VIVENTES DOS PANTANAIS E CERRADOS “LIVING ... - UFGD
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Universidade Federal da Grande Dourados<br />
para buscar o trilheiro dos bichos. A chuvinha fronteiriça<br />
rega a terra para que a semente da esperança brote e cresça<br />
livremente, produzindo fartura, fartura que traz alegrias e<br />
põe brilho de fé nos olhos do vivente... vivente que, de mãos<br />
postas, agradece a Deus, porque a chuva criadora choveu na<br />
hora certa, por vontade do Pai Eterno, que vela sempre pelo<br />
seus fi lhos amados. (SEREJO, 2008, p. 242-243).<br />
Um outro texto, digno de destaque, é “Apresentação” que, assim intitulado,<br />
abre a obra em análise, projetando-a no universo do discurso sobre o regionalismo<br />
sul-mato-grossense e marcando o registro peculiar dessas narrativas, ao recobrir<br />
como um todo o mesmo livro Fiapos de regionalismos, que hora abordamos:<br />
Este livrote pode servir aos estudiosos do gênero em alguma<br />
coisa. O autor acredita que assim venha a acontecer.<br />
A realidade está nele espelhada. É vivência nua e crua. Não<br />
há enfeites bombásticos, nem imagens literárias para impressionar<br />
o leitor. Homens entendidos das coisas do mundo<br />
da erva-mate e do idioma guarani manusearam os originais.<br />
Incentivaram de maneira franca o despretensioso escritor dos<br />
ervais. Daí a publicação. (SEREJO, 2008, p. 177).<br />
* * *<br />
Amplifi cando a caracterização do nosso personagem do erval, transmutado<br />
em autor-narrador, fi gurativização da voz serejiana, há que retomar a perspectiva<br />
dos Contos gauchescos, de Simões Lopes Neto, cujo herói, Jango Jorge, é descrito como<br />
o gaúcho que “tinha vindo das guerras do outro tempo; foi um dos que peleou na<br />
batalha do Ituzaingó [...]”, e é justamente a ele que seu Autor delega uma função<br />
indispensável no contexto do vasto pampa em que transcorrem as narrativas dos<br />
Contos gauchescos, numa ambiência e “fábula do lugar” que se pode transladar como<br />
citação de muitas falas do nosso narrador-autor, Hélio Serejo, que, como vimos nos<br />
excertos citados, frequentemente vai se mostrar como seguindo os ecos da voz e<br />
assim relendo aqueles Contos:<br />
Esse gaúcho desabotinado levou a existência inteira a cruzar<br />
os campos da fronteira: à luz do sol, no desmaiado da<br />
lua, na escuridão das noites, na cerração das madrugadas...;<br />
ainda que chovesse reiúnos acolherados ou que ventasse por<br />
alma de padre, nunca errou vau, nunca perdeu atalho, nunca<br />
desandou cruzada! (LOPES NETO, 1949, apud CHAVES,<br />
2006, p. 63).<br />
Devemos ainda chamar a atenção para o processo de colonização no Sul do<br />
estado de MS enquanto resultante de uma heterogeneidade cultural, como observa<br />
o historiador Jérri Marin. Segundo Marin (2004), esse processo muito decorreu das<br />
uniões matrimoniais inter-raciais, cuja mestiçagem torna-se um conceito crítico adequado<br />
para a explicação do caldo de cultura, que Lévi-Strauss atribuíra às “tradições<br />
102 Raído, Dourados, MS, v. 4, n. 8, jul./dez. 2010