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Avelino Ferreira Torres - Público

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do autarca, <strong>Avelino</strong> <strong>Ferreira</strong> <strong>Torres</strong>, naampliação da igreja e arranjo da zonaenvolvente quando era pároco Antóniode F. Carvalho.”O padre Carvalho, que parece umsósia de Alberto João Jardim, como jálhe têm dito, abre os braços para a amplitudedo adro, onde nesta manhã desemana não há vivalma, parcialmenteconquistado a vinhas velhas. “Não épreferível ter isto do queuma ramada para fazerduas ou três pipas? Istodá para uns milharesde pessoas…” Tem umanexo com instalaçõessanitárias e tudo.Cabeça erguidapara a fachada de duastorres, o pároco explicacomo a da direita “é umaautêntica fotocópia” daoriginal, que era só uma. Uma questãode simetria. “Se eu não contasse com aajuda da câmara, não me metia nisto,tinha remendado e de resto estavaquietinho”, diz o padre Carvalho.“Dei ao corpo ao manifesto, fiz apeloaos paroquianos, na Lotaria de Reissorteámos um automóvel…” De resto,houve “pessoas amigas” que tambémajudaram, como Belmiro de Azevedo.Lá fora fica o centro de dia, com janelasde alumínio verde, construído hánove anos. “A câmara ajudou bastante,em materiais, em mão-de-obra, o boloprincipal foi a câmara.” Porque é quenão funciona?, há quem pergunte, pelafreguesia. “Como centro de dia nãochegou a funcionar”, admite o padreCarvalho. “Não teve aderência, as pessoasnão quiseram vir.” Mas chegou aabrir? “Não, não teve aderência”, repete.“Funciona para catequese. E nasférias já tive aqui uns jovens.”Os sinos do meio-dia ribombam,à altura da vasta obra de ampliaçãoda igreja de Tuias. Que pensa então opadre Carvalho da muito menos visíveligreja de Álvaro Siza, tanto é o que temà volta, lá no centro da cidade? “Pessoalmente,não gosto”, diz, franco. “Nãogosto daquele tipo de arquitectura,aquilo dispersa um bocado. Gosto deuma casa minimamente mobilada, euma igreja não deixa de ser uma casa.Acho muito despido…” A luz, concede,Chamou a Siza“o comunista”,mas depoisacolheu-o: “Isto éuma democraciamusculada”“é formidável”. Já o som, “é uma miséria”.E a porta em simples madeirade castanho, alta de dez metros? “Aporta… a porta… se me explicarem…assim à primeira, não entendo. Gostodo baptistério, uma coisa digna. Masaquelas cadeirinhas… Até corro o riscode ser atrasado!” E ri.Por ser homem de gosto muitodiferente deste é que o então jovempároco de Santa Mariade Marco de Canaveses,Nuno Higino— também poeta, eactualmente a fazerum doutoramento emFilosofia Estética naUniversidade Complutensede Madrid—, muito quis, e conseguiu,em 1989, queÁlvaro Siza aceitassedesenhar a igreja nova da freguesia.<strong>Avelino</strong> <strong>Ferreira</strong> <strong>Torres</strong> começoupor reagir ao nome de Siza chamandolhe“o comunista”, mas depois acolheuo,ao seu estilo: quando o arquitecto foilevar o projecto para o processo deaprovação na câmara, <strong>Avelino</strong> disselheimediatamente: “Está aprovado.Isto é uma democracia musculada.” Asobras começaram em 1994, a inauguraçãofez-se dois anos depois.Quem acompanhou deperto o sonho destaigreja — sendo amigode Nuno Higino desde asua chegada a Marco deCanaveses como pároco, em 1988 — foium ímpar contador de histórias, quemora para os lados do Estádio <strong>Avelino</strong><strong>Ferreira</strong> <strong>Torres</strong>. Há que descer entãodas freguesias e enfrentar a cidade.Tem um perfil de águia, JoãoCustódio, e todo ele é movimento enquantofala, com grande achamentode palavras, sem desdém do calão.Casou cedo, aos 18, quando a mulhertinha 14, porque “é de manhã que secomeça o dia”, portanto tem já umafilha de 33, sendo ele ainda um jovemcinquentão, contabilista reformado,para efeitos de estatística, marcoensede sempre, para o que aqui maisimporta, e atento.JoãoCustódio5 2 a n o scontabilistareformadoAmigo do párocoidealista Nuno Higino,aprecia <strong>Avelino</strong><strong>Ferreira</strong> <strong>Torres</strong>: “Ele éesperto e inteligente,não é qualquer doutorque o leva. As coisasmás é que vão para aimprensa, mas ele éuma pessoa humana”.MarcoFidalgo2 8 a n odesignerSó vive no Marco porcausa da namorada:“O Marco estáfechado. Não tenhoamigos aqui, nãoconsigo. (...) É acidade dos carros. Dedia não se consegueestacionar, à noite é ovazio completo. Tudoisso sufoca”.É ao ar livre, na avenida que levaao estádio, sem paredes a atrapalharo gesto, que ele lembra isto, e vale apena não o interromper muito: “Opadre Nuno foi uma pessoa diferenteno Marco. Cativava as crianças, osjovens, que começaram a ir para aigreja. Fazia um funeral, um baptizado,um casamento, que lhe custavamdinheiro, deslocação, e não levavanada. Eu nunca fui uma pessoa ligadaaos padres, vou à missa quandoentendo, se for preciso não ir um ano,não vou. Mas ele é como um filho meu.Quando saiu daqui, foi como um filhoque me saiu…”E João Custódio bate com os punhosno peito. “Fugiu sempre para a pobreza.Nem conta no banco tinha. Fui-lheabrir uma, onde ele foi juntando o quepodia. Depois foi tirar o dinheiro parapôr na igreja! Esteve aqui 13 anos e foidaqui teso. Os padres recebem um diade trabalho de cada paroquiano. Masele não andava a cobrar dinheiro às pessoas.E há padres que não entram como compasso de Páscoa em casa ou nãolevantam o funeral enquanto a pessoanão pagar os direitos! Conheço padresque têm tudo, ‘padres’ há muitos, maspadres há poucos. O padre Nuno fugia,quando vinham aquelas pessoas degravata. Aqui, quando foi inaugurado oestádio, e vieram aqueles cães todos doPorto, ele não foi. Ele também é terrum,é teimoso, lutou pela igreja, saiu e deixoua freguesia a chorar por ele, mesmopessoas que não vão à igreja. Ele lidavacom todos da mesma maneira, tanto faziaser comunista como ser católico. Osdrogados que aí havia… ele dava-lhes odinheiro que tinha e à noite eles roubavam-no!Isto é uma pura!” Uma pura?“Uma pura verdade! Roubaram-lhe ocomputador. E ele a dizer dos drogados:‘Se eu pudesse recuperar quatroou cinco…’ Eles já presos, e ele ia vê-lostodas as semanas!”João Custódio sabia que mais tardeou mais cedo Nuno Higino se iriaembora, para estudar. Mas, no seu entender,não foi só isso. “Quando há umpadre bom, eles têm de parti-lo todo.”Eles quem? “Há um bispo no Porto…e eles tanto alevantam como deitamabaixo. A Igreja discrimina as suaspróprias pessoas.”47 PÚBLICA

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