I-III A.D.<br />

Marble<br />

height (11 cm), length (8,2 cm),<br />

width (11,4 cm)


Inv. CE00735<br />

Fragmento <strong>de</strong> sarcófago<br />

Romano, III d.C.<br />

Mármore<br />

altura (29,9 cm), comprimento (27 cm),<br />

largura (12,7 cm)<br />

Fragment of sarcophagus<br />

Roman Empire, III A.D.<br />

Marble<br />

height (29,9 cm), length (27 cm),<br />

width (12,7 cm)<br />

Inv. CE00739<br />

Fragmento <strong>de</strong> sarcófago<br />

Romano, III d.C.<br />

Mármore<br />

altura (32 cm), comprimento (18 cm),<br />

largura (8,7 cm)<br />

Fragment of sarcophagus<br />

Roman, III A.D.<br />

Marble<br />

height (32 cm), length (18 cm),<br />

width (8,7 cm)<br />

70<br />

71 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong>


Inv. CE03510<br />

Estela funerária<br />

Romano, I-III d.C.<br />

Mármore<br />

altura (23,5 cm), comprimento (25,3 cm),<br />

largura (4,5 cm)<br />

Funerary stele<br />

Roman, I-III A.D.<br />

Marble<br />

height (23,5 cm), length (25,3 cm),<br />

width (4,5 cm)<br />

72<br />

73 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong>


Inv. CE00902<br />

Fragmento <strong>de</strong> placa<br />

com figura feminina<br />

em relevo<br />

Romano, I - II d.C.<br />

Mármore<br />

Dimensões: altura (31,2 cm), comprimento<br />

(14 cm), largura (5,1 cm)<br />

Fragment of plaque<br />

with female figure<br />

in relief<br />

Roman, I-III A.D.<br />

Marble<br />

height (31,2 cm), length (14 cm),<br />

width (5,1 cm)<br />

Inv. CMA001<br />

Estátua <strong>de</strong> divinda<strong>de</strong> feminina<br />

Romano, II d.C.<br />

Mármore<br />

altura (98,4 cm), comprimento (38,6 cm),<br />

largura (27,5 cm)<br />

Statue of female divinity<br />

Roman, II A.D.<br />

Marble<br />

height (98,4 cm), length (38,6 cm),<br />

width (27,5 cm)<br />

74<br />

75 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Inv. CMA002<br />

Estátua <strong>de</strong> divinda<strong>de</strong> feminina<br />

Romano, I d.C.<br />

Mármore<br />

altura (211 cm), comprimento (80,3 cm),<br />

largura (43,8 cm)<br />

Statue of female divinity<br />

Roman, I A.D.<br />

Marble<br />

height (211 cm), length (80,3 cm),<br />

width (43,8 cm)


Inv. CE00961<br />

Estela funerária<br />

Romano, V-VI d.C.<br />

Arenito<br />

altura (39 cm), comprimento (26 cm),<br />

largura (13,8 cm)<br />

Funerary stele<br />

Roman, V-VI A.D.<br />

Arenit<br />

height (39 cm), length (26 cm),<br />

width (13,8 cm)<br />

Inv. CE00962<br />

Estela funerária<br />

Romano, V-VI d.C.<br />

Arenito<br />

altura (42,5 cm), comprimento (23 cm),<br />

largura (10 cm)<br />

Funerary stele<br />

Roman, V-VI A.D.<br />

Arenit<br />

height (42,5 cm), length (23 cm),<br />

width (10 cm)<br />

76<br />

77 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong>


78<br />

gemas romanas<br />

da coleção estrada<br />

O uso <strong>de</strong> gemas era bastante generalizado<br />

na joalharia romana. A Col. Estrada possui<br />

um significativo conjunto <strong>de</strong> gemas<br />

romanas, apresentando-se nesta exposição<br />

algumas <strong>de</strong>las, mais concretamente aquelas<br />

que eram usadas em anéis.<br />

Muitas das gemas tinham uma imagem,<br />

sendo o método mais vulgar o da incisão.<br />

Mas em alguns casos também podiam ser<br />

camafeus, que consistiam em pedras finas<br />

cinzeladas <strong>de</strong> modo a formar uma figura<br />

em relevo com camadas sobrepostas<br />

<strong>de</strong> cores diferentes.<br />

O uso das gemas não era meramente<br />

<strong>de</strong>corativo, havendo uma enorme varieda<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> usos, influenciados pelo tipo <strong>de</strong> gema,<br />

cor, limpi<strong>de</strong>z, rarida<strong>de</strong> e ainda os motivos<br />

gravados na gema, numa complexa<br />

interacção entre si.<br />

Um dos usos mais vulgares dos anéis<br />

com gemas era como sinete para autenticar<br />

documentos. Outras vezes os anéis podiam<br />

ter uma função apotropaica, com vista a<br />

afugentar o mal. Já noutros ocasos os anéis<br />

po<strong>de</strong>riam representar fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong>s políticas,<br />

com representação da figura a que se era<br />

fiel. Outros anéis podiam representar<br />

estatuto sócio-económico, como por<br />

exemplo os camafeus, cuja feitura era mais<br />

cuidadosa; representar antepassados;<br />

invocar a protecção <strong>de</strong> certos <strong>de</strong>uses;<br />

pertença a um grupo, como o exército;<br />

mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> comportamento; anéis<br />

<strong>de</strong> casamento; et cetera.<br />

No caso das gemas aqui expostas, como<br />

estão <strong>de</strong>scontextualizadas, não é fácil<br />

i<strong>de</strong>ntificar o uso a que se <strong>de</strong>stinavam,<br />

po<strong>de</strong>ndo haver, em alguns casos mais que<br />

uma explicação possível.<br />

79 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Os bustos masculinos (CE01204, CE02987,<br />

CE02992, CE04708 e CE04739) po<strong>de</strong>riam<br />

ser anéis <strong>de</strong> sinete com representação<br />

do dono do anel. As gemas com um<br />

escorpião (CE02574, CE02988 e CE04737)<br />

eram comummente prescritos para<br />

protecção <strong>de</strong> doença genitais. Quanto<br />

às gemas que representam um Mercúrio<br />

(CE4738 e CE04740), seriam usados<br />

para protecção <strong>de</strong> viajantes e comerciantes,<br />

sendo também prescritos contra a<br />

intoxicação. O anel com um olho<br />

representado (CE02592) <strong>de</strong>stinava-se<br />

a afastar o mau-olhado. A águia a caçar<br />

um coelho (CE03415), seria possivelmente<br />

uma forma <strong>de</strong> honrar o <strong>de</strong>us Júpiter, sendo<br />

a águia um dos seus símbolos. A gema<br />

com representação <strong>de</strong> um casal (CE04735),<br />

talvez pertencesse a um anel <strong>de</strong> casamento.<br />

O camafeu com uma mulher (CE04736),<br />

talvez representasse a sua <strong>de</strong>tentora;<br />

mostrava igualmente estatuto<br />

sócio-económico, dado os camafeus serem<br />

mais caros. O anel com um cão (CE2594),<br />

talvez tivesse um sentido psicopompo,<br />

servindo o cão para guiar a alma do morto.<br />

Já no anel <strong>de</strong> quartzo vermelho, sem<br />

qualquer <strong>de</strong>coração (CE02991), joga-se<br />

sobretudo com o variado simbolismo<br />

da cor vermelha: ardor e beleza, <strong>de</strong> força<br />

impulsiva e generosa, <strong>de</strong> juventu<strong>de</strong>, <strong>de</strong><br />

saú<strong>de</strong>, <strong>de</strong> riqueza. Por último, assinale-se<br />

dois anéis com representação <strong>de</strong> Hélio<br />

(CE02989 e CE02993), <strong>de</strong>us do sol,<br />

facilmente reconhecível, pelos raios solares<br />

na sua cabeça; aqui, o propósito seria<br />

possivelmente o <strong>de</strong> invocar Hélio<br />

para levantar o morto que usava o anel<br />

para elevá-lo ao reino etério <strong>de</strong> Selena;<br />

o simbolismo <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e juventu<strong>de</strong><br />

do quartzo vermelho das duas gemas,<br />

reforça esta interpretação.<br />

Gustavo Portocarrero<br />

Bibliografia<br />

CHEVALIER, Jean;<br />

GHEERBRANT, Alain (1994)<br />

Dicionário dos Símbolos, Lisboa: Teorema<br />

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University of California Press<br />

SPIER, Jeffrey (1992)<br />

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Catalogue of the Collections, Malibu:<br />

The J. Paul Getty Museum<br />

Inv. CE01204<br />

Anel com gema<br />

com busto masculino<br />

Romano (I-III d.C.)<br />

Ouro e quartzo<br />

altura (2,1 cm), comprimento (2 cm),<br />

largura (1,9 cm)<br />

Ring with gem with male bust<br />

Roman (I-III A.D.)<br />

Gold and quartz<br />

height (2,1 cm), length (2 cm),<br />

width (1,9 cm)


Inv. CE02574<br />

Anel com gema com escorpião<br />

Romano (I-III d.C.)<br />

Ouro e âmbar<br />

altura (2,2 cm), comprimento (2,5 cm),<br />

largura (0,9 cm)<br />

Ring with gem with scorpion<br />

Roman (I-III A.D.)<br />

Gold and ambar<br />

height (2,2 cm), length (2,5 cm),<br />

width (0,9 cm)<br />

Inv. CE02592<br />

Anel com gema com olho<br />

Romano (I-III d.C.)<br />

Ouro e ágata<br />

altura (2,9 cm), comprimento (2,6 cm),<br />

largura (0,9 cm)<br />

Ring with gem with eye<br />

Roman (I-III A.D.)<br />

Gold and agate<br />

height (2,9 cm), length (2,6 cm),<br />

width (0,9 cm)<br />

Inv. CE02594<br />

Anel com gema com cão<br />

Romano (I-III d.C.)<br />

Ouro e azurite<br />

altura (2,3 cm), comprimento (2,1 cm),<br />

largura (1,1 cm)<br />

Ring with gem with dog<br />

Roman (I-III A.D.)<br />

Gold and azurite<br />

height (2,3 cm), length (2,1 cm),<br />

width (1,1 cm)<br />

Inv. CE02987<br />

Anel com gema com busto<br />

masculino<br />

Romano (I-III d.C.)<br />

Ouro e quartzo<br />

altura (2,7 cm), comprimento (3,1 cm),<br />

largura (1,8 cm)<br />

Ring with gem with male bust<br />

Roman (I-III A.D.)<br />

Gold and quartz<br />

height (2,7 cm), length (3,1 cm),<br />

width (1,8 cm)<br />

80<br />

81 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Inv. CE02991<br />

Anel com gema<br />

Romano (I-III d.C.)<br />

Ouro e quartzo<br />

altura (2,3 cm), comprimento (2,8 cm),<br />

largura (1,7 cm)<br />

Ring with gem<br />

Roman (I-III A.D.)<br />

Gold and quartzo<br />

height (2,3 cm), length (2,8 cm),<br />

width (1,7 cm)<br />

Inv. CE04708<br />

Anel mo<strong>de</strong>rno com gema romana<br />

com busto masculino<br />

Romano (I-III d.C.)<br />

Ouro e pedra carbonática<br />

altura (2,1 cm), comprimento (2,8 cm),<br />

largura (1,6 cm)<br />

Mo<strong>de</strong>rn ring with roman gem with<br />

male bust<br />

Roman (I-III A.D.)<br />

Gold and carbonatic rock<br />

height (2,1 cm), length (2,8 cm),<br />

width (1,6 cm)<br />

Inv. CE02993<br />

Anel mo<strong>de</strong>rno com gema<br />

romana com Hélio<br />

Romano (I-III d.C.)<br />

Prata e quartzo<br />

altura (2,7 cm), comprimento (2 cm),<br />

largura (1,5 cm)<br />

Mo<strong>de</strong>rn ring with roman<br />

gem with Helios<br />

Roman (I-III A.D.)<br />

Silver and quartz<br />

height (2,7 cm), length (2 cm),<br />

width (1,5 cm)<br />

Inv. CE02992<br />

Anel com gema com busto<br />

masculino<br />

Romano (I-III d.C.)<br />

Ouro e turmalina<br />

altura (2,2 cm), comprimento (2 cm),<br />

largura (1,1 cm)<br />

Ring with gem with male bust<br />

Roman (I-III A.D.)<br />

Gold and tourmaline<br />

height (2,2 cm), length (2 cm),<br />

width (1,1 cm)


Inv. CE02988<br />

Anel com gema com escorpião<br />

Romano (I-III d.C.)<br />

Ouro e âmbar<br />

altura (2,4 cm), comprimento (2,6 cm),<br />

largura (0,9 cm)<br />

Ring with gem with scorpion<br />

Roman (I-III A.D.)<br />

Gold and ambar<br />

height (2,4 cm), length (2,6 cm),<br />

width (0,9 cm)<br />

Inv. CE02989<br />

Anel com gema com Hélio<br />

Romano (I-III d.C.)<br />

Ouro e quartzo<br />

altura (2,1 cm), comprimento (2,1 cm),<br />

largura (1,8 cm)<br />

Ring with gem with Helios<br />

Roman (I-III A.D.)<br />

Gold and quartz<br />

height (2,1 cm), length (2,1 cm),<br />

width (1,8 cm)<br />

82<br />

83 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Inv. CE03415<br />

Anel com gema com águia<br />

caçando um coelho<br />

Romano (I-III d.C.)<br />

Ouro e ágata<br />

altura (2 cm), comprimento (2,3 cm),<br />

largura (1,5 cm)<br />

Ring with gem with eagle hunting<br />

a rabbit<br />

Roman (I-III A.D.)<br />

Gold and agate<br />

height (2 cm), length (2,3 cm),<br />

width (1,5 cm)


Inv. CE04735<br />

Gema com bustos <strong>de</strong> casal<br />

Romano (I-III d.C.)<br />

Jaspe<br />

altura (2,9 cm), comprimento (2,5 cm),<br />

largura (1 cm)<br />

Gem with busts of couple<br />

Roman (I-III A.D.)<br />

Jasper<br />

height (2,9 cm), length (2,5 cm),<br />

width (1 cm)<br />

Inv. CE04736<br />

Camafeu com busto feminino<br />

Romano (I-III d.C.)<br />

Ágata<br />

Dimensões: altura (1,7 cm), comprimento<br />

(0,9 cm), largura (0,8cm)<br />

Cameo with female bust<br />

Roman (I-III A.D.)<br />

Agate<br />

height (1,7 cm), length (0,9 cm),<br />

width (0,8 cm)<br />

Inv. CE04739<br />

Gema com busto masculino<br />

Romano (I-III d.C.)<br />

Ágata<br />

altura (1,5 cm), comprimento (1,2 cm),<br />

largura (0,3 cm)<br />

Gem with male bust<br />

Roman (I-III A.D.)<br />

Agate<br />

height (1,5 cm), length (1,2 cm),<br />

width (0,3 cm)<br />

84<br />

Inv. CE04740<br />

Gema com Mercúrio<br />

Romano (I-III d.C.)<br />

Quartzo<br />

altura (1,4 cm), comprimento (1,1 cm),<br />

largura (0,3 cm)<br />

Gem with Mercury<br />

Roman (I-III A.D.)<br />

Quartz<br />

height (1,4 cm), length (1,1 cm),<br />

width (0,3 cm)<br />

85 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Inv. CE04737<br />

Gema com escorpião<br />

Romano (I-III d.C.)<br />

Ágata<br />

altura (1,6 cm), comprimento (1,3 cm),<br />

largura (0,6 cm)<br />

Gem with scorpion<br />

Roman (I-III A.D.)<br />

Agate<br />

height (1,6 cm), length (1,3 cm),<br />

width (0,6 cm)<br />

Inv. CE04738<br />

Gema com Mercúrio<br />

Romano (I-III d.C.)<br />

Quartzo<br />

altura (1,6 cm), comprimento (1,1 cm),<br />

largura (0,6 cm)<br />

Gem with Mercury<br />

Roman (I-III A.D.)<br />

Quartz<br />

height (1,6 cm), length (1,1 cm),<br />

width (0,6 cm)


ja<strong>de</strong>s da china<br />

Ao longo <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> 7000 anos <strong>de</strong> história,<br />

as <strong>arte</strong>s da China <strong>de</strong>senvolveram-se<br />

em torno <strong>de</strong> um equilíbrio harmonioso<br />

entre o virtuosismo técnico, no domínio<br />

profundo das técnicas e dos materiais,<br />

e uma reflexão estética sobre a interacção<br />

entre o homem e o cosmos. Assim, a <strong>arte</strong><br />

chinesa prolonga-se pelas mais diversas<br />

técnicas e materiais, nomeadamente<br />

o ja<strong>de</strong>, o bronze, a laca, a seda, a pintura<br />

sobre seda, a escultura e as variadas<br />

tipologias <strong>de</strong> cerâmica, entre as quais<br />

a porcelana teve especial notorieda<strong>de</strong>.<br />

O crescimento e prosperida<strong>de</strong> das<br />

civilizações <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m absolutamente<br />

do conhecimento e <strong>de</strong>senvolvimento<br />

tecnológico que se reflecte nos principais<br />

aspectos que <strong>de</strong>terminam a estrutura social.<br />

O domínio das técnicas artísticas<br />

e dos diferentes materiais permitiu<br />

às socieda<strong>de</strong>s primitivas estabelecer uma<br />

relação estreita com o sagrado através<br />

<strong>de</strong> elaborados objectos rituais, ornamentais<br />

e funerários que dignificavam e distinguiam<br />

tanto os espíritos ancestrais como também<br />

os lí<strong>de</strong>res tribais.<br />

É neste contexto que, na formação<br />

da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> cultural e artística da China,<br />

o conhecimento sobre as técnicas<br />

<strong>de</strong> escultura <strong>de</strong> ja<strong>de</strong> se <strong>de</strong>senvolveram<br />

em consonância com as práticas rituais<br />

e a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> práticas cerimoniais<br />

em torno da autorida<strong>de</strong> política.<br />

A vasta maioria das culturas do Neolítico<br />

na China, que se <strong>de</strong>senvolveram no período<br />

entre 8000 e 2000 a. C., encontraram<br />

no ja<strong>de</strong> o suporte para a instrumentalização<br />

dos rituais sagrados, esculpindo um vasto<br />

imaginário <strong>de</strong> animais, figuras<br />

antropomórficas e muitos outros objectos<br />

<strong>de</strong> formas únicas, cujo significado e função<br />

se per<strong>de</strong>u no tempo. Entre as diversas<br />

socieda<strong>de</strong>s do Neolítico, a cultura<br />

Hongshan (3400 - 2300 a. C.), na região<br />

<strong>de</strong> Liaoning, Mongólia Interior,<br />

distingue-se pela larga quantida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> objectos <strong>de</strong> ja<strong>de</strong> encontrados em espaço<br />

fúnebre. Niuheliang terá sido uma das áreas<br />

on<strong>de</strong> a cultura Hongshan se concentrou<br />

com particular incidência.<br />

Recentes escavações arqueológicas,<br />

que <strong>de</strong>correm <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a década <strong>de</strong> 1980,<br />

permitiram obter um maior conhecimento<br />

sobre o <strong>de</strong>senvolvimento tecnológico,<br />

no que respeita às ferramentas <strong>de</strong> pedra,<br />

à cerâmica e à produção <strong>de</strong> ja<strong>de</strong>s rituais,<br />

tanto ao longo do Rio Yangtze e do Rio<br />

Amarelo, como também no Noroeste<br />

da China, junto às estepes da Mongólia.<br />

Contudo, é pela execução <strong>de</strong> objectos<br />

rituais e ornamentais <strong>de</strong> ja<strong>de</strong> e pelo<br />

conhecimento das técnicas que lhe estão<br />

implícitas, que tornam a cultura Hongshan<br />

numa das mais interessantes e intrigantes<br />

culturas do Neolítico na China. Inúmeros<br />

objectos <strong>de</strong> ja<strong>de</strong>, na forma <strong>de</strong> animais,<br />

<strong>de</strong> figuras antropomórficas e também<br />

<strong>de</strong> elementos abstractos eventualmente<br />

associados perspectiva do sagrado que<br />

se expressa através da natureza, sugerem<br />

uma relativa complexida<strong>de</strong> dos rituais.<br />

Pen<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> ja<strong>de</strong> (huang) em forma<br />

<strong>de</strong> nuvens e orifícios que simulam uma<br />

máscara ou um rosto seriam possivelmente<br />

usados por lí<strong>de</strong>res tribais que,<br />

simultaneamente, conduziam os rituais.<br />

Aros <strong>de</strong> ja<strong>de</strong> semi-anelares e discos <strong>de</strong> ja<strong>de</strong><br />

(bi) com uma perfuração ao centro têm<br />

sido entendidos por muitos arqueólogos<br />

como sendo representações simbólicas<br />

do cosmos, baseados em interpretações<br />

mais tardias <strong>de</strong>scritas nos Clássicos<br />

contemporâneos <strong>de</strong> Confúcio e <strong>de</strong> Laozi.<br />

Pequenas esculturas <strong>de</strong> ja<strong>de</strong> na forma<br />

<strong>de</strong> tartarugas, <strong>de</strong> dragões em forma <strong>de</strong> anel,<br />

<strong>de</strong> águias e <strong>de</strong> outros pássaros são<br />

igualmente comuns nos túmulos da cultura<br />

Hongshan, mas também em outras culturas<br />

do Neolítico recente. Pensamos que<br />

a importância <strong>de</strong>stas figuras tem que ver<br />

com a capacida<strong>de</strong> que tanto os pássaros<br />

como as tartarugas têm <strong>de</strong> transitar entre<br />

dois espaços distintos - o céu e a terra<br />

e a terra e a água. Metaforicamente,<br />

representa a transição espiritual entre a vida<br />

e a morte ou, eventualmente, a viagem<br />

espiritual do lí<strong>de</strong>r tribal durante os rituais,<br />

que lhe permite comunicar com<br />

os espíritos.<br />

86<br />

87 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Inv. CE03458<br />

Figura sentada Zoomórfica<br />

China, Cultura Hongshan<br />

(3500 a.C. - 2500 a.C.)<br />

Ja<strong>de</strong> Nefrite<br />

altura (6,5 cm), comprimento (2,7 cm),<br />

largura (2,2 cm)<br />

Zoomorphic seated figure<br />

China, Hongshan Culture<br />

(3500 BC - 2500 BC)<br />

Nephrite Ja<strong>de</strong><br />

height (6,5 cm), length (2,7 cm),<br />

width (2,2 cm)<br />

Inv. CE03459<br />

Figura sentada Zoomórfica<br />

China, Cultura Hongshan<br />

(3500 a.C. - 2500 a.C.)<br />

Ja<strong>de</strong> Nefrite<br />

altura (7 cm), comprimento (3,1 cm),<br />

largura (2,8 cm)<br />

Zoomorphic seated figure<br />

China, Hongshan Culture<br />

(3500 BC - 2500 BC)<br />

Nephrite Ja<strong>de</strong><br />

height (7 cm), length (3,1 cm),<br />

width (2,8 cm)


No que respeita ao conhecimento<br />

tecnológico, as ferramentas <strong>de</strong> pedra<br />

<strong>de</strong>monstram que a cultura Hongshan<br />

dominava profundamente as técnicas<br />

<strong>de</strong> polimento, <strong>de</strong> lascagem, <strong>de</strong> corte<br />

e <strong>de</strong> perfuração, para além <strong>de</strong> proce<strong>de</strong>rem<br />

a uma selecção criteriosa das pedras<br />

utilizadas, na sua maioria em granito<br />

e calcário e escolhidas pela sua dureza<br />

e textura. De um modo geral, estas<br />

ferramentas <strong>de</strong> pedra seriam utilizadas<br />

na agricultura e também para cortar as<br />

peles e carne <strong>de</strong> animais domesticados.<br />

O <strong>de</strong>senvolvimento da agricultura<br />

e da pecuária tem como consequência u<br />

ma estabilida<strong>de</strong> e prosperida<strong>de</strong> dos<br />

aglomerados populacionais. As técnicas<br />

utilizadas para o polimento e corte das<br />

ferramentas <strong>de</strong> pedra terão sido as mesmas<br />

aplicadas para os objectos rituais <strong>de</strong> ja<strong>de</strong>.<br />

Ao contrário do que acontecia com as<br />

pedras comuns, o ja<strong>de</strong> era consagrado<br />

apenas aos rituais sagrados ou para<br />

ornamento associado ao estatuto<br />

ou hierarquia social.<br />

A execução <strong>de</strong>stes objectos, pelas<br />

características especiais do ja<strong>de</strong> ao nível<br />

da dureza, implicava a existência <strong>de</strong> uma<br />

estrutura organizada <strong>de</strong> divisão <strong>de</strong> trabalho,<br />

envolvendo um número elevado<br />

<strong>de</strong> <strong>arte</strong>sãos especializados e com<br />

conhecimento no manuseio <strong>de</strong> ferramentas<br />

específicas para trabalhar o ja<strong>de</strong>.<br />

Presumivelmente, a maior p<strong>arte</strong> das<br />

ferramentas utilizadas para trabalhar o ja<strong>de</strong><br />

seriam feitas em ma<strong>de</strong>ira e em bambu,<br />

juntamente com abrasivos à base <strong>de</strong> areia,<br />

que permitiam perfurar e polir a superfície<br />

do objecto. Alguns arqueólogos sugerem<br />

a utilização <strong>de</strong> uma roda <strong>de</strong> esmeril,<br />

comummente <strong>de</strong>signada como pedra<br />

<strong>de</strong> amolar, montada num eixo mecanizado<br />

para cortar, <strong>de</strong>sbastar a superfície e <strong>de</strong>linear<br />

o perfil dos objectos. A fricção <strong>de</strong> cordas<br />

envolvidas numa pasta <strong>de</strong> esmeril e cristais<br />

<strong>de</strong> quartzo terá sido uma das técnicas<br />

<strong>de</strong> corte <strong>de</strong>senvolvidas pela cultura<br />

Hongshan, mas também utilizada<br />

posteriormente pela cultura Liangzhu<br />

(3200 - 2200 a. C.), que ocupou a actual<br />

área <strong>de</strong> Shanghai.<br />

A cultura Lianghzu, que emergiu<br />

na sequência do <strong>de</strong>clínio das culturas<br />

Majiabang (4000 - 3300 a. C.) e Songze,<br />

<strong>de</strong>senvolveu amplamente as técnicas <strong>de</strong><br />

trabalhar o ja<strong>de</strong>, sendo <strong>de</strong>sse período os<br />

bem conhecidos tubos prismáticos (cong)<br />

e inúmeros exemplares <strong>de</strong> discos <strong>de</strong> ja<strong>de</strong><br />

(bi), na sua maioria ornamentados<br />

com figuras e máscaras em alto-relevo.<br />

As longas perfurações dos cong e dos discos<br />

terão sido feitas com perfuradores <strong>de</strong><br />

bambu e uma mistura <strong>de</strong> água e quartzo,<br />

uma vez que estes objectos apresentam<br />

estrias elípticas ao longo da perfuração.<br />

Devido à enorme pressão exercida, a<br />

perfuração era feita alternadamente em<br />

cada um dos lados, evi<strong>de</strong>nciando uma<br />

protuberância mais ou menos a meio da<br />

abertura. A <strong>de</strong>scoberta <strong>de</strong> ferramentas em<br />

sílex e <strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> tubarão encontrados em<br />

escavações arqueológicas, junto a objectos<br />

<strong>de</strong> ja<strong>de</strong>, permite pensar que po<strong>de</strong>rão ter<br />

sido utilizados para a ornamentação<br />

e inscrição <strong>de</strong> marcas <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação<br />

dos clãs na superfície do ja<strong>de</strong>.<br />

As armas rituais e outros objectos<br />

ornamentais <strong>de</strong> ja<strong>de</strong> associados ao po<strong>de</strong>r<br />

espiritual e político, entre os quais os<br />

ceptros (zhang), os colares <strong>de</strong> contas<br />

e os peitorais (huang), tornam-se comuns<br />

durante o Neolítico recente, nomeadamente<br />

nas culturas Liangzhu, Shijiahe<br />

(2500 - 2200 a. C.) e Longshan<br />

(2500 - 2000 a. C.). Ao longo das margens<br />

do Rio Amarelo, nas actuais Províncias<br />

<strong>de</strong> Henan, Shanxi e Shandong, nas<br />

cerimónias rituais da cultura Longshan<br />

foram utilizadas armas <strong>de</strong> ja<strong>de</strong> em diversos<br />

formatos, <strong>de</strong>signadamente machados (kwei,<br />

yue e fu) e facas (dao). Normalmente,<br />

estas armas não aparentam sinais <strong>de</strong> uso,<br />

o que pressupõe que fossem utilizadas<br />

apenas nos sacrifícios durante os rituais<br />

ou presumivelmente como símbolos <strong>de</strong><br />

po<strong>de</strong>r. Efectivamente, a cultura Longshan<br />

constitui uma fronteira cultural entre<br />

o Neolítico e a Ida<strong>de</strong> do Bronze, que inicia<br />

aproximadamente por volta <strong>de</strong> 1700 a. C.<br />

com a <strong>de</strong>nominada cultura Erlitou,<br />

precisamente na mesma região ocupada<br />

pela cultura Longshan.<br />

88<br />

Acresce ainda o facto <strong>de</strong> que na cultura<br />

Erlitou e ao longo da dinastia Shang<br />

(1600 - 1045 a. C.) as armas rituais seguem<br />

os mo<strong>de</strong>los anteriores da cultura Longshan.<br />

Na realida<strong>de</strong>, enquanto durante o Neolítico<br />

os objectos <strong>de</strong> ja<strong>de</strong> são, na sua vasta<br />

maioria, objectos rituais que reflectem os<br />

aspectos relacionados com os mitos<br />

primordiais, do imaginário celestial e que<br />

indiciam a existência <strong>de</strong> práticas xamânicas,<br />

os ja<strong>de</strong>s das dinastias Shang e Zhou são<br />

objectos predominantemente ornamentais,<br />

auspiciosos e que procuram reflectir<br />

as virtu<strong>de</strong>s do homem que os ostenta.<br />

A emergência da autorida<strong>de</strong> política<br />

e <strong>de</strong> uma maior complexida<strong>de</strong> na<br />

organização social, através <strong>de</strong> um sistema<br />

<strong>de</strong> hierarquias <strong>de</strong>finidas com base na<br />

proximida<strong>de</strong> familiar ao lí<strong>de</strong>r do clã, dá<br />

lugar ao princípio do Mandato do Céu,<br />

isto é, aquele que governa sob consignação<br />

divina.<br />

Assim, durante os Shang e sobretudo<br />

os Zhou, os objectos <strong>de</strong> ja<strong>de</strong> constituem<br />

atributos da autorida<strong>de</strong> política, do estatuto<br />

social, da prosperida<strong>de</strong>, da hegemonia<br />

militar e das virtu<strong>de</strong>s morais da governação.<br />

A importância do ja<strong>de</strong>, associado às<br />

qualida<strong>de</strong>s transcen<strong>de</strong>ntais que lhe eram<br />

atribuídas pelos Shang, reflecte-se não<br />

só no <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> objectos<br />

aparentemente usados para observação<br />

astronómica e, consequentemente,<br />

vocacionados para a elaboração<br />

do calendário chinês, mas também<br />

na conservação e reconhecimento do valor<br />

ancestral <strong>de</strong> objectos <strong>de</strong> ja<strong>de</strong> <strong>de</strong> culturas<br />

do Neolítico. No túmulo da Princesa Fu<br />

Hao foram encontrados vários objectos<br />

<strong>de</strong> ja<strong>de</strong> das culturas Hongshan, Liangzhu<br />

e Longshan, alguns dos quais na forma<br />

<strong>de</strong> dragões, <strong>de</strong> pássaros e alguns cong<br />

com máscaras inscritas na superfície.<br />

A nosso ver, este facto significa que<br />

presumivelmente os Shang reconheciam,<br />

respeitavam e valorizavam o conhecimento<br />

e o pensamento mítico dos seus<br />

antepassados, reactualizando esse<br />

imaginário não só através do ja<strong>de</strong> mas<br />

sobretudo através dos recipientes rituais<br />

<strong>de</strong> bronze.<br />

89 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Apesar dos avançados conhecimentos<br />

sobre as técnicas <strong>de</strong> fundição do bronze<br />

e <strong>de</strong> uma reconhecida sofisticação artística<br />

não se verifica uma significativa inovação<br />

técnica ao nível da escultura <strong>de</strong> ja<strong>de</strong>.<br />

Mesmo as ferramentas utilizadas<br />

na agricultura e em outras activida<strong>de</strong>s<br />

continuam, durante a dinastia Shang,<br />

a ser produzidas em ma<strong>de</strong>ira.<br />

Mais tar<strong>de</strong>, o auge artístico<br />

e o domínio total das técnicas da execução<br />

<strong>de</strong> objectos <strong>de</strong> ja<strong>de</strong> coincidiram com<br />

o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> ferramentas<br />

em ferro, durante o início do Período<br />

dos Estados Combatentes (475 - 221 a. C.).<br />

Durante este período até à dinastia<br />

Han (206 a. C. - 220), o Confucionismo,<br />

o Taoismo e as virtu<strong>de</strong>s associadas à ética<br />

e à moral que lhes estão implícitas<br />

<strong>de</strong>sempenharam um papel vital no<br />

estabelecimento da Or<strong>de</strong>m. Os Clássicos<br />

<strong>de</strong>screvem como o ja<strong>de</strong> representava as<br />

cinco principais virtu<strong>de</strong>s inerentes à<br />

governação: a benevolência, a integrida<strong>de</strong>,<br />

a inteligência, a bravura e a confiança,<br />

e, por isso, todos os homens importantes<br />

e associados à elite <strong>de</strong>veriam usar objectos<br />

<strong>de</strong> ja<strong>de</strong>.<br />

No período subsequente à queda<br />

da dinastia Han e até à dinastia Tang<br />

(618 - 907), a importância do ja<strong>de</strong> <strong>de</strong>cresceu<br />

significativamente, na sequência da<br />

introdução do Budismo na China<br />

e da perda <strong>de</strong> influência do Confucionismo<br />

e do Taoismo junto das elites imperiais.<br />

Apenas a partir da dinastia Song<br />

(960 - 1279), com o ressurgimento da<br />

importância do Confucionismo pela mão<br />

dos gran<strong>de</strong>s filósofos Cheng Yi e Zhu Xi,<br />

é que o ja<strong>de</strong> voltou a ser apreciado pelos<br />

homens eruditos como um objecto com<br />

profundo valor simbólico. Os objectos<br />

<strong>de</strong> ja<strong>de</strong> fazem p<strong>arte</strong> dos gabinetes <strong>de</strong><br />

homens letrados, que se <strong>de</strong>dicavam<br />

à pintura, à caligrafia, à poesia, à filosofia,<br />

às questões centrais do pensamento,<br />

do Taoismo e do Confucionismo,<br />

coleccionavam estatuetas <strong>de</strong> ja<strong>de</strong> na forma<br />

<strong>de</strong> animais, flores que representavam<br />

símbolos auspiciosos associados à<br />

longevida<strong>de</strong>, à prosperida<strong>de</strong>, à fortuna<br />

e ao sucesso na carreira enquanto oficiais<br />

do Estado.


Posteriormente, durante as dinastias Ming<br />

(1368 - 1644) e Qing (1644 - 1911), sob<br />

a influência do contexto cultural dos Song,<br />

do surgimento do Neo-Confucionismo<br />

e da reformulação da organização do<br />

Estado, estes símbolos auspiciosos <strong>de</strong> ja<strong>de</strong><br />

elegantemente executados tornaram-se<br />

num dos mais apreciados objectos nos<br />

gabinetes dos homens letrados, como<br />

símbolo do seu próprio conhecimento.<br />

Ao longo das últimas dinastias, a gosto<br />

pelo ja<strong>de</strong> tornou-se cada vez mais um sinal<br />

<strong>de</strong> requinte, <strong>de</strong> conhecimento e <strong>de</strong> estatuto<br />

social, sendo utilizado nos mais diversos<br />

contextos da socieda<strong>de</strong>. A popularização<br />

do ja<strong>de</strong> foi inflamada pelo <strong>de</strong>senvolvimento<br />

das oficinas <strong>de</strong> produção que respondiam<br />

não só às encomendas <strong>de</strong> importantes<br />

figuras da socieda<strong>de</strong> chinesa mas também<br />

dos comerciantes e missionários europeus<br />

que também viram no ja<strong>de</strong> o material<br />

<strong>de</strong> eleição para a representação <strong>de</strong><br />

imaginária cristã utilizada no contexto<br />

das missões na China e no Japão e <strong>de</strong><br />

objectos exóticos enviados para figurarem<br />

nos gabinetes <strong>de</strong> curiosida<strong>de</strong>s das<br />

principais cortes europeias.<br />

Apesar disso, o ja<strong>de</strong> continuava a ser um<br />

privilégio da família imperial, ocupando<br />

um lugar especial nas colecções do Palácio,<br />

sobretudo durante o reinado <strong>de</strong> Qianlong.<br />

O gosto do imperador pelo ja<strong>de</strong> inspirou-o<br />

a compor poesias que versavam sobre as<br />

qualida<strong>de</strong>s da pedra, encorajou-o a planear<br />

campanhas militares para a pacificação<br />

<strong>de</strong> rebel<strong>de</strong>s na província <strong>de</strong> Xinjiang, com<br />

vista a garantir o acesso ao ja<strong>de</strong> proveniente<br />

do Khotan. Alguns dos poemas <strong>de</strong><br />

Qianlong, gravados nos próprios objectos<br />

<strong>de</strong> ja<strong>de</strong>, referem que o ja<strong>de</strong> não <strong>de</strong>veria ser<br />

<strong>de</strong>sperdiçado nas mãos <strong>de</strong> <strong>arte</strong>sãos comuns.<br />

As oficinas imperiais recrutavam apenas<br />

os artistas mais hábeis, capazes <strong>de</strong> retirar<br />

da pedra as formas mais belas e <strong>de</strong> recriar<br />

no ja<strong>de</strong> os mo<strong>de</strong>los dos objectos rituais<br />

<strong>de</strong> ja<strong>de</strong> e bronze da antiguida<strong>de</strong>, das<br />

porcelanas das dinastias Tang e Song<br />

e até da pintura das colecções imperiais.<br />

Rui Oliveira Lopes<br />

Bibliografia<br />

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Publishing, 2006.<br />

M. Sax, N. D. Meeks, C. Michaelson,<br />

A. P. Middleton,<br />

“The i<strong>de</strong>ntification of carving techniques on<br />

Chinese ja<strong>de</strong>”, Journal of Archaeological Science,<br />

31 (2004), pp. 1413-1428<br />

M. Sax, N. D. Meeks, J. Ambers, C. Michaelson,<br />

“The introduction of rotary incising wheels for<br />

working ja<strong>de</strong> in China”, P. Jett, (ed.) Scientific<br />

Research on the Sculptural Arts of Asia,<br />

Proceedings of the Forbes Symposium at the<br />

Freer Gallery of Art, Washington DC, (2005).<br />

Rawson Jessica (ed),<br />

Treasures from Shanghai. Ancient Chinese<br />

bronze and ja<strong>de</strong>s, London: The British Museum<br />

Press, 2009.<br />

90<br />

91 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Inv. CE03460<br />

Figura sentada Zoomórfica<br />

China, Cultura Hongshan<br />

(3500 a.C. - 2500 a.C.)<br />

Ja<strong>de</strong> Nefrite<br />

altura (10,1 cm), comprimento (4,2 cm),<br />

largura (3,8 cm)<br />

Zoomorphic seated figure<br />

China, Hongshan Culture<br />

(3500 BC - 2500 BC)<br />

Nephrite Ja<strong>de</strong><br />

height (10,1 cm), length (4,2 cm),<br />

width (3,8 cm)


Inv. CE03461<br />

Figura sentada Zoomórfica<br />

China, Cultura Hongshan<br />

(3500 a.C. - 2500 a.C.)<br />

Ja<strong>de</strong> Nefrite<br />

altura (9,1 cm), comprimento (4,9 cm),<br />

largura (3,5 cm)<br />

Zoomorphic seated figure<br />

China, Hongshan Culture<br />

(3500 BC - 2500 BC)<br />

Nephrite Ja<strong>de</strong><br />

height (9,1 cm), length (4,9 cm),<br />

width (3,5 cm)<br />

Inv. CE03462<br />

Figura sentada Zoomórfica<br />

China, Cultura Hongshan<br />

(3500 a.C. - 2500 a.C.)<br />

Ja<strong>de</strong> Nefrite<br />

altura (12 cm), comprimento (7 cm),<br />

largura (4,8 cm)<br />

Zoomorphic seated figure<br />

China, Hongshan Culture<br />

(3500 BC - 2500 BC)<br />

Nephrite Ja<strong>de</strong><br />

height (15,7 cm), length (5,6 cm),<br />

width (4,8 cm)<br />

92<br />

93 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Inv. CE03463<br />

Figura sentada Zoomórfica<br />

China, Cultura Hongshan<br />

(3500 a.C. - 2500 a.C.)<br />

Ja<strong>de</strong> Nefrite<br />

altura (15,7 cm), comprimento (5,6 cm),<br />

largura (3,7 cm)<br />

Zoomorphic seated figure<br />

China, Hongshan Culture<br />

(3500 BC - 2500 BC)<br />

Nephrite Ja<strong>de</strong><br />

height (15,7 cm), length (5,6 cm),<br />

width (3,7 cm)


Inv. CE03464<br />

Figura sentada Zoomórfica<br />

China, Cultura Hongshan<br />

(3500 a.C. - 2500 a.C.)<br />

Ja<strong>de</strong> Nefrite<br />

altura (12 cm), comprimento (4,6 cm),<br />

largura (5,3 cm)<br />

Zoomorphic seated figure<br />

China, Hongshan Culture<br />

(3500 BC - 2500 BC)<br />

Nephrite Ja<strong>de</strong><br />

height (12 cm), length (4,6 cm),<br />

width (5,3 cm)<br />

94<br />

Inv. CE03465<br />

Figura Zoomórfica<br />

em forma <strong>de</strong> anel<br />

China, Cultura Hongshan<br />

(3500 a.C. - 2500 a.C.)<br />

Ja<strong>de</strong> Nefrite<br />

altura (10,4 cm), comprimento (3,3 cm),<br />

largura (7,9 cm)<br />

Pig-Dragon<br />

China, Hongshan Culture<br />

(3500 BC - 2500 BC)<br />

Nephrite Ja<strong>de</strong><br />

height (10,4 cm), length (3,3 cm),<br />

width (7,9 cm)<br />

95 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Inv. CE01104<br />

Rithon<br />

China, Dinastia Qing (1644 - 1911)<br />

Serpentinite<br />

altura (10,3 cm), comprimento (19,8 cm),<br />

largura (7,8 cm)<br />

Rithon<br />

China, Qing Dynasty (1644 - 1911)<br />

Serpentinite<br />

height (10,3 cm), length (19,8 cm),<br />

width (7,8 cm)


Inv. CE00784<br />

Elefante carregando um macaco<br />

China, Dinastia Qing (1644 - 1911)<br />

Ja<strong>de</strong><br />

altura (25,3 cm), comprimento (12,2 cm),<br />

largura (4,9 cm)<br />

Elephant carrying a monkey<br />

China, Qing Dynasty (1644 - 1911)<br />

Ja<strong>de</strong><br />

height (25,3 cm), length (12,2 cm),<br />

width (4,9 cm)<br />

Inv. CE00759<br />

Xi Wang Mu.<br />

Rainha Mãe do Oci<strong>de</strong>nte<br />

China, Dinastia Qing (1644 - 1911)<br />

Ja<strong>de</strong><br />

altura (30,5 cm), comprimento (6,9 cm),<br />

largura (4,2 cm)<br />

Xi Wang Mu.<br />

Queen Mother of the West<br />

China, Qing Dynasty (1644 - 1911)<br />

Ja<strong>de</strong><br />

height (30,5 cm), length (6,9 cm),<br />

width (4,2 cm)<br />

96<br />

Inv. CE00758<br />

Lokapala<br />

China, Dinastia Qing (1644 - 1911)<br />

Ja<strong>de</strong><br />

altura (29,7 cm), comprimento (13,5 cm),<br />

largura (7 cm)<br />

Lokapala<br />

China, Qing Dynasty (1644 - 1911<br />

Ja<strong>de</strong><br />

height (29,7 cm), length (13,5 cm),<br />

width (7 cm)<br />

97 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong>


98<br />

escultura em pedra<br />

do gótico e do renascimento<br />

das igrejas e conventos<br />

<strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Com a colecção <strong>de</strong> imaginária medieval,<br />

renascentista e barroca, em pedra, em<br />

ma<strong>de</strong>ira e em terracota, que foi sendo<br />

recolhida na igreja <strong>de</strong> Nossa Senhora do<br />

Castelo a partir <strong>de</strong> 1922, o Museu D. Lopo<br />

<strong>de</strong> Almeida, aí instalado, podia apresentar,<br />

entre vários outros objectos <strong>de</strong> interesse,<br />

uma evolução da Escultura Portuguesa,<br />

do século XV ao século XVIII, com base<br />

em peças oriundas das igrejas e conventos<br />

extintos da cida<strong>de</strong>. Estas colecções serão,<br />

como já foi dito nas exposições anteriores,<br />

integradas no MIAA, pelo que, para esta<br />

IV Antevisão, <strong>de</strong>dicada aos materiais<br />

pétreos, seleccionámos um conjunto<br />

<strong>de</strong> estatuária e <strong>de</strong> escultura retabular<br />

em pedra dos séculos XV e XVI.<br />

Para além das duas esculturas acéfalas<br />

romanas que têm estado presentes na nave<br />

da igreja <strong>de</strong> Nossa Senhora do Castelo<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> a i Antevisão do MIAA e a que se<br />

acrescentam, para esta iv Antevisão, outras<br />

peças <strong>de</strong> origem clássica, encontramos,<br />

no altar-mor, um exemplar quase único<br />

<strong>de</strong> moldura gótico-manuelina, em ma<strong>de</strong>ira,<br />

<strong>de</strong> um retábulo quinhentista, ainda in situ<br />

(subsistindo, exposta ao lado, uma das<br />

pinturas que o integrou, uma belíssima<br />

Adoração dos Magos que atribuímos<br />

à oficina <strong>de</strong> Francisco Henriques, pintor<br />

luso-flamengo com activida<strong>de</strong><br />

documentada entre 1509 e 1518) em cujo<br />

nicho central se encontra o orago da igreja,<br />

Santa Maria do Castelo, eventualmente<br />

uma imagem anterior reutilizada ou talvez<br />

mesmo coeva da armação retabular.<br />

Trata-se <strong>de</strong> uma notável escultura, com<br />

vestígios do douramento e policromia<br />

originais, <strong>de</strong> uma Nossa Senhora da<br />

Conceição (sobre um crescente lunar),<br />

com o Menino ao colo, ostentando este um<br />

gesto que faz referência ao seu aleitamento,<br />

que já aproximámos da obra atribuída ao<br />

escultor <strong>de</strong> Coimbra Diogo Pires-o-Velho,<br />

documentado <strong>de</strong> 1473 a 1514, e que parece<br />

ser, iconografica e plasticamente, uma<br />

versão, em menor escala, da principal obra<br />

documentada do mestre, a Virgem com o<br />

Menino <strong>de</strong> Leça da Palmeira, encomendada<br />

por D. Afonso V em 1478 e concluída em<br />

1481.<br />

99 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Ligeiramente anterior é a imagem<br />

quatrocentista em pedra calcária que se<br />

expõe na transição da capela-mor para<br />

a nave: a Virgem do Leite, dada como<br />

proveniente da igreja <strong>de</strong> S. Vicente,<br />

que apresenta consi<strong>de</strong>rável dimensão<br />

e excelente qualida<strong>de</strong> plástica, com restos<br />

da policromia original, aproximando-se<br />

da obra atribuída ao escultor <strong>de</strong> Coimbra<br />

João Afonso, formado nos canteiros do<br />

Mosteiro da Batalha e autor <strong>de</strong> tumulária,<br />

retábulos e imaginária avulsa,<br />

nomeadamente <strong>de</strong> várias Virgens com<br />

o Menino, activo nas décadas centrais<br />

<strong>de</strong> Quatrocentos (cerca <strong>de</strong> 1436 a cerca<br />

<strong>de</strong> 1470).<br />

Já o São Brás, proveniente <strong>de</strong> igreja não<br />

especificada, integra-se na vasta produção<br />

das oficinas <strong>de</strong> Coimbra que copiavam,<br />

num registo «menor», os receituários<br />

figurativos dos principais mestres<br />

da centúria, os já referidos João Afonso<br />

ou Diogo Pires-o-Velho. De acordo com<br />

a sua legenda, S. Brás, protector contra<br />

as doenças <strong>de</strong> garganta, enverga traje<br />

episcopal e abençoa uma criança que se<br />

havia engasgado. Por seu turno, a Santa<br />

Mártir, proveniente da igreja <strong>de</strong> S. Vicente,<br />

apresenta, para além da palma do martírio,<br />

o atributo que a i<strong>de</strong>ntificaria mutilado,<br />

presumindo-se que possa ter sido Santa<br />

Luzia, protectora contra as doenças<br />

dos olhos, ou Santa Bárbara, patrona<br />

dos artilheiros. Integra-se na produção<br />

das oficinas secundárias <strong>de</strong> Coimbra<br />

que seguem a «maneira» do atrás<br />

mencionado escultor João Afonso.<br />

Da época do Renascimento, <strong>de</strong>stacamos<br />

três conjuntos <strong>de</strong> imagens em Pedra <strong>de</strong><br />

Ançã que terão pertencido a estruturas<br />

retabulares ou a portais ou até a arcos<br />

triunfais que integrassem nichos à maneira<br />

<strong>de</strong> retábulo.


A um primeiro conjunto, eventualmente<br />

um Apostolado <strong>de</strong> um portal ou <strong>de</strong> um<br />

retábulo, pertencem a excepcional escultura<br />

representando S. Bartolomeu e um outro<br />

Apóstolo – talvez S. Pedro – a que se po<strong>de</strong><br />

associar uma outra representando um<br />

Profeta ou um Rei Mago. A primeira citada<br />

documenta, no seu rigor plástico, na pose<br />

«serpentinata» e na ousada anatomia<br />

<strong>de</strong> «esfolado», a plena assimilação<br />

do Renascimento pelas oficinas <strong>de</strong><br />

Coimbra, resultante da activida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

escultores franceses na cida<strong>de</strong>,<br />

nomeadamente Nicolau Chanterene,<br />

<strong>de</strong> 1518 a 1528.<br />

Um segundo conjunto é formado<br />

pelas representações <strong>de</strong> três dos quatro<br />

Evangelistas. Ainda que as alegadas<br />

proveniências <strong>de</strong>stas peças não sejam<br />

coinci<strong>de</strong>ntes, as suas características<br />

materiais e iconográficas parecem indicar<br />

que pertenceram ao mesmo conjunto, <strong>de</strong><br />

que falta um quarto evangelista, S. Lucas,<br />

que faria par com o S. Marcos, constituindo<br />

o S. Mateus e o S. João o outro par,<br />

<strong>de</strong>finindo possivelmente registos<br />

sobrepostos <strong>de</strong> um portal ou <strong>de</strong> um<br />

retábulo. Em especial o S. João Evangelista<br />

reflecte, na caracterização individualizada<br />

e expressiva do rosto, a disseminação<br />

do gosto renascentista pelas oficinas<br />

<strong>de</strong> Coimbra que resultou da permanência<br />

nessa cida<strong>de</strong> do já citado escultor francês<br />

Nicolau Chanterene, <strong>de</strong> 1518 a 1528.<br />

O terceiro conjunto, que se apresenta<br />

pela primeira vez, é constituído por duas<br />

estátuas sem cabeça que, ao contrário<br />

das restantes mencionadas, não são<br />

<strong>de</strong> vulto perfeito mas sim meias figuras,<br />

o que indicia a sua integração em nichos<br />

<strong>de</strong> um portal ou arco triunfal ou em nichos<br />

secundários <strong>de</strong> um retábulo. O <strong>de</strong>sgaste<br />

patente numa <strong>de</strong>las dá a enten<strong>de</strong>r que<br />

talvez estivesse exposta aos elementos.<br />

Numa <strong>de</strong>las é discernível uma filactera,<br />

atributo habitual <strong>de</strong> profetas ou sibilas.<br />

Na outra parece divisar-se um animal<br />

aos pés da figura, o que apontaria para<br />

um dos quatro evangelistas.<br />

Finalmente, apresentam-se duas imagens<br />

quinhentistas já antes mostradas em<br />

Antevisões anteriores, uma Mater Dolorosa<br />

<strong>de</strong> um Calvário, conhecida popularmente<br />

por Nossa Senhora dos Remédios, e uma<br />

Santa que i<strong>de</strong>ntificamos como Santa<br />

Catarina, próxima da maneira da oficina<br />

coimbrã <strong>de</strong> João <strong>de</strong> Ruão.<br />

Fernando António Baptista Pereira<br />

Bibliografia<br />

AA. VV.<br />

Catálogos das Exposições <strong>de</strong> Antevisão do<br />

MIAA, Abrantes, CMA, 2009, 2010 e 2011.<br />

PEREIRA, José Fernan<strong>de</strong>s Pereira (coord.)<br />

Dicionário <strong>de</strong> Escultura Portuguesa, Lisboa,<br />

Caminho, 2005, (artigos sobre escultores da<br />

Ida<strong>de</strong> Média e do Renascimento assinados<br />

por FABP).<br />

BAPTISTA PEREIRA, Fernando António<br />

«O gosto artístico dos Almeidas» in Actas do<br />

Colóquio comemorativo dos 500 Anos do Estado<br />

Português da Índia, Abrantes, CMA, 2009.<br />

100<br />

Inv. CMA003<br />

Santa Mártir<br />

Coimbra, Portugal, século XV<br />

Pedra <strong>de</strong> Ançã<br />

altura (80 cm)<br />

comprimento (29 cm)<br />

largura (21 cm)<br />

Saint Martyr<br />

Coimbra, Portugal, 15th century<br />

Limestone<br />

height (80 cm)<br />

length (29 cm)<br />

width (21 cm)<br />

101 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong>


Inv. CMA004<br />

S. Brás<br />

Coimbra, Portugal, século XV<br />

Pedra <strong>de</strong> Ançã<br />

altura (68 cm), comprimento (24 cm),<br />

largura (18 cm)<br />

Saint Blaise<br />

Coimbra, Portugal, 15th century<br />

Limestone<br />

height (68 cm), length (24 cm),<br />

width (18 cm)<br />

Inv. CMA024<br />

Santa Catarina<br />

Coimbra, 1.ª meta<strong>de</strong> do século XVI<br />

Pedra <strong>de</strong> ançã<br />

altura (98 cm), comprimento (30 cm),<br />

largura (38 cm)<br />

Saint Catherine<br />

Coimbra, 1st half of the 16th century<br />

Limestone<br />

height (98 cm), length (30 cm),<br />

width (38 cm)<br />

102<br />

103 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Inv. CMA021<br />

Nossa Senhora do Leite<br />

Coimbra, Portugal, século XV<br />

Pedra <strong>de</strong> Ançã<br />

altura (102 cm), comprimento (35 cm),<br />

largura (40 cm)<br />

Lady and Child<br />

Coimbra, Portugal, 15th century<br />

Limestone<br />

height (102 cm), length (35 cm),<br />

width (40 cm)


Inv. CMA022<br />

S. Bartolomeu<br />

Coimbra, Portugal,<br />

1.ª meta<strong>de</strong> do século XVI<br />

Pedra <strong>de</strong> Ançã<br />

altura (76 cm), comprimento (13 cm),<br />

largura (20 cm)<br />

Saint Bartholomew<br />

Coimbra, Portugal,<br />

1st half of the 16th century<br />

Limestone<br />

height (76 cm), length (13 cm),<br />

width (20 cm)<br />

104<br />

Inv. CMA020<br />

São Mateus Evangelista<br />

Coimbra, 1.ª meta<strong>de</strong> do século XVI<br />

Pedra <strong>de</strong> ançã<br />

altura (115 cm), comprimento (31 cm),<br />

largura (18 cm)<br />

Saint Matthew Evangelist<br />

Coimbra, 1st half of the 16th century<br />

Limestone<br />

height (115 cm), length (31 cm),<br />

width (18 cm)<br />

105 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Inv. CMA028<br />

São João Evangelista<br />

Coimbra, 1.ª meta<strong>de</strong> do século XVI<br />

Pedra <strong>de</strong> ançã<br />

altura (114 cm), comprimento (35 cm),<br />

largura (22 cm)<br />

Saint John Evangelist<br />

Coimbra, 1st half of the 16th century<br />

Limestone<br />

height (114 cm), length (35 cm),<br />

width (22 cm)


Inv. CMA123<br />

Profeta (?)<br />

Portugal, 1.ª meta<strong>de</strong> do século XVI<br />

Pedra <strong>de</strong> ançã<br />

altura (71 cm), comprimento (29 cm),<br />

largura (17 cm)<br />

Prophet (?)<br />

Portugal, 1st half of the 16th century<br />

Limestone<br />

height (71 cm), length (29 cm),<br />

width (17 cm)<br />

106<br />

107 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Inv. CMA124<br />

S. Mateus Evangelista(?)<br />

Portugal, 1.ª meta<strong>de</strong> do século XVI<br />

Pedra <strong>de</strong> ançã<br />

altura (63 cm), comprimento (18 cm),<br />

largura (17 cm)<br />

Saint Matthew Evangelist (?)<br />

Portugal, 1st half of the 16th century<br />

Limestone<br />

height (63 cm), length (18 cm),<br />

width (17 cm)


fragmentos<br />

<strong>de</strong> um retábulo pétreo<br />

do renascimento<br />

Em meados do século xx, aquando da<br />

regularização do adro da igreja <strong>de</strong> S. João,<br />

em Abrantes, foram i<strong>de</strong>ntificados cerca<br />

<strong>de</strong> 20 fragmentos <strong>de</strong> pedra calcária, com<br />

<strong>de</strong>coração quinhentista. Esses fragmentos<br />

foram recolhidos nessa altura por Diogo<br />

Oleiro e levados para o Museu Lopo<br />

<strong>de</strong> Almeida. Apresenta-se nesta exposição<br />

a maior p<strong>arte</strong> <strong>de</strong>sses fragmentos.<br />

A <strong>de</strong>coração <strong>de</strong>stes fragmentos é bastante<br />

variada. Dois <strong>de</strong>les apresentam episódios<br />

narrativos. No mais interessante <strong>de</strong> todos<br />

vê-se uma cena da Via Sacra, com Cristo<br />

levando a cruz às costas e Santa Verónica<br />

beijando a túnica do Re<strong>de</strong>ntor e ostentando<br />

um pano com a Vera Efígie do Salvador.<br />

Na mesma cena, mas num segundo registo,<br />

um soldado parece agarrar outra figura<br />

(talvez Simão Cireneu). O outro fragmento<br />

<strong>de</strong> cena narrativa mostra Maria e João<br />

juntos, olhando para o alto, o que indicia<br />

estarem a presenciar a crucificação.<br />

Há mais fragmentos com restos <strong>de</strong> figuras<br />

<strong>de</strong> possíveis cenas narrativas mas <strong>de</strong><br />

momento impossíveis <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificar.<br />

Alguns dos fragmentos apresentam<br />

conchas <strong>de</strong> coroamento <strong>de</strong> nichos<br />

ou <strong>de</strong> frontões, enquanto outros<br />

apresentam diversas figuras humanas<br />

<strong>de</strong> difícil i<strong>de</strong>ntificação mas que fazem<br />

p<strong>arte</strong> dos mo<strong>de</strong>los habituais <strong>de</strong> <strong>de</strong>coração<br />

renascentista. De <strong>de</strong>stacar, ainda, nesse<br />

âmbito, um fragmento com um centauro,<br />

outro com um templete e ainda um outro<br />

com quatro cascos <strong>de</strong> um animal que seria<br />

um cavalo, mula ou burro.<br />

Não se conhece a origem dos fragmentos<br />

expostos, mas é bastante provável que<br />

pertençam a um retábulo que se encontrava<br />

no interior da igreja <strong>de</strong> S. João. De acordo<br />

com o Dicionário Geográfico do Padre Luís<br />

Cardoso, escrito em meados do século<br />

xviii, havia no interior da igreja <strong>de</strong> S. João,<br />

do lado do Evangelho, uma capela <strong>de</strong>dicada<br />

ao Santíssimo Sacramento, encontrando-se<br />

aí um retábulo <strong>de</strong> pedra (cujo para<strong>de</strong>iro era<br />

<strong>de</strong>sconhecido até à recolha dos fragmentos<br />

em meados do século xx) representando os<br />

Passos da Paixão <strong>de</strong> Cristo. Ora, pelo<br />

menos dois dos fragmentos <strong>de</strong> pedra<br />

parecem correspon<strong>de</strong>r a essa <strong>de</strong>scrição,<br />

pelo que se po<strong>de</strong> aceitar que vários <strong>de</strong>stes<br />

fragmentos pertenceram a esse retábulo,<br />

o qual foi removido da igreja talvez por<br />

se encontrar danificado, sendo então os<br />

mesmos enterrados no adro do templo.<br />

Tão pouco se conhece o autor do retábulo<br />

a que terão pertencido estes fragmentos,<br />

mas as suas características estilísticas<br />

sugerem a Escola <strong>de</strong> Coimbra e os meados<br />

ou segunda meta<strong>de</strong> do século xvi.<br />

A investigação em curso vai procurar<br />

esclarecer a estrutura narrativa e<br />

compositiva do retábulo, bem como a sua<br />

mais correcta datação e atribuição, tendo<br />

em conta a presença em Abrantes e no<br />

Sardoal <strong>de</strong> importantes escultores que<br />

estavam ocupados nas obras do Convento<br />

<strong>de</strong> Cristo, em Tomar, em meados<br />

<strong>de</strong> quinhentos.<br />

Gustavo Portocarrero<br />

Fernando António Baptista Pereira<br />

Fragmentos do retábulo<br />

da capela do Santíssimo<br />

Sacramento da igreja<br />

<strong>de</strong> S. João <strong>de</strong> Abrantes<br />

Coimbra, Portugal, século XVI<br />

Pedra <strong>de</strong> Ançã<br />

Fragments of retable<br />

of the church of S. João<br />

of Abrantes<br />

Coimbra, Portugal, 16th century<br />

Limestone<br />

Inv. CMA016a<br />

altura (79,5 cm), comprimento (63 cm),<br />

largura (30,5 cm)<br />

height (79,5 cm), length (63 cm),<br />

width (30,5 cm)<br />

Inv. CMA016b<br />

altura (67 cm), comprimento (47 cm),<br />

largura (32 cm)<br />

height (67 cm), length (47 cm),<br />

width (32 cm)<br />

Inv. CMA016c<br />

altura (69 cm), comprimento (46 cm),<br />

largura (22 cm)<br />

height (69 cm), length (46 cm),<br />

width (22 cm)<br />

Inv. CMA016d<br />

altura (53 cm), comprimento (43 cm),<br />

largura (16 cm)<br />

height (53 cm), length (43 cm),<br />

width (16 cm)<br />

Inv. CMA016e<br />

altura (47 cm), comprimento (45 cm),<br />

largura (35 cm)<br />

height (47 cm), length (45 cm),<br />

width (35 cm)<br />

Inv. CMA016f<br />

altura (66 cm), comprimento (56 cm),<br />

largura (20 cm)<br />

height (66 cm), length (56 cm),<br />

width (20 cm)<br />

Inv. CMA016g<br />

altura (85 cm), comprimento (34 cm),<br />

largura (36 cm)<br />

height (85 cm), length (34 cm),<br />

width (36 cm)<br />

Inv. CMA016h<br />

altura (54 cm), comprimento (44 cm),<br />

largura (23 cm)<br />

height (54 cm), length (44 cm),<br />

width (23 cm)<br />

Inv. CMA016i<br />

altura (34 cm), comprimento (85 cm),<br />

largura (35 cm)<br />

height (34 cm), length (85 cm),<br />

width (35 cm)<br />

Inv. CMA016j<br />

altura (39 cm), comprimento (55 cm),<br />

largura (30 cm)<br />

height (39 cm), length (55 cm),<br />

width (30 cm)<br />

Inv. CMA016l<br />

altura (41 cm), comprimento (57 cm),<br />

largura (35 cm)<br />

height (41 cm), length (57 cm),<br />

width (35 cm)<br />

Inv. CMA016q Inv. CMA016a<br />

108<br />

Inv. CMA016m<br />

altura (45 cm), comprimento (37 cm),<br />

largura (17 cm)<br />

height (45 cm), length (37 cm),<br />

width (17 cm)<br />

Inv. CMA016o<br />

altura (51 cm), comprimento (88 cm),<br />

largura (20 cm)<br />

height (51 cm), length (88 cm),<br />

width (20 cm)<br />

Inv. CMA016p<br />

altura (36 cm), comprimento (28 cm),<br />

largura (15 cm)<br />

height (36 cm), length (28 cm),<br />

width (15 cm)<br />

Inv. CMA016q<br />

altura (62 cm), comprimento (28 cm),<br />

largura (21 cm)<br />

height (62 cm), length (28 cm),<br />

width (11 cm)<br />

109 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Inv. CMA016r<br />

altura (40 cm), comprimento (32 cm),<br />

largura (22 cm)<br />

height (40 cm), length (32 cm),<br />

width (22 cm)<br />

Inv. CMA016s<br />

Dimensões: altura (24 cm), comprimento<br />

(24 cm), largura (12 cm)<br />

height (24 cm), length (24 cm),<br />

width (12 cm)


Inv. CMA016b Inv. CMA016c<br />

Inv. CMA016d Inv. CMA016e<br />

Inv. CMA016l Inv. CMA016m Inv. CMA016p Inv. CMA016o<br />

Inv. CMA016r Inv. CMA016s<br />

110<br />

Inv. CMA016f Inv. CMA016g<br />

Inv. CMA016h Inv. CMA016i Inv. CMA016j<br />

111 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong>


um relógio <strong>de</strong> sol<br />

<strong>de</strong> ch<strong>arte</strong>rs <strong>de</strong> almeida<br />

na capela-mor da igreja<br />

<strong>de</strong> santa maria do castelo<br />

Na exposição <strong>de</strong> Antevisão III, em que<br />

o fio condutor era o bronze como material<br />

inspirador da realização artística em<br />

diversos tempos e lugares, escolhemos três<br />

peças da primeira fase da obra <strong>de</strong> João<br />

Ch<strong>arte</strong>rs <strong>de</strong> Almeida, a que se<br />

convencionou chamar «dos bronzes»,<br />

em virtu<strong>de</strong> da predominância <strong>de</strong>ssa matéria<br />

como material <strong>de</strong>finitivo. Desta feita,<br />

perante a escolha da pedra como<br />

<strong>de</strong>nominador comum para os vários<br />

sectores da exposição da IV Antevisão, o<br />

próprio escultor sugeriu um Relógio <strong>de</strong> Sol,<br />

que <strong>de</strong>cidimos colocar no centro<br />

da capela-mor da igreja <strong>de</strong> Santa Maria<br />

do Castelo, num diálogo profícuo com<br />

os dois magníficos túmulos góticos dos<br />

Almeidas, longínquos antepassados<br />

do artista.<br />

Enquanto na fase «dos bronzes» (anos<br />

sessenta e setenta) o escultor estava<br />

interessado na flui<strong>de</strong>z das formas e dos<br />

contornos, a que não era estranho um certo<br />

organicismo prevalecente durante a sua<br />

formação, procurando uma certa<br />

dissolução do motivo mediante uma muito<br />

própria vibratilida<strong>de</strong> das superfícies aliada<br />

a uma acentuada <strong>de</strong>formação/re<strong>de</strong>finição<br />

figurativas que se não esgotavam num<br />

formalismo esteticista ou numa mera<br />

projecção gestual, antes traduziam<br />

uma vasta gama <strong>de</strong> temas e problemas.<br />

A partir dos anos oitenta, a obra <strong>de</strong><br />

Ch<strong>arte</strong>rs inflectiria noutras direcções,<br />

passando a preocupar-se mais<br />

<strong>de</strong>cisivamente com o volume e a utilizar<br />

novos materiais, como o ferro, o aço,<br />

a pedra e o betão, e re<strong>de</strong>finindo-se num<br />

quadro <strong>de</strong> abstracção geométrica e<br />

<strong>de</strong>puração formal <strong>de</strong> carácter conceptual<br />

e minimal.<br />

Um traço comum a todas as novas<br />

direcções que empreen<strong>de</strong>u, quer na<br />

escultura intimista, quer na <strong>arte</strong> para<br />

o espaço público, foi a absoluta assunção<br />

da geometria como matriz invariante<br />

no domínio do Tempo, essa mutabilida<strong>de</strong><br />

também absoluta. Assim surgiram<br />

os Relógios <strong>de</strong> Sol, na segunda meta<strong>de</strong><br />

dos anos 80, e, logo <strong>de</strong>pois, no início<br />

dos anos 90, os Diedros em Movimento,<br />

ambos <strong>de</strong> disciplina geométrica rigorosa,<br />

num esforço minimal <strong>de</strong> domínio do<br />

material, seja o mármore ou o metal,<br />

polido ou pintado, numa verda<strong>de</strong>ira<br />

cintilação da forma que transcen<strong>de</strong><br />

a matéria. Os Relógios <strong>de</strong> Sol, como<br />

o que se apresenta no centro da capela-mor,<br />

anunciavam, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo, nos seus <strong>de</strong>licados<br />

chanfros e na sua verticalida<strong>de</strong>, não apenas<br />

uma relação muito especial com o Astro<br />

Rei, assinalando, em sombras projectadas<br />

no solo, o seu curso, como se fossem raios<br />

<strong>de</strong> sol petrificados, como queriam os<br />

Antigos Egípcios que fossem os seus<br />

obeliscos, mas toda uma nova dimensão,<br />

espacial e territorial, que a escultura <strong>de</strong><br />

Ch<strong>arte</strong>rs <strong>de</strong> Almeida iria prosseguir<br />

até aos nossos dias, reinventando,<br />

na nossa imaginação, o espírito dos lugares.<br />

Assim o faz o Relógio <strong>de</strong> Sol agora<br />

colocado no centro do espaço sacro<br />

e funerário da capela-mor da igreja<br />

<strong>de</strong> Santa Maria do Castelo, reequacionando<br />

as variáveis verticalida<strong>de</strong>/horizontalida<strong>de</strong>,<br />

matéria e forma, tempo e eternida<strong>de</strong>.<br />

Fernando António Baptista Pereira<br />

112<br />

113 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong>


pedras, rochas<br />

e barreiras na pintura<br />

<strong>de</strong> maria lucília moita<br />

Como já foi afirmado em todos os<br />

Catálogos anteriores, no futuro MIAA,<br />

incluindo logo na primeira fase, que<br />

correspon<strong>de</strong> à recuperação e musealização<br />

do Convento <strong>de</strong> S. Domingos, a secção<br />

<strong>de</strong> Arte Contemporânea contemplará,<br />

principalmente, duas galerias <strong>de</strong>dicadas<br />

às colecções legadas ao Município <strong>de</strong><br />

Abrantes pelo Escultor Ch<strong>arte</strong>rs <strong>de</strong><br />

Almeida e pela Pintora Maria Lucília Moita.<br />

Na exposição Antevisão 1, apresentou-se,<br />

no coro-alto da igreja <strong>de</strong> Nossa Senhora<br />

do Castelo, uma curta selecção <strong>de</strong> obras<br />

dos dois artistas. Na mesma ocasião,<br />

foi inaugurada a impressionante Cida<strong>de</strong><br />

Imaginária Mar <strong>de</strong> Abrantes concebida<br />

por Ch<strong>arte</strong>s <strong>de</strong> Almeida na beira-Tejo,<br />

que, a partir <strong>de</strong> então, marcou a silhueta<br />

da cida<strong>de</strong> vista do rio.<br />

Na Antevisão 2, e no mesmo local<br />

da igreja do Castelo, privilegiou-se<br />

a pintura mais recente <strong>de</strong> Maria Lucília<br />

Moita, já realizada no século XXI<br />

e então ainda inédita, relacionando-a<br />

com segmentos do seu percurso anterior,<br />

sobretudo com a fase mais abstracta,<br />

dita «orgânica», dos anos setenta.<br />

Na Antevisão 3, escolhemos, para<br />

o mesmo local, outras importantes fases<br />

da obra <strong>de</strong> Maria Lucília Moita,<br />

a da chamada «reacção» à formação<br />

naturalista inicial da autora, <strong>de</strong> acentuada<br />

geometrização, e as imediatamente<br />

seguintes, em que a sua pintura enveredou<br />

pela experimentação e ten<strong>de</strong>u para um<br />

certo grau <strong>de</strong> abstracção, períodos que<br />

se documentavam através da paisagem<br />

e, sobretudo, do retrato que, a seu modo,<br />

respondiam aos fios condutores temáticos<br />

centrados na representação da figura<br />

humana e da Natureza que essa exposição<br />

valorizava.<br />

Nesta Antevisão 4, a primeira que<br />

se realiza após o falecimento da artista<br />

há poucos meses e que já não pô<strong>de</strong> contar<br />

com o seu sempre tão útil conselho,<br />

e novamente no Coro-Alto da igreja,<br />

<strong>de</strong>cidimos, <strong>de</strong> acordo com o fio condutor<br />

escolhido para a mostra, a pedra, privilegiar<br />

uma temática transversal a toda a obra<br />

<strong>de</strong> Maria Lucília Moita, a da representação<br />

ou evocação <strong>de</strong> pedras, rochas e barreiras,<br />

o que nos permite revisitar quase todo<br />

o seu percurso artístico.<br />

Ao longo da sua formação, realizada<br />

durante os já longínquos anos quarenta<br />

do século XX, Maria Lucília Moita<br />

absorveu as referências naturalistas que<br />

impunham um certo primado da visão<br />

exterior. Todavia, logo nas pinturas que<br />

apresentou nas suas primeiras exposições,<br />

a emergência <strong>de</strong> uma visão interiorizada<br />

do mundo visível dava os primeiros passos,<br />

pautando-se por uma busca da síntese<br />

espacial que se resolvia em gran<strong>de</strong>s planos<br />

<strong>de</strong> cor-luz. Contudo, tais realizações não<br />

satisfizeram a jovem artista e, vivendo num<br />

século <strong>de</strong> incessante experimentação<br />

<strong>de</strong> processualida<strong>de</strong>s, sentiu a necessida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> percorrer novos caminhos, que, por<br />

vezes, passaram pelo abandono temporário<br />

da pintura, em favor da poesia.<br />

A reacção à herança naturalista da sua<br />

formação culminou na exposição realizada,<br />

em 1960, na Galeria do Diário <strong>de</strong> Notícias,<br />

em Lisboa. Nela apresentou uma série<br />

<strong>de</strong> óleos marcados por uma acentuada<br />

geometrização da forma (que <strong>de</strong>finiu<br />

como uma «procura <strong>de</strong> estrutura,<br />

<strong>de</strong> síntese») reforçada por pinceladas<br />

incisivas dadas paralelamente e por opções<br />

cromáticas <strong>de</strong> tons puros e mais lisos,<br />

como nas Rochas <strong>de</strong> São Martinho<br />

do Porto, <strong>de</strong> 1959, com que se inicia<br />

o percurso, que mostra bem os caminhos<br />

<strong>de</strong> renovação que Maria Lucília tentava<br />

percorrer.<br />

114<br />

Contudo, ninguém pareceu enten<strong>de</strong>r<br />

essa busca <strong>de</strong> uma via própria, pelo que a<br />

artista acabou por achar que entrara numa<br />

«fase <strong>de</strong> dureza» em que não se reconhecia.<br />

A segunda fase experimentalista que<br />

se seguiu, no imediato regresso à pintura,<br />

a partir <strong>de</strong> 1962, conduziu a pintora<br />

à exploração do quadro como superfície,<br />

no trabalho sobre as texturas, exaltando<br />

o matérico da própria execução pictural.<br />

Nesta época, encontramos Maria Lucília<br />

interessada em temáticas paisagísticas mas<br />

observadas <strong>de</strong> muito perto, procurando<br />

capturar nas diferentes texturas <strong>de</strong> pedras,<br />

rochas e barreiras a linguagem própria<br />

<strong>de</strong> uma pintura executada à espátula<br />

e com o pincel duro que procura alcançar<br />

a dimensão <strong>de</strong> uma visão cada vez mais<br />

interiorizada e i<strong>de</strong>ntificada com a «escrita»<br />

do fazer pictórico(na expressão da própria<br />

pintora, «como que escrevendo»...).<br />

São exemplo <strong>de</strong>ssa <strong>de</strong>manda as<br />

composições Pedra Castanha, Pedras<br />

da Serra da Estrela e Intimida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pedra,<br />

todos <strong>de</strong> 1969, e Pedra e água e Brancos<br />

<strong>de</strong> Marvão no Inverno, <strong>de</strong> 1970.<br />

O <strong>de</strong>finitivo abandono da espátula<br />

e o regresso ao pincel haviam operado<br />

um efeito <strong>de</strong> síntese entre a experiência<br />

<strong>de</strong> geometrização da fase <strong>de</strong> revolta contra<br />

a pintura «aprendida» e a exploração<br />

matérica da escrita pictural que acabava<br />

<strong>de</strong> conquistar: em vários quadros<br />

dos inícios da década <strong>de</strong> setenta surgira<br />

uma pintura vigorosa <strong>de</strong> pinceladas largas,<br />

verticais ou horizontais, que prolongava<br />

e aprofundava uma visão cada vez mais<br />

analítica e quase microscópica da paisagem<br />

que vinha <strong>de</strong> trás e que antece<strong>de</strong>u a fase<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>sintegração figural que emergiria<br />

a partir <strong>de</strong> 1974 e representou o momento<br />

<strong>de</strong> maior aproximação à abstracção<br />

no itinerário da pintora.<br />

Se em Casas espectrais, <strong>de</strong> 1972, cujo título<br />

tem origem no verso <strong>de</strong> uma poesia<br />

publicada no ano anterior («casas espectrais<br />

em cal / <strong>de</strong>sapossada / tempos temporais»), a<br />

referência é, ainda, perceptível, embora em<br />

acentuada diluição, nas composições Sem<br />

Título <strong>de</strong> 1973 e 1979 que se apresentam o<br />

caminho da abstracção parece instalar-se.<br />

115 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

No termo <strong>de</strong> uma lenta reaprendizagem<br />

dos valores expressivos da própria matéria<br />

pictural, que se verificara nos inícios da<br />

década <strong>de</strong> setenta, a experiência <strong>de</strong> regresso<br />

ao pincel fê-la <strong>de</strong>sembocar, como acabamos<br />

<strong>de</strong> ver, num tratamento cada vez mais<br />

abstractizante da forma pictural.<br />

Em sucessivas composições que se<br />

esten<strong>de</strong>ram por vários anos e <strong>de</strong>finem uma<br />

abordagem que o saudoso Lima <strong>de</strong> Freitas<br />

viria a baptizar <strong>de</strong> «orgânica», <strong>de</strong>vido<br />

às sugestões <strong>de</strong> «órgãos» e <strong>de</strong> «tecidos<br />

celulares» que se <strong>de</strong>spren<strong>de</strong>m dos motivos,<br />

resultantes, na realida<strong>de</strong>, <strong>de</strong> uma visão cada<br />

vez mais próxima, <strong>de</strong> tipo microscópico,<br />

do próprio real, que, assim, se<br />

«<strong>de</strong>smaterializa», a pintora explora<br />

o “vazio” aparente da tela enquanto espaço<br />

<strong>de</strong> “achamento” da própria forma, que se<br />

torna assim fragmentária, imprecisa,<br />

fugidia, porque viva e quase incapturável<br />

pela cristalização do gesto pictórico,<br />

<strong>de</strong>s-figurando ou mesmo preten<strong>de</strong>ndo<br />

abolir a própria referência.<br />

Contudo, quer nesses anos, quer mesmo<br />

posteriormente, nunca Maria Lucília Moita<br />

seria consi<strong>de</strong>rada ou se consi<strong>de</strong>raria a si<br />

própria uma pintora verda<strong>de</strong>ira ou<br />

exclusivamente abstracta, tendo, por sinal,<br />

participado tanto na exposição Abstracção<br />

Hoje como na que se intitulou Figuração<br />

Hoje, ambas organizadas na Socieda<strong>de</strong><br />

Nacional <strong>de</strong> Belas Artes, a primeira em 1975<br />

e a segunda uns meses antes, em finais <strong>de</strong> 74.<br />

Por outro lado, em diversos textos poéticos<br />

que escrevera e reunira, em 1971, na<br />

colectânea Apertado mundo <strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro,<br />

essa <strong>de</strong>smaterialização da referência ou<br />

a própria fragmentação do gesto, fazendo<br />

emergir o suporte, fora já anunciada,<br />

encontrando o seu equivalente ao nível<br />

da poesia numa certa <strong>de</strong>sintegração<br />

da frase pela exploração expressiva<br />

do símbolo mínimo que é cada<br />

palavra-conceito, o que levou certos<br />

críticos a falarem numa aproximação (que<br />

não era senão intuitiva) ao «concretismo»<br />

minimalista e conceptual que impregnava<br />

a melhor poesia portuguesa <strong>de</strong> então.


Ao fim <strong>de</strong> poucos anos <strong>de</strong> <strong>de</strong>riva<br />

abstractizante e tendo sentido uma certa<br />

saturação, Maria Lucília Moita, sempre<br />

insatisfeita com o adquirido, reencontrou,<br />

no início da década <strong>de</strong> oitenta, a sua<br />

i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> a dois níveis, na estabilização da<br />

sua própria «escrita pictural», <strong>de</strong>pois<br />

<strong>de</strong> sucessivas experimentações, voltando<br />

a ocupar todo o espaço plástico do suporte,<br />

e no «regresso» aos seus «temas» <strong>de</strong><br />

sempre, em perfeita sintonia com o intenso<br />

lirismo que a Natureza sempre <strong>de</strong>spertou<br />

na sua apurada sensibilida<strong>de</strong>. Com efeito,<br />

ao sair do momento abstracto «orgânico»,<br />

Maria Lucília regressou a um novo tipo <strong>de</strong><br />

paisagismo, cada vez mais interior, apenas<br />

tornado possível por essa incontornável<br />

experiência <strong>de</strong> ascese formal que <strong>de</strong>finira<br />

o seu percurso imediatamente anterior.<br />

Noutro lugar <strong>de</strong>monstrámos que a pintura<br />

«<strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro» que Maria Lucília Moita<br />

sempre realizou mas principalmente<br />

aquela que nos últimos vinte e poucos anos<br />

apresentou respon<strong>de</strong>, <strong>de</strong> um modo faseado<br />

e na típica inquietu<strong>de</strong> do seu modo<br />

<strong>de</strong> «estar no mundo», a esse grandioso<br />

<strong>de</strong>si<strong>de</strong>rato comum ao Oriente<br />

e ao Oci<strong>de</strong>nte: pintar a inesgotável riqueza<br />

da paisagem interior.<br />

A reinvenção da paisagem na última<br />

fase da obra <strong>de</strong> Maria Lucília Moita está,<br />

finalmente, representada pelas obras<br />

Barreiras do Covão <strong>de</strong> Feto, <strong>de</strong> 1984,<br />

Da minha serra, <strong>de</strong> 1986, Das Carreiras,<br />

<strong>de</strong> 1989 e por Margens do Tejo, <strong>de</strong> 1995.<br />

Em todos eles, Maria Lucília Moita<br />

coloca-nos perante uma paisagem interior<br />

que é feita da sua comunhão multifacetada<br />

com o Mundo, um mundo que a pintora<br />

insistia em querer ver e ler como um<br />

poema.<br />

Fernando António Baptista Pereira<br />

Pedras <strong>de</strong> S. Martinho do Porto<br />

1959<br />

45x58<br />

Pedra Castanha<br />

1969<br />

40x48<br />

116<br />

117 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Intimida<strong>de</strong> da Pedra<br />

1969<br />

40x48<br />

[em baixo]<br />

Pedras e água<br />

1970<br />

60x46


(Brancos <strong>de</strong>)<br />

Marvão no Inverno<br />

1970<br />

60x46<br />

s/ título<br />

1979<br />

62x45<br />

Casas espectrais<br />

1972<br />

76x64<br />

s/ título<br />

1973<br />

45x33<br />

Barreira da minha serra<br />

1986<br />

60x46<br />

Barreiras do Covão do Feto<br />

1981<br />

61x46<br />

118<br />

Margens do Tejo<br />

(Abrantes)<br />

1995<br />

73x54<br />

119 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong><br />

Das Carreiras<br />

1987<br />

37x45


120<br />

121 <strong>museu</strong> <strong>ibérico</strong> <strong>de</strong> <strong>arqueologia</strong> e <strong>arte</strong> <strong>de</strong> <strong>abrantes</strong>

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