10.07.2015 Views

INVESTIGACOES - Revista Investigações

INVESTIGACOES - Revista Investigações

INVESTIGACOES - Revista Investigações

SHOW MORE
SHOW LESS
  • No tags were found...

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

<strong>INVESTIGACOES</strong> ,-Lingtiistica eTeoria Literaria-VOL. 1IfItIAngela DIonisioAcefVO Pessoa\PROGRAMA DE POS-GRADUA(jAoEM LETRAS E L1NGOfSTICAUniversidade Federal de PernambUco


REITOR DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO:Dr. Edinaldo BastosPRO-REITOR DE PESQUISA E POS-GRADUACAO DA UFPE:Dr. Yony SampaioCOORDENADORA DO PROGRAMA DE POS-GRADUACAO EMLETRAS E LINGUISTICA:Marigia VianaPROGRAMA DE POS-GRADUACAO EM LETRASE LINGOISTICANIVEL DO CURSO:MestradoAREAS DE CONCENTRACAO:Linguistica eTeoria da LiteraturaPROGRAMA DE POS-GRADUACAO EM LETRAS E LINGUISTICADEPARTAMENTO DE LETRASCENTRO DE ARTES E COMUNICACAOUNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO50.000 RECIFE PETelefone: 271.22.11,R.2312


Este volume, que d~ inicio ~ serle "<strong>INVESTIGACOES</strong>", tem porobjetivo divulgar trabalhos de pesquisas em andamento noPrograma de P6s-Gradua~ao em Letras e Linguistica da UFPE, bemcomo apresentar os resultados de pesquisas concluidas.Os artigos aqui apresentados inserem-se nas diversas linhasde pesquisa do Programa de P6s-Gradua~ao, dentro de suas duasAreas de Concentra~ao: Linguistica e Teoria da Literatura. Naarea de Linguistica estao representadas as seguintes Linhas dePesquisa: (a) Descri~ao de Linguas Indigenas (com 0 trabalho deA. Pal~cio sobre a Flexao do Guato); (b) Organiza~ao Linguisticada Produ~ao Oral e Escrita (em que estao as pesquisas sobreLinguagem e Sexo, de J. Hoffnagel e E. Marcuschi; Analise daLingua Oral, de J.C. Gon~alves; Rela~oes de Poder em Intera~oesAssimetricas, de L.A. Marcuschi e Padroes Entoacionais na Compreensaode Texto, de M. Viana); (c) Linguistica Aplicada (como trabalho de F. Gomes de Matos sobre Gramatica e decisoesLinguisticas). Na Area de Concentra~ao da Teoria da Literaturaesta presente a Linha de Pesquisa Literatura Comparada (com 0trabalho de S. Joachin sobre a Leitura Multi-Angular da Paraliteratura).Se no primeiro volume da serie s6 foram acolhidas estaslinhas de pesquisa do Programa, espera-se que no pr6ximo estejamrepresentadas as demais, com artigos de professores da UFPEou de outras Institui~oes, 0 que indica que este veiculo seacha aberto tambem para outros Programas afins. Nao se preve u-ma regularidade de publica~ao ja que tudo dependera, por um lado,da exist~ncia de trabalh~s adar a p~6lico e, de outro, deverbas que permitam a produ~ao industrial do livro.Com esta pUblica~ao abre-se, certamente, um canal paraintercambio de informa~oes entre este Programa de P6s-Gradua~aoe os os outros Programas nas areas e linhas de pesquisa afins.M.V.


Flexao em Guat6Adair Pimentel PalacioA Gramatica e as Decisoes Linguisticas dos UsuariosFrancisco Gomes de Matos 19Brazilian Folk Literature: Oral or Literate Tradition?Jos~ Carlos Goncalves 25Linguagem e Sexo: Estudos Sobre a Fala FemininaJudith Hoffnagel e Elizabeth Marcuschi 39Manifestacoes de Poder em Formas Assim~tricas de InteracaoLUlz Antonio Marcuschi 51Pad roes Entoacionais, Compreensao e Leitura de TextoMarigia Viana 71Leitura Multi-Angular da Paraliteratura: uma PropostaSebastien Joachin : 83


A lingua Guato, falada por umas 10 ou 15 familias em MatoGrosso do Sul, foi documentada pela primeira vez no Sec. XIXpor Castelnau (1851), uma lista de 164 palavras que Martius(1867) e Schmidt (1905) republicaram. Schmidt comparou-acomseuproprio levantamento de 507 palavras e 39 oracoes (SCHMIDT,1942 a) e registrou mais 106 palavras e quatro pequenas narrativas (SCHMIDT, 1942 b).(1938), e 201 palavras por Wilson (1959). Rodrigues (1986) cla~sifica-a no tronco Macro-Je, mas nao a relaciona com nenhuma outra lingua ou familia ling~istica estudada. Pode-se consideralauma lingua obsolescente porque as condicoes em que vivemseus falantes favorecem esta situacao. Eles sac todos bilingUesem Guato e portugues ou monolingUes apenas em portugues. Entretanto,para os poucos falantes a lingua e ainda urn fator de i-dentidade etnica do grupo e elo de ligacao entre eles.Em 1976, quando iniciamos 0 estudo dessa lingua (PALACIO,1984), havia na literatura apenas listas de palavras, exceto p~10 levantamento de Schmidt, que fez tambem algumas observacoessobre sua estrutura.Nosso objetivo foi 0 de registrar os aspectos mais relevantes da gramatica do Guato. Como 0 povo nao tern aldeia, as familiasremanescentes vivem dispersas as margens do rio Paraguai ena cidade de Corumba, MS.Os dados foram coletados em viagens a ~ato Grosso do SuI em1977, 78, 79 e 84 e durante a permanencia de uma informante emCampinas, SP, em 1979 por urn periodo de tres meses. Em duas OC~sioes, 1977 e 1978, foi-nos possivel subir 0 rio e contataralgumas familias.


Seguindo questionario previamente trabalhado, submetemosnossos informantes a audicao de uma sentenca em portugues quesolicitarnos fosse traduzida para 0 Guato. A resposta era sirnultanearnentegravada e transcrita de oitiva.Alem dos enunciados preparados, urn total de 3.000, para 0controle da parte gramatical, documentamos dois textos rniticos,varios dialogos, conversas informais e algumas narrativas de fatoscorriqueiros.Das revisoes feitas do material gravado, corn 0 que foitranscrito de oitiva, foi rnontado urndicionario Guato-Portugues,e outro Portugues-Guato, de onde isolamos cerca de 1.000 rnorfemaslexicais.Para a analise dos dados seguimos os criterios metodologicosencontrados na literatura e recomendados na analise de linguasagrafas, sem estudo previo. Tratam-se de procedimentos an~liticos testados com muitas linguas, que tern provado serem eficazescomoprimeira aproximacao nos estudos das linguas. Adotamosuma abordagem estruturalista-distribucional bastante concreta.De acordo com a analise e descricao, pode-se resurnir a gr~matica da lingua Guato nas seguintes linhas gerais:1. Fonologiaa) Os fonemas segmentais sac os seguintes consoantes:p, t, c, v k, k W , b, d, J, v g, gW, f, v, h, r, y, m, n; e vogais:i, +, u, I, +, ii, e, 0, e, E, a, ;), a.b) Ha dois tons a nivel lexical: alto ( - ) e baixo (sem repr~sentacao grafica) .c) Ha silabas cv e V.d) Os processos foneticos encontrados sac os de assimilaCao,elisao, epentese e assilabacao.e) Os processos fonologicos com condici~namento morfologicosac os de elisao e epentese.2. Morfologiaa) Os morfemas estao classificados em tres gru~os: temas, a-fixos e particulas. Os temas e os afixos sac formas presas e asparticulas sac formas livres ou dependentes.


) 0 tema pode ser formado por uma ou duas raizes (temas co~postos) sem ou com afixos derivacionais (temas derivados). Os ~fixos derivacionais podem ser prefixos ou sufixos.c) 0 Guato pode ser tipologicamente classificado como umalingua predominanternente aglutinante com respeito a formacao depalavras. Pode ser incluida entre as linguas split, quanto a relacao que se estabelece entre sujeito e objeto na morfologiaverbal. Neste particular, apresenta urn sistema tripartido. Tantosac empregados os sistemas ergativo/absolutivo e nominativolacusativo, como ha ainda uma neutralizacao desses sistemas. 0sistema ergativo/absolutivo esta presente tambem nas palavrasinterrogativas.d) 0 sistema numeral e urn sistema de base quinaria e decimalcom valores representativos muito altos.3. Sintaxea) 0 Guato e uma lingua basicamente VSO. A topicalizacao dosujeito e obtida pelo preposicionamento deste ao verbo. 0 objetomuito raramente precede 0 sujeito, mas quando 0 faz recebeurnmarcador especial.b) Os quantificadores e demonstrativos precedem as locucoesou sintagmas que modificam. As locucoes genitivas sac construidascom 0 possuidor seguindo a coisa possuida sem qualquer preposiCao.c) As questoes nucleares sao formadas pelo uso de uma curvaentonacional ascendente com as oracoes declarativas. As questoesnao nucleares sac iniciadas por uma palavra interrogativa.d) A negativa manifesta-se atraves de flexao.e) A coordenacao das oracoes da-se por justaposicao. A subordinacao e marcada por particula subordinativa que precede a oracao subordinada. A oraCao relativa e encabecada por pronome relativoe segue a locucao que relativiza.,Faremos aqui algumas observacoes gerais sobre as flexoessubstantivas e a flexao pessoal dos verbos.As flexoes dos substantivos sao de dois tipos: determinativa e pessoal.A flexao determinativa manifesta-se pelos prefixos ma~ e


go-. 0 prefixo ma- flexiona urn tema livre de contexto:1. ma-g+ (det -agua) agua;enquanto go- flexiona urn tema contextualizado:2. adirakWag+ri go-g+ (esta frio muito det -agua)a a.gua e6;tQ mudo 6tUa.A flexao pessoal dos substantivos tern valor semantico deposse. Todos os marcadores pessoais sac prefixos, exceto 0 daprimeira pessoa do singular que se realiza por urn prefixo e urnsufixosimultaneos.a- -ru meu2 gWa- teu3 (- dele1 d gi- nosso (1 +2)1 p haji- nOSSD (1 (+2)+3(+3))3p bi- delesTabela 01(Os numeros referem-se as pessoas).o prefixo de segunda pessoa e 0 mesmo para 0 singular e 0plural. Quando a segunda pessoa refere-se ao plural, este e muitas vezes, mas nao sempre, especificado pela particula pluralizadora mehe posposta a palavra que pluraliza:3. gWa-gi mehe (2-mae pI) mae. de. VOc.U.A terceira pessoa do singular tern dois alomorfes, E- ei-, cada urn marcando uma classe de temas:4. E -vi O!1.e.lha(l,) de.le., i-r E (olho(-6) de.l~.A primeira pessoa dual (ld) e inclusiva, enquanto a primeirapessoa plural (lp) po de ser inclusiva ou exclusiva.Os seguintes exemplos ilustrarao 0 emprego desses afixos:5. a-tora-ru (l-filho-l) mw 6uho6. gWa-gi (2-mae) tua miie, mae de VOc.u


7. E-p5 (3-braco) bftaco dele8. gi-ov+ (ld-casa) nOMa ~Ma9. ha5i-r5ga (lp-joe1ho) nOMO


flexao pessoal, sac aqueles que geralmente nao ocorrem marcadospelos possessivos, mas que tambem flexionam-se por eles.Esses itens sao temas referentes a natureza, como ve cacho~-~o, gare]aYE ga£inha, e demais aquisicoes culturais mais recentesatraves do contato corn outras nacoes. Esses contatos teriaminfluido para modificar os valores de posse do grupo. Ostemas referentes a animais, antes de receberem a flexao pessoaI,sao combinados corn a raiz ayE ckia, ~cao:19. ayE-ve-ru (cria-cachorro-l) me.u cachoMo20. i-ayE-vaka (3-cria-vaca) a vaca dele..Outros elementos culturais flexionam-se semmorfolagicas:21. a-~~vai-ru (l-faca-l) mi.nha 6aca22. ik+vai-ru (caldeirao-l) me.u caldehtao.Este fate provavelmente e urn reflexo lingllistico devido acontatos sociais.A flexao pessoa1 dos verbos apresenta urna grande comp1exidade. Ela se realiza par prefixos ou sufixos obedecendo a diversospadroes.Trataremos primeiramente da flexao pessoal dos verbostransitivos que se combinam corn morfemas flexionais diferentesdos usados corn os verbos intransitivos e descritivos.Os verbos transitivos flexionam-se segundo a tabe1a 2quando apenas 0 referente do sujeito esta expresso, como ern:23. n-E-ro g-eg+ti go-ciada (indicativo-3-comer det-peixedet-fruta) peA-xe. come. 6~lLta .-yo2 glJa-3 €-1 d ga -1 P Ja-3p bE: -TabAla 02


o uso desses afixos pode ser assim exemplificado:24.na-ro-yo g-eg+ti (ind-comer-l det-peixe)c.omopuxe25. na-gWa-ro go-~iada (ind -2-comer det-fruta)c.ome.66!Luta26. n-E-ro go-r+ (ind-3-comer det-carne)e.te c.ome c.aJ[}1.e27. goko ma-ga-bagaki (nos imperfectivo -ld-bater)no~ biLtemMneie28. ma-]a-kaYE-]i (impf-lp-chamar-generalizador)c.hamamo-6ctodo-629. da-bE-ki (0 que-3p-pescar)o que e.te.6 puc.am?Quando 0 verbo flexiona-se para expressar as funcoes desujeito e de objeto, os afixos manifestam-se por uma complexacombinacao:s,~u. b. JeJ 1 2 3 ld 1 p eIt3pto 0ga-123ld1p3pctJ -yo -yo-he ¢ ¢-yo ¢ ja- ¢€- €- ¢ ¢ €--yo -he g€- j€- ¢ga---_.~-- - --------- ..gWa- gwa- gwa- g"'a-¢ ¢ja- Ja- Ja--he ¢ ¢br:- br:- b€- ¢ ¢-yo -he ¢ g€- j€-.-


(Os espacos anulados referem-se a reflexividade (combinacoes I-I, 2-2. etc.) ou as impossibilidades pragmaticas (combinacoesI-ld, 1-lp, etc). A reflexividade e marcada por particula. Osmarcadores sUbjetivos ocupam a parte superior esquerda de cadaespaco, enquanto os marcadores objetivos ocupam a parte inferiordireita).30. na-bagaki-he (ind-bater-2) bato em voee(


2 -he3 ¢IdIp3pga-~Ja-bE-Tabela 04Os seguintes exemplos ilustrarao essas flexoes:46. toU-yo (bem grande-I) MiL bem gftande47. n-ak w 5-he (ind-branco-2) ~ bftanc.a48. n-acig+ (ind-cair) ue c.a.i49. na-g-acig+ (ind-ld-cair) c.~o~50. na-]a-k+ni (ind-lp-dormir) do~o~51. na-bE-k+ni (ind-3p-dormir) doftmemObserve-se que as marcas de flexao de sujeito dos verbosintransitivos e descritivos no singular sac as mesmas daquelasdosobjetos.o resume geral da flexao pessoal dos verbos e a seguinte:Sujeito de Sujeito detransitivos intr/descr-yo-yo2 g '"a- -he3 (- rt>1d ga- ga -1 P ja- ja-3p b(- bE -


Por essa tabela podemos verificar que a flexao da primeirapessoa do singular realiza-se pelo sufixo -yo para exercerqualquer funcao, quer de sujeito de verba transitivo, quer desujeito de verba intransitivo e descritivo, assim como a funcaodeobjeto.A segunda e terceira pessoas do singular expressam-se pormarcadores que seguem urn padrao diferente do da primeira pessoa,pois cada uma dessas pessoas e representada por urn afixopara a funcao de sujeito dos verbos transitivos e outro para asfuncoes de sujeito dos verbos intransitivos/descritivos e de objeto.As tres pessoas do plural, entretanto, nao seguem nem 0 p~drao adotado para a primeira pessoa do singular, nem 0 adotadopara as segunda e terceira pessoas do singular. Toda a manifestacaodual e plural expressa-se por prefixos que marcam a funcaode sujeito, de verbos transitivos e intransitivos/descritivos,enquanto a funcao de objeto e marcada por outros prefixos.Nesse ponto podemos afirmar que a flexao pessoal dos verbosem Guato expressa-se por afixos que caracterizam urn sistemamisto. Esta lingua nao so contrasta 0 sistema nominativo/acusativo,como em portugues, mas tambem contrasta 0 sistema ergativo/absolutivopara pessoas diferentes. Alem disso, ela tern urnpadrao para a primeira pessoa do singular que neutraliza os contrastes desses dois sistemas.Os marcadores da segunda pessoa e da terceira pessoa dosingular sac expressoes morfologicas que valorizam a dicotomiaage.nte./paue.nte., caracterizada pelos prefixos gWa-2 e E - 3, porurn lado, e pelos sufixos -he 2 e ¢ 3, por outro lado, urn contrastetipico do sistema ergativo/absolutivo, em que a funcaodo agente tern uma marca distinta da funCao do pauente.. Enfatizamosagente e paue.nte. porque, embora essas nocoes nao sejamcompletamente satisfatorias, elas sugerem melhor 0 valor semantico-gramaticaldessas marcas do que as nocoes de sujeito e objeto.Vimos usando esta dicotomia nao so por uma questao de cIareza, mas tambem porque sujeit%bjeto dao conta de urn maior numere dos afixos pessoais.


Os marcadores da primeira pessoa dual e primeira e terceirapessoas plural apresentam expressoes morfologicas que valorizam a dicotomia sujeit%bjeto, caracterizada pelos contrastesdos prefixos ga- ld, ja- 1p e bE- 3p, por urn lado, para expressar0 sujeito; enquanto os prefixos gE- 1d, jE- 1p e ~ 3p, poroutro lado, marcam a funeao do objeto. Este e um contraste tipico do sistema nominativo/acusativo, em que a funeao do sujeitotem marca distinta da funeao do objeto.0. Guato usa assim tres padroes diferentes para manifestara flexao pessoalverbal. Um padrao para a primeira pessoa dosingular, uma neutralizaeao entre sistemas; outro padrao para asegunda pessoa e a terceira do singular, um sistema ergativo/aQsolutivo; e ainda outro padrao para as pessoas dual e plural,um sistema nominativo/acusativo. Sao tres padroes distintos, emsentido restrito, para representar um sistema tripartido, emsentido 1ato.Embora essas manifestaeoes sejam expressas atraves de marcaspuramente morfologicas, temos evidencia suficiente para a-firmar que 0 Gauto nao somente e uma lingua ~p~, urna linguaque se divide no uso de sistemas, mas tambem apresenta urna divisac sui generis, pois se subdivide no singular em dois padroesem oposieao a um terceiro para 0 plural.* A flexao em Guato foi apresentada durante aBrasileira de Antropologia, rea1izada em Braslia deVersoes modificadas deste trabalho foram publicadas no IX Anaisde seminarios do GEL, Batatais, 1984 : 140-145, sob o titulo"Flexao pessoal em Guato"; e em Language in Global Perspective,editado por Benjamin F. Elson, Dallas, Texas, SIL, 1986 363-372, sob 0 titulo "Aspects of the Morphology of Guato".CASTELNAU, Francis de. Expedieao as Regioes Centrais e da Amecado SuI. Trad. O. M. de O. Pinto. Sao Paulo, Ed. Nacional,1949. v. 2. Original frances, 1851.


COMRIE, Bernard. Ergativity. In: LEHMANN, Winfred P., ed.Syntactic Typology: Studies in the Phenomenology of Language.Austin, University of Texas Press, 1978. cap. 8, p. 329-394.Degrees of Ergativity: some Chukchee Evidence. In:PLANK, Frans, ed. Ergativity: towards a Theory of GrammaticalRelations. London, Academic Press, 1979. p. 219-240.Language Universals and Linguistic Typology: Syntax andMorphology. Chicago, The University of Chicago Press, 1981.LEHMANN, Winfred P., ed. Syntactic typology: Studies in thephenomenology of Language. Austin, University of Texas Press,MARTIUS, Carl Friedrich Phil Yon. BeitrMge zur Ethnographie undSprachenkunde Amerikas zumal Brasiliens. Leipzig, 1867. v. 2.PALACIO, Adair Pimentel. Guato, a lingua dos indios canoeirosdo rio Paraguai. Sao Paulo, UNICAMP, 1984. Tese de doutorado.PLANK, Frans, ed. Ergativity: towards a Theory of GrammaticalRelations. London, Academic Press, 1979.RODRIGUES, Aryon D. Linguas brasileiras: para 0 conhecimento daslinguas indigenas. Sao Paulo, Loyola, 1986.RONDON, Frederico. Na Rondonia Ocidental. Sao Paulo, Ed. Nacional,1938. (Brasiliana, v. 130).SCHMIDT, Max. Estudos de etnologia brasileira. Trad. Catarina BaratzCannabrava. Sao Paulo, Ed. Nacional, 1942 a. (Brasiliana,Gr. Formato, v. 2). Original alemao, 1905.Resultados de mi tercera expedicion a los Guatos efectuadaen el ano de 1928. <strong>Revista</strong> de la Sociedad Cientifica del Paraguay,Asuncion, 2(6) :41-75, 1942 b.WILSON, James. Guato word list. Arquivo de Linguas do SummerInstitute of Linguistics, Brasilia, 1959. (Dados nao publicados).


Nosso interesse pela problematica da elabora~ao de gramatica'1centradas nas intenc;oes, nos interesses e nas necessida ,-des dos usuarios do portugues como lfngua materna data de 1977,quando preparamos urn Posfacio ao Dicionario de LingUfstica e Gramaticado inesquecfvel Pai da Ciencia d~ Linguagem no Brasil,Joaquim Mattoso Camara Jr._ a ultimo dos vinte e quatro verbetesacrescentados aquela obra recebeu a designac;ao de Gramatica doUsuario,por acreditarmos que tal instrumento'descreveria e expllcaria as opC;oes lingtifsticas de que poderiam dispor os usuariosde portugues e os possfveis efeitos dessas decisoes.A ideia, embrionaria ha 12 anos, so come~aria a germinar em1985, em artigo no qual, a partir de uma distinc;ao entre gramatlca centrada no sistema e gramatica orientada para os usos do si~tema (Gagne, 1983), explicitamos algumas das caracterfsticas distintivas de uma terceira especie de produto, desta vez primordialmentevoltado para 0 processo decisorio do usuario. Apologis -tas de uma pedagogia da liberta~ao lingUfstica, que reconhec;a evalorize a independencia do usuario, insistimos que uma gramaticado usuario teria a diffcil, mas necessaria miss80 de ajudar 0falante/escritor a transformar-se de depe9dente em decisor lin -gUfstico.As bases teoricas de uma gramatica para 0 usuarlO (assimpreferimos denomina-la, para salientar seu beneficiario) receberam,em 1986, uma dimensao psicologica, ate entao pouco explora-


da: a auto-confian~a lingUfstica dos que usam 0 portugues comolIngua materna. Nesse segundo artigo, apresentamos pares de variantes lexicais e sintaticas,contrastando quanta a graus em umaescala de formalidade, sugerindo ao lei tor que se empenhasse, comousuario, em ser responsavel por seus usos do portugues oral eescrito, acostumando-se a tomar decisoes com base em fatos ou noborn senso, obseryando a varia~ao e os efeitos desse prodesso nosinterlocutores.o incentivo para prosseguirmos na explora~aQ dessa gramatica,verdadeiramente a servi~o.dQs usuarios,surgiu durante oCu~so de especializa~ao em Ifngua portuguesa, oferecido pelo Mestrado em Letras e LingUfstica da UFPE. Coube-nos ministrar a disciplinaGramatica II que, de comum acordo com os alunos, se caracterizoupor enfoque funcional-comunicativo, logo direcionado parauma gramatica do tipo reflexivo, como destaca Corblin (1988).Conclufdas estas informa~oes preliminares, focalizaremos a questaomotivadora deste artigo: Como descrever, explicitar as eta -pas interrelacionadas no processo decisorio em que se engaja amente do usuario de uma Ifngua materna? Como ajudar alguem, particularmenteurn estudante, a descobrir, compreender e a resolverseus problemas de comunica~ao oral e escrita, sem antes conscientizar esta pessoa a respeito da importancia de uma heurfsticapara conhecer alguns aspectos da identidade lingHfstica indivi -dual? Desafiados pelos alunos --quase todos professores de portuguesligados a rede escolar estadual-- desenvolvemos uma lista-padrao, ligeiramente modificada para esta publica~ao.Iniciada a era das gramaticas teoricas de base cognitiva,com 0 quase-tratado do lingUlsta norte-americano Langacker(1987) ,ainda estamos engatinhando na concep~ao e produ~ao de gramaticasque contribuam para a eficacia comunicativa dos usuarios. Pode -mos exemplificar tal estado de coisas, no plano aplicativo, con~truindo uma lista detalhada de estrategi~envolvidas no complexoprocesso lingUfstico decisorio ativado cognitivamente por urn usuario, ao se deparar com 0 problema de optar por uma dentre diver-


sas variantes de uso.A formula~ao apresentada e propositadamente extensa. paraque se tenha uma id~ia dos m~ltiplos aspectos de uma atividade decisoria; em uma situa~ao bem pratica, na sala de aula. conviriaadequar esse texto,-dando-Ihe a concisao e a in£ormatividade necessarlasa sua compreensao por usuarios sem inicia~ao a lingUI~tica. Esse traduzir a informa~ao cientlfica em dados acesslveisa leigos e outro problema que precisa ser enfrentado com seriedade pelos responsaveis por urn comunicar conhec~mentos cientlficosde maneira eficaz; saber, enfim. fazer tradu~io em sua proprialingua.Estrategias em urn processo decisorio:o que 0 usuario se perguntariala Que inten~ao comunicativa pre tendo concretizar, atraves deuma forma lingUlstica significativa?lh Que op~oes de uso (variantes) existem. a disposi~ao, e quaisdelas conhe~o (no portugues oral/escrito/culto/formal/informal)?Za Que revela minha capacidade de observa~ao sobre quem usa cadavariante quando, onde, como por que e para que?2b 0 que as obras de referencia ou de orienta~ao (gramaticas escolares, manuais de estilo ou de reda~ao e similares) esclarecemsobre essa varia~ao? Por que sao/nao sac confiaveis ?3a 0 que sei (descobri) sobre as rea~oes de ouvinte/leitores asvariantes existentes e particularmente a que pretendo usar?3b Como rotular os efeitos provaveis de variantes que ainda naosei? De que modo posso antecipar rea~oes a esses usos?4a Qual das variantes prefiro'usar e que risco comunicativo po~so estar assumindo ao faze-Io?4b 0 que esta decisao contribui para minha confian~a lingUIstica?Sa Ate que ponto exerci meu direito lingUlstico de fazer op~oes?5b Ate que ponto respeitei os direitos lingulsticos dos meusouvintes/leitores?


o USUarlO independente:tradutor de prescri~ao emA forma~io de usuarios como decisores lingUIsticos pressup5ea capacidade de traduzir atitudes rigidas, absolutistas em flexiveis, relativistas. Assim, em vez de pensar ou dizer "isso estaerrado". 0 usuario confiante pensaria ou diria "Que outras op


princIpio de que toda pessoa tern 0 direito de tomar decisoes lingUisticas ser urn decisor lingUlstico ao interagir com outros usuarios da mesma lIngua. Por isso, compete ao lingUistacontemporaneo ajudar 0 autor de material didatico lato sensu e 0professor de portuglJeS a criarem condi~oes favoraveis ao desenvolvimento da auto-confian~a lingUIstica dos usuarios no contextoescolar e fora deste. preparando esses educandos para usarem responsavelmente sua lingua materna.A complexidade da tare fa aguarda pesquisadores que aprofundema problematica sugerida neste breve artigo.Gomes de Matos, Francisco. Posfacio. Dicionario de LingUistica egramatica de Joaquim Mattoso Camara Jr. Petropolis, Vozes,1977 .Gagne, Gilles. Norme et enseignement de la langue maternelle. InLa Norme Linguistique (ed. Edith Bedard et Jacques Maurais).Quebec, Conseil de la LangueFran~aise e Paris, Le Petit Ro~bert, 1963.Gomes de Matos, Francisco. De dependente a decisor lingtiistico:por'uma gramatica do usuario. Petropolis, <strong>Revista</strong> de CulturaVozes. setembro de 1985, pp. 543-546.Gomes de Matos, Francisco. A autoconfian~a do usuario de portugues.Petropolis, <strong>Revista</strong> de Cultura Vozes, dezembro de 1986;pp- 50-61.Corblin, Francis. Savoir la grammaire et faire de la grammaire.In De 1a Grammaire Scientifique a 1a Grammaire Sco1aire. (h~lene Huot et alii). Paris, Universite Paris 7, 1988.Langacker, Ronald W. Foundations of Cognitive Grammar. Vol. 1.Theorica1 Prerequisites. Stanford University Pres~ 198~


In recent years scholars of different persuasions havefocused on the nature of oral and written language. One suchattempt to define the components of oral written language isChafe's (1979) analysis of involvement and integration.Involvement and integration are not clearcut matters interms of Chafe's (1979) analysis. Chafe examines the concepts ofinvolvement and integration in relation to spoken and writtenlanguage respectively. He calls our -attention not only to thedifferent nature of the tasks involved in speaking and writingbut to their different" outcomes as well. Time seems to be adecisive factor in the differentiation of those two languagetypes. Chafe claims that spoken language is produced in spurtsor "idea units". He states that "Idea units typically have acoherent intonation contour, they are typically bounded byhesitations, and they usually exhibit one of a small set ofsyntactic structures. They are a striking observable feature ofspoken language". He goes on claiming that idea units seem tobe produced at a speed which matches the normal "thinking rate"and that language may well reflect the pace of our flow ofthought. Aswe write much slower than we think, writing has moretime and its outcome seems to be more integrated, as our thoughtsprecede us when writing. Chafe states tha1&"the result is thatwe have more time to integrate a succession of ideas into asingle linguistic whole in a way that is not avaliable to us inspeaking".In writing the expression of a series of ideas is moldedinto a more complex, integrated whole, by means of devices whichare not encountered in speaking. In speaking the language


depends upon an intellectual understanding of the principles orpoints to be made". She goes on saying that "Internal evaluationcontributes to the sense of identification, while externalevaluation makes explicit what the point is .. a feature ofIi terate - based strategies". She makes the point that the use ofdifferent strategies by people in literate and oral traditionsmay cause problem for cross-cultural comunication. Amongthemany implications of oral vs.literate strategies Tannen suggeststhat written fiction capitalizes on strategies which arecharacteristic of both oral and written traditions thus makingoptimal use of these apparently conflicting linguistic realities.Her idea of the oral/literate continnum is an illuminating wayto look at oral and written language in a non-conflictingperspecti ve, by avoiding the commonsplit between oral andwritten tradition. In this study I will examine a folk tale ofthe so-called' literatura de cordel', a controversial type ofliterature that scholars of different orientation class as oralor written language. I will base my study on a narrative calledThe Life and Will of Candia de Fogo. This story is excerptedfrom Literatura Popular em Verso - Antologia, and a copy of thestory can be found in the appendix. This story is a specimen ofthe cycle called I Anti-Hero' and Adventures. The protagonist isthe typical Brazilian anti-hero, a trickster who survives bytrickeries and who always finds a way out of every embarrassingsituation. The character is a personage who exists underdifferent names in the folklore stories allover Brazil.In this paper I will look at evidences of external andinternal evaluation with an aim towards determining whether thedata fit the oral or written mode of language. I speculate thatfrequent recourse to instances of internal eV~luation manifestedby the occurrence of direct questions may be an indicator of thedegree of 'oralness' or 'writtenness' of the Brazilian folk(cordell poetry.


title of this section I decided to carry out a quali tati ve andquantitative analysis of one piece of work of the so-calledBrazilian folk literature (literatura de cordell randomlyselected from the data. I will focus my study on the use offorms of external and internal avaluation in the narrative asdevices indicating degrees of 'oralness' or 'writtenness'.Before I start my analysis of evaluation I should clarifythat the narrative under analysis is not a personal recollectionof the nan:ator's past experiences in order to make a point itis rather an account of vicarious (- endured, suffered, orperformed by one person in place of another) experience. This isa crucial distinction because it will yield different patternsof evaluation than the narratives of personal experiences would.Because of the vicariousness of the narrative, the narrator hasto have recourse to more internal than external evaluation.Rather than addressing direct reminders to the audience andusing remarks to himself as evaluative devices the author appealsto internal evaluation in the form of direct quotation. Tannen(1980) stated "direct quotation is a commonform of internalevaluation. By putting words in the mouth of the characters, theteller communicates what happened from inside the story".The author then makes use of internal evaluation by lettinghis characters evaluate the story for him.Let us now examine some instances of external evaluation andsee how this is carried out in the tlarrative. Whenpossible Iwill use examples from my own data as illustrations.Labov (1972) shows that "the narrator can stop the narrative ,turn to the listener, and tell him what the. point is", insteadof letting "the narrative itself convey this information to thelistener - to give them the experience". Let us look at anexample of this. In the examples quoted, the portuguese Versionwill appear to the left, with the English (aproximate)translation juxtaposed to it:


(31) Agora vamos saber quem era esse Cancao. Let us now see whothis Cancao was.Note that although the author addresses a direct reminder tohis audience this has mostly a descriptive orientation functionrather than carrying evaluative force. Table summarizes theoccurrences of Direct Reminders in the narrative.DIRECT REMINDERSAPPLICATIONS TOTAL9509500.634.0There were 950 lines in the total narrative. In the textonly six instances of direct reminders were found. This gives avery low percentage of use of only 0.63 (less than 1.0). If weconsider the number of lines used, i.e., the number of utterancesin the stanza, as direct reminders, this percentage increasesslightly to 4.0 of the total. Functionally, these directreminders have the role of calling the hearer I s (in this casereader's) attention to the development of the narrative, it isused three times at the beginning of the narrative as to open-upthe narration, once at the middle (line 679 - 680) and twice atthe end as a closing or coda-like device. It functions then asa kind of transition device to initiate, link and wrap-up eventsin the narrative sequence.A second type of external evaluation (so defined by exclusion,since it is not an instance of internal evaluation) is theoccurrence of indirect quotations. Indirect quotations seem tobe a feature of written language and thus have a descont",xtualizing,integrative function. Consider the following example:


(27) Muita gente talvez pense que seja exageracao. Most peoplemaythink itis an exageration.By indirectly reporting what people think rather than quotingthem directly, the narrator chooses to use a more indirect andexternal form of evaluation with the result of sounding moredetached from and thus involved with his audience. Table 2presents the occurrences of indirect quotations in the narrative.INDIRECT QUOTATIONSAPPLICATIONS TOTALWe can see that indirect quotation is not a very commondevice in the narrative under study. It was used only 1.05 ofthe times. Even if one considers the lenght of discourse stretchused rather than the mere number of occurrences of theaforementioned phenomenon the percentage is 5ti 11 too low (2.33).Thus it is evident that indirect quotation is not a very commonfeature of this type of story-telling to judge from the sampleexamined in this study.Labov (1972) shows that external evaluation "is a commontrait of middle-class narrators, who frequently interrupt thecourse of their narrative. "This seems to ,correlate with ourfinding of scarce use of this evaluative device in the narrativeunder analysis because the Brazilian folk literature, as weshowed in our introductory chapter, is a working-class phenomenonand then the authors would tend to use more involving techniquesto evaluate their narratives taking into account the specifictype of audience their productions are aimed at.


characterized by the recourse to direct quotations by thenarrator in his attempts to make the point of his story. Themost commonway to use direct quotation is for the author to usea verb such as SAYand then embed the direct quotation as we cansee in the example bellow:(137) Cancao quando soube disse: - Isso nao e novidade.When he heard this Cancao said: - That's no news.theTable 3 summarizes the occurrences of direct quotations innarrative.DIRECTQUOTATIONSAPPLICATIONSTOTALIf we consider the number of occurrences of direct quotationin the narrative we can see that it is not very high (12.63). Ifnonetheless we consider the total number of lines in thenarrati ve that we used as direct quotation we can see .the_percentage rises sharply to 57.26. This means that more than halfof the narrative is performed by direct quotations as an internalevaluation mechanism. What over-inflates the amount of discoursestretch used as direct quotations is 1Jhe fact that while somequotations are very short, basically of two lines, l~e example(137) above, others range in size from 2 to 22 lines. There are


then some very lengthy quotations that constitute more spaciousrenditions of evaluation.We saw then that direct quotation is a very common featureof our sampled data. Pointless narratives are unevaluated butgood narratives can be measured by the degree of evaluationstrength they have. Ideally every line and almost every elementof the syntax should contribute to the point, by elaboratingarguments. The majority of the evaluative devices have the effectof suspending the action of the narrative so that attention iscalled to special parts of the narrative in order to signal tothe listener that these facts are related to the point. Evaluationis generally interspersed in the narrative and is conveyed bymechanisms which depart from the basic narrative syntax. Let usconsider some examples:As part of the descriptive structure of the narrative, thishas the function of presenting characterological information tothe audience in an evaluative way. At this point in the narrativethis is the first appearance of a new character, the hero'smother, who does the evaluation for the author. The reason thatit is his mother who says what she says is much more evaluativethan if the words were uttered by another character In thecourse of the narrative, more and more detai1ed characterologicaland environmental information is supplied and this certainly hasan evaluative function.Let us examine another example:(205) Disse a velha: nao puxaste (205) Said the old woman: youdon't look like


(206) Your father who wasbraveman.These are instances of evaluative function of directquotations. By the frequent use of direct quotations the authoradds to the mass of detail-temporal, situational and characterological - the point of the narrative, "what the story is reallyabout". In addition to acting to tell the audience what thenarrator feels is crucial information in the story he is telling,i.e., what the point of the story is, evaluation also serves tosuspend the narrative action by delaying discussion.In addition to having descriptive and evaluative functions,direct quotations may also contribute to the narrative action.Let us look at one more example:(536) disse vou dar urn passeio(536) He said: I'm gonna take a walk.a temporal juncture and gives sequence to the flow of narrativeaction in the story. It adds one more ~tep towards thecomplicating action while at the same time providing forevaluation.We can see then that direct quotation have all the functionsusually assigned to evaluative language in the course of thenarrative.In Austin's classification of illocutionary acts, the verbs•introducing direct quotations are generally examples of sayings(constatives, statements, assertions, etc.). These verbs arereclassified by Searle (1976) as Representatives, Le., "theirpoint or purpose is to conunit the speaker (in varying degrees)to something's being the case, to the truth of the expressedproposition". Searle states that "All the members of the


epresentative class are assessable on the dimension of assessmentwhich includes true and false. "He symbolizes the representativesas ,. .J.. B (p), and says that the direction of fit is words totheworld and that the psychological state expressed is Belief that(p) •Table 6 bellow summarizes the types of verbs introducingdirect quotations.VERBS APPLICATIONS TOTAL PERCENTAGESSay [dizer] 88 120 73.33Ask [perguntar] 11 120 9.16Answer, reply [responder] 03 120 2.50Exclaim [exclamar] 02 120 1.66Wonder [querer saber] 02 120 1.66Tell [contar] 01 120 0.83Yell, shout [gritar] 01 120 0.83Give a message [dar recado] 01 120 0.83No overt veJ;bs 12 120 10.00A brief .look at the table above will suffice to show us thatthe verb !i.AYis by far the most frequent verb to introduce directquotations in the narrative under analysis. We have already seenplenty of examples with SAY in our previous analysis. We wouldjust like to add that the verb SAY can be used in a variety oftenses and modes to introduce direct quotations. The most commontense however is the Simple Past Indicative and the ImperfectIndicative which are the Portuguese narrative tenses parexcellence. It is nonetheless not uncommon for the verb SAY tobe used in a variety of tenses and modes (such as Imperative andSubjunctive). The verb dizer (SAY) then was used on a rate of73.33 in the text. Its overuse may be attributed to its neutralsemantic meaning, i.e., in addition to being the most frequent


epresentative verb it is also· semantically 'unloaded'differentlythan verbs such as EXCLAIM,SHOUT,which carry further meaningand are more strongly evaluative in degree of emotionalinvolvement. It seems that the story-teller in this case isplacing more emphasis on what his characters say then in thefact that they say something. Table 6 tells us that the secondcategory of verbs introducing direct quotations is NOVERBS,Le., they are introduced directly with no verb. Let us considerthe following example:(633) I have to go ten milesaway from here.(637) Wanna do like me?Since the context is obvious due to the highly contextualizedcharacter of this type of narrative the introductory verb maywell remain ellyptical and is not necessary on the surface form.If we add those cases of ~llyptical verb to the category of SAY,we will then have SAYbeing used 84.16% of the time as theintroductory verb. Other verbs such as Answer, Tell, Shout, Give(a massage) are all examples of representatives and do not needany further comment for the time being.The second most used type of verb is the verb ASK. Askbelongs to the category of DIRECTIVES,whose" illocutionary pointconsists in the fact they are attempts (varying degrees, andhence, more precisely, they are determinates of the determinablewhich includes attempting) by the speaker to get the hearer todo something", as Searle classified them. They are symbolized asA{.0 t W(H does A). Their direction of fi t is world-to-words andthe sincerity condition is want (or wish or desire). Other verbsof this class are ask, order, command, requ.st, beg, etc.We have an example of ASKin no. (273) and (274):(237) (She) asked: did you goshopping charge(2741 at somebody's store?


Perguntar (ask) was used 9.16% of the time in the verbleintroducing direct quotations. As a directive it is a reques\for clarification or information and forces the character to adanew evaluative information to the narrative point.In sum, Representatives and Directives are the two mostcommontypes of verbs introducing direct quotations. Syntactically,all these verbs are transitive and thus need an object which inthis case is the whole quoted speech. As Tannen (1980) noted "byputting the words in the mouth of the characters, the tellercommunicates what happened from inside the story. Nonetheless,by deciding what words to put in the character's mouth, theteller is bUilding the story toward the desired point". Thismetacommunicati ve function, then seems to be one more applicationof direct quotations.Wehave analysed a sample of Brazilian folk literature withthe objective of determining its oral or written nature.Tannen (1980) calls our attention to the nature of thedifference between oral and written language residing more on acontinuum than in a bipolar mutually exclusive scale. She claimsthat written fiction is a kind of language which capitalizes bothon the advantages of oral and written language without thedisadvantages of neither: " ... Written fiction - a form whichtakes advantage of written form and increased production time toachieve a more integrated prose, but which still opts for manyof the strategies associated with spoken language to create prosethat also has a high involvement factor, in order to capitalizeon the oral tradition function of emphasizing the interpersonal,of making use of the subjective response and ;:he knowing throughidentification which Ong hypothesizes and which Chafe has calledthe involvement factor".The point Tannen makes in her article seems applicable toour analysis of Brazilian folk poetry. The Brazilian folk poetryis oral folklore written in the form of rudimendary poetry.Our analysis of the evaluation mechanisms that this type of


poetry is filled with shows us that it is a kind of writtenIi terature that imitates oral language. The lack of externalevaluation is one such evidence that this poetry appeals moreheavily to evaluative mechanisms which are typical of orallanguage. Direct quotations constitute instances of internalevaluation which Labov and Tannen associate with good storytelling,a phenomenon they have found in narrators from workingclass, rural areas, or in members of certain cultures. Inaddition to being an internal evaluation device, the use ofdirect quotations relies heavily on context and interpersonalrelationship which are marks of involvement in Chafe's (1979)analysis of written and oral language. The fact that the mostcommontype of verb which introduces direct quotations is theverb SAYseems to argue intuitively for the similarity betweenthis kind of poetry and conversation. The fact that directquotations can also be introduced directly without any surfacerepresentative verb can be taken as evidence that the Brazilianfolk poetry relies heavily on contextualized, shared knowledge.Scribner (1968) observs that "writing separates the producer fromthe product. Oral language exists only at the very moment thatthe individual is in the act of creating it, whereas writingseparates our language from us and sets it in the outer world,making it available for inspection and contemplation by itscreator as well as by others".The need for wider communication seems to be the leit motiffor the Brazilian folk poetry to be written rather than simplysung. Literacy brings its advantages and larger markets areopen for the folk poet. In this sense writing approximates theproducer to the product, by "making it available for inspectionand contemplation by its creator as well as by others".Although "the user of written language is performing in asolitary rather than a social manner", the, Brazilian writtenfolk poetry seems to be a way of making its millions of readersand listeners feel in a more social way through theintersubjective communication it establishes.Based on the evidence drawn from the analysis of directquotations as forms of internal evaluation wewould suggest that


the Brazilian written folk poetry seems to be in a transitionphase from oral to written language, a phase in which in spiteof its written format it still relies heavily on oral modes ofexpression.References(1) Albert B. Lord (1960) The Singer of Tales. New York, atheneum1978.(21 Chafe, W. (19791 Integration and involvement in Spoken andWritten Language. Paper presented at the 2nd Congressof the International Association for Semiotic Studies .Vienna, July 1979.(3) Franklin Maxado (1980) 0 que e literatura de Cordel. Rio deJaneiro:CODECRI.(41 Fundacao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica1978. Anuario Estatistico do Brasil. Brasilia, IBGE.(5) Horacio de Almeida (1976) in (2).(61 Ivan Cavalcante Proenca (1977) A Ideologia do Cordel. Riode Janeiro: Editora Brasilia-Rio.(7) Labov, W. (1972) The Transformation of experience in narrativeSyntax, in Language in the Inner City. PhiladelphiaUniv. of Pensylvania Press.(8) Liedo Maranhao de Souza (1976) Classificacao Popular da Literaturade Cordel. Petropolis: Vozes.(9) Ministerio da Educacao e Cultura e Casa de Rui Barbosa. LiteraturaPopular em Verso. Antologia, Torno II (1976).(10) Proenca, M. Cavaloante (19641. Introduction to LiteraturaPopular em Verso. Rio de Janeiro - Brasilia, MEC - FundacaoCasa de Rui Barbosa, 1964.(111 Scribner, S. (19681 Cognitive Consequences of LiteracyAlbert Einstein School of Medicine"Bronx, New York.(12) Searle, J.R. (1976) A Classification of Illucotionary Acts,in Language in Society 5, 1 - 23.(13) Sebastiao Nunes Batista (1973). Restituicao da autoria defolhetos do Catalogo, Torno I de Literatura Popular emVerso in (2).(14) Tannen (1980) Spoken/Written Language and the oral/LiterateContinuum. In Proceedings of the sixty Annual Meeting ofthe Berkeley Linguistics Society Berkeley, U. CaliforniaPress, to appear.


lINGUAGEME SEXO: ESTUDOS SOBRE A FAlA FEMININA*,JUDITH HOFFNAGElELIZABETH MARCUSCHIJa simples observa~oes nao-cientificas do quotidiano evidenciama presen~a generalizada de estereotipos quanto a falado homem e da mulher. Mas mesmo analises cientificas sugeremque a fala feminina e percebida como mais polida, conservadora,emocional, entusiastica, incerta, fofoqueira, enfadonha. A falamasculina, em contrapartida, seria direta, raciona1, pouco emocional,com senso de humor e seria. S€gundo Aries (1984), asmulheres sac tidas como cooperativas, expressivas, boas ouvintes;os homens, ao contrario, sao considerados ob;etivos, a-naliticos e orient ados para 0 status. Em termos de topico I ,homens falam sobre assuntos importantes: economia, trabalho,politica etc., enquanto as mulheres se detem em assuntos pessoais:crian~as, casa, empregada, temas tidos como menos relevantes.A investiga~ao cientifica da questso Iinguagem e sexo e relativamenterecente. Segundo Kramarae (1980a:83),"as palavrasusadas para descrever mulheres e homens, seu comportamento esua intera9ao verbal, so passam a chamar a aten9ao como sendoestruturas e atividades linguisticas problematicas a partir dosmovimentos contemporaneos de liberta9so da mulher".Ate 0 final dos anos sessenta os estudos nesta area nao foramsistematicos. A partir dai cresce 0 Interesse cientifico* Eata investiga9ao representa uma versao ligeiramen~e modificadadas bases teoricas de uma pesquisa que esta Benda desenvolvidapelas autoras para a Funda~ao Carlos Chagas,


pela analise do desempenho lingu{stico feminino e masculino.Este interesse nao surge de forma isolada, mas acompanha outrosestudos de natureza sobretudo sociologica, psicologica e pol{-tica, que reivindicam uma equipara~ao dos direitos e deveres dohomem e da mulher enquanto seres sociais.Embora as rela~oes linguagem e sexo tenham recebido aten~oesesporadicas ja no seculo XVII (cf. Jespersen, 1922; citado emThorne e Henly, 1975:5), somente nos anos setenta deste seculoa tematica emerge como urn campo de estudos.Os primeiros relatos sobre as poss1veis rela~oes entrelinguagem e sexo foram feitos, em sua maioria, por antropologosem suas investiga~oes etnograficas. Isto porque, como sugereKramer (1974: 2), "era mais facil perc~ber diferen~as delinguagem entre os sexos em outras culturas do que na nossa".as relatorios etnograficos restringem 0 enfoque de seus estudosao uso de elementos isolados da fala (p. ex. pronuncia, afixosnominais ou pronomes pessoais) em tribos "exoticas". Bodine(1975), numa revisao da literatura sobre diferen~as sexuais emlinguagem, observa que os primeiros estudos se concentraram naquelascaracter1sticas da fala que podiam ser atribu1das ao repertorioexclusivo de urn ou de outro sexo. A partir dessa constata~aofrisa ela que, pelo fate das linguas europe1as seremmarcadas mais por uma diferencia~ao preferencial do que por umadiferencia~ao exclusiva, isto, e, menos diferen~as absolutas doque frequencia de ocorrencia, os pesquisadores europeus nao 00-taram tao facilmente a rela~ao entre linguagem e sexo em suasproprias 11nguas. Bodine conclui que nao apenas nos faltaminforma~oes a respeito da rela~ao entre linguagem e sexo namaioria das 11nguas, mas, 0 que e mais lamentavel, faltam-nosestudos sobre "0 significado social de tal diferencia~ao"(1975: 149) .Freyre, em 1933, na obra Casa-Grande & ~enzala, ao abordar 0papel desempenhado pela ama negra na cultura brasileira e naforma~ao da fam1lia aponta para a importante contribui~ao que aama negra deu para 0 "amolengamento" ou "amolecimento" e mesmoadocicamento da 11ngua portugesa, livrando-a de seus "rr" e


trata-se de uma visao do papel da mulher na forma~ao culturalatraves da linguagem. Freyre nao esta interessado diretamente nalinguagem e sim na forma~ao social do povo brasileiro. Lakoff,com seu livro Language and Woman's Place puqlicado em 1975, mudou0 enfoque do estudo linguagem e sexo. Lakoff argumenta queas mulheres sac socializadas dentro de certos padroes de fala eque estes correlacionam-se com a posi~ao subordinada que cabeas mulheres no seio da sociedade. Rea~oes favoraveis e desfavoraveisas investiga~oes de Lakoff provocaram 0 surgimento denumerosos estudos, em diversas disciplinas, que tentaram demonstrarou negar a existencia de urn estilo proprio da fala feminina.Varios niveis do desempenho linguistico (fonologia, lexico,morfologia, sintaxe) passaram a ser vistos como possiveisfontes de distin~oes linguisticas entre os sexos.o interesse na rela~ao linguagem e sexo produziu, noentanto, nos anos 70, muitas investiga~oes fragmentadas que,nas palavras de West e Zimmerman (1985:108) "exageraram as diferen~aslinguisticas entre os sexos".- Ao comentar os resultadosda primeira decada de pesquisas na area aqui abordada,Smith (1983:115-117) observa que a mera associa~ao de urn sexocom urn tra~o linguistico ainda nao e suficiente para liga-losdiretamente. Excetuando correla~oes excepcionais, a associa~aopode ser atribuida ao sexo e a alguma outra variavel, como porexemplo idade, status social ou economico.Pesquisas recentes sobre linguagem e sexo vem apresentandoresultados mais concretos e, na opiniao de Thorne e Henly(1975), tern conceituado a linguagem nao em termos de variaveisisoladas ou como codigo abstrato, mas dentro de contextos de u-soreal.A_~."_,oincorpora~ao __..~.~ ...._.. -~~--- da..~-"--_.- no~ao '-'-,_. de --~_'- contexto __.-.r..~~ il1!I>.l ---,_~-_~~~ ica 0 acresc -_~ ~-~_--_.~_- imo _oileuma variavel imEort1i.lltE!'~0'.l_~~ja~acja_d~.!!lElp.::3a.


outras. Nestes contextos, segundo West e Zimmerman (1985:109),podemos observar par exemplo varia~oes quanta a diferen~a na a-loca~ao dos turnos de fala, bem como a interferencia de elementossituacionais. Tal como lembra Goffman (1964) deve ser a-qui analisadose 0 falante est~ interagindo:- com alguem do mesmo sexo ou de sexo diferente;- com urn subordinado ou urn superior;- com urn au v~rios ouvintes;- face a face ou ao telefone;- lendo urn script au espontaneamente;- em uma ocasiao formal ou informal;- em situa~ao de rotina au de emergencia.Observa ainda Goffman que nao se trata simplesmente dosatributos da estrutura social (tais como idade e sexo) , mas simdo valor atribuldo a estas propriedades, tal como ocorre na situa~aoe no momenta.Para as estudiosos interessados na rela~ao entre 0 discursosexista e questoes sociais, e fundamental uma an~lise acuradado r..c:()~l1t=~~t()~i~nteraciol1a1. a linguista pode, par exemplo, delimitarseu interesse simplesmente as posslveis diferen~as sexistasna fala. No entanto, se pretender ir mais longe e procurarinvestigar como e porque estas diferen~as ocorrem, nao podeperder de vista que as intera~oes se dao em sociedade. Este deveser seu ponto de partida teorico. Segundo acertadamente frisamThorne e Henly (1975:14), "com esta mudan~a de perspectiva,o sexo e nao so uma variavel que se correlaciona com v~rios aspectoslingulsticos mas, mais do que isso, torna-se urn fenomenosocia-cultural".E consider~vel 0 numero de autores que explicam as estilossexistas de fala em termos da diferencia~ao social de homens emulheres. Pieper (1981), par exemplo. sugere que a desempenholingulstico dos dais sexos deve ser analisa10 em fun~ao dos papeisque 0 homem e a mulher assumem em sociedade. Assim sendo,determinado estilo de fala nao pode ser considerado como especificamentefeminino au masculino. mas sim como pre ferencialmentemasculino ou feminino. Troemel-Ploetz- (1982) argu-


menta nao ser correto identificar "linguagem feminina" com umavariante lingulstica propria, independente, ja que a mulher naorecorre a urn dialeto proprio, que os homens nao entendem. Admitecomo aceitaveljalar-se em "linguagem feminina", desde queest a seja entendida como expressao da situa9ao da mulher comourn todo dentro da sociedade, apresentando caracterlsticaslingulsticas bem especlfica~.Hoje, a tendencia das pesquisas e investigar a fala de ambosos sexos em contextos de uso concretos que pod em nao so registrardiferen9as lingulsticas especlficas, mas que tambem tentamexplicar por que estas ocorrem e quais sac suas consequenciassocio-interacionais.Fishman (1977, 1978a, 1978b, 1980) mostra, em suas analisessobre a divisao sexual do trabalho em conversa90es casuais quequalquer intera9ao social requer empenho do interactante paraque seja bem-sucedida. As pesquisas de Fishman revelam que asmulheres tern que se empenhar mais do que seus interlocutores dose=xo oposto para iniciar e sustentar uma intera~ao verbal. Aaut ora lembra que algumas das caracterlsticas associadas a falafeminina (uso mais numeroso de indaga90es, muitas vezes com"tag questions" e marcadores de apoio) podem em verdade servistas como estrategias conversacionais as quais as mulheresrecorrem para resolver problemas tais como sustentar umaconversa9ao quando interagem com homens. Fishman (1918a) a-ponta, por exemplo, que para superar a dificuldade de conseguira aten960 dos homens na abertura de uma conversa9ao as mulheresrecorrem mais frequentemente a perguntas do que a atos de faladeclarativos. Pois a uma pergunta segue, na maioria das vezes,uma resposta e a urn ato declarativo pode seguir 0 silencio dointerlocutor. Ja os homens recorrem mais a declarativas para i-niciar uma conversa9ao, pois a probabilidade de que sejam ouvidose maior do que no caso de mulheres. Fishman , conclui afirmandoque da mesma forma que 0 trabalho domestico, tambem 0trabalho feminino na intera9ao parece ser imperceptlvel, "porque0 empenho interacional e relacionado com 0 que significaser uma mulher, com 0 que a mulher e em sociedade, ficando obs-


curecida a ideia de que e empenho interacional 0 que ela realiza.Assim, 0 empenho interacional nao e visto como 0 que asmulheres realizam na intera~ao, mas identificado como parte doque elas sao" (1978a:405).Apesar da ideia de que as mulheres falam mais do que os homensser aceita, na maioria das vezes, como verdadeira, pesquisastern revelado que os homens nao so falam bem mais nasconversa~oes de que participam interlocutores de ambos os sexos,mas tambem interrompem mais a fala das mulheres (Swacker,1975; West e Zimmerman, 1985; Kramer, 1974; Zumbuhl, 1984;Troemel-Ploetz, 1984, entre outros).Utilizando 0 modelo de analise conversacional proposto porSacks, Schegloff e Jefferson (1974), Zimmerman e West (1975) e-xaminaram padroes de intera~ao, silencio e apoio ao parceiro nodesenvolvimento do topico em conversacoes casuais na cultura a-mericana (cf. tambem Troemel-Ploetz, 1984, sobre discussoes emtelevisao na cultura alema). Estes estudos leva ram a conclusaode que "os homens negam as mulheres, enquanto parceiras deconversa~ao, os mesmos direitos no que se refere a utiliza~aoplena dos seus turnos e ao apoio interacional no desenvolvimentodo topico" (Zimmerman e West, 1975:125). A mesma pesquisade Zimmerman e West indica ainda que "0 poder e 0 dominio, quesac privilegio dos homens em certos contextos da vida social,adquirem formas definidas e padronizadas, sendo exercidos tambemna interaG80 conversacional com as mulheres" (1975:105).Quando Lakoff (1975:53-56) lan~ou a hipotese de que uma dascaracteristicas da fala feminina era 0 frquente uso de expressoesdo tipo hedges (evasoes ou rodeios), que serviriam paratransmitir a inseguran~a do falante com respeito ao que estadizendo, varios estudos foram feitos para testar a afirmaG80.Boa parte destas pesquisas constatou que praticamente inexisteuma diferen~a significativa na frequencia po uso destas expressoespor falantes dos dois sexos (cf. Crosby e Nyquist, 1977;Edelsky, 1981; Fishman, 1978b e 1980). Ha, no entanto, evidenciasde que estas expressoes adquirem fun~oes distintas nafala masculina e na fala feminina.


Holmes (1986) observa que nao e suficiente contar 0 numerode ocorrencias de certas caracteristicas na fala de homens emulheres, mas e necessaria uma analise funcional de seu uso. 0estudo de Holmes sobre 0 emprego da express~o "you know" porhomens e mulheres demonstrou que n~o ha diferen~a significativaem termos quantitativos, mas a fun~~o da expressao adquire caracteristicasdiversas em cada sexo. Mulheres usam a expressaopara enfatizar 0 que dizem e para confidenciar aos interlocutoresque estes compartilham seu conhecimento do assunto. Homensrecorrem a "you know" para expressar sua incerteza frente aoque dizem ou para expressar que estao conscientes de que seu e-nunciado nao esta muito preciso.Em Women and Men Speaking Kramarae (1981) examina varios modelosdesenvolvidos para a analise dos fatores sociais embutidosnas atitudes e nos usos linguisticos de mulheres e homens.Com vista a futuros estudos a respeito da rela~ao entre fala esexo a autora opt a pelo modele a que aenomina "The Strategy Model"Kramarae parte d? pressupostQ de que a fala e uma agaosocialmente situada. Segundo ela, quatro s~o os aspectos a seremconsiderados na formagao de padroes e de sentidos na interagao:- a compreensao que os falantes tern da situagao- a relagao singular existente entre os falantes- as normas de fala compartilhadas- as estrategias dos falantes.o modele desenvolvido por Kramarae baseia-se nas seguintesconsidera90es:1) 0 capitalismo industrializado aumentou a divisao dotrabalho entre homens e mulheres, estigmatizando seus lugaresde atuagao. Homens sac definidos ideologicamente pela esfera,publica, enquanto mulheres estao mais restritas a esfera domes-•2) a autoridade (poder legitimo, autoriza~ao para comandar)e associada a esfera publica, dando ao homem ° monopolioda autoridade. Como resultado desta diferencia~ao entreseus papeis e atlvidades, homens e mulheres tern rela~oes dis-


tintas com 0 poder;3) como consequencia da divisao de trabalho, da sepa-ra~ao do campo de atua~ao e as diferen~as de acesso e de rela-trabalhos sobre linguagem e sexo em lIngua portuguesa. Diante~ao com a poder, homens e mulheres recorrem a diferentes estrategiaspara influenciar as outros e controlar eventos. E malSprodutivo, pais, estudar a fala de homens e mulheres dentro docontexto da forma~ao social das classes homem e mUlher;4) a conceito de estrategia providencia a liga~aoentre a estrutura social e as a~oes e intera~oes dos indivIduos.A no~aode estrategia verbal de Kramarae fundamenta-se nateoria de Brown e Levinson (1978:61), para as quais a "intera-~ao e a expressao de re1a~oes sociais ... construidas a partirdo usa estrat£iico da linguagem". Assim, argumentam esses autores,em se podendo descobrir as principios do uso 1ingulstico,descobrir-se-a ao mesmo tempo as principios das rela~oes sociais(cf. Kramarae, 1981:118-119). Em outro momenta Kramarae(1981:123) sugere que a valor da teoria da estrategia reside,em parte, no fornecimento de linhas-mestras para as areas depesquisa, ate agora pouco exploradas, sobre linguagem e sexo,permitindo assim a defini~ao e categoriza~ao das semelhan~as ediferen~as nos estilos de fala bem como de suas fun~oes.A 1iteratura acima examinada mostra a quase inexistencia dedisso vale, pois, indagar se e possIve1 afirmar que existe umafa1a tipicamente feminina e uma fa1a tipicamente masculina nalIngua portuguesa do Brasil. Sera possivel constatar variedadesau estilos 2 diferenciados? Quais as imp1ica~oes para a intera-~ao social caso existam dois estilos de fala? Como se da a a-quisi~ao desses estilos? Cada estilo e exclusivo de urn sexo ouo estilo de urn e tambem encontravel na fala do outro? Que implica~oesdecorrem da escolha de urn au outro estilo? Parame1hor compreender se de fate existem estilos de fala tipicamentefeminino e masculino no Portugues do Brasil e como se podechegar a uma tipologia destes esti10s, sera fundamentalinvestigar urn variado 1eque de intera~oes. As questoes sac instigantese werecem ser investigadas.


1.0 termo Topico e aqui usado talcomo definido par Brown e Yudiscursivoem oposi~ao a to-Ie (1983), no sentido de topicopico sentencial, uma vezque esta segunda no~ao e mais de naturezasintatica.2. Entendemos estilo no sentido atribuido par Ervin-Tripp(1972:235), ou seja:"mudan~as CO-ocorrentes em varlOS niveisda estrutura ling~istica dentro de uma lingua".Aries, Elizabeth. 1984. Zwischenmenschliches Verhalten ineingeschlechtlichen und gemischtgeschlechtlichen Gruppen.InS. Troemel-Ploetz (ed.), Gewalt durch Sprache. Frankfurt,Fischer. pp. 114-126.Bodine, Ann. 1975. Sex differentiation in Language. In B. Thorneand N Henly (eds.), Language and Sex: Difference and dominance.Rowley, MA, Ne~bury House,pp. 130-151.Brown, P. and S. Levinson. 1978. Universals in Language usage:politeness phenomena. In Esther Goody (ed.), Questions andpoliteness: Strategies in Social Interaction. Cambridge,Cambridge University Press, pp.56-324.Brown, Gilian and George Yule. 1983. Discourse Analysis. Cambridge,Cambridge University Press.Crosby, Faye and Linda Nyquist. 1977. The female register.Language in society 6: 313-322.Edelsky. Carole. 1981. Who's got the foor? Language in Society10: 383-421.Ervin-Tripp, Susan. 1972. On sociolinguistic rules: alternationand co-ocurrence. In J.J. Gumperz and Dell Hymes (eds.).Directions in Sociolnguistics. New York. Holt, Rinehart andWinston. pp.2l3-250.Fishman, P. 1977. Interactional shitwork. Heresies 1:99-101.Fishman, P. 1978a. Interaction: the work women do. SocialProblems 25:397-406.


Fishman, P. 1978b. What couples talk about when they're alone?in D. Butturff and E.L. Epstein (eds.), Women's Languageand Style. Akron, L & S Books, pp. 11-22.Fishman, P.M. 1980. Conversational insecurity. In H. Giles, W.P. Robinson and P.M. Smith (eds.), Language: Social PsychologicalPerspectives. Oxford, Pergamon Press, pp. 127-132.Fishman, Pamela M. 1984. Macht und Ohnmacht in Paargespraechen.In S. Troemel-Ploetz (ed.), Gewalt durch Sprache. Frankfurt,Fischer,pp.127-142Freyre, Gilberta. 1933. Casa-Grande & Senzala. 192 ed. de 1978.Rio de Janeiro, Jose Olympia Editora.Goffman, Ervin. 1964.The neglected situation. American Anthropologist66:134-136Holmes, Janet. 1986. Functions of 'you know' in women's andmen's speech. Language in Society 15: 1-22.Kramarae, Cheris. 1980a. Perceptions and politics in languageand sex research. In H. Giles and P.M. Smith (eds.), Lang~uage: Social Psychological Perspectives. Oxford, PergamonPress, pp. 83-88.Kramarae, Cheris. 1981. Women and Men Speaking. Rowley, Mass.,Newbury House.Kramer. Cheris. 1974. Women's speech: separate but unequal?Quarterly Journal of Speech 60:14-24.Lakoff, Robin. 1973. Language and woman's place. Language inSociety 2:45-80.Lakoff, Robin. 1975. language and Woman's Place. New York, Harper& Row.Leitao, Eliane Vasconcelos. 1979. Sexo e linguagem. Rio de janeiro,PUC/Rio, Disserta~ao de Mestrado.Marcuschi, LUlz Antonio. 1986. Analise da Conversa~ao. Sao Paulo,Atica.Pieper, Ursula. 1981. Rol1en- und Geschlech~stypische Charakteristikain der verbalen Elternkind-Kommunikation. FoliaLinguistica 15:87-139.Sacks, H.; E. Schegloff and G. Jefferson. 1974. A simplest systematicsfor the organization of turn-taking for conversation.Language 50:696-735.


Siqueira, Elizabeth Angelica dos Santos. 1983. Sexismo linguisticono portugues do Brasil: alguns estereotipos. Recife,Universidade Federal de Pernambuco. Diss. de Mestrado.smith, Philip M. 1983. Sex markers in speech. In K.R. Schrerand H. Giles (eds.), Social Markers in Speech. Cambridge,Cambridge University Presspp. 109-146.Swacker, Marjorie. 1975. The sex of the speaker as a sociolinguisticvariable. In B. Thorne and N. Henly (eds.),Language and Sex: Difference and Dominance. Rowley, Mass.Newbury House, pp. 76-83.Thorne, Barrie and Nancy Henly. 1975. Difference and dominance:an overview of language, gender and society. In Languageand Sex: Difference and Dominance. Rowley, Mass.,NewburyHouse. pp. 5-42.Troemel-Ploetz, Senta. 1982. Frauensprache: Sprache der Veraenderung.Frankfurt, Fischer.Troemel-Ploetz, Senta. 1984. Die Konstruktion konversationellerUnterschiede in der Sprache van Frauen und Maennern. InGewalt durch Sprache. Frankfurt, Fischer, pp. 288-322.West, Candance and Don H. Zimmerman. 1985. Gener, language anddiscourse. In T.A. van Dijk (ed.) Handbbok of DiscourseAnalysis. Vol.4. London, Academic Press, pp. 103-124.Zimmerman, Don H. and Candance West. 1975. Sex roles, interruptionand silences in conversation. In B.Thorne and N.Henly (eds.), Language and Sex: Difference and Dominance.Rowley, Mass., N ~bury House, pp. 105-129.Zumbuhl, Ursula. 1984. ••Ich darf noch ganz kurz ..." Diemaennliche Geschwaetzig- keit am Beispiel van zwei TV-Diskussionssendungen. In S. Troemel-Ploetz (ed.), Gewaltdurch Sprache. Frankfurt, Fischer, pp. 233-245.


o tema proposto para este simposio*, Linguagem e Discrimina-~ao Social, pode ser abordado sob dois aspectos:(1) na visao que defende uma unica modalidade de usalinguistico como recomendavel, descartando como inferior tododesvio da norma padrao. Neste caso a discrimina~ao se da tantoem rela~ao a variedade de lingua como em rela9ao a seus usuana9aoe controle que se manifestam nosdiversos tipos de e-ventos discursivos. Aqui a discrimina9ao 5e faz diretamente noexercicio da intera9ao verbal e implicitamente no tipo de e-vento comunicativo institucionalmente marcado.Minha abordagem da questao situar-se-a no contexto dessa segundaperspectiva. Esta decisao se deve tanto ao interesse pessoalna pesquisa do assunto, como a relevancia da propria questao.Par outro lado, a primeira perspectiva, alem de preconceituosa,trata a linguagem como uma institui9aa independente darealidade social, ou seja, urn bem abstrato e autonamo. Mas alinguagem nao e apenas urn sistema de simbolos, e sim tambem urn"instrumento da desigualdade (cf. R. Fowler, 1985:62).E facil canstatar que a ~maj,JL£om':l~d_alJ!1g~!3c,on,~


discursivos; sabemos como dar a entender coisas que nao queremasdizer explicitamente; sabemos como insultar au elogiar; sabemosque interagir com urn medico e diferente do que interagircom urn delegado de policia au com urn colega de trabalho ou urnprofessor em sala de aula. Sabemos portanto que entre dar umaordem ou dar urn elogio vai nao apenas uma diferen~a de ato defala, mas uma diferen~a de rela~oes de poder.E tambem sabemosque nao e nada facil lidar com todo este saber. Sabemos, porfim, que para certos tipos de intera~ao exige-se longo preparo,como p. ex. para a participa~ao na discussao em urn seminario deestudos, urn simposio cientifico etc.Vma vez definida a perspectiva da abordagem, resta restringira conjunto de questoes. A grosso modo as intera~oes navida diaria podem ser distribuidas em duas grandes classes:(a) conversac;oes casuais e(b) encontros institucionalizados.Da primeira classe fazem parte todos os tipos de event osinteracionais para as quais nao ha uma prepara~ao previa nemtema definido; as parceiros em geral se conhecem; as intera~oessac geralmente privadas e as possibilidades de interven~ao porparte dos falantes sac em principia igualitarias. Na segundacIa sse situam-se os eventos interacionais que usualmente tern urnobjetivo definido; as situa~oes sac geralmente pUblicas e oscontextos caracterizados por normas convencionalizadas; os participantesnem sempre se conhecem e urn deles representa, emprincipio, urn papel especifico e predominante derivado de suaposi~ao institucional.Nao obstante essas diferen~as, as duas classes de eventosnao passam de dois pontos imaginarios dentro de urn continuum.Em ambas podem-se constatar assimetrias au desigualdades geradorasde poder e fontes de controle dos mais diversos tipos. G.Kress e R. Fowler (1979:63 ss) sugerem que ;as rela~oes comunicativassao geralmente assimetricas no sentido de que urn participantetern mais autoridade que 0 outro". As aparencias deintimidade, solidariedade e coopera~ao nos encontros socia isseriam "ilusorias".


Muitos estudos na area da intera9Bo verbal, por etnometodologoscomo H.Sacks, E.Schegloff, G.Jefferson, J.Schenkein, E.Goffman e outros se ativeram em geral as intera90es simetricase suas preocupa90es foram descobrir as formas de organiza9Bo eestrutura9Bo conversacional validas como regras gerais. Assimfoi 0 sistema de ~omaaa de turno (cf. Sacks, Schegloff, Jefferson,1974),urn aparato em que as rela90es de poder nBo foram e-xaminadas. Na verdade, as regras para a tomada de turno ssao emgeral muito mais comp1exas do que 0 classico trabalho dessesautores deixa supor.Nesta abordagem sera enfatizado apenas aquele conjunto deintera90es que apresenta algum tipo de assimetria ou desigualdade.Isto porque, de fato, como observam J.J. Gumperz e J.Cook-Gumperz (1982:2), nos dias que correm, em sociedades complexascomo a nossa, tornamo-nos cada vez mais dependentes dosservi90s pUblicos e de contatos interpessoais com desconhecidos.Assim, 0 espa90 para a imposi9BO a identidade pessoal setorna reduzido e as flexibilidades na rela9Bo interpessoal ficammenores. Por outro lado, 0 "~c1LflS;L~is:L:L~R~JJiiJ?~i~o!!1€lrClITlE?J1teurn efeito ou reflexo da org~niza9"B2,~?cial e processos e)e euma parte dopI"()(;€lsso social" (cL R. Fowler eta1., 1979: 1). Assim por exemplo, ~_n::Cl._e~tE~-""~~_t~_n13oe ap~n9stipo de discurso, mas urn mecanismo de controle de urn individuo~b:.~c(),~()Utrg(cL G. Kress e R. Fowler, 1979), 0 que 'pode. serconsiderado urn poder institucionalmente derivado, au seja,\,lmNum primeiro momento definirei uma bateria de n090es e emseguida tentarei elaborar alguns criterios para observa9ao dere1a90es de poder e controle discursivo nos eventos interacionais.Aqui me aterei apenas a uns pucos pontos cruciais, comocertos tipos de atos de fa1a e 0 par pergunta-resposta.Num extenso estudo sobre discurso e poder, T.A.van Dijk(1987) observa que poder e uma n09130 que no macro-nivel dizrespeito ao poder social que se manifesta como poder economico,


politico, cultural e outros. No micro-nivel ele e 0 exerciciode prerrogativas derivadas dessas estruturas mais altas que semanifestam na condu~ao local das rela~oes interpessoais. E nestesentido que se pode usar a no~ao de controle tal como no casodo controle dos topicos, das formas de tratamento, da tomadados turnos, da sele~ao de certos atos de fala etc. Domina~ao eurn terceiro aspecto e tern a ver com 0 uso do poder em fun~ao decertas imposi~oes para fins especificos. No macro-nivel situam--se os grupos sociais, as classes de interesses bem como aspraticas institucionais e socio-culturais que regulam e determinamformas globais de discursos. Dai surgem por exemplo tiposcomo 0 discurso religioso, 0 discurso juridico, 0 discurso parlamentar,0 discurso militar, 0 discurso patronal, 0 discursopedagogico e assim por diante.Nesta analise ater-me-ei apenas as manifesta~oes de poder emrela~oes interpessoais assimetricas, ou seja, naquelas em quese verifica algum tipo de desigualdade entre as participantes.Quanta a no~ao de poder, T. A. van Dijk (1987:5) identifica,entre outros, os seguintes aspectos (cf. tb. R. Fowler,1985):(1) 0 poder baseia-se geralmente na posse de recursossocialmente valorizados mas desigualmente distribuidos, comostatus, conhecimento, especializa~ao,etc.(2) poder e analisado em geral em rela~ao a conceitoscomo domina~ao, influencia, for~a, autoridade, prestigio, coer-~ao, manipula~ao, persuasao e legitima~ao.(3) em todos os casos deve ser feita uma distin~aoentre 0 poder individual e 0 poder social derivado da posi~aono grupo(4) poder e uma propriedade especifica da inter(a~ao)e como tal nem sempre e exercido de forma explicita, sobretudonas rela~oes discursivas.(5) poder e uma no~ao relacional rm que urn individuo Aexerce algum tipo de pressao sobre outro B . Isto significa quepoder e uma propriedade de uma rela~ao especifica entre A e B .Segundo R. Fowler (1985:61), trata-se de uma rela~ao transitivaassimetrica.


(6) 0 poder e exercido por A sobre B no interesse de Aque para tanto recorrera aosmeios adequados.(7) 0 poder de A se legitima se B se rende a A sejapor acreditar que os desejos e a~oes de A sac de seu interesseou porque quer evitar san~oes (p.ex. no caso de A ser uma instanciacomo 0 Judiciario).interpesalgumasvesoais,em atos discursivos dos mais diversos tipos,zes de forma explicita e outras de modo implicito,lembra T.A. van Dijk (1987), "0 dis;urso nao serve apenas paramostrar ou exercer 0 poder, mas tambem para dissimul~-lo".Entre os fatores b~sicos da organiza~ao do poder pessoal esta acogn~~ao social, pois ela "providencia as bases para a produ~aoe interpreta~ao de discursos e os fundamentos da intera~ao social".Como exemplo caracteristico deste tipo de opera~ao doconhecimento social apresento aqui urn trecho de uma entrevistaentre uma empregada domestica (analfabeta) da cidade do Recifecom uma pesquisadora (universit~ria. pos-graduanda):(1) MAROJXHI- L.E.D./Recife, 1978, 25:245-343/ .../1 E: e quando voce fala com seus patrOes voce fala do mesmo2 jeito3 S: falo do mesmo jeito4 E: nao ternassim uma palavra que voce gosta assim de dize5 mais6 S: born(.) eu nao tenho p:>rqueeu so falo a mesma coisa7 igual p:>rqueeu nao sei fala france:is p:>rtugue:: is (.)8 ingle:is (.) materna:tica essas coisa eu nao seio fala9 (..) que eu falo a mesma coisa que eu falo agora10 E: mas se voce vai pedi alguma coisa ao seu patrao au a sua11 patroa como e que voce diz12 S: borneu digo (.) "don'Ivete per favor sera que a senhora13 podia me ceder: (.) digamos (.) dez cruzeiros vinte14 cruzeiros adiantados" (.) e assim que eu digo (.) se ela15 deu ai eu "lWito obrigado" (.) quando ela me de ai eu


diferenteE: quais sao as p31avrass: l::xJrn e (.) ele fala eh


52 dize "VAMOS" e a empregadaoutra ja nao diz vamo/"VAMO"(.)53 que dize que as palavra ja esta diferente /.../ e isso que54 nos fala /.../Este trecho, propositadamente longo, tem varios indicadoresmuito claros de rela90es de poder impllcitos e expllcitos,fundados no que van Dijk chama de cogni9Bo social. Em primeirolugar trata-se de um tipo de atividade (cf. S. Levinson, 1979)designado entrevista e que representa rela90es assimetricas. Eassimetrico quanta aos papeis, pois uma e a entrevistadora e aoutra e a entrevistada , sendo que a primeira comanda os topicos,introduzindo-os ou retirando-os de pauta. Tambem e assimetricaem rela9Bo ao status, ja que uma e analfabeta e empregadadomestica e a outra e universitaria. A entrevista podeser tida, de urn modo geral, como urn exemplo prototipico de rela90esde poder e controle nas praticas sociais devido a desigualdadede papeis a que os participantes estBo submetidos (Cf.R. Fowler et al.,1979:2ss).Em segundo lugar, evidencia-se em (1) uma assimetria implicitaque se verifica na rela9ao entre a empregada e os patroes.Note-se que ate mesmo na natureza dos atos de fala a empregadareproduz explicitamente os atos que 0 patrao the impoe.Vejam-seas linhas 35-39: "nao fa9a isso que isso e muito feio", "e ridiculo","isso e pessimo e horroroso nao se fala assim",etc. Eevidente que isto reproduz condi90es discursivas desiguais emque urn dos membros toma a iniciativa de regular ate mesmo 0comportamento lingulstico do outro, ou seja estabelece uma rela9aode poder de A sobre B , tal como observado acima.A empregada age com conscie~cia desses fatos e ace ita issocomo se fosse algo natural. Neste caso trata-se da imposi9ao deuma assimetria vinda de uma institui9ao carcaterizada na rela-9ao patrao-empregada . 0 que se observa aqui e como 0 poder e-xerce urn controle tanto social como lin1ulstico. R. Fowler(1985:64) lembra que esse poder e "constitutivo" na medida emque constroi a propria realidade social, ou seja, constroi "asinstitui90es, as papeis, as status e preserva a estrtura hierarquicada sociedade, protegendo as oportunidades explorativas


das classes reguladoras", gerando assim aluntaria ou involuntaria.Assimetria e uma no~ao usada para descrever uma rela~ao dedesigualdade ou desequillbrio entre os membros participantes deurn evento de fala. Essa desigualdade pode ter origem em uma serievariada de indicadores. No caso visto em (1) observamos pe-10 menos 5 diferen~as fundamentais:(i) inser~ao ern grupos sociais diversos;(ii) forma~ao desigual(iii) profissao corn valor social diferenciado(iv) direitos diferenciados(v) papeis desiguais no comando da intera~ao.Disto resultam diferen~as quanta as formas de tratamento ( Strata I por "senhora" e I trata S por "voce"); quanta as formasde polidez ; quanta ao controle dos topicos (a entrevistadoratern 0 domlnio total do que e mencionavel); quanta ao estilo;quanta ao tipo de atos de fala (quando S reporta os atos que 0patrao Ihe impoe mostra que sao' atos que nao Ihe compete repetir).Ern suma, na assimetria pode-se notar uma diferen~a de podersocial, pessoal e institucional; uma diferen~a na sele~aode recursos lingulsticos; uma diferen~a de identidade socialcorn componentes de classe, personalidade e status. Estes sao osingredientes que compoem a distancia social entre os participantesoGeneralizando, podemos dizer que urn encontro assimetrico ernconversa~oes casuais e tao posslvel, embora menos frequente,quanta ern encontros institucionalizados. Tlpico e proplcio aassimetrias e por exemplo 0 encontro casual entre indivlduosque 5e desconhecem, mas urn deles apresenta alguma caracterlsticade constraste, como vestimenta, aparenc~a pessoal, idade, ousexo. As diferen~as poderao ser menos ou mais acentuadas,contribuir menos OU mais para controles e domina~oes. Nosencontros institucionais temos ja por defini~ao uma situa~aoproplcia a diferen~a,pois como lembra J.A. Thomas (1985:766) urn


dos participantes encontra-se em "seu territorio pessoal" e seconsolida como a participante dominante. Com territorio pessoalentende-se tanto a prerrogativa da posi~ao institucional (comono caso do Delegada diante do preso) como a possibilidade decornando e controle de a~oes futuras (caso do Entrevistador nacondu~ao dos topicos).o arquetipo rnais acabado disso sac as tomadas de depoirnentospelo Juiz na hara de constituir a prova processual. Aqui 0 Juiztern, por defini~ao normativa, os turnos e dispoe sua distribui-~ao podendo cortar ou solicitar repeti~ao a qualquer momento. 0proprio advogado, quando se dirige a alguma das testemunhas aupartes deve faze-lo atraves do Juiz. A propria institui~ao judiciariae, par natureza, coercitiva e pouco rnaleavel.Todos asatos verbais praticados estao sub jUdice e ali a principia decoopera~ao (Grice, 1975) tern sua validade em sentido estrito e(1987) que tentou mostrar como a·exigencia de rnaximizacao da e-ficiencia na troca de info!macao no tribunal leva a uma Dservanciaregular do principio de cooperacao tal como proposto parGrice (1975).Isto revelaria, par outro lado, a inadequacao dornesmo principia para as intera~oes casuais (cf. R. Penman,1987:214 s.s).apresente sempre 0 tipo de lirnita~ao e controle acima apontadopara a jUdiciario, ela e mais frequente que no caso dosencontros casuais. Segundo T.A.van Dijk (1987:40) "dialogos comau em instituicoes au organiza~oes levam a intera~oes institucionaisde modo a manifestarem, sinalizarern au legitimarem umamultiplicidade de rela~oes de poder". Os participantes obedecema norrnas ali vigentes, cabendo-lhes urn espa~o reduzido para anegocia~ao de papeis, posi~oes e estrategias.Mas e justamente essa rigidez na organ~za~aa dos procedimentasinteracionais que leva, em muitos casos, a perversao dosistema , como no fato que me foi relatado par urnJuiz do Recife.Num dado depoimento, no ato da constitui~ao da prava, 0Juiz perguntau a testemunha da acusa


minoso'" ao que a testemuna respondeu:" Ele e urn cafajeste, urntarado, urn doido". 0 Juiz nao ditou a respostaao escrevente ereinquiriu a testemunha com a mesma pergunta, obtendo a mesmaresposta. Novamente nao atranscreveu, ao que a testemunha disse:"Mas 0 Senhor Juiz nao vai par isso nos autos?". Essa indaga


tempo os turnas, ter a prerrogativa de iniciar au concluir topicos,regular 0 estilo,etc. 0 poder pessoal aumenta com a acumuladas possibilidades de contrale.Os membros mais fortes na intera~ao tern, pais, a possibilidadede exercer controle em varios nlveis, tais como:-selecianar preferenclalmente as falantes;-introduzir, incentivar au retirar topicos discursivos-iniciar e concluir as eventoS-coordenar as aloca~oes dos turnos, sua extensao etc.-produzir preferencialmente determinados tipos de atos de fala-definir as formas de polidez-definir a estilo, 0 lexica etc.-coordenar as sequencia~oes-avaliar posi~oes, opinioes situa~oes etc.e muitos outros aspectos, geralmente ligados a rela~oes de desigualdadesau assimetrias. Com rela~ao a no~ao de topico sigoaqui a posi~ao de Brown & Yule (1983), que distinguem entre 0topico sentencial e a topico discursivo, sendo que me refiro aeste ultimo.o exerclcio desses controles e uma fante de poder pragmaticoe estrategico na medida em que define as condi~oes de adequa~aodiscursiva. Se par urn lade temos uma correla~ao entre poderinstitucional e formas de controle, por outro temos a mesmacorrela~ao entre poder pessoal e formas de controle, cuja manifesta~aopode ser mais sutil mas nao menos eficaz. T.A. vanDijk (1987:20) indaga-se sobre uma outra forma de co-varia~ao,ou seja, a que existiria entre tipos de texto e formas de exercer0 poder . Assim, ele levanta a hipotese de que uma tipologiade texto poderia sugerir tambem uma tipologia de poder.A escolha do tipo de discurso usualmente se restringe a fataresinstitucionais ou situacionais independentes do controledireto dos falantes (cf. van Dijk,1987:26); Contudo, urn dos falantes,geralmente 0 mais forte naquele evento, pode suspendertemporariamente as negocios formais em andamento e introduzirurn novo tipo de texto estranho ao momenta. Este e 0 caso de urnprofessor que durante uma aula pode parar e contar uma piada au


discutir urn tema de polltica ou algo semelhante, ou urn presidentede sessao que resolve introduzir ingredientes novos nareuniao, estranhos ao que esta em andamento. E evidente que cabetamb~m a esse membro 0 retorno ao t6pico anterior ou ao ~ipode texto adequado aquela situa~ao. Essa troca e sele~ao de generosdiscursivos restringe-se, evidentemente, ao membro maisforte e com mais poder. E perfeitamente possivel no entanto queocorra urn aparte do tipo "questao de ordem", quando urn dos presentesresolve investir num das regras formais e pedir 0 retornoao t6pico. Esse procedimento s6 se da eficaz e bem-formadamentequando 0 "descaminho"do t6pico nao ocorreu por decisao domembro mais forte ou a sua revelia.Assim, em nao havendo pqssibilidade de escolha do tipo, podehaver uma escolha na forma de conduzir 0 tipo. Quanto a issovale salientar que a situa~ao em que se desenvolve urn dado e-vento ou episodio social (cf. S Levinson, 1979) nao e urn dado apriori, mas urn constructo interpessoal (cf. M. Cody( M.McLaughlin, 1985). A situa~ao ~, pois, urn con junto de comportamentosque tern 0 efeito de agir tanto sobre como a partir doque esta ocorrendo, isto ~, a propriedade de ser indexical ereflexivo.Como se observa, ha dois aspectos envolvidos nessa correla-~ao entre tipo de texto e tipo de poder:(a) urn tipo de texto tern em si certas formas de organiza~aoestrutural internas que Ihe saolditadas pela natureza do e-vento. Tais sac as diferen~as entre uma intera~ao no Tribunaldo Juri, numa sala de aula, numa reuniao da presidencia daenpresa, no encontro entre m~dico-paciente, na rela~ao entrepatrao-empregado,etc. Todos estes tipos evidenciam formas depoder, mas diferenciam-se quanto a rigidez, normatividade, etc.(b) urn tipo de texto pode realizar-se de modo oportunisticocom varia~oes que permitam maior entrosame~to, mais disten~ao,facilita~ao do fluxo das rela~oes interpessoais. Neste caso asdecisoes do membro mais forte podem ser tomadas at~ mesmo ernfun~ao da melhor condu~ao daquele tipo como tal (como mecanismode negocia~ao).


Em (b) temos formas de condu~ao que dizem respeito ao estiloque define a controle local das a~oes e das decisoes. Podem-seromper certos tabus, como introduzir elementos lexica is naocondizentes com 0 processo normal de condu~ao do evento, permit~rmaior informalidade, variar nas formas de endere~amento,variar nas formas gramaticais etc.Ao analisar a no~ao de tipo de atividade S. Levinson(1979:369) propoe uma distin~ao entre a estrutura do evento emquestao e 0 estilo no qual ele e conduzido. A estrutura incluiuma serie de sub-partes ou episodios com certas sequencias pre--estruturadas que funcionam como conven~oes ou normas. Assim eo caso de urn seminario num curso de Pos-gradua~ao cuja primeiraparte e uma apresenta~ao e em seguida se tern uma discussao; assime 0 caso de uma conversa~ao telefonica corn seu inlcio, umaabertura ritual, seu desenvolvimento e urn fechamento novamenteritual; mais comp1exo e por exemplo urn Ju1gamento num Tribunaldo Juri. Todos e1es tern suas condi~oes de desenvolvimento e organiza~aointerna, raciona1mente montados corn vista aos objetivaspretendidos.A questao central para Levinson (1979:370) e: "de que maneirasas propriedades estruturais duma atividade condicionam (especialmenteas fun~oes das)as contribui~oes verbais que nelapodem ser feitas?" Levinson (1979:371) observa que para cadatipo de atividade ha urn con junto de esquemas inferenciais correspondente.Ern outros termos, isto aponta para 0 fate de queumal serie de a~oes por exemp10, a Pergunta-Resposta, tera erncada tipo de atvidade discursiva uma tendencia preferencia1 parauma forma de funcionar. Assim, no caso da rela~ao medico-paciente,as varias perguntas do medico tern como objetivo checaras informa90es para chegar ao diagnostico?a doen9a; as perguntasno caso do Tribunal do Juri servem para construir 0 argumentona medida em que arrancam do acusado os dados imprescind1veis:na escola trata-se de exercitar urn conhecimento,sendo que ali as P-R sac urn procedirnento didatico.


Neste sentido, os tipos de atividade condiconam 0 que podeser tornado como contribui~ao admissivel pa!a a atividade e comotal determinam como sera tornado 0 que alguem diz (cf. Levinson,1979:393). Funcionam, pois, como orientadores dos processosinferenciais. Esta posi~ao indica que cada tipo de atividadetern formas de se organizar que permite uma orienta~ao de_inidatanto na sua estrutura~ao interna (formal) I~mo na sua estrutura~aomais ampla (cognitiva). Imagino que 0 perigo nisto tudo esupor que os tipos de atividade possam funcionar a margem deseus usuarios, ou seja, que possam funcionar como tipos ideais,ou arquetipos a mod a de uma super-estrutura.Nao obstante isso, e evidente que a perspectiva colocada erelevante quando se observa que os tipos de atividade submetemos individuos a certas condi~oes previas. 0 nao-dominio dessascondi~oes pode resultar em insucesso. Por outro lado, quem ternurn determinado papel pode usar ou abusar da prerrogativa que a-quele tipo de atividade the concede, orientando a propriatendencia das propostas de sentido (esquemas inferenciais) emproveito proprio. Em outros termos, ali reside uma fonte de manipula~ao.Observe-se no entanto que todas essas reflexoes a respeitodas rela~oes de poder no interior de tipos discursivos nao develevar a conclusao de que 0 tipo funciona como uma super-estrutura.Pois urn dos postulados centrais da AC e de que quem regeeste espetaculo da intera~ao interpessoal e 0 principio do raciociniopratico.Numa analise muito simples com urn texto de uma entrevistafeita no Recife em 1978, no ambito de urn projeto sobre aLinguagem da Empregada Domestica (de onde veio 0 texto citadoem (1) ), tentei verificar em que medida s~ portava a entrevistadana rela~ao com sua entrevistadora apenas na rela~ao deengate da resposta a pergunta. A entrevistadora, uma universitariapos-graduanda, entrevistou uma empregada domestica a-nalfabeta com urn questionario padronizado, mas que dava margem


a uma serie de perguntas ad hoc. A entrevista dourou 35 minutose constou de 92 perguntas.Para a analise estabeleci urn pequeno aparato que seti~ao que a resposta evidenciava em rela980 a perguntaPara tanto estabelecf 9 tipos de formas:(1) repeti9ao do verbo/substativo no in{cio da resposta(2) repeti980 da pergunta antes de iniciar a resposta(3) repeti~ao integral da pergunta como parte inicialresposta(4) repeti~8o com reformula~8o da perguntaapenas no processo de repeti~ao. Verifiquei as formas de repefeita.(5) repeti~ao intermitente da pergunta durante a resposta(6) repet19ao com transforma90es morfossintaticas(7) repeti~oes parafrasticas(8) reposta sem repeti~ao de elementos da pergunta(9) respostas tangenciaisComo se observa, as formas (8) e (9) nao incluem repeti~oes.A hipotese era que as respostas iniciadas nas formas (1) a (5)representariam a maioria para as entrevistas em condi~oes assimetricastal como se verificava no caso aqui analisado. E evidenteque eu supunha como tese mais ampla que nas perguntas erespostas 5e da urnmomento prop{cio para hetero-repeti~oes maisfrequentes que em outros casos de troca de turno. 0 resultadofoi0 seguinte:~ Quantidade1 262 33 154 175 76 17 98 139 0%28.53.516.518.57.8l.9 1814.4Como se depreende desse resultado, as primeiras cinco formasrepresentam precisamente 74,8% do total. E evidente que no casoO.


de 1 temos uma forma muito comum na lingua portuguesa para respostasem geral. Veja -se 0 formato prototipico:(2) E: voce gosta de crian~as: gosto sim senhora(3) E: como e a feijoadas: born {.) a feijoada (.) nos compramos 0 mocoto/ .../Na forma 2 temos uma incidencia bem menor e urn exemplotra como se da este tipo:(4) E: que e que voce acha do amor Severinas: que e que eu acho do amor (. ) eu acho 0 amormui:to bacana acho mui:to bornNa forma 3 a incidencia foi muito alta e isto indica uma e-norme considera~ao para com a entrevistadora (mas poderia sertambem uma evidencia de planejamento verbal/cognitivo pausapreenchida -, ou uma mostra de coopera~ao):(5) E: equal foi 0 maior problema que voce tevecom 0 seu maridos: born (.) 0 maior problema que eu tive com 0 meumarido (.) foi uma discussao / .../Na forma 4 houve uma incidencia supreendentemente alta com 0esquema prototlpico seguinte:(6) E: mas voce nao explicava porque nao sabiaou porque nao querias: porque nem sabia e mesmo nao queria explica praninguem(.) queriaforma 5 foram poucos osfica so pra mimlongos constaram sobretudo de narrativas pessoais,mesmo ocorreram sequencias como esta:(7) E: voce acha que a empregada tern direito (.) a (.)todos os lugares da casas: born (.) eu acho que a empregada deve te direitoporque ela se ela veve dentro dF casa arruma fazetodo servi~o eu acho que ela tern direito de ta emtodos os lugar (.) realmente aqui eu tenho 0direito de ta em todos as lugares que eu quiseNa forma 6 ocorreu apenas 0 caso seguinte:


{8) E: a que e que voce conversa com suas amigasS: nossa conversa e sobre / .. ./Na forma 7 deram-se mais casas e este tipo e muito importantepar representar de algum modo urn recurso lingiiistico variado.Veja urn exemplo tipico:(9} E: se voce ti~esse que ensina urna pessoa asai daqui para para 0 Born Pre~o (.) comoe que voce ensinavaS: born (.) se ele me perguntasse (.) S. por favoronde fica a Born Pre~o (.) eu poderia ensinar (.)voce siga essa Rua em frente / .../Na forma 8 que, .representa a resposta sem repeti~ao, a incidenciafoi de certa maneira alta e teve a seguinte esquema:(10) E: que e que voce faz aquiS: eu cozinho e arrumoFinalrnente, na forma 9 nao houve urn so caso sequer. rsto eurn resultado a primeiravista surpreendente, pais significa quea empregada nao deixou de responder a nenhuma das questoes quelhe foram pastas. Par urn lado, trata-se, evidentemente, de umaenorme considera~ao para com a pesquisadora. Par outro, podesignificar uma submissao da entrevistada devida a sua propriacondi~ao da de empregada (consciencia social).Por fim, podesignificar uma imposi~ao das normas de coopera~ao estrita eneste caso teriamos a pressao tipica advinda da natureza do e-vento comunicativo (entrevista).Uma analise sumaria deste resultado evidencia que em entrevistasassirnetricas, como a maioria das que- os lingiiistas costumamfazer ~m suas investiga~oes sociolingiiisticas, da-se umaespecie de reflexo de poder. Normalmente, as empregadas, pelasobserva~oes que tenho feito, nao seguem este modelo nas sequenciasP-R em suas intera~oes interpessoais espontaneas comas demais empregadas.Por outro lado, se tomarmos entrevistas de natureza mais simetrica,tais como as coletadaspelos pesquisadores do ProjetoNURC, veremos que a distribui~ao das percentagens, usando ascrito';riosacima expostos de (1) - (9), naoe a me sma que no ca-


so da empregada domestica aqui analisada. Como exemplo, cito a-penas 0 resultado de uma unica analise com a entrevista registradapelo Projeto NURC/SP que se encontra em A. de Castilho/D.Preti (1987:100-135). Ali foram feitas 27 perguntas pelosentrevistadores, sendo que todas as respostas dos dais entrevistados(que em principia deveriam dialogar entre si) resultarammuito longas, formais e mesmo pernosticas, a que nao erepresentativo para a corpus do Projeto NURC. A formas de (1) a(6) somaram 35% das ocorrencias no conjunto. Na forma 7, em quesao dadas respostas parafrasticas (parafrase da pergunta no i-nicio da resposta), deram~se 36 % das ocorrencias. 0 curiosa eque na forma 9 onde era prevista a pOBsibilidade de respostasnao-responsivas verificaram-se 21 % das ocorrencias. Contudo,mesmo para as materiais do Projeto NURC, 0 normal e uma frequenciamais alta nos primeiros cinco tipos (cerca de 50-60%)com predominio para formas sem repeti~ao integral. Ja no casodas entrevistas com as domesticas (que foram em numero de 60) atendencia e precisamente a revelada no caso acima.Estes resultados podem sugerir que 0 tipo de even to nao tern~ma for9a intrinseca tao grande como se supunha no inicio.Contudo, e necessario mais cautela, pois a domina9aO tern variasformas de se dar dentro do tipo de even to como tal. A subversaodo tipo (como se viu acima) pode ser uma fonte de poder.Retomando a posi9ao de S Levinson (1979) podemos dizer quede fato 0 tipo de atividade entrevista com finalidade para pesquisapode ter duas formas de sec encarada em termos de esquemainferencial de suas perguntas:(a) responder tudo, se possivel com palavras que reveleminclusive urn engate muito cae so com repeti90es evidentes;(b) responder sem repetir ou se possivel nem responder auapreserttar alguma observa9ao tahgencial, periferica au desviante.Tudo dependera das rela90es entre os personagens em questao:quanta mais assimetrica a rela~ao, tanto mais se favorecera aperspectiva (a). Neste sentido parece-me que 0 mfterial do ProjetoNURC revela urn grande equilibrio em termos de simetrias


asicas entre os falantes. A hipotese geral aqui sugerida ficapara ser verificada, mas e de interesse para os linguistas afim de que reflitam sobre seus proprios dados e as conclusoesque deles extraem, inclusive 0 autor desta analise.* versao revista do texto apresentado no Simposio linguagem eDiscrimina~ao Social , na 40ft REUNIAO ANUAL DA SBPe, julho de1988, Sao Paulo. (Quero agradecer aqui os valiosos comentarioscrfticos que recebi do "Grupo das Ter


F'C:1dLER,Roger! Bob HOIX;E/ Gunther KRESS/ Tony TREW ,eds. (1979),language and Control. London, Routledge & Kegan Paul.GRICE, H.P. (1975), Logic and Conversation. In: P. COLE/ J.MORGAN(eds.) Syntax and 5euantics. Vol. 3: Speech Acts. NewYork, Academic Press. 41-58.GUMPERZ, John J./ Deborah TANNEN (1979) , Individual and SocialDifferences in Language Uses. In: C. FILLMORE/ D. Kemplere W. S.-Y WANG (eds.), Individual Differences in languageAbility and language Behavior. New York, Academic Press.305-325.GUMPERZ, John J./ CCX)K-GUMPERZ, Jenny (1982), Introduction:language and the communication of social identity. In: J.J. GUMPERZ (ed. ), language and Social Identity.cambridge, Cambridge University Press. 1-21.KRESS, Gunther / Roger FOWLER (1979), Interviews. In: R. F'C:1dLERetal.(eds.), 1979. 63-80.LABOV, william /T. LABOV (1986), Public Discourse and the Problemof Social Order. in: T. ENS INK/ A.vanESSEN/ T. van derGEEST (eds.), Discourse Analysis and Public Life.Dordrecht, Foris. 225-243.LEVINSON, Ste[i1en C. (1979), Activity Types and language,Linguistics 17, 365-399.PENMAN, Robyn (1987), Discourse in Courts: Cooperation, Coercion,and Coherence, Discourse Processes 10 (3) 201-218.SACKS, Harvey/ Emmanuel SCHEGLOFF/ Gail JEFFERSON (1974), ASimplest Systematics for the Organization of Turn-Takingfor Conversation Language 50, 696-735.THct1AS, Jenny A. (1985), The Language of Power: Towards a DynamicPragmatics, Journal of Pragmatics 9, 765-783.


PADROES ENT()ACIOMAIS.CfJr'lPR~EttSlo· E lEHURADE TEXIO *A estrei ta rela~iio entre os niveis segmentais, suprassel!;me!!tal e contexto social tern constituldo uma preocupa~ao constanteno estudo da produ~iio da fala.A leitura, a exemplo da fala, estrutura-se a partir de umaserie de esquemas (frames) e rela~oes cuja organiza~ao ocorreaos niveis segmental ,suprassegmental e interacional (contexto s~cial). Embora oS dois primeiros tenham sido bastante explorados,a rela~iio entre estes e 0 interacional tern side poucoinvestigada.As inten~oes do falante (nivel interacional) e os diferentespadroes entoacionais presentes na leitura, por exemplo, podemconstituir um manancial de informa~oes as quais 0 ouvinte nemsempre esta atento, podendo ocorrer uma ma compreensao do textoou mesmo perda da informa~ao veiculada. Trabalhos recentes (Mon!gomery 1979; Halliday 1975; Furtow 1984) tern investigado a rela-~iio entre, por exemplo, entoa~ao e contexte social, e resultadosobtidos atraves de analises espectrograficas vem comprovar a importanciade uma investiga~ao daquela rela~ao no processo de leitura e sua compreensiio.Na leitura, assim como na fala, as estruturas ao n~vel se&-mental sac marcadas pelos aspectos sunrassegmentais de tonicidadee entoa~io, dura~ao e ' amplitude, todos man tendo entre sf uma fntima rela~io. Alem da dependencia entre esses dois nfveis- 0 segmental e 0 suprassegmental- pesquisas com adultos e crian~as(Montgomery 1979; Halliday 1975; Furrow 1984) tern demonstradouma rela~io estreita entre entoa~ao e contex~o social. A inten-~ao do falante, identificada no processo de intera~ao (fun~ao s~cial da linguagem) aparece diretamente vinculada aos tra~os en -toacionais contrastivos. A Fonetica Instrumental tern fornecidosubsidios para a verifica~ao de tal afirmativa. As informa~oes


obtidas atraves de espectrogramas sugerem que a diferentes padr~es entoacionais correspondem diferentes inten~oes do falante.David Furrow (1984) constatou que crian~as de dois anos deidade apresentam diferentes comportamentos prosodicos dependendodo contexto em que se da a comunica~ao oral.o 0 estudo de Montgomery (1979) sobre 0 use da entoa~ao emcrian~as tambem sugere que ao uso da entoa~io ascendente a cria~~a associa urn significado iocial que se sobrep~e ao significadofuncional da lIngua. 0 uso da entoa~ao ascendente esta diretame~te relacionado a fun~io pragmatica da intera~ao social (expectativade respostas a perguntas formuladas no processo de intera -~io social) ainda nos primordios do processo interacional da li~guagem. Uma explica~io para tal pode ser 0 fate de que na comunlca~io com a crian~a 0 adulto faz uso dos aspectos prosodicos aclma referidos para distinguir as diferentes fun~oes sociais de intera~io nos enunciados, levando a crer que ao se fazer uso de diferentes padroes de entoa~ao estimula-se 0 desenvolvimento de modula~oes prosodicas na aquisi~ao da linguagem.Na verdade, a questao da entoa~ao, tonicidade, dura~ao e amplitude para a capta~io da inten~ao do falante possui papel preponderantena compreensao da mensagem. Para O'Connor e Arnold(1959) a entoa~ao expressa a atitude do falante face a situa~aoem que se encontra, numa escala superior a propria estrutura doenunciado em termos de palavras e sua organiza~ao dentro do discurso.Enquanto d principio possaparecer valido, adificuldadeesta em estabelecer os diferentes niveis de tonicidade e entoa -~io e sua re1a~ao com a atitude do falante. Halliday (1967) di~tingue cinco tons (linhas melodicas) associados aos movimentostonais (pitch movements). Esses tons estio vinculados a oposi~ioentrepolaridades:"Se a polaridade e assertativa, a intensidade da t6nieRcai; se nao-assertativa, sobe. Assim, tom 1 constituiuma asser~ao ou uma pergunta que nao envolve polarid~de; 0 tom 4, que cai eem seguida sobe, constitui umaasser~ao que envolve ou implica alguma pergunta. 0 tom2 constitui uma pergunta ... e 0 tom 5, que sobe e em


seguida cai, constitui uma pergunta nao mais importante,combatida por uma asser~~o. 0 tom 3 evita uma decisao: como numa asser~~o e, na melhor das hipoteses,eventualou imaterial"(Halliday op. cit.:7).Com isso entende~se que 0 falante pode ter diferentes grausde envolvimento com seu interlocutor (Coulthard, 1977). Os dif~rentes graus podem relacionar-se com inten~oes marcadamente di~tintas no falante e, ainda, com diferentes graus de conhecimentopartilhado ou envolvimento pessoal de ambas as partes.Brazil (1975) oferece dois exemplos em que diferentes grausde entoa~ao podem sugerir diferentes padroes: 0 uso de 'do youknow' (voce sabe) e de '1 mean to say' (quero dizer). Para 0 primeiro, 0 padrao descrito seria como uma ocorrencia inicial de urntom descendente seguido por urn tom ascendente. No segundo caso,apenas um tom descendente. Com isso, terlamos ja dois padroes,sugerindo um maior ou menor partilhamento de um conhecimento pr~vio (shared knowledge). Em 'you know' 0 tom descendente/ascende~te esti vinculado a uma inten~io do falante em manifestar urn conhecimentoprevio entre as duas partes (falante/interlocutor).Em '1 mean to say' 0 padrao entoacional muda, mudando tambem aatitude do falante com rela~ao ao seu interlocutor, pressupondo--se aqui 0 nao-partilhamento de uma informa~ao previa. Para 0primeiro casa, Brazil usa 0 termo 'refering' e 0 associa ao padraoentoacional descendente/ascendente. 0 termo empregado para 0 segundocaso e 'proclaiming' e esta associado ao padrao descendente.Esses dois padroes assemelham-se aos tons 4 e I de Halliday.Brazil estabelece ainda graus de intensidade que podem ser atribuidosaos dois tons ja estabelecidos (refering e proclaiming),indicando graus de envolvimento por parte do interlocutor (cf.Coulthard, 1977). Com isso, a classifica~ao de Brazil aproximaaquela de Halliday do tom 5.Podemos resumir a classifica~ao de Halliday e a de Brazilem duas dimensoes- refer/proclaim e involved/uninvolved- em queo significado estara sempre relacionado a urnmaior ou menor graude envolvimento dos interlocutores, envolvimento esse que, por


sua vez, pressupoe urnmaior au menor grau de partilhamento de urnconhecimentoprevio.Na escolha do tom, 0 falante dispoe de tres niveis: alto,medio e baixo. 0 medio consiste em, por assim dizer, a linha b~sica, ponto de referencia para a classifica~ao das outros dois:alto e baixo. A distancia entre esses tres niveis e percorridapor uma serie de grada~oes (cf. Brazil op. cit). A distancia maximaacima do ponto medio esta associada uma fun~ao contrastiva,mais evidente quando 0 contraste se da ao nivel do sistema como,por exemplo, 0 contraste lexical, sem uma rela~ao necessaria entreftens dentro e ftens fora do sistema (cf. Coulthard, op.cit).o nivel 'baixo (distancia maxima abaixo do ponto neutro)pressupoe uma rela~ao de equivalencia entre itens num contextoconversacional. De certa forma, a classifica~ao em niveis acimadescrita esta relacionada as dimensoes de significado previamentediscutidas de 'refer/proclaim' e 'involved/univolved'. As gr~da~oes alto/medio/baixo funcionam como pistas (Key para Labov eFanshel. 1977) e urn tom alto pode sugerir:'ha algo mais a seguir'enquanto 0 tom baixo implica 'isto foi dito numa situa~ao criadapor algo que acabou precisamente agora'.o uso de diferentes tons (keys')- alto. medio. baixo -pode.dentro do sistema. estar relacionado com diferentes tipos de estruturas(interrogativa. negativa e declarativa). Em cada tipode estrutura pode-se ainda descrever uma serie de padroes. cadaurn dos quais correspondera a diferentes inten~oes do falante. Noentanto, mesmo considerando diferentes padroes dentro de cadaestrutura torna-se dificil - quando nao, impossivel- prever-seuma descri~ao de todos os padroes entoacionais de que 0 falantefaz uso na lfngua para exprimir diferentes inten~oes. Para Labove Fanshel (1977) e praticamente impossivel prever-se urn numerode interpreta~oes de pistas (keys) prosodicas que sejam livresdocontexto.Esses dados ressaltam 0 papel que os padroes entoacionaisexercem na cornpreensao de urn texto, seja ele oral ou escrito. Corno se da a compreensao equal 0 processo nela envolvido sac questoes ainda nao muito claras, rnuito emb~ra haja urn consenso no


compreensao:ocompreender urn enunciado (texto oral ou escrito)~ aprenderseusignificadoTomando como ponto de partida a equival~ncia acima estabelecida, serfamos levado~ a concluir que a compreensio poderia sero resultado de uma atividade descontextualizada onde 0 conheci -mento pr~vio e 0 envolvimento do emissor/receptor com fat orespresentes ou ausentes na mensagem seriam fatores marginais e desomenos importancia, prescindindo, inclusive, de maiores ques -tionamentos.£ fato que no momento em que 0 indivfduo se coloca na situa~io de receptor, algo mais que uma simples rea~io de natureza e~clusivamente lingUfstica ocorre. No contexto social da comunica-~ao; a intera~ao pressupoe uma serie de atividades e processosdos quais os interlocutores dificilmente tomam censciencia.A compreensao, fator decisivo na comunica~ao, consiste, em ultima in~tancia, no resultado de urn processo interacional. A intera~aolingUfstica pressupoe urn conhecimento lingUfstico (fun~oes e rel~~oes inerentes ao sistema) e urn partilhamento do 'horizonte' (parausar urn termo ja conhecido na analise da Conversa~ao) por pa~te dos interactantes. a receptor tende a estabelecer rela~6esnao apenas ao nfvel puramente do sistema mas tamb~m em fun~io docontexto (em sua aplica~ao mais ampla) extralingUfstico. Essecontexto auxi!iado pelas rela~oes lingUfsticas i que Ihe permitefazer inferencias a partir do que e vinculado num dado enunciado.a comportamento daf resultante tende a modificar as a~oes dos i~teractantes em rela~ao a algo ja conhecido ou representado e 0que seria acrescentado ao ja conhecido (Wells, 1981). As inform~~oes veiculadas somadas ao conhecimento previa (lingUfstico e demundo) proporcionam uma reintegra~io do conhecimento 'anterior'ao novo.Mas, considerar apenas 0 enunciado e sua rela~ao com 0 contextoainda nao e suficiente para se ter as bases para as discu~soes em torno do processo de compreensao. Subjacente aquela rel~~ao, existem processos de outra ordem, ao Dlvel da cogDi~ao, dos


quais temos pouco conhecimento mas que, sabemos, exercem urnpapelfundamental na compreensao. Marcuschi (1987) ao tratar a rela~aotexto/contexto, chama a aten~ao para a 'contextualiza~aocognitiva' vista como "dependente da propria organiza~ao dos c~nhecimentos e experiencias pessoais" (op.cit. :8) e coloca comocondi~6es para a compreensao de texto a base textual (sistemalingUfstico), 0 conhecimento relevante partilhado, a coerenciado proprio texto, a coopera~ao mutua (recep~ao e produ~ao), aabertura textual (possibilidades interpretativas dentro de alte!nativas mutuamente aceitaveis), a base contextual (presen~a decontextos suficientes situados num tempo e espa~o definidos tantopara a produ~ao como para a recep~ao) e, finalmente. a determina~aotipo16gica (tipo de texto).A partir dessa coloca~ao ja podemos pensar na compreensaocomo urn processo que envolve algo mais que a simples equivalenciaconsiderada no inlcio deste trabalho.Indo mais profundamente ao amago da questao. haveremos depensar em outro fator que apesar de presente em toda intera~aolingUfstica, nem sempre esta explfcito: a inten~ao do emissor. 0receptor tende a 'captar' a inten~ao do falante/autor a partirdas informa~6es veiculadas pelo sistema (base textual, em Marcu~chi) associadas ao contexto e as 'propostas' de modifica~ao in -tencionadas pelo emissor (Wells, 1976). Levando em considera~aoesses aspectos Wells define a compreen'sao como "resul tado de urnprocesso interacional entre as pistas (cues) fornecidas pela pr~du~ao do emissor e 0 conhecimento que 0 receptor dispoe para interpretar essas pistas" (op.cit. :119). As pistas fornecidas peloemissor sac interpretadas pelo receptor com base no conhecimento'anterior' partilhado por ambos. Uma falha no processo acarretauma interpreta~ao erronea da mensagem e, consequentemente, umafalha em todo 0 processo de compreensao.Tanto na emissao quanta na recep~ao da ~ensagem (fornecimento e identifica~ao das pistas dentro da coloca~ao de Wells) haainda urn outro fator a se considerar~ a criatividade. Tanto 0emissor quanta 0 receptor sac criativos no ate de produzir e rec~ber uma mensagem. Marcuschi (1988) coloca a criatividade como urn


dos aspectos essenciais a serem considerados no estudo do proce~so da compreensao, alertando, inclusive, para 0 fato de que sedeveria desenvolver, "maior respeito pela criatividade do alunosem submete-lo compulsoriamente a respostas sempre estanques"(op.cit.: 2) em situa


imos coloca-los a parte da discussao sobre compreensao e alertarpara 0 perigo em se tomar urn dos dois, ou ambos, como fatoresdeterminantes, nao negando, no entanto, 0 papel que ambospossam exercer no processo da compreensaog evidente que a memoria exerce urnpapel fundamental na cornpreensao (estabelecimento de rela~oes corn fates presentes e/ouausentes na mensagem). No entanto, tambem e sabido que numa si -~ao de teste de compreensao em que se busque dados a partirda reprodu~ao de urn texto. e possivel que 0 ouvinte reproduza t~do 0 enunciado, ou parte dele, sem todavia, dar evidencias deter compreendido 0 enunciado caso the seja solicitada uma para -frase daquele enunciado. Esse tipo de memoria mecanica (apoiadaem dados da memoria recente) e discutido em Carrol 01972) ao citar0 trabalho de Marks and Jack (1953) sobre os modelos de se~ten~as oferecidas ao ouvinte como uma estrutura que se aproximavadaquela lfngua inglesa mas naodescrita como tal. 0 ouvinte(nao familiarizado com 0 novo si~tema) seria capaz de reproduzirpelo menos parte da senten~a imediatamente apcs a apresenta~aodo modelo. Sem evidencias (0 queobviamente seria diffcil) deter compreendido 0 enunciado. Sabe-se que este tipo de ocorrenciae bastante comum no ensino de lingua estrangeira. A coloca~ao de Carrol e que embora a compreensao possa contribuir para areten~ao de estruturas na memoria ela nao ocorre necessariamente.Marcuschi (1985) defende a posi~ao de que existem processa- .mentos mais globais que nao consideram a frase como unidade basica, sendo 0 processamento mais "mais semantico que sintatico".Para esse autor, na realidade, a memoria tematica ou pr6posici~nal e mais eficiente e mais utilizada pelo falante - ouvintee estaria num nivel superior ao das palavras ou frases. Se atentarmospara 0 fato de que textos apresentados num tempo passadorelativamente longfnquo podem ser retomados (memoria de longa d~ra~ao) com base apenas no tema e nunca ern sqa reprodu~ao sintatica, a coloca~ao de Marcuschi parece bastante coerente. Na realidade,e 0 significado e nao a forma sintatica que e preservadana memoria. Esta parece ser tambem a posi~ao de Carroll que afi!ma que a memoria para as estruturas sintaticas e unidades lexica


is especfficas tende a desaparecer mais rapidamente do que a memoria para 0 significado de urn determinado texto. ~ esse significado que vai orientar a organiza~ao das novas informa~oes e estabelecer a reintegra~ao do conhecimento 'novo' ao 'anterior, resultandonuma rela~ao da informa~ao com urn contexto mais amplo.Embora a memoriia~ao tenha urn papel import ante na compreen~sao nao podemos esquecer que sao processos diferentes e que sevamos testar uma devemos cuidar para nao enveredarmos pelos caminhosda outra .Alem da memoria, urn outro processo normalmente associado acompreensao e a inferencia. 'Da me sma forma que alguns testes decompreensao podem ser tendenciosos pela maior ou menor enfase dada as questoes que impliquem dados de memoria, testes que uti1izeminferencias para investigar 0 processo de compreensao pode -rao ser igualmente tendenciosos. Se considerarmos a compreensao,a memoria e a inferencia como processos distintos (embora obviamentere1acionados) haveremos de distinguir tambem as formas deestudar cada urn separadamente. Vistas como processos, a melhormaneira seria pois investi~ar e identificar os estagios por quepassam as opera~oes mentais que organizam as informa~oes lingUl~ticas. Trabasso (1972) chama a aten~ao para duas opera~oes principais:a codifica~ao da informa~ao em representa~oes internas ee a compara~ao dessas representa~oes. Para ele i'a compreensao seda quando as representa


A partir do significado literal do enunciado (ou do que vaina estrutura de superffcie) 0 leitor/ouvinte e capaz de 'perce -ber' as inten~oes do autor (ou do que subjaz a estrutura de supe!ffcie e que nao esta implfcito no enunciado).A crian~adesde cedoe levada a £azer uso de inferencias para se adaptar ae contexto social em que se encontra, e logo'aprende' a 'captar' as inten~oes do seu emissor. Ela identificauma ordem pela inten~ao subjacente ao enunciado. Ao escutar algocomo 'seu prato ainda esta cheio' e mais provavel que ela tomecomo uma advertencia para comer mais do que como uma informa~aoou como urn comentario elogioso. Para Wells (1981:118) "as crian-~as, em particular, devem aprender a prestar aten~ao tanto a me~sagem implfcita (covert) quanto a explfcita (overt) transmitidano enunciado do adulto, se quiserem ter sucesso socialmente comoentendedores (comprehenders)". Como a inten~ao do emissor estasubjacente ao enunciado, 0 receptor tende a fazer inferencias apartir do contexto imediato do conhecimento previo parti1hado. Ea crian~a toma consciencia desse processo logo cedo.* Este traba1ho e parte do projeto "Padroes Entoacionais na Leituradetexto" financiado pe10 CNPq, processo n9 307219/88-7BRAZIL, DC, 1975. Discourse Intonation. Discourse Analysis.Monographs. University of Birmingham: ELR.COULTHARD; R.M. 1977/1985. An Introduction to DiscourseAnalysis. London, Longman.FURROW, D. 1984. Young Children's Use of Prosody, Journalof Child Language, 11: 203-213.HALLIDAY, M.A.K. 1967. Intonation and Grammar in BritshEnglish. The Hague, Mouton.LABOV, W. and FANSHELL, D. 1977. Therapeutic Discourse:Psychoterapy as Conversation.MARCUSCHI, L.A. 1988. Leitura ee Escrito Como Ato IndividualNew YOrk, Academic Press.c01llpreensao db Texto Faladode uma Pratica Social. In:


R. ZILBERMAN & E.T.da SILVA (eds.), Le~tura: ~erspectivasInterdisciplinares. Saa Paulo, Atica, pp. 38-57._______________ . 1985. 0 Processo Inferencial na Compreensaode Textos. UPPE (mimeo)O'CONNOR. J.R. and G.F. ARNOLD, 1959. Intonation of Colloquial English. London, Longman.TRABASSO. Tom. 1972. Mental Operations in Language Comprehension.In: R.O. FREEDLE & J.B. CARROLL (eds.).Language comprehensionand Acquisition of Knowledge. New York, John Willey& Sons, pp. 113-137.WELLS, 1976. Comprehension: what it means to understand. English in Educatimn. 10: 24-37.WELLS, 1981. Learning through Interaction. Cambridge, Cambridge University Press.


LEITURA MULTI-ANGULAR DA PARALITERATURAUMA PROPOSTA1. Introdu~aogeral1.1. ObjetivoNossa proposta e de demonstrar "in concreto" urna afirmaCaomuito comum entre os estudiosos que se debrucam sobre a literaturade massa (R. Barthes (1), M. Sodre, A. V. da Silva (2) eF. Kothe (3), etc.). 0 romance/a navela popular, dizem eles ernsubstancia, e essencial ou congenitamente ideologico ou/e alienante.Nao e 0 lugar apropriado de abrir uma controversia sobreesse truismo, talvez por sua parte tambem ideologico. Preferimostrabalhar sobre 0 como dessa assercao. Habitualmente, osespecialistas ern Teoria Literaria se satisfazem de general idades,de citacoes colhida~ estrategicamente au de esquemas maniqueistasdo texto de superficie. Achamos melhor fazer a provadas evidencias, para alem de urn estruturalismo mecanista ou deurna sociologiaempirica.Recentemente, nos Estados Unidos, M. L. Pratt (4), (Pratt1977; Pratt e Traugott 1980), na Ing1aterra, G. N. Leech eM.Short (5) inspirando-se ern W. Labove H. P. Grice conseguiramresultados interessantes por terem aplicado a textos literariosdo gabarito dos romances de Jane Austen, Georges Dickens, GeorgeElliot, William Faulkner, Ernest Hemingwqy, Laurence Sterne,Tobias Smolett, Machado de Assis, Albert Camus, etc., as regrasde uso da linguagem cotidiana. Sem pretender a nenhurna inovacaometodologica, podemos tarnbem efetuar urna inversao de nos so modohabitual de apreensao: vamos tentar aproximar de urna maneiraplenamente literaria, enobrecendo nosso objetivo de estudo, essestextos da "sub-1iteratura", sem empregar comparacoes inoportunasou pre-julqarnentos indevidos. Por isso, ernbora insistindosobre 0 processo estruturador, uti1izaremos a respeito


deles, cada vez que for necessar~o, os mesmos recursos que osestudiosos da "alta" literatura convocam nas suas leituras dehoje: 0 conceito de isotopia, a imagistica e a dimensao mitica,urn conceito de texto que abarca a noeao de produtividade e deintertextualidade, os procedimentos poeticos de polissemia e deambiValencia, de anagramatizaeao e de convergencia estilistica,a dialetica das estruturas de superficie (fenotexto), a semanticapragmatica de Leech (supra).E como nosso "corpus" (ver 1.3) e constituido de narrativaspertencendo a chamada Literatura/Arte de Representaeao, 0estudo da personagem e dos objetos a ela referidos e ai de primeirarelevancia. Por isso ficarao aproveitadas explicita ouimplicitamente a categoria de motivacao (realista), as categoriasgreimasianas de "eixo semantico" (6) ,"programa narrativo","modelo actancial", "sincretismo actorial", "objetos de valor"(7). Achamos essas categorias, mediante certas retificacoes,particularmente aptas a neutralizar urn tipo de discurso criticourn tanto ingenuo, "personalizante", "irrelevante", mas presenteate na metalinguagem de prestigiosos estudiosos da Literatura eque apaga a distincao entre pessoae personagem, e consequentementeentre Vida e Discurso. Precisamos ser mais cautelosos paranao cairmos em extrapolacoes indevidas.A primeira vista, ele parece faltar dessa homogeneidadetao cara aos estruturalistas. Temos, com efeito, na primeiraseeao de aplicacao (parte II) um conjunto de dois seriados deromances de espionagem (Serie OSS-117 de Je~n e Josette Bruce,serie SAS de Gerard de Villiers): mais Robert Sabatier, JeanLarteguy, Georges Conchon, Jean Chatenet, Jacques Perry, PaulSavatier, Marcel Coudin, Irving Leroy, Louis Danton, Jean Raspail(8). No entanto ha varios fatores de homogeneidade:a) Todas as obras sac narrativas populareslb) Todas poem em cena personagens descritiv~nente definidospela cor e pela raea;c) Todas funcionam no mesmo ambiente climatico (calor extremo):


d. Todas funcionam corn 0 mesmo referente histarico geografico:Franca e Africa pas-colonial. Frederic Dard parecefugir do padrao geografico apenas ao nivel de superficie;e. 0 "corpus" inteiro opera globalmente corn a mesma situacaode discurso.Este ultimo ponto merece uma breve consideracao geral. Comoqualquer discurso, a ficcao e urn ate de comunicacao. Jato e,nela alguem fala para alguem, comunica urna mensagem a alguem,nurn certo contexto de tempo e de espaco. 0 que Leech & Short9} ilustra da seguinte maneira:Message(Leech & Short: p.257)Quadro-lSegundo os dois linguistas britanicos (p.258), a especificidadedo discurso literario (no sentido lato do texto "publicado")residiria no fate que ha, habitualmente, urn so emissoraddresser} para urn grande nlirnerode receptores (addressees). Anosso ver, a indeterminacao e a pluralidade regem os dois polosda eomunicacao. Uma coletividade "potencial" e "atualiazada"no sentido de Greimas e Bremond} (lO) fala para urna outra coletividadepotencial e atualizada, pelo intermedio de tal emissorrealizado e identificado[? "autor implicit03 e. de tal receptorrealizado e identificavel (0 lEdtor vlrtualde l!:.Orlandi (11)).De urna parte como da outra, a singularidade nunea resta perfeita.Urn halo de pluralidaqe sernpre sul:>siete.Assirn, no rom.ncepopular (polieial, de espionagem) frances, a situacao de discurso(cornou sem resposta e~plieita) seria sumariarnente a seguinte,na 6tica dos estudiosos Leeeh'& Short, prat~, E. Or1andiamalgamados:


("~videolo91°-Emissor- "Autor implicito"- Seus narradores.>-" Q-:ȯS~'/LeitoresplausiveisQuadro-25e esse modelo de comunicaCao unilateral fosse viavel, apluralidade do polo A deveria ser enriquecida pela formacao social(0 "bloco histerico" de Gramsci) a qual pertenceria 0 Autorreal que se projeta na obra de modo diverse (polemico,obliquo,etc.), atraves does) narrador(es) e das personagens. Masha a instancia proteiforma das ideologias dominantes cristalizadasnos A.I.E. (Althusser) (12), ou soprando no ar, saturandoo territerio nacional, 0 hemisferio de vivencia de quem sera urndia escritor. Neste nivel, e quase impossivel discriminar aesquerda da direita, os cooperacionistas dos cartieristas naFranca de apes-guerra (1945).Podemos arriscar de maneira quase simploria 0 que requermatizes interminaveis, isto e constituir urn quadro de discursoque serialPolo A- Autor implicito, branco- Narradores- Bloco Historico- Grupo de pertencia- Grupo de Classe- A. I.E.Aspiracoes Nacionais- Ocidente Burgues- Esquerda Intelectual(~scritores) de apes1945.Mensagem(Cooperacionismoideologico)(Cartierismo)visando urnaAfrica Negrarecem "descolonizada"orientalmal OcidentalizadaPolo B- Leitores francesesbrancos- Outros lei toresocasionaispitalista bur-gues de apos1945


Mas esse modelo de situacao do discurso e falso do pontode vista da problematica da escritura. 0 polo do narrador francese branco, "dramatis' personae "do intelectual de esquerda quegeralmente pleiteia ern favor dos desfavorecidos e que se expressanum continuum cultural e ideologicamente ja saturado,isso e um fato no "corpus" analisado. Urn outro fato: 0 tempo eo espaco do Receptor macicamente frances, igualmente situado nomesmo continuum. Tambem esta certa a inscricao do africano comofoco de uma diversidade de discursos emanados de outrem: e umdiscurso branco que, atraves das personagens, falam e pens ampor ele e a respeito dele, mais exatamente da sua representaca~excentricarnente. Mesmo a versao "americanizada" desse discursonao constitui um descentramento verdadeiro do duploFranca/Africa.o modelo e falso por causa de sua rigidez, de seu pressupostade ~ ideologia, e da forma monologica dessa ideologia.Acontece que 0 espaco ideolegico e multivalente, englobante,mas tarnbem virtual nos intersticios do texto. 0 papel do leitor- que potencialmente pode escapar a prevista situacao do discurso- nao e apenas 0 de um receptor de ideologia, mas sim deatualizador de ideologias virtuais ou implicitadas. Quando 0texto diz, ele pode contra-dizer por inferencias, por implicitacoes,como a semantica pragrnatica que nos ensinaram apesFreud (13).Urn dos alvos de nossas analises sera necessariamente aideologia como discurso do outrem, como percepcao de outrem ecomo inscricao. ~ ao desenrolar do ato de Leitura que este discursose cria. t dentro de uma situacao de discurso, aqui ficclonal,que urn "codlficador plurivocal" (termo de Bakhtin) emitesinais equivocos em direcao de um decodificador heterogeneo(nos e todos os leitores possiveis). Para atingir nosso objetivo,acharnos metodologicamente oportuno lancar mao, no que dizrespeito a ficcao popuiar, de'todoo contributo recente da TeoriaLiteraria aplicada as grandes obras. Sem uma analise dosmicro-elementos e de seu estatuto como signo no arranjo do discurso,a narrativa popular fica desconhecida na sua essenciali-


dade ern seus mecanismos reais, como ficariam desconhecidos osgrandes romances brasileiros da era da cana-de-acucar se estivessemreduzidos a dialetica m~niqueista de macro-estruturascomo: Senhor de Engenho X Eseravatura, ou Possuidores X Naopossuidores. Precisamos de uma aproximacao deselitizada queacaba corn a discriminacao, entre obras premiadas, catalogadas,academieas, erigidas ern classicos (14) e obras de puro divertimento(mas pre-julgadas nocivas). Nossa tare fa como estudiososda Literatura e de trabalhar textos, qualquer que seja, corn osrecursos que levam ern conta os micro e macro elementos, e queintegram todos os niveis de analise.A primeira parte apresenta os conceitos basicos que condicionamnossa leitura. Entre eles domina 0 conceito de isotopiaque nos experimentamos sobre a personagem de ficcao (22 parte);efetuaremos urn desvio teorico que enriqueca a isotopia, subsistindonela dois outros conceitos: 0 de programa narrativa (Greimas)e 0 de produtividade (Kristeva). Pela fusao desses ultimoseoneeitos eriamos 0 conceito misto de programacao textual e, quese desdobra 0 conceito geral de isotopia no plano narrativa.A programacao, como nos a entendemos e de natureza energetica.Ela pode ser intencional, ela pode ser "pulsional". Beja qualfor, em nesso estudo, particularmente nas leitura de aplicacao,a personagem sera encarada prioritariamente como isotepia, istoe, uma estruturacao morfo-semantica dentro de urn processo de in-•teracao sintatico-pragmatica. Ela e urn signa correlato (porquenunea ele fica isolado), ern varios niveis, sem esquecer de observarque ele e precipitado da memoria, dos limbos e dos interstieiosdo texto ern instancia de leitura, como durn discursomais vasto (0 social, 0 sub-liminar) - outras tantas designacoeseoneretas do chama do genotexto.As categorias basicas (isotopia, programacao, motivacao)serao salientadas, por vezes eompletadas per observacoes esparsas,diseontinuas, sobre urna amostragern excerta d, "corpus".


A.J. Greimas lancou 0 conceito de isotopia, ha 17 anos a-traves da sua Semantica Estrutural (1966), definindo-a como:Urn conjunto de categorias semanticas que torna possivel a leiturauniforme da narrativa tal que ela resulta das leiturasparciais dos enunciados depois das resolucoes de suas ambiguidades;essas sendo guiadas pela procura da leitura finica".Outros teoricos do texto literario como J.C. Coquet, J.M.Klinkenberg (15), retomaram 0 conceito. Mas, foi urn discipulode Greimas, Francois Rastier quem,seis anos depois, desenvolveu,particularmente no estudo "Sistematique des Isotopies"16). Em colaboracao com 0 chamado grupo de Liege, Jean-MarieKlinkenberg aprofundara asideias de Rastier no comeco de urnimportante livro de aplicacao do conceito de isotopia - Rhetoriquede la poesie (17), ao -passo que J.M. Adam e J.P. Goldenstein,em varios lugares de seu indispensavel LLRguistique etDiscours Litteraire (18), demonstraram pedagogicamente a fecundidadeteorica do conceito.Rastier tinha definido a isotopia como "toda reiteracao dequalquer unidade linguistica" (19); Klinkenberg explicita estadefinicao. A de Greimas se limitava a urna exploracao semantica;Rastier, Michel Arrive, Adam e Goldenstein generalizaram 0 conceitoe 0 estenderam a outros niveis do texto: sintatico, prosodico,fonemico ou grafemico. A terminologia designando estesniveis varia de urn p~ra outro autor.Klinkenberg pretende completar Rastier por urn quadro teoricoinspirado em Solomon Marcus e pius Servien (20) e que daconta do papel da isotopia nos dois maiores tipos de discurso.Previamente, ele divide as isotopias em duas classes: isotopiada expressao e isotopia do contefido. Eis 0 quadro geral de urnateoria do discurso simplificada incluindo 0 lugar da isotopia:


discurso poetico discurso cientificoisoplasmie .•.. -isotaxie + -isosemie - +isologie - +Tableau I, Deux types de discours, in Rhetorique de la poesie.Quadro-4"Isoplasmie" e "Isotaxie" seriam "a repeticio regrada damesma unidade significante, manifesta ou nio, fonica ou graficamente,ou das mesmas estruturas sintaticas (profunda ou desuperficie), ao longo de urn enunciado" (21).As isosemias e as isologias nio sio definidas por Klinkenbergporque sua terminologia parece remeter ao quadro conceptualda retorica geral do grupo de Liege (22).Dai, a correspondencia terminologicalmetaplasma/isoplasmiametataxa/isotaxiametasemema/isosemiametalogismo/isologiaKlinkenberg e seu grupo propoem excelentes leituras tabulariase lineares da poesia baseadas sobre as isotopias do conteudo(veja Rhetorique de la poesie). Entretanto, Adam e Goldensteinexploraram 0 conceito na analise de trechos de descricio,de cancao popular, de texto publicitario, de dialogo (23).Michel Corvin 0 aplicara a semiologia do teatro de maneira implicita(24).Adam e Goldenstein precisam a definicao de Rastier e Klinkenberg,a da isotopia como reiteracao/repeticao. Para eles reiteracao e apenas uma condicao da isotopia. Depois de distinguirisotopia denotada e isotopia do contexto e cOdigo, eles, preconizamurna leitura que seria a identificacao da "heterogeneidadedo que parece a primeira vista hbmogeneo"."Esta identificacao passa pela construcao de diferentesfeixes isotopicos: isotaxias ou estruturas sintaticas, isografiasou estruturas graficas, isofonias ou estruturas fonicas,


isosemias ou estruturas s~micas".As isoplasmias de Klinkenberg se confundem aqui com a isografiae a isofonia que, conforme Adam e Goldenstein, proporcionamurn estudo das anagramas (25).Aproveitamos esta colocacao de Adam e Goldenstein para frisar que a leitura anagramatica ~ uma leitura do significante aonivel "pulsional" capaz de revelar disseminacoes insolitas deelementos significativos. Desde a publicacao de As Palavras sobas Palavras de Saussure (26) varios estudiosos assinalaram aimportancia dessa leitura do significante nas obras literarias(Kristeva 1968, Adam e Goldenstein 1976, Haroldo de Campos1978) (27).Chegou 0 momenta de entregar a concepcao da isotopia queseguimos neste trabalho. Ela se situa na otica de Adam e Goldenstein.A isotopia nos pa~ece uma proqramacao textual que naoexclui essas "beligerincias" de estrutura (Ricardou.1967) nemesses disfuncionamentos geradores de sentido, nos quais PierreMacherey coloca a ess~ncia de ideologia da obra (28).Mas, 0 que e a programacao textual?Essa nOCao de programacao,derivada da cibernetica e aclimatadana teoria literaria. e vinculada nao apenas ao conceitomarxita de produCao, mas tambem ao duplo conceito de "geraciotransformacao"que a gramatica do texto em~restou a linguisticagerativa.A programacao da rea Ice ao dinamismo da letra, isto e, dosignificante na espera de sentido. assim como ao dinamismo doprocesso elaborador indo de uma matriz de funcionamento (estrutura-em-profundidade)para suas realizacoes no discurso manifesto.Uma matriz sendo achada, "0 texto se autogera e nos da aler/construir uma producao".Do ponto de vista da leitura, a isotopia e a programacaosac instrumentos de exploracao das virtualidades textuais; do


ponto de vista da escritura, esses conceitos chamam atencao sobreas ideias de heterogeneidade, de disseminacao, de diversidadede niveis. Nao se trata mais de simples despistagem de temasou 1ugares comuns como a morte, a vida, a natureza, 0 amor.Muito a1em deste reconheciemnto tematico, devemos e1aborar urntraba1ho sobre as significantes com nossa intuicao do signific~do, a aprofundar 0 significado com a ajuda do significanteGreimas 1966). Nossa 1eitura abrange as microorganizacoes, assimcomo as macroorganizacoes estruturais e ret6ricas,as camadasdo genotexto, do fenotexto e do intertexto, e preenche todoo espaco vazio da significancia. ~ esse tipo de 1eitura integrativaque convoca em ape10 0 consciente, 0 inconsciente, 0discurso social, em urn movimento centripeto e centrifugo a1ternado,que tentaremos praticar na segunda e terceira parte denossa pesquisa. Ja Adam e Goldenstein (1976) apresentaram exemp10sapaixonantes desta abordagem do texto. Recomendamos particularmentea leitura magistral que e1es fizeram dos objetos emMadame Bovary de F1aubert, de urn extrato do Chant du Monde deJean Giono 0 de cinco versos da poetisa canadense Anne H'bert(29). Por exemp10, a analise do texto de Jean Giono demonstra adisseminacao de tracos portadores de seres mito16gicos ou de e-lementos sexuais, que nenhuma leitura tradiciona1 seria capazde atua1izar. Vma serie lexematica ou/e sintagmatica como: compridas,passaro, descida, vagas, (labirinto), (Creta), cravava,ia ao fundo, voava rente com ~ terra, adorinha, alto, etc., entregaao leitor 0 mito de Incaro, 0 qual constitue uma isotopiaNo meu texto, Creta e Labirinto, ficam ent~e parenteses porqueforam produzidas nurn momenta anterior da 1eitura. 0 1abirinto,termo nunca mencionado no discurso manifesto foi 0 resu1tado deurna atencao minuciosa aos elemtnos indicadores da especia1idadecomo ,,~esquerda, ~ direita, para a frente", comp1etados -pe10ssemas:/escuridaol, Icravacaol, lextravio/.Adam e Goldenstein conseguiram atualizar entidades complexas,bastante conhecidas como "cava1o" + "humano" = Centauro, "cavalo" + "passaro" = "Pegaso".


deles porque a1em da cultura recebida, a imaginacao do escritorpode descobrir elementos a partir dos quais a percepcao de urn1eitor hipotetico vai construir simbioses desconhecidas (c. g.cavalo peixe, cavalo galinha,etc.).Tais producoes seriam da ordem idiolectal ou pertenceriama 0 que Max Black e Luiz Antonio Marcuschi chamam "metafora pr~dutora", e que levam 0 1eitor a organizar mundos de conhecimentopossiveis os quais, a sua vez, sac indices tangiveis da visacpropria, miticamente irredutivel, do sujeito falante ou escrevente.Em outros termos, a isotopia nos introduz nurn universoimplicitando coerencias familiares ou estranhas; as coerencias"estranhas" desembocam sobre urn mundo possive1, urn "novodominio de conhecimento" que Luis Antonio Marcuschi, apos MaxB1ak e Jean Ricardou, assinalou como tare fa a meta fora criadora(30). t nesta otica que eu completaria a leitura isotopica dopoema Sa1ut (Sa1vacao?, Saude?) de Mallarme feita por FrancoisRastier (31). Rastier descobriu ai tres cadeias isosemicas quenos etiquetamos e1ipticamente x,y,z. Mas, nos supomos outraspossibilidades de cadeias metaforicas ainda nao desenvolvidas.A leitura isotopica e a programacao possivel dariam 0 dispositivoseguinte, do genotexto em direcao do fenotexto.


1- As tres cadeias descobertas por Rastier (x,y,z):1.1 - A cadeia tematica (x) da Navegacao, de uma legibilidademaxima no nosso contexto cultural.1.2 - A cadeia tematica (y) mais sutil, menos aparente, dobrinde, de uma legibilidade restrita (urnacrianca naoa percebera) .1.3 - A cadeia tematica (z) da problematica da escritura, deurna legibilidade minima, ao alcance dos estudiosos daliteratura. Ela e produzida a partir das procedentesnurna epoca sensibilizada ao problema da elaboracao dotexto, isto e, numa configuraCao cultural particular.~ urn caminho novo de sentido, conectando elementos decadeias pre-existentes.2- Outras cadeias nas ordens sintatica, fonemica, grafemica, aoalcance do especialista Rastier (elas foram particularmenteanalisadas em Systematique des isotopies).3- Outras cadeias que poderiam hipoteticamente resultar da combinacaoe recombinacao sucessivas das unidades de Rastierx,y,z) ou de novas conotacoes y', x', z'/y' ',x",z", etc.Nos obteriarnos assim entidades outras ou intermediarias entreas descobertas, da ordem idiolectal. Sao da ordem da metaforacriadora de Luiz Antonio Marcuschi e da metafora produtorade Ricardou.4- As cadeias intertextuais que se deslizam sob 0 texto do escritorem varios nucleos do seu discurso a ..• 1 ••. m ••• n •••sao analogias as precedentes.Tal analise correponde idelamente a pefinicao dode Kristeva:"Le texte est productivite, ce qui veut dire (que) sonrapport a la langue dans laquelle il se situe est redistributif(destrutivo-constructif) (32).Assim urn texto funciona programaticamente com duas ou maiscadeias isot6picas. A nocao de isotopia torn a 0 lpitor atento afun~ao integrativa e motivacional de todos os elenentos de urntexto, incluindo os "in absentia" ou 0 niimero finito de deicti-


cos que podem cristalizar em seus redores os elementos sob oselementos sob os quais se ap6ia 0 trabalho textual. Alias 0trabalho textual desemboca para urn alem do texto, seja na ordemmetaforica, seja na ordem pragmatica.o nivel de analise ainda ilustrado se depreende das interrogacoesque 0 leitor/escritor faz aos signos de nivel manifesto,fissurando-os ern fragmentos ou microelementos morfologicosou invertendo-os anagramaticamente. Por exemplo: seja urn per sonagemconstituido ao fio da leitura e cujo nome Burt e 0 pontode partida da-convocacio dos signos. A interrogacio de nivelmicrossematico do significante entregara:Este significado obtido por permutacio das duas letras medianas,pode ser 0 germe de uma produtividade ou programacaotextual de papel. Foi exatamente 0 que aconteceu na analise deurn romance frances, Le Negre de Sables, de Catherine paysan33). Por disseminacao, 0 mesmo grupo /BR/ ja existiu nurna variantedo titulo: 0 /GR/ de Negre, emblema classematico da personagemcentral do livro. Voltaremos depois mais sistematicamentea esta questao da analise da personagem como significantea ser preenchida por elementos intertextuais.Do ponto de vista da leitura construtiva, quais sac as e-xigencias que pesam sobre 0 analista?Discernir as isotopias de urn texto no quadro de uma programaCao,supoe uma tripla competencia:- urna competencia perceptiva ou psicolinguistica;- uma competencia linguistica e retorica;- uma competencia cultural (pragmatica, sociolinguistica).Segundo 0 tipo de texto ou de trabalho a efetuar, as unidadesdiscernidas podem-se ler ern tres niveis semanticos, alemdos outros niveis linguisticos Ja assinalados:- urn nivel macrossematico (ou sintatico);


- urn nivel microssematico (ou semantico no sentido estreitol;- urn nivel intertextual (ou/e pragmatico na medida em que, conformeBeaugrande, Marscushi e Recanati, a pragmatica fica solidariada semantical.Quando se trata - como em nosso estudo - personagens deromance, 0 nivel macrossematico coincide com 0 universo de sentidosgerados pela personagem mesma, enquanto pacotes energeticosde signos elementares ou personagens.Veremos que toda "personagem" de relevo cria no leitor urnefeito personagem.o nivel microssematico consistindo numa procura de tracosdistintivos, de significantes minimos ou de semas que levam aconstituicao de redes isotopicas ou de personagens, e "pervasive",se espalha em todos os lugares. Ja foi antecipada amostrado seu funcionamento. 0 mais urgente e porem construir urn mode-10 de leitura ao nivel macrossematico que subsurnira automaticamente0 microssematico (ou microssemico) .Por enquanto, liquidamos aqui 0 terceiro nivel de leitura- 0 nivel intertextual. Este paras ita 0 texto em todos osniveis de escritura/leitura. ~ urn nivel proteiforma, que tece 0maximo de relacoes paradigmaticas, que requer urna grande competenciacultural da parte do leitor. A descoberta por M. Bakhtinda permeabilidade dos elementos intra-discursivos (Problemas dapoetica de Dostoievski) (34) conduziu Julia Kristeva a examinara fundo este conceito ao nivel inter-discursivo. Assim, a nocaode intertextualidade remete a urn dos aspectos da nocao de text~"Nous appellerons texte, toute pra.tique du langagetelle que les operations du genotexte soient etaleesdans Ie phenotexte, Ie phenotexte essayant de representerIe genotexte et invitant Ie lecteur a reconstruirela signifiance" (35).Ler 0 intertexto e por em evidencia 0 modo de producao dasvarias camadas de uma escritura, e ler a verticalidade historicae talvez a horizontalidade contemporanea do texto, e ler todosos vestigios de discursos arcaicos, miticos, ideologicosque ela carrega por vocacao. No caso citado anteriormente, 0


nome do heroi de Catherine Paysan, Burt evoca Burt Lancaster,nome que conota, pela mediaCao' de numerosissimos filmes de Western,os semas seguintes: artista, lindo, super-energia, superatividade,defensor do born direito, etc.o contexto do romance de Catherine Paysan atualizou somentealguns semas (artista, super-energia) e apaga 0 resto. E esteapagamento mesmo constitue por sua vez urn filtro ideologico.Nenhum escritor escapa a intertextualidade, porque, comodiz M. Hausser, "urn sintagma (.••) acarreta com ele urn outro ououtros contextos do que no qual ele efetivamente aparece (.•. );urn sintagma pode em certas condicoes, conservar a lembranca, latrace, dos contextos nos quais ele figurou" (36).Essa possibilidade que pre-existe na lingua, virou urn fatodo discurso, "produto semiotico complexo" (Adam e Goldenstein).A intertextualidade aponta essa complexidade. Ela e designaCaodessas implicacoes que se depreendem da heterogeneidade, dospressupostos externos do texto de seu engate sobre outros infraou extra-textos conscientemente convocados ou inconscientementeinfiltrados. Todas as obra~ sao, por conseguinte, fabricacoessegundas. Tal poema e urna superposiCao de fragmentos. rnurneraveistrechos encaixados sao "a maneira que um texto le a historiae nela se insere" (37).3. Para uma leitura isotopica da personagem3.1. Constituicao da urn modelo de analiseUtilizaremos aqui 0 "corpus" integral, particularmente osseriados de espionagem. Em seguida faremos,' com alguns romancesexcertos do corpus global, amostras de analise.Esse modelo nao se superpoe ao quadro global de situacaode discurso discutido na introducaol a situacao de discurso detectadaprojeta luz sobre todos 05 detalhes do texto, em instanciatanto de escritura quanto de leitura.Na leitura isotopica adotada aqui, cada personagem e suscetivelde ser considerada como urna categoria semiea, urn eneadeamentode sintagmas predicativo5 eongregados sob urn apelativo(0 significante - nome). A recepcao progressiva na leitura nas-


ce em certos pontos de impacto que libertam urn efeito ("classema",na terminologia de Greimas), e 0 efeito-personagem. Cadacolocacao predicativa ou substantiva pode equivaler a urn sema,que, reiterado, e constitutivo de uma classe. Conseguimos estabelecerno corpus duas super-classes ou categorias:Do lade da categoria / nigridade / destacam-se duas subalternasa partir de um elemento diferenciador, a / negroididade/ ou conjunto de tracos negros. 0 que se ilustra assim:Na pratica do texto, essa divisao bipartida remete a:- negros com tracos negroides acentuadas;- negros com tracos negroides atenuadas.A negroididade admite por sua vez urna outra subdivisao apartir de um diferenciador especifico que e a cor, a "nigricidade"se quiser. 0 que se ilustra assim:NegroJpreto(negro de tez escura)1Negroclaro(negro de tez palida)Na medida em que 0 negro coincide com a isotopia (ill e 0branco com uma outra isotopia (i2l, 0 negro claro se confundecom a simbiose das duas (il.i2l, emprestando selS elementosclassematicos a ambas as categorias. Dizemos que J negro claro


e bi-isotopico. Acontece que a negra clara, ou mestica, desempenhaurn papel textual muito importante no corpus estudado. Elaproporciona a seu nivel certos matizes discriminativos como:


ObjetoIIDestinador=Dl ---~:> 0i-----;> S


a maioria dos P2), ora para consumar sua queda (a maioria dosP3)' No entanto, 0 jogo das conotacoes de tracos e das pressuposicoes/potenciali~adae desvia a categoria ideologica e surpreende0 leitor com sutis derrogacoes. t sobre este aspectoque nos chamamos a atencao ainda insuficiente dos estudiosos deestrita obediencia estruturalista e certos sociologos da literatura.Antes de estudar a programacao da mesticidade, nossa leituracomecara justamente com algumas derrogacoes onde certospersonagens pretos assumem papeis de mesticos. Neste ultimo nivelque acabamos de mencionar, se exceptuarmos raros casos divergentes,0 algoritmo de leitura denuncia cada personagem-chavecomo isotopia de racialidade:il= PI rl + ~ (VI)i2= P2 r2 + ~ (v2)i3= P3 rl·r2+ { (vl·v2)Concretamente, 0 discurso ideologico chegou a declinar geralmenteno contexto do corpus:il= Pl= 0 pesadelo, 0 selvagem, a dependenciai2= P2= 0 leve, a urbanidade, a arte organizadorail como oponente de i2 e i3 como adjuvante deP2Toda a elaboracao do texto se resume em motivar narrativamenteuma maieutica ideologica. Mas muitas Nezes, e dificil saber0 lugar onde se situa essa ideologia.No quadro dessa segunda parte da pesquisa, sera examinadauma categoria de personagens - os negros de tez escura (com negroididadeacentuada ou nao) - em torno dos quais as narrativasdesenvolvem uma manobra muito significativa de motivacao aliadaa uma programacao de papel tematico.Esse fate, essas personagenssac constituidas como isotopia da negricidade frente a


seus interlocutores, inscritos como isotopia da branquidade,dentro da situacao de discurso ja referida. A motivacao, comoenergia de €scritura, sera 0 lado dominante dessas leiturasfragmentarias. A ideologia sera surpreendida "in vivo", e naopostulada como pressuposto.3.2.1. Amostragem: Congo a gogo, Alain et Ie negre,La salade noire (39)Temos observado enquanto operador do texto que, na maioriados romances populares afiguram-se correlacionados os 3 tracosdescritivos seguintes para presentificar disforicamente a personagemnegra:cabelos crespos + labios grossos + nariz achatadoExemplo: Dois "leoes de chacara" a servico de urn personagembranco, urn belga chamado Van Bergen (Congo ~ ~,p.65). Por queesse halo de disforia em torno desse duplo africano? Provavelmenteque os tres tracos caracterizadores do ponto de vista dodiscurso do narrador, sao destinados ilocucionariamente contrao colonialismo e 0 racismo do proprio Van Bergen, pelo intermedioda negatividade projetada sobre os seus lacaios negros.Muito pelo contrario, quando 0 texto fornece apenas doiselementos negro ides , como por exemplo:cabelos crespos + nariz achatado (Alain et le negrep.l3) .Essa "de-saturacao" da negricidade corresponde a urn efeito-personagemeuforico. A personagem concernida (aqui urn tal deValentim=Vale em tez) tern urn papel de africano radicado em Paris,assimilado urn tanto aos valores franceses (ate ser 0 amantede urna comerciante branca e francesa no enredol. Qual e aconotacao desse "uso" da personagem negra como discurso ao interlocutor-leitor?Talvez uma hegemonia cultural francesa, urnacerta "francidade" triunfa sutilmente ai. a emi.sor-narradorou 0 autor implicito) e manifestamente anticolonialista e antiracista.lsso eo dizer do texto. Mas sobrou urna "implicaCao", ~


quela mensagem que uma certa instancia (ideologia) colocou apesardo emissor. A fala deste foi "roubada", deslocada, fazendolhesofrer urn efeito de "double-bind".Outro exemplo: na novela La salade noire (p.44), uma personagemnegra, Assossou, e inscrito com 0 duplo insigno/cabelos crespos+ nariz achatado. Tanto pelo nome (que nome poderia ser maistipicamente africano?). Quanto pelos tracos fisionomicos convocados,esse papel emblematiza a isotopia da negroididade a-centuada. Mas a dinamica do texto, num jogo mostrar-eseonder,desacentua 0 efeito quase antipatico posto, e dota 0 aetantenegro de modulacao euforizante, A metonlmia paternidade-filiacao,apadrinhamento - afilhacao serao os reguladores utilizadosCom efeito, 0 narrador de La salade noire retifica um poueoadiante (p.45) a imagem de Assossou pela imagem do seu filho,urna personagem que entra na cena da escritura sob urna duplafrancidade:- 0 nome Francois (forma arcaica de Frances);- os semas contextuais "belo" rapaz de nariz eurto e ~ •••Mas 0 discurso do narrador infrin~e a maxima de qualidadede H.P. Grice (40). Quando acrescentou ncomo 0 seu pain, depoisde ter depieto 0 pai sob a bandeira da negroididade acentuada.Essa contradicao do texto (aehatado X curto-reto) traiu uma i-deologia que nao ousa dizer ainda 0 seu nome. Porque essa regulagemde traco? 0 enredo nos esclarece: Assossou apadrinharaurna familia franeesa de "eooperantes n (Assistencia tecniea), amotivacao textual 0 desafricaniza urn pouco a fim de prepararessa conjuncao narrativa com a isotopia braaca e francesa. Aeufemizacao na pintura de Francois - obedece a mesma intencionalidadeou pelo menos ao mesmo npensamento inconsciente n dotexto: a conjuncao Franca-Africa, 0 objeto de eomunica.lo expllcita(no discurso ficcional), tende como adjuvantes as duasisotopias brancas (os Claudel) e os negros (AssossOU e seu filhol.o texto e saturado da ideologia ncooperacionistaR. A prova,a cascata de contiguidades, amor entre filho de Assossou ea filha do Sr. Claudel, a cultura francesa do africano Assossou


(moradia em Montpellier, licenciatura em letras francesasl. Chegamosao mesmo resultado do que no exemplo precedente.o "dito" poderia esquematizar-se assim, a Franca sendo 0locutor-destinador da mensagem atraves de seus escritoresl narradores(quadro 10 ell).DestinadorA Francadiz: _------- ......•. ) ObjetoCooperemos_ (mensagem)------~} Destinatarioa AfricaQuadro-lOEixo da Comunicacao Implicita:Destinador --------A Fran\faimplicita a si mesmaObjeto -------- --- DestinatarioColonizemos --------) a Africa(mensagem nao dita)As personagens brancas e negras se tornam posicoes discursivasem funcao de "Adjuvantes". A forca ilocucionaria da narrativacomo discurso reside justamente nessa ausencia-neutralizacaoquase total do posto "oponente". Em quadro Greimasiano ter~ I~~~~:~~ / .IF:.::.,Franca 7e africano .o apagamento da Africa nesse quadro 12 e devido ao fateque a partir do momenta que nos lnteqramos 0 eixo do desejoSubjeto-objeto) e 0 eixo da acao (adjuvante-oponente). 0 eixoda comunicacao recua como tal diante destes ultimos. E em vez


de falar/agir em direCao do Actante Africa como no quadro 1, 0actante onipresente Franca passa a Falar/agir em funCao delequadro 2) e em proveito dele proprio (quadro 3).A ideologia que se aponta de tal maneira constituiu 0 negroassimilad%u aculturado frances em isotopia da mesticidade(branco e negro, frances e africano) segundo Greimas (1966) quenos temos desviado, desenvolvido e formalizado na parte precedente:"Branco e Negro se opoem sobre 0eixo da claridade, cujos semas Ihesac comuns" (41).Uma das manobras de justificaCao de todos esses textos ede confeccionar "mesticos" reais ou falsos que apagam a posiCaoisotopica greimasiana, pela inscriCao dos nomes, de conjuncoesmetonimicas, de situacoes, etc ••• Mas a motivaCao narrativa a-caba por implicitar 0 que nao se pretende dizer.Esperamos que 0 lei tor tenha tirado proveito desses esbocosde analise cruzada, que desenvolvemos em nosso livro "LeNegre dans Ie roman Blanc, !1ontreal, Press de l'Universite deMontreal, 1980.(2) SILVA, A.V. da. A paraliteratura. In: PORTELA, Eduardo,org. Teoria literaria. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro,1979.(3) KOTH~, F. Literatura ~ sistemas intersemioticos. Sao Paulo,cortez e Moraes, 1981.PRATT, M.L. Toward ~ speech~ Bloomington, IndianaPRATT, M.L. & TRAUGOTT, E.C.act theory of literary discour-University Press, 1977.Linguistics for students of


literature. London, New York, Toronto, Harcourt, Brace,Jovanovich, 1980.(5) LEECH, G.N. & SHORT, M. Style in fiction. London, Oxford,Oxford university Press, 1981.(7) GREIMAS, A.J. Prefacio. In: COURTES, J. Introduction a 1asemiotique narrative ~t discursive. Paris, Hachette,1976.(8) JOACHIM, S. Le Negre dans Ie roman Blanc. Montreal, Pressesdel'Universite de Montreal, 1980.(10) op. cU. 6BREMOND, C. Logique du recit.(11) ORLANDI, E.P. ! linguagem ~ seu funcionamento. Sao Paulo,Brasiliense, 1983.(12) ALTHUSSER, L.A.I.E.In:Ideologie et appareils ideologiques d'Etat;Positions. Paris, Socia1es, 1976.(13) Entre outras boas referencias:RECANATI, F. La transparence et l'enonciation; pour introDUIRE a la Pragmatique. Paris, Seui1, 1979.LES ~NONC~S performatifs. Paris, Minuit, 1981.LANGUE FRANCAISE. La Pragmatique. Paris, n.42, mai 1979.(14) Esse voto fica imp1icito nas obras de W.Labor & T.A. VanDyk, de M.L.Pratt (1977) e na Introduction a 1a phi1osophiedu langage. Cap.7.(15) COQUET, J.C. Semiotique 1itteraire. Paris, Marne, 1973.KLINKENBERG, J.M. Le concept d'isotopie en semantique eten semiotique litteraire. Francais Moderne, n.41,3,1972.


(16) RASTIER, F.etalii.Systematique des Isotopies. In: GREIMAS, A.J.Ensaios de Semiotica ~ Poetica. Sao Paulo,(17) GROUPE DE LI~GE. Retorica da poesia. Sao Paulo, Cultrix,1980.(18) ADAM, J.M. & GOLDENSTEIN, J.P. Linguistique et discourslitteraire. Paris, Larousse, 1976.(22) GROUPE DE LIEGE. Rhetorique generale. Paris, Larousse,1970.(24) CORVIN, M. Abordagem semiotica do prologo da Parodia deAdamov. In. GUINSBURG, J. et alii. Semiologia doTeatro. Sao Paulo, Perspectiva, 1978.(26) STAROBINSKI, J. As palavras sobre as palavras. Sao Paulo,Perspectiva, 1974.(27) KRISTEVA, J. A semanalise. Sao Paulo, Perspectiva, 1968.ADAM, J.M. & GOLDENSTEIN, J.P. op.cit. 18. seCCao I.CAMPOS, H. ~ operaCao texto. Sao Paulo, Perspectiva, 1978.cap. 5 (Debates).(28) MACHEREY, P. Para ~ teoria da pro&ucao literaria. Lisboa,Estampa, 1978.


15-31. (<strong>Revista</strong> do Depto. de Letras da Universidade Federalde Pernambuco - Recife).(34) BAKHTIN, M. Problemas da poetica de DostoievsK~. Rio deJaneiro, Forense - Universitaria, 1981.(35) KRISTEVA, J. Semana1yse et production de sens •.. In: GREYMAS, A.J. et alii. Ensaios de semiotica ~ poetica. SaPaulo, Cu1trix.(38) LEENHARDT, J. Lecture po1itigue dU~. Paris, Minuit,1973.WAUTHIER, C. L'Afrique des a~ricains. Paris, Seui1, 1977.(40) DASCAL, M. org. Fundamentos metodo1ogicos da Linguistica;Pragmatica. Campinas, Unicamp, 1982. v.IV.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!