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assento no coração, o principal centro do sangue. (Daí que Marco se refira por<br />
duas vezes à alma como «uma exalação do sangue».)<br />
Na hora aprazada, a Natureza desfaz os elementos materiais que compuseram<br />
o corpo, de modo a usá-los para outros fins; e isto é aquilo que conhecemos<br />
como morte. Quanto àquilo que acontece à ”ígnea partícula”, os Estóicos, como<br />
os Cristãos, não são unânimes. Todos concordam que mais tarde ou mais cedo<br />
ela terá de ser reabsorvida pelo Espírito-Fogo original, mas havia diferenças de<br />
opinião quanto à altura em que isso acontece. A doutrina mais antiga, a que<br />
Marco adere, era que, depois da dissolução do corpo, a alma continuava a viver<br />
nas regiões superiores do ar, e só era dissolvida de novo no Fogo-Mundo na<br />
conflagração final. Eram estes os ensinamentos de Cleanthes; Chrysipo, por<br />
outro lado, era de opinião que só as almas dos bons e dos sábios preservavam a<br />
sua identidade pessoal até ao fim do mundo, enquanto que aos maus e aos<br />
ignorantes era concedido apenas um curto período de sobrevivência antes da<br />
sua reabsorção. Outros pensadores consideravam que em todos os casos esta<br />
reabsorção se seguia imediatamente à morte; e ainda outros acreditavam num<br />
estado purgatorial no qual a alma sofria um processo de purificação física e<br />
moral como prelúdio da sua reunião com a substância-mundo.<br />
(c) A Ética. Os Estóicos ensinavam que o fim principal do homem, e o seu mais<br />
elevado bem, é a felicidade. Na sua visão, a felicidade era alcançada «vivendo<br />
de acordo com a Natureza». Esta famosa frase é muito facilmente mal<br />
interpretada pelo leitor moderno. Não significa viver uma vida simples, ou a vida<br />
do homem natural; e muito menos viver da maneira que muito bem queremos.<br />
Para apreender o seu significado, temos de nos lembrar que a “Natureza” é uma<br />
das designações dos Estóicos para o fogo divino que, além de criar todas as<br />
coisas, também as molda para os seus próprios fins. Assim, ela incarna a ideia<br />
que hoje nós exprimimos pela palavra “evolução”: o poeta americano que<br />
escreveu «Alguns chamam-lhe Evolução e outros chamam-lhe Deus» ficou<br />
muito perto da maneira de pensar dos Estóicos. Ela era a força que guiava e<br />
dirigia todos os tipos de crescimento ou desenvolvimento em direcção à<br />
perfeição final; e porque ela era também uma força viva, intencional e inteligente,<br />
os próprios Estóicos também, por vezes, lhe chamavam Deus. «Viver de acordo<br />
com a Natureza», portanto, não era uma máxima muito diferente da obrigação<br />
do Novo Testamento «Sede vós os seguidores de Deus», e implicava um ideal<br />
igualmente sublime e uma disciplina igualmente espinhosa.<br />
Se quisermos uma definição mais precisa desta “Vida Natural”, Marco diz que<br />
ela consiste, para cada criatura, numa estrita conformidade com o princípio<br />
essencial da constituição dessa mesma criatura. No caso do homem, este<br />
princípio essencial é a sua razão, que é parte da Razão universal. Desde que,<br />
portanto, ele siga esta lei racional do seu ser, aproxima-se da felicidade; se se<br />
afasta dela, não a alcançará. A Vida Natural é, de facto, a vida controlada pela<br />
razão; e tal vida é descrita, em resumo, como “virtude”. É o significado de virtude<br />
que explica o dogma estóico que diz que «a virtude é o único bem, e a felicidade<br />
consiste exclusivamente na virtude».<br />
A razão diz-nos claramente que algumas coisas estão no nosso poder e outras<br />
não. Por exemplo, a saúde física, a riqueza, os amigos, a morte, e outras deste<br />
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