Agenda Cultural de Proença-a-Nova - Outubro 2020
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
<strong>Agenda</strong> <strong>Cultural</strong> <strong>de</strong> <strong>Proença</strong>-a-<strong>Nova</strong> outubro <strong>2020</strong><br />
abc das localida<strong>de</strong>s<br />
Casalinho<br />
“<br />
(...) um lugar encaixado numa<br />
espécie <strong>de</strong> vale entre os montes,<br />
é terra fértil em lembranças<br />
daqueles tempos em que não<br />
existia um metro <strong>de</strong> chão por<br />
cultivar.<br />
“<br />
Numa das encostas da Serra das Talhadas existe um<br />
refúgio que nasceu nas margens da ribeira do Alvito.<br />
O Casalinho, um lugar encaixado numa espécie <strong>de</strong> vale<br />
entre os montes, é terra fértil em lembranças daqueles<br />
tempos em que não existia um metro <strong>de</strong> chão por<br />
cultivar. Américo Gonçalves, <strong>de</strong> 80 anos, viveu os anos<br />
do pós II Guerra Mundial e lembra-se bem, “como as<br />
minhas mãos, <strong>de</strong> o meu pai dizer a minha mãe: oh<br />
Maria, hoje vão ser fuzilados os alemães. Quando<br />
acabou a guerra tinha 5 anos. O pós-guerra durou<br />
muitos anos, a vida era dura e tudo se aproveitava.<br />
Cada um trepava por on<strong>de</strong> podia”.<br />
Nessa altura eram cerca <strong>de</strong> 11 moradores, todos<br />
<strong>de</strong>dicados à vida do campo. Cultivava-se milho painço,<br />
trigo e centeio. Não havia mãos a medir nas voltas dos<br />
cereais ao longo do ano: semear, sachar, regar, colher…<br />
até serem postos em molhos - os rolheiros, como lhes<br />
chamavam - e dispostos na eira comunitária para se<br />
malharem. Homens alinhados <strong>de</strong> um lado e outro<br />
embalavam as mangoeiras no ar e soltavam um grito<br />
ao ritmo da pancada: “ei-ei, ei-ei…ei-ei, ei-ei”, recorda<br />
Américo. No final da malha, as casas mais abastadas<br />
matavam uma cabra ou uma ovelha para alimentar<br />
quem andava a trabalhar e era tradição comer-se o<br />
enchido feito a partir da bexiga do porco cheio com<br />
a massa da chouriça magra – “parece que ainda hoje<br />
sinto aquele gosto na boca”, relembra. O resto da palha<br />
que ficava na eira era a alegria da rapaziada que por ali<br />
brincava ou até dormia nas noites quentes <strong>de</strong> verão.<br />
O Casalinho é uma al<strong>de</strong>ia ribeirinha em que, além do<br />
sustento que a terra dava, a ribeira do Alvito era muito<br />
importante na sobrevivência <strong>de</strong>stas pessoas. “Havia<br />
muito peixe na ribeira, não havia poluição como agora.<br />
Um exemplo, eu tive um problema na pele e disseram<br />
à minha mãe para me levar a fazer banhos no rio Tejo.<br />
Hoje era impensável”. No final da manhã, <strong>de</strong>pois<br />
das tarefas do campo e antes do almoço, os homens<br />
juntavam-se para ir aos peixes. De quando em vez<br />
aconteciam umas peripécias, como naquelas vezes em<br />
que aparecia o guarda-rios e lá tinham <strong>de</strong> fugir à pressa.<br />
Habitualmente eram quatro homens que iam à pesca<br />
e a divisão do peixe também era engraçada: sentados<br />
<strong>de</strong>baixo <strong>de</strong> uma cabana faziam quatro montinhos, on<strong>de</strong><br />
se colocava um peixe gran<strong>de</strong> para cada um, <strong>de</strong>pois os<br />
mais pequenos e os pequeninos às mãos.<br />
A apanha da azeitona era outra gran<strong>de</strong> época <strong>de</strong><br />
azafama na al<strong>de</strong>ia. Ranchos <strong>de</strong> pessoas partiam <strong>de</strong><br />
casa antes do sol nascer a caminho da jornada. No fim<br />
14