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aqui - História da Medicina

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38<br />

ain<strong>da</strong> que implicitamente, à existência de um Serviço<br />

de Saúde. Em to<strong>da</strong>s as exigências do Exposto só<br />

vemos o facultativo a atestar despesas e, mesmo<br />

assim, só em intenção.<br />

Esta análise do Exposto permite-nos, contudo,<br />

saber ou deduzir alguns aspectos pertinentes no<br />

campo <strong>da</strong> medicina <strong>da</strong> época: a existência de serviço<br />

de vacinação obrigatório e parece que geral, mas não<br />

se fala no tipo de vacinas que certamente distintos<br />

médicos <strong>aqui</strong> prontos saberão pormenorizar; que<br />

seriam vulgares doenças contagiosas (julgo que a mais<br />

perigosa e que a lei visava era a tuberculose de que<br />

morreu, nessa época, Júlio Dinis); a vulgari<strong>da</strong>de de<br />

doenças venéreas em mulheres o que a verificar-se<br />

representava uma chaga social a não negligenciar.<br />

Esta degra<strong>da</strong>ção moral frequente de muitas mulheres<br />

está ain<strong>da</strong> expressa na passagem do regulamento<br />

que refere “...deve providenciar-se para que sem ofensa<br />

do sexo e sem perturbação <strong>da</strong>s famílias honestas, as<br />

mulheres grávi<strong>da</strong>s sejam vigia<strong>da</strong>s, a fim de se evitar<br />

infanticídios e abusos de criação...”. O aborto seria<br />

pois um recurso vulgar com que as autori<strong>da</strong>des não<br />

concor<strong>da</strong>vam. Definitivamente, o Exposto era um ser<br />

entre a vi<strong>da</strong> e a Morte à nascença por impossibili<strong>da</strong>de<br />

de a mãe a criar, por motivos económicos ou sociais<br />

e morte na Ro<strong>da</strong> por abuso, incúria e corrupção que<br />

levava os míseros dinheiros destinados a ela, e a ter<br />

que se colocar à porta <strong>da</strong>s igrejas na caixa <strong>da</strong>s<br />

esmolas para Expostos.<br />

Fica-nos mesmo a ideia de que to<strong>da</strong>s as enti<strong>da</strong>des<br />

administrativas, menos os legisladores, ficavam felizes<br />

pelo desaparecimento dos Expostos e os facultativos<br />

eram postos com naturali<strong>da</strong>de à margem porque<br />

certamente não pactuariam com este estado de<br />

coisas, se chamados a intervir activamente.<br />

No ano de 1840, algumas câmaras como a de Braga,<br />

que se escusavam a pagar as suas quotas de<br />

Expostos, estranha e paradoxalmente, propuseram a<br />

legalização do que vinham praticando-a administração<br />

<strong>da</strong> Ro<strong>da</strong> poder receber até 10 filhos de pessoas<br />

miseráveis e indigentes, alimentandos-os durante um<br />

ano com leite, ao que Sua Magestade a Rainha<br />

respondeu negativamente pois isso iria prejudicar os<br />

Expostos.<br />

E é neste contexto de total desprezo por esta figura<br />

social, que ela luta naturalmente pela vi<strong>da</strong>, em<br />

condições de luta tão desiguais, que só por milagre<br />

vence nesta selecção natural duríssima .<br />

Mas alguns milagres sucederam mesmo! Quatro<br />

anos depois foi publicado o Regulamento <strong>da</strong><br />

Administração dos Expostos e Crianças Subsidia<strong>da</strong>s<br />

do Distrito de Castelo Branco que é claramente um<br />

avanço sobre o anterior, relativamente ao papel do<br />

facultativo. A Ro<strong>da</strong> termina e agora ao Exposto juntase<br />

a figura de “criança subsidia<strong>da</strong>”, filha de pessoas<br />

sem posses, na linha do que as autori<strong>da</strong>des<br />

pretendiam há anos, mas à custa do que se destinava<br />

ao Exposto e que o Regulamento de então não<br />

permitia.<br />

As crianças expostas em qualquer lado eram<br />

apresenta<strong>da</strong>s nas Câmaras Municipais que as<br />

entregavam directamente a amas de “amamentação<br />

provisória” para prover as primeiras e vigentes<br />

necessi<strong>da</strong>des dos Expostos e depois passavam a<br />

amas definitivas que, agora sim, deveriam ter<br />

informação do facultativo sobre se tinha ou não<br />

moléstias contagiosas. As amas definitivas eram<br />

obriga<strong>da</strong>s a apresentar as crianças para serem<br />

vacina<strong>da</strong>s, logo que recebessem aviso e, em caso de<br />

falecimento, participar aos regedores, apresentar a<br />

carta de criação ao pároco para, no verso, passar a<br />

certidão de óbito que, continua a não ser uma<br />

prerrogativa do facultativo.<br />

Continua o novo Regulamento a impor que,<br />

mensalmente, as crianças sejam observa<strong>da</strong>s no acto<br />

de pagamento à ama mas agora a criança é<br />

apresenta<strong>da</strong> ao Presidente <strong>da</strong> Câmara, aos facultivos<br />

municipais, além de outras personali<strong>da</strong>des.<br />

Os médicos municipais examinavam as amas e as<br />

crianças e propunha as diligências que julgassem<br />

convenientes, relativas à alimentação e tratamento <strong>da</strong>s<br />

crianças, opinião que ficava exara<strong>da</strong> em termo próprio.<br />

Estas preocupações agora tão claramente expressas<br />

mais reforçam as considerações negativas que<br />

exprimimos para o período anterior. Parecendo<br />

insignificantes eram de fundo e correspondiam, na sua<br />

essência, à plenitude do médico assumido<br />

administrativamente, de um médico que nos aparece<br />

como médico público e municipal, mu<strong>da</strong>nça<br />

institucional que não deontológica pois a deontologia<br />

médica não está em causa, uma vez que já no séc.<br />

XVI, Amato Lusitano vinca bem a sua preocupação<br />

por uma ética profissional no juramento com que<br />

finaliza a VlIª Centúria. Não se compreenderia que<br />

350 anos depois esse sentimento ético não estivesse<br />

bem arreigado nos professionais <strong>da</strong> saúde.<br />

Esta mu<strong>da</strong>nça do estatuto do facultativo,<br />

corresponde claramente a uma melhoria na condição<br />

dos Expostos, conforme comprovam documentos de<br />

outras regiões, já que não me foi possível detectar<br />

<strong>da</strong>dos <strong>da</strong> nossa região.<br />

É a exaltação do facultativo que se extrai dos dois<br />

documentos que muito nos apraz registar nesta<br />

reunião de História <strong>da</strong> <strong>Medicina</strong>.<br />

3. Análise de livros de registos<br />

Passamos agora a debruçar-nos sobre o primeiro<br />

Livro de Registos de Expostos <strong>da</strong> Câmara Municipal<br />

de Castelo Branco do ano de 1782, anterior ao<br />

estabelecimento <strong>da</strong> Ro<strong>da</strong> na nossa ci<strong>da</strong>de.<br />

A simples existência deste livro mostra que, mesmo<br />

antes <strong>da</strong> oficialização <strong>da</strong> instituição, a Câmara Municipal<br />

era já a responsável pelo registo, controle e<br />

despesas dos Expostos.

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