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(Instituto Paulo Freire) e Maria Ines Duque Estrada (jornalista)

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minha mente". Professores de cerca de 150 universidades enviaram condolências, evidenciando arepercussão e a influência de sua pedagogia em várias partes do mundo.<strong>Paulo</strong> <strong>Freire</strong> deixou diversos livros que continuam sendo publicados em diversas línguas e influenciaramtoda uma geração de educadores e militantes políticos. Ainda vivo, virou nome de nove escolas, tornou-secidadão honorário de nove cidades, recebeu seis prêmios internacionais e batizou três cátedrasuniversitárias. Foi doutor honoris causa por 28 universidades, nome de rua em Itabuna (BA) e de 26centros de estudo e documentação em questões educacionais em países tão heterogêneos quanto a Itália,o Chile, a Bélgica e os Estados Unidos. Sem falsas modéstias, não escondia seu prazer com ashomenagens: "Elas me alegram e me fazem bem", confessa em Pedagogia da Esperança (1992). Masapesar de todas as que recebeu, foi sobretudo um homem simples.— Qualquer conhecimento que lhe chegasse de alguém mais humilde se tornava uma nova comprovaçãode suas teorias. E seus hábitos eram também singelos. Gostava de comer banana frita, galinha decabidela e peixe ao leite de coco. Escreveu seus livros à mão, usando lápis ou caneta hidrográfica.Gostava de cães e passarinhos, tinha um jeito bonachão, acentuado pela fala vagarosa e pelo grisalho desuas barbas. Não aparentava, em definitivo, o currículo que bem poucos brasileiros poderão um dia reunir— lembra o <strong>jornalista</strong> João Batista Natali.É por isso que Moacir Gadotti insiste:— Dar continuidade a <strong>Freire</strong> não significa tratá-lo como um totem, ao qual não se pode tocar mas se deveapenas adorar; nem como um guru, que deve ser seguido por discípulos, sem questionamentos. Nadamenos freireano do que esta idéia. <strong>Paulo</strong> <strong>Freire</strong> foi, sobretudo, um criador de espíritos. Por isso deve sertratado como um grande educador popular. Adorar <strong>Freire</strong> como um totem significa destruí-lo comoeducador. Por isso não devemos repetir <strong>Freire</strong>, mas "reinventá-lo", como ele mesmo dizia, e levar adianteo esforço de uma educação com uma nova qualidade para todos.E qual foi o legado que <strong>Paulo</strong> <strong>Freire</strong> deixou?— Em primeiro lugar, ele nos deixou sua vida, uma rica biografia. <strong>Paulo</strong> nos encantou com a sua ternura,sua doçura, seu carisma, sua coerência, seu compromisso, sua seriedade. Suas palavras e suas açõesforam palavras e ações de luta por um mundo "menos feio, menos malvado, menos desumano". Ao ladodo amor e da esperança, ele também nos deixou um legado de indignação diante da injustiça. Diantedela, dizia que não podemos "adocicar" nossas palavras — afirma Gadotti, organizador da Biobibliografiade <strong>Paulo</strong> <strong>Freire</strong> (Ed. Cortez, 1996) com 780 páginas, a obra mais completa sobre o educador, que estásendo traduzida em diversas línguas.Ele contou que em março de 1997, quando um grupo de jovens de Brasília ateou fogo e matou um índiopataxó, <strong>Paulo</strong> <strong>Freire</strong> ficou muito impressionado. E se perguntava por que chegamos a tamanha barbárie:— As causas são múltiplas: há a mídia, a escola, a sociedade... todos somos responsáveis. Mas há aimpunidade que permite, sobretudo às classes poderosas, fazer quase tudo o que quiserem sem serpunidas. Raramente são punidas. Poucos são os ricos que estão nas cadeias. Por isso precisamos dizer"não pode" sem ter medo de sermos antidemocráticos. Há o que pode e o que não pode ser feito. <strong>Paulo</strong><strong>Freire</strong> nos falava com freqüência de uma pedagogia da indignação. Diante da injustiça, da impunidade eda barbárie, precisamos de uma pedagogia da indignação. Dizer "não" provoca conhecimento. O "não"desacomoda, incomoda, desinstala. Dizer "não" é buscar a ética, é valor, é postura.O que mais preocupava o educador nos últimos anos era o avanço de uma globalização capitalistaneoliberal. Ele atacava tanto o neoliberalismo por ser uma doutrina visceralmente contrária ao núcleocentral de seu pensamento, que é a utopia.— Para <strong>Paulo</strong> <strong>Freire</strong> — continua Gadotti — o futuro é possibilidade. Para o neoliberalismo o futuro é umafatalidade. O neoliberalismo apresenta-se como única resposta à realidade atual, desqualificando qualqueroutra proposta. Desqualifica principalmente o Estado, os sindicatos e os partidos políticos. Denuncia apolítica fazendo política.Outro legado de <strong>Paulo</strong> <strong>Freire</strong>, acrescenta, é a esperança :— Ele era um ser humano esperançoso. Não por teimosia, mas por "imperativo histórico e existencial",6


como afirma em Pedagogia da esperança. Além da esperança, cultivou a autonomia, que é a capacidadede decidir-se, de tomar o próprio destino nas suas mãos. Diante de uma economia de mercado queinvade todas as esferas de nossa vida, precisamos lutar — também através da educação — para criar nasociedade civil a capacidade de governar e controlar o desenvolvimento (alternativa ao socialismoautoritário).No desenvolvimento da sua teoria da educação, <strong>Paulo</strong> <strong>Freire</strong> conseguiu, de um lado, desmistificar ossonhos do pedagogismo dos anos 60, que sustentava a tese de que a escola tudo podia, e, de outro lado,conseguiu superar o pessimismo dos anos 70, para o qual a escola era meramente reprodutora do statusquo. Fazendo isso — superando o pedagogismo ingênuo e o pessimismo negativista — conseguiu mantersefiel à utopia, sonhando sonhos possíveis. Fazer hoje o possível de hoje, para amanhã fazer oimpossível de hoje.7

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