Reflexões sobre a PESQUISA QUALITATIVA & QUANTITATIVA ...
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Reflexões <strong>sobre</strong> a <strong>PESQUISA</strong> <strong>QUALITATIVA</strong> & <strong>QUANTITATIVA</strong>:<br />
Maneiras complementares de apreender a Realidade<br />
Fernando A C Bignardi<br />
Contexto histórico<br />
A espécie humana, bem como vários outros seres vivos são movidos pela curiosidade.<br />
Este comportamento é responsável por boa parte da capacidade de <strong>sobre</strong>vivência da espécie. Nos<br />
seres humanos o desenvolvimento cerebral, notadamente dos lobos temporais, possibilitou<br />
acumular memória, que aliada ao raciocínio das áreas integrativas, como os lobos frontais,<br />
conferem ao Homem a capacidade de perceber e interpretar a realidade, elaborando teorias<br />
para compreendê-la.<br />
Enquanto a percepção se alicerça nos sentidos (visão, audição, etc), a interpretação<br />
depende de valores culturais éticos e morais. A complexidade deste fato nos remete à<br />
função cerebral ativada no momento da observação, isto é, o observador pode evocar áreas<br />
cerebrais que funcionam em freqüências mais lentas como as ondas eletroencefalográficas teta e<br />
delta, relacionadas à criatividade e a contemplação, ou seja, a um estado de unicidade com o<br />
Todo, onde sujeito e objeto ocupam a mesma dimensão e praticamente são Um; ou o cérebro<br />
pode estar funcionando por meio de ondas beta, relacionadas à vigília e ao raciocínio lógico,<br />
separando o sujeito do objeto de pesquisa.<br />
Estas duas situações polares encerram um espectro intermediário de possibilidades<br />
de apreensão da Realidade, que, obviamente sofre ainda a influencia dos valores éticoculturais<br />
do observador.<br />
Alguns estudos antropológicos sugerem que a espécie humana era originariamente<br />
matriarcal, vivendo em agrupamentos que coletavam alimentação de forma pacífica, a<br />
semelhança dos contemporâneos Bonobos (raça de chipanzés vegetarianos e pacíficos). O<br />
advento da agricultura e da posse da terra valorizou a força dos machos como defensores do<br />
território, possibilitando o surgimento do patriarcado com sua atitude de dominância em relação<br />
à Natureza e até mesmo em relação à mulher.<br />
Este contexto iniciou um processo de interpretação da Realidade embasado numa<br />
divisão Homem/Natureza e Mente/Corpo, que alcançou seu auge no Ocidente, com a Inquisição,<br />
conduzida pela Igreja Católica, impondo hegemonicamente, que aos leigos restasse apenas a<br />
dimensão material da Realidade, erradicando da civilização ocidental a diversidade cultural,<br />
criando assim as condições para o surgimento da Ciência restrita a Matéria.<br />
Newton foi um exemplo de um observador mergulhado nos valores desta época: lançou<br />
as bases de uma Física que acreditava ser a Realidade o resultado da ação de um conjunto de<br />
Leis imutáveis, cujo conhecimento, possibilitava prever com exatidão os fenômenos.<br />
A Física newtoniana dominou o contexto científico até o final do século passado.<br />
Neste contexto polarizado entre certo e errado, entre dominante e dominado, prevalecia<br />
a dúvida e o principal objetivo da pesquisa era produzir a certeza nascida da<br />
reprodutibilidade dos resultados, sugerindo a descoberta de Leis Universais!<br />
Somente com Einstein há cerca de um século, a dimensão imaterial (energia) é<br />
resgatada pelo domínio científico. Surge a Física Quântica, que começa a compreender a<br />
incerteza inerente aos fenômenos e reconhece que a Realidade é um “caldo” complexo de<br />
possibilidades que colapsam como objetos perceptíveis na dependência de um arcabouço<br />
informacional.<br />
Talvez, esta intrincada e complexa rede de informações que sustenta a Realidade<br />
perceptível aos nossos sentidos, seja o que se convencionou chamar de Deus: “no princípio era o<br />
Verbo e este se fez Carne” (Evangelho de João).<br />
Poderíamos dizer que a Informação transita verticalmente permeando a<br />
horizontalidade dos vários níveis de Realidade. Talvez seja este o motivo de ser o símbolo<br />
da cruz tão atraente para a humanidade.<br />
Acreditamos que o simples fato de termos consciência da complexidade dos fenômenos<br />
nos tornaria melhores pesquisadores e atores mais conseqüentes no manejo de nosso cotidiano<br />
social e ambiental. O verdadeiro respeito nasce no cerne da UNICIDADE.<br />
A Metodologia de Pesquisa
A Pesquisa Qualitativa parece ter vocação para mergulhar na profundidade dos<br />
fenômenos. Faz isto de forma compreensiva, abrindo-se para apreender a egrégora informacional<br />
subjacente ao fenômeno, leva em conta toda a sua complexidade e particularidade. Não<br />
almeja alcançar a generalização, mas sim o entendimento das singularidades.<br />
Muitas culturas, como a tibetana, onde o poder patriarcal não se tornou tão<br />
pronunciado, e o senso de unicidade se perpetuou, desenvolveram e aprimoraram formas de<br />
apreender e pesquisar a Realidade alicerçadas na senso-percepção consensual, isto é, no<br />
consenso obtido da percepção de vários indivíduos da comunidade diante de um mesmo<br />
fenômeno. Não é considerada a possibilidade de Fraude, que se origina na disputa pelo Poder. No<br />
Ocidente contemporâneo assiste-se, com freqüência a produção de resultados de pesquisas<br />
manipulados pelos interesses mais variados, obrigando a Ciência a criar mecanismos de defesa<br />
contra as fraudes que fazem parte dos valores culturais vigentes.<br />
A Pesquisa Quantitativa aplica-se à dimensão mensurável da realidade, origina-se<br />
na visão newtoniana dos fenômenos e transita com eficácia na horizontalidade dos extratos mais<br />
densos e materiais da Realidade. Seus resultados auxiliam o planejamento de ações coletivas e<br />
produz resultados passíveis de generalização, principalmente quando as populações pesquisadas<br />
representam com fidelidade o coletivo.<br />
Exemplos<br />
A Qualidade de Vida é um conceito que se manteve impreciso e imensurável até<br />
recentemente. A medida em que o fenômeno passou a ser investigado por meio de Questionários<br />
e Grupos Focais, numa abordagem Qualitativa, foi progressivamente possível compreender sua<br />
intimidade a ponto de se desenvolver instrumentos capazes de mensurar a subjetividade<br />
envolvida no sentido da Qualidade de Vida. Dessa forma foram obtidos o WHOQOL (World Health<br />
Organization Quality of Life instrument), instrumento construído em âmbito mundial, pela<br />
Organização Mundial de Saúde; e o SF 36 (Short Form com 36 itens) concebido nos EUA, que foi<br />
adaptado e validado para outras línguas. Este último instrumento evidencia o impacto da Saúde<br />
nas atividades diárias e no Bem Estar. Foi desenvolvido a partir de um Questionário com mais de<br />
200 itens que foram sendo selecionados segundo sua capacidade de discernimento e<br />
mensuração.<br />
Com o auxilio destes recursos métricos tem-se demonstrado a ação de intervenções<br />
imateriais, como a Homeopatia, atuando na Qualidade e Sentido de Vida de idosos<br />
homeopatizados; estas respostas do terreno biológico eram dificilmente evidenciáveis antes do<br />
advento destes instrumentos nascidos da sinergia entre a metodologia Qualitativa e a<br />
Quantitativa.<br />
Por outro lado, temos na agricultura uma situação oposta onde a abordagem<br />
Quantitativa alienada tem se demonstrado imprópria.<br />
Com o intuito de aumentar a produção de alimentos em quantidade, a qualidade dos<br />
mesmos tem sido essencialmente afetada. Isto se deve a aplicação de tecnologia agrícola<br />
desenvolvida para o clima temperado (onde a aração tem a capacidade de trazer para a<br />
superfície a vitalidade do solo que ficou latente a 40 cm de profundidade sob a cobertura de neve<br />
do inverno) em áreas tropicais onde a camada vital está à flor do solo protegida pela sobra da<br />
cobertura vegetal. As populações nativas dos Trópicos aprenderam ancestralmente a fazer plantio<br />
direto (sem o uso do arado) por perceberem que o solo exposto ao sol dos trópicos perde a sua<br />
fauna e flora, responsável pela capacidade de converter a matéria orgânica em sais minerais que<br />
alimentam as plantas.<br />
Para solucionar quantitativamente o problema, a tecnologia alienada, a serviço do poder<br />
dominador da Natureza, opta por alimentar as plantas com adubos químicos, gerando plantas<br />
com deficiências nutricionais que, por sua condição, atraem os organismos reguladores da<br />
Natureza, que passam a ser tratados com agrotóxicos conceituados como Pragas.<br />
O resultado desta forma de Agricultura é um alimento micro desnutrido e intoxicado que<br />
estende esta mesma condição ao ser que dele se nutre; surge assim o ser humano<br />
metabolicamente desequilibrado que tem sido diagnosticado pela Ortomolecular.<br />
Este é um exemplo onde o desrespeito a sabedoria ancestral em nome do “saber”<br />
hegemônico, planeja estratégias alicerçadas em dados quantitativos em detrimento da<br />
compreensão qualitativa fenomenológica.
Medidas deste tipo desconsideram a complexidade da relação ser humano / meio<br />
ambiente e da dimensão sócio cultural. Demonstram por meio de avaliações estatísticas a<br />
supremacia da tecnologia hegemônica <strong>sobre</strong> a ancestral, entretanto desconsideram o prejuízo<br />
sócio ambiental decorrente, como: a desertificação conseqüente a salinização do solo, a ruptura<br />
de ciclos da biodiversidade, fundamentais para a <strong>sobre</strong>vivência do Planeta como um todo e das<br />
próprias populações autóctones. Qualificam-se estes modelos como lucrativos, mas na verdade<br />
este pretenso lucro decorre dos prejuízos que sobram para a conta do poder público, na forma de<br />
catástrofes ambientais e sociais.<br />
Estas distorções só acontecem porque o senso de Unicidade foi perdido, cedendo lugar<br />
ao materialismo reducionista e alienado da complexidade natural dos fenômenos.<br />
Entendemos, portanto, que a realidade só pode ser apreendida em sua complexidade<br />
com metodologias de pesquisa que tenham por meta alcançar a verticalidade informacional da<br />
intimidade dos fenômenos aliada a mensuração e tradução matemática da horizontalidade dos<br />
mesmos.