Descaminhos do acervo cultural fluminense - Inepac
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ARTIGOS SOBRE PATRIMÔNIO CULTURAL - Marcus Monteiro<br />
Roubos e furtos, omissão e descaso.<br />
<strong>Descaminhos</strong> <strong>do</strong> <strong>acervo</strong><br />
<strong>cultural</strong> <strong>fluminense</strong><br />
São sobejantemente conhecidas a magnitude <strong>do</strong> <strong>acervo</strong> <strong>cultural</strong><br />
<strong>fluminense</strong> e seu potencial turístico, bem como seu valor como<br />
instrumento de desenvolvimento social, entretanto, para que isso<br />
ocorra há de se canalizar recursos públicos e priva<strong>do</strong>s para o<br />
inventário, o restauro, a revitalização, a divulgação e a proteção <strong>do</strong><br />
que por décadas encontrou-se entregueà própria sorte.<br />
Constantemente somos surpreendi<strong>do</strong>s com casos de<br />
desaparecimentos de <strong>acervo</strong>s, normalmente roubos, furtos,<br />
favorecimento por conveniente negligência e em alguns casos com<br />
participação direta <strong>do</strong>s agentes responsáveis por sua guarda.<br />
Esse <strong>acervo</strong> por sua dupla natureza, patrimônio <strong>cultural</strong> e como mera<br />
merca<strong>do</strong>ria, tornou-se alvo de quadrilhas especializadas que cada vez<br />
mais nos impressionam com sua ousadia.<br />
Imagens religiosas e objetos liturgicos, principalmente de ouro e prata,<br />
mobiliário quadros e fragmentos de arquitetura, <strong>do</strong>cumentos e livros
aros, fotografias e mapas antigos e tu<strong>do</strong> mais, irão alimentar a<br />
insaciável demanda <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> de obras de arte e antiguidades.<br />
Gravuras e livros raros da biblioteca <strong>do</strong> museu nacional, mapas<br />
antigos e outras obras raras da mapoteca <strong>do</strong> Palácio <strong>do</strong> Itamaraty e<br />
recentemente exemplares únicos de fotografias antigas da Biblioteca<br />
Nacional desfalcam pela ação de "gatunos" essas preciosas coleções.<br />
Detentora de parte expressiva desse <strong>acervo</strong> as igrejas antigas tornamse<br />
alvo preferencial. Como exemplo citamos a Igreja de Nossa<br />
Senhora <strong>do</strong> Pilar, em Duque de Caxias, que teve grande parte de suas<br />
imagens vendidas pelo pároco e o restante furtadas, sen<strong>do</strong> a última,<br />
da padroeira, em 2001. Em seguida, desapareceram as colunas<br />
salomônicas e a frente <strong>do</strong> altar-mor e <strong>do</strong>is altares laterais tu<strong>do</strong><br />
entalha<strong>do</strong> e <strong>do</strong>ura<strong>do</strong> a ouro 24 quilates, obras raras <strong>do</strong> século XVII.<br />
Em 2003, foram furtadas <strong>do</strong> Museu de Inconfidência, em Paraíba <strong>do</strong><br />
Sul, as imagens de São José, São Tiago, São Sebastião e São<br />
Domingos, todas <strong>do</strong> século XVII, entalhadas policromizadas e<br />
<strong>do</strong>uradas, além de peças de ouro e prata.<br />
Também em 2003 foram furtadas da capela da Madre de Deus da<br />
antiga Fazenda da Posse, em Nova Iguaçu, as imagens da Sagrada<br />
Família da Antiga Sé. No centro da cidade <strong>do</strong> Rio de Janeiro, os<br />
criminosos furtaram durante as obras de restauração, castiçais de<br />
prata que formavam a banqueta <strong>do</strong> altar-mor.<br />
É importante destacar o fato de que boa parte de roubos e furtos não<br />
são comunica<strong>do</strong>s às autoridades, quer pelo descrédito das mesmas,<br />
quer pela conveniência de quem não deseja ser importuna<strong>do</strong> com os<br />
des<strong>do</strong>bramentos de um inquérito policial ou mesmo com a finalidade<br />
de acobertar o ilícito.<br />
Naturalmente a maioria das peças furtadas no esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Rio de<br />
Janeiro são revendidas em outros esta<strong>do</strong>s e até em outros países,<br />
especialmente Portugal, sen<strong>do</strong> portanto de difícil recuperação.<br />
Algumas sofrem modificações estilísticas, mutilações e repinturas para
dificultar sua identificação. No caso de <strong>do</strong>cumentos, livros, mapas,<br />
gravuras e fotografias que normalmente têm um simples carimbo<br />
como prova de propriedade, os próprios ladrões se especializaram em<br />
apagar estes registros.<br />
Apesar <strong>do</strong>s cuida<strong>do</strong>s, antiquários e coleciona<strong>do</strong>res sérios acabam<br />
fican<strong>do</strong> sob suspeição, vitimas também de comerciantes<br />
inescrupulosos que, ao receptarem peças de procedência duvi<strong>do</strong>sa,<br />
inundam e aviltam o merca<strong>do</strong> de arte brasileiro.<br />
àqueles que de forma simplista e injusta limitam-se a culpar os<br />
coleciona<strong>do</strong>res por serem o elo final dessa cadeia, devemos lembrar<br />
que seria impossível aquilatar a importância para o estu<strong>do</strong> e a<br />
preservação <strong>do</strong> <strong>acervo</strong> <strong>cultural</strong> brasileiro de coleciona<strong>do</strong>res como<br />
Raimun<strong>do</strong> Otonni de Castro Maia, Dom Clemente Maria da Silva<br />
Nigra, Francisco Marques <strong>do</strong>s Santos, Ricar<strong>do</strong> <strong>do</strong> Espírito Santo,<br />
Stanislaw Hestan, Mario de Andrade, Eduar<strong>do</strong> Etzel, Calouste<br />
Gulbenkian, João Marino, José Mindlin, Angela Gutierrez, Sérgio<br />
Fadel, Pierre Chalita, Ricar<strong>do</strong> Cravo Albin e tantos outros.<br />
Uma parceria entre os governos federal, estadual e municipais com o<br />
objetivo de inventariar to<strong>do</strong> esse <strong>acervo</strong> <strong>cultural</strong> crian<strong>do</strong>-se assim as<br />
condições necessárias de fiscalização, ajudariam muito.<br />
Esforço significativo vem sen<strong>do</strong> desenvolvi<strong>do</strong> pelo <strong>Inepac</strong> no senti<strong>do</strong><br />
de inventariar to<strong>do</strong>s os bens móveis e integra<strong>do</strong>s como objeto <strong>do</strong>s<br />
novos tombamentos de igrejas, capelas, sedes de fazendas e casas<br />
históricas, instrumentalizan<strong>do</strong> dessa forma o controle de peças<br />
fundamentais na compreensão e contextualização <strong>do</strong>s bens culturais.<br />
Com o patrocínio da fundação Vitae, o Iphan já está inventarian<strong>do</strong> o<br />
<strong>acervo</strong> existente no interior de igrejas e museus sob sua tutela.
Lamentavelmente, a maioria <strong>do</strong>s prefeitos <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Rio de Janeiro<br />
insistem que só será possível investir em preservação e proteção <strong>do</strong><br />
patrimônio <strong>cultural</strong> após o atendimento das necessidades básicas <strong>do</strong>s<br />
cidadãos (saúde, educação, saneamento básico e empregos)<br />
relegan<strong>do</strong> a cultura e to<strong>do</strong> o patrimônio material e imaterial que a<br />
representa a percentuais ínfimos de fictícias possibilidades<br />
orçamentárias, o que significa definitivamente condená-lo a mera<br />
lembrança.<br />
Por outro la<strong>do</strong>, o fato de haver cada vez mais pessoas preocupadas<br />
com o patrimônio local principalmente nas cidades <strong>do</strong> interior, nos leva<br />
a acreditar na inversão desse quadro de dependência exclusiva <strong>do</strong><br />
dinheiro público para a sua recuperação e proteção.<br />
O clamor da sociedade por uma política mais eficiente de preservação<br />
e proteção de bens culturais só será atendida com a reestruturação<br />
incluin<strong>do</strong> o devi<strong>do</strong> aparelhamento <strong>do</strong>s órgãos com jurisdição sob o<br />
patrimônio, carreamento <strong>do</strong>s recursos necessários ao cumprimento de<br />
suas atribuições e legislações modernas que atendam as questões<br />
que o desenvolvimento humano impõe.<br />
É importante referir que a minuta da nova lei estadual de patrimônio<br />
elaborada pelo Conselho Estadual de Tombamento e pelo <strong>Inepac</strong>, já<br />
se encontra em fase final de revisão pela procura<strong>do</strong>ria geral <strong>do</strong> esta<strong>do</strong><br />
deven<strong>do</strong> ser enviada a Alerj ainda este ano pela governa<strong>do</strong>ra Rosinha<br />
Garotinho.<br />
O substancial apoio <strong>do</strong> Secretário de Esta<strong>do</strong> de Cultura, Prof. Arnal<strong>do</strong><br />
Niskier, que destacou o patrimônio como vetor fundamental de política<br />
de cultura em sua gestão, tem si<strong>do</strong> fundamental na ação promovida<br />
pelo <strong>Inepac</strong> em prol da proteção <strong>do</strong> <strong>acervo</strong> <strong>cultural</strong> <strong>do</strong> Rio de Janeiro.<br />
Ao finalizar esta breve nota, ressaltamos o importante papel da<br />
sociedade <strong>fluminense</strong> na defesa desse precioso lega<strong>do</strong>, participan<strong>do</strong><br />
vigian<strong>do</strong> e denuncian<strong>do</strong> às autoridades competentes tu<strong>do</strong> aquilo que<br />
de uma forma ou de outra possa ameaçá-lo, nunca esquecen<strong>do</strong> da
grande responsabilidade que temos de transmiti-lo às nossas futuras<br />
gerações.<br />
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