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e que transcendem o meramente particular para projetar-se
ainda mais a proposta inicial da artista, um confronto direto
americana reflete um mundo agitado, cheio de cartazes lumi-
e cola PVA, parafusos, interruptores, cabos elétricos, arrebites
esteticamente no universal.
com o conturbado momento histórico da época.
nosos, produtos alimentícios e garrafas de coca-cola”. 6
– objetos côncavos ou convexos – convivem formalmente nas
Assim, os fragmentos e os recortes de materiais industrializa-
Ao expor fragmentos e detritos da decantada sociedade tec-
Em depoimento, iconoclasticamente, a autora reforça a sua
composições e alegorias visuais de Teresa Nazar. Metáforas que
dos se transformam em ferramentas primordiais para a sua cria-
nológica, a artista realiza uma experiência estética diferenciada:
independência estética afirmando que as nomenclaturas e as
abrigam objetos, formas e cores vibrantes: operações simbólicas
ção plástica. Uma forma talvez de sinalizar um tempo difícil, não
uma crítica ao estatuto real da contemporaneidade que privilegia
classificações artísticas deviam ser eliminadas: “Chegou um
desvinculadas de relações imediatistas de significados-signifi-
só para o Brasil, sua pátria adotada, mas para o mundo em geral.
os processos produtivos tecnológicos vigentes, em detrimento da
momento que você não precisa dizer: isto é uma pintura, um de-
cantes, somente testemunhas da realidade circundante. Para a
Visionariamente, a pintora entendeu os fatos, hoje considerados
humanidade. Daí a aparente instabilidade criada em suas obras,
senho, uma gravura ou uma escultura. Você pode utilizar todos os
artista, os materiais funcionam como coautores da obra, pois
históricos (o Ato Institucional Número 5, a prisão dos estudantes
tensão permanente entre superfícies e volumes.
materiais escultóricos, gráficos, pictóricos em uma única obra”. 7
expressam intrinsecamente o essencial, o indisfarçável, certa
do 3º Congresso da UNE, a proibição da exposição no Museu de
Felicitada pelos principais críticos de arte brasileira, Teresa
Apesar da não concordância explícita da artista, de sua filia-
verdade inalcançável à arte por outros meios. Os materiais,
Arte Moderna do Rio de Janeiro de artistas brasileiros seleciona-
Nazar aprofundou ainda mais as suas pesquisas estéticas.
ção à Pop-Art, algumas de suas obras (distantes do marketing e
muitas vezes constroem tensões, integrantes e inseparáveis
dos para representar o Brasil na Quinta Bienal de Paris, o Pacto de
Mário Schenberg, ao escrever sobre esta nova fase da artista,
da apologia de consumo) se aproximam, tangenciam conceitu-
do ideário visual concretizado pela artista. Uma cosmogonia
Varsóvia, o fim da Primavera de Praga, as grandes manifestações
afirmou: “Na VIII Bienal, Teresa causou uma grande surpresa
almente esta corrente artística.
visual que redimensiona as discussões sobre a própria criação
estudantis e greves em Paris, o assassinato do líder pacifista
pelo progresso rapidíssimo que realizara em pouco tempo. Ver-
Após ser aclamada pelo crítico Mário Schenberg como “ar-
artística (iniciada por Teresa Nazar com as suas pinturas dos anos
Martin Luther King e até as transgressões criativas do Festival
dadeiro salto. Sua pintura ganhara um arrojo e uma liberdade
tista da vanguarda paulista” e alcançar visibilidade nacional por
1950), para um diálogo mais amplo com diferentes técnicas e
de Woodstock). Enfim, um tempo que exigia posicionamentos
imprevisíveis, graças à sua audácia no emprego de novos ma-
intermédio de suas participações com grande destaque em duas
diversificados materiais, assim os seus quadros avolumam-se e
claros, sem subterfúgios. A artista reformula radicalmente a sua
teriais e a virada para novas formas de realismo... Sua visão do
Bienais Internacionais de São Paulo - a pintora foi convidada
testam os limites sacralizados da pintura: uma tradução parti-
obra situando-a neste novo contexto histórico, traduzindo em
mundo não podia ser transmitida adequadamente pela simples
(em plena ditadura militar) para realizar junto com os mais im-
cular, convincente, sensível de Teresa Nazar.
criações visuais seu engajamento social, estético.
representação gráfica e colorística tradicional”. 1 Em 1966, Fre-
portantes artistas daquela época: Hélio Oiticica, Antonio Dias,
Com esse resgate histórico da produção plástica de Teresa
Objetos subtraídos do cotidiano, industrializados são apro-
derico de Morais acrescentou: “Do último ano para cá, Teresa
Rubens Gerchman, Nicolas Vlavianos, Pedro Escosteguy, Maria
Nazar nos anos 1960, a Galeria Berenice Arvani reforça a opinião
priados como matéria de ressignificação poética. Destituídos de
Nazar transformou radicalmente sua temática, iniciando uma
Helena Chartuni e Carlos Vergara – de um dos mais polêmicos
de Walter Zanini que, em 2005, afirmou que Teresa Nazar “criou
seu destino original, desprovidos de qualquer tipo de glamour,
série interessantíssima sobre vôos de astronautas, na qual usa
eventos da década de 60: o Happening na Avenida São Luís/
múltiplos campos de imagens, construídos através de grande
ganham uma nova potência quando migram para a arte. Denun-
materiais dos mais diversos – placas de metal, restos de objetos
Galeria Atrium de São Paulo, que, segundo Carlos Vergara, foi
liberdade de formas articuladas, singulares... é recorrente o
ciam o estado efêmero da vida, ressignificam valores.
industrializados, etc. – como que a sugerir a mesma ambiência
para desmitificar a arte: “Somos realistas. As coisas devem ser
assemblage de coisas industrializadas ... descobrimos em seus
Os cânones tradicionais do bom gosto, se aplicados à primeira
dos vôos interplanetários... É preciso prestar atenção em Teresa
vistas como são. Vamos tirar o paletó da obra de arte para que
cenários geralmente conturbados, uma presença significativa
vista na obra desta fase da artista, são inutilizáveis. Teresa Nazar
Nazar”. 2 Harry Laus também destacou a sua grande mudança
o público se sinta à vontade para ver”. 8
de razões femininas, sócio-culturalmente e psicologicamente
deliberadamente incorporou e ao mesmo tempo ultrapassou as
artística: “Teresa Nazar abandonou a pintura de cavalete e de-
Em entrevista para o jornal O Estado de São Paulo Teresa
entre as maiores de um período de luta por emancipações ... A
características artísticas das correntes reinantes da época: Novo
dica-se a serrar, parafusar, pregar elementos dos mais variados
acrescentou “o propósito do apeningue é social e artístico ser-
contribuição de Teresa Nazar permanece.” 11
Dadaísmo, Novo Realismo, Nova Figuração, Pop-Art. Assim como
para a realização de seus quadros. É uma pintora da vanguarda
vindo-se da psicologia do choque para despertar no espectador
Susan Sontag, Teresa Nazar entendeu a significativa contribuição
da estética Camp para aquele período. A pintora decisivamente
paulista”. 3 Antonio Bento, em 1966, reforçou: “A temática ‘pop’ é
adequada às novas realizações da artista... Teresa Nazar utiliza-se
o impacto ante a obra de arte... algo momentâneo, que pode
chocar o meio mostrando a insignificância das coisas e das idéias,
João J. Spinelli
eliminou o que seria assimilável facilmente, substituindo-o
de objetos e chapas prateadas, que revitalizam a sua composi-
o desprezo pelos valores estabelecidos e também algo mais: a
por uma composição vigorosa à margem do caudal da arte de
ção... uma pintura inovadora e anticonformista, baseada numa
validade na escolha dos meios de expressão artística”. 9
1 SCHENBERG, Mário. “Teresa Nazar”. Galeria Atrium, São Paulo, 18 de agosto
imediata intelecção e consecutiva comercialização, à procura
temática da nossa época, como a da navegação sideral, com os
Este evento, um manifesto iconoclasta, na época foi aclama-
de 1966.
de uma arte objetual, entre a pintura e a escultura, uma crítica
seus foguetes, cápsulas e astronautas, heróis modernos empe-
do e ao mesmo tempo detestado pelo público e parte da crítica
2 MORAIS, Frederico. “A melhor Exposição é a de Teresa Nazar”. O Globo, Rio
direta à sociedade industrial de consumo, que lhe possibilitou
nhados na aventura da conquista do cosmo”. 4 O historiador de
de arte. Os críticos mais engajados com a arte contemporânea
de Janeiro, 18 de setembro de 1966.
uma visão particular do mundo, índice da liberdade artística
arte José Roberto Teixeira Leite confirmou: “a artista destacou-se
o defenderam. O diretor do Museu de Arte de São Paulo – MASP,
3 LAUS, Harry. “Coexistência Pacífica”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 16 de
alcançada pela imaginação irrestrita desta artista.
por suas interpretações pictóricas do cotidiano, bem como pela
Pietro Maria Bardi, com discernimento e firmeza afirmou: “a
setembro de 1966.
Independente e livre de objetivos esculturais, os materiais
série de quadros dedicados aos astronautas e aos vôos espaciais,
arte brasileira continua a se desenvolver como estava previsto,
4 BENTO, Antonio. “Os Astronautas de Teresa Nazar”. Última Hora, Rio de
industrializados escolhidos pela artista impulsionam e dinami-
servindo-se então de uma linguagem claramente influenciada
participando sempre, e cada vez com mais intensidade, dos mo-
Janeiro, 16 de setembro de 1966.
zam a composição final da obra: lâminas finas, maleáveis são
pela Pop norte-americana”. 5
vimentos de renovação que surgem agora, uns após outros, em
5 LEITE, José Roberto Teixeira. Dicionário Crítico da Pintura. Rio de Janeiro:
recortadas arqueadas, dobradas, sanfonadas. Além dos metais,
Apesar de Teresa Nazar não concordar, muitos críticos inseri-
toda parte. Para muitos isto é errado; para outros, justo... tudo o
ArtLivre, 1988. p. 349. Verbete Nazar, Teresa.
Teresa Nazar acrescentou em seus painéis materiais plastificados,
ram a sua produção visual na Pop-Art. A artista, em depoimento
que escapa do campo do conhecimento fácil e corriqueiro ainda
6 A Arte de Impacto de Teresa Nazar. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 1966
tecidos variados, pregos e até parafusos.
para o Jornal do Brasil, discordou: “Há muito tempo – por ne-
não é aceito”. 10
7 FAAP. Departamento de Pesquisa e Documentação de Arte Brasileira da
Perfeitamente integrados à composição, adquirem certa
cessidade e obrigação – acabei com a pintura de cavalete. Creio
Ao se apropriar e adequar para a arte objetos e materiais até
Fundação Armando Álvares Penteado. São Paulo, 27 de setembro de 1977.
autonomia de aparência inesperada, incomum. Apesar de optar
nos materiais que procuro e utilizo porque, através deles, chego
hoje relegados culturalmente, a pintora institui formalmente
8 Vamos participar desse apeningue. O Estado de São Paulo, São Paulo, 18 de
pela não utilização de materiais considerados nobres e sacrali-
a concretizar um pedaço do tempo no qual existi”. Em seguida
uma nova leitura, um novo olhar. Para esta artista não existiam
agosto de 1966.
zados pelas artes plásticas, seus painéis superam vicissitudes
completou: “Minha arte é bem distinta daquilo que os pop-art
materiais nobres ou menos nobres. Cabia unicamente ao criador
9 Apeningue, o que é? O Estado de São Paulo. 12 de agosto de 1966
e alcançam densidades unívocas. As emendas e as suturas, re-
americanos mostram em suas obras, pois, sendo o artista um
rever e superar padrões e convenções estipulados por antigas
10 BARDI, Pietro Maria. Simpatia para com o “happening” dos artistas. Diário
solutivamente visíveis ressaltam não apenas as precariedades
termômetro de sua época, ele retratará os símbolos do mundo
gerações de artistas e ou historiadores de arte. Assim, telas
de São Paulo, 17 de agosto de 1966
destes materiais, mas da própria humanidade. As confrontações
que o rodeia dentro de seus limites geográficos. O homem ame-
de arame, palhas de aço (Bombril), tecidos, placas metálicas
11 ZANINI, Walter. Sobre Teresa Nazar. In Tereza Nazar na Vanguarda Paulista.
formais e figurativas aparentemente contraditórias reforçam
ricano não tem tempo de parar para pensar. Por isso a Pop-Art
recortadas ou dobradas, madeira, gesso misturado com estopa
Spinelli. João. [ET alii]. São Paulo. Museu de Arte Brasileira – FAAP - 2005 p. 14
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